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S ER C O NVIVER TRANSFORMAR

omo lidar com as dificuldades


aber ol ar para n s mesmos e para o outro com mais compai o uma boa
maneira de trans ormar os percalços do camin o em sabedoria e orça
NÚMERO 201

Vai dar tempo Autoconfiança Vamos trabalhar


2018

O que fazer para Aprenda a acreditar Espaços compartilhados


aproveitá-lo melhor mais em si mesmo que conversam com você

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VIDA SIMPLES ACREDITA
E É APOIADA POR ESTAS MARCAS

ILUSTRAÇÃO ISTOCK

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DEDICO A | PERTENCE A:
ILUSTRAÇÃO ISTOCK

@VIDASIMPLES

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C A RTA A O L E I TO R

A mensagem que não enviei


É uma amiga, que me trava ela estava sorrin o A ente con- que ela fique em on e quer que este a
ligou para contar: ‘“Andrea se foi, hoje versava so re a vi a os planos os ese- ue seu filho e anos tam m fique
e manhã An rea não era amiza e an- os o relacionamento An rea queria ver em e que o amor que ela sempre teve
tiga, mas recente, que nasceu e se trans- o filho crescer isso ou tu o isso om por ele si a apesar a aus ncia o e
formou junto com meu tempo em Vida a mudança da revista de casa, mantive pensando na Andrea e na sua força de
Simples, na editora Caras, antiga mora- meu contato com ela por mensagens se uir apesar as ificul a es lem rei-
a a revista An rea tra alhava numa e hatsApp a ltima que trocamos -me do tema da capa desta edição de
área em que os jornalistas, em geral, não em outu ro ela estava a ati a mas es- i a imples A mat ria oi escrita pela
têm muita proximidade, a administrati- peran osa esses ltimos tempos an- ara iqueira ornalista cheia e cora-
va as como sou a a a conversar eu ava muito pessimista as ontem co- gem e de alma, que estreou lindamente
me apro imei e An rea la trazia con- loquei pensamentos positivos, renovei sua primeira reporta em por aqui ara
sigo uma história de coragem, força e es- minha e estou novamente confiante nos conta como superar os esafios a
peran a na vi a avia mais e tr s anos no tratamento au a es espon i a vi a com resili ncia que isso não tem
esco rira um c ncer no intestino a- vida pede amor, fé e intensidade sempre, a ver com suportar toda e qualquer dor,
nhou a primeira atalha epois e al u- in epen entemente os esafios stou mas em aprender com elas e crescer
mas cirurgias e muitas sessões de qui- com voc m m s se passou es e en- com isso An rea oi resiliente acre i-
mioterapia, que perduraram por quase tão na semana passa a uma ami a tou na vi a at o fim A mensa em a o-
um ano al uns meses a se un a em comum me disse que Andrea não ra enten o quem me enviou oi ela ue
atalha se anunciou um e ame e roti- estava na a em u ia escrever mas a eu voc to os n s possamos azer valer
na mostrou novamente um n ulo ais vida, essa danada, me atropelou e deixei a pena cada minuto nesta jornada linda
quimioterapia empre que eu a encon- passar A ora fica apenas o ese o e chama a vi a At m s que vem

FOTO LUCIO TELLES


Ana Holanda,
Diretora de redação

PUBLISHER | CEO Luciana Pianaro CIRCULAÇÃO E ASSINATURAS Danieli Lopes


luciana@vidasimples.co
COLABORADORES Eduardo Alves, Izabel Duva Rapoport,
(desde 2002)
CONSELHO EDITORIAL Eugenio Mussak, Ana Holanda, Matheus Dantas e Sibele Oliveira
ISSN 977167876000, ano 16, edição 201 Alessandra Garattoni, Luciana Pianaro
É uma publicação mensal da Vida Simples Conteúdo IMPRESSÃO E ACABAMENTO Plural Indústria Gráfica
e Negócios Ltda (CNPJ: 30.487.265/0001-27) DIRETORA DE REDAÇÃO Ana Holanda
Rua Itamirimdiba, 58, Pinheiros, São Paulo/SP CEP: 05429-060 DISTRIBUIÇÃO Realbras
www.vidasimples.co PROJETO GRÁFICO Estúdio Colírio
MARKETING, PUBLI E PROJETOS ESPECIAIS Luciana Pianaro
EDITOR DE ARTE Tiago Gouvea luciana@vidasimples.co

COMUNICAÇÃO Nara Siqueira ASSINATURAS E VENDA AVULSA


falecom@vidasimples.co
REVISÃO Amanda Pessoa Whatsapp: 11 94498.1479

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SER CONVIVER TRANSFORMAR • 2018 NÚMERO 201

pág. 26 A beleza escondida no cotidiano delicado


de Ilha Bela, no litoral de São Paulo
FOTO MARCELO OSÉAS

NESTA EDIÇÃO TODO MÊS COLUNAS

18 C A PA 32 D I L E M A S 04 C A RTA 50 PENSANDO BEM 54 CONVERSA


Como lidar com Autoconfian a A O L E I TO R Por u enio ussa EM FAMÍLIA
as ificul a es Por ua Fonseca
40 T R A B A L H O 06 M E N S A G E N S 52 OUTROS OLHARES
26 H O R I ZO N T E S spa o para to os Por ris uerra 55 VIAGENS
08 C A L E I D O S C Ó P I O
A vi a como ela TRANSFORMADORAS
46 E X P E R I Ê N C I A 53 PELAS RUAS
uliana eis
32 P E N S A R que apren i com Por auro alliari
uanto tempo um oelho rala o 56 CAMINHO
a ente tem DAS VIRTUDES
ustavo ana a

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M E N SA G E N S

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e sugestões pelo e-mail Disponível também na versão digital.
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Conexão Reinventar Juntos


m tempos tão if ceis incr vel ter A alma a i a imples e sempre a ora Para ns por terem evolvi o aos lei
uma pu lica ão que pre a uma cone ão reinventa a ue sai amos nos reinven tores a anti a quali a e com muitos
maior com a natureza com a socie a e tar sempre ri a a equipe acr scimos stamos untos
e principalmente com n s mesmos - Dani Trolesi - Ivan Ramos Coutinho
- Leandro Neves
Essência Sem moderação
Layout ue a revista i a imples cres a ain a ou aprecia or e i a imples sem mo
Para enizo a to os a equipe pelo novo mais que che ue a to as as pessoas e era ão eu mo o e tra alhar sempre
la out a revista Ficou muito om a que seu conte o permane a rechea o me chamou a aten ão ssencial e leve
mento apenas pela iminui ão o tama e to a a ess ncia e seus iri entes e inha trans orma ão como pessoa ao
nho a onte que ificultou a leitura e to a a equipe lon o os anos tem a ver com a revista
- Luzia Toyoko Hanashiro - Ana Paula Puga - Afonso Claudio de Alcântara e Lelis

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Poesia e alma VIDA SIMPLES POR AÍ
Ao chegar a São Paulo (não resido aqui), Poste uma foto usando a hashtag #revistavidasimples no Instagram. Selecionaremos nossas
a primeira coisa que fiz oi comprar a favoritas para publicar aqui no mural
revista. Está emocionante! Muita poesia
e alma em cada página. Vocês nos tocam
pro un amente
- Flávia Andrade

Encantado e ansioso
oltan o e rias recentes e ciente as
mudanças e possíveis atrasos da Vida
imples e outu ro fiquei an ustia o
@wabisabicollage @cafelilietiramisu @circleoftalks
quando percebi que as grandes livrarias
estão extinguindo o setor de revistas.
Por causa disso, cheguei a pensar se não
seria um sinal das nuvens escuras que
pairam sobre nosso país. Na edição pas-
sada, de setembro, li vários colunistas
espe in o se mas elizmente ei an o
seu rastro para segui-los. Alguns tentarei
seguir, porque me apeguei a eles ao lon-
o os ultimos anos ssa semana fiquei
@fortiuscomunicacao @gabrielaguizi @maxgmesquita
aliviado ao encontrar a revista de outu-
ro em uma anca Fiz uas coisas ime-
diatamente após a compra: percebi que,
e ato as espe i as oram concretas
mas que o editorial da Ana Holanda es-
tava l Po e at ser que estranhe al o
mas sei que ao final a e i ão estarei
encantado e ansioso pela próxima.
- Mauricio Frias Prata

@nelmoura @nevesleandro @wadaelaine


Simples assim
ato e ler a i a imples um rein-
ventar-se. Origami: de um pedaço de
papel trans orma ão em um p ssaro
Esse mudar depende de cada um de nós,
sempre. Como um luto, o tempo de cada
um. Toda mudança causa resistência,
FALE COM A GENTE
me o assusta as em vin a apren-
di. Hoje, com 60 anos, eu me sinto como ATENDIMENTO AO LEITOR PUBLI E OUTROS PROJETOS
uma enciclop ia pronta a rece er no- Para perguntas, críticas, sugestões e atendimento ao E-mail: luciana@vidasimples.co
assinante. E-mail: falecom@vidasimples.co Whatsaspp: (11) 94498-1479 • Telefone: (11) 3032-5998
vos apren iza os empre com humil- Whatsaspp: (11) 94498-1479 • Telefone: (11) 3032-5998
dade, resiliência, respeitando o ritmo de LICENCIAMENTO DE CONTEÚDO
PARA ASSINAR E COMPRAR Para direitos de reprodução dos textos e imagens publicados
cada um nesta jornada maravilhosa que Acesse www.vidasimples.co em Vida Simples. E-mail: falecom@vidasimples.co
compartilhamos. Simples assim.
- Lucimar Malavazzi Penteado

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C A L E I D O S C Ó P I O

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sua idade da baliarina, no
ambiente duro e cinza da cidade
CIDADE
É PALCO
nos az uestionar ser ue o
ritmo dos lugares nos impõe um
eito de dançar a ida

rabal o nos az re etir sobre


como o ai e em das pessoas
nas grandes metr poles impacta
o ritmo do nosso corpo

o ot ra o er io a ah
e a ailarina enata A onso iellas o-
ram s ruas o centro e ão Paulo para
retratar per ormances e an a no meio
a rua na cal a a A i eia era e plorar a
rela ão o corpo com a ci a e e azer um
paralelo entre o artista no palco e o ci a-
ão comum na metr pole Am os intera-
em com o cen rio vivem persona ens e
movem se em um ritmo que po e se tra-
uzir em an a se a a coreo ra a a se-
a a o trivial coti iano e plica enata
resulta o o ensaio eu vi a ao pro e-
to orpo r ano e oi al m a finali a e
est tica e visual omo mani esto nos az
pensar e que orma sentimos o caos a
ci a e pulsar e e que maneira nos mo-
vimentamos e e istimos na cena ur a-
na palco e tantas situa es as ruas
o corpo se esloca con rontan o o tr nsi-
to contornan o a ente e contemplan o
os pr ios e a soli ão a multi ão a ci-
a e ele cansa em ritmo e austivo e per-
ce e que parte isso suave e a ressivo
ao mesmo tempo iz a ailarina que lo-
o nas primeiras otos esco riu se r -
vi a e ina Foi esafiante e muito or-
te azer as per ormances nessa con i ão
ãe e filha assim como ca a um e n s
são prota onistas esse espet culo que
a vi a e to o ia não importa o que
a ente a a veste ou carre a e nem para
on e vai asta viver na metr pole para
azer parte a an a IZABEL DUVA RAPOPORT
A
A

