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Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 43, n. 4, p. 1199-1216, out./dez. 2018. 1199
http://dx.doi.org/10.1590/2175-623688386
Políticas de Avaliação e Gestão Educacional
Introdução
Os temas Gestão Educacional e Políticas de Avaliação nunca foram
tão polêmicos como no contexto atual em que ambas as áreas foram
e continuam sendo alvo de profundas alterações que acarretam con-
sequências controvertidas. Por essa razão, também têm sido tanto ob-
jetos de estudos e pesquisas contumazes, abrangentes e significativas
no cenário nacional e internacional, quanto de manifestações críticas,
advindas de estudantes, docentes, organizações acadêmicas e sindi-
cais, entre outras. Nessa direção, essa seção temática enfoca tais temas
buscando aportar contribuições ao debate, com diferentes abordagens,
recortes e contextos nacionais.
Nesse texto introdutório aos artigos que o compõem, procura-se
relevar a partir da exploração de alguns apontamentos oriundos de pro-
duções teórico-metodológicas do campo a seguinte questão provocati-
va: que articulações, interfaces e tensões podem ser identificadas entre
avaliação e gestão?
Com efeito, Gestão Educacional e Políticas de Avaliação são cam-
pos de ações que conduzem e regulam o processo educativo no Brasil e
no mundo. A centralidade desses campos se exacerba no país e em ou-
tros cenários a partir da década de 1990. Com a crise econômica do ca-
pitalismo, em nível mundial, as reestruturações no setor produtivo, as
redefinições no papel e na atuação do Estado, por imposição de ajustes
estruturais e um conjunto de circunstâncias e medidas que requerem e
imputam perdas profundas de direitos sociais e trabalhistas ao conjun-
to dos trabalhadores.
Como consequência, nos últimos anos enfrentamos inúmeros de-
safios nas políticas colocadas em prática no Brasil, na América Latina e
em vários países com repercussões sérias na política educacional.
Torna-se relevante, portanto, destacar que esse processo de re-
formulações se desenvolve em um contexto em que os profissionais da
educação promoviam debates e reivindicavam a melhoria da qualida-
de da educação, avanços dos direitos dos trabalhadores, garantia de
financiamento público para a educação pública, efetivação da gestão
democrática nas instituições, entre outros temas pautados por diversos
sujeitos e em diferentes espaços da sociedade. Havia, portanto, reivin-
dicações de melhoria na educação pública e essas abrangiam a valori-
zação do magistério, por meio de concursos públicos, carreira, remune-
ração, estabilidade, entre outras.
Assim, a partir da década de 1990, gestão e avaliação ganharam
relevância no cenário educacional, e se constituem como eixos estru-
turantes das políticas educacionais adotadas, o que se expressou cla-
ramente na Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional (LDBEN),
aprovada em 1996, e em inúmeras outras legislações nacionais. O novo
marco legal redimensiona a educação escolar, por meio de políticas,
programas, processos e práticas que se articulam em diferentes aspec-
tos e sob diversos dispositivos, produzindo uma nova regulação, com
muito mais controle por parte dos gestores dos sistemas que implicam
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e mais recentemente a Prova Brasil apresentam distintas características
e possibilidades de uso de seus resultados para que as informações ava-
liativas sirvam também para o próprio processo de formulação, imple-
mentação e ajuste de políticas educacionais. (Brasil, 2005; 2009; 2010).
O SAEB, criado em 1990 passou por várias reformulações até che-
gar a sua formulação atual, vigente desde 2015. Sua criação induziu,
orientou e foi reforçada pela criação de sistemas de avaliação nos esta-
dos da federação. Em 20151 registravam-se sistemas próprios de avalia-
ção da educação básica em 18 estados brasileiros, que tendem a utilizar
as mesmas escalas para os testes sem, contudo, haver integração entre
eles.
O Enem, criado em 1998 para avaliar o desempenho dos estudantes
no Ensino Médio também passou por significativas alterações. Após 20
anos, tornou-se porta de acesso para o Ensino Superior público e parti-
cular do Brasil. Atualmente, por meio do Sistema de Seleção Unificada
(SiSU), as notas do Enem são aceitas por todas as universidades federais,
estaduais, centros universitários e institutos federais de educação.
