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Nova Lima-MG
2010
ROSÍRIS PAULA CERIZZE VOGAS
Nova Lima - MG
2010
ROSÍRIS PAULA CERIZZE VOGAS
Esta dissertação foi julgada adequada para a obtenção do título de Mestre em Direito, e
aprovada em sua forma final, pela Coordenação do Curso de Pós-Graduação em Direito da
Faculdade de Direito Milton Campos, área de Direito Empresarial, linha de pesquisa A
empresa na contemporaneidade – a preservação da empresa e o poder de tributar.
Banca Examinadora:
______________________________________________________________________
Presidente: Prof. Dr. Sacha Calmon Navarro Coêlho
______________________________________________________________________
Membro: Prof. Dr.
______________________________________________________________________
Membro: Prof. Dr.
______________________________________________________________________
Coordenador do Curso: Prof. Dr. Carlos Alberto Rohrmann
The subject matter of this study concerns the analysis of the constitutionality of the laws
passed by some States in order to subsidize the practice of credit cancellation of Tax on
Circulation of Goods and Services (ICMS) to tax payers who acquire goods in other
federative units which grant fiscal benefits with no regard to the National Fiscal Council
(CONFAZ). It deals with the perverse States reactions within the triggered Brazilian fiscal
war. This study stems from an analysis of the Tax on Circulation of Goods and Services
(ICMS) legal profile, from its applicable constitutional principles, and from the legal scheme
of the fiscal benefits and respective limitations for its concession. Thus the causes and effects
of the fiscal war are examined in order to reach the core of the problem, that is the tax on
circulation of goods and services (ICMS) credit cancellation. The main arguments counter to
this practice, bearing in mind the Superior Court of Justice (STF) jurisprudence, are
presented. In face of observed tension between constitutional regulations, an agreement is
proposed based on important exegetical criteria such as reflection and legal postulates.
Finally, a reflection on the necessity and possibility of a structural reform in the Tax on
Circulation of Goods and Services (ICMS) sub-system is proposed as an alternative to restrain
jurisdictional conflicts.
KEY words: fiscal war, fiscal benefits, Tax on Circulation of Goods and Services (ICMS),
Non-Cumulativity
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
QUADROS
FIGURAS
TABELAS
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 13
CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................................181
REFERÊNCIAS....................................................................................................................185
ANEXOS
I – Art. 155 da Constituição Federal de 1988.........................................................................195
II - Lei Complementar n°. 24 de 07 de janeiro de 1975..........................................................198
III – Resolução n°. 3.166 SEF MG de 11 de junho de 2001...................................................201
INTRODUÇÃO
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No entanto, o ensaio extravasa o campo da dogmática jurídica na medida em que
são feitas incursões, ainda que breves, seja na seara política, quando se investigam as causas e
alternativas para a guerra fiscal, seja no campo econômico, quando buscamos relacionar os
seus efeitos.
Fixamos algumas premissas essenciais, realizando o corte metodológico
necessário a todo trabalho científico. Com isso, foi escolhido o objeto da investigação que se
limitou a buscar respostas para a seguinte questão: são constitucionais as normas e medidas
restritivas ao direito de aproveitamento de crédito de ICMS pelo contribuinte adquirente de
mercadorias em operações interestaduais, cujos remetentes sejam beneficiários de incentivos
fiscais concedidos em desacordo com a legislação de regência do imposto?
É claro que ao longo da pesquisa muitas dúvidas surgiram e precisaram ser
superadas para que fosse possível formular, ao final, conclusões coerentes, devido às
inúmeras controvérsias e polêmicas que o assunto suscita. Eis alguns dos subproblemas
enfrentados: (i) a glosa de créditos de ICMS ofende ou preserva o princípio da não-
cumulatividade?; (ii) o direito ao crédito de ICMS é decorrente do imposto incidente ou pago
em operações anteriores?; (iii) tipos exonerativos, como a isenção parcial, redução de base de
cálculo ou de alíquota, alíquota zero, diferimento, crédito presumido, dentre outros tantos,
podem ser equiparados aos institutos da isenção ou não-incidência e, portanto, podem ser
considerados exceções ao princípio da não-cumulatividade?; (iv) a Lei Complementar n°.
24/1975 foi recepcionada pela Constituição Federal?; (v) como compatibilizar a glosa de
créditos de ICMS prevista no art. 8° da LC n°. 24/1975 com o princípio da não-
cumulatividade?; (vi) a LC n°. 24/1975 é auto-aplicável?; (vii) a norma restritiva ao direito
creditório do ICMS tem eficácia declaratória ou constitutiva?
Para embasar as premissas e respostas a essas questões realizamos investigação
jurisprudencial e, também, doutrinária, em obras de autores brasileiros e estrangeiros, e em
diversas fontes secundárias (teses, dissertações, artigos e revistas especializadas). Isto
possibilitou-nos a revisão bibliográfica acerca do tema proposto com o intuito de identificar as
efetivas contribuições científicas existentes e trazer uma nova abordagem em relação ao que
já foi produzido. Em face de todo o estudo feito, estruturamos esta dissertação em oito
capítulos, conforme evolução do tema.
O capítulo 1 apresenta o atual perfil jurídico do ICMS, especificamente no que se
refere ao fato gerador circulação de mercadorias, a partir de uma digressão sobre a evolução
legislativa do imposto e dos aspectos fundamentais de sua incidência. Discutimos, também, o
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papel da lei complementar em matéria de ICMS, colocando, desde logo, para primeiras
reflexões, uma das principais causas da guerra fiscal no Brasil: a acentuada vocação nacional
de um imposto de competência estadual.
No capítulo 2 fazemos uma incursão sobre os princípios constitucionais
especificamente aplicáveis ao ICMS, essenciais para a compreensão das bases sob as quais
está estruturada toda a sistemática de apuração e cobrança desse imposto. Discorremos, então,
sobre a não-cumulatividade e suas exceções, o federalismo fiscal, a neutralidade e o modelo
de tributação na origem.
No capítulo 3 enveredamos pela análise do regime jurídico dos benefícios fiscais,
pautando-nos em uma conceituação preliminar para posterior distinção técnica das suas
variadas espécies. São evidenciadas diferenças expressivas entre os institutos jurídicos dos
favores estatais, distinções estas que trazem importantes implicações de ordem prática,
principalmente no momento de aferirmos se estamos, ou não, diante de uma exceção
constitucional ao princípio da não-cumulatividade.
No quarto capítulo são expostos os limites genéricos e específicos para a
concessão de benefícios fiscais pelas unidades federadas, bem assim aquelas limitações
impostas por normas de natureza orçamentária.
Já, no capítulo 5, investigamos as causas da guerra fiscal, pontuando as suas
conseqüências macroeconômicas para então atingir um dos seus principais efeitos colaterais: a
glosa de créditos de ICMS. Foram mapeados os principais normativos restritivos de direitos
creditórios editados pelos estados que têm adotado essa malfadada prática, com ênfase para a
legislação dos Estados de Minas Gerais (Resolução n°. 3.166/2001) e São Paulo (Portaria
CAT n°. 36/2004).
No sexto capítulo desenvolvemos a linha de argumentação que nega a glosa de
créditos de ICMS, escorada em dispositivos do Diploma Supremo que resguardam direitos e
garantias individuais dos contribuintes, destacando as inconstitucionalidades que gravitam em
torno das medidas restritivas. Além disso, promovemos uma análise crítica da atual
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, majoritariamente favorável às manifestações
fazendárias de que trata o estudo.
O capítulo 7 preocupamo-nos em buscar e definir critérios exegéticos consistentes
para a superação de um conflito instaurado a partir da aplicação inadvertida de regras e
princípios constitucionais. Para tanto, as situações dos envolvidos no embate são examinadas
sob duas principais perspectivas: a primeira, que estuda individualmente o contribuinte
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adquirente que sofre a glosa de créditos de ICMS, à luz do sobreprincípio da segurança
jurídica, e seus notáveis subprincípios da proteção da confiança e da boa-fé; a segunda,
estudando isoladamente as razões do estado de destino restringir o direito creditório do seu
contribuinte, à luz do sobreprincípio da justiça fiscal.
Em seguida utilizamos a técnica hermenêutica da ponderação para realizar o
imprescindível sopesamento dos valores envolvidos nesse confronto, pautando-nos pelo
emprego dos postulados jurídicos, ou melhor, das metanormas, capazes de estruturar a
aplicação de outras normas jurídicas, preciosos instrumentos para a superação de antinomias.
É cediço que a solução para a guerra fiscal no país depende de uma já tardia
reforma do Sistema Constitucional Tributário. O conflito interestadual é o ponto mais
intrincado de todas as propostas já colocadas nos últimos tempos. Sendo assim, no último
capítulo, exploramos a forma como o tema guerra fiscal é tratado na última Proposta de
Emenda Constitucional, atualmente em trâmite no Congresso Nacional, a PEC n°. 233/2008,
e, ainda, se as alternativas por ela veiculadas são de fato suficientes para dar cabo ao
problema.
As controvérsias acerca dessa matéria são pulsantes e, uma vez que representam
grandes conflitos de interesses, o debate se torna não só oportuno como verdadeiramente
necessário e construtivo. Não há qualquer pretensão de apresentarmos respostas definitivas
para a problemática posta à evidência, mesmo porque este não é o papel do cientista do
direito. Ao contrário, o que almejamos é ofertar à comunidade jurídica e ao meio empresarial
uma nova e possível interpretação do fenômeno enunciado, convictos de que não se pode
promover justiça fiscal atropelando direitos e garantias fundamentais e individuais dos
contribuintes.
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1 O PERFIL JURÍDICO DO ICMS
O ICMS é um imposto que, apesar de ter sido criado pela Constituição Federal de
1988, decorre de uma evolução legislativa, resultado da unificação de seis outros impostos
existentes no ordenamento constitucional anterior (CF/1967), quais sejam: (i) imposto sobre
circulação de mercadorias; (ii) imposto único sobre minerais; (iii) imposto único sobre
combustíveis líquidos e gasosos; (iv) imposto único sobre energia elétrica; (v) imposto sobre
transportes; (vi) imposto sobre comunicações.
Em razão dessa complexa fusão de fatos geradores, o legislador constitucional
dedicou especial atenção a esse imposto, que está disciplinado de forma bastante detalhada no
art. 155 da CF/1988 (vide Anexo I). Sem dúvida alguma, o ICMS é um tributo
minuciosamente tratado pelo Texto Maior.
Inicialmente, a incidência operava-se sobre as vendas mercantis – IVM, imposto
de competência da União Federal, instituído pela Lei nº. 4.625/1922. Com o advento da
Constituição de 1934, o imposto passou a incidir sobre as vendas e consignações - IVC,
quando a competência para a sua exigência foi alterada para os estados-membros.
Tanto o IVM como o IVC eram tributos de incidência em cascata, isto é, de
incidência cumulativa sobre todas as fases da cadeia circulatória das mercadorias. Assim,
sempre que houvesse mudança da titularidade das mercadorias, deveria ser aplicada a alíquota
do imposto sobre a margem ou valor da transação que se agregava à nova base de cálculo da
operação subseqüente, onerando significativamente o consumidor final.
A partir da Reforma Tributária determinada pela Emenda Constitucional n°. 18 de
1965 (CF/1946), o IVC foi substituído pelo Imposto sobre Circulação de Mercadorias – ICM,
com substanciais alterações, principalmente em razão da instituição da não-cumulatividade. A
nova sistemática buscava mitigar os severos efeitos da cobrança cumulativa do imposto sobre
o consumo, porém, sem definir com maior acuidade o seu exato alcance, o que foi delegado à
lei complementar, situação esta mantida pela Constituição Federal de 1967. O ICM foi então
regulamentado pelo Decreto-Lei n°. 406/1968.
O eminente professor Sacha Calmon Navarro Coêlho (2004) apresenta o contexto
econômico que justificou a substituição da sistemática cumulativa do antigo IVC para o
regime da não-cumulatividade do ICM:
O ICMS está previsto no art. 155, II do Diploma Maior, que assim dispõe:
Art. 155. Compete aos Estados e Distrito federal instituir impostos sobre:
(...)
II - Operações relativas à circulação de mercadorias e sobre a prestação de
serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação,
ainda que a operação ou prestação se inicie no exterior.
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sempre estão expressos e integrados no texto da lei. Tais aspectos são qualidades da hipótese
de incidência capazes de determinar os sujeitos da obrigação tributária, seu conteúdo material,
local, momento de nascimento e quantum devido.
Portanto, para se compreender os elementos estruturantes do ICMS é prudente que
façamos uma rápida incursão pelos aspectos da sua norma jurídica de incidência, quais sejam
os aspectos material, pessoal, espacial, temporal e quantitativo.
O aspecto material é a descrição objetiva do fato que poderá deflagrar a obrigação
tributária. No caso do ICMS significa a realização de operações relativas à circulação de
mercadorias, ou prestações de serviços de transporte (interestadual e intermunicipal), ou de
prestações de serviço de comunicação. Cabe aqui, tão-somente, o exame dos conceitos
nucleares que compõem o aspecto material dos negócios mercantis (ICMS mercantil), que
essencialmente importam ao presente estudo.
O termo operações pressupõe a realização de um negócio jurídico mercantil e não
toda e qualquer circulação de mercadorias. Trata-se da realização de ato jurídico atinente à
transmissão de propriedade, de modo a levá-la da fonte de produção ao consumo, desde que
haja finalidade lucrativa.
O vocábulo circulação significa a passagem das mercadorias de uma pessoa para
outra, refletindo mutação patrimonial. José Eduardo Soares de Melo e Luiz Francisco Lippo
(2004, p. 36), citando Carvalho de Mendonça, esclarecem que: “a circulação das mercadorias
pressupõe, pois, tradição. Por esse meio, elas entram na massa circulante dos bens,
conseguindo o seu objetivo econômico, qual o de chegar fácil e oportunamente às mãos dos
consumidores”.
Por mercadorias devemos entender o bem móvel sujeito à mercancia. Em razão
do fato de bem móvel ser o gênero do qual a mercadoria é a espécie, de modo que não pode
qualquer bem móvel ser considerado uma mercadoria, é imprescindível que seja objeto de
venda ou revenda em caráter habitual. (CARRAZZA, 2009, p. 43). É por isso que não podem
ser consideradas mercadorias os bens de uso próprio da pessoa física ou integrantes do ativo
imobilizado de uma empresa, quando vendidos a terceiros.
Portanto, para dar ensejo a obrigação tributária de pagar o ICMS, sob o ponto de
vista de seu aspecto material, é preciso que estejam presentes de forma cumulativa os
seguintes elementos: (i) realização de operações (negócios jurídicos pertinentes à transmissão
de propriedade ou posse das mercadorias); (ii) circulação jurídica (mutação patrimonial) e
(iii) a existência de mercadoria (bem compreendido no efetivo ato mercantil).
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O aspecto pessoal, por sua vez, compreende os sujeitos ativos e passivos da
obrigação tributária. O sujeito ativo é a pessoa titular do direito subjetivo de exigir o tributo.
O sujeito passivo é a pessoa física ou jurídica, privada ou pública, que tem o dever jurídico de
satisfazer a prestação tributária.
No âmbito do ICMS, os sujeitos ativos da obrigação tributária são os estados e
distrito federal, conforme competência que lhes foi outorgada pela Constituição Federal.
Esses entes políticos devem observar a competência tributária como verdadeira baliza
intransponível a guiar o legislador ordinário, na criação e regramento, in abstrato, do ICMS.
A Carta Maior em vigor não define os sujeitos passivos do ICMS, mas somente as
suas materialidades. Portanto, a definição da sujeição passiva do ICMS parte da análise do
próprio aspecto material da hipótese de incidência do imposto, de modo que o contribuinte
será todo aquele que realizar as operações de circulação de mercadorias, transporte
interestadual e intermunicipal ou comunicação.
A Lei Complementar n°. 87/1996 delineou com maior precisão o conceito de
contribuinte e, em seu art. 4°, assim dispôs:
Não deixamos de mencionar que a legislação pode definir como sujeito passivo
indireto pessoa diversa daquela que realizou o fato gerador. Tratam-se das hipóteses de
transferência1 (solidariedade, sucessão e responsabilidade) e substituição tributária2.
1
A transferência ocorre após o surgimento da obrigação tributária contra o sujeito passivo direto ou contribuinte,
isto é, em virtude de fato posterior há o redirecionamento para outra pessoa ou sujeito passivo indireto da
respectiva obrigação.
2
A substituição tributária ocorre quando o legislador afasta, antes mesmo do surgimento da obrigação tributária,
o sujeito passivo direto ou contribuinte que efetivamente realizam o fato gerador, transferindo o seu encargo e
dever jurídico de pagamento do tributo, desde logo, para outra pessoa, o substituto.
22
O aspecto espacial de incidência do ICMS é o lugar previsto na norma geral e
abstrata, onde poderá nascer a obrigação tributária, caso naquele local ocorra o fato jurídico
tributário. Em sendo o ICMS um imposto de competência estadual e distrital, é de se concluir
que os fatos jurídicos ocorridos em qualquer ponto dos territórios dos estados ou distrito
federal ensejarão o nascimento da obrigação tributária.
O art. 11 da Lei Complementar n°. 87/96, em cumprimento a regra prevista no art.
155, § 2°, d da Constituição Federal, tratou de definir o aspecto espacial da incidência do
ICMS, ou seja, o local da operação ou prestação.
No que tange ao aspecto temporal de incidência do ICMS, temos que os estados e
o distrito federal poderão eleger, por meio de lei ordinária, o momento em que o fato gerador
será tido por ocorrido.
O art. 12 da Lei Complementar n°. 87/96 dá as balizas para a definição do
momento em que o fato gerador será considerado ocorrido. Somente para exemplificar,
citamos alguns desses momentos eleitos pelo legislador complementar: a) saída da mercadoria
de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular; b)
início da prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, de qualquer
natureza; c) desembaraço aduaneiro de mercadorias ou bens importados do exterior.
Em resumo, no caso do ICMS mercantil, a Lei Kandir definiu que a saída do
estabelecimento do contribuinte deve ser considerada o momento em que restou realizado o
fato gerador, o que, por si só, não basta para dar ensejo à obrigação tributária, havendo que se
verificar a presença cumulativa dos demais aspectos da incidência do imposto.
Por fim, no que diz respeito ao aspecto quantitativo da incidência do ICMS, por
meio do qual se irá apurar o quantum debeatur da obrigação tributária, temos que examinar os
seus dois principais (mas não únicos) elementos formadores, quais sejam a base de cálculo e a
alíquota.
A base de cálculo é a dimensão da materialidade do tributo, que dita os critérios
para mensuração do fato jurídico tributário (CARRAZZA, 2009, p. 85), devendo ser o valor
representado pelas operações de circulação de mercadorias ou de prestação de serviços. Já a
alíquota é um percentual que incide sobre o valor da operação de circulação de mercadorias
ou de prestação de serviços.
Normalmente a materialidade de cada tributo é, ou pelo menos deveria ser,
suficiente para medir normativamente o valor devido aos cofres públicos, já que as operações
e prestações representam necessariamente grandezas econômicas. Todavia, não é o que ocorre
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no caso do ICMS, que, enquanto tributo plurifásico e não-cumulativo, deve considerar outros
elementos, como, por exemplo, o crédito das operações anteriores, para ter o seu quantum
efetivo devidamente dimensionado.
O estabelecimento da alíquota pelo sujeito ativo competente, por meio de lei
ordinária, deve observar as limitações previstas na Constituição Federal, especialmente nos
seus incisos IV a VIII do § 2° do art. 155, que transferiram para o Senado Federal a
responsabilidade da definição de alíquotas mínimas e máximas, cujos parâmetros são de
observância obrigatória pelos estados e distrito federal, no momento de sua fixação.
Claro que não se esgota aqui o assunto sobre os aspectos fundamentais da
incidência do ICMS, pelo que expomos uma visão geral quanto aos seus elementos
estruturantes para, com isso, possibilitar uma melhor compreensão do problema das
manifestações fazendárias restritivas do direito creditório do ICMS em relação aos
contribuintes que adquirem mercadorias incentivadas noutros estados, cerne deste estudo.
Mesmo que possa parecer redundante, não é incorreto dizer que as leis
complementares destinam-se a complementar o texto constitucional, sendo que o legislador
constituinte reservou a essa espécie normativa matérias de relevância, que dependem de maior
quorum ou consenso para a sua aprovação (art. 69 da CF/1988).
É passível de defesa o entendimento de que inexiste qualquer hierarquia entre lei
complementar e lei ordinária, pois o que distingue as duas modalidades normativas são apenas
as matérias que cabem a cada um delas tratar, bem como o quorum para a sua aprovação. Por
outro lado, ambos os veículos introdutores de normas jurídicas, por óbvio, devem subordinar-
se à Constituição e aos seus postulados.
Mas não há qualquer consenso na doutrina quanto ao tema da hierarquia das leis.
Para o jurista Edvaldo Brito (2004, p. 94), a lei complementar é superior às outras leis, pois
veicula matéria para a qual a Constituição deu-lhe preeminência em relação às demais
normas.
No que diz respeito à finalidade da lei complementar, cumpre-nos trazer a lume
posição do abalizado constitucionalista Alexandre de Moraes (2010):
25
h) definir os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o imposto incidirá
uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade, hipótese em que não
se aplicará o disposto no X, b;
i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre,
também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço.
26
n°. 87/96 traz as regras básicas relativas ao ICMS, a serem rigorosamente observadas pelos
entes federativos.
Basta imaginar a generalizada balburdia que se instauraria se cada uma das 27
legislações estaduais e distrital pudesse, a seu exclusivo critério, dispor sobre regras de
sujeição passiva, responsabilidade tributária, fato gerador e alíquotas. Tal fato simplesmente
implicaria a ruína total dos mecanismos de instituição e arrecadação do ICMS (BARROS;
GUERRA, 2010, p. 107).
Portanto, as normas gerais de ICMS devem ser veiculadas por meio de lei
complementar, em razão da necessidade premente de uniformização da legislação, a fim de
preservar os primados da unidade da Federação e a segurança jurídica.
O ICM, por ser, na genealogia dos IVAs, um imposto nacional que difunde
os seus efeitos pelo território inteiro do país, em razão, principalmente, do
seu caráter não-cumulativo, viu-se – o imposto deveria ser da União – na
contingência de ser retalhado em termos de competência impositiva entre os
diversos Estados-Membros da Federação, o que antecipou sérias dificuldades
no manejo do gravame que deveria ter “perfil nacional” uniforme. A
conseqüência foi o massacre da competência estadual, já que o imposto teve
que se submeter a um regramento unitário pela União através de leis
complementares e resoluções do Senado. E para evitar políticas regionais
autônomas e objetivos extrafiscais paraninfados pelos estados de per se,
27
foram ideados os convênios de Estados-Membros, espécies de convívio
forçado em que um só podia fazer o que os demais permitissem ou
tolerassem. (COÊLHO, 2004, p. 385).
28
atribuição de um imposto não cumulativo à União, o IPI (art. 153, IV, § 3°,
II) não causa no particular nenhum problema. (BORGES, 1996, p. 72).
29
2 O ICMS À LUZ DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
31
aplicação. Enquanto os postulados orientam a aplicação de outras normas, os princípios e
regras são o próprio objeto da aplicação. Por isso qualificam-se como metanormas ou normas
de segundo grau.
A importância dos postulados, como instrumento de solução de confronto entre
normas de mesmas ou diferentes espécies, ainda será mais explorada neste estudo, justamente
porque, como será apresentado, toda problemática relativa à glosa de créditos de ICMS gira
em torno, essencialmente, de um conflito normativo constitucional.
Com base nessas lições, o sistema jurídico pode ser definido como uma rede
axiológica, hierarquizada e coerente de princípios, regras e postulados, que convivem de
modo a garantir a sua própria unidade valorativa e adequação interna.
A Constituição Federal, como sistema de normas, é composta por regras,
princípios e postulados e aspira unidade de sentido e ordenação. Tais características do
sistema constitucional somente serão preservadas se os princípios forem devidamente
valorizados e revistos periodicamente pelos intérpretes e aplicadores do direito.
Sobre a relevância e o papel dos princípios no ordenamento jurídico vale a pena
observarmos os ensinamentos de Geraldo Ataliba (2004):
2.2 Não-cumulatividade
33
Tal princípio se tornou constitucional a partir da Emenda Constitucional n°.
18/1965, mantendo-se intocável nas reformas constitucionais posteriores, como se depreende
do art. 22, V, § 4° e art. 24, II, § 5° da CF/1967, bem como do art. 21, § 3° e art. 23, II
alterados pela Emenda Constitucional n°. 1/1969.
A Constituição Federal de 1988 veda apenas o creditamento do imposto em
decorrência de operações anteriores isentas ou não tributadas, razão pela qual o princípio da
não-cumulatividade há que ser interpretado em termos amplos e sem maiores restrições, a
exceção daquelas constitucionalmente enunciadas, no sentido da incidência de ICMS sempre
gerar direito a crédito.
O princípio da não-cumulatividade presta-se não apenas a resguardar um direito
do contribuinte, mas, também, como regra impositiva a ser observada pelas fazendas públicas
estaduais.
Uma das principais vantagens do ICMS, enquanto tributo plurifásico e não-
cumulativo, é permitir a antecipação do imposto devido apenas no consumo, tornando
responsáveis pela sua arrecadação todos os agentes econômicos e demais participantes do
processo circulatório de mercadorias.
É vedado onerar o contribuinte de direito, mediante a possibilidade de todo
adquirente, exceto o consumidor final, abater o imposto que lhe foi transferido pelo vendedor,
de modo que o ICMS não recaia sobre o contribuinte, seja ele comerciante, industrial,
distribuidor, produtor, etc., mas, sim, arcado, exclusivamente, pelo consumidor final, isto é,
pelo contribuinte de fato.
Importa destacar que a não-cumulatividade não faz parte dos aspectos
fundamentais de incidência tributária do ICMS, relacionada, sim, ao âmbito de extinção do
crédito tributário, na etapa de apuração do quantum debeatur, de modo que o contribuinte
poderá liquidar seu débito tributário, parte, por meio de compensação do crédito decorrente da
operação anterior, e, parte, em dinheiro (MELO; LIPPO, 2004, p. 121).
Certo é que a Constituição Federal delegou à lei complementar apenas a
competência para disciplinar o regime de compensação do imposto (art. 155, § 2°, XII, c da
CF/1988), exigindo-se a observação incondicional do critério da não-cumulatividade, previsto
constitucionalmente. Assim, em nenhum caso, a pretexto de regulamentar o regime de
compensação do ICMS, poderá o legislador complementar estabelecer qualquer tipo de
restrição que venha impossibilitar o pleno direito ao crédito do imposto.
34
Roque Carrazza (2009) é enfático quando discorre sobre os limites para
manipulação do alcance do princípio da não-cumulatividade por lei complementar:
Desse modo, se não é dado nem mesmo à lei complementar alterar o sentido do
princípio constitucional da não-cumulatividade, não há, é evidente, qualquer possibilidade das
unidades federativas interferirem no alcance e aplicação desse princípio, seja por meio de lei
ou por norma infralegal.
O princípio da não-cumulatividade é dotado de eficácia plena, que pode
eventualmente ser regulamentado. Por essa razão, o legislador infraconstitucional nada pode
fazer em relação a ele, posto lhe faltar competência legislativa para restringir o seu conteúdo,
sentido e alcance.
Ressaltamos que muitos estados interpretam de forma equivocada a expressão
contida no art. 155, § 2º, I da CF/1988, qual seja imposto anteriormente cobrado. Não raro,
tal expressão é tida pelos fiscos como sinônimo de imposto pago ou efetivamente devido nas
operações anteriores.
Essa hermenêutica está eivada de impropriedades, sendo já assente na doutrina
que o direito do contribuinte adquirente das mercadorias nasce independentemente do
contribuinte anterior ter, ou não, recolhido o imposto relativo a sua operação de saída. A
expressão imposto cobrado deve, na verdade, ser entendida como imposto incidente.
É fundamental que se estabeleça a exata distinção entre as expressões incidente e
cobrado, vez que, de fato, representam situações jurídicas distintas. A primeira expressão,
devido, enseja a exigência de um tributo, vez que se realizou a sua hipótese de incidência,
sendo irrelevante se foi ou não efetuado algum pagamento; a segunda, cobrado, representa o
momento posterior, em que, após a apuração do imposto, o contribuinte recolherá aos cofres
públicos o montante apurado.
Esse argumento comprova-se pelo fato de, ainda sem o pagamento do preço da
mercadoria pelo adquirente e, portanto, do valor do imposto constante na nota fiscal, o tributo
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ser devido e cobrado normalmente daquele que promoveu a sua respectiva saída, na forma da
legislação de regência. Por outro lado, poderá ocorrer, também, que o fornecedor apresente
saldo credor, elidindo qualquer pagamento do imposto. Isto, contudo, não afeta a incidência
da operação.