CORPO URBANO
@projetocorpourbano
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C A L E I D O SC Ó P I O

A VIDA DAS CORES


Pequena empresa formada por duas mulheres transforma resíduos vegetais, como cascas de cebola
ou pedaços de repolho roxo, em corantes ecológicos usados para colorir tecidos
e cores cria os por sa- tes e novas tonali a es conta sa ora a posta em e um la o a empresa orta-
ora u im e arol oreira a tintura- alquimista a upla e um mesmo repo- lece a oa estina ão os escartes or -
ria me ores ot nicas t m al o em co- lho ro o por e emplo po em sair at tr s nicos o outro possi ilita que marcas e
mum to os v m o li o ecolhemos cores i erentes Aproveitamos a mat ria roupas possam pro uzir e maneira mais
cascas e ce ola amarela e ro a em ei- a natureza que che ou ao fim para um consciente IZABEL DUVA RAPOPORT
A

ras or nicas sementes e a acate em primeiro consumi or e epois e tra a-


restaurantes re u o e a a rão a terra lha a como onte os corantes ve etais ÂME CORES BOTÂNICAS
orra e ca e outros materiais para tes- volta terra para echar o ciclo na com- @amecoresbotanicas
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MEMÓRIA
NEGRA
Coletivo Dúdú Badé
leva tradições africanas
e afro-brasileiras para
crianças e educadores

é formada pela du-


pla de arte-educadoras Ana Caro-
line da Silva e Amanda Cristina da Silva
de Jesus por onde passam. Nas rodas,
histórias se fundem com brincadeiras,
culinária e atividades que exploram a
ancestrali a e ne ra e suas influ ncias
nos dias de hoje. “É a nossa forma de
partilhar, afetar e construir perspecti-
vas de valorização dessa cultura entre
as crianças e os educadores”, diz Ana
Caroline. Ao lado da irmã, ela conduz o
coletivo Dúdú Badé, cujo nome foi ins-
pirado na primeira caça ao tesouro do
pro eto i nifica ca ar em an o pre-
to”, conta. Para elas, a ideia é fazer com
que as crianças negras se orgulhem de
ser quem são. - IZABEL DUVA RAPOPORT

[1]
DÚDÚ BADÉ
facebook.com/dudubade1
FOTOS 1. TALICIA VENÂNCIO/DIVULGAÇÃO; 2. RAFAEL MARQUES/DIVULGAÇÃO

POESIA E BORDADO
s o primeiro livro o artista on cio ficou pronto omposto e
dez poesias e dez bordados, o Me nino Q u e R ou b ou o O l h ar do P oe t a (Editora Be-
ca) é uma homenagem à mãe do autor, que lhe ensinou as artes manuais, e ao poe-
ta Manoel de Barros, que lhe ensinou a arte de “poemar”. “É uma ponte para a mi-
nha crian a interior retornar minha eo rafia a etiva iz ele a a livro que o
autor pro uziu com o financiamento a am lia e os ami os teve aca amento e
costura feita à mão por Rony. Com eles, o autor busca despertar o olhar do leitor
para o simples a astar a sua or e ficar mais perto a amiza e IZABEL DUVA RAPOPORT

[2]
RONY CÁCIO
@ronycacio

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C A L E I D O SC Ó P I O

GENTE INCRÍVEL

IVA NIL DE ROC HA


56 anos, parte ira

PARTEIRA POR VOCAÇÃO


Mineira, ela nunca pensou que sua vida pudesse seguir outro caminho
que não o de fazer um bebê vir ao mundo por suas mãos - SIBELE OLIVEIRA

era criança quando decidiu o que queria capacita. “Na hora em que pego o bebê e passo para os
ser. Neta de duas parteiras, ela herdou a vocação das avós braços da mãe, sinto que sou um instrumento de Deus”,
e formou-se enfermeira. Não para cuidar de doentes, mas diz. Imersa nesse sentimento, costuma cantar. “Quando
para trazer bebês ao mundo. Por isso, especializou-se em canto para ele é como se o abençoasse.
obstetrícia. Encantou-se com o centro de parto humani- A beleza de fazer alguém nascer de forma natural leva
zado do Hospital Geral de Itapecerica da Serra, onde as Ivanilde a percorrer grandes distâncias. Mesmo moran-
grávidas podiam comer, beber, caminhar e tomar banho, do em Pouso Alegre (MG), ela continua atendendo em
em vez e ficar eita as sen o me ica as ra alhava l São Paulo, em cidades do interior paulista e do sul de
quando uma de suas alunas do curso de enfermagem a Minas. Uma vez foi procurada por um casal que morava
procurou dizendo que não queria repetir o sofrimento em Guaxupé (MG). Preocupou-se quando soube que eles
o primeiro parto ese ava que seu se un o filho nas eram eficientes visuais mas aca ou sen o um os par
cesse em casa com a ajuda de Ivanilde. Assim foi. Desde tos mais lindos que fez. Ela conta que o casal enxergava
então, o boca a boca trouxe várias outras gestantes até a com a alma, e que com sua orientação, o pai teve a felici-
parteira domiciliar, que de 2003 até hoje realizou cerca dade de cortar o cordão umbilical. Para Ivanilde, nasci-
de 300 partos em residências. “São mulheres que que- mentos assim são mais humanos e fica nove me
rem ter autonomia sobre o próprio corpo e decidir como ses entro a mãe ntão tira o e fica lon e ela sso
parir sem inter er ncias afirma ela que tra alha como repercute na afetividade, na forma de ser dessa criança.
enfermeira obstetra há mais de trinta anos. Eu o mantenho ligado à placenta até o cordão umbilical
Ap s a confirma ão e que a esta ão e ai o risco os parar de pulsar, para depois cortá-lo. O bebê vai para o
pais assinam um termo de prestação de serviço e parti- colo da mãe e continua escutando as batidas do coração
cipam de uma aula sobre o parto. A grávida não recebe dela. Só o tiro, com carinho, para fazer os cuidados. E
me ica es e quase sempre fica a ra a a ao mari o va logo devolvo para ela”. Para continuar dando atenção a
nilde chega acompanhada de uma enfermeira assisten- eles, mesmo de longe, a parteira oferece cursos para as
te e às vezes também de uma aprendiz, que ela mesma mães sobre aleitamento materno.

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UM ELO
POTENTE
Com dinheiro público e privado,
iniciativa leva conhecimento
para comunidades e populações
vulneráveis crescerem sós

o que az o nstitu-
to eio uma or aniza ão com se-
e em ão Paulo asta pensar no seu
nome eio sim oliza a un ão este
instituto em ser um elo entre as pesso-
as e as empresas p licas e priva as
nstituto orma o por ente isposta
a levar seus conhecimentos para popu-
la es com pouco ou nenhum acesso
e uca ão e com in orma ão escassa so-
re como aquilo que pro uzem po e
a u las a erar al um tipo e ren a
e plica uar o Parente que unto com
ars ie erichsen un ou o pro eto
tra alho e o o etivo a upla encon-
trar uma orma e levar s comuni a-
es o ciclo completo e um ne cio sus-
tent vel Para isso eles mostram a ar-
tesãos e artesãs a import ncia aquilo
que azem para eles para a comuni-
a e no entorno e para a manuten ão
a hist ria e ca a um ão aulas so-
re esi n e pro utos mane o e ma-
t ria prima e at mesmo erramentas
e estão e e comercializa ão u o
isso sem ei ar e olhar para a cultu-
ra local a iversi a e e os sa eres que
essas pessoas carre am consi o ão
asta olhar somente para pro uto ser-
vi o ou processo e orma isola a iz
uar o ciclo para ser completo e-
ve ir al m o in cio e o fim ão toa
no meio que se esenvolve a vi a IZA-
BEL DUVA RAPOPORT
A

O objetivo do Instituto Meio é ajudar pequenos produtores, espalhados pelo país, a entender todo INSTITUTO MEIO
seu processo da criação à venda para que, assim, possam crescer valorizando o saber de cada um institutomeio.org
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C A L E I D O SC Ó P I O

CINEMA INDEPENDENTE PARA TODOS


istribuidora de filmes com tem tica social orma no os p blicos e amplia os espaços de e ibiç o no pa s

o tamanho da tela. No cir- rela ão ao que est sen o e i i o afir- s ioná r ios da Q u e b r ada e C h e g a de F iu F iu , a
cuito alternativo de cinema, a exibição ma ivia Almen ar que ao la o a s cia upla mant m a aturana o i uma re e
e filmes vai al m as salas echa as che- arol isorelli criou em a atura- cultural on line que isponi iliza filmes e
an o a centros culturais escolas e espa- na o iliza ão ocial a poca nos e- a pro rama ão e pontos e e i i-
os ao ar livre eralmente se ui a e mos conta e quantos filmes com temas ão pelo pa s IZABEL DUVA RAPOPORT
ro a e conversa osso p ico en a- relevantes são pro uzi os e não che am
a o e as sess es sempre t m um prop - s salas e cinema comercial o e al m TATURANA MOBILIZAÇÃO SOCIAL
sito sso mu a a aten ão as pessoas em e istri uir o ras e impacto como V i- fb.com/TaturanaMobi

MENSAGENS QUE ATRAVESSAM O TEMPO


FOTO GABRIELA BARRETOS/DIVULGAÇÃO

e ei ar uma mensa em carinhosa para voz rava a numa anti a secret ria eletr nica o que me trou e
filhos netos so rinhos pessoas queri as enfim ssa a uma ale ria inespera a por isso pensei em criar um servi o pa-
proposta o portal eu ltimo ese o a pr tica a pessoa con- ra trans ormar um pouco esse momento a per a iz servi-
trata o servi o a plata orma on line e ei a rava o um epoi- o o ereci o por meio e assinatura ANA HOLANDA
mento para aqueles que ama rece erem ap s sua morte A i eia
o paulista rio assio aur cio uan o meu pai aleceu eu MEU ÚLTIMO DESEJO
me senti completamente per i o as encontrei ao acaso sua meuultimodesejo.com.br