Em sua proposta de avaliação, o Enem privilegia a capacidade
que os estudantes têm de resolver questões e apresentar argumentos a
partir de habilidades e de competências desenvolvidas no processo de
escolarização, sendo um dos seus objetivos avaliar a apropriação desses
conhecimentos pelos estudantes. Todos os anos, depois de divulgados
os resultados das avaliações nacionais, e entre elas o Enem, há a intensi-
ficação de discussões acerca da qualidade do ensino no Brasil, em geral,
responsabilizam-se os professores pela baixa qualidade do ensino mi-
nistrado nas escolas. Nesse prisma, o Enem e as habilidades requeridas
por ele, aproximam-se, de forma estreita, das questões relativo às práti-
cas curriculares dos professores.
Essa avaliação externa surgiu com a intenção de avaliar, de forma
voluntária o desempenho do estudante após chegar ao final da Educa-
ção Básica, visando colaborar para rendimentos positivos da qualidade
desse nível de escolaridade, entretanto a adesão dos alunos, nos primei-
ros anos de aplicação da avaliação, foi mínima. No ano de 2009 surgiu
o novo Enem, que ampliava as atribuições do mesmo, sendo utilizado
como critério de seleção para o ingresso do aluno no Ensino Superior e
também como critério de seleção para os alunos que almejam concor-
rer à bolsa no Programa Universidade para Todos (ProUni), ao Financia-
mento Estudantil (Fies), que oferecem, respectivamente, bolsas de estudo
e financiamento sem juros, ou com juros baixos em instituições privadas
e ainda como possibilidade de certificação do Ensino Médio.
Em 2017, o Enem sofreu algumas modificações, sendo as mais re-
levantes: a redistribuição dos dias de prova, divulgação individual dos
resultados, colocando fim às publicações de notas por escolas e a revo-
gação do Enem como forma de certificado de conclusão do Ensino Mé-
dio. Esse exame é hoje, após várias modificações e ajustes, a avaliação
externa mais relevante do Ensino Médio, influenciando, muitas vezes,
os currículos e as práticas docentes. Por esse motivo, considera-se rele-
vante a discussão acerca dessa avaliação externa e suas relações com as
práticas desenvolvidas pelos docentes em sala de aula.
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Considerações Finais
Pretendeu-se nesse artigo destacar algumas interfaces, articula-
ções e tensões existentes entre avaliação e gestão educacional. Ao con-
cluí-lo, torna-se relevante destacar três considerações.
Em primeiro lugar, avaliação e gestão estão estreitamente imbri-
cadas em todos os níveis de ensino e as concepções e finalidades que
efetivamente as orientam conduzem a resultados situados historica-
mente.
Em segundo lugar, o processo de avaliação empreendido no Bra-
sil desde a década de 1990, com seus antecedentes na década de 1980,
possui um nexo, um eixo condutor comum, que eleva e aprofunda a
crise dos sistemas educacionais públicos e conduz à mercadorização
da educação em todos os níveis de ensino, tendo como rumo a interna-
cionalização pautada por hierarquias educacionais e sociais. Trata-se
de um processo de mundialização dos modelos educacionais, ainda in-
concluso, mas em estágio já bastante avançado, que tem como exemplo
mais adiantado e modelo, as experiências norte-americana e chilena.
Há, portanto que se buscar conhecer e analisar essas experiências, em
profundidade.
Finalmente, os estudos sobre a gestão e avaliação, assim como os
demais, demandam sempre apreciação crítica dos sujeitos, numa pers-
pectiva de diálogo e confrontação. Parece ser fundamental indagar e
problematizar as políticas educacionais em curso e, particularmente,
as de avaliação e gestão da educação com base em referências teóricas
que deem conta não só de desvelar a sua essência, natureza, finalida-
des, e os seus efeitos e as tensões que estas têm gerado, mas também
que carreguem o potencial de contribuir para a superação da própria
política.
Notas
1 Disponível em: <http://www.observatoriodopne.org.br/metas-pne/7-apren-
dizado-adequado-fluxo-adequado/estrategias/7-32-sistemas-estaduais-de-
-avaliacao>. Acesso em: 01 ago. 2018.
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