A acepção da palavra cobrado contida no comando constitucional em questão é de
suma relevância na análise do direito de abater ou creditar e não pode ser interpretada
literalmente, pois a efetiva cobrança, isto é, o valor arrecadado do imposto, não é de
conhecimento do contribuinte adquirente de mercadorias ou do tomador dos serviços (MELO,
2005, p. 229).
O Superior Tribunal de Justiça adota a mesma interpretação, ora defendida, ao
fixar entendimento de que o direito ao crédito decorre de norma constitucional, sendo
autônomo em relação ao cumprimento da obrigação tributária pelo remetente das
mercadorias. Destacamos acórdão proferido por força do julgamento do Recurso Especial n°.
1.125.188/MT3, em que se apreciou a possibilidade do Estado do Mato Grosso proceder à
retenção de caminhões de origem do Estado do Mato Grosso do Sul, transportando cimento.
3
No mesmo sentido é o acórdão proferido em relação ao REsp 773675/RS. PROCESSO CIVIL E
TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. ICMS DESTACADO NAS NOTAS
FISCAIS EMITIDAS PELA FORNECEDORA. DIREITO AO CREDITAMENTO. PRINCÍPIO DA NÃO-
CUMULATIVIDADE. DEMANDA DECLARATÓRIA QUE RECONHECERA A NÃO INCIDÊNCIA DO
ICMS SOBRE OS SERVIÇOS DE COMPOSIÇÃO GRÁFICA NAS EMBALAGENS PERSONALIZADAS.
ESTORNO DOS CRÉDITOS. IMPOSSIBILIDADE. 1. O direito de crédito do contribuinte não decorre da
regra-matriz de incidência tributária do ICMS, mas da eficácia legal da norma constitucional que prevê o próprio
direito ao abatimento (regra-matriz de direito ao crédito), formalizando-se com os atos praticados pelo
contribuinte (norma individual e concreta) e homologados tácita ou expressamente pela autoridade fiscal. Essa
norma constitucional é autônoma em relação à regra-matriz de incidência tributária, razão pela qual o direito ao
crédito nada tem a ver com o pagamento do tributo devido na operação anterior. 2. Deveras, o direito ao
creditamento do ICMS tem assento no princípio da não-cumulatividade, sendo assegurado por expressa
disposição constitucional, verbis: "Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito federal instituir impostos sobre:
(...) II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual
e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; (omissis) § 2º
O imposto previsto no II atenderá ao seguinte: I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em
cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas
anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito federal;" 3. O termo “cobrado” deve ser, então,
entendido como “apurado”, que não se traduz em valor em dinheiro, porquanto a compensação se dá entre
operações de débito (obrigação tributária) e crédito (direito ao crédito). Por essa razão, o direito de crédito é
uma moeda escritural, cuja função precípua é servir como moeda de pagamento parcial de impostos indiretos,
orientados pelo princípio da não-cumulatividade. 4. Destarte, o direito à compensação consubstancia um direito
subjetivo do contribuinte, que não pode ser sequer restringido, senão pela própria Constituição Federal.
Evidenciado resulta que a norma constitucional definiu integralmente a forma pela qual se daria a não-
cumulatividade do ICMS, deixando patente que somente nos casos de isenção e não-incidência não haveria
crédito para compensação com o montante devido nas operações seguintes ou exsurgiria a anulação do crédito
relativo às operações anteriores (art. 155, § 2º, II). 5. Ressoa inequívoco, portanto, que o direito de abatimento,
quando presentes os requisitos constitucionais, é norma cogente, oponível ao Estado ou ao Distrito federal. A seu
turno, os sucessivos contribuintes devem, para efeito de calcular o imposto devido pela operação de saída da
mercadoria do seu estabelecimento, abater o que antes e, a título idêntico, dever-se-ia ter pago, a fim de evitar a
oneração em cascata do objeto tributado, dando, assim, plena eficácia à norma constitucional veiculadora do
princípio da não-cumulatividade. Percebe-se, assim, que o creditamento não é mera faculdade do contribuinte,
36
A apreensão das mercadorias se dava com o cruzamento da fronteira entre os
estados, já que o Estado do Mato Grosso entendia que a empresa produtora do cimento não
recolhia a diferença do ICMS devido por substituição tributária, de acordo com decreto
estadual, que permitia o creditamento de apenas 2% do valor devido na operação anterior.
Tratava-se de nítida guerra fiscal entre os estados, na medida em que o Estado do Mato
Grosso do Sul concedia um crédito presumido ao contribuinte no importe de 60% do valor do
ICMS devido, na prática, redução para 4,8% da alíquota de 12% relativa ao ICMS devido por
substituição tributária, enquanto na nota fiscal constava o destaque da alíquota de 12%,
assumido como crédito para o adquirente da mercadoria.
O Estado do Mato Grosso alegava que esse crédito presumido equivaleria às
hipóteses constitucionalmente previstas de isenção ou não-incidência e que, por essa razão,
não poderia gerar crédito porque em tais situações não haveria imposto devido.
O acórdão em tela foi contundente e categórico ao afirmar que imposto devido não
deve ser confundido com imposto efetivamente recolhido e que “o benefício fiscal concedido
pelo estado de origem não altera o cálculo do imposto devido, mas, apenas, resulta em
recolhimento a menor em face da concessão de crédito, devendo ser descontado o percentual
de 12% do ICMS devido por substituição tributária ao estado destinatário”.
Assim, é certo que a não-cumulatividade do ICMS é direito incontrastável e
subjetivo do contribuinte e só pode ser corretamente entendida e aplicada de acordo com o
estabelecido na Carta Magna, sendo irredutível por normas infraconstitucionais.
mas dever para com o ordenamento jurídico objetivo, não lhe sendo possível renunciar ao lançamento do crédito
do imposto, mesmo que tal prática lhe fosse conveniente. Sequer a própria lei poderia autorizá-lo a tanto, sob
pena de patente inconstitucionalidade. 6. Nesse diapasão, não se afigura legítima a exigência de estorno dos
créditos de ICMS, porquanto a empresa agiu no estrito cumprimento da regra-matriz de direito ao crédito, uma
vez ter-lhe sido regularmente repassado o tributo pela empresa fornecedora quando da aquisição das embalagens
personalizadas, consoante destacado nas notas fiscais - documentos idôneos para tanto - , gerando a presunção de
incidência da exação na operação anterior. 7. Deveras, a relação fiscal se estabelece entre o sujeito com
competência tributária e o contribuinte, de sorte que o eventual crédito do fisco em relação ao primeiro
contribuinte do imposto não pode ser exigido de outrem, o qual, pela lei, não é seu substituto tributário nem
sucessor. In casu, a recorrida pagou o tributo e o primeiro contribuinte depositou-o, levantando-o após, com a
anuência do Estado, que não pode pretender reavê-lo de quem implementou o seu dever. 8. Recurso especial
desprovido. (REsp 773675/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 02.04.2007)
37
valores cobrados a título de ICMS nas operações anteriores de aquisição de mercadorias e
débito os valores devidos pelas operações subseqüentes de vendas.
As únicas hipóteses restritivas ao direito creditório do ICMS, em caráter de
exceção ao princípio da não-cumulatividade, estão previstas no art. 155, § 2°, II da
Constituição Federal, que assim estabelece:
Art. 155.
(...)
§ 2.º O imposto previsto no II atenderá ao seguinte
(...)
II - a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da
legislação:
a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas
operações ou prestações seguintes;
b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores.
(Grifamos)
38
- mas o estorno dos mesmos créditos, em caso de isenção, apenas reduzirá o
alcance do benefício concedido, jamais transferindo o ônus do tributo para o
contribuinte ou tornando cumulativo o imposto. A regra constitucional é a de
que o imposto jamais seja suportado pelo contribuinte e essa regra em
nenhum caso deverá ser quebrada;
- finalmente a anulação dos créditos em relação à prestação de serviços de
transporte e de comunicação não está autorizada pela Constituição brasileira,
a qual restringe essa possibilidade às operações de circulação de
mercadorias. (BALEEIRO, 2000, p. 422).
39
implicar qualquer tipo de restrição ou limitação ao direito creditório do ICMS incidente em
operações ou prestações anteriores.
Ives Gandra Martins (2000, p. 109) defende que o verbo disciplinar previsto no
aludido dispositivo constitucional não significa alterar ou retirar direitos, tampouco conceder
privilégios, nem suprimir ou adulterar, muito menos violar direitos.
Cabe ao legislador infraconstitucional, notadamente o legislador complementar
que tem competência para disciplinar, ou melhor, regulamentar o regime de compensação do
ICMS, observar as balizas e diretrizes constitucionais, sendo-lhe defeso subverter a ordem
jurídica e seus postulados econômicos.
40
após a promulgação da Constituição Republicana de 1891, que legitimou a famosa política
café com leite, o Brasil adotou a forma federativa de Estado, transformando as províncias em
estados-membros, que passaram a gozar de relativa autonomia em relação ao governo central.
As principais características da Federação são bem apresentadas por Celso Ribeiro
Bastos (2004):
4
A autonomia dos estados–membros encontra seu fundamento de validade jurídico constitucional no Art. 25 da
Carta Magna, que assim dispõe: “Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem,
observados os princípios desta Constituição”.
41
Federal, assunto inexistente, ou pouco relevante, nos Estados unitários
(Regiões e Comunas). (COÊLHO, 2004, p. 65).
Elcio Fonseca Reis (2000) ensina que a repartição das competências de equilíbrio
é uma tendência do federalismo contemporâneo, baseando-se na técnica da repartição da
competência concorrente, em que se atribui determinada matéria legislativa e material a mais
de um ente político. Segundo o jurista, a repartição de competência é base de sustentação do
federalismo constitucional:
42
pretenda, de algum modo, retirar a competência tributária dos estados, que devem ter a sua
integridade territorial respeitada.
Não podemos olvidar que, não obstante os estados-membros serem dotados de
autonomia constitucional legislativa e financeira, são também juridicamente iguais entre si.
Ainda que econômica ou politicamente não o sejam, têm os mesmos direitos e deveres e,
participando de igual modo da formação da vontade nacional, não se admite que um estado,
por autoridade própria, obrigue outro a fazer alguma coisa. (CARRAZZA, 2003, p. 143).
Humberto Ávila (2006, p. 102) pondera sobre a necessidade de relativização dessa
autonomia, partindo da premissa de que o ideal federativo denota um verdadeiro compromisso
entre a uniformidade e a diversidade, entre a autonomia do ente federado e a unidade da
Federação. Diante disso, qualquer interpretação que conduza seja a uma autonomia absoluta
seja a uma uniformidade total e irrestrita importará violação do princípio federativo.
Se nem uma emenda constitucional pode abolir a forma federativa de Estado, por
muito maior razão, não poderão fazê-lo quaisquer normas infraconstitucionais, tais como as
leis complementares, leis ordinárias, portarias e resoluções, dentre outras normas infralegais.
Novamente invocamos as brilhantes lições de Roque Carrazza (2009, p.542), para
quem a União não pode estipular, nem mesmo por lei complementar, como os estados
exercitarão suas competências tributárias, aí compreendida a faculdade de conceder incentivos
fiscais, assunto sobre o qual eles próprios, dentro da autonomia que a Constituição lhes
conferiu, devem livremente deliberar.
Corolário do princípio do federalismo é o princípio da territorialidade dos estados-
membros, pautado na autonomia para administração de suas receitas e para legislar na medida
de suas competências.
A soberania é um conceito em constante evolução, intimamente vinculado à idéia
de Estado, com dois elementos essenciais, quais sejam a população e o território. Conforme
leciona Alberto Xavier (2004, p.13), a soberania, à luz de seu elemento pessoal, traduz-se no
poder do Estado legislar sobre as pessoas que a ele se sujeitam, sendo que à luz de seu
elemento territorial, externa o seu poder de legislar sobre pessoas, coisas ou fatos, que se
localizam em seu território.
Em um contexto geral, o princípio da territorialidade visa delimitar a soberania de
um estado e a eficácia de suas leis em relação a outros estados. (NAKAYAMA, 2006, p. 93).
Especificamente em matéria tributária, esse princípio é considerado critério de política
43
econômica, seja para garantir a neutralidade fiscal nos intercâmbios internacionais, seja na
busca da eqüidade horizontal entre estados distintos com poder de imposição.
Em síntese, pelo princípio da territorialidade, a lei tributária de um estado vigora
nos seus limites geográficos e tem o condão de vincular apenas os contribuintes aí situados.
44
fiscais contraria o princípio da neutralidade fiscal, posto que o ICMS, enquanto principal
fonte de receita tributária dos entes federativos no Brasil, não só pode como deve ser uma
espécie de mecanismo do planejamento econômico e da execução de políticas públicas.
Ruy Barbosa Nogueira (1971, p. 151) , ao contrário, desde a época do antigo ICM,
já criticava a utilização dos impostos sobre o consumo para fins extrafiscais, defendendo que
a intervenção do Estado no domínio econômico deveria ser realizada pela União, tendo o ICM
função eminentemente fiscal, no sentido de fornecer a receita necessária para os estados-
membros e municípios, razão pela qual não tinha o condão de servir de instrumento regulador
da economia.
André Elali (2007) traça importantes considerações sobre os sentidos que a
neutralidade da tributação pode assumir:
Na mesma esteira, Antônio Carlos dos Santos (2005, p. 356) vislumbra dois
sentidos para a neutralidade da tributação: (i) um primeiro sentido seria aquele associado a
ciência das finanças, segundo o qual os tributos não devem favorecer ou prejudicar grupos
específicos dentro da economia, evitando influenciar de forma negativa na concorrência e (ii)
um segundo sentido seria aquele diretamente inverso ao primeiro, em razão do qual a
tributação deve, sim, intervir para atenuar ou suprimir imperfeições, o que o autor conceituou
como neutralidade ativa.
As normas jurídicas que estabelecem incentivos fiscais são consideradas
instrumentos de intervenção econômica por indução, sendo que o Estado detentor do poder de
tributar e regular, emprega o tributo como instrumento de incentivo de determinadas condutas
dos contribuintes. (SHOUERI; BELLAN: ANDRADE JÚNIOR, 2008, p. 329-330). Mas é
necessário cuidar para que o comportamento negocial dos contribuintes não seja determinado
em razão da carga tributária por eles suportada, que de alguma forma implique vantagem
competitiva, e, sim, com base em elementos de ordem não fiscal, como, por exemplo,
qualidade e agilidade na entrega dos produtos.
45
O ICMS é o imposto de maior relevância econômica do sistema tributário e, por
ser de competência dos estados-membros, aguça a preocupação com a garantia da unidade do
território brasileiro e com a plena integração do mercado interno.
O princípio da neutralidade guarda íntima correlação com o princípio da não-
cumulatividade, sendo que este se presta a garantir a eficácia do primeiro, para que os tributos
sejam neutros e não firam as leis da livre concorrência e competitividade, que norteiam os
mercados.
Misabel Derzi (2004, p. 343-344) defende que um imposto é considerado ideal
para o mercado se: (i) for neutro no impacto de formação de preços; (ii) onerar o consumo e
não a produção ou comércio; (iii) oferecer maiores vantagens aos fiscos, na medida em que a
sistemática de um tributo plurifásico permite a antecipação do imposto que seria devido
somente no consumo, tornando responsáveis pela arrecadação todos os agentes participantes
do processo circulatório das mercadorias.
Destacamos, também, que a Emenda Constitucional n°. 42/2003 positivou o
princípio da neutralidade tributária, ao introduzir o art. 146-A, dispondo que lei complementar
poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios
da concorrência, sem prejuízo da competência da União para normas de igual objetivo.
Trata-se, portanto, de um poderoso instrumento para coibir a guerra fiscal, por
meio de lei complementar, até hoje, não utilizado pelos parlamentares. (SCAFF, 2005, p. 30).
De igual sorte, o objetivo de prevenção dos desequilíbrios da concorrência previstos no
aludido dispositivo constitucional também pode ser alcançado pelo governo mediante
políticas públicas, planejamento, metas, inclusive a concessão de incentivos fiscais.
Importa salientar que, apesar do art. 146-A ter positivado o princípio da
neutralidade tributária na Constituição, certo é que já havia outros dispositivos no Texto
Maior a vedar expressamente a tributação como meio inidôneo para diferenciação de agentes
econômicos no mercado. É o caso do art. 150, II da CF/88, que proíbe o tratamento desigual
para contribuintes em situação econômica equivalente. (PAULA, 2008, p. 23).
Diante disso, podemos afirmar que o princípio da neutralidade fiscal, cujo
objetivo é reduzir o impacto da tributação sobre a decisão dos agentes econômicos e sobre a
formação de preços, decorre essencialmente do princípio constitucional tributário da
igualdade, assim entendido como limitação genérica nas situações em que são estabelecidas
exonerações fiscais, conforme será mais bem depurado no quarto capítulo.
46
2.5 Tributação na origem
47
por escopo conferir tratamento equânime aos bens e serviços dentro dos estados ou dos
municípios, de modo que possam circular, sem barreiras fiscais, entre os entes políticos.
O Texto Maior não prescreveu de forma expressa a tributação do ICMS nem na
origem nem no destino. Na verdade, acabou criando um sistema misto ou híbrido, objetivando
distribuir a receita entre o estado produtor e o estado consumidor.
Nos termos do art. 155, § 2°, IV do da CF/1988, resolução do Senado Federal
estabelecerá as alíquotas aplicáveis às operações e prestações interestaduais e de exportação.
De acordo com o inciso VII do mesmo dispositivo constitucional, quanto às operações e
prestações que destinem bens e serviços a um consumidor final localizado em outro estado,
deverá ser adotada: a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do
imposto; b) a alíquota interna, quando o destinatário dele não for contribuinte. Por fim, o
inciso seguinte, VIII, reza que, na hipótese do destinatário ser contribuinte do imposto, numa
operação interestadual, caberá ao estado da localização do destinatário o imposto
correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual. Portanto, a tributação das
operações interestaduais será definida conforme o destinatário das mercadorias reúna, ou não,
as condições de contribuinte e/ou consumidor final.
Com as alíquotas interestaduais inferiores às alíquotas internas, o estado de
origem pode acumular crédito de ICMS nas operações interestaduais, pois os débitos
originados pelas saídas das mercadorias para outro estado, não raro, não são suficientes para
absorver a totalidade dos créditos das operações anteriores.
Verificamos que existe no modelo brasileiro de tributação das operações
interestaduais uma certa compensação de receitas entre estado produtor e consumidor, a
inteiro encargo do contribuinte. Todavia, é evidente que há um privilégio para os estados
produtores, que ficam com a maior parte da receita. Isto vem acentuar ainda mais as
desigualdades econômicas e regionais entre os estados, pois sabemos que os estados
produtores estão concentrados nas regiões Sul e Sudeste. Sendo assim, os estados
consumidores, em regra, pertencentes às regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste recebem
parte dos recursos decorrentes da tributação das operações interestaduais, mas não de forma
suficiente para se estabelecer justiça fiscal.
Parece elementar que o atual modelo brasileiro de tributação das operações
interestaduais agrava o cenário de guerra fiscal entre os estados. Obviamente que se a
arrecadação do ICMS fica vinculada à localização da atividade produtiva, já que a maior
48
parcela do imposto cabe ao estado de origem, os entes políticos atuarão com as armas que
tiverem e do jeito que puderem para atrair o investimento privado para os seus territórios.
Natália de Azevedo Morsch (2006, p. 143) defende que esse mecanismo, embora
preserve a autonomia dos entes federativos, enfraquece o federalismo, vez que privilegia os
estados produtores, tornando-se fator de agravamento dessas diferenças econômicas.
Já Heron Arzua (2005) argumenta que para tributar e cobrar o princípio pode e
deve ser o de origem, mas o produto da arrecadação não deve pertencer ao estado de origem,
mas, sim, ao estado de destino, pelo menos na sua quase integralidade. Tal sistemática faria
com que a arrecadação de cada estado guardasse coerente relação com a dimensão de seu
mercado consumidor, isto é, com o lugar onde o cidadão demanda serviços públicos e não
mais com o de sua produção.
Notamos que a própria Constituição Federal fomenta a desarmonia sistêmica,
posto que, ao mesmo tempo em que veda a concessão de incentivos fiscais unilaterais pelos
estados em desacordo com as regras insculpidas na Lei Complementar n°. 24/1975 (art. 155, §
2°, XII, g), distribui-lhes as armas para o confronto entre si, que tentam sobreviver ao cenário
de deflagrada e ardorosa guerra fiscal, ao adotar o modelo de tributação das operações
interestaduais; apesar da característica de regime misto (possibilitando o compartilhamento de
receitas com o estado de destino), privilegia a tributação no estado de origem.
São preocupantes as discrepâncias constatadas a partir do exame do desempenho
arrecadatório do ICMS nas regiões brasileiras são preocupantes, conforme mostra a Tabela 1
abaixo:
49
Brasil, devendo haver o progresso para um modelo mais justo, equalizado e, na medida do
possível, mais lógico do ponto de vista econômico.
50
3 O REGIME JURÍDICO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS
5
Art. 151. É vedado à União:
I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência
em relação a Estado, ao Distrito federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de
incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as
diferentes regiões do País. (Grifamos)
6 Art. 43. Para efeitos administrativos, a União poderá articular sua ação em um mesmo complexo
geoeconômico e social, visando a seu desenvolvimento e à redução das desigualdades regionais. (...)
§ 2º - Os incentivos regionais compreenderão, além de outros, na forma da lei:(...)
52
Feita esta brevíssima digressão histórica acerca das mudanças na ideologia sobre
renúncia de receitas no Brasil, cabe uma investigação sobre a forma como se opera a
extrafiscalidade no âmbito do ICMS, para posteriormente passarmos ao estudo do conceito de
benefícios fiscais e suas diferentes espécies.
III - isenções, reduções ou diferimento temporário de tributos federais devidos por pessoas físicas ou
jurídicas. (Grifamos)
53
reduzir a carga tributária incidente sobre certos comportamentos ou atividades, estimulando a
sua realização.
Na segunda hipótese o ente federado, por meio da concessão de anistia, remissão,
subsídio, crédito presumido, isenções, reduções de alíquota ou da base de cálculo, ou qualquer
outra modalidade de estímulo fiscal, proporciona, por exemplo, o desenvolvimento da
economia, a geração de empregos diretos e indiretos, a capacitação profissional, a compra de
produtos, etc., os quais, por si só, compensam eventuais decréscimos na arrecadação. O
conjunto desses instrumentos, que implicam redução do ônus tributário, recebe o nome
genérico de benefício fiscal.
Tais incentivos fiscais têm por objetivo fundamental a modificação do status do
sistema econômico, de modo a promover a regulação do mercado, por meio da
extrafiscalidade, sendo que em todo e qualquer mecanismo de intervenção no domínio
econômico devem ser consideradas as normas de direito tributário, econômico e financeiro
(ELALI, 2010, p. 70).
Nesse contexto, os estados brasileiros devem, sim, intervir na economia, para
corrigir as distorções na concorrência, visando à preservação da harmonia do sistema
econômico, em nome dos princípios da livre iniciativa e livre concorrência.
Mas não é só. A Constituição Federal estabeleceu diversos princípios de caráter
teleológico que legitimam a concessão pelos estados de benefícios fiscais: (i) a dignidade da
pessoa humana e os valores sociais do trabalho (art. 1º, III e IV); (ii) a construção de uma
sociedade justa e solidária, na erradicação da pobreza e da marginalização (art. 3º, I, III e IV);
(iii) direito social ao trabalho (art. 6º e art. 7º, caput, e XXXI); (iv) ordem social, busca do
pleno emprego, bem-estar (art. 170, caput e VIII e art. 193).
Também não podemos olvidar o § 7° do art. 165 da Carta Maior, que estabelece
que “os orçamentos fiscais e de investimentos, compatibilizados com o plano plurianual, terão
entre suas funções a de reduzir desigualdades inter-regionais, segundo critério populacional”.
Paulo Caliendo (2008, p. 118) encara com reservas a utilização da função
extrafiscal do direito tributário, a qual, em nome da preservação do princípio da neutralidade
tributária, deve ser residual, motivada e, se possível, temporária, visto que o tributo não pode
ser entendido como elemento fundamental de direção econômica, mas, tão-somente, meio de
regulação excepcional, limitado e justificado.
É por essa razão que não podem os entes políticos, a pretexto de cumprir valores
constitucionais, criar estímulos que venham a agredir a estrutura de legalidade e isonomia
54
estabelecida pelo Texto Maior, não se admitindo, sob qualquer hipótese, atos tendentes a
concessão de privilégios individuais e despropositados, que acentuem as desigualdades.
Na análise acerca da legitimidade de qualquer tipo de intervenção do estado no
domínio econômico, por meio da concessão de incentivos fiscais, é necessário antes investigar
se se está diante de uma situação criada para conceder algum privilégio excessivo ou
realmente há concretização de princípios constitucionais, com aferição de resultados efetivos
hábeis a fundamentar a sua validade.
Especificamente no que diz respeito ao ICMS, apesar de ser um imposto, cuja
função é primordialmente fiscal, pode ser utilizado pelos estados em sua função extrafiscal,
com vistas a alcançar o desenvolvimento econômico, reduzir desigualdades regionais e, mais,
promover justiça fiscal, desde que se observem as formas e os fundamentos constitucionais.
55
instituição do tributo, por meio de veículo legislativo específico, com o propósito de estimular
o surgimento de relações jurídicas de cunho econômico.
São basicamente três os principais objetivos que os entes políticos buscam
alcançar quando concedem incentivos: (i) um modelo de desenvolvimento nacional, visando
ao fortalecimento da economia; (ii) um modelo de desenvolvimento regional, com propósitos
de integração nacional e recuperação econômica regional e (iii) uma política de
desenvolvimento setorial, face às particularidades que justificam tratamentos especiais para
determinados setores da economia. (TRAMONTIN, 2008, p. 111).
Em regra, os entes políticos estabelecem situações desonerativas de exações
tributárias, mediante a concessão de benefícios fiscais, com o objetivo de estimular o
contribuinte à adotar determinados comportamentos, com vistas à realização dos mais
variados interesses públicos.
Nesta senda, Geraldo Ataliba e José Artur Lima Gonçalves (1991), acertadamente,
observam o seguinte:
Como bem pondera José Eduardo Soares de Melo (2007, p. 232), o regime de
concessão de incentivos fiscais não está adstrito à rigidez dos princípios tributários, havendo
discricionariedade na aplicação de tais estímulos, com a manutenção dos direitos dos
contribuintes.
O direito à utilização, fruição ou realização dos benefícios fiscais não pode ter
vinculação estrita com o regime jurídico de tributação, pois, nesse tipo de relação jurídica, o
contribuinte é credor ou sujeito ativo, enquanto o poder público qualifica-se como devedor ou
sujeito passivo. Portanto, resta evidente a inversão total daquela relação se comparada à
relação tributária, em que o poder público é sempre sujeito ativo, tendo o contribuinte sempre
no pólo passivo da obrigação.
56
3.4 Espécies de benefícios fiscais
57
3.4.1 Distinção entre incentivos fiscais e incentivos financeiros
7
Consulta n°. 0038/99. Relator: Conselheiro Marcelo Calliari. DOU 28.04.2000.
59
Com todo o respeito ao posicionamento do ilustrado doutrinador, o ponto é que a
distinção jurídico-formal entre incentivos fiscais e financeiros é essencialmente relevante para
o deslinde da problemática que gravita em torno das reações fazendárias à concessão
unilateral de estímulos de qualquer natureza pelos estados. Como demonstraremos no
próximo capítulo, a Lei Complementar n°. 24/1975, competente para regular a forma como,
mediante deliberação entre as unidades federativas, serão concedidos ou revogados isenções,
incentivos e benefícios fiscais, nos termos do art. 155, § 2°, XII, g da Constituição Federal,
não foi recepcionada pelo Texto Maior de 1988, no que tange aos incentivos financeiros, vez
que extrapolou a competência outorgada pelo legislador constituinte.
60
Quadro 1 – Regra Matriz de Incidência Tributária segundo Paulo de Barros Carvalho
61
Quadro 2 – Regra Matriz de Incidência Tributária segundo Sacha Calmon
Norma Tributária
Hipótese de Incidência Consequência Jurídica
a) Aspecto material: o fato em si a) A quem pagar (sujeito ativo)
b) Aspecto temporal: condições de tempo b) Quem deve pagar (sujeito passivo)
c) Aspecto espacial: condições de lugar c) Quanto pagar (base de cálculo, alíquotas, adições,
d) Aspecto pessoal: condições e qualificações subtrações, valor fixo)
relativas às pessoas envolvidas com o fato d) Como pagar
e) Quando pagar
f) Onde pagar
Fonte: COELHO, Sacha Calmon Navarro (2003).