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CM

MY

CY

CMY

K
C A L E I D O SC Ó P I O

UM CAFÉ COM TATIANY LEITE

LITERATURA PARA TODOS


Junto com o escritor Augusto Assis, a jornalista Tatiany Leite criou um canal
no Youtube para incentivar jovens a ler e tomar gosto pela literatura SIBELE OLIVEIRA

passou a in ncia respi- anto que nossos v eos e maior au- ela est em v rios lu ares e que não s o
ran o hist rias isneta e neta e es- i ncia são as aulas as tam m tem cl ssico apesar e ser poss vel enten er
critores so rinha e uma poetisa e i- muita ente que nos se ue e comenta um cl ssico e orma i erente omo
lha e uma pro essora e latim ela era que não vai prestar vesti ular mas os- I r ac e m a e os e Alencar que tem
aquelas crian as que per em a no ão ta as nossas opini es e e ates uma lin ua em muito re usca a ssa
o tempo com um livro na mão stu- narrativa que era if cil na poca o
ou ornalismo quan o cresceu mas o É O AMOR PELOS LIVROS QUE LEVA AS romantismo passa a para os alunos
amor pela literatura nunca aca ou m PESSOAS AO CANAL? lerem ho e A nossa un ão por e emplo
ia conheceu Au usto Assis orma o uan o as pessoas che am ificilmente pe ar racema e analisar o que os e
em mar etin e escritor es e a oles- elas t m um amor a soluto pela literatura Alencar quis izer com esse livro plicar
cente s ois tiveram a i eia e criar as aca am se apai onan o epois que por que ele usou palavras em uarani
um canal no outu e e incentivar os o- per em o preconceito ntram no canal por que a persona em principal uma
vens a lerem livros no papel ou i ital- porque precisam estu ar ou uscam uma n ia o que retrata essa hist ria quem
mente Foi assim que nasceu o canal V á opinião so re al uma coisa espec fica oi o autor ostramos e uma maneira
L e r u m L iv r o A upla az v eos so re como uma s rie que viram na etfli esconstru a as coisas que são coloca as
v rios tipos e o ras principalmente as e ficaram curiosas so re o t tulo que a num patamar inalcan vel
que são leitura o ri at ria nos vesti u- ori inou nosso intuito que to os
lares mais importantes o pa s atian pensem eu não ostava e literatura DÁ TRABALHO ATRAIR OS JOVENS?
conta que se sente toca a ao sa er que antes mas a ora a oro e quero sa er mais astante porque muitos colocam as
suas aulas atravessam a tela o celular so re o que voc s estão alan o artes num patamar elitista Al m isso
ou o computa or e trans ormam se em h v rias coisas acontecen o muito
hist rias quan o che am ao outro la o VOCÊS DIZEM NA DESCRIÇÃO DO CANAL conte o sen o pu lica o iariamente
QUE O OBJETIVO É TIRAR O “PESO” DA Pren er a aten ão e al u m alan o e
QUEM ACOMPANHA O VÁ LER UM LIVRO? LITERATURA. COMO FAZEM ISSO? literatura não cil porque a ten ncia
um p lico misto mas os pr vesti- A literatura eralmente vista como uma que o aluno ache que não vai ostar
A

ulan os que não t m con i es e pa- leitura muito aca mica esmistificamos if cil fis lo e primeira om que
ar um cursinho ou que querem com- isso alan o e maneira tranquila azen o quan o a ente conse ue erru ar essa
plementar o conhecimento são maioria lin s com a atuali a e mostran o que arreira ela não sai mais o canal
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Levar conteúdo para pessoas que talvez não tivessem
acesso, para mim, é a melhor coisa desse projeto. Isso
é realmente ensinar. É transformá-las em cidadãos

O QUE VOCÊS FAZEM PARA PRODUZIR pessoas que talvez não tivessem acesso, uma favela mineira. Ela ensina como
UM CONTEÚDO LEVE E ACESSÍVEL? para mim, é a melhor coisa de todo esse ninguém a história do Brasil e nos faz
Consumimos muita atualidade e por isso projeto. Isso é realmente ensinar. Trans- compreender a questão racial. É um
a nossa linguagem e gestos são joviais. Is- formar os alunos em pessoas boas, em exercício de empatia muito grande. Eu,
so agrada o público. E tentamos sempre cidadãos. Todo livro promove um gran- enquanto uma mulher branca que tal-
fazer um link com o que achamos que as de exercício de empatia. Quando ensino vez não tenha a menor ideia da realida-
pessoas vão querer assistir. as pessoas, acabo treinando essa empa- de de uma negra pobre, consigo entrar
tia. Essa troca é essencial. nessa história e entender muito melhor
É DIFERENTE APRENDER LITERATURA o mundo à minha volta.
NA SALA DE AULA E NO YOUTUBE? POR QUE LER É IMPORTANTE?
É preciso entender as aulas no YouTube Porque acabamos criando uma compre- VOCÊ PODERIA COMPARTILHAR
como uma atividade complementar, por- ensão muito maior de nós mesmos e do UMA HISTÓRIA DE COMO O CANAL
que nada substitui a escola. As aulas no mundo. É através da leitura que exer- TRANSFORMOU A VIDA DE ALGUÉM?
colégio variam de acordo com o humor do citamos a criatividade, o olhar para o Há pouquíssimo tempo uma pessoa co-
professor e do aluno, porque acontecem próximo, que entendemos melhor nos- mentou no canal que nunca tinha tido
várias coisas na vida de cada um que está sa história e do nosso país. acesso a um ensino de qualidade, que
ali. Eu e o Guto gravamos quando estamos estudou em escola estadual a vida toda
bem. E o aluno é ativo na escolha, porque OS LIVROS INFLUENCIAM A SUA VIDA? e só conseguiu aprender literatura com
ninguém clica num vídeo a que não quer Leio desde muito cedo e isso acabou a gente. Ela passou no vestibular para
assistir. Como é uma decisão dele, acaba ajudando a moldar a minha personali- medicina em uma universidade públi-
fican o mais atento dade, a reação aos problemas e ao mun- ca. Isso não tem preço para nós. Alcan-
do. Cresço tanto no sentido psicológico çamos uma parcela da sociedade que
O QUE ENSINAR SIGNIFICA PARA VOCÊ? quanto no trabalho e na vida. não teve acesso a um ensino gratuito de
Tudo. Infelizmente o método de educa- qualidade, e contribuímos para que es-
ção aqui no Brasil deixa muito a desejar, QUAL OBRA MARCOU MAIS VOCÊ? sas pessoas cheguem à universidade. Es-
ainda mais para quem não tem dinheiro. Várias. No momento é o P onc iá V ic ê n- tudando conosco, essa moça entrou em
O ensino deveria ser a base de qualquer c io (Pallas), da Conceição Evaristo, uma um curso super concorrido. Choramos
menino ou menina. Levar conteúdo para escritora brasileira negra que vem de quando recebemos o comentário dela.

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Como idar om as difi u dades


É possível superar as adversidades com uma boa dose de resiliência, atribuindo
um novo sentido à experiência e criando oportunidades a partir dela
TEXTO NARA SIQUEIRA

tr s anos e oito meses e e casa eu po ia assistir aos esenhos a ultura


vi a anhei um irmão enho mem rias não mui- enquanto comia um olo e chocolate ueria sen-
to n ti as a arri a a minha mãe crescen o e eu tir isso para sempre porque era al o po eroso
rincan o com o e que havia entro ela as empre ouvia meus pais izen o que tinham que
quela poca não azia a menor i eia e que e l resolver al uns pro lemas e a ulto e eu não que-
sairia al u m tão pequenino e onitinho com um ria que esses contratempos che assem para mim
par e olhos cor e mel que me ariam acre itar ente ran e não parecia tão eliz ao ter que li ar
que eu tinha anha o um oneco lin o e e ver a- com eles A vi a era muito ostosa aos seis anos e
e Fiquei realmente em surpresa com aquele su- s tr s horas a tar e
perpo er a minha mãe on orme crescia minha usca por essa apti ão
em meu irmão cresceu e minha casa oi inun a- especial aumentava ão me recor o e quan o oi
a por uma trupe e super her is pre eri o era o a primeira vez que ouvi a palavra resili ncia ato
omem Aranha m suas rinca eiras atirava teia que a achei tão onita que a incorporei no meu
para to os os la os a casa e ia e um c mo o para icion rio particular sem ao menos sa er o que
o outro mais r pi o que um piscar e olhos Apesar e atamente ela si nificava omei consci ncia e
o avoritismo o prota onista vermelho e azul os que estava li a a a uma orma e en rentar ificul-
outros persona ens tam m tinham seu valor u a es o que parecia per eito Afinal era capaz e
se voc pu esse ter um po er especial qual seria enten er que em al um momento passaria por si-
eu lhe per untava cheia e curiosi a e ra ele res- tua es escon ort veis semelhantes s que se su-
pon ia que queria ser invis vel ora que ostaria e ce iam para os mais velhos Associei o termo com
correr como o he Flash or a e coloquei o rapi amente como pr requisi-
uan o a per unta era evolvi a para mim no to e sucesso ratei como uma questão e honra
entanto eu não sa ia respon er ueria que meu eu precisava ser resiliente superar qualquer ifi-
superpo er osse al uma coisa que sur isse e cul a e encarar e rente os pro lemas ser uma
entro m sentimento talvez omo aquela sen- ortaleza ra o que me levaria a al um lu ar na
sa ão inesquec vel e quan o ao terminar a tare a vi a aquilo que eu tanto procurava

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Pouco tempo depois, lá estava eu, frustrada, muitas mães no decorrer do tempo. A partir des-
aos prantos para minha terapeuta: “eu não sei sa percep ão e clareza ela eci e criar um pro-
ser resiliente!”. Precisava lidar com uma chefe eto e ucativo e conscientiza ão no tr nsito
que gritava comigo o tempo todo na frente de por exemplo. Seja qual for a solução encontra-
clientes por eu não saber, só de olhar, a qual a por ela a or a motriz a mesma a vonta e
marca determinada peça de roupa pertencia. de acolher, ajudar e transformar a própria vida,
ssa uma situa ão if cil tenho que en ren- dando um novo sentido a ela e, consequente-
tar isso e permanecer forte”, imaginava. Em se- mente, à do próximo. Ao abraçar uma causa e
ui a o choro vinha porque aquilo o a oa traçar planos de ação, a pessoa se torna maior
ainda mais quando eu pensava que estava sendo o que a viv ncia ruim que e perimentou o
uma garota mimada por não conseguir adminis- sentimento de pertencer a algo mais intenso do
trar todo o contexto. E, então, veio a descoberta. que o sofrimento individual. “Outra observação
Pu e enfim a icionar um si nifica o ao super- importante iz respeito criativi a e que
poder que eu almejava ter. Resiliência não é tor- uma caracter stica importante a resili ncia la
nar-se um saco de pancadas e aceitar qualquer não serve s para que a pessoa pense em sa as
situa ão como se aquilo fizesse parte e certa fora da caixa, mas também para que possa ver o
maneira o crescimento emocional e ps quico pr prio pro lema e outros n ulos o que e
individual. Entendi que há batalhas que não te- certa orma lhe or a afirma isete
mos que en rentar e azer essa escolha não nos
coloca frente a frente com o fracasso ou a fraque-
za uito pelo contr rio resili ncia tam m Há batalhas que não temos que enfrentar, e fazer
saber que temos limites e valores - e precisamos
respeitá-los. “Essa confusão é bastante comum”,
essa escolha não nos coloca frente a frente com
conta Lisete Barlach, doutora em Psicologia So- o fracasso ou a fraqueza. Muito pelo contrário,
cial pela Universidade de São Paulo. “O termo
chegou ao Brasil associado a uma ideia de resig-
resiliência também é saber que temos limites
nação e conformismo. E continuamos aprenden-
do assim equivocadamente”, declara ela.
Ser resiliente está muito mais ligado à capaci- APRENDIZADO CONSTANTE
dade que temos de enfrentar as adversidades, os a er encarar as ificul a es não al o que
percalços da vida, e enxergá-los de uma maneira nasce conosco, então, de cara, já não se cobre
diferente, acreditando que pode surgir uma so- tanto. Vamos adquirindo essa capacidade aos
lução criativa a partir deles, mesmo que isso não poucos ao lon o a vi a a ca a vez que temos
fique claro em um primeiro momento ser ca- que li ar com um conte to esafia or que nos
paz e suportar ou e se recuperar e situa es tire do que costumamos chamar de normalida-
complica as ou mesmo uras e ao final essa de. “Não precisa ser um acontecimento grandio-
caminhada, perceber-se mais forte, apesar do so. Podemos pensar em cenários bem rotineiros,
sofrimento – sim, porque não podemos ignorar como quan o al u m per e um voo iz ana na
a or ma inemos uma mãe que per e um filho Leão, especialista em Psicologia Sistêmica, de
em um acidente: ele foi atropelado por um mo- São Paulo. “Há pessoas que decidem voltar para
torista e tremamente alcooliza o claro que casa e a frustração é tão grande, que a compro-
com o luto, essa mulher vivenciará uma dor e mete emocionalmente por dias seguidos. Outras
uma tristeza pro un as as no meio esse pro- encaram aquilo como um erro que já aconteceu,
cesso e depois que a dor se tornar menos dila- é passado, é algo a que todos estamos sujeitos,
cerante, ela também pode entender que aquela e buscam alternativas para embarcar, seja em
situação é recorrente e que não é a única pessoa outra companhia aérea, seja em um horário dife-
que está passando por isso - outras já viveram rente. A resiliência é um convite para enfrentar
algo parecido. E mais: isso ainda ocorrerá com a situação, não desistir dela”.

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Mas como fazer isso? Como reagir de maneira, tendimento de que não estamos no controle de
i amos mais equili ra a iante as ificul a- tudo, nem mesmo daquilo que soa como previsí-
des? Talvez, de cara, você não consiga encontrar vel. Encarar cada vivência como um aprendiza-
uma saída para o chefe que grita a todo instante; do e consequente oportunidade de crescimento
talvez você siga com a sensação de impotência é um bom caminho rumo à resiliência, porque
diante da situação econômica e política do país; nos torna mais ispostos e fle veis es e que
talvez você não suporte mais perder três horas claro, essa circunstância não infrinja nossos va-
do dia no congestionamento; talvez você ainda lores. E como reconhecer quando ultrapassamos
sinta uma dor profunda quando se lembra de os próprios limites? “Quando há dor e sofrimen-
alguém querido que se foi. Os percalços podem to esclarece ana na eão
ser de origens diversas, mas cada um sabe onde Há dores naturais ao processo de transforma-
lhe i mais ou menos e o quão if cil se uir ção que são necessárias, e essas não são passí-
em frente, respirar, seguir tentando e, no meio veis e ser evita as Por outro la o e istem as
de tudo, manter-se forte, em pé, inteiro. que nos avisam que estamos indo contra nossa
Um ponto importante é que não dá para per- verdade - e é nesse cenário que precisamos as-
correr caminhos if ceis sem antes olhar para sumir que está na hora de reavaliar o caminho e
dentro e reconhecer o que estamos sentindo. ponderar se vale a pena permanecer onde esta-
Esse talvez seja um dos aprendizados mais pro- mos ou seguir por outra rota.
fundos e que é cercado por muito desconforto.
Em seu livro Mais F or t e do q u e N u nc a – C aia. L e -
v ant e - s e . T e nt e O u t r a V e z (Sextante), a professo- Não dá para percorrer caminhos difíceis
ra e pesquisadora do departamento de Serviço
Social da Universidade de Houston (EUA), Brené
sem, antes, olhar para dentro e reconhecer
Brown, fala muito bem sobre como lidamos com o que estamos sentindo. Esse talvez
nossas emoções de maneira equivocada e por
quê. Segundo ela, “o que mais atrapalha na hora
seja um dos aprendizados mais profundos
e en rentar uma emo ão if cil o elemento
que costuma servir de obstáculo a outros com-
portamentos corajosos: o medo. Não gostamos Se pensarmos na resiliência como uma casa,
do que estamos sentindo e temos medo do que certamente nos daremos conta de que ela não se
os outros vão pensar. Não sabemos o que fazer sustenta sozinha. Há outras habilidades impor-
com o desconforto e a vulnerabilidade. A emo- tantes que fazem parte da construção, como a
ão po e ser terr vel mesmo fisicamente Po e- capacidade de se adaptar a diferentes situações,
mos nos sentir expostos, em risco e inseguros a fle i ili a e e a persist ncia Pessoas con-
em meio às emoções. Nosso instinto é fugir da trola oras t m mais ificul a e na concep ão
dor. Na verdade, a maioria de nós nunca foi ensi- do ser resiliente, porque são pouco tolerantes
nada a acolher o incômodo, conviver com ele ou rustra ão e plica ana na if cil perce er
comunicá-lo, mas apenas a descarregá-lo, livrar- que h coisas que saem o controle A psic lo-
se ele ou fin ir que ele não est acontecen o ga Lisete Barlach dá mais uma pista: “a religio-
Lidar, primeiramente, com a dor, com o incô- sidade, não necessariamente a religião, também
modo, parece ser, então, essencial. Mas você importante Acre itar que h al o maior nos
pode começar a fazer isso em passos pequeni- permite superar algumas questões com facilida-
nos. Uma sugestão: exercite um olhar mais aten- de, porque não as vemos como um acaso.
to para os acontecimentos do cotidiano. Isso
ajuda a entender como costumamos responder IMPORTÂNCIA DO COLETIVO
aos esafios e o que po emos azer para mu ar A boa nova é que você não precisa enfrentar essa
a reação do nosso corpo, para reduzir, na mesma estrada de forma tão solitária quanto pode ima-
proporção, a frustração. Aos poucos, vem o en- ginar. A psicóloga Elisa Mara Leão, que, em

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seu trabalho de doutorado, dedicou-se a estudar mos toca os ou a u a os pelo outro e tam m
a resiliência, destaca que o aspecto social é um afetamos quem está ao redor. Tornamo-nos mais
importante fator de proteção quando pensamos ortes para en rentar os pr imos esafios com
nas características que favorecem a formação de essa palavrinha complicada chamada resiliência
uma personalidade propícia ao enfrentamento e entendemos que a maior capacidade de resis-
das crises. O convívio que estabelecemos com as tir é aquela feita com o amor que nasce dentro
pessoas que estão ao nosso redor é determinan- da gente e transborda para o mundo. Como diria
te no processo e ressi nifica ão e supera ão a mon a u ista Pema h r n em seu livro O s
das turbulências. Familiares, parceiros de tra- L u g ar e s Q u e N os A s s u s t am – u m G u ia P ar a D e s -
balho, amigos, integrantes de um mesmo grupo er r o or ge e e o if cei (Sex-
social… Todas as pessoas com quem mantemos tante s quan o conhecemos as nossas trevas
rela es são onte e influ ncia ece em nosso podemos ter consciência das trevas alheias. A
afeto e, em certa medida, devolvem-no para nós, compaixão se torna real quando reconhecemos
acrescentado aquilo que há dentro de cada um. nossa humanidade compartilhada”.
oris rulni neurolo ista ranc s afirma oltan o ao in cio este te to ho e acre ito
que só conseguimos enfrentar um sofrimento ter a resposta que me foi feita lá na infância pelo
e fazer com ele um trabalho útil para os outros meu irmão mais novo se voc pu esse ter um
depois de termos sido acolhidos e fortalecidos. poder especial, qual seria?”. O poder de olhar
Ele chama essas pessoas, tão essenciais no cami-
nho, de “tutores de resiliência”, gente que signi-
fica apoio e se uran a para n s Po e ser aquele Essa jornada pertence a você, mas temos que
amigo que sabe ouvir, um terapeuta, o compa-
nheiro ou companheira, os pais, os irmãos. Os
aprender a depender de outros viajantes, por
tutores são como pontos de apoio distribuídos breves momentos, para encontrar refúgio, apoio e
pelas nossas estra as pessoais mais if ceis e
isso só é possível porque eles reconhecem nos-
a disposição ocasional de caminhar lado a lado
sos problemas, sabem se colocar no nosso lugar,
entendem o que estamos passando.
A pesquisadora Brené Brown também se re- para dentro com uma grande lente de aumen-
fere à necessidade do apoio do outro de manei- to. Isso porque entendi que para sobreviver às
ra muito bonita em seu livro Mais F or t e do q u e turbulências inerentes ao caminho não é preciso
N u nc a. Sobre seguir em frente, em momentos enfrentar todos os cenários de forma resistente,
if ceis ela escreve essa orna a pertence a numa tentativa de superá-los a qualquer custo.
você, mas ninguém é capaz de trilhá-la com su- É preciso me olhar profundamente, entender o
cesso sozinho. Temos que aprender a depender que estou sentindo, aceitar algumas vezes, en-
e outros via antes por reves momentos para contrar maneiras para sair do meu maremoto
encontrar refúgio, apoio e disposição ocasio- interno, de vez em quando. Em determinados
nal e caminhar la o a la o Para aqueles que momentos, vou conseguir fazer isso sozinha, em
t m me o e ficar sozinhos li ar com a soli ão outros vou precisar e a u a tu o em as
inerente a esse processo o ran e esafio en- sempre sairei transformada da experiência, sem
quanto para aqueles que preferem se isolar do amais esquecer e on e vim em que lu ar es-
mundo e se curar sozinhos, a exigência de esta- tou e qual rota quero realmente seguir. Esse é o
elecer v nculos e pe ir e rece er a u a reconhecimento e uma orna a compartilha a
que se torna o esafio esili ncia afinal
O mais bonito de toda essa relação é que ao
conse uir li ar com as ificul a es perce emos
NARA SIQUEIRA está estreando nas páginas da revista.
que essa realmente não uma orna a solit ria Ela ainda está em busca de super poderes, mas já
Ela não diz respeito só a nós. Ao longo dela so- considera a resiliência uma conquista.