O confronto dessas duas teorias tem proposital objetivo neste trabalho. Um dos
argumentos adotado pelos estados, e que vem sendo acatado pelo Poder Judiciário para
justificar a glosa de créditos de ICMS do contribuinte que adquire mercadorias incentivadas
em outro estado, é justamente a equiparação de todo e qualquer tipo exonerativo às hipóteses
de não-incidência ou isenção. Portanto, nessa linha subvertida de raciocínio, tais restrições ao
direito creditório dos contribuintes encontram fundamento de validade nas exceções ao
princípio da não-cumulatividade previstas no art. 155, § 2°, II, b da Constituição Federal.
Por isso, é valiosa a Teoria da Exoneração Tributária desenvolvida pelo mestre
Sacha Calmon, especialmente a técnica classificação dos tipos exonerativos, já que, como será
demonstrado, não se pode admitir a equiparação de uma isenção com exonerações internas
quantitativas, nem com as exonerações externas, posto que as isenções têm o condão de
anular somente os aspectos da hipótese de incidência e não os aspectos da sua conseqüência,
eis que se configura uma exoneração interna qualitativa.
62
Assim, temos a não-incidência, natural ou pura como preferem alguns, quando os
requisitos previstos na lei tributária não se verificarem concretamente, de modo a não surgir
obrigação tributária para o contribuinte. (BORGES, 2007, p. 183). Para exemplificar, temos
que a venda isolada de um computador de uma pessoa física a terceiro é hipótese de não-
incidência tributária do ICMS, que, para incidir, depende da ocorrência no mundo fenomênico
de uma operação de circulação de mercadorias, assim entendidas como bens móveis sujeitos à
mercancia e com habitualidade.
No tocante à imunidade, a doutrina não diverge quanto às seguintes características
essenciais do instituto: (i) é regra jurídica com sede constitucional; (ii) é regra de
incompetência tributária ou delimita a competência dos entes políticos da Federação, em
sentido negativo; (iii) obsta o exercício da atividade legislativa do ente estatal, negando
competência para a imposição tributária em relação a fatos especiais e determinados; (iv)
distingue-se da isenção, que se dá no plano infraconstitucional da lei ordinária ou
complementar. (BALEEIRO, 2000, p. 114).
São múltiplas as situações de imunidade espraiadas na Constituição, muitas das
vezes impropriamente denominadas de isenção ou não-incidência. Exemplos clássicos de
imunidade são encontrados no art. 150, VI do Texto Supremo, tais como a imunidade
recíproca, a imunidade sobre templos de qualquer culto ou a imunidade sobre os partidos
políticos.
Já no que se refere à definição da isenção, a doutrina da mais alta reputação é
completamente dissonante, sendo que tal figura tem sido objeto de inflamados debates.
Rubens Gomes de Sousa, citado por Paulo de Barros Carvalho (2005, p. 484),
defendia que a isenção é um favor legal, consubstanciado na dispensa do pagamento de
tributo devido, em que ocorre o fato jurídico ensejando o vínculo obrigacional para posterior
dispensa do débito tributário, por força da norma isentante.
José Souto Maior Borges (1996, p. 70) diverge dessa doutrina tradicional, que
trata a isenção como dispensa do pagamento de tributo devido, enfatizando que, se assim o
fosse, haveria sempre a incidência de norma tributária sobre o isento e a incidência da norma
isentante, surgindo a obrigação tributária, cuja conseqüência de lei seria a dispensa do
pagamento. Conclui o autor que as isenções são, na verdade, hipóteses de não-incidência,
legalmente qualificadas.
Partindo da classificação das normas jurídicas em normas de comportamento e
normas de estrutura, Paulo de Barros Carvalho (2005, p. 488-490) desenvolveu teoria,
63
inserindo as isenções nesse espectro, ponderando que a regra isencional investe contra um ou
mais critérios da norma-padrão de incidência, seja no seu antecedente seja no seu
conseqüente. Segundo o consagrado jurista, há uma mutilação parcial da norma jurídica de
incidência, por meio da anulação de um de seus critérios. A supressão dos critérios é parcial;
se fosse total significaria destruir a própria regra matriz, inutilizando-a, como norma válida no
sistema.
Exemplificando, a norma que estabelece isenção de IPI para os produtos
fabricados na Zona Franca de Manaus ataca o critério espacial do antecedente da regra matriz
de incidência tributária. Já a norma que estabelece isenção de Imposto de Renda para os
sujeitos, que aufiram renda inferior a determinado valor, ataca o critério pessoal, que, para o
citado professor, compõe o conseqüente da norma-padrão.
As conclusões de Paulo de Barros Carvalho seriam perfeitas não fosse o fato de
que, partindo de suas premissas, tivéssemos, necessariamente, que admitir a possibilidade da
mutilação do critério quantitativo do conseqüente da regra matriz de incidência tributária para
dar ensejo a uma isenção tributária. Se isto fosse possível, haveríamos mesmo de admitir que
os institutos da alíquota zero e isenção são equivalentes. Mas, muito ao contrário, as isenções
só podem atuar contra os aspectos da hipótese de incidência, jamais se voltarem contra os
aspectos do conseqüente normativo, que pressupõem já ter incidido a norma e já ter ensejado
o dever jurídico de pagamento de um tributo, podendo sofrer reduções no quantum debeatur,
mediante outras técnicas exonerativas, como, por exemplo, as reduções de base de cálculo e
alíquotas, isenções parciais e alíquotas zero, que serão examinadas logo mais.
É muito comum estender o conceito de isenção a toda e qualquer fórmula
exonerativa, praticando-se a denominada assimilação de figuras afins, como bem adverte o
professor Sacha Calmon (2010, p. 131), que defende ter cada figura o seu sentido próprio,
sendo as diversas espécies dotadas de status inconfundíveis e muito bem delineados. Para ele,
o fenômeno da incidência pode ser obstado em razão de normas, que determinam situações de
imunidade ou isenção:
Achamos que a norma de isenção não é. E se não é, não pode ser não
juridicizante. Não sendo, também não incide. As normas não derivam de
textos legais isoladamente tomadas, por isso que se projetam do contexto
jurídico. A norma é resultante de uma combinação de leis ou de artigos de
leis (existentes no sistema jurídico). As leis e artigos de leis (regras legais)
que definem fatos tributáveis se conjugam com as previsões imunizantes e
isencionais para compor uma única hipótese de incidência: a norma jurídica
de tributação. Assim, para que ocorra a incidência da norma de tributação, é
indispensável que os fatos jurígenos contidos na hipótese de incidência
64
ocorram no mundo. E esses fatos jurígenos são fixados após a exclusão de
todos aqueles considerados não tributáveis em virtude de previsões expressas
de imunidade e isenção. (COÊLHO, 2010, p. 137).
65
incidência da norma de tributação. As reduções são diminuições monetárias
no quantum da obrigação, via base de cálculo rebaixada ou alíquota
reduzida. (COÊLHO, 2010, p. 152).
Estão corretos ambos os autores supracitados, visto que não podemos admitir a
incidência parcial, fracionada ou mitigada da norma jurídico-tributária, razão pela qual não
podemos falar em isenção parcial.
O Supremo Tribunal Federal admite que a figura da isenção parcial se equipara à
redução da base de cálculo, porém equivocadamente coloca a isenção parcial na mesma vala
da isenção total, ao permitir o estorno de créditos de ICMS pelos estados, invocando, para
tanto, as hipóteses restritivas ao princípio da não-cumulatividade, comandadas pelo art. 155,
§2°, II, b da Constituição, determinando que o direito ao crédito do imposto deve ser
proporcional à base de cálculo reduzida, ignorando, assim, a tese ora defendida.
Passemos a conferir recente precedente nesse sentido:
8
Desde a decisão proferida nos autos do RE n°. 161.031 – MG, sob a relatoria do Ministro Marco Aurélio, em
Sessão Plenária de 24.03.1997, por anos, inúmeros outros julgados do STF estiveram balizados em tal
precedente, tendo admitido a distinção entre os institutos da redução da base de cálculo e isenção parcial,
declarando, assim, a inconstitucionalidade do efeito cumulativo da exigência do estorno de crédito de ICMS na
primeira hipótese. Esse posicionamento foi completamente reformulado pela Suprema Corte após decisão
proferida quanto ao RE n°. 174.478 – SP, sob a relatoria do Ministro Cezar Peluso, em 17.03.2005, que, desde
então, prevalece.
66
estamos diante de algum tipo de redução de base de cálculo ou redução de alíquota, é certo
que compactuar com tal equívoco importa conferir validade a um instituto que, simplesmente,
não está previsto no ordenamento jurídico pátrio.
68
Tabela 3 – Hipótese de Cadeia Produtiva com
Desoneração Intermediária de ICMS
Total a recolher 2 0 10 -
É óbvio que o ICMS total recolhido ao longo dessa cadeia, contemplado por uma
isenção intermediária, isto é, o montante de R$ 12,00, é bem superior ao ICMS total recolhido
numa situação em que não há nenhuma hipótese exonerativa no ciclo produtivo (no exemplo
anterior, R$ 10,00). Apesar da violação ao princípio da não-cumulatividade há, por outro
lado, permissivo constitucional expresso, validando essa exceção (art. 155, § 2º, II, a e b).
Sendo assim, qualquer medida tendente a estornar créditos decorrentes da
aquisição de mercadorias por contribuinte fere o princípio da não-cumulatividade, razão pela
qual, novamente, enfatizamos a regra de que tal medida somente é admitida nos casos de
operações isentas ou não-tributadas, por determinação clara do próprio Diploma Fundamental,
a que se deve emprestar interpretação estrita. Por isso, vale insistirmos na utilização da
melhor técnica jurídica para distinção dos tipos exonerativos9.
Resta evidente que o STF, ao equiparar os institutos da isenção parcial e redução
de base de cálculo, alargou o conceito de isenção tributária, contrariando, inclusive, a
sistemática de interpretação prevista no art. 111 do Código Tributário Nacional, que disciplina
uma interpretação literal da legislação tributária sobre outorga de isenções.
Na doutrina há corrente de escol que defende não ser a alíquota zero um tipo
exonerativo específico, tendo o mesmo sentido da isenção. É esse o entendimento de Paulo de
9
Tal distinção ficou evidente no trecho do voto vencido e proferido pelo Ministro Marco Aurélio, no julgamento
do RE n°... 174.478-2/SP, que representou um marco da mudança do posicionamento do STF sobre a matéria:
“O direito é ciência e, como tal, os institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprio. A sinonímia não
se faz presente. Uma coisa é isenção, outra, a não-incidência, e um terceiro gênero surge quando se cogita da
incidência com simples redução de base de cálculo”.
69
Barros Carvalho (2005, p. 483), de que determinada regra é dirigida ao critério quantitativo,
previsto no conseqüente da regra matriz de incidência tributária, de modo que, independente
do valor da base de cálculo, o resultado será necessariamente o desaparecimento do objeto da
prestação tributária.
Diversa é a acertada posição liderada por Sacha Calmon (2010), com a qual
compactuamos, principalmente porque se recusa a confundir as categorias jurídicas com os
seus efeitos econômicos:
10
Recurso Extraordinário n°. 350.466-1/PR.
70
E já finalizando o tópico, reafirmamos que tanto o instituto da alíquota zero, como
os institutos da isenção parcial, reduções de base de cálculo e alíquota, ou quaisquer outros
tipos liberatórios, examinados na seqüência, que juridicamente possam se diferenciar das
figuras da não-incidência e isenção total, não se enquadram nas hipóteses restritivas e
excepcionais ao princípio da não-cumulatividade.
11
Devemos enfatizar que não é este o posicionamento do Supremo Tribunal Federal que prestigia o comando do
art. 155, § 2°, XII, g, da CF/88, em detrimento de outro dispositivo de ordem constitucional, qual seja o art. 155,
§ 2°, II, a e b. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados: ADI 1587-DF, ADI 1999 – MC/SP, ADI 2353-
MC/ES.
71
contribuintes, severamente penalizados pelo total menosprezo, por parte dos entes políticos, a
esse grave problema do Sistema Tributário no Brasil.
Tais regimes permitem uma moralização sistêmica, na medida em que garantem o
direito à recuperação de créditos de ICMS ou estanca o seu acúmulo, de forma compensatória
e não incentivatória.
Não foi outra a conclusão a que chegou Ives Gandra Martins (1999), quando
apreciou caso de glosa de créditos de ICMS, em razão de unilateral invalidação de regime
especial de tributação, concedido pelo distrito federal erroneamente equiparado a incentivo
fiscal:
Hugo de Brito Machado e seu filho Hugo de Brito Machado Segundo (2005)
explicam precisamente o que se deve entender por regimes especiais de tributação:
72
ficção, em que a operação pode, inclusive, não ter sido tributada e o correspondente imposto
pago.
Outro exemplo seria a redução de alíquotas, como contrapartida da vedação ao
aproveitamento de créditos de operações anteriores, com o objetivo de minimizar os impactos
da complexidade da técnica de não-cumulatividade, permitindo que o contribuinte se exima
do dever de elaboração de conta gráfica do imposto, com demonstrativos detalhados dos
créditos utilizados, o que viria a facilitar a vida do próprio agente fiscalizador.
Para clarear a exposição, citamos, a título ilustrativo, o disposto no § 9° do art. 66
do Decreto n°. 43.080/2002 (RICMS) do Estado de Minas Gerais, que prevê o mencionado
regime especial de apuração do ICMS:
73
Concluindo, as normas que concedem regimes especiais de tributação representam
manifestações legítimas do Poder Executivo em oferecer opções de sistemáticas eletivas para
constituição do valor a ser recolhido, a título do imposto, o que não se pode equiparar a um
benefício de ordem fiscal, pois este necessariamente tem que representar redução de carga
tributária.
3.4.3.6 Diferimento
74
É comum o diferimento ser tratado como sinônimo ou fenômeno decorrente da
substituição tributária, a exemplo da hipótese do fato gerador do ICMS ser realizado pelo
remetente da mercadoria, mas a legislação atribuir a responsabilidade pelo pagamento do
imposto ao destinatário nas operações seguintes.
André Luiz Martins Freitas (2008, p. 7-8) adota posicionamento que parece o
mais acertado, posto defender que o diferimento não é figura ligada ao aspecto pessoal da
hipótese de incidência do ICMS, razão pela qual não guarda relação com a substituição
tributária. Tal instituto trata, sim, do prazo de pagamento do imposto, vinculando-se à
situação existente somente após a ocorrência do fato gerador.
José Eduardo Soares de Melo e Luiz Francisco Lippo (2004) definem o
diferimento da seguinte forma:
O fato é que a legislação dos estados sobre o diferimento realmente não deixa
clara a natureza jurídica do instituto. Observamos que, até mesmo no Estado de Minas Gerais,
com previsão específica do diferimento tanto na legislação estadual de regência do ICMS12,
como no respectivo regulamento aprovado pelo Decreto n°. 43.080/2002, tratando da isenção
12
Lei n°. 6.767/1975: Art. 9º - O Regulamento poderá dispor que o lançamento e o pagamento do imposto sejam
diferidos para operações ou prestações subseqüentes. Art. 10- O imposto será diferido: I - nas saídas de
produtos agropecuários e hortifrutigranjeiros, do estabelecimento do produtor rural para estabelecimento de
cooperativa de que faça parte, situado neste Estado; II - nas saídas de mercadorias de estabelecimento de
cooperativa de produtores para estabelecimento da própria cooperativa, de cooperativa central ou de federação
de cooperativas de que a cooperativa remetente faça parte, situadas no Estado de Minas Gerais; III - nas
operações com gado bovino, suíno, caprino, ovino, bufalino e eqüídeo, de cria ou recria, entre produtores rurais,
cadastrados no Estado, na forma que dispuser o Regulamento; Parágrafo único - O imposto devido pelas saídas
mencionadas nos s será recolhido pelo destinatário quando das saídas subseqüentes da mercadoria, esteja esta
sujeita ou não ao pagamento do tributo. Decreto n°. 43.080/1975: Art. 7º - Ocorre o diferimento quando o
lançamento e o recolhimento do imposto incidente na operação com determinada mercadoria ou sobre a
prestação de serviço forem transferidos para operação ou prestação posterior. (...) Art. 11 - O diferimento não
exclui a responsabilidade do alienante ou do remetente da mercadoria ou do prestador do serviço, quando o
adquirente ou o destinatário descumprirem, total ou parcialmente, a obrigação. (...) Art. 13 - O recolhimento do
imposto diferido será feito pelo contribuinte que promover a operação ou a prestação que encerrar a fase do
diferimento, ainda que não tributadas. Art. 14 - Ressalvado o disposto no artigo seguinte, o adquirente ou o
destinatário da mercadoria ou do serviço não se debitarão em separado pelo imposto diferido na operação ou
prestação anteriores, sendo-lhes vedado abater o respectivo valor como crédito. (Grifamos)
75
e substituição tributária de forma separada, ainda não evidencia que o alcance do instituto
estaria relacionado somente à dilação do prazo de pagamento do imposto.
Apesar da legislação mineira ser clara no sentido de identificar o diferimento no
lançamento e pagamento do imposto, ao mesmo tempo atribui a responsabilidade pelo efetivo
recolhimento do ICMS ao adquirente ou destinatário da mercadoria, e não ao contribuinte de
fato que realizou o fato gerador. Trata-se de nítida hipótese de substituição tributária para trás
ou regressiva, em que o fato gerador realiza-se em etapa anterior, pelo substituído, e o
recolhimento do tributo em etapa subseqüente, pelo substituto tributário que efetivamente
paga tributo alheio.
A substituição tributária para trás é um instrumento muito utilizado pelos fiscos,
principalmente nas operações de produtores rurais, em que há reconhecida dificuldade de
fiscalização, razão pela qual difere-se para a etapa posterior, ou melhor, atribui-se a
responsabilidade pelo recolhimento do tributo ao adquirente ou destinatário.
O diferimento utilizado em seu conceito juridicamente correto e com o necessário
rigor técnico, isto é, quando mero alongamento do prazo para pagamento do imposto, em que
o recolhimento se dá por aquele que realiza o fato gerador, apesar de ser uma vantagem fiscal,
não pode configurar uma espécie de benefício fiscal, não se constituindo tipo exonerativo, vez
que não há redução de carga tributária. Nessa hipótese, sequer se trata de norma de
cumprimento obrigatório pelo contribuinte.
E assim sendo, o diferimento pode, inclusive, ser disciplinado por normas infra-
legais, sem que disto decorra qualquer vício formal, já que prazo de pagamento de tributos
não está previsto no art. 97 do CTN, que dispõe sobre as matérias a serem tratadas em lei,
nem no rol do art. 146, III da CF/88 que versa sobre as matérias reservadas a lei
complementar.
76
ignorância excursáveis do sujeito passivo, quanto à matéria de fato; (iii) à diminuta
importância do crédito tributário; (iv) a considerações de eqüidade, em relação às
características pessoais ou materiais do caso; (v) a condições peculiares a determinada região
do território da entidade tributante.
Já a anistia consiste no perdão de penalidade pecuniária, tratando-se de causa
excludente do crédito tributário, à luz do art. 180 do CTN, podendo ser concedida em caráter
geral ou limitadamente.
Incorreu em erro de técnica o legislador do CTN ao tratar a anistia como hipótese
excludente do crédito tributário, devendo, sim, ser uma causa extintiva do crédito tributário,
tal qual a remissão. Na verdade, não há exclusão de crédito algum, mas, sim, a remissão ou
perdão das multas, que, nos termos do art. 113 do CTN, também integra a obrigação principal.
(COÊLHO, 2004, p. 867-868).
Vale ressaltar que ambos os institutos em exame não obstam o nascimento da
obrigação de o sujeito passivo pagar o tributo, mas, tão-somente, o desobrigam, liberando-o
após a obrigação já ter surgido.
77
Entendemos ser questionável o nivelamento dos conceitos de subvenções e
incentivos fiscais, pois as primeiras se constituem em benefícios de natureza exclusivamente
financeira, não abarcadas pelo universo dos segundos. Por outro lado, as subvenções podem,
sim, configurarem-se como uma das modalidades de subsídios e, segundo Ricardo Lobo
Torres (1995, p. 296), ser incluídos no conceito mais abrangente de subvenção.
Examinados os conceitos e critérios distintivos dos benefícios fiscais, por meio da
delimitação das características e especificidades mais acentuadas de seus tipos, passaremos,
agora, ao estudo dos requisitos e limites para a sua concessão.
78
4 LIMITES PARA A CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS FISCAIS
Como argumento para exigir estorno de créditos de ICMS dos contribuintes que
compram mercadorias de fornecedores contemplados com incentivos fiscais em outras
unidades federadas, os estados valem-se do descumprimento, por parte daqueles entes, de
requisitos de ordem legal e constitucional para a concessão dos privilégios.
Nesse contexto, o poder concedente deve observar não só os limites genéricos
tratados na seqüência, sem prejuízos de outros não menos importantes (como os já destacados
no capítulo segundo: federalismo, neutralidade, territorialidade, etc.), como, também, os
limites especificamente aplicáveis aos atos que importem renúncia fiscal, no âmbito do ICMS.
Os requisitos devem ser cumpridos de forma cumulativa, não se admitindo a
observância de limites genéricos e o desrespeito a limites específicos e vice-versa. Noutras
palavras, se um estado pretende legítima a concessão de determinado benefício fiscal, de nada
adiantará instituí-lo por meio de lei ordinária estadual, sem submetê-lo à aprovação do
Confaz.
Para sabermos se merecem consideração os argumentos contrários a essas
medidas de retaliação, em circunstâncias de deflagrada guerra fiscal, isto é, para aferir se há
plausibilidade lógico-jurídica na tese que inadmite esse tipo de reação estatal, é necessário,
primeiramente, investigar os fundamentos e justificativas dos estados para a utilização dessa
arma tão poderosa e perversa contra os contribuintes: a glosa de créditos de ICMS.
13
É este o atual posicionamento do STF. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados: Rext 77.394, DJ
13.12.74, ADI 3462 MC / PA, DJ 21.10.2005 e ADI 1.247-MC, DJ 08.09.95.
81
E se o Confaz é o órgão responsável pela deliberação sobre a forma do exercício
da competência do ICMS, na medida em que a lei interna desonerativa editada por um estado
só terá validade se aprovada, à unanimidade dos demais entes, no âmbito daquele órgão
colegiado, isto faz surgir a seguinte questão: não seria o próprio Confaz o agente competente
para a concessão desses incentivos?
Tácio Lacerda Gama (2009, p. 280) responde afirmando, categoricamente, que
essa competência é, sim, do Confaz. Sob a sua ótica, os estados são detentores de uma espécie
de competência condicional, vez que, na ausência de autorização do Confaz, enquanto órgão
competente, os entes federados não poderão exercer seu poder liberatório, tendo de exigir o
tributo de forma obrigatória. Contudo, admitir tal tese significaria concordar que a
competência legislativa constitucionalmente atribuída aos estados poderia ser limitada por um
convênio.
Celebrando os ensinamentos de Roque Carrazza (2003, p. 451), lembramos que a
competência tributária é dotada dos seguintes atributos: privatividade, indelegabilidade,
inalterabilidade, irrenunciabilidade, incaducabilidade e facultatividade de exercício.
Por isso, preferimos dizer que a competência tributária, especialmente no que
concerne à concessão de qualquer tipo de benefício fiscal em matéria de ICMS, é privativa
dos estados, sendo inalterável e, conseqüentemente, proibido o seu exercício por quem não
tenha sido consagrado com esse direito. Todavia, é uma competência sem eficácia plena e
imediata, já que depende de um convênio interestadual para o seu exercício, razão por que
cremos não haver, nesse caso, transferência de competência tributária; apesar de relativizada,
a titularidade continua exclusiva dos legisladores ordinários estaduais.
Noutro giro verbal, qualquer pensamento contrário a esse elucidado importaria
aceite da inadmissível assertiva de que convênios interestaduais podem criar ou majorar
tributos, pois constitui premissa inarredável e já ultrapassada a de que o detentor de
competência para criar tributos também a tem para conceder exonerações tributárias.
Admitirmos que o Confaz é órgão legitimado para a concessão de benefícios fiscais significa
alargar as inflexíveis fronteiras constitucionais, que limitam o campo de incidência do ICMS.
Se é certo que a Constituição Federal determinou aos estados e distritos federal
firmarem convênios entre si para a concessão de benefícios fiscais, visando coibir a guerra
fiscal, mais certo ainda é o fato de que tais convênios não são suficientes para dar força às
deliberações dos entes políticos competentes, tanto é assim que esses convênios precisam ser
devidamente ratificados por meio de decretos legislativos.
82
Quanto ao segundo requisito, ou limite genérico a ser observado, destacamos que
somente o titular da competência para a instituição de um tributo, na forma prescrita pela
Constituição Federal, está autorizado a conceder benefícios fiscais. Portanto, no caso do
ICMS, apenas os estados e o distrito federal podem dispor sobre incentivos.
Invocando a clássica lição de José Souto Maior Borges (2007, p. 30), afirmamos
que no poder de tributar se insere o poder de eximir, como verso e reverso de uma mesma
medalha, sendo certo que o poder de isentar é próprio do poder de tributar. É claro que, se os
estados-membros detêm competência tributária para editar normas sobre a criação de tributos,
também a têm para editar normas de exoneração tributária.
Assim, a autonomia financeira, constitucionalmente garantida, possibilita aos
entes federativos a discricionariedade, no tocante ao uso e destinação dos recursos públicos,
desde que amparada por comandos de lei, de modo que, como quem pode o mais pode o
menos, é inteiramente possível que haja disposição dos valores em prol da sociedade por
intermédio de incentivos fiscais. (MARTINS; MARONE, 2006, p. 50).
Mas havemos de ter em mira que tais entes não são dotados de autonomia
absoluta nem competência ilimitada, relativamente aos atos praticados em seus territórios; ao
contrário, essa autonomia relativa e competência limitada devem ser entendidas como
instrumento de preservação dos ideais de uniformidade e unidade federativa. (ÁVILA, 2006,
p. 102). Ainda mais que, como é sabido, o ICMS é um tributo estadual de forte vocação
nacional.
83
isso, devendo impor aos agentes de um mesmo ciclo produtivo uma só regra de
comportamento. E se esse ciclo também é comandado pelo primado da não-cumulatividade, é
inadmissível que algumas pessoas se beneficiem mais que outras. Logo, a lei não pode
estabelecer que a não-cumulatividade seja inaplicável em determinada etapa desse ciclo, a
menos que haja ressalva no texto constitucional (como é o caso das hipóteses de isenção e
não-incidência), isto para que se mantenha o poder aquisitivo do último elo desta cadeia: o
consumidor final.
É cediço que os tributos tenham em algumas hipóteses expressamente tratadas na
Constituição, função extrafiscal, isto é, além da arrecadação, o legislador pode se utilizar do
aumento ou da diminuição do tributo para, por exemplo, intervir na economia ou no mercado.
E isto encontra fundamento na própria concepção formal de igualdade, que também impõe
tratamento desigual em determinadas circunstâncias.
Todavia, por se tratar de exceção, e levando-se em conta o primado da igualdade,
as técnicas tributárias praticadas para implementar a extrafiscalidade somente são utilizadas
pelo legislador infraconstitucional nos exatos termos da Constituição. Para ilustrar, cite-se o
critério de distinção de alíquotas do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores -
IPVA, expressamente previsto no art. 155, § 6°, II da CF/88, que estabelece a possibilidade do
IPVA ter alíquotas diferenciadas, em função do tipo e da utilização do veículo; no caso do
Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana - IPTU, com base no art. 156, § 1°, II da
CF/88, as alíquotas poderão ser diferenciadas de acordo com a localização e uso do imóvel14.
Pelo princípio da isonomia, há proibição de desigualar arbitrariamente os
contribuintes. Na concretização dessa exigência é necessário investigar se a distinção legal era
permitida e se a lei tratou desigualmente quando isso era obrigatório. É inconstitucional a
desigualdade arbitrária, isto é, sem fundamento expresso na Constituição. Todas as exceções
para distinção nos critérios de tributação devem estar expressamente previstas na Constituição
Federal. (ÁVILA, 2010, p. 355).
Como desdobramento dessa limitação ao poder de tributar, temos que a outorga
de tratamento mais favorável deverá beneficiar o conjunto de contribuintes que atendam aos
requisitos eleitos pelo legislador para a sua concessão. Além disso, impõe-se que os critérios
de distinção fixados pela lei tenham correlação com a finalidade a ser atingir, que, por sua
vez, deve corresponder a um valor perseguido pela ordem jurídica.