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C O N V I V E R | H OR I ZONTE S

A vida como ela é


Retratar as pessoas e o cotidiano
de um lugar é também uma
maneira de aprender a amar-se
TEXTO ANA HOLANDA
FOTOGRAFIA MARCELO OSÉAS

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C O N V I V E R | H OR I ZONTE S

que levava no io o finais e semana quan o o lu ar ficava pesquisamos so re oto rafias e lha-
ot ra o arcelo s as se mu ou com repleto e ente e ora apren eu ela vemos somente ima ens e praias
a esposa para lha ela em ão Paulo a a mirar a lama que se orma epois lin ssimas as qual o rosto o povo
u tinha conheci o a ilha havia uns a chuva o ni us que leva as pessoas ilha elense omo seu coti iano
anos em uma via em e mer ulho e um la o para o outro ou as crian as Para mim uma comuni a e que não
e lem ro que isse um ia vou morar rincan o com o que a natureza lhes se retrata est a a a ao esquecimento
aqui ito e eito lem ra s as ntre apresenta sse olhar elica o para as ou assimila ão por outras ormas e
e arcelo morou nesse lu- pessoas e para o entorno virou ensaio viver o final as contas na minha opi-
ar que um estino muito procura o oto r fico estampa o no seu site que nião retratar nosso ia a ia uma ela
por turistas lha ela conheci a pelas tam m port lio e tra alho as orma e amar a n s mesmos finaliza
praias e uas claras e pela natureza não espere encontrar ima ens e locais
e u erante que o ot ra o en er ou para is acos s a vi a e to o ia
MARCELO OSÉAS mora atualmente em São
mais o que isso le se encantou com a mesmo ou tu o isso sse re istro tem Paulo, mas ainda se encanta com a vida cotidiana.
vi a que acontecia to o ia e não s nos um motivo pro un o para ele quan o Para saber mais: marcelooseas.com.br

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O ônibus que percorre as ruas da ilha, as crianças brincando ao ar livre, a interação dos moradores do lugar com os bichos.
Tudo isso encanta e remete para a simplicidade e a beleza de um cotidiano em que, às vezes, deixamos de reparar

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C O N V I V E R | H OR I ZONTE S

Para o fotógrafo paulista Marcelo Oséas, retratar as pessoas de um lugar, em suas atividades mais prosaicas, é uma
maneira de se autovalorizar, de se olhar de um modo amplificado e generoso e, por que não, um jeito de se amar

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T R A N SFO R M A R | PE NS AR

Quanto tempo a gente tem?


As emoções e experiências podem transformar a
percepção do tempo e alterar a forma de senti-lo passar
TEXTO DÉBORA GOMES ILUSTRAÇÃO | COLAGEM TIAGO GOUVEA

eu pensava que o tempo osse um em um rel io com ponteiros velozes quan o ouvem
ran e rel io e ponteiros i antes que uncionava a palavra tempo como eu em minha in ncia e os-
sem escanso em al um lu ar que eu não po ia al- se para esenhar o tempo eu provavelmente aria
can ar me ava conta a sua veloci a e quan o o um trem ala com um maquinista com um rel io
c u come ava a escurecer anuncian o que era hora ran e no pulso contou aria re erin o se m si-
e parar a rinca eira o ia e me preparar para or- ca rem ala a cantora Ana ilela
mir o e s vezes ain a me pe o pensan o nessas que em ora tenha apenas anos aria
propor es o tempo e em suas maneiras elica as apren eu a se ivi ir entre as rinca eiras as o ri-
e passar por mim con esso tento al umas vezes a es a escola a nata ão e as ativi a es que esen-
esenhar em minha ca e a ormas e aproveit lo volve na i re a eu tempo parece mesmo alcan ar a
melhor iante a reali a e o ia a ia veloci a e e um trem ala m pouco i erente e
ompreen er que o tempo não al o palp vel mas via que anos mais nova não e perimenta tanto
que po e se trans ormar iante os esafios a nos- essa pressa la me isse que conse ue aproveitar
sa rotina um ran e passo para nos enten ermos em seus momentos e ol a para rincar ouvir his-
melhor com ele sem tantas co ran as ou arrepen- t rias passear no parque e istrair o tempo quase
imentos Afinal como escreveu rio uintana a sem perce er sua passa em
vi a o ever que n s trou emos para azer em casa ssa i eren a e percep es acontece porque con-
uan o se v são seis horas uan o se v orme envelhecemos amos lo o um eito e preen-
se ta eira uan o se v atal uan o se v cher nossos espa os va os com mais e mais tare as
terminou o ano uan o se v per emos o amor a crian o a sensa ão e sermos teis iante a vi a
nossa vi a as ser que e iste uma maneira mais aria me ensinou que to a essa veloci a e que e -
a etuosa e li ar com o nosso tempo sem acumular perimentamos ho e vem e uma necessi a e anti a
tantas sensa es e esper cio e ocupar sempre o tempo se a com tare as ha itu-
Para tentar encontrar essa resposta contei com a ais ou novas esco ertas an o a impressão e ias
a u a as pequenas via Almei a e aria onti o ca a vez mais curtos iante e tantos a azeres u e
om e anos as uas tam m s vezes pensam minha mãe temos s o omin o para escansar

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Quando fazemos algo novo ou mesmo prazeroso, a sensação de tempo é diferente de quando precisamos nos ocupar com algo enfadonho

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T R A N SFO R M A R | PE NS AR

Então, é o dia em que fazemos mais coisas juntas um pouco mais de paz. Cláudia Hammond explica
e nem percebemos ele passar”, completou Maria. que, quando preservamos nossos momentos de
Em seu livro T im e W ar p e d: U nl oc k ing t h e My s - alegria e lançamos um olhar novo para a nossa ro-
t e r ie s of T im e P e r c e p t ion (Tempo Irregular: Des- tina, buscando mais detalhes ou novidades naqui-
cobrindo os Mistérios da Percepção do Tempo, lo que nos cerca, forçamos nosso cérebro a deixar
em tradução livre), a psicóloga britânica Cláudia sua zona de conforto e isso, por si só, já muda a
Hammond explica que o sistema de nosso cérebro sua percepção do tempo.
considera vários fatores, como emoções, expecta- Conhecer pessoas, lugares, tomar caminhos di-
tivas, exigências e sentidos, para registrar a pas- ferentes ao voltar para casa, agir de maneira es-
sagem de tempo. Segundo ela, alguns momentos pontânea, envolver-se em novas atividades. Todos
da vida parecem mais longos que outros porque, esses pequenos detalhes, que podem até parecer
durante esses períodos, somos expostos a experi- clichês, têm o poder de mudar a nossa forma de
ências novas. Isso faz com que o cérebro perceba sentir e agir diante do passar das horas.
cada situação com durações diferentes. Algumas
vezes, quando estamos fazendo algo muito praze- LEMBRAR-SE DE RESPIRAR
roso ou divertido, sentimos o tempo de uma ma- Por aqui, sempre que alguma situação ameaça me
neira mais leve, sem amarras. E, justamente por amedrontar diante das horas, tento trazer à mente
não focarmos tanto em sua passagem, ele parece a frase de um amigo, “lembrar de respirar é man-
voar. “O tempo é outro quando escrevo. Já passei tra para não se afogar na tempestade dos dias”.
horas escrevendo, já vi dia amanhecer, sem sentir Muitas vezes, esquecemos que algumas soluções
as horas passarem. É uma sensação deliciosa”, ex- se encontram em nós, no cultivo de uma calmaria
plicou a escritora Ana Jácomo. interna – e não na velocidade de fora. Deixando
Para ela, a escrita é um medidor de ponteiros e nossa ansiedade de lado, perdemos um pouco o
também uma forma de sentir o tempo de um jei- desejo de controlar tudo e então enxergamos no-
to mais leve, doce e até poético, além de ser um vas possibilidades diante dos olhos, compreen-
caminho para guardar e preservar memórias. “A dendo que realmente há um tempo para todas as
palavra é uma forma de preservar os instantes. coisas. Assim, automaticamente deixamos de nos
Um exemplo disso são as cartas trocadas entre cobrar tanto e temos a chance de viver momentos
amigos. Os anos passam e é possível fazer uma re- intensos e prazerosos. “Da mesma maneira que o
leitura de épocas pelo contato com tudo o que foi tempo nos mostra o que não si nifica tanto quan-
escrito”, disse. Ainda segundo Ana, o prazer que to pensávamos, ele também nos diz o que, de fato,
experimentamos em uma determinada atividade, é precioso”, completa Ana.
também mostra claramente se algo é bem-vindo A partir do instante em que nos abrimos para
ou não para o nosso coração. as pequenezas da vida e entendemos que são elas
Isso explica um pouco aquela sensação que fa- que importam, temos a chance de viver de uma
lei há pouco de que o tempo parece caminhar a forma mais honesta com nós mesmos e com o nos-
passos lentos, quando estamos dentro de alguma so tempo Afinal como escreveu uintana ao fim
situação desagradável. Desejamos tanto que ele do poema: “se me fosse dado um dia, outra opor-
passe depressa, que nem sequer conseguimos tunidade, eu nem olhava o relógio. Seguiria sem-
aproveitar determinadas situações. “Precisamos pre em frente e iria jogando pelo caminho a casca
sempre aproveitar o momento. Porque ele não dourada e inútil das horas”. E você? Se lhe fosse
volta. Esse instante que estamos vivendo aqui da- dada uma outra oportunidade, viveria as simplici-
qui a pouco já passou e não vai nunca mais se re- dades ou se prenderia no deslizar dos ponteiros?
petir”, disse Maria, referindo-se à nossa conversa.
E esse aproveitar que ela sugere não precisa im-
plicar coisas grandiosas: olhar para o nosso dia
DÉBORA GOMES não usa relógio, mas ainda percebe
com mais leveza e menos cobranças já é uma for- o tempo pelas cores do céu e diferencia muito bem
ma de nos separar dos esgotamentos e encontrar as estações do ano pelo pôr do sol.