14
Vide todas as hipóteses em que a CF/88 previu critérios de diferenciação de alíquotas: IPI (Art. 153, § 3°, I),
ICMS (Art. 155, § 2°, III), Contribuição Social (195, § 9°), Cide Combustível (Art. 177, § 4°, I, a), IVA (Art.
155, § 6°, II), IPTU (Art. 156, § 1°, II e Art. 156, I, a e b), IR (Art. 1536, § 2°, I) e ITR (Art. 153, § 4°, I).
84
A análise de um caso concreto é válida para testar as premissas aqui definidas. O
Decreto n°. 23.994 de 29.12.2003, que regulamenta a Lei de n°. 2.826 de 29.09.2003 do
Estado do Amazonas, em seu art. 20, II, estabelece isenção do ICMS sobre “as operações de
entradas que destinem máquinas ou equipamento ao ativo permanente de estabelecimento
industrial para utilização direta e exclusiva no seu processo produtivo, de procedência
nacional ou estrangeira, bem como suas partes e peças”.
Para fruição desse benefício o contribuinte deverá cumprir uma série de
requisitos, dentre eles: (i) não dar saída ao bem do estabelecimento por um período mínimo de
cinco anos; (ii) implantar projeto técnico, de viabilidade econômica; (iii) manter programas de
benefícios sociais para os seus empregados, especialmente nas áreas de alimentação, saúde,
lazer, educação, transporte e creche a preços subsidiados; (iv) manter programas de qualidade,
meio ambiente e de segurança e saúde ocupacional; (v) utilizar, em condições semelhantes de
competitividade, infra-estrutura local de serviços, dentre outros.
Verificamos que o caráter extrafiscal do benefício em questão tem o propósito de
atingir finalidades econômicas e sociais, previstas nas constituições federal e estadual, que
justifiquem as medidas de diferenciação entre contribuintes adotadas pelo legislador do
Estado do Amazonas, no caso, a concessão de isenção somente para as indústrias e,
exclusivamente, quanto a aquisições destinadas ao ativo permanente do estabelecimento.
Além disso, o art. 2° desse decreto preconiza a obediência dos incentivos fiscais aos
princípios da reciprocidade, transitoriedade, regressividade e gradualidade.
Desse modo, concluímos que a norma em tela: (i) trata igualmente contribuintes
que se encontrem na mesma situação, posto que todas as indústrias que se enquadrarem nos
requisitos da lei terão direito à fruição do benefício; (ii) não viola o tratamento diferenciado
de nenhum direito fundamental, muito pelo contrário, tem justamente o propósito de viabilizar
a concretização de valores constitucionais, na medida em que, fomentando a estruturação do
parque industrial do Estado do Amazonas, promove o desenvolvimento da economia regional
e geração de empregos e (iii) além de ter fundamento constitucional, é impessoal e objetivo o
critério de diferenciação.
Agora, se por hipótese, determinado sujeito desse estrato de contribuintes não for
habilitado pelo Estado do Amazonas à fruição do favor legis, mesmo cumprindo todos os
requisitos, aí, sim, haverá séria transgressão ao princípio da isonomia que, como visto, é
dotado de elevada significação para a preservação da democracia no país.
85
4.2 Limites específicos para a concessão de benefícios fiscais relativos ao ICMS
86
Nesse contexto, o legislador maior considerou relevante a participação do Senado,
não só na definição das alíquotas interestaduais, como, também, na determinação das
alíquotas mínimas para as operações internas, admitindo-se que os estados atuem na fixação
de suas alíquotas internas, não inferiores às alíquotas interestaduais. (CALCIOLARI, 2006, p.
20).
Vale salientar que a competência federal para definição das alíquotas
interestaduais do ICMS está demarcada no art. 155, § 2º, IV e V da CF/88, de modo que a
matéria só pode ser disciplinada em resolução do Senado Federal, naquelas hipóteses
específicas. Desta feita, fora delas, como já assentou o Supremo Tribunal Federal 15, a
competência legislativa estadual é ampla, não sendo passível de vinculação a qualquer ato
externo de natureza legislativa ou normativa.
Portanto, em matéria de incentivos fiscais, o estado competente para a sua
concessão haverá de observar necessariamente dois limites: (i) as alíquotas aplicáveis às
operações interestaduais são aquelas fixadas por resolução do Senado Federal; (ii) as alíquotas
aplicáveis às operações internas fixadas pelos estados e distrito federal não poderão ser
inferiores às previstas para as operações interestaduais, salvo deliberação de todas as unidades
federativas em sentido contrário, conforme será visto nos tópicos subseqüentes.
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(...)
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de
serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação,
ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.
(...)
§ 2.º O imposto previsto no II atenderá ao seguinte:
(...)
XII - cabe à lei complementar:
(...)
15
ADI nº 1601-6 – União Federal, Relatora Min. Ellen Gracie, DJ 19.12.2001 e ADI 3936 MC/Paraná, Relator
Min. Gilmar Mendes, DJ 09.11.2007.
87
g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito
Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e
revogados. (Grifamos)
16
Vide Anexo 2.
88
Na mesma esteira, porém de forma mais moderada, Ives Gandra Martins (2005, p.
136) entende que a lei complementar abrange os dois tipos de incentivos, os fiscais e os
financeiros, sendo que a Constituição cuida exclusivamente de incentivos fiscais, no que diz
respeito à possível regulação por lei complementar, razão pela qual a Magna Carta não teria
recepcionado a LC n°. 24/75, especificamente no que diz respeito aos incentivos financeiros.
Todavia, o autor acredita que, quanto aos incentivos fiscais, não haveria dúvidas sobre a sua
recepção.
O STF reconhece que a lei em comento foi recepcionada pela atual Constituição,
porém ainda não enfrentou a questão referente aos incentivos financeiros, especificamente
não recepcionados, o que abre espaço para o amadurecimento doutrinário e jurisprudencial do
tema. É o que verificamos em trecho do voto do Ministro Marco Aurélio, relator em
julgamento da ADI n°. 902 MC/SP17, publicado no Diário de Justiça aos 22.04.1994, abaixo
reproduzido:
Por essa razão, cremos que, para a concessão de subsídios que não importem
renúncia fiscal, dentre eles os incentivos de ordem financeira, os estados não devem
observância às regras da LC n°. 24/75. Seria, por exemplo, o caso do Espírito Santo, que criou
o Fundo de Desenvolvimento das Atividades Portuárias – Fundap, por meio da Lei nº. 2.508
de 22.05.1970, regulamentada pelo Decreto nº. 163-N de 15.07.1971 e alterações posteriores.
Trata-se de fundo gerenciado pelo Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo
S/A – Bandes, destinado à concessão de financiamento para apoio a empresas, com sede no
território capixaba, que realizem operações de comércio exterior tributadas pelo ICMS do
estado.
O financiamento pode ser liquidado no prazo de até 20 anos com juros de 1% ao
ano, sem correção monetária, sendo o valor liberado correspondente, no mínimo, a 7,2% e, no
17
No mesmo sentido, ADI n°. 1.247; ADI nº 2.376-4; ADI nº 2.224-5.
89
máximo, a 9% do valor da saída das mercadorias do estabelecimento cadastrado. A
contrapartida para o beneficiário é a aplicação de percentual não inferior a 7% do valor
financiado em investimentos no estado18.
O ICMS relativo às operações de importação e exportação, devido no momento
do desembaraço aduaneiro, se realizadas em razão do Fundap, é postergado para o momento
em que ocorrerem as respectivas saídas das mercadorias.
Para ilustrarmos a operação, imaginemos o seguinte: 1°) empresa X, uma trading
sediada no Estado do Espírito Santo, importa eletroeletrônicos da China, efetuando o
desembaraço aduaneiro das mercadorias no porto de Vitória; 2°) empresa X realiza venda para
a empresa Y, recolhendo o ICMS no momento da saída das mercadorias importadas de seu
estabelecimento; 3°) empresa Y utiliza-se do ICMS destacado na nota fiscal de aquisição das
mercadorias importadas, como crédito de operações anteriores; 4°) empresa X, mediante
comprovação do recolhimento do ICMS, bem como cumprimento dos requisitos legais para
obtenção do incentivo Fundap, dirige-se ao Bandes para obter financiamento correspondente à
parte do valor recolhido a título de ICMS.
Verificamos, pois, que o contribuinte somente terá acesso ao financiamento após a
quitação integral do tributo. O benefício não está relacionado a nenhuma hipótese de renúncia
fiscal típica, sendo verdadeiro incentivo financeiro, administrado ao lado do orçamento
referente às despesas públicas. Não se trata sequer de devolução de tributo ou mesmo doação
por parte do estado capixaba, pois a empresa deverá pagar o governo estadual nos prazos e
condições previamente fixados.
Por essa razão, a aplicação desse benefício pelo Estado do Espírito Santo não
pode ser obstada sob o argumento de que tal ente político estaria concedendo favor legal em
desacordo com as regras constitucionais, uma vez que, como visto a LC n°. 24/75 não foi
recepcionada pela Constituição de 1988, no que tange aos incentivos financeiros.
91
dos convênios no Diário Oficial da União, caso o Poder Executivo de cada unidade da
Federação deixe de publicar decreto ratificando, ou não, os convênios celebrados. Isto porque,
um convênio só pode ter validade se ratificado pelo legislativo estadual, razão pela qual a
fórmula em comento é manifestamente inconstitucional. Assim, devemos deixar claro que o
processo de um convênio começa nas assembléias de estados federados, mas termina nas
casas legislativas, onde recebem ratificação e conteúdo de lei, aí, sim, em conteúdo formal e
material. (COÊLHO, 2007, p. 348-351).
A exigência de convênios devidamente ratificados pelos estados para fins de
concessão de benefícios fiscais já tinha ganhado status constitucional desde a Carta Magna de
1967 (art. 23, § 6°).
De acordo com José Souto Maior Borges (1996, p. 173), a submissão das
exonerações fiscais ao convênio é praticamente a única alternativa, para afastar as
dificuldades de harmonização das políticas tributárias estaduais relativas ao ICMS, não
conflitando com a reserva de lei tributária material na concessão dessas exonerações. Para o
autor, considerando que a lei é ato unilateral do estado-membro, este não pode diretamente
fazê-lo, pois a concessão de exonerações fiscais é um ato plurilateral.
Tércio Sampaio Ferraz Júnior (1998) destaca, com muita propriedade e clareza, as
razões por que o legislador constitucional estabeleceu a necessidade de deliberação colegiada,
em matéria de concessão de benefícios fiscais:
Afinal, por ser o ICMS um imposto instituído por lei estadual, cuja receita se
reparte entre Estados e Município, mas que, pela própria natureza da
circulação de mercadorias, repercute a economia das demais unidades
estaduais da Federação, há um risco permanente de que, na disciplina de
benefícios fiscais, uma unidade possa prejudicar outra unidade federativa.
Para evitar prejuízos deste gênero, a Constituição Federal exigiu que a
concessão de tais benefícios ficasse na dependência de deliberação, exigindo
a Lei Complementar a realização de convênios entre Estados e Distrito
Federal. (FERRAZ JUNIOR, 1998, p. 278).
92
revogando benefícios fiscais do ICMS, desde que houvesse concordância da unanimidade dos
estados nesse sentido.
De acordo com Hironobu Sano (2008, p. 77), a criação de um órgão colegiado na
área tributária surgiu a partir do acirramento da guerra fiscal entre os estados brasileiros, ainda
na década de 1960, com a cobrança do então ICM, tendo por principal objetivo a busca pela
harmonização tributária na sua cobrança, que desde aquela oportunidade era utilizado como
instrumento de atração de empresas.
Percebemos na atualidade uma tendência dominante na concessão de benefícios
fiscais pelos estados à completa revelia do Confaz, principalmente em função das sanções
previstas no parágrafo único do art. 8º da Lei Complementar nº. 24/1975 serem incompatíveis
com a Lei de Responsabilidade Fiscal, o que corrobora na manutenção da situação de conflito
entre os estados. (CALCIOLARI, 2006, p. 22).
O fato é que o Confaz não conseguiu conter o acirramento da competição
interestadual, em que pese ter sido este o propósito da sua criação. Não se verificou, na
prática, a geração de ações coordenadas, seja pela ausência do governo federal, seja pela
absoluta e revelada incapacidade dos governadores e secretários de fazenda em negociar e
harmonizar suas propostas. Verifica-se no seu seio apenas a celebração de convênios
específicos, direcionados para determinado setor ou produto, sem que, no entanto, se envide
qualquer esforço para resolver a questão do conflito federativo. (SANO, 2008, p. 85).
Está fora de dúvidas que a aprovação unânime, no âmbito do Confaz, por todos os
entes federativos quanto à concessão de incentivos fiscais (e não financeiros), é requisito
essencial para legitimar o exercício da competência tributária exonerativa pelos estados e
distrito federal. Porém, tal sistemática há muito tem se mostrado ineficaz no combate à guerra
fiscal, restando evidente para toda a nação a indiscutível impotência desse órgão colegiado no
estabelecimento de políticas tributárias eficientes e capazes de garantir harmonia e cooperação
no pacto federativo.
Os estados ignoram o Confaz, concedendo favores de toda a sorte com vista a
atrair investimentos para seus territórios. O legislativo federal ignora ser premente a
necessidade de se emplacarem reformas estruturais no subsistema tributário do ICMS.
Enquanto prevalecer a opção pela ignorância, alastram-se e intensificam-se os conflitos.
Salve-se quem puder! Em terra de cego, quem tem um olho é rei!
93
4.3 As limitações impostas por normas orçamentárias
94
Tributário e Financeiro, instituídas por cada uma dessas pessoas políticas, dentro dos limites
de suas respectivas competências.
Assim, estará caracterizada como responsável a gestão fiscal do ente político que
instituir tributos de sua competência, promover a sua respectiva previsão orçamentária, com
base em estudos técnicos especializados, e tornar efetiva a arrecadação, por meio do
aparelhamento estatal eficiente para garantir a realização da receita tributária, quer pela
fiscalização, quer pela cobrança administrativa ou judicial.
Conforme adverte Marcos Nóbrega (2010), o objetivo da LRF não foi obstar por
completo a prática da guerra fiscal ou a concessão de benefícios que impactam no déficit do
orçamento público, mas sim “dotar o mecanismo de concessão de racionalidade, planejamento
e, sobretudo, transparência”.
Quando o tema é renúncia de receitas, estabeleceu o legislador complementar, em
seu art. 14:
95
I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na
estimativa de receita da lei orçamentária na forma do art. 12, e de que não
afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de
diretrizes orçamentárias;
II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado
pelo caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de
alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo o
contribuição.
96
14, a saber: (i) estar acompanhada de estimativa de impacto orçamentário-financeiro no
exercício em que deva iniciar a sua vigência e nos dois seguintes; (ii) atender às disposições
da lei de diretrizes orçamentárias e (iii) atender alternativamente uma das seguintes
condições: a) demonstrar que a renúncia foi devidamente considerada na estimativa de receita
da lei orçamentária e que, por conseguinte, não afetará as metas de resultados fiscais previstas
no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias ou b) a renúncia deve estar acompanhada
das correspondentes medidas de compensação a serem efetivadas no triênio, contado a partir
do início de sua vigência, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de
alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
Cumpre registrar um argumento muito utilizado pelos entes políticos, em defesa
da inaplicabilidade da Lei de Responsabilidade Fiscal na concessão de determinados
benefícios fiscais, no sentido de não haver renúncia de receita, tornando-se desnecessária a
exigência de estimativa de impacto orçamentário-financeiro. Segundo essa linha de
pensamento, o benefício fiscal concedido não é uma renúncia de receita efetiva, mas, sim,
uma renúncia de receita futura, vez que as concessões visam empresas que vierem a se
instalar ou para ampliar a produção das já instaladas, de modo que não se está a renunciar
receita existente, mas uma receita hipotética, que de fato não existiria caso não tivesse havido
a redução fiscal implementada. (SCAFF, 2005, p. 30).
Concluímos não ser vedada a concessão de benefício fiscal pelas pessoas políticas
de direito constitucional interno, o que, aliás, não seria admissível face aos princípios da
Federação e da autonomia municipal. A Lei de Responsabilidade Fiscal apenas disciplina a
sua concessão, estabelecendo requisitos para que a eventual renúncia de receita não
comprometa o alcance das metas orçamentárias. Com isso, objetiva-se que os entes políticos
administrem as suas finanças de forma mais planejada, controlando com mais rigor suas
despesas e receitas, evitando a redução indiscriminada de arrecadação, sem contrapartida no
orçamento.
97
5 GUERRA FISCAL: causas e efeitos
19
Enquanto brigam os estados e municípios para ver com quem ficará a fatia deste bolo, por ora, vem ganhando
o contribuinte, já que conforme consagrado pelo STJ, os serviços de provimento de acesso a Internet são
hipóteses de não-incidência tributária, posto que, não se enquadrando no conceito constitucional de
comunicação, não podem se sujeitar ao ICMS e, da mesma forma, não estando previstos na lista anexa à Lei
Complementar n°. 116/2003, não podem se sujeitar ao ISS (Recurso Especial n°. 1183611/PR, Min. Eliana
Calmon, DJ 22.06.2010; Recurso Especial n°. 719635/RS, Min. Mauro Campbell Marques, DJ 07.04.2009;
Súmula n°. 334, DJ 14.02.2007).
99
Fernando Ayres (2010), em excelente apresentação em seminário sobre o tema da
guerra fiscal, expôs graficamente o histórico do processo de intensificação dos conflitos
interestaduais da seguinte forma:
2010
Plano Collor I e II Aumento de investimento
Retomada estrangeiro Concessão de
Impacto recessivo incentivos
1994 Grandes montadoras
1990/1993
Plano Real (1995 - 2000)
100
autoritário, de pouco diálogo, mas apoio mútuo entre governos nacional e estaduais. Tal
reforma foi tão expressiva e relevante que as bases estruturais por ela desenvolvidas e
alicerçadas vigoram até hoje.
O marco inicial desse período foi a Emenda Constitucional n°. 18/1965, que criou
o ICM, em substituição ao então IVC, e implementou a sistemática da não-cumulatividade.
Referida emenda foi, no ano seguinte, seguida da instituição do Código Tributário Nacional,
que, a partir da edição da Lei n°. 5.172/1966, já previa, em seu art. 213, a necessidade de
celebração de convênios entre estados pertencentes a uma mesma região geoeconômica para o
estabelecimento de alíquotas uniformes do ICM.
Desde então, os estados, preocupados com a generalização do cenário de
competição fiscal decorrente da nova sistemática de apuração do ICM, começaram a se
mobilizar, visando estabelecer acordos para uniformização de alíquotas e padronização das
políticas de isenções, conforme se depreende do Convênio do Recife de 23.10.1966, firmado
pelos estados do Nordeste. O objetivo de convênios20 como este era o de fixar regras para uma
administração conjunta do ICM e a defesa de interesses regionais.
O mesmo propósito teve o Ato Complementar n°. 34 de 30.01.1967, editado pelo
presidente Castello Branco, que estabeleceu uma política comum de concessão de incentivos
regionais, reconhecendo, naquela oportunidade, a relevância da matéria para a economia
nacional e para as relações interestaduais, tendo revogado quaisquer disposições legais ou atos
que tivessem outorgado favores fiscais relativos ao IVC ou ICM, não previstos em convênios
e protocolos. Nesse interregno foram ainda promulgadas as Constituições Federais de 1967 e
de 1969.
O segundo período desenvolveu-se entre os anos de 1975 e início dos anos 1990,
tendo como marco inicial a edição da Lei Complementar n°. 24/1975, que, como visto,
instituiu o Confaz e impôs a regra de aprovação unânime dos estados para validação da
concessão dos benefícios fiscais. Tratou-se, portanto, de uma das mais fortes reações do
governo federal no sentido de buscar a harmonização da legislação tributária em matéria de
renúncia fiscal e, claro, de combater o conflito interestadual.
Esse período foi gravado por grande recessão econômica e pela descentralização
fiscal, iniciada no final da década de 1970, quando estados e municípios tiveram um aumento
na sua participação sobre a arrecadação federal do IPI e do IR. No final dos anos 1980, o
20
Nessa época vários convênios foram editados com o objetivo de coibir a guerra fiscal, como, por exemplo:
Convênio de Salvador de 22.11.1966, I Convênio do Rio de Janeiro de 27.02.67, Convênio de Cuiabá de
07.06.67, Convênio de Porto Alegre de 16.02.68, Convênio da Amazônia de 16.05.68, etc.
101
Brasil viveu um processo de redemocratização, quando a Constituição Federal de 1988 trouxe
importantes e substanciais alterações no Sistema Tributário Nacional, principalmente em
matéria de ICMS, como já exposto. Os estados e municípios se fortaleceram e ampliaram não
só a sua base arrecadatória, como, também, a participação nas transferências da receita do
governo federal; tudo para fazer frente às novas responsabilidades assumidas. Esse cenário
fomentou a intensificação da guerra fiscal. (SANO, 2008, p. 73 e 93).
O terceiro período pode ser verificado a partir do início dos anos 1990 até os dias
atuais. Com a retomada dos investimentos, principalmente do setor automotivo, outra não foi
a conseqüência senão a abertura de franca disputa entre os estados para a atração de empresas
e investimentos para os seus territórios, bem assim para não perder os parques industriais já
instalados. O governo federal não se mobilizou no sentido de desenvolver e capitanear
políticas de desenvolvimento regional, tendo, inclusive, sido extintos os órgãos federais que
se aventuraram na tentativa de superação das desigualdades regionais, como aconteceu com a
Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e a Superintendência de
Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). Essa postura do governo federal fez com que os
estados se antecipassem no preenchimento da lacuna criada pelo próprio poder central, razão
pela qual se jogaram na guerra fiscal. (SANO, 2008, p. 94).
O início dos anos 1990, sob a égide do governo Fernando Collor de Melo, foi uma
época marcada pela crise inflacionária, por grande recessão econômica e elevado déficit
público. Foram lançados os Planos Collor I e II, cujo propósito era ajustar a economia,
quando se verificou uma elevação da carga tributária, cortes nos gastos públicos, privatização
de empresas estatais, redução da máquina dos governos estaduais, abertura do mercado
interno com redução gradativa de alíquotas de importação, além da revogação de incentivos
fiscais, concedidos em desacordo com a Constituição Federal, o que enfraqueceu muito a
autonomia dos estados.
O advento do Plano Real em 1994 levou à estabilização monetária e abertura
econômica. Apesar do fortalecimento do governo federal, houve um acirramento ainda maior
da guerra fiscal, já que, mais uma vez, não se preocupou com o estabelecimento de ações de
coordenação intergovernamental para frear os conflitos. Algumas medidas foram tomadas,
visando incrementar a relação vertical entre União e estados, como, por exemplo: (i) criação
do Fundo de Estabilização Fiscal – FEF em 1996; (ii) edição da Lei Kandir e desvinculação
das receitas da União também em 1996 e (iii) edição da Lei de Responsabilidade Fiscal em
2000. Porém, nenhuma ação influiu de forma decisiva na articulação horizontal, não tendo
102
sido enfrentada com seriedade e compromisso a problemática dos conflitos interestaduais.
(SANO, 2008, p. 97).
Prova disso é que, no processo de aprovação da Lei Kandir, restou evidente a
completa falta de interesse dos estados, com a total chancela do governo federal, em colocar
um basta na guerra fiscal, haja vista que os dispositivos direcionados a esta finalidade foram
vetados pelo presidente da República, devido à pressão dos governos estaduais.
Esse período foi marcado também pelo uso crescente das Ações Diretas de
Inconstitucionalidade (ADI) junto ao Supremo Tribunal Federal, visto que muitos estados
decidiram levar as suas disputas para apreciação da Corte Maior, na tentativa de expurgar do
ordenamento jurídico as normas que ilegitimamente concederam benefícios fiscais de forma
unilateral.
Apesar da Lei Complementar n°. 24/1975 condicionar a concessão de benefícios
fiscais à celebração prévia de convênio pelos estados e distrito federal, é freqüente a
inobservância dessa prescrição pelos entes políticos, postura cabalmente repudiada por larga
jurisprudência do STF. É o que se depreende da ementa a seguir colacionada:
Mas o ápice da guerra fiscal foi atingido no início dos anos 2000, quando os
estados passaram a dirigir a sua munição contra os contribuintes sediados em seus próprios
21
No mesmo sentido estão os seguinte julgados da Corte Suprema: ADI 2352 MC/ES, DJ 09.03.2001; ADI 2376
MC/RJ, DJ 04.05.2001; ADI 1179/SP, DJ 19.12.2002; ADI 2377 MC/MG, DJ 07.11.2003; ADI 1308/RS, DJ
04.06.2004; ADI 3246/PA, DJ 01.09.2006; ADI 2320/SC, DJ 16.03.2007.
103
territórios. Gilberto Moreira (2001, p. 237) anuncia que tais entes tributantes passaram a
tomar medidas indiretas para exigir dos contribuintes, que adquiriram mercadorias ou
tomaram serviços das empresas unilateralmente incentivadas, o valor equivalente à vantagem
obtida junto ao estado de origem, limitando o creditamento do imposto relativo às operações
anteriores, em total agressão ao regime jurídico do ICMS, estabelecido pelo Texto Maior.
Tudo o que até aqui foi exposto é suficiente para nos levar à conclusão sobre os
principais fatores que têm propiciado a intensificação da guerra fiscal, instaurada no Brasil.
Para recapitular, vale ressaltar: (i) existência de um sistema federativo extremamente
desigual; (ii) competência estadual do principal imposto sobre o valor agregado na contramão
dos padrões mundialmente adotados; (iii) ICMS como principal fonte de financiamento dos
estados; (iv) falta de políticas nacionais bem delineadas de desenvolvimento regional; (v)
benefícios de forma unilateral, sob diversas modalidades/estruturas, concedidos pelas
unidades federadas e (vi) atuação cada vez mais precária do Confaz, originariamente criado
para garantir a harmonização entre os estados.
Daniel Peixoto (2007, p. 75-76) também elenca mais uma série de fatores que
agrava a guerra fiscal: (i) desequilíbrio entre as diversas regiões e estados quanto à oferta de
mão-de-obra qualificada, infra-estrutura, acesso a insumos e mercados; (ii) apesar dos
mecanismos de harmonização, como leis complementares, resoluções e convênios, o caráter
nacional do ICMS conflita com o seu modo de implementação no Brasil, vez que existem 27
legislações diferentes em âmbito local, o que implica desigualdade na cobrança do tributo,
desequilíbrios concorrenciais entre empresas e insegurança dos contribuintes na definição do
local do investimento; (iii) adoção do princípio da origem, que concentra o impacto fiscal no
estado onde se localiza a empresa, que dará ensejo a operação de saída e (iv) falta de aptidão
do judiciário em dar respostas ao problema, além da lentidão de rito e sobrecarga de processo.
Não podemos olvidar outro importante fator que contribui para a intensificação da
guerra fiscal, qual seja a centralização da Federação brasileira na União, que exerce um papel
de tutora dos estados e municípios, sob o ponto de vista financeiro, já que tem competência
para fiscalizar suas contas e dispor sobre suas receitas (SCAFF, 2005, p. 31). Isso traz
expressivas implicações de ordem política, posto que estados e municípios passam a depender
de transferências voluntárias da União, o que não se ajusta ao modelo do federalismos fiscal
de equilíbrio, idealizado originalmente pela Constituição.
104
5.2 Efeitos macroeconômicos e sociais da guerra fiscal
No entanto, o lado positivo da guerra fiscal também deve ser reconhecido, como
bem enfatiza o Paulo de Barros Carvalho (2006):
106
há de que se estabeleceu aquilo que chamamos de “guerra fiscal” entre as
unidades da Federação. A expressão assume indisfarçáveis conotações
políticas, mas reflete, também, no campo de sua amplitude semântica, um
plexo de relações jurídicas não conciliadas segundo os princípios da
harmonia que o constituinte de 1988 previu. Aliás, diga-se de passagem, a
“guerra fiscal” tem seu lado positivo, manifestado no empenho que as
entidades tributantes realizam para atrair investimentos, buscando por esse
meio acelerar o desenvolvimento econômico e social, com benefícios
significativos para a Administração e para os administrados. Sobremais,
como tudo há de pautar-se em consonância com as diretrizes do direito
posto, esse confronto de política tributária acaba, muitas vezes, propiciando
o aprofundamento cognoscitivo das legislações vigentes, desencadeando
reformas que aperfeiçoam instituições e aprimoram os mecanismos de
implantação dos tributos. (CARVALHO, 2006, p. 679).