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A questão é que não temos controle em relação aos ponteiros, mas podemos modificar a maneira como vivenciamos cada minuto

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É possível desenvolver
a au oconfian a

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D I L E M A S

onfiar na nossa capacidade de realizar pe uenos ou grandes


desafios, de acreditar em n s mesmos, n o tare a das mais -
ceis preciso nos ol ar com mais generosidade, assumir ue s
ezes amos errar, tropeçar ou racassar , acima de tudo, ter a
coragem de nos e por, mesmo correndo o risco de parecermos
rid culos ou inade uados az parte da ida, n o mesmo
TEXTO SAULO VELASCO

alar e homens e velmente não reconhecermos em n s


mulheres e traor in rias que realiza- o mesmo n vel e or a e esem ara o
ram ran es eitos conquistaram im- que automaticamente cre itamos a es-
portantes posi es ou ain a tiveram sas pessoas e traor in rias
a cora em necess ria para mu ar suas Antes e a an onar qualquer sonho
vi as ra icalmente a an onan o o con- em un ão o reconhecimento humil e
orto e a se uran a e um caminho que e nossas limita es pessoais h uma
a socie a e acre ita ser o mais acerta- importante li ão a ser apren i a uma
o everenciamos to os eles e at os parte consi er vel as realiza es mais
inve amos com a cren a e que suas a mir veis o ser humano ecorre não
conquistas são resulta o e um om e compet ncias especiais mas e um
e uma inteli ncia ou e qualquer ou- sin elo pre ica o emocional que cha-
tro atri uto especial e inacess vel s mamos e autocon ian a n epen en-
pessoas comuns Pior ao nos olharmos temente e qualquer apti ão t cnica
enquanto alme amos conquistas seme- que possamos vir a a quirir ela a au-
lhantes icamos ecepciona os e s tocon ian a que nos permitir colocar
vezes nos martirizamos por lamenta- esse apren iza o em pr tica ou não

A SÉRIE DILEMAS é uma parceria entre a revista Vida Simples e a The School of Life e traz artigos assinados
por professores da chamada “Escola da Vida”. A série tem como objetivo nos ajudar a entender nossos medos
mais frequentes, angústias cotidianas e dificuldades para lidar com os percalços da vida.

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SE R | D I L E M A S

Mas o que fazer se, ao nos observarmos, tomonitoramento e autogerenciamento.


reconhecermos com igual decepção que m outras palavras ser confiante pos-
nossa alma carece esse tipo confian a suir e manifestar um conjunto de atitu-
O que fazer ao constatarmos que fomos des sobre si e sobre os outros, as quais
injustamente privados dessa caracte- au iliam a en rentar esafios e a per-
r stica Felizmente a resposta mais sistir iante e ificul a es e e sinais
otimista do que, à primeira vista, pode de fracasso ou humilhação. Como fazer
parecer Autoconfian a não um tra o isso ma maneira i entificar as ar-
inato e est tico a personali a e ão reiras emocionais li a as confian a e
algo com que simplesmente possuímos em seguida, descrever possíveis estra-
ou não e que deveríamos nos conformar. t ias psicol icas que ca a um po e
Ao contr rio uma ha ili a e e como exercitar para superá-las. Por exemplo, o
qualquer outra, pode ser aprendida. medo de parecer idiota, para si mesmo e
para os outros uma as principais ar-
APRENDENDO A TER CONFIANÇA reiras ao desenvolvimento da autocon-
Ao longo de nossa vida acadêmica e fian a Frequentemente recuamos ian-
profissional apren- te e esafios que su erem mesmo que
demos a ser con- remotamente, alguma possibilidade de
Recuamos diante fiantes em reas parecermos ridículos aos olhos dos ou-
t cnicas em espe- tros. E, no entanto, essas costumam ser
de desafios ue c ficas como eren- exatamente as situações mais estimulan-
sugerem, mesmo ciar vários projetos, tes e ratificantes as nossas vi as Por
ue remotamente, escrever relatórios, medo de parecermos bobos, ousamos
preparar todo tipo pouco, não nos candidatamos, por exem-
alguma possibilidade de de planilha e apre- plo, a uma promoção, não apresentamos
parecermos ridículos aos sentações ou ainda uma nova ideia na reunião, não arrisca-
operar e tratar pes- mos um novo projeto de vida, não convi-
olhos dos outros soas, desenhar com damos, nem mesmo, aquela pessoa que
precisão etc. Há, po- nos atrai para sair para jantar.
r m um tipo eneraliza o e confian a Na contramão do que normalmente se
passível de ser aplicado a qualquer área pensa, a melhor forma de superar essa
da vida humana, que infelizmente não arreira efinitivamente não nos con-
nos ormalmente ensina o Aqueles vencen o e que somos pessoas s rias
que eventualmente acabam aprenden- e e que tu o ficar em Ao contr rio
do, por conta de acontecimentos da vida tornamo nos muito mais confiantes quan-
cotidiana, arriscarão mais e terão mais do aceitamos humildemente em nossos
chances de sucesso. Aqueles que não dis- corações que somos, e sempre seremos,
puserem de condições similares podem ridículos de algum modo. Jamais escapa-
acabar, infelizmente, à margem dos seus remos disso. Simplesmente, não há es-
próprios desejos de realização. colha. Assumir por premissa que somos
ornar se autoconfiante requer um im ecis e carteirinha li erta or Por-
grau razoável de autoconhecimento e, tanto, precisamos urgentemente fazer as
sobretudo, um exercício perene de au- pazes com o nosso idiota interior, essa

A SÉRIE DILEMAS é uma parceria entre a revista vida simples e a The School of Life e traz artigos assinados
por professores da chamada “Escola da Vida”. A série tem como objetivo nos ajudar a entender nossos medos
mais re uentes, an stias otidianas e di i u dades para idar om os per a os da ida

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pessoa que desesperadamente tentamos em n s um con unto e raquezas que
esconder dos olhos alheios. Quando assim não o servamos nas pessoas que estão
o fizermos qualquer nova estupi ez que azen o aquilo que ese amos azer
porventura venhamos a cometer não nos Para superar a síndrome do impostor e
abaterá. Será apenas mais uma instância tornarmo nos mais autoconfiantes pre-
daquilo que já aceitamos honestamente cisamos azer um voto e u se a as-
sobre nós mesmos. Ao consentirmos o sumir ce amente certas coisas so re as
risco iminente e azer papel e i iota pessoas que elas amais nos irão e plici-
aumentamos consi eravelmente nossa tamente e que portanto amais po emos
probabilidade de sucesso. provar empiricamente como acre itar
Outra importante barreira emocional que mesmo as pessoas mais respeitadas
autoconfian a tem si o enomina a e ormi veis que conhecemos possuem
de síndrome do impostor. De tempos em as mesmas raquezas e inse uran as que
tempos a vi a nos presti ia com sin u- nós. Elas simplesmente nos escondem
lares oportuni a es e realizarmos coi- isso e revelam apenas o que lhes conve-
sas ver a eiramente si nificativas como niente omo to o mun o est vestin o a
assumir um car o e er ncia a rir um sua máscara de suces-
ne cio pr prio escrever um romance so s conse uimos
coor enar um pro eto inova or ão en er ar as nossas Temos acesso, o tempo
incomum no entanto re eitarmos essas pr prias limita es
oportuni a es simplesmente porque não rias outras ar-
todo, a nossas incertezas,
nos consi eramos i nos elas n ro- reiras emocionais à difi u dades, ansiedades,
me o mpostor assim a cren a e que autocon ian a po- medos e inse uran as
as pessoas que já conquistaram o que de- dem ser menciona-
se amos são le timas em suas posi es as em ora nesse internas mas, dos outros,
enquanto n s caso ocup ssemos esses caso este não se a emos apenas a ui o
mesmos lu ares ser amos impostores o melhor momen-
insolentes uma ran e arsa apenas es- to para analis las
ue e es mostram
perando para ser descoberta. como a autossabota-
A razão pela qual e perimentamos a em o me o as cr ticas a presun ão o
s n rome o impostor na a tem a ver não e o otimismo in nuo A supera-
com qualquer perspectiva e m rito ou ão esse con unto e arreiras requer
e compet ncia pessoal re erente a uma es or o ili ncia e tam m perseve-
etermina a realiza ão emo nos como ran a Precisamos e ercitar nossa auto-
impostores apenas porque sabemos cer- con ian a continuamente se quisermos
tas coisas so re n s mesmos e não temos mant la em orma a mesma maneira
o mesmo conhecimento a respeito dos que precisamos e ativi a es sicas
outros. Temos acesso a nossas incerte- re ulares para manter nosso corpo em
zas me os ansie a es e inse uran as equil rio Al uns e erc cios oram su-
internas mas os outros vemos apenas eri os aqui A ora voc que precisa
o que eles izem e azem aos olhos o percorrer esse caminho. Pode parecer
mun o ão temos acesso a sua intimi- r uo no in cio mas o resulta o acre i-
a e m outras palavras reconhecemos te astante recompensa or

SAULO VELASCO psi o o, em si o o ia pe a S , s io undador da upa Edu a o Amp iada,


pro essor no aradi ma Centro de Ci n ias e Te no o ia do Comportamento e pro essor na T e S oo o
i e rasi , onde ministra au as e or s ops so re on ian a e outras a i idades emo ionais

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C O N V I V E R | T RAB ALHO

Espaço para todos


Compartilhar o ambiente de trabalho com pessoas iguais
ou diferentes pode gerar aprendizados dentro e fora da gente
TEXTO EDUARDO ALVES

primeiras palavras e um espa o cole as compartilhar a mesa e o espa o o ca com


compartilha o on e se pratica o que chamamos e esconheci os u o isso tornou meus movimentos
co or in lu ar fica na re ião a aveni a Paulista contra it rios por al uns instantes esqu cios e
em ão Paulo inha inscri ão por aqui oi eita pou- uma carreira inicia a em outro ormato e era ão
co antes o convite para con uzir esta reporta em e mol a a para nascer e morrer no mesmo lu ar e ui
casou com o in cio a minha orna a empreen e ora para o uturo mesmo assim apreensivo e livre
aquele momento em que enten emos que necess - Para esta reporta em mais o que conhecer postos
rio mu ar a rota para ar mais si nifica o ao azer e e tra alho ui atr s e hist rias e quem esco riu
ao ser e criar uma maior cone ão entre eles ncon- no espa o e na e peri ncia o compartilhamento o
trar esse caminho epois e tanto tempo ocupan o si nifica o e o suporte o seu momento e ser e e
a mesma mesa a mesma ca eira o mesmo en ere o realizar al o essa orna a não e clusiva o ono
e ten o o mesmo cartão e visitas si nifica esco- o pr prio ne cio mas po e azer parte a carreira
rir espa os e acolhi a para li ar com as incertezas e qualquer um a minha e a sua por e emplo
que o novo az rotar no peito e na ca e a não am m conversei com especialistas que enten em
estou alan o s e um of cio mas e sentimentos e ente e e espa os eitos para acolher e conectar
e necessi a es que afloram quan o nos ispomos a ma elas oi a psic lo a e c oac h om r onza a
mer ulhar em mu an as e a entrar em contato com que inclusive a epta e co or in s para seus
o si nifica o que estar presente em um am iente e aten imentos la me contou que ocupar espa os
tra alho se a qual or tem em nossa vi a compartilha os po e espertar afini a es e o senti-
os meus primeiros ias em carreira solo fiz meu mento e união entre as pessoas uita ente tra a-
ca astro numa por ão e espa os compartilha os A lha como aut nomo e po e encontrar nesses lu ares
primeira sensa ão oi e li er a e e po er transi- uma cone ão com o outro e se livrar muitas vezes
tar por a e estar a ca a momento num lu ar a se- o sentimento e soli ão passan o a ter a sensa ão
un a oi e me o claro o que po eria encontrar e estar em um time eles as pessoas não se veem
e li ar com o inespera o A surpresa e a ca a ia concorrentes entre si pelo contr rio aponta ela
a rir portas ter esafios i erentes e estar com novos am m são espa os que uncionam muito em