Desse modo, é possível admitir, assim como destaca Ricardo Varsano (1997, p. 8-
10), que os benefícios fiscais podem ser concebidos como uma eliminação marginal de
tributo, em virtude do surgimento de uma nova oportunidade de uso privado de recursos da
sociedade, cujos benefícios sejam superiores aos do uso público a que se destinavam,
podendo, assim, propiciar aumento do bem-estar da sociedade da unidade federada
concedente. Apesar disso, o autor alerta que são raros os casos em que a concessão de um
incentivo estadual se justifica sob o ponto de vista nacional, já que é do governo central a
responsabilidade pelo empreendimento de políticas públicas de desenvolvimento industrial e
regional ou de desconcentração da produção.
Ricardo Calciolari (2006) acredita que esses efeitos positivos são de curto prazo,
sendo que, no longo prazo, são inegavelmente ruins os efeitos da guerra fiscal:
Acerca dos efeitos da guerra fiscal na arrecadação, eles podem até ser
positivos a curto prazo para o ente vitorioso, mas, a longo prazo, são ruins
para toda a Federação. Os entes com alíquotas maiores serão forçados a
baixar suas alíquotas ao patamar dos entes “concorrentes”, sob pena de não
atrair o capital privado, e, aos poucos, as alíquotas dos entes em disputa
estarão no mesmo patamar, agora mais abaixo, apresentando todos eles
menor receita com a competência própria e maior dependência das
transferências intergovernamentais. (CALCIOLARI, 2006, p. 24).
É certo que a guerra fiscal desestabiliza toda a estrutura sobre a qual se assenta a
exigência do ICMS, na medida em que revela falta de harmonia entre as legislações tributárias
das diversas unidades federativas que convivem em um mesmo sistema tributário.
O tema é polêmico, pois, ao mesmo tempo em que são reconhecidas as
desvantagens e efeitos perversos da guerra fiscal, a concessão de incentivos aos agentes
econômicos pode ser útil para compensar desvantagens geográficas, econômicas e sociais
107
experimentadas por alguns entes políticos, que, em condições normais, não seriam atrativos
ao capital privado e financeiro.
Por isso, devem ser estimulados arranjos competitivos saudáveis, e não
predatórios, capazes de, simultaneamente, promover eficiência econômica e satisfação das
necessidades sociais.
Mas, no estágio patológico fiscal que se encontra o Brasil, só mesmo uma
reestruturação completa em toda a sistemática do ICMS será capaz de conter os perversos
efeitos dessa guerra, embora seja este um caminho árido e tortuoso, que poucos governos se
arriscam a trilhar. E mais, com trinta e cinco anos de vigência e declarada impossibilidade de
observância da Lei Complementar n°. 24/1975, por ser absolutamente impraticável, já está
mais do que claro que os estímulos econômicos prevalecem sobre as normas que se prestam a
tentar coibir a guerra fiscal.
Se há efeitos danosos do ponto de vista sócio-econômico, e se há notória sangria
de recursos públicos, qual a razão para o tempo revelar somente o agravamento desse cenário?
Falta vontade política para emplacar uma reforma tributária, que redefina as bases das
operações interestaduais do ICMS? Como é possível recuperar a neutralidade do ICMS,
essencialmente importante na tributação do valor agregado? Enquanto o legislativo não se
movimenta, como o judiciário pode garantir a preservação dos direitos dos contribuintes que
estão sendo fuzilados nesta guerra?
É nesse cenário caótico, permeado de dúvidas e insegurança jurídica, que os
agentes privados lutam pela sobrevivência, no planejamento e na execução de seus negócios e
objetivos empresariais.
108
notadamente no inciso I do § 2º do art. 155, que preconiza o princípio da não-cumulatividade,
e na g do inciso XII do § 2º do art. 155, que dispõe caber à lei complementar regular a forma
como, mediante deliberação dos estados e do distrito federal, isenções, incentivos e benefícios
fiscais serão concedidos e revogados. Por isso, os mencionados normativos sustentam ainda a
validade de suas prescrições nos comandos da Lei Complementar nº. 24/1975, que diz ser
obrigatória a celebração e ratificação de convênios para a concessão ou revogação de
isenções, incentivos ou favores fiscais ou financeiro-fiscais, de que resulte redução ou
eliminação, direta ou indireta, do ônus do ICMS.
A conseqüência prática disso é que, verificada a concessão unilateral de favores
fiscais pelo estado de origem, isto é, sem amparo em convênio firmado entre todas as
unidades federativas, o estado de destino poderá não só glosar eventuais créditos de ICMS
apropriados pelo contribuinte adquirente sediado em seu território, como, também, exigir o
valor respectivo acrescido de multas e juros.
Para ilustrarmos tal problemática, imaginemos a hipótese de um distribuidor
sediado no Estado de Minas Gerais, que adquire produtos de um fornecedor sediado no
Estado da Bahia. O último concede benefício de redução de base de cálculo em 40% para as
operações de venda de suas mercadorias realizadas por contribuintes baianos, sejam as saídas
internas ou interestaduais. Graficamente, esta operação dar-se-ia da seguinte forma:
Ocorre que o Estado de Minas Gerais, julgando, a seu exclusivo talante, que o
Estado da Bahia teria concedido o benefício de redução de base de cálculo para as
mercadorias envolvidas na operação em desacordo com a legislação de regência do ICMS,
veda o aproveitamento pelo seu contribuinte, o distribuidor mineiro, do imposto destacado na
nota fiscal de aquisição dos produtos e exige o estorno do crédito da seguinte forma:
109
Quadro 4 – Exemplo Fictício da Forma como se Operacionaliza
a Glosa de Créditos de ICMS
110
legislação e atos concessivos de todos os estados? Ainda que isto fosse possível, seria um
ônus, desprovido de qualquer proporção, imputado aos contribuintes.
Osvaldo de Carvalho (2006) comenta sobre o problema gerado pela glosa de
créditos de ICMS utilizados pelo adquirente de mercadorias incentivadas no estado de origem,
ressaltando a intensa insegurança jurídica vivida pelo contribuinte do estado de destino, já que
não é possível ter conhecimento sobre os benefícios de que goza o seu fornecedor:
Somente para ilustrar, imaginemos uma grande rede varejista que adquire
todos os dias milhares de itens de mercadorias, realizando centenas de
milhares de operações mercantis mensais. É praticamente impossível, ainda
que com o avanço da cibernética, controlar todas as operações de entrada de
mercadoria ou prestação de serviços que estejam escoimadas em benefícios
fiscais irregulares, mesmo porque, nos documentos fiscais dificilmente
constam aquelas operações ou prestações lastreadas em benefícios fiscais
obtidos pelos remetentes das mercadorias. (CARVALHO, 2006, p. 87)
Num cenário de guerra fiscal, as armas que deveriam estar apontadas para as
unidades federadas que concedem incentivos em desacordo com a Constituição Federal, na
verdade, acabam se voltando para o contribuinte sediado no estado de destino, que acreditava
estar cumprindo leis válidas.
Merece destaque o magistério de José Eduardo Soares de Melo (2007), para quem
a situação verificada no estado destinatário abrange, única e exclusivamente, o fisco da
respectiva região e o contribuinte a que se encontra jurisdicionado, no que diz respeito à
apropriação do crédito do ICMS, decorrente de legítima operação amparada em nota fiscal,
contendo todos os elementos do negócio mercantil, como a identificação de comprador e
vendedor, descrição das mercadorias, preço e valor do imposto. O festejado autor sustenta
ainda que:
111
redução de base de cálculo do imposto, é absolutamente diverso das espécies exonerativas de
isenção e não-incidência, como vimos no terceiro capítulo. Portanto, não poderia o princípio
da não-cumulatividade ser suprimido, por não se tratar de exceção constitucionalmente
prevista.
Assim, os contribuintes destinatários de mercadorias oriundas de outras unidades
federadas têm vivenciado um dilema preocupante: (i) se comprarem mercadorias de outros
estados correrão o risco de se sujeitarem à fiscalização, autuação, imposição de penalidades,
sanções políticas e, até mesmo, representação criminal, já que não têm condições de garantir
que seu fornecedor é, ou não, beneficiário de algum tipo de privilégio fiscal; (ii) por outro
lado, se deixarem de comprar mercadorias de fornecedores sediados em outros estados, terão
sérios problemas em suas atividades operacionais, podendo perder mercado, receita, e ter seu
negócio inviabilizado, além de causar problemas de abastecimento local ou regional.
Há, como podemos ver, uma restrição direta à liberdade das empresas e notória
agressão ao primado da livre iniciativa e, como se não bastasse, um aumento indireto de carga
tributária.
112
relativamente à parcela do ICMS, dispensada mediante redução na base de cálculo na unidade
federada de origem da mercadoria, quando concedido o benefício sem amparo em convênio
celebrado no âmbito do Confaz.
São vários os argumentos utilizados pelo Estado do Paraná para fundamentar sua
prática. Além de todos os fundamentos de praxe já mencionados alhures, destacamos ainda os
seguintes: (i) a concessão de benefícios fiscais relativos ao ICMS de forma unilateral a um
contribuinte ou aos contribuintes de determinado segmento econômico de uma unidade
federada retira a neutralidade que o imposto deve ter no sentido de não interferência nas
regras de mercado; (ii) os contribuintes não alcançados por benefício fiscal dessa ordem
concorrem em desigualdade contra vantagens financeiras, impossibilitando o
desenvolvimento regular de suas atividades econômicas; (iii) a concorrência predatória
prejudica a receita do estado e, em conseqüência, a população mais carente, a mais
dependente da atividade estatal.
No Estado do Ceará foi instituída a Instrução Normativa n°. 32 de 29.12.2003, por
meio da qual o crédito de ICMS correspondente à entrada, a qualquer título, de mercadoria em
estabelecimento localizado em território cearense, por estabelecimento que seja usuário de
benefício fiscal concedido sem amparo em convênio celebrado no âmbito do Confaz só será
admitido na mesma proporção em que o imposto tenha sito efetivamente recolhido à unidade
da Federação de origem. A norma prevê que a autoridade administrativa que, no exercício de
suas atividades, verificar a apropriação, por contribuintes desse estado, de créditos tributários
em desacordo com o artigo anterior, deverá emitir notificação para estorno de crédito,
podendo ser lavrado o competente auto de infração, acusando o creditamento indevido
registrado em conta gráfica.
Da mesma forma, o Estado do Rio de Janeiro vedou a apropriação de crédito de
ICMS, por meio do Decreto n°. 39.855 de 5.09.2006, dispondo expressamente que:
Estado Legislação
CE Instrução Normativa n°. 32 de 29.12.2003
DF Lei n°. 1.254 de 08.11.1996 (art. 4º)
MA Portaria n°. 523 de 29.12.2009
MT Decreto n°. 4.540 de 02.12.2004
MS Resolução n°. 1.741 de 25.03.2004
MG Resolução n°. 3.166 de 11.07.2001
PR Decreto n°. 2.183 de 26.11.2003
PI RICMS – Decreto n°. 13.500 de 23.12.2008 (art. 68)
RJ Decreto n°. 39.855 de 05.09.2006
SP Comunicado CAT n°. 36 de 29.07.2004
22
Este mapeamento é meramente ilustrativo, pois como se sabe, a legislação tributária no país sofre constantes e
rápidas alterações. O objetivo é tão-somente o de demonstrar que não estamos diante de uma prática isolada,
mas, sim, adotada por grande parte dos entes federativos, o que torna evidente a necessidade de atenção para o
problema, principalmente por parte do judiciário.
114
imposto, conforme indicação constante do seu Anexo Único. É o que prevê o diploma
normativo em exame:
115
A norma em questão não pode anular uma operação comercial interestadual
regular, em decorrência de um potencial vício no tratamento aplicável apenas ao exercício do
direito de crédito pelo adquirente de mercadorias, incentivadas pelo estado de origem, visto
que uma eventual declaração de inconstitucionalidade pelo STF se voltaria unicamente ao
benefício fiscal instituído.
Sacha Calmon e Eduardo Maneira (2005), convencidos de que o prejuízo da
inércia do Estado de Minas Gerais em impugnar judicialmente os atos unilaterais concessivos
de incentivos fiscais pelos entes federativos deve ser suportado exclusivamente pelos cofres
públicos mineiros, não podendo jamais ser transferidos aos contribuintes, sustentam que:
Essa resolução traz sérios prejuízos para os contribuintes mineiros, dentre eles
elencamos os seguintes: (a) perda de competitividade, visto que, ao efetuarem o estorno de
crédito de ICMS, os preços das mercadorias são proporcionalmente majorados em
comparação aos preços adotados pelos contribuintes de outros estados, que não restringem a
apropriação do crédito de ICMS; (b) elevados custos de gestão dos sistemas de faturamento
das empresas para atualização das constantes alterações da norma e para parametrização das
novas regras fiscais, principalmente para os contribuintes que comercializam um grande
volume de produtos; (c) impacto tributário dos ajustes na conta gráfica para implementar o
estorno do crédito nos casos de aplicação retroativa da norma, prejudicando os resultados
operacionais das empresas, na medida em que esses custos não mais podem ser repassados no
preço aos seus clientes, ressaltando-se ainda o risco de exposição a autuações fiscais.
116
5.3.3 Comunicado CAT n°. 36/2004 do Estado de São Paulo
Tal Comunicado faz menção aos seguintes dispositivos legais: art. 155, § 2°, I e
XII, g, bem como ao art. 170, IV da CF/88; arts. 1° ao 8° da LC n°. 24/75 e ao § 3° do art. 36
da Lei Estadual n°. 6.374/1989. Ocorre que tais comandos prescritivos são imprestáveis para
fundamentar a validade do normativo em exame.
O art. 155 § 2°, XII, g da CF/88 trata apenas de incentivos fiscais e não
financeiros, de modo que cabe aqui uma verificação sobre o tipo de incentivo que estaria
sendo objeto de presunção de invalidade pelo Estado de São Paulo. O art. 155, § 2°, I da
CF/88 é genérico e não trata especificamente da glosa unilateral de créditos de ICMS,
informando apenas o modo da arrecadação do tributo. Os arts. 1° ao 8° da LC n°. 24/75 e o §
3° do art. 36 da Lei Estadual n°. 6.374/1989 referem-se aos incentivos fiscais e, também, aos
financeiros. Porém, como a Constituição Federal de 1988 tratou apenas de incentivos fiscais,
tais diplomas normativos não teriam sido recepcionados quanto aos incentivos financeiros.
(MARTINS, 2005, p. 142-143).
Resta-nos evidente, que este indigitado comunicado é mero ato administrativo
eivado de manifesta ilegalidade e inconstitucionalidade, posto tratar-se da glosa, pelo Estado
117
de São Paulo, de incentivos financeiros concedidos por outras unidades federadas. Demais
disso, ato administrativo que é, só poderia regulamentar o conteúdo já prescrito em lei, sendo-
lhe defeso extravasar ou reduzir a sua eficácia e, principalmente, mitigar ou minimizar a
eficácia de outras leis fundadas na Constituição, emanadas dos demais estados.
Dejalma Campos (2006) é contrário à restrição trazida pelo aludido comunicado:
23
ADI 3350 AgR, Relator: Min. Gilmar Mendes, DJ 31.10.2008.
118
o caso do incentivo para as indústrias de informática e automação locais, concernente à
possibilidade de crédito de 50% do ICMS, instituído por meio do Decreto n°. 33.656 de 16 de
abril de 1993, sem qualquer consulta ao Confaz. Tal normativo foi objeto da ADI n° 902/SP,
movida pelo Estado do Paraná. Deferido pedido de liminar24 para afastar a sua aplicação, a
referida legislação acabou revogada pelo Estado de São Paulo, o que implicou na perda do
objeto da ADI.
Como podemos notar, o Estado de São Paulo já aderiu à disputa fiscal, não se
admitindo o argumento de que estaria exercendo, tão-somente, uma estratégia preventiva e de
proteção. Não pode haver dois pesos e duas medidas; se o estado concede favores fiscais à
revelia do Confaz, não pode empreender a glosa de créditos sob o mesmo argumento.
Por certo que não poderia ser mais confortável a posição acusatória do Estado de
São Paulo em relação aos demais entes que concedem incentivos fiscais, haja vista ser ele
detentor de grande hegemonia industrial no cenário nacional, cujo sucesso em todo o processo
de sua formação econômica, baseou-se em benefícios orçamentários, financeiros e, porque
não, tributários, que inegavelmente privilegiaram a sua região, em detrimento de outras no
país.
24
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - PERTINÊNCIA. Tratando-se de impugnação de ato
normativo de Estado diverso daquele governado pelo requerente, impõe-se a demonstração do requisito
"pertinência". Isto ocorre quanto ao Decreto n°. 33.656, de 16 de abril de 1993, do Estado de São Paulo, no que
se previu o crédito de cinquenta por cento do valor do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
devido em operações ligadas aos produtos finais do sistema eletrônico de processamento de dados. O interesse
dos Estados mostrou-se conducente a reserva a lei complementar da disciplina da matéria e esta cogita da
necessidade de convênio - Lei Complementar n°. 24, de 7 de janeiro de 1975, recepcionada pela Carta de 1988 -
artigo 34, par. 8., do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Liminar concedida. (ADI 902 MC,
Relator: Min. Marco Aurélio, DJ 22.04.1994).
119
6 LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS À GLOSA DE CRÉDITOS DE ICMS
Esta pesquisa tem por principal objetivo responder a uma questão de difícil
enfrentamento: são constitucionais as normas e medidas restritivas ao direito de
aproveitamento de crédito de ICMS pelo contribuinte, adquirente de mercadorias em
operações interestaduais, cujos remetentes sejam beneficiários de incentivos fiscais
concedidos em desacordo com a legislação tributária?
Antes de se adentrar ao problema, é preciso colocar em evidência as premissas
iniciais que puderam ser fixadas ao longo deste estudo. Tratam-se das proposições que
servirão de base para as conclusões que pretendemos chegar neste capítulo. São elas:
Primeira premissa: a expressão cobrado prevista no art. 155, § 2°, I da CF/88
significa incidido e não pago. Portanto, o contribuinte adquirente de mercadorias poderá se
creditar do montante de todo o imposto que incidiu nas operações anteriores.
Segunda premissa: o princípio da não-cumulatividade só comporta duas hipóteses
restritivas constitucionalmente previstas, a isenção e a não-incidência, irredutível por normas
infra-constitucionais.
Terceira premissa: as unidades federativas são plenamente competentes para
conceder benefícios fiscais como conseqüência da própria autonomia financeira de que são
dotadas, característica essencial da Federação brasileira. A concessão de incentivos fiscais
pode, ou não, violar o princípio da neutralidade tributária, o que dependerá da análise do caso
concreto, já que as benesses, em muitos casos, se destinam a preservar valores gravados na
própria Carta Suprema.
Quarta premissa: existem expressivas diferenças entre os favores concedidos
pelos entes políticos, não podendo os benefícios fiscais ser equiparados aos benefícios
financeiros, já que aqueles são concedidos antes do pagamento dos tributos e estes após o
adimplemento da obrigação tributária pelo contribuinte. De igual forma, no âmbito dos
benefícios fiscais, existem diversos tipos exonerativos, cada um com sua particularidade, que
não podem ser colocados pelo legislador ou aplicador do direito em uma mesma vala comum.
É o caso, por exemplo, das isenções parciais que equiparam-se a redução de base de cálculo
ou de alíquota, mas que não se confundem com a isenção total. Portanto, para se concluir pela
possibilidade, ou não, do creditamento do ICMS em relação às aquisições de mercadorias
incentivadas na origem, é preciso identificar exatamente o tipo exonerativo em voga, para
avaliar se se está, ou não, diante de uma exceção ao princípio da não-cumulatividade.
Quinta premissa: para que a norma concessiva de algum benefício fiscal seja
legítima devem ser observados alguns requisitos, de forma cumulativa: (i) requisitos
genéricos: legalidade, agente competente e isonomia; (ii) requisitos específicos: alíquotas
fixadas pelo Senado Federal, regras impostas pela Lei Complementar n°. 24/75,
especialmente a aprovação do benefício pela unanimidade dos membros do Confaz; (iii)
requisitos orçamentários, isto é, observância dos comandos da Lei de Responsabilidade
Fiscal. Se quaisquer desses requisitos não forem observados, a norma concessiva deverá ser
considerada inconstitucional, não antes da manifestação pelo órgão competente do Poder
Judiciário.
Sexta Premissa: a Lei Complementar n°. 24/75 foi recepcionada pela atual
Constituição Federal somente em relação aos incentivos fiscais, mas não quanto ao
disciplinamento da forma de concessão e revogação de incentivos financeiros ou outros
privilégios que não importem em redução de carga tributária.
É claro que todas essas premissas foram fixadas a partir dos elementos
interpretativos e critérios metodológicos utilizados na pesquisa, sendo certo que em torno de
todas elas gravitam inúmeras controvérsias, tanto no âmbito doutrinário como no
jurisprudencial, razão máxima deste assunto ainda carecer de maior aprofundamento teórico e
debate científico. Por certo, são mesmo as divergências de opinião que motivarão outras
reflexões sobre o tema, propiciando o amadurecimento do conhecimento e a manutenção da
chama viva de novas idéias.
121
O verdadeiro vetor da tributação é a Constituição, fundamento de validade para
outras normas e de caráter imperativo, deve ser observada não só pelo legislador, como,
também pelos intérpretes e aplicadores do direito.
Nenhum ato jurídico ou manifestação de vontade pode subsistir validamente
quando incompatível com a Constituição. Para Alexandre Macedo Tavares (2008, p. 7), o
princípio da supremacia constitucional deve ser o primeiro a ser observado pelo intérprete,
sob o ponto de vista lógico e cronológico, na exegese da Norma Fundamental.
É por isto que os sistemas de controle de constitucionalidade das leis e atos
normativos adotados pelo ordenamento jurídico pátrio têm expressiva relevância no sentido
de garantir proteção, harmonia e independência dos poderes constituídos, bem como
autonomia das pessoas políticas de direito público, no exercício das atribuições que lhes
foram constitucionalmente outorgadas.
A aplicação da lei deve ser sempre precedida de uma análise interpretativa que
jamais pode se desvirtuar dos caminhos ditados pelo texto constitucional. Somente a partir da
interpretação, assim entendida como atividade que busca extrair o conteúdo, o alcance e o
sentido de uma determinada norma jurídica pode-se aplicar a lei ao caso concreto. (BASTOS;
PFLUGG, 2005, p. 154).
Mas, por mais que as normas constitucionais sejam dotadas de alto grau de
abstração e generalidade, esta atividade não é absoluta e sem limites, pois existem amarras
que delimitam o campo de atuação do intérprete, que não pode extrapolar a expressão literal
da norma interpretada, tampouco a vontade legis, sob pena de atuar como legislador positivo e
criar nova norma jurídica, ao invés de cumprir o seu mister, o de, essencialmente, descobrir o
sentido da norma constitucional interpretada. (IBID., p. 163-164).
São exatamente estes freios que, limitam os excessos do Poder Executivo no
exercício do poder ativo de tributar, em prol da preservação das garantias e direitos
individuais dos contribuintes. Foi com este propósito que a Constituição Federal de 1988
criou os instrumentos necessários para impor tais limitações, que, se não observadas,
culminarão, como há muito já advertia o mestre dos mestres, Aliomar Baleeiro (1997, p. 38),
na não-efetivação dos preceitos constitucionais, na deseducação dos órgãos públicos ou na
quebra de princípios fundamentais.
Sendo assim, neste capítulo serão apresentadas as limitações constitucionais ao
poder de tributar, in casu, que se impõem à prática adotada pelas administrações fazendárias,
que glosam créditos de ICMS nas aquisições interestaduais incentivadas, que a mais grave
122
conseqüência para os contribuintes sediados em seus territórios, é a majoração da carga
tributária, de forma inconstitucional. As respostas a serem dadas pelo Poder Judiciário a este
problema já estão na própria Carta Política, sendo que, para encontrá-las, não seria sequer
necessário empreender uma visão sistêmica e estrutural do Direito.
123
O conceito de “validade” pode ser construído a partir da própria definição de
direito positivo. Sendo este o conjunto das normas jurídicas válidas, em
determinadas coordenadas de tempo e de espaço, toda proposição normativa
integrante do ordenamento jurídico apresentará validade. Ser norma válida,
portanto, quer significar que esta mantém relação de pertinencialidade com
um determinado sistema, sendo a validade o vínculo que se estabelece entre
a norma jurídica e o sistema do direito posto. A afirmação de que uma norma
“N” é validade significa que pertence ao sistema “S. A validade não é, pois,
um atributo que qualifica a norma jurídica, mas a relação de sua pertinência
com determinado sistema jurídico. (CARVALHO, 2006, p. 681-682).
124
Judiciário. Por essa razão, não pode o estado de destino das mercadorias adquiridas com
incentivo fiscal concedido pelo estado goiano, vedar o crédito apropriado pelos contribuintes
sediados em seu território por pressupor, com base em seu exclusivo juízo, que a norma
concessiva do privilégio tributário é inconstitucional.
Assim, o fato da norma concessiva de incentivos fiscais estar em desacordo com o
comando do art. 155, § 2°, XII, g da Constituição Federal não é suficiente para invalidá-la.
Sobre a validade das normas jurídicas são pertinentes e assertivas as lições de
Eurico Marcos Diniz de Santi (2009):
Noutro giro lingüístico, as normas jurídicas devem ser tidas como válidas e aptas
a produzir seus efeitos, enquanto não foram extirpadas do ordenamento jurídico pelos meios
próprios. É o que passaremos a expor na imediata seqüência.
A guerra fiscal não é um conflito direto entre estados e contribuintes, mas, sim,
entre os próprios estados, sendo o juiz natural deste conflito o Supremo Tribunal Federal.
Como ressaltado, a lei que institui qualquer tipo de benefício ou exoneração fiscal
pertence ao ordenamento jurídico, válida e plenamente capaz de produzir seus efeitos,
devendo, por isso, ser cumprida pelos seus destinatários. Somente após a declaração de
inconstitucionalidade25 pelo Poder Judiciário, especificamente pelo STF, conforme prevê o
art. 102, I, a da CF/8826, uma norma poderá ser considerada como inválida.
O controle de constitucionalidade está ligado ao princípio da supremacia da
Constituição, bem assim à rigidez constitucional e à proteção dos direitos e garantias
25
A Ação Direta de Inconstitucionalidade é disciplinada pela Lei Federal de n°... 9.868/1999.
26
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente:
a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de
constitucionalidade de lei ou ato normativo federal.
125
fundamentais. (MORAES, 2010, p. 710). Significa a verificação pelo Poder Judiciário da
compatibilidade de uma norma infraconstitucional ou ato normativo com a Constituição.
Somente por meio desse processo de controle o judiciário poderá certificar se o
estado, no exercício de seu poder legislativo, observou os requisitos formais e materiais para a
edição de uma norma jurídica, pois, como visto, para que seja válida, basta o cumprimento
dos requisitos formais, isto é, a introdução no ordenamento jurídico pelo processo legislativo
próprio e por agente competente. Assim, o exame de compatibilidade material com a ordem
constitucional somente poderá ser realizado por meio de controle de constitucionalidade e
jamais antes disto.
Existem dois modelos clássicos de controle de constitucionalidade: o controle
difuso e controle concentrado. O controle difuso é exercido diretamente no âmbito de casos
concretos, tem natureza subjetiva e permite que todos os órgãos do Poder Judiciário, em todas
as instâncias, enquanto guardiões da Constituição, apreciem a violação de direitos
constitucionais nas situações ocorridas no mundo fenomênico. Já o controle concentrado
atribui ao STF competência para processar e julgar originariamente ação direta de
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, que objetive a invalidação
de determinada norma jurídica, a fim de se garantir a segurança das relações jurídicas, não
havendo nenhum interesse subjetivo ou caso individual concreto a ser solucionado.
Os mais diversos normativos estaduais podem ser submetidos ao controle abstrato
de normas: (i) disposições das constituições estaduais, desde que incompatíveis com o Texto
Fundamental; (ii) leis estaduais de qualquer espécie ou natureza; (iii) decretos editados com
força de lei; (iv) regimentos internos de tribunais estaduais, bem assim os regimentos das
assembléias legislativas; (v) atos normativos diversos. (MARTINS; MENDES, 2009, p. 191).
Se existe remédio constitucional, não há qualquer plausibilidade para que o
executivo estadual, ao seu talante, suste a aplicação das normas concessivas de benefícios
fiscais, porque sob seu exclusivo crivo tais preceitos conteriam vícios de
inconstitucionalidade. Desse modo, enquanto válidas, as normas instituidoras de incentivos
devem permanecer vigentes e eficazes, a menos que haja pronunciamento da Corte Suprema,
competente que é para decretá-las inconstitucionais.