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FOTO ISTOCK

Ao entrar num coworking, a primeira sensação é de solidão, de estar sozinho naquele mar de novas conquistas e desafios

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C O N V I V E R | T RAB ALHO

para quem precisa focar e produzir e não encontra solitário é ser mãe nos dias de hoje. Em outros
isso trabalhando dentro da própria casa”. tempos, as mães trocavam mais entre elas, eram
Coral Michelin, que é mestre em design estraté- todas vizinhas, conversaram sobre suas dúvidas e
gico e dissertou sobre casas colaborativas como inseguranças. Nesse espaço, encontramos a opor-
inovação social, comenta que, no início, as pessoas tunidade de interagir com outros pais e falar de
buscam ambientes compartilhados pensando ape- coisas pelas quais todos passamos”, diz ela.
nas na redução de custo. Mas a verdade é que, com Em 2016, o espaço compartilhado que Thaís e o
o tempo, podem descobrir, nesses espaços, outras marido frequentavam foi adquirido por uma esco-
oportuni a es isso epen e muito o perfil e la in antil a ila ofia que manteve o local para
cada um e do lugar que encontram. “É preciso olhar os pais de seus alunos. Conversei com a Natália
além e trocar mais com o outro, pensar em como Ramon, que é mãe do Antônio, de 5 anos, e do Fe-
contribuir para aquela rede. Esse pode ser um local lipe, de 3, e proprietária da escola. Ela conta que
rico para gerar conhecimento e interação, valorizar quando conheceu o coworking viu a oportunidade
mais conexões e convivência e não apenas renda”. de compartilhar um sentimento que sempre tinha
Com isso, o ambiente de trabalho ganha outro sig- tido: não se sentir pela metade sendo mãe ou pro-
nifica o alinhan o esenvolvimento profissional e fissional eus filhos sempre estu aram on e
pessoal na mesma jornada. E o ritmo é você quem trabalho e conheço todas as pessoas que estão
dá: diário, semanal ou até de poucas horas. perto deles. Apesar de termos a entrada livre para

EM FAMÍLIA
Foi percebendo os novos rumos que gostaria de Compartilhar o espaço de trabalho é ter a
dar à carreira que a designer Thais Scaglione e
o marido, Flávio Vieira, publicitário, resolveram
surpresa de, a ada dia, a rir portas e desafios
deixar São Paulo e retornar para Curitiba, cida- diferentes, estar com novos colegas, dividir a
de onde se conheceram. Em 2008, abriram uma
agência de design, a Sem Dublê. Começaram em
mesa e o cantinho do café com desconhecidos
casa e alugaram salas quando a empresa começou
a crescer e a equipe aumentou. Nesse caminho,
perceberam que paredes já não faziam sentido os pais por aqui, era incômodo pensar que não
para aquela jornada e voltaram a apostar no h om e po iam estar ao la o os filhos como eu consi o
office. Seguros da rota que tomaram, prepararam- conta entusiasmada. Natália revela ainda que, no
se para rece er o primeiro filho ho e com pouco come o os pais ficam atentos a to o movimento
mais de 3 anos. “Já havíamos decidido que eu iria a crian a o er rio fica ao la o o coworking -
ter seis meses dedicados ao Joaquim”, conta Thaís. mas, com o tempo, a criança e os pais ganham seu
Ao final essa tempora a no entanto a esi ner lugar. “A professora sente quando a criança preci-
não sentia que estava pronta para se separar do sa de um ‘cheiro’ da mãe e, então, a leva até o espa-
filho e esco riu um espa o compartilha o para o compartilha o Assim se constr i a confian a
famílias, que funcionava como um coworking para do pequeno com outros adultos, além dos pais”.
que mães e pais ficassem mais perto a crian-
a a e pu essem equili rar a profissão e a e i- ENTRE AMIGOS
cação aos pequenos. “Foi maravilhoso, porque eu Não são só as famílias que encontram apoio e cari-
não queria deixá-lo o dia todo na escola. Conse- nho em espaços compartilhados. Marluce Santos,
guir estar próxima dele e retomar aos poucos a ou Mar, como gosta de ser chamada, há um ano
minha carreira foi essencial. Além disso, o Flávio desembarcou na frenética São Paulo. Fotógrafa es-
sempre nos acompanhava”, recorda-se. Começa- pecialista em moda, ela resolveu buscar na capital
ram indo algumas horas, em determinados dias da paulista novos ares e oportunidades para a vida e
semana e, depois, foram alongando, até chegar a para o trabalho. “No começo, achei que seria mais
seis horas diárias. “Por lá, percebi também o quão fácil me acostumar”, recorda-se. “Conseguia

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Mas basta um olhar mais atento, trocar uma palavra entre uma tarefa e outra, ou um café e outro para perceber que você não está sozinho

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C O N V I V E R | T RAB ALHO

ver meus amigos em Florianópolis com mais fre- qual a empresa, que tem foco no setor imobiliário,
quência. Aqui todos têm outro ritmo”. está alocada (sim, tem muita companhia se ajus-
Mudar de cidade é o tipo de coisa que nem sem- tando também a esse formato). Frederico passa
pre é muito fácil. Mar se dividia entre o trabalho pouco tempo em uma mesa. Isso porque uma de
em casa, para tratamento das imagens e adminis- suas atividades é justamente conectar pessoas,
tra ão o ne cio e est ios e oto rafia alu- mostrar o valor do trabalho em rede e apresentar
gados para produção. Apesar de serem sempre oportunidades que moram nesse formato.
bem equipados, ela sentia falta de algo nessas O que a Thaís, o Flávio, a Natália, a Mar, a Bethi-
locações: de gente. Pesquisando na internet, des- na, o Frederico e eu temos em comum é a busca
cobriu os espaços compartilhados e encontrou por um espaço que converse com quem somos,
um que atendia suas duas necessidades: tinha um que esteja alinhado com nosso momento de vida
estúdio para fotografar e a presença de pessoas. atual, e que traga, ainda, a sensação de aconchego,
Hoje, Mar frequenta, em alguns dias da semana, de que encontramos nosso lugar no mundo naqui-
o a Fashion que fica perto e sua casa em ão lo em que trabalhamos. É o encontro com espa-
Paulo e tem a proposta de atender o mercado de ços que contribuem para que a realização nossa
moda. Ela, que adora contar histórias, diz que po- e ca a ia se a sempre permea a e si nifica o
der trocar com os outros é um ganho e tanto quan- para nós e para o outro. Ainda na dúvida? Então
do se está em um c ow or k ing . “Posso participar dos siga a sugestão da psicóloga Gomér: “vá conhecer
eventos, interagir, fazer novas amizades e, ainda,
apresentar o meu trabalho”, comenta com alegria.
la tam m me confi enciou s vezes quan o É preciso olhar além e trocar mais com o outro,
preciso ficar um pouco al m o hor rio no est -
dio, já aviso a Bethina e a convido para uma cerve-
pensar em como contribuir para aquela rede. Esse
ja e um bom papo depois do expediente”. pode ser um local rico para gerar conhecimento,
Bethina, que é sócia e diretora do espaço, tam-
bém já foi c ow or k e r do mesmo lugar no início de
valorizar mais conexões e não apenas a renda
sua carreira com a moda. Esse aprendizado, pude
perceber, ajudou-a a se aproximar das pessoas.
“Continuo sem ter uma sala por aqui; outro dia esses lugares, sentir a energia deles e das pessoas
estava trabalhando no computador na bancada de ali; isso realmente importa para que você escolha
costura, no ateliê”, disse sorrindo durante minha um ambiente que lhe o faça feliz”, conclui.
visita ao local er eliz com o tra alho para a ar Nessa busca, você pode se deparar com um lu-
e para a Bethina, não tem a ver com o ter um es- garzinho bem aconchegante, com cara de casa,
paço para chamar de seu, mas com as relações e em sua cidade, ou no formato mais corporativo,
realizações que a vivência cotidiana proporciona. que também é válido, se isso o satisfaz. Ou, ainda,
descobrir um assento para trabalhar naquele café
SEM ROTINA e que tanto osta ora ou outra prefiro azer
O carioca Frederico Mattos encontrou no espa- da minha sala de estar o espaço compartilhado.
ço compartilhado sua realização. “Meu dia a dia onvi o cole as e profissão para se reunirem
é bastante dinâmico. Estou sempre em contato por aqui e, apesar de juntos, cada um segue com
com gente de áreas diferentes e em movimento. suas tarefas, trocando risadas e angústias. O que
Fazer a ponte entre pessoas e seus negócios tem importa é que todos consigam encontrar a própria
muita relação com o que eu estava buscando num medida. Você certamente achará a sua.
ambiente de trabalho”. Depois de anos dedicados
en enharia em o ras iretamente no campo
Frederico decidiu buscar novos ares para fugir da
EDUARDO ALVES é comunicador por formação,
rotina e migrou para o universo corporativo. Há mas gosta mesmo é de ser reconhecido
10 meses na Cyrela, hoje trabalha no c ow or k ing no como um bom ouvinte e um contador de histórias.