José Eduardo Soares de Melo (2007) apresenta firme posicionamento sobre a
ausência de fundamentos jurídicos capazes de suportar esse comportamento dos estados:
Tais atos fazendários não expressam conteúdo normativo próprio, não têm o
condão de retirar normas do ordenamento, sequer declará-las
126
inconstitucionais, e muito menos revelar caráter programático, uma vez que
à Administração Fazendária não é atribuída competência para oferecer
conselhos, avisos, mas submeter-se às normas vigentes, válidas e eficazes,
enquanto não sejam declaradas inconstitucionais.
As diretrizes fazendárias não podem imiscuir-se na esfera dos negócios dos
particulares, interferir nas posturas pessoais dos adquirentes das
mercadorias, questionar relacionamentos com os fornecedores e alterar
operações mercantis. (MELO, 2007, p. 236-237).
Concluímos que, além da glosa de créditos de ICMS não ser meio admissível
para realizar embargo econômico a outra unidade da Federação, também não é meio adequado
para a realização de controle de constitucionalidade, até porque, admitir o contrário,
significaria colocar fim ao pacto federativo já que um estado estaria totalmente subordinado
ao outro. Representaria a extinção do princípio da separação dos poderes, vez que o Executivo
poderia substituir o Judiciário em seu papel e vice-versa.
27
Apelação Cível com Revisão n°. 518.847-5/5-00, Sétima Câmara de Direito Público, Rel. Des. Nogueira
Diefenthalar, julgamento em 23.07.2007.
128
6.2.1.3 A impossibilidade de auto-aplicação das sanções previstas no art. 8° da LC n°.
24/75
Daniel Monteiro Peixoto (2007) faz coro a este posicionamento, no sentido de ser
necessária a prévia manifestação do STF antes da aplicação das penalidades previstas no art.
8° da LC n°. 24/75:
Não estamos diante de questão das mais pacíficas; muito pelo contrário. Osvaldo
Santos de Carvalho (2006, p. 121), escorado no firme posicionamento de Aldo de Paula Junior,
apresenta entendimento no sentido de que é privativo do Supremo Tribunal Federal o controle
de constitucionalidade, com efeito vinculante e erga omnes. Os atos normativos que impõem
a glosa de créditos de ICMS não seriam hipóteses de declaração de inconstitucionalidade na
acepção utilizada pelo Poder Judiciário, mas de não aplicação de norma por manifesto vício
de inconstitucionalidade. Esse vício intrínseco decorre da simples edição de ato normativo em
desconformidade com a Constituição, o que acaba por fulminar a sua validade ab initio.
Essa corrente doutrinária não se coaduna com o conceito de validade adotado
como premissa no tópico anterior, isto é, aquele segundo o qual a conclusão pela validade
prescinde do exame de conteúdo, bastando que a norma exista no ordenamento jurídico,
criada por agente competente e observado o processo legislativo próprio.
131
E já encerrando, acreditamos que se a lei complementar tem o condão de
disciplinar a forma de concessão ou revogação de benefícios fiscais, não lhe é vedado dispor
sobre os efeitos do seu descumprimento. Se a lei pode ditar regras, ainda que meramente
formais ou estruturais, também pode estabelecer as penalidades por sua inobservância. Mas,
mesmo que ao cabo de todo este estudo, se pudesse concluir pela constitucionalidade das
sanções previstas na LC n°. 24/75, fato é que não são auto-aplicáveis e só podem ser impostas
após manifestação do Poder Judiciário acerca do seu conteúdo e da sua constitucionalidade.
132
Vimos que o princípio da não-cumulatividade que norteia a incidência do ICMS
deve ser observado por todas as unidades federativas. Por outro lado, não se trata somente de
um direito, mas sim de um imperioso dever dos contribuintes, a fim de evitar a repercussão
econômica do imposto, fazendo valer os ditames constitucionais.
No início deste capítulo apresentamos a primeira premissa fixada ao longo desta
pesquisa, em que a expressão cobrado prevista no art. 155, § 2°, I da CF/88 significa incidido
e não pago. É de clareza meridiana que o imposto devido em cada operação de circulação de
mercadoria tributável pelo ICMS deve ser compensado com o montante incidente nas
operações anteriores, havendo autorização para estorno do crédito, frisamos uma vez mais,
apenas para os casos de operações isentas ou não tributadas.
Não podemos negar que em uma operação interestadual há duas relações jurídicas
bastante distintas e bem delineadas: (i) na primeira o sujeito ativo é o estado de origem
concedente do benefício fiscal e, o sujeito passivo, o contribuinte beneficiado e (ii) na
segunda o sujeito ativo é o contribuinte adquirente da mercadoria e, sujeito passivo, o estado
de destino, em tese, lesado pelo benefício fiscal concedido pelo estado de origem
(MARQUES, 2010, p. 148). A Figura 2 ilustra o que ora expomos:
UF “X”
CRÉDITO ICMS INCIDENTE
OPERAÇÕES ANTERIORES
UF “Y”
1ª 2ª
FORNECEDOR ADQUIRENTE
UF “X” Operação Mercantil UF “Y”
SUJEITO
Não- Cumulatividade SUJEITO ATIVO
PASSIVO
133
Admitirmos o contrário implicaria no ilógico dever do contribuinte adquirente de
mercadorias confirmar com seus fornecedores, a cada transação realizada, o valor
efetivamente pago na operação anterior, antes de creditar o imposto incidente e destacado na
nota fiscal.
A Lei Complementar n°. 87/1996, arrimada na competência para disciplinar o
regime de apuração e compensação do imposto, concebida pelo art. 155, § 2º, XII, c, da
CF/1988, estabeleceu:
135
interestaduais, nos termos do art. 155, § 2°, IV da CF/88. Como já mencionamos, importante
mecanismo este a atuar no sentido de preservar a harmonia do pacto federativo brasileiro.
Considerando que existe normativo expresso estabelecendo as alíquotas aplicáveis
às operações interestaduais (7% e 12%), isto é, nos termos da Resolução n°. 22/89, os
remetentes das mercadorias, ainda que sejam beneficiários de privilégios estatais, não têm
outra opção senão destacar nas notas fiscais o ICMS correspondente à aplicação da alíquota
interestadual incidente sobre o valor da operação.
As unidades federativas que glosam o crédito correspondente ao diferencial de
imposto presumidamente não pago na operação anterior, acabam por alterar o montante que
incide sobre a operação interestadual, já que há um efetivo estabelecimento de nova alíquota
interestadual, em notório ato de usurpação de competência privativa do Senado Federal.
Não se pode ignorar que certamente encontraremos juristas que, na contra mão do
raciocínio ora desenvolvido, irão defender que quem está a usurpar a competência do Senado
Federal é o estado de origem pelo uso de alíquota real inferior à nominal. Mas, tal
entendimento não possui sustentáculo, já que como visto, alguns benefícios fiscais como a
redução de base de cálculo ou alíquota e a isenção parcial, por exemplo, não alteram a regra
matriz de incidência tributária, mas tão somente o quantum debeatur. Diferente é o caso glosa
de créditos implementada pelo estado de destino que afeta diretamente a regra padrão do
direito creditório que deve partir sempre do imposto incidente na operação anterior. Ou seja, o
crédito apropriado pelo contribuinte destinatário das mercadorias incentivadas deve estar
mesmo pautado em alíquota nominal e não em alíquota real.
O Supremo Tribunal Federal28 já teve oportunidade de se manifestar sobre a
questão no julgamento da ADI n°. 3.312-3, em que se discutia a constitucionalidade de
28
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DECRETO N. 989/03, EDITADO PELO
GOVERNADOR DO ESTADO DO MATO GROSSO. USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO SENADO
FEDERAL PARA FIXAR A ALÍQUOTA DO ICMS, NOS TERMOS DO PRECEITO DO ARTIGO 155, § 2º,
S IV E V, DA CB/88. ICMS. IMPOSTO NÃO-CUMULATIVO. A CONCESSÃO UNILATERAL DE
BENEFÍCIOS FISCAIS, SEM A PRÉVIA CELEBRAÇÃO DE CONVÊNIO INTERGOVERNAMENTAL,
AFRONTA AO DISPOSTO NO ARTIGO 155, § 2º, XII, G, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. O decreto
n. 989/03, do Estado do Mato Grosso, considera como não tendo sido cobrado o ICMS nas hipóteses em que a
mercadoria for adquirida nos Estados do Espírito Santo, de Goiás, de Pernambuco e no Distrito federal 2. O
contribuinte é titular de direito ao crédito do imposto pago na operação precedente. O crédito há de ser calculado
à alíquota de 7% se a ela efetivamente corresponder o percentual de tributo incidente sobre essa operação.
Ocorre que, no caso, a incidência dá-se pela alíquota de 12%, não pela de 7% autorizada ao contribuinte mato-
grossense. 3. Pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que a concessão unilateral de benefícios
fiscais relativos ao ICMS, sem a prévia celebração de convênio intergovernamental, nos termos do que dispõe a
LC 24/75, afronta ao disposto no artigo 155, § 2º, XII, g, da Constituição Federal". Precedentes. 4. Ação direta
julgada procedente para declarar inconstitucional o decreto n. 989/2003, do Estado do Mato Grosso. (ADI 3312,
Relator Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, DJ 09.03.2007).
136
decreto do Mato Grosso, que vedava o aproveitamento integral dos créditos relativos à
operação onde houve a concessão de incentivo fiscal, tendo restado reconhecido que tal
competência é atribuída exclusivamente ao Senado Federal pela Constituição Federal.
Um exemplo pode tornar mais clara a exposição. Tomemos por base os seguintes
dados fictícios de uma operação: (i) estado de origem: Paraíba; (ii) estado de destino: São
Paulo; (iii) benefício fiscal de redução de alíquota em 8% concedido pelo estado de origem
para a venda de produtos agrícolas. Confira-se graficamente qual seria o resultado da alíquota
efetiva dessa operação interestadual, se o estado destinatário das mercadorias empreender a
glosa dos créditos de ICMS aproveitados pelo contribuinte adquirente de tais mercadorias
sediado em São Paulo:
Este exemplo deixa evidente, que, por ato do Poder Executivo do Estado de São
Paulo, destinatário das mercadorias incentivadas, houve a alteração da alíquota interestadual
fixada pelo Senado Federal em 12% para uma nova e inferior alíquota no percentual de 4%.
Se a alíquota considerada para fins de tomada de crédito é aquela incidente na operação
anterior, logo não há outra alíquota a ser considerada pelo contribuinte adquirente de
mercadorias senão aquela fixada pelo Senado Federal (no exemplo, 12%). Por isto, não pode a
administração fazendária de destino impor que o seu contribuinte adote alíquota diversa para
apuração de seu direito creditório, sob pena de usurpação de competência constitucionalmente
atribuída ao Senado Federal.
137
6.2.4 Violação ao princípio da não discriminação em razão da origem
29
Art. 152 – É vedado aos Estados, ao Distrito federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre
bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino. (destacamos)
138
Santo 1.090/2002 energia elétrica, lubrificantes,
combustíveis, mercadorias para
consumidor final e aquelas sujeitas à
substituição tributária promovidas por
estabelecimento comercial atacadista
estabelecido no estado.
Está patente que os atos normativos, na maioria dos casos infralegais, que
restringem a tomada de créditos de ICMS quando os fornecedores se encontram noutros
estados da Federação, aumentam a carga tributária dos contribuintes adquirentes de
mercadorias incentivadas. Quanto a esta conseqüência não há qualquer dúvida.
Porém, resta ainda examinar o efeito dessas normas, isto é, se são esses
normativos dotados de caráter constitutivo de nova obrigação tributária ou se teriam efeito
meramente declaratório, já que escorados em normas de superior hierarquia pré-existentes,
quais sejam a Lei Complementar n°. 24/75 e a Constituição Federal.
É óbvio que sustentam os fiscos terem esses normativos restritivos efeito
declaratório e se limitarem a aplicar sanções, conforme lhes foi autorizado pelos legisladores
constitucional e complementar.
139
Mas toda a linha argumentativa desenvolvida alhures leva inegavelmente à
conclusão diametralmente oposta. Não se pode desconsiderar a realidade de que a ineficácia
atribuída ao crédito nos moldes postos pelo art. 8° da Lei Complementar n°. 24/75 implica
violação ao princípio da não-cumulatividade, nas hipóteses de tipos exonerativos diversos da
isenção e não- incidência. Mas, ainda que pudéssemos afastar essa premissa, entendida por
nós como inarredável, tem-se que a aplicação da sanção restritiva de direito creditório não foi
precedida da necessária declaração de inconstitucionalidade da norma concessiva do incentivo
fiscal editada pelo estado de origem, o que, por si só, fragiliza a justificativa das fazendas
públicas estaduais, vez que estará configurado ato normativo unilateral e com conteúdo
decisório proveniente do Poder Executivo, inconstitucional, sem a participação do Poder
Judiciário.
Ao agir desta maneira, isto é, ao impor a sanção automaticamente sem antes se
socorrer ao judiciário, o Poder Executivo inova o ordenamento jurídico pátrio e cria nova
obrigação tributária.
Sobre a impossibilidade de atribuição de efeito declaratório a tais atos fazendários
José Eduardo Soares de Melo (2009) doutrina com propriedade:
140
Com base neste conceito, procuraremos examinar se as medidas restritivas de
direito creditório de ICMS preservam, ou não, os princípios da legalidade e irretroatividade, e
conseqüentemente, o princípio da não-surpresa.
O princípio da legalidade foi previsto genericamente no art.5°, II da Constituição
Federal, por meio da conhecida expressão “ninguém será obrigado a fazer ou não fazer
alguma coisa senão em virtude de lei”, e acabou recebendo especial destaque ao ser
reafirmado em matéria tributária pelo art. 150, I do Texto Supremo, que dispôs ser vedado
“exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”.
O sentido da palavra lei apresentado pelo aludido dispositivo constitucional, é a
lei em sentido estrito ou, mais especificamente, as espécies normativas taxativamente
enumeradas no rol do art. 59 da CF/88 (emendas à Constituição, leis complementares,
ordinárias e delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções). Nenhuma
outra espécie normativa pode prestar-se a instituir ou majorar tributo. Por isto, decretos
executivos e resoluções estaduais, comunicados, instruções normativas, dentre outras, não
podem criar tributo ou aumentar a carga tributária, posto que o Poder Executivo não tem
autorização legal para tanto e não pode se imiscuir em atos privativos do Poder Legislativo.
O princípio da legalidade é um dos pilares do sistema tributário e tem por fim
conter a discricionariedade da administração tributária. Só a lei pode servir de garantia contra
arbitrariedade, capaz que é de outorgar a indispensável coerência ao ordenamento jurídico. E
nem poderia ser diferente, pois conceitualmente o tributo é prestação pecuniária compulsória
que importa sacrifício patrimonial dos sujeitos em direção aos cofres públicos, razão pela qual
só mesmo a lei formal, editada pelos representantes da coletividade, e conforme a vontade
soberana, está apta a impor um gravame fiscal. Eis o primado conquistado pela sociedade que
concretiza a democracia.
Devem estar previstos em lei todos os elementos e aspectos essenciais que
compõem a regra matriz de incidência tributária, principalmente aqueles determinantes do
quantum do débito¸ como é o caso do direito de abatimento do ICMS incidente nas operações
anteriores. A imposição tributária não pode partir de critérios e juízos de valor subjetivos
porque isto significaria a retomada do regime monárquico.
Alguns dos atos normativos editados pelo Poder Executivo, além de não observar
o princípio da legalidade, são dotados de efeitos retroativos quanto as suas regras restritivas
ao direito de apropriação de crédito de ICMS, como é o caso, por exemplo, da Resolução n°.
3.166/2001 editada pelo Estado de Minas Gerais.
141
Em matéria tributária, salvo as exceções previstas no art. 106 do CTN (edição de
lei interpretativa ou que comine penalidade menos severa) a lei tributária deve respeitar o
princípio da irretroatividade, previsto no art. 150, III, a da CF/88, que veda a cobrança de
tributos “em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os
houver instituído ou aumentado”.
Considerando que as regras da Resolução n°. 3.166/2001 e suas alterações
posteriores têm o nítido propósito de majorar a carga tributária assumida pelo contribuinte,
por vedar o aproveitamento integral de créditos de ICMS, não se enquadram nas exceções
legalmente admitidas à irretroatividade tributária e, portanto, somente podem atingir fatos
geradores posteriores a sua entrada em vigor.
Como exemplo claro de arbitrária retroatividade, pode-se citar a Resolução n°.
4.041 de 14 de novembro de 2008 que alterou a Resolução n°. 3.166/2001, e em seu art. 1°
expressamente previu que os contribuintes adquirentes de mercadorias remetidas por
estabelecimentos industriais localizados nos municípios ali especificados deveriam efetuar o
estorno do crédito desde abril de 2005, conforme o município de origem das mercadorias.
Partindo do pressuposto de que os creditamentos são feitos pelos contribuintes,
com base na legislação vigente que assegura a plenitude do crédito, resta configurado ato
jurídico perfeito insuscetível de modificação por ato administrativo ou norma infralegal
superveniente que entenda aplicável uma regra excepcional em que, até então, não se incluía
nominalmente a legislação do estado de origem. Não se pode compactuar que uma norma
posterior discipline sobre algo já incorporado ao patrimônio do particular, pois isto atingiria a
estabilidade das relações jurídicas e o próprio direito de propriedade.
Arremata-se ponderando que se tais normas têm caráter verdadeiramente
constitutivo da obrigação tributária para os contribuintes adquirentes de mercadorias
incentivadas, então, devem de igual forma ter eficácia prospectiva, não podendo retroagir a
fatos geradores pretéritos a sua publicação, sob pena de ofender não só o princípio da não-
surpresa, dotado de elevado prestígio no ordenamento pátrio, como, também, o sobreprincípio
da segurança jurídica.
142
inconstitucionalidade pelo STF. Sendo assim, torna-se imperioso examinar agora os efeitos
temporais e materiais da anulação dos benefícios fiscais, a fim de aferir as suas conseqüências
práticas para o contribuinte adquirente de mercadorias incentivadas em outros estados.
Ocorre que essa interpretação deve ser empreendida com cautela, pois, no caso, a
declaração de normas concessivas de estímulos fiscais irá causar grandes prejuízos de ordem
patrimonial para os contribuintes que, acreditando na validade das normas editadas por agente
competente, realizaram transações jurídicas, concretizadas no tempo, projetaram a sua
atividade econômica, com base na carga tributária que presumiam ser a correta. Sendo assim,
qualquer alteração no critério jurídico do lançamento tributário só pode valer para o futuro30, e
jamais retroagir para surpresa daquele que acreditou firmemente ter agido em conformidade
com interpretação oficial da lei. (MARTINS; MARONE, 2006, p. 56).
Lembramos que há expressa manifestação legislativa nesse sentido, ex vi, do art.
27 da Lei n°. 9.868/99, permitindo a interpretação de eficácia ex nunc, sempre que a
retroatividade da norma, tida por inconstitucional, puder gerar lesão ao cidadão ou ao Poder
Público, tratando-se de comando fundado em razões de segurança jurídica e interesse social.
Vejamos:
30
É isto que determina o Art. 146 do CTN, segundo o qual “a modificação introduzida de ofício ou em
conseqüência de decisão administrativa ou judicial nos critérios jurídicos adotados pela autoridade
administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo,
quanto a fato gerador ocorrido posteriormente, à sua introdução”.
143
Art. 27 – Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em
vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o
Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir
os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu
transito em julgado ou de outro momento que venha ser fixado.
Se o STF pode modular os efeitos de suas decisões em prol do fisco nos casos de
declaração de inconstitucionalidade de normas relativas à imposição de tributos, limitando,
assim, o direito à repetição de indébito dos contribuintes, com base no argumento de lesão ao
Poder Público, por qual razão não poderia modular os efeitos de suas decisões em prol dos
contribuintes que se beneficiaram de incentivos fiscais inválidos, já que isto, certamente,
implicará lesão não só ao seu patrimônio, como, também, a terceiros que com eles
mantiveram relação econômica?
Verifica-se um conflito normativo entre o disposto no art. 8° da LC n°. 24/75 e o
art. 146 do CTN, isto é, uma vez declarada a inconstitucionalidade da norma concessiva de
estímulo fiscal pelo STF, haverá que se aplicar a sanção prevista na primeira parte do inciso I
do art. 8° da LC n°. 24/75 (a nulidade do ato), pois, de acordo com a premissa que fixamos, a
sanção prevista na segunda parte do I do referido dispositivo é simplesmente inaplicável por
violar o princípio da não-cumulatividade. Todavia, a aplicação da sanção de nulidade do ato
concessivo do benefício não pode acarretar o restabelecimento da exigência fiscal dos valores
recolhidos a menor, pois tal penalidade importará modificação do critério jurídico de
lançamento adotado pela autoridade administrativa estadual no exercício do lançamento, e,
portanto, violará o disposto no Código Tributário Nacional.
A anulação de benefícios fiscais pelo STF só pode projetar seus efeitos para o
futuro (ex nunc), seja por acusar prejuízo patrimonial aos cidadãos, seja por alterar critério
jurídico de lançamento tributário. Em síntese, as conseqüências da retroação da invalidação
dos atos concessivos de benefícios fiscais causarão agravos ainda maiores ao Direito do que
aqueles que justificaram a sua invalidação, por afrontarem valores máximos, como os da
segurança jurídica e da proteção da confiança e da boa-fé dos contribuintes.
A análise dos efeitos materiais da anulação dos benefícios fiscais, por decisão do
STF, deve ser feita sob dois prismas distintos: o do vendedor, que se beneficia de incentivo
fiscal concedido por um estado e o do adquirente da mercadoria sediado em outro estado.
144
No caso do vendedor, o efeito da declaração de inconstitucionalidade deve ser
unicamente a impossibilidade de continuar usufruindo os benefícios fiscais tidos como
inválidos, pois em relação aos fatos geradores pretéritos, as relações jurídicas já se efetivaram
com base em critério jurídico de lançamento que não pode mais ser alterado de forma
retroativa, nem mesmo por decisão judicial.
Mas, ainda que essa premissa pudesse ser afastada, o fato é que a cobrança
retroativa do tributo desonerado não pode estar acompanhada da imposição de penalidades,
juros de mora e outros consectários, posto ter o contribuinte agido nos estritos limites das
normas e atos expedidos pelas autoridades administrativas de seu território. Nesse sentido,
prevê o art. 100 do CTN:
Art. 100. São normas complementares das leis, dos tratados e das
convenções internacionais e dos decretos:
I – os atos administrativos expedidos pelas autoridades administrativas;
II – as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição
administrativa, a que a lei atribua eficácia normativa;
III – as práticas reiteradamente observadas pelas autoridades
administrativas; (...)
Parágrafo único. A observância das normas referidas neste artigo exclui a
imposição de penalidades, a cobrança de juros de mora e a atualização
do valor monetário da base de cálculo do tributo. (Grifamos)
145
Se, após a declaração de inconstitucionalidade da norma concessiva do estímulo
fiscal, o estado de origem vier a exigir o tributo que não foi pago por conta do aproveitamento
de um benefício, impõe-se, mesmo assim, seja atribuído o crédito correspondente ao
estabelecimento destinatário das mercadorias incentivadas. Uma vez concretizada esta
hipótese, não há como admitir tanto a nulidade do ato quanto a ineficácia do crédito
apropriado pelo estabelecimento destinatário, pois isto, de igual forma, acarretará a violação
do princípio da não-cumulatividade.
Klaus Eduardo Rodrigues Marques (2010) conclui argutamente pela legitimação
do direito ao crédito após a declaração de inconstitucionalidade do benefício fiscal,
sustentando que:
146
apropriar do crédito em igual proporção.
Verifica-se claramente neste exemplo que o motivo supostamente autorizado a
prática da glosa de créditos pelo Estado de Minas Gerais, simplesmente desaparece a partir da
exigência do imposto, antes dispensado pelo Estado do Espírito Santo, mas que se tornou
obrigatório por força do efeito da aplicação da sanção prevista na primeira parte do inciso I do
art. 8° da LC n°. 24/75.
Não se pode cogitar, ao se admitir essa tese, que a legitimação do crédito ocorre
pelo pagamento do imposto anteriormente dispensado. A legitimação do crédito se dá pela
efetiva cobrança ou exigência do imposto outrora dispensado.
O entendimento segundo o qual, o pagamento é a razão legitimadora do crédito,
afasta a premissa máxima deste estudo, em que o sentido da expressão cobrado prevista no
art. 155, § 2°, I da CF/88 é incidido e não pago. E isto poderá gerar várias distorções de
ordem prática, pois pode haver situações em que, mesmo depois de declarada a
inconstitucionalidade da norma concessiva do benefício fiscal e exigido o imposto dispensado
pelo estado concedente, o beneficiário deixe de efetuar o pagamento, seja por não ter
condições financeiras para suportar o encargo, seja porque à época da determinação do
pagamento já encerrou suas atividades, seja por qualquer outro motivo.
E nesses casos, como ficará o direito creditório do contribuinte adquirente das
mercadorias? Nesta linha de raciocínio, certamente não haverá pagamento para legitimar o
seu crédito. Deve o contribuinte adquirente pagar a conta e ser penalizado por norma
inconstitucional editada por outro estado da Federação e sofrer sozinho os impactos da guerra
fiscal? Não, definitivamente não é este o propósito de um Estado Democrático de Direito.
Por essas razões, é preciso que fique claro não ser o pagamento efetivo pelo
fornecedor o motivo da legitimação do crédito do adquirente, mas, sim, a exigência do
imposto anteriormente desonerado.
147
O aplicador do direito tem o papel indiscutível de atribuir a máxima efetividade às
normas constitucionais, sendo diariamente desafiado, como bem pondera Juarez Freitas
(2005, p. 320-323), a realizar uma cromática positivação derradeira, capaz de oferecer as
condições objetivas para a formação do sistema axiológico-constitucional em melhores
feições. Para o autor inexiste resposta única, assim como inexiste princípio jurídico absoluto,
o que não significa afirmar que a relatividade implique debilidade eficacial, daí porque são
perfeitamente conciliáveis os métodos exegéticos tópico e sistemático.
A jurisprudência dos tribunais estaduais de justiça e do STJ ainda está bastante
oscilante e obscura, ora reconhecendo a inconstitucionalidade dos atos normativos, que
fundamentam a prática da glosa de créditos de ICMS, ora admitindo como válidas as
manifestações fazendárias nesse sentido. Como está fora de dúvidas que o tema envolve
questões de ordem eminentemente constitucional, certo é que, em última instância, é o STF o
tribunal competente para dar solução ao problema.
A solução está nas mãos do Judiciário, a menos que haja uma reforma completa e
estrutural na sistemática atual do ICMS, o que como veremos mais adiante, depende de
vontade política e de cooperação intragovernamental, o que vai de encontro ao modelo
arraigado de autonomia das unidades federativas, que não querem abrir mão de poder e das
condições que lhe asseguram arrecadar cada vez mais. Por isso, a jurisprudência do STF está a
merecer maior atenção de nossa parte.
Os atos dos estados que desencadeiam a guerra fiscal são repelidos por larga
jurisprudência na Corte Suprema. E outra não poderia ser a postura do STF diante de normas
concessivas de benefícios fiscais, em desacordo com as regras editadas pelo legislador
constitucional e complementar, que pretendeu dar um tratamento federativo uniforme em
matéria de ICMS. Se tais normativos não preencheram os requisitos mínimos legais para
legitimar os estímulos fiscais, oferecidos pelos entes políticos, deverão, então, ser expulsos do
ordenamento jurídico.
Por outro lado, não têm sido acertados os pronunciamentos do STF quando são
colocadas, sob sua apreciação, normas que, a pretexto de proteger os estados contra a guerra
fiscal, acabam violando direitos e garantias fundamentais constitucionalmente assegurados
aos seus contribuintes. Falando de outro modo, quando o assunto é a glosa de créditos de
ICMS, não tem sido dado o Direito, como se espera daquele Tribunal, enquanto guardião mor
da Magna Carta.
148
Com o devido respeito, os precedentes da Suprema Corte invocam erroneamente o
princípio da não-cumulatividade para legitimar as medidas unilaterais de estorno de créditos
adotadas pelos Estados (COÊLHO; MANEIRA, 2010, p. 4), quando na verdade, deveriam
utilizar tal primado para rechaçar tais práticas. Está havendo um manuseio inapropriado e
descompromissado dos sentidos alcançados pelos dispositivos constitucionais em apreço,
aliado a um falacioso normativismo estrito.