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Existem pessoas sonhando de forma parecida, enfrentando as mesmas dificuldades. A possibilidade de troca é a maior beleza desses espaços

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O que aprendi com um joelho ralado
Um tombo, real ou figurado, pode trazer lições sobre como
lidar com as nossas cicatrizes e finalmente nos aceitar

TEXTO MATHEUS DANTAS

aqueles aqueles escorren o at o t nis u estava o que eu mesmo passar a tomar conta
que a ente levava quan o ain a era istante e casa e a nica solu ão oi os meus ias o meu tempo no rel io
menino e ralar os oelhos com san ue caminhar sentin o as consequ ncias a a minha vi a como um to o
escorren o pela perna muito rama e minha esaten ão em vonta e e levantar a cama sem
to o aquele so rimento na espera pelo ompartilhar to o esse prel io aca a vonta e e conviver e comer e ir para
me icamento que ar ia at na alma azen o mais senti o quan o volto para minha ama a aula e io a ou cele rar
Pensou Pois a vi a eu um eito e o in cio e quan o minha vi a por na a como era e costume As re es
me azer recor ar que quan o sa mos passou por um ven aval e eu me vi to- sociais me traziam pavor stava cami-
corren o sem sa er o que queremos talmente lon e a minha zona e con or- nhan o para um ciclo epressivo em
alcan ar al m e não consquistarmos a to ornalista orma o rec m esempre- eu que havia conquista o tanto profis-
che a a poss vel que caiamos antes a o latino americano sem inheiro no sional e pessoalmente nten i melhor
eito crian a no esespero a ale ria anco ou parentes importantes e com minha cor minha op ão se ual meu pa-
Foi assim que aconteceu comi o na rua to a certeza vin o o interior in cio pel no mun o omo ornalista realizei
urante uma corri a e por mais malu- o per o o em casa passou esperce i- v rios sonhos lo o ce o e talvez esti-
co que soe na vi a tam m o Festival e m sica ali cursinho tão vesse acomo a o achan o que nenhu-
tom o aconteceu no primeiro sonha o aqui via enzinha com a am - ma estra a traria novi a e pela rente
semestre e em ro que prote i lia tu o a mil maravilhas para quem não ano virou e no in cio e entre
o rosto com as mãos e errapei com os estava aten o o ponto iariamente u outros esencontros esapontamentos
oelhos no as alto u o isso urante fiquei at e ca elos loiros e não estava e ecep es que oram sur in o pelo
uma corri inha inocente a hora fiquei nem a para a torci a as o tempo a caminho motiva os por mim ou at por
sem a ão levantei assusta o nin u m vi a outro e não emorou muito para quem permiti estar por perto um ia me
por perto para a u ar e s o san ue uma sensa ão e es nimo muito maior pe uei choran o urante uma via-

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T R A N SFO R M A R | E X PE R I Ê NCI A

Min a ansiedade min a profiss o erros


ou decis es n o s o o meu odo elas fazem
par e de uem eu sou do ue me propon o
a aprender a evoluir e a ransformar

gem de São Paulo até Sorocaba, cidade voltarmos com as sessões de terapia. agora. Numa madrugada, li palavras de
onde moro. Meus pais iam me buscar no Até porque quem quer dançar bem pre- encorajamento, que me despertaram
local combinado, e eu tratei de enxugar cisa ensaiar com quem sabe boa parte inspira ão e fizeram o cora ão om e-
em as l rimas fin ir naturali a e e dos passos, não é mesmo? ar mais rápido, da melhor forma que
colocar no palco o ator quase formado Com cuidado, paciência e carinho, você possa imaginar. Até mesmo as re-
que existe em mim. Mas a peça não du- principalmente comigo mesmo, fui com- des sociais passaram a ter uma função
rou muito tempo. Ainda bem! preendendo, de uma maneira cada vez diferente no meu dia a dia. Não permi-
melhor, que a vida realmente só nos co- to que nada que eu veja ali represente
ACEITA ESTA DANÇA? loca em meio a furacões de onde vamos mais do que uma simples imagem, que
Gosto de pensar que o meu momento tirar bons aprendizados, se quisermos, afete meu humor ou que me leve a com-
de virada foi quase como pegar minha é claro. Eu quis, e continuo querendo. parar o que sou ou tenho com o que o
vida pela mão e tirá-la para dançar. Uma Nossas escolhas permeiam tudo! Aos outro diz ser ou ter. E, nesse caminho,
dança só nossa, de ritmo honesto, em- poucos, voltei a ver o brilho das coisas, minha família teve papel fundamental.
balada por autoconhecimento, com a cobrando-me menos, respeitando o fato Está comigo sempre, nos altos e baixos,
permissão de alguns passos em falso, de que muitas coisas não vão ser como confirman o o clich e que a ase e
afinal at o melhor ailarino tra alha espero, e entendendo que ainda assim tudo. E os amigos? Nessa transição lou-
com a possibilidade do erro. Aceitar que existe o belo nisso tudo. Um dia por vez. ca, e nos momentos em que me permiti
muitos deles haviam acontecido pelo A paixão pela música voltou forte, estar mais ausente, para me entender
caminho foi uma das melhores decisões tornou-se presente novamente, e che- melhor no silêncio, os que seguem ao
que já tomei na vida. Logo retomei o guei até a compor uma canção após ler meu lado agora estavam ali também,
contato com a Ari, psicóloga que tinha um depoimento nesta mesma sessão prontos para ouvir o choro, dar o con-
me atendido havia um tempinho, para da Vida Simples que você está lendo selho e mostrar que sempre há um jeito

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Às vezes, são os pequenos acidentes do caminho que
nos fazem parar para refletir e, finalmente, entender
o que não estava bem na nossa jornada

para tudo. Em períodos assim, compre- troquei os curativos por vários dias se- em ordem quanto a isso. Estou vivendo o
ende-se bem quem está por você, e não guidos. Quando pequeno, eu costumava que o universo tem me possibilitado. Eu
só com você quando convém. Até mes- arrancar a casca logo, sem esperar a fe- olho para trás e vejo o que já conquistei
mo oportunidades de trabalho inespe- rida cicatrizar totalmente. Já nessa re- e isso me fortalece para continuar na ca-
radas vieram a minha direção. cuperação, resolvi fazer da mesma ma- minhada, construindo minha autoestima
Eu vejo que aceitei que precisava me neira como tenho levado a minha vida: e confian a mesmo que os tom os ve-
encontrar, entender quem sou, o quan- exercitando a paciência. E então me vi nham novamente.
to já fiz e as inúmeras possibilidades capaz de tomar as rédeas, o controle da Sobre a música que compus, o refrão
que sempre existirão para que eu faça minha própria vida. Agora, essa analo- diz: “coragem para ser quem eu sou, co-
qualquer coisa acontecer. Pés no chão, gia acaba seguindo comigo para dife- ragem para falar de amor, coragem para
tempo ao tempo e novos olhares. Mes- rentes lugares, guardada no bolso junto viver o que há dentro de mim. Coragem
mo no meio da dor, eu disse sim para com os ensinamentos que ela me traz: para viver minha cor, para ser então
mim mesmo, com todas as minhas cica- há que se ter calma com as feridas, com meu próprio amor. Coragem para só ser
trizes. E foi a resposta mais bem dada os tom os les não po em si nificar feliz, e ser feliz só, também!”. Que eu e
que eu poderia me oferecer. mais do que realmente são. você consigamos fazer desses versos
inha ansie a e minha profissão uma verdade, boa sorte para nós, e que
MAS, E OS JOELHOS? meus erros ou minhas decisões não são saibamos aproveitar cada instante do
Eles parecem até desconexos na histó- o meu todo, elas fazem parte de quem eu nosso tempo por aqui.
ria, mas foram os joelhos ralados que sou, do que me proponho a aprender, a
me fizeram refletir aquele mesmo deixar de ser, a evoluir e também a trans-
FOTO ISTOCK

dia, corri para a farmácia, para com- formar. Eu não sou feito só de coisas boas MATHEUS DANTAS é libriano, tem a música correndo
nas veias e a escrita como paixão. Usa o jornalismo
prar medicamentos. Passei o remédio e nem terei sucesso em tudo. E está tudo para compartilhar e defender suas ideologias.

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P E N S A N D O B E M

Esse não foi o combinado


Quando as coisas não saem como planejamos, o caminho é não brigar
com o destino. Não podemos controlar tudo _ POR EUGENIO MUSSAK

sa o escrit rio mais ce o inha que muletas fisioterapia e claro repercussão em to a


passar em casa rapi amente arrumar a mala e se- uma a en a e tra alho efinitivamente não era
uir para o aeroporto o ia se uinte teria uma isso que eu tinha com ina o com o estino para
sessão e rava ão e v eos em uriti a parte e aqueles ias as como sa emos o estino não
um sensacional pro eto e atualiza ão para m i- muito e cumprir o com ina o
cos que envolve temas e me icina e tam m e om e ficar quieto que se anha tempo para
estão e e humani a es escrit rio pertinho e pensar e entre to os os tipos e evaneios perce-
casa em um airro tranquilo e ão Paulo enos i que a quanti a e e vezes em que plane ei al o
e cinco minutos a p com apenas uas ruas para que aca ou sen o i erente simplesmente imen-
atravessar Fica numa casa e vila em uma rua sem sa com inaram com os russos per untou ar-
sa a com cal a as estreitas e sem movimento por rincha a icente Feola antes o o o contra a então
isso to os usam a rua como uma esp cie e cal a- nião ovi tica ap s a prele ão o treina or em
ão que ao caminhar pela ruazinha che a se que ele mostrou uma estrat ia in al vel que havia
rua transversal sem pisar na cal a a ou se a sem esenha o para anhar o o o Al uns izem que
a percep ão clara e que se est sain o e um lu- len a outros afirmam que ver a e que o an
ar para pe estres para outro on e os carros e as com to a sua inoc ncia e simplici a e e racioc -
motos são so eranos as tu o em porque mes- nio escreveu em uma rase uma ver a eira tese
mo nessa ruazinha o movimento pequeno u es- e l ica em conhecer na a so re os un amen-
tava caminhan o com a ca e a oca a nas ativi- tos a estrat ia muito menos a teoria os o os
a es o ia se uinte mas com a aten ão normal ele perce eu que na e ecu ão e qualquer plano
olhan o o uturo sentin o o presente Foi quan o se a e uma via em um ne cio uma pol tica eco-
che uei ao encontro a ruazinha com a rua propria- n mica um almo o e omin o ou um o o e a-
mente ita e o estino ez as suas rez imposs vel prever to os os movimentos as
A motocicleta vinha em uma veloci a e superior or as que não controlamos
permiti a talvez estimula a pelo pouco movi- a ver a e a nica previsão certeira que po e-
mento e ao tentar esviar e uma tampa e uei- mos azer que al o imprevisto acontecer lhan-
ro o motoqueiro aca ou por inva ir a conflu ncia o essa orma conclu mos que os imprevistos são
as uas vias on e na maior inoc ncia est vamos previs veis sim ou se a não sa emos o que vai ar
eu meus pensamentos minha a en a aperta a e erra o mas precisamos estar prepara os para as
minha perna ireita que at então estava inteira contin ncias caso contr rio não teremos como re-
motoqueiro at tentou rear mas o resulta o oi a ir A pretensa e pressão e um o a or e ute ol
uma colisão rontal onsequ ncia ratura a t ia rasileiro virou quase uma lei assim como aconte-
ireita am ul ncia hospital cirur ia imo iliza ão ceu com outra rase amosa ita por um en enhei-

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A única previsão certeira que podemos fazer
é que algo imprevisto acontecerá. Assim,
concluímos que os imprevistos são previsíveis

ro espacial americano chamado Edward Murphy Jr. não. O acaso existe, obviamente, mas não é só para
Ele trabalhava