A guisa de ilustração vejamos decisão monocrática proferida nos autos do
Recurso Extraordinário de n° 463.079/MG:
Mas, sóbria decisão recentemente proferida pela Min. Ellen Gracie elucida que
alguns dos principais argumentos suscitados nos tópicos anteriores estão a merecer a
consideração da Corte Suprema, e que, portanto, há plausibilidade jurídica nessas teses. Pelo
brilhantismo de sua fundamentação, transcrevemos na íntegra o decisum:
152
apreciou a ADI 2.377-MC, DJ 7.11.2003, cujo relator foi o Min. Sepúlveda
Pertence:
“2. As normas constitucionais, que impõem disciplina nacional ao ICMS,
são preceitos contra os quais não se pode opor a autonomia do Estado, na
medida em que são explícitas limitações. (Grifo do autor)
3. O propósito de retaliar preceito de outro Estado, inquinado da mesma
balda, não valida a retaliação: inconstitucionalidades não se compensam.”
O risco de dano está presente no fato de que a sede administrativa da
Requerente está na iminência de ser leiloada. (Grifo do autor)
5. A pretensão manifestada pela Requerente não equivale, propriamente, à
simples atribuição de efeito suspensivo ao recurso extraordinário. Para que
seja obstado o curso da Execução Fiscal, faz-se necessária a concessão de
tutela com tal efeito, conforme já destacado por este Tribunal por ocasião do
julgamento da AC 2.051 MC-QO, rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ª Turma, DJe
9.10.2008. A pretensão, pois, em verdade, exige a suspensão da
exigibilidade do crédito tributário.
6. Ante o exposto, reconsidero a decisão anterior, conheço da ação cautelar e
concedo medida liminar para suspender a exigibilidade do crédito tributário
em cobrança, nos termos do art. 151, V, do CTN, sustando, com isso, a
execução e os respectivos atos expropriatórios. Publique-se, intimem-se e
cite-se o Estado requerido. Brasília, 21 de junho de 2010. (Agr. Reg. AC
2611/MG, DJ 28.06.2010).
154
7 CRITÉRIOS EXEGÉTICOS PARA A SUPERAÇÃO DO CONFLITO
Art. 102, I,
“a”
Art. 150, I
Art. 155,
2 ,I
Art. 155, 2 ,
XII, “g”
Com efeito, várias perguntas ficam sem resposta, segundo esse modelo.
Quais as relações existentes entre as regras e os princípios constitucionais?
São somente os princípios que atuam sobre as regras ou será que as regras
também agem simultaneamente sobre o conteúdo normativo dos princípios?
Quais são as relações existentes entre os próprios princípios constitucionais?
Todos os princípios possuem a mesma função ou há alguns que ora
predeterminam o conteúdo, ora estruturam a aplicação de outros? Quais são
as relações entre as regras legais, já consideradas válidas, e os princípios e as
regras de competência estabelecidos na Constituição? São somente as
normas constitucionais que atuam sobre as normas infraconstitucionais ou
será que essas também agem sobre aquelas? (ÁVILA, 2008, p. 126-127)
156
O autor propõe, então, a substituição da tradicional noção de hierarquia, pautada
em uma sistematização linear (norma superior constitui o fundamento da norma inferior),
simples (baseada numa relação de hierarquia linear entre as normas) e não gradual entre duas
normas jurídicas (normas estão, ou não, sistematizadas enquanto hierarquicamente postas),
que tem sérias implicações no plano da validade das normas, por um novo modelo de
sistematização circular (normas superiores condicionam as inferiores, e as inferiores
contribuem para determinar os elementos das superiores), complexo (não há apenas uma
relação vertical de hierarquia, mas várias relações horizontais, verticais e entrelaçadas entre as
normas) e gradual (a sistematização será tanto mais perfeita quanto maior for a intensidade da
observância dos seus vários critérios). (IBID., 125-127).
A questão posta em discussão não é pacífica. É o entendimento de Geraldo
Ataliba citado por Ruy Samuel Espíndola (1999, p. 155-165): "mesmo no nível constitucional,
há uma ordem que faz com que as regras tenham sua interpretação e eficácia condicionadas
pelos princípios. Estes se harmonizam, em função da hierarquia entre eles estabelecida, de
modo a assegurar plena coerência interna ao sistema".
Por essa razão, alguns princípios são considerados irreformáveis, ou seja, estão
imantados pela cláusula da inabolibidade, ao passo que outros podem ser, na forma do
processo constitucional legislativo, suprimidos pelo poder constituinte derivado.
Preferimos as conclusões dos que acreditam que não há hierarquia entre as
espécies normativas, apesar de serem elas dotadas de diferentes níveis de concretização e
densidade semântica. O princípio da unidade da Constituição impede a existência de normas
constitucionais antinômicas ou incompatíveis, podendo haver, por outro lado, tensão das
normas entre si, que pode ser resolvida, mediante utilização dos postulados jurídicos e
critérios hermenêuticos, conforme propostas a serem tratadas adiante.
Os postulados são espécies normativas diferentes dos princípios e das regras, por
não se situarem no mesmo nível de aplicação. Enquanto os postulados orientam a aplicação de
outras normas, os princípios e regras são o próprio objeto da aplicação. Além disso, não tem
os mesmos destinatários, pois os princípios e regras são dirigidos primariamente ao Poder
157
Público e contribuintes, ao passo que os postulados são dirigidos para o intérprete e aplicador
do direito. Por isso, qualificam-se como metanormas ou normas de segundo grau (ÁVILA,
2008, p. 122-123). Nos dizeres de Álvaro Cruz, “os postulados devem ser entendidos como
elementos sem os quais soçobram a coerência, a integridade e a consistência do Direito”.
(CRUZ, 2007, p. 37).
Mas os postulados normativos não funcionam como qualquer norma que
fundamenta a aplicação de outra, como é o caso dos sobreprincípios (exemplos: Estado de
Direito, segurança jurídica e devido processo legal). A diferença é que os sobreprincípios
situam-se no próprio nível das normas de aplicação, buscando, no entanto, um estado ideal de
coisas mais amplo que o dos princípios. Os postulados estão em um nível superior de normas
que estruturam efetivamente (e não somente fundamentam) a aplicação de outras. (ÁVILA,
2008, p 135).
Existem dois tipos de postulados: (i) os meramente hermenêuticos, aqueles
destinados à compreensão em geral do Direito e (ii) os aplicativos, cuja função é estruturar a
correta aplicação de outras normas. (ID., IBID.).
Como exemplos de postulados hermenêuticos, citem-se: (i) o postulado da
unidade do ordenamento jurídico, que exige do intérprete o relacionamento entre a parte e o
todo mediante emprego das categorias da ordem e unidade; (ii) o postulado da coerência, que
impõe ao intérprete a obrigação de relacionar determinadas normas com outras que lhes são
superiores e (iii) o postulado da hierarquia, que requer a compreensão do ordenamento como
uma estrutura escalonada de normas. Entre os principais postulados aplicativos destacam-se:
(i) postulado da razoabilidade; (ii) postulado da proporcionalidade e (iii) postulado da
segurança jurídica . (IBID., p. 124).
Pode-se também afirmar que os postulados não funcionam da mesma maneira,
pois alguns são aplicáveis incondicionalmente e outros dependem da existência de
determinados elementos, pautando-se por alguns critérios. Como exemplos de postulados
inespecíficos (incondicionados), destacam-se a ponderação, a concordância prática e a
proibição de excesso. Como exemplos de postulados específicos (condicionados) apontam-se
a igualdade, a razoabilidade e a proporcionalidade. (IBID., p. 142-143).
Partindo do pressuposto de que não há hierarquia entre princípios e regras, e tendo
sido apresentado o conceito dos postulados enquanto terceira categoria normativa, imperioso
se faz definir qual o melhor caminho a ser seguido no caso de conflito entre normas
constitucionais.
158
7.2.2 Em busca do melhor critério exegético – a técnica da ponderação
31
A técnica da subsunção pode ser definida como aquela em que o aplicador busca enquadrar uma premissa
menor, os fatos, a uma premissa maior, a norma jurídica, uma vez que a situação ocorrida no mundo fenomênico
se amolda perfeitamente à norma geral e abstrata, o que traz como conseqüência o surgimento de uma norma
individual e concreta.
159
a técnica da ponderação é mais que suficiente para o deslinde da problemática da glosa de
créditos de ICMS.
Estabeleceremos, então, um critério metodológico para que possamos empreender
a ponderação dos interesses e valores em jogo, tendo como base as já identificadas normas
constitucionais conflitantes. Para tanto, percorreremos o seguinte caminho analítico: (i)
análise dos interesses do contribuinte que sofre a glosa de créditos de ICMS (sujeito ativo que
tem direito subjetivo ao crédito de ICMS), à luz do sobreprincípio da segurança jurídica; (ii)
análise dos interesses da Fazenda Pública Estadual (sujeito passivo cujo dever jurídico é
admitir o crédito de ICMS) que impõem a glosa de créditos de ICMS, à luz dos
sobreprincípios da justiça fiscal e (iii) utilização dos postulados da razoabilidade,
proporcionalidade e eficiência para sopesar as normas conflitantes para então concluir pela
melhor solução a ser dada a problemática.
Noutra perspectiva, isolaremos as normas constitucionais conflitantes e daremos
foco aos sobreprincípios situados no mesmo plano normativo dos princípios e regras em
tensão, porém que abarcam um maior espectro do estado ideal de coisas a ser alcançado, para
então subirmos para o plano das normas de segundo grau (metanormas) ou postulados da
razoabilidade, proporcionalidade e eficiência, permitindo o exercício da técnica de
ponderação, então proposta.
160
Registre-se que o conteúdo da segurança não se confina em uma estrutura
eminentemente fechada e impregnada de conceitos estáticos. É, antes, algo
dinâmico que busca a consecução dos valores jurídicos, pautando-se por uma
interpretação teleológica, em que maior é a finalidade da norma, sobretudo a
partir da Constituição de 1988. Nesse arcabouço teórico, compreende-se,
então, que a segurança jurídica se sustenta na garantia de certeza e
estabilidade, mediante as quais as pessoas possam estar sempre cientes de
seus direitos, não havendo dúvida quanto à impossibilidade de eventos
inesperados, no campo jurídico, sem o seu prévio conhecimento.
(CAVALCANTE, 2009, p. 114).
161
aqueles que pensam exatamente em sentido contrário, isto é que a boa fé estaria abrangida
pelo princípio da proteção da confiança.
Misabel Derzi (2009) em profunda e aclamada pesquisa sobre o tema, apresenta a
seguinte proposta de distinção elaborada pelo jurista alemão Roland Kreibich:
162
prática, pois o princípio da não-cumulatividade dispensa a aferição daquilo que realmente foi
pago nas operações anteriores.
Mas admitamos, num raciocínio dialético, que a premissa máxima do verdadeiro
alcance do princípio da não-cumulatividade pudesse ser afastada. Suponhamos que: (i) viesse
a prevalecer o entendimento segundo o qual para fins de apuração do crédito das operações
anteriores considera-se o imposto pago e não o imposto incidente,ou (ii) viesse a prevalecer o
entendimento de que outros benefícios fiscais, como redução de base de cálculo ou de
alíquota, isenção parcial, alíquota zero, crédito presumido, diferimento, etc., constituem
modalidades de isenção, sendo, portanto, considerados exceções ao princípio da não-
cumulatividade (como já vem julgando o STF nos últimos tempos).
Diante da concretização desses cenários, afloram duas indagações: (i) a
apropriação do crédito de ICMS tornar-se-ia um fato contrário à ordem jurídica? A resposta
seria SIM; (ii) em razão disso, poderia ser considerada legítima a glosa de créditos de ICMS?
A resposta definitivamente é NÃO, justamente devido ao princípio da proteção da boa fé, que
tutela o contribuinte adquirente, não conhecedor dos benefícios fiscais concedidos pelo estado
de origem das mercadorias ao seu fornecedor, ou melhor, ignora estar agindo em
desconformidade com o direito ou não está consciente da verdadeira situação jurídica que
invalida a sua conduta, toma o crédito do imposto integralmente destacado na nota fiscal.
O STJ uniformizou entendimento acerca da legitimidade do aproveitamento do
crédito de ICMS pelo contribuinte de boa fé destinatário das mercadorias, inclusive nos casos
em que restar reconhecida e declarada a inidoneidade da documentação fiscal, que suportou a
operação:
32
Vide também a Súmula 571 do STF: O comprador de café ao IBC, ainda que sem expedição de nota fiscal,
habilita-se, quando da comercialização do produto, ao crédito do ICM que incidiu sobre a operação anterior.
164
porque estes não têm a obrigação de conhecer a legislação dos estados de seus fornecedores e,
segundo, por não poderem desconsiderar o imposto destacado na nota fiscal.
De igual forma, à luz do princípio da proteção da confiança, a glosa de créditos de
ICMS também não se sustenta. Ainda que os estados defendam que o contribuinte não pode
alegar o desconhecimento ou ignorância quanto aos benefícios fiscais inválidos, posto que já
teriam sido editadas normas restritivas do seu direito creditório, o fato é que tais diplomas,
como assentado, não têm o condão de declarar a inconstitucionalidade de normas instituídas
por outros entes federativos, já que esta competência é exclusiva do Supremo Tribunal
Federal. Admitir essa possibilidade significaria esgotar o princípio da presunção de
constitucionalidade das leis e dos atos emanados do Poder Público.
A conseqüência disso é a geração de enorme desconfiança do contribuinte
adquirente, em relação ao seu estado, este incompetente que é para dizer sobre a
inconstitucionalidade de outro estado e aplicar sanção não autorizada. Além disso, o estado do
contribuinte destinatário promove aplicação retroativa às normas restritivas de direitos
creditórios, criando nova obrigação, inovando o ordenamento jurídico e tornando imprevisível
a atuação do Poder Público.
Esse cenário importa instabilidade total das relações jurídicas, tornando o
contribuinte adquirente desconfiado e receoso de qual caminho seguir. O contribuinte perdido
e inseguro se pergunta: (i) devo cumprir a legislação do meu estado?; (ii) devo observar o
princípio de presunção de constitucionalidade das leis e atos emanados pelos estados de meus
fornecedores, já que não houve pronunciamento em sentido contrário pelo Poder Judiciário?;
(iii) precisarei exigir que meu fornecedor comprove que não utiliza incentivo fiscal,
assumindo as funções fiscalizatórias, inerentes a própria administração fazendária?; (iv) e se
for constatada a utilização de benefícios pelo meu fornecedor, como emitir juízo de valor a
respeito da validade, ou não, dos favores estatais?; (v) de que adianta cumprir a legislação de
meu estado para evitar autuação, se daqui a pouco, ao tomar conhecimento de novos
benefícios concedidos por outros entes, aqui e acolá, então atualizará sua norma e dando-lhe
efeitos retroativos?
Concluindo, se há quebra da confiança depositada pelo contribuinte na relação
jurídica geral e abstrata prevista na lei, o direito positivo perde estabilidade e previsibilidade,
gera insegurança jurídica e agride o princípio da proteção da confiança. Nesse contexto, o
poder legítimo de tributar acaba se transformando em um abominável poder de destruir.
165
7.2.4 Justiça fiscal e solidariedade social
166
de benefício fiscal, seria justa a aplicação da sanção preconizada na segunda parte do inciso I
do art. 8° da LC n°. 24/75 (ineficácia do crédito)?
Independentemente da aplicação de tal sanção ser, ou não, compatível com o
princípio da não-cumulatividade, os estados alegam que: (i) a finalidade das sanções previstas
no art. 8° da LC n°. 24/75 é coibir a guerra fiscal e garantir neutralidade; (ii) toda tributação
encontra fundamentos na solidariedade social e, portanto, os prejuízos decorrentes da atitude
do estado de origem que concedeu benefício fiscal inválido, devem ser repartidos e custeados
por toda a sociedade, inclusive pelos contribuintes adquirentes de mercadorias, sediados em
outro estado.
O desafio é, pois, investigar se a justificativa de tributação com base na
solidariedade social, notadamente no caso da aplicação da sanção da glosa de créditos de
ICMS, garante ou despreza a realização de justiça fiscal.
Devemos levar em conta que o objetivo fundamental do Estado é a construção de
uma sociedade livre, justa e solidária, nos termos do art. 3°, I da Constituição brasileira. Mas
estes valores devem se equilibrar entre si.
A composição entre liberdade, igualdade e solidariedade está sintetizada no
conceito de Estado democrático de direito, que abrange uma concepção mesclada de um
Estado de direito protetivo com um Estado social intervencionista, o que, segundo Marco
Aurélio Greco (2005, p. 53-55), significa equilíbrio: “Não se trata de a liberdade valer mais
que a solidariedade ou a solidariedade mais que a liberdade. Não há predomínio de um sobre
o outro. Há, isto sim, necessidade de compor liberdade com solidariedade e solidariedade com
liberdade.”
Cabe ao intérprete, aspirando unidade de sentido da Constituição, evitar que o
reconhecimento do Estado democrático de direito, a pretexto de consagrar valores
sobremaneira abstratos, como a solidariedade, acabe impondo a utilização desvirtuada das
necessárias funções sociais do Estado e culmine em arbítrio ou excesso de poder.
O ponto, então, é verificarmos se distribuir os prejuízos decorrentes da repudiada
guerra fiscal entre toda a sociedade (contribuintes vendedores do estado de origem que
efetivamente fruíram os benefícios invalidados pelo Poder Judiciário, e os contribuintes
adquirentes do estado de destino, que sequer tinham conhecimento da existência desses
benefícios), em nome da solidariedade social, é algo justo, concretizando o ideal de um estado
protetivo, mas, ao mesmo tempo, intervencionista.
167
A polêmica surge quanto à possibilidade de aplicação da sanção depois da
declaração de inconstitucionalidade pelo STF, pois se for aplicada antes da manifestação do
judiciário, haverá, como vimos, instituição de nova obrigação tributária, isto é, não estamos
diante de uma sanção/penalidade, mas, sim, de nítida imposição fiscal.
Humberto Ávila (2005) não vislumbra a menor possibilidade de se justificar a
tributação, com base no princípio da solidariedade social:
A palavra sanção, segundo Aurélio Pitanga Seixas Filho (2004, p. 47), significa
“forma (punição ou pena) determinada pela lei para quem desobedecer a sua ordem ou
comando”. Verificamos pelo conceito apresentado que uma sanção é penalidade para o sujeito
efetivamente descumpridor da lei; aqui, o estado que concedeu o benefício fiscal inválido ou,
no máximo, para o contribuinte que aproveitou esse benefício. A penalidade, em regra, não
pode ser imputada a terceiro que não tenha qualquer relação jurídica com os sujeitos
envolvidos no ato de fomento a guerra fiscal, a menos que se trate de uma típica hipótese de
responsabilidade tributária, o que de longe não é o caso.
Por isso, ainda que na sua feição de sanção, a glosa de créditos de ICMS não exala
justiça fiscal, pois em nome do valor solidariedade social aniquila-se o valor liberdade, uma
vez que há interferência direta no exercício da atividade privada de terceiro, estranho à
relação ou ao ato jurídico, que ensejou a infração. E quando dois valores máximos objetivados
pelo estado colidem, a conseqüência é a não realização do sobreprincípio justiça fiscal.
Após investigação das normas em pleno estado de tensão, bem como depois do
exame dos fins buscados pelos sobreprincípios da segurança jurídica e justiça fiscal,
passaremos ao estudo da forma de aplicação dessas normas (regras, princípios e
sobreprincípios), ingressando no terreno das metanormas.
168
A razoabilidade e a proporcionalidade, embora comumente tratadas pela doutrina
como princípios, neste trabalho serão empregadas como postulados, isto é, normas
estruturantes de segundo grau, que orientam a aplicação de princípios ou regras.
Luís Roberto Barroso (2006, p. 141) define a razoabilidade como “um parâmetro
de valoração dos atos do poder público para aferir se eles estão informados pelo valor superior
inerente a todo ordenamento jurídico: a justiça”. O autor acredita que a razoabilidade seria
uma norma a ser empregada pelo Poder Judiciário, ou seja, pelos aplicadores do direito, a fim
de permitir maior valoração dos atos expedidos pelo Poder Público, possibilitando a análise
de sua compatibilidade com o sistema de valores elencados na Constituição.
Hugo de Brito Machado (2009, p. 33) leciona ser a razoabilidade uma diretriz da
razão humana, a preconizar a interpretação das leis conducentes a soluções racionais, de modo
que entre duas ou mais soluções possíveis, em face da lei, opta-se pela que se mostre mais
racional. Sem dúvida, à luz de tal conceito, a razoabilidade carregaria elevada carga de
subjetividade e teria pouca utilidade prática para este estudo.
Foi com o propósito de permitir um discurso mais estruturado do direito que
Humberto Ávila (2010, p. 424-425) encontrou estes consistentes critérios de aplicação do
postulado da razoabilidade: (i) diretriz que exige a relação das normas gerais com as
individualidades do caso concreto (razoabilidade-eqüidade); (ii) diretriz que exige uma
vinculação das normas jurídicas com o mundo a que fazem referência (razoabilidade-
congruência); (iii) diretriz que exige relação de equivalência entre duas grandezas
(razoabilidade-equivalência); (iv) diretriz que exige a consistência entre os elementos
constantes de uma regra jurídica, especialmente proibindo a validade de normas que instituem
deveres contraditórios ou sem qualquer sentido prático (razoabilidade-coerência).
O postulado da proporcionalidade, por sua vez, exige que os poderes legislativo e
executivo escolham meios adequados, necessários e proporcionais para a realização de seus
fins. Ávila (2008) dá a exata dimensão do conceito em tela:
169
A aplicação do postulado da proporcionalidade deverá ser precedida de três
exames fundamentais: (i) o da adequação; (ii) o da necessidade e (iii) o da proporcionalidade,
em sentido estrito. (IBID., p. 161-162).
Paulo Bonavides cita frase de Jellinek (2000, p. 356) que dá a exata noção daquilo
que se pretende concluir com o emprego do postulado da proporcionalidade: “o problema da
proporcionalidade é saber se não se atirou no pardal com um canhão”.
Verifica-se que o postulado da razoabilidade exige uma relação entre a medida
adotada e o critério que a dimensiona. Já o postulado da proporcionalidade requer uma relação
entre meio e fim.
Foquemos novamente a problemática da glosa de créditos de ICMS, agora, sim,
ponderando todos os princípios e regras em tensão, utilizando-nos, para tanto, dos postulados
da razoabilidade e da proporcionalidade.
A razoabilidade leva em conta, numa interpretação normativa, aquilo que
normalmente acontece e não o extraordinário. Por isso, as normas infralegais restritivas de
direitos creditórios, com fulcro na LC n°. 24/1975, não observam o critério da razoabilidade-
eqüidade, pois presumem que os benefícios fiscais concedidos por outras unidades federativas
são inconstitucionais e, ao proceder desse modo, ignoram o que normalmente acontece, isto é,
que deve haver presunção de constitucionalidade de leis e atos emanados do Poder Público, e
não o contrário. Um estado não é competente para declarar a inconstitucionalidade de normas
editadas por outros estados. Assim, a aplicação deste tipo de regra deve excluída por falta de
motivação.
De igual forma, a razoabilidade impõe que o legislador eleja causas existentes ou
suficientes para atuação estatal. No caso, sem a necessária manifestação pelo Poder Judiciário
acerca da inconstitucionalidade das normas concessivas de privilégios fiscais, não existem
razões para suportar a exigência do estorno de créditos de ICMS. A partir disso, a norma
torna-se arbitrária e deixa de observar o critério da razoabilidade-congruência.
A medida adotada pelo tipo de norma em análise, isto é, a ineficácia do crédito,
não equivale ao critério a ser corretamente considerado, em que o crédito deve corresponder
ao imposto incidente nas operações anteriores. Ao utilizar critério distinto, o de
correspondência do crédito ao imposto pago na operação anterior, acaba distorcendo a correta
dimensão da medida, deixando, então, de observar o critério da razoabilidade-equivalência.
A razoabilidade, por fim, determina a coerência, ou ausência de contrariedade, da
norma com outras normas constantes do ordenamento jurídico. Assim, o simples fato das
170
normas infralegais restritivas de direitos creditórios conflitarem com os princípios da não-
cumulatividade, legalidade, irretroatividade, não-discriminação de bens, em razão da
procedência ou destino, inclusive com as regras que definem as competências exclusivas do
Senado Federal para a fixação de alíquotas e a do Supremo Tribunal Federal para declarar a
inconstitucionalidade de normas ou atos estaduais, por si só, já importa absoluta incoerência
sistemática. Logo, não há observância do critério da razoabilidade-coerência, o que torna tais
normas essencialmente contraditórias.
Em última análise, testemos as normas restritivas de direitos creditórios à luz do
postulado da proporcionalidade. Pelo critério de adequação, questionamos: o meio promove o
fim? Para responder, devemos, antes, formular outra pergunta, não menos importante: qual o
fim da norma restritiva em exame? O fim é, sem dúvida, coibir a guerra fiscal. Então, a glosa
de créditos de ICMS consegue alcançar a sua finalidade? É claro que não; muito pelo
contrário. Todo o contexto apresentado neste estudo evidencia que, ausentes métodos
eficientes para coibi-la, a guerra fiscal só vem se acentuando.
Pelo critério da necessidade, questionamos: dentre os meios disponíveis e
igualmente adequados para promover o fim, não há outro meio menos restritivo dos direito
fundamentais afetados? É certo que há um meio infinitamente menos restritivo do direito
fundamental do contribuinte ao crédito do ICMS incidente nas operações anteriores. Este
meio é justamente a adequada propositura de ADI perante do STF, em face do estado que
ilegitimamente concedeu incentivo fiscal, em desacordo com a Constituição. Não se pode, sob
qualquer pretexto ou argumento, apenar e retaliar o contribuinte adquirente das mercadorias
incentivadas, visto que não cometeu qualquer infração e não contribuiu em nenhuma medida
para deflagrar o conflito interjurisdicional.
Pelo critério da proporcionalidade, em sentido estrito, perguntamos: as vantagens
trazidas pela promoção do fim correspondem às desvantagens provocadas pela adoção do
meio? Definitivamente não, pois, em primeiro lugar a glosa de créditos não alcança o seu fim,
o de coibir a guerra fiscal e, depois, porque causa sensíveis prejuízos ao contribuinte sediado
no estado que editou a norma restritiva, agredindo a sua liberdade de atuação, a ponto de
comprometer a manutenção de suas atividades econômicas e operacionais.
Sendo assim, a glosa de créditos de ICMS não se sustenta sob nenhum dos
critérios de aplicação dos postulados da razoabilidade ou da proporcionalidade.
171
7.3 Uma análise econômica da questão
172
Humberto Ávila (ID., IBID.) qualifica o dever de eficiência como um postulado
que “estrutura o modo como a administração deve atingir os seus fins e qual deve ser a
intensidade da relação entre as medidas que ela adota e os fins que ela persegue”. Para Ives
Gandra Martins (2006, p. 31), a eficiência é um princípio que pode ser definido como “a
adoção de política tributária com mecanismos e instrumentos legais capazes de gerar
desenvolvimento e justiça fiscal, sendo, pois, a arrecadação, mera conseqüência natural e
necessária, para que, sem ferir a capacidade contributiva, gere serviços públicos à comunidade
proporcionais ao nível impositivo”.
Paulo Caliendo (2008) delimita ainda mais o conceito de eficiência e o distingue
de outros conceitos correlatos, como os de eficácia e efetivo:
173
está a lhe causar prejuízos. Essa medida é muito mais célere, uma vez que garante o
abastecimento dos cofres públicos de forma imediata e não deixa o fisco à mercê da
morosidade do judiciário. Mas o fato da glosa de créditos se apresentar mais interessante
economicamente e menos custosa não significa que deva ser adotada. É que o critério em
pauta impõe à administração o dever de escolher, dentre os meios existentes, o menos
dispendioso; desde que em qualquer dos caminhos possíveis para alcançar o mesmo fim, não
haja restrição aos direitos dos seus contribuintes.
Sob o segundo ângulo deve ser analisado se a fazenda pública estadual, para
alcançar o seu fim, coibir a guerra fiscal e não ser prejudicada em razão dela, deveria escolher
o meio que irá promover o fim de modo mais satisfatório possível ou se bastaria
simplesmente a promoção do fim. É que não pode a administração promover seus fins a partir
da escolha entre meios pautada em aspectos quantitativos, qualitativos e probabilísticos. Ou
melhor, a administração, para ser eficiente, não tem liberdade de escolher se um meio pode
promover mais ou menos o fim que outros meios, ou se pode promover pior ou melhor o fim,
ou se pode ainda promover o fim com mais ou menos certeza. Promover o fim de modo mais
satisfatório possível significa escolher um meio que não importe em restrição de direitos
individuais. Por isto, o administrador não pode escolher o meio mais intenso, melhor e mais
seguro para a realização dos seus fins, se isto representar restrição de direitos dos seus
administrados. Se para atingir o seu fim, a fazenda pública tem a sua disposição um meio
menos restritivo dos direitos individuais de seus administrados (ADIN) então é este meio que
deve ser adotado. Em síntese, a administração deverá escolher o meio que promova
minimamente o fim, mesmo que não seja ele o mais intenso, melhor ou mais seguro.
A administração fazendária deve ser cautelosa ao agir melhor fiscalmente para
evitar que, a pretexto de se realizar o fim de modo mais eficiente, acabe contrariando outras
bases da ordem econômica teorizadas na Constituição, especialmente a livre iniciativa, que é
antes de tudo, fundamento essencial da República Federativa do Brasil.
174
8 REFORMA TRIBUTÁRIA E EXPECTATIVAS FUTURAS
Pablo Ibañez (s/d, p. 1) relata que, desde os primórdios da Federação brasileira até
os dias atuais, houve apenas três grandes reformas tributárias: (i) a primeira durante o governo
Getúlio Vargas; (ii) a segunda durante o regime militar e (iii) a terceira com a Constituição
Federal de 1988. Isto evidencia que as reformas tributárias estruturais sempre estiveram
ligadas a um contexto histórico de grandes transformações políticas no cenário nacional.
Segundo o autor, desde a abertura econômica na década de 1990, foram várias tentativas de
reforma, mas todas frustradas.
Diante das causas e dos efeitos da guerra fiscal apresentados ao longo deste
estudo e da dificuldade do Poder Judiciário em encontrar solução justa e eficiente para os
casos concretos, principalmente àqueles atinentes à glosa de créditos de ICMS nas operações
interestaduais, parece-nos que a alternativa para dar cabo ao problema, porém de difícil
concretização, é mesmo a Reforma Tributária. Interessados nesta reflexão, nos deteremos na
síntese da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) n°. 233/2008, atualmente
tramitando33 no Congresso Nacional.
É claro que se chegou à Proposta de Emenda Constitucional pela imperiosa
necessidade de se solucionar, em definitivo, a guerra fiscal, já que os demais assuntos
poderiam ser resolvidos por meio de normas infraconstitucionais.
Feitas essas considerações preliminares, e respeitando os limites desta pesquisa, a
questão da Reforma Tributária será analisada exclusivamente com o objetivo de verificar o
modo com que a PEC n°. 233/2008 tratou a problemática da guerra fiscal, em relação ao
ICMS, sem nos preocupar com as consistências de ordem jurídica e prática de suas propostas,
tampouco se as mesmas se prestarão a cumprir os seus objetivos finalísticos.
Na Exposição de Motivos n°. 16/MF, o então Ministro Guido Mantega (2010, p.1)
aponta os principais objetivos da PEC n°. 233/2008: (i) a simplificação do sistema tributário
nacional; (ii) o avanço no processo de desoneração tributária; (iii) a eliminação de distorções
que prejudicam o crescimento da economia brasileira e a competitividade das empresas,
principalmente no que diz respeito à chamada guerra fiscal entre os estados; (iv) a ampliação
do montante de recursos destinados à Política Nacional de Desenvolvimento Regional; (v)
instituição de um modelo de desenvolvimento regional mais eficaz.
33
O processo de aprovação de uma PEC é lento e complexo. Para se ter uma dimensão do processo, quando uma
PEC é apresentada à Câmara dos Deputados, passa primeiro pela análise da Comissão de Constituição e Justiça e
de Cidadania (CCJ) quanto à sua admissibilidade, exame esse que considera aspectos de constitucionalidade,
legalidade e de técnica legislativa da proposta. Uma vez aprovada, a Câmara criará uma comissão especial
específica para analisar o seu conteúdo, com prazo de 40 sessões do plenário para proferir parecer. Na sequência,
a PEC deverá ser votada pelo plenário em dois turnos, com intervalo de cinco sessões entre uma e outra votação.
Para ser aprovada, precisa de, pelo menos, 308 votos (3/5 dos deputados) em cada uma das votações. Depois de
aprovada na Câmara, a PEC segue para o Senado, onde é analisada novamente pela CCJ e, em seguida, pelo
plenário, onde novamente precisa ser votada em dois turnos. Se o Senado aprovar o texto exatamente como o
recebeu da Câmara, a emenda é promulgada pelas Mesas da Câmara e do Senado. Se forem necessárias
alterações, precisará voltar para a Câmara, para nova votação. A proposta vai de uma Casa para outra até texto
idêntico ser aprovado pelas duas Casas. (CAMARA DOS DEPUTADOS. Conheça a tramitação de PECs.
Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/agencia/noticias/70153.html>. Acesso em: 22 ago. 2010)
176
Verifica-se que a guerra fiscal é uma das principais bandeiras para justificar a
premente necessidade da reforma tributária. Vejamos, então, quais foram os mecanismos de
ajuste previstos para alteração do regime jurídico do ICMS. Em seguida teceremos
considerações sobre as medidas especificamente direcionadas para o combate à guerra fiscal.
As principais propostas de alterações apresentadas pela PEC n°. 233/2008, tal
como foi minutada, para instituição do novo ICMS, nos moldes do art. 155-A, a ser incluído
no texto constitucional, são sintetizadas no quadro a seguir:
34
Fonte: ZOUVI, Alberto; TRINDADE, Fernando Antônio Gadelha; SILVEIRA, José Patrocínio;
PELLEGRINI, Josué Alfredo; MIRANDA, Ricardo Nunes. Reforma Tributária: a PEC nº. 233, de 2008.
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177
padrão, aprovando ou rejeitando as proposições do Confaz;
b) Confaz: poderá reduzir e restabelecer a alíquota atribuída a determinada
mercadoria ou serviço, desde que a alíquota resultante corresponda a uma das
estabelecidas pelo Senado, conforme item a.1;
c) Lei Complementar: poderá definir as mercadorias e serviços passíveis de ter
sua alíquota aumentada ou reduzida por lei estadual, bem como os limites e
condições para essas alterações, não se aplicando nesse caso as regras
mencionadas nos itens a.1 e a.2.
Não haverá alíquotas interestaduais e internas, mas simplesmente alíquotas
uniformes por mercadorias e serviços aplicáveis às operações e prestações,
internas e interestaduais, e às importações.
Poderá haver diferenciação de alíquota em função de quantidade e tipo de
consumo, sendo que, mesmo nesse caso, as alíquotas deverão, em regra, ser
uniformes em todo o território nacional.
Inversão do critério de apropriação atualmente no modelo misto, com
predominância da apropriação pelo estado de origem para um modelo em que o
estado de origem ficaria com o percentual de 2% da incidência do imposto e o
estado de destino com o restante (princípio do quase destino).
Apropriação da receita de Exceções em que o imposto pertencerá integralmente a um só estado: a) de
ICMS nas operações origem, nas operações e prestações sujeitas a incidência inferior a 2%; e b) de
destino, nas operações com petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis
interestaduais líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica.
Regime de transição gradual para a tributação do ICMS no destino, reduzindo-
se a alíquota na origem progressivamente e completando-se o processo no
oitavo ano após a aprovação da reforma tributária, com a criação do novo
ICMS.
Poderá dispor sobre: fatos geradores e contribuintes; base de cálculo, de modo
que o próprio imposto a integre; local das operações e prestações; regime de
compensação do imposto; garantia do aproveitamento do crédito do imposto;
Competência da lei
substituição tributária; regimes especiais ou simplificados de tributação;
complementar processo administrativo fiscal; competências e funcionamento do novo Confaz;
sanções aplicáveis aos estados e ao DF e aos seus agentes públicos, por
descumprimento das normas que disciplinam o exercício da sua competência e
o respectivo processo de apuração dessas infrações.
a) editar regulamentação única;
b) autorizar a transação e a concessão de anistia, remissão e moratória a ser
concedida mediante lei estadual específica;
Competências do Confaz c) estabelecer critérios para a concessão de parcelamento de débitos fiscais;
d) fixar as formas e os prazos de recolhimento do imposto;
e) estabelecer critérios e procedimentos de controle e fiscalização
extraterritorial.
Vigência do novo ICMS A partir de 1º de janeiro do oitavo ano subseqüente ao da promulgação da PEC.
De fato, várias das iniciativas propostas têm como escopo coibir a guerra fiscal
entre os estados. A mudança da cobrança do ICMS nas transações interestaduais para o estado
de destino parecer ser uma solução inteligente para o problema e, como bem planejado, deve
ser empreendida de forma gradual para não comprometer abruptamente a sistemática de
distribuição de receitas entre as unidades federativas, mostrando coerência no regime de
transição gradual. A manutenção da cobrança do percentual de 2% do imposto no estado de
origem é suficiente para desestimular a competição predatória entre os estados, coerente com
os objetivos macros da reforma.
178
Outrossim, há evidente preocupação com o equilíbrio do desenvolvimento
regional. Os dispositivos da PEC denotam a intenção de oferecer garantias para a integral
recomposição das eventuais perdas de receita dos estados, por meio da criação Fundo de
Equalização de Receitas (FER). A idéia é calibrar uma fórmula de compensação entre estados
mais beneficiados e mais prejudicados com as mudanças.
Além disso, a proposta de criação de um Fundo Nacional de Desenvolvimento
Regional (FNDR) visa permitir o controle da aplicação dos recursos da Política Nacional de
Desenvolvimento Regional, o que denota um indiscutível progresso, se compararmos às
incipientes políticas públicas em prática atualmente.
Como sanção à guerra fiscal, os estados ou distrito federal, que infringirem as
regras de concessão de benefícios fiscais, perderão o direito à transferência de recursos do
FPE, FER e FNDR, dentre outras transferências voluntárias, enquanto vigorarem os
privilégios ilegítimos.
Por outro lado, devemos nos atentar para o fato de que o texto da PEC não deixa
claros os mecanismos para assegurar a manutenção dos efeitos de incentivos e benefícios já
concedidos. É certo que há a definição de um prazo de transição para desativar
progressivamente os benefícios já concedidos no âmbito da guerra fiscal, com uma notória
preocupação de impedir novas concessões irregulares. Mas deve haver o compromisso de
assegurar a vigência (ou substituição) dos benefícios em vigor, sob pena de se abrir um
imensurável passivo e contencioso entre estados e contribuintes, cuja repercussão pode, até
mesmo, inviabilizar a aprovação da reforma.
Algumas alternativas poderiam ser estudadas como, por exemplo, a
implementação de anistia e remissão para todos os contribuintes que usufruíssem benefícios
inválidos, para ingresso no regime do novo ICMS sem passivos, litígios, preservando-se a
segurança jurídica. Outra possibilidade seria a convalidação de todos os incentivos que
estivesse em vigor e mudança na sistemática por meio de um mecanismo de transição gradual.
A reforma, objeto da PEC n°. 233/2008, é bastante factível se comparada às
propostas que a antecederam, pois a criação do IVA estadual não importa perda de
arrecadação do ICMS, mas somente mudança na forma de operacionalizá-la. Isto é positivo,
pois é patente a impossibilidade de negociar com os estados qualquer interferência nos seus
regimes de competência. Outro ponto a ser realçado é o de que permanece a substituição
tributária, enquanto boa técnica de arrecadação para os estados, independentemente do
modelo de tributação a ser adotado, se na origem ou no destino.
179
Enfim, não há qualquer pretensão em aprofundarmos no assunto, menos ainda
esgotá-lo, mesmo porque isto seria impossível, já que o tema encontra-se em processo de
franca modelagem e construção.
Com efeito, pretendemos concluir a reflexão apenas pontuando que o verdadeiro
impasse para a concretização da tão deseja reforma tributária está fincado na estrutura de
poder denominada federalismo, que delega autonomia relativa aos governos subnacionais para
realização de suas políticas próprias. Foi por isto que os governos mais centralizadores, como
o de Getúlio Vargas e o do regime militar instalado em 1964, tiveram mais força para retaliar
as políticas individuais dos estados (IBAÑEZ, 2006, p. 157). Tanto é verdade, que, como bem
vimos no capítulo cinco, a guerra fiscal se intensificou com a descentralização dos governos e
a conquista de maior autonomia pelos estados.
Muitas propostas já foram colocadas e descartadas, outras aguardam esforço
político para se viabilizarem, mas nenhuma será eficiente se não trouxer em seu bojo a
federalização do ICMS, pautada numa imposição nacional, com partilha automática da receita
entre as unidades federadas, garantias de fiscalização e arrecadação comuns, sob a supervisão
da máquina fiscal superior da União.
Apesar de o atual contexto político ser mais favorável à tramitação da almejada
reforma tributária, aliado a um processo de acentuado crescimento econômico que impacta
positivamente o resultado da arrecadação fiscal, reduzindo os ambientes de resistência, fato é
que os insucessos reiterados de tentativas de reformas anteriores acabam por nos manter
céticos e descrentes, quanto a real e efetiva possibilidade de aprovação da PEC n°. 233/2008,
nos moldes em que se apresenta.
180
CONSIDERAÇÕES FINAIS
182
Só há duas e únicas hipóteses excepcionais ao princípio da não-cumulatividade: a
isenção e não-incidência. Esta é a razão por que se torna indispensável a análise tópica de
cada benefício fiscal concedido para concluir se se está, ou não, diante de uma hipótese
restritiva, o que deve ser feito à luz da irretocável Teoria da Exoneração Tributária.
Ainda que inarredável premissa pudesse ser afastada, não se admitiria a glosa de
créditos de ICMS antes da declaração de inconstitucionalidade da norma concessiva do
benefício fiscal, tida por irregular pelo Supremo Tribunal Federal. Aceitar que um estado
possa julgar, a seu talante, a legislação editada por outro estado significa usurpar a
competência do Poder Judiciário, destroçando o princípio da separação dos poderes. Significa
aniquilar a autonomia estatal e, por conseguinte, mortificar o próprio federalismo. Sem
exageros, importa levantar a bandeira da anarquia, em nome de generalizada desordem.
A insustentabilidade da sanção preconizada pela Lei Complementar n°. 24/1975
fica ainda mais nítida ante o argumento de que, uma vez declarada a inconstitucionalidade da
norma concessiva do benefício fiscal e exigido o imposto pelo estado de origem, antes com
incidência desonerada, a conseqüência inequívoca é a legitimação do crédito já apropriado
pelo contribuinte do estado de destino.
Ademais, por terem caráter constitutivo de nova obrigação tributária e por
inovarem o ordenamento jurídico, as normas restritivas de direitos creditórios maculam o
princípio da não-surpresa dos contribuintes, notadamente porque, em regra, são postas por
meio de veículos infralegais e com efeitos retroativos. Adicionalmente, sustam o princípio da
não discriminação de mercadorias em razão da origem e quebram a regra que atribui
competência ao Senado Federal para a fixação de alíquotas.
No plano dos sobreprincípios, a glosa de créditos de ICMS não faz qualquer
sentido do ponto de vista lógico-jurídico, vez que violenta o princípio da segurança jurídica e
não realiza justiça fiscal. Quando empregada a técnica da ponderação das normas em
confronto a partir da utilização dos postulados jurídicos, resta corroborada a completa
desproporcionalidade, ineficiência e falta de razoabilidade dessa perversa reação estatal.
O cenário é de perplexidade e indignação. Como se não bastasse a carga tributária
do país beirar ao insuportável, o contribuinte ainda é apenado por ato inconstitucional de
estado que com ele não guarda qualquer vínculo jurídico. Neste caso, a pena efetivamente
ultrapassa a pessoa do infrator.
O contribuinte é o núcleo mais elementar de todo o Sistema Tributário Nacional, a
razão de existir do próprio Estado e, por isso, não pode ter seus direitos fundamentais
183
desprezados. Esta é a máxima que não deve ser negligenciada, já que transcende uma
dimensão meramente analítica para atingir um universo puramente teleológico do próprio
ordenamento.
Medidas combativas neste contexto degradante do progresso econômico devem
ser implementadas. Enquanto não se aprova a necessária reforma tributária, enquanto a União
Federal se preserva na inércia, sem iniciativa para coordenar o estabelecimento de normas
mais eficazes na coibição da guerra fiscal e na promoção da cooperação intergovernamental,
enquanto o modelo de atuação do Confaz não é revisto, as esperanças são depositadas no
Poder Judiciário, guardião de todo arcabouço de direitos dos contribuintes, que vêm sendo
desonrados.
Mas, como lançar um olhar largo e otimista para o futuro, diante do atual cenário
jurisprudencial oscilante, para não dizer muito mais favorável do que contrário à glosa de
créditos de ICMS? Este é o grande desafio do jurista que considera inegociável o respeito ao
cidadão-contribuinte e não se conforma com as respostas prontas e com as verdades acabadas.
Ao fim, o contribuinte não pode se subjugar a uma guerra fiscal entre os estados,
pois a cooperação que estrutura e justifica a República Federativa do Brasil exige um trabalho
comum, convergente, único meio de se concretizar o texto constitucional. A Constituição
Federal de 1988 prevê a união indissolúvel dos estados e municípios e do distrito federal,
objetivando uma sociedade livre, justa e solidária, com a garantia de preservar os direitos
fundamentais do cidadão e promover o desenvolvimento nacional, para que o verdadeiro
Estado Democrático de Direito se constitua formal e materialmente.
184
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193
ANEXOS
ANEXO I
“Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito federal instituir impostos sobre: (Redação dada
pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as
prestações se iniciem no exterior;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
III - propriedade de veículos automotores. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de
1993)
§ 1.º O imposto previsto no I: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
I - relativamente a bens imóveis e respectivos direitos, compete ao Estado da situação do bem,
ou ao Distrito federal
II - relativamente a bens móveis, títulos e créditos, compete ao Estado onde se processar o
inventário ou arrolamento, ou tiver domicílio o doador, ou ao Distrito federal;
III - terá competência para sua instituição regulada por lei complementar:
a) se o doador tiver domicilio ou residência no exterior;
b) se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário
processado no exterior;
IV - terá suas alíquotas máximas fixadas pelo Senado Federal;
§ 2.º O imposto previsto no II atenderá ao seguinte: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 3, de 1993)
I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à
circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores
pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito federal;
II - a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação:
a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou
prestações seguintes;
b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores;
III - poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços;
IV - resolução do Senado Federal, de iniciativa do Presidente da República ou de um terço
dos Senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros, estabelecerá as alíquotas
aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação;
V - é facultado ao Senado Federal:
a) estabelecer alíquotas mínimas nas operações internas, mediante resolução de iniciativa de
um terço e aprovada pela maioria absoluta de seus membros;
b) fixar alíquotas máximas nas mesmas operações para resolver conflito específico que
envolva interesse de Estados, mediante resolução de iniciativa da maioria absoluta e aprovada
por dois terços de seus membros;
195
VI - salvo deliberação em contrário dos Estados e do Distrito federal, nos termos do disposto
no XII, g, as alíquotas internas, nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas
prestações de serviços, não poderão ser inferiores às previstas para as operações
interestaduais;
VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final
localizado em outro Estado, adotar-se-á:
a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto;
b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele;
VIII - na hipótese da alínea "a" do anterior, caberá ao Estado da localização do destinatário o
imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;
IX - incidirá também:
a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica,
ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim
como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado
o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço; (Redação
dada pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
b) sobre o valor total da operação, quando mercadorias forem fornecidas com serviços não
compreendidos na competência tributária dos Municípios;
X - não incidirá:
a) sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a
destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do
imposto cobrado nas operações e prestações anteriores; (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
b) sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes,
combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica;
c) sobre o ouro, nas hipóteses definidas no art. 153, § 5º;
d) nas prestações de serviço de comunicação nas modalidades de radiodifusão sonora e de
sons e imagens de recepção livre e gratuita; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de
19.12.2003)
XI - não compreenderá, em sua base de cálculo, o montante do imposto sobre produtos
industrializados, quando a operação, realizada entre contribuintes e relativa a produto
destinado à industrialização ou à comercialização, configure fato gerador dos dois impostos;
XII - cabe à lei complementar:
a) definir seus contribuintes;
b) dispor sobre substituição tributária;
c) disciplinar o regime de compensação do imposto;
d) fixar, para efeito de sua cobrança e definição do estabelecimento responsável, o local das
operações relativas à circulação de mercadorias e das prestações de serviços;
e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros
produtos além dos mencionados no X, "a"
f) prever casos de manutenção de crédito, relativamente à remessa para outro Estado e
exportação para o exterior, de serviços e de mercadorias;
g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito federal, isenções,
incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.
h) definir os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o imposto incidirá uma única vez,
qualquer que seja a sua finalidade, hipótese em que não se aplicará o disposto no X, b;
(Incluída pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na
importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço. (Incluída pela Emenda Constitucional
nº 33, de 2001)
196
§ 3º À exceção dos impostos de que tratam o II do caput deste artigo e o art. 153, I e II,
nenhum outro imposto poderá incidir sobre operações relativas a energia elétrica, serviços de
telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País.(Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
§ 4º Na hipótese do XII, h, observar-se-á o seguinte: (Incluído pela Emenda Constitucional nº
33, de 2001)
I - nas operações com os lubrificantes e combustíveis derivados de petróleo, o imposto caberá
ao Estado onde ocorrer o consumo; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
II - nas operações interestaduais, entre contribuintes, com gás natural e seus derivados, e
lubrificantes e combustíveis não incluídos no I deste parágrafo, o imposto será repartido entre
os Estados de origem e de destino, mantendo-se a mesma proporcionalidade que ocorre nas
operações com as demais mercadorias; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
III - nas operações interestaduais com gás natural e seus derivados, e lubrificantes e
combustíveis não incluídos no I deste parágrafo, destinadas a não contribuinte, o imposto
caberá ao Estado de origem; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
IV - as alíquotas do imposto serão definidas mediante deliberação dos Estados e Distrito
federal, nos termos do § 2º, XII, g, observando-se o seguinte: (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 33, de 2001)
a) serão uniformes em todo o território nacional, podendo ser diferenciadas por produto;
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
b) poderão ser específicas, por unidade de medida adotada, ou ad valorem, incidindo sobre o
valor da operação ou sobre o preço que o produto ou seu similar alcançaria em uma venda em
condições de livre concorrência; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
c) poderão ser reduzidas e restabelecidas, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III,
b.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
§ 5º As regras necessárias à aplicação do disposto no § 4º, inclusive as relativas à apuração e à
destinação do imposto, serão estabelecidas mediante deliberação dos Estados e do Distrito
federal, nos termos do § 2º, XII, g. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
§ 6º O imposto previsto no III: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
I - terá alíquotas mínimas fixadas pelo Senado Federal; (Incluído pela Emenda Constitucional
nº 42, de 19.12.2003)
II - poderá ter alíquotas diferenciadas em função do tipo e utilização. (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 42, de 19.12.2003)”
197
ANEXO II
198
Art. 5º - Até 10 (dez) dias depois de findo o prazo de ratificação dos convênios, promover-se-
á, segundo o disposto em Regimento, a publicação relativa à ratificação ou à rejeição no
Diário Oficial da União.
Art. 6º - Os convênios entrarão em vigor no trigésimo dia após a publicação a que se refere o
art. 5º, salvo disposição em contrário.
Art. 7º - Os convênios ratificados obrigam todas as Unidades da Federação inclusive as que,
regularmente convocadas, não se tenham feito representar na reunião.
Art. 8º - A inobservância dos dispositivos desta Lei acarretará, cumulativamente:
I - a nulidade do ato e a ineficácia do crédito fiscal atribuído ao estabelecimento recebedor da
mercadoria;
Il - a exigibilidade do imposto não pago ou devolvido e a ineficácia da lei ou ato que conceda
remissão do débito correspondente.
Parágrafo único - As sanções previstas neste artigo poder-se-ão acrescer a presunção de
irregularidade das contas correspondentes ao exercício, a juízo do Tribunal de Contas da
União, e a suspensão do pagamento das quotas referentes ao Fundo de Participação, ao Fundo
Especial e aos impostos referidos nos itens VIII e IX do art. 21 da Constituição federal.
Art. 9º - É vedado aos Municípios, sob pena das sanções previstas no artigo anterior,
concederem qualquer dos benefícios relacionados no art. 1º no que se refere à sua parcela na
receita do imposto de circulação de mercadorias.
Art. 10 - Os convênios definirão as condições gerais em que se poderão conceder,
unilateralmente, anistia, remissão, transação, moratória, parcelamento de débitos fiscais e
ampliação do prazo de recolhimento do imposto de circulação de mercadorias.
Art. 11 - O Regimento das reuniões de representantes das Unidades da Federação será
aprovado em convênio.
Art. 12 - São mantidos os benefícios fiscais decorrentes de convênios regionais e nacionais
vigentes à data desta Lei, até que revogados ou alterados por outro.
§ 1º - Continuam em vigor os benefícios fiscais ressalvados pelo § 6ºdo art. 3º do Decreto-Lei
nº 406, de 31 de dezembro de 1968, com a redação que lhe deu o art. 5º do Decreto-Lei nº
834, de 8 de setembro de 1969, até o vencimento do prazo ou cumprimento das condições
correspondentes.
§ 2º - Quaisquer outros benefícios fiscais concedidos pela legislação estadual considerar-se-ão
revogados se não forem convalidados pelo primeiro convênio que se realizar na forma desta
Lei, ressalvados os concedidos por prazo certo ou em função de determinadas condições que
já tenham sido incorporadas ao patrimônio jurídico de contribuinte. O prazo para a celebração
deste convênio será de 90 (noventa) dias a contar da data da publicação desta Lei.
§ 3º - A convalidação de que trata o parágrafo anterior se fará pela aprovação de 2/3 (dois
terços) dos representantes presentes, observando-se, na respectiva ratificação, este quorum e o
mesmo processo do disposto no art. 4º.
Art. 13 - O art. 178 do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966),
passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 178 - A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas
condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto
no III do art. 104."
Art. 14 - Sairão com suspensão do Imposto de Circulação de Mercadorias:
I - as mercadorias remetidas pelo estabelecimento do produtor para estabelecimento de
Cooperativa de que faça parte, situada no mesmo Estado;
II - as mercadorias remetidas pelo estabelecimento de Cooperativa de Produtores, para
estabelecimento, no mesmo Estado, da própria Cooperativa, de Cooperativa Central ou de
Federação de Cooperativas de que a Cooperativa remetente faça parte.
199
§ 1º - O imposto devido pelas saídas mencionadas nos s I e II será recolhido pelo destinatário
quando da saída subseqüente, esteja esta sujeita ou não ao pagamento do tributo.
§ 2º - Ficam revogados os incisos IX e X do art. 1º da Lei Complementar nº 4, de 2 de
dezembro de 1969.
Art. 15 - O disposto nesta Lei não se aplica às indústrias instaladas ou que vierem a instalar-se
na Zona Franca de Manaus, sendo vedado às demais Unidades da Federação determinar a
exclusão de incentivo fiscal, prêmio ou estimulo concedido pelo Estado do Amazonas.
Art. 16 - Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em
contrário.
ERNESTO GEISEL
Mário Henrique Simonsen
João Paulo dos Reis Velloso.
200
ANEXO III
35
Não foi incluído o Anexo Único desta Resolução devido ao fato do mesmo sofrer constantes atualizações. Tal
Anexo pode ser consultado por em:
http://www.fazenda.mg.gov.br/empresas/legislacao_tributaria/resolucoes/2001/rr3166_2001.htm
201
RESOLVE:
Art. 1º - O crédito do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e
sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação
(ICMS) correspondente à entrada de mercadoria remetida a estabelecimento localizado em
território mineiro, a qualquer título, por estabelecimento que se beneficie de incentivos
indicados no Anexo Único, será admitido na mesma proporção em que o imposto venha
sendo efetivamente recolhido à unidade da Federação de origem, na conformidade do referido
Anexo.
Parágrafo único - O crédito do ICMS relativo a qualquer entrada de mercadoria oriunda de
outra unidade da Federação somente será admitido, ou deduzido para os efeitos do Micro
Geraes, na conformidade do disposto no caput, ainda que as operações estejam beneficiadas
por incentivos decorrentes de atos normativos não listados no Anexo Único desta Resolução.
Art. 2º -
Efeitos de 12/07/2001 a 16/12/2004 - Redação original:
"Art. 2º - Fica vedado o aproveitamento de quaisquer créditos relativos a operações
beneficiadas com reduções de base de cálculo em sua origem sem amparo em convênios
celebrados no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ)."
Art. 3º - Quando da verificação fiscal de mercadorias objeto dos benefícios fiscais citados nos
artigos anteriores, a fiscalização aporá, no documento acobertador, a título de esclarecimento
ao destinatário, a informação, conforme o caso, da vedação ao creditamento do Imposto
relativo à operação e/ou da parcela que este está autorizado a se creditar ou a deduzir para os
efeitos do Micro Geraes.
Parágrafo único - A falta no documento acobertador da informação prevista neste artigo não
autoriza o destinatário a se creditar ou se deduzir do ICMS destacado em desacordo com os
preceitos desta Resolução.
Art. 4º - Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 5º - Revogam-se as disposições em contrário.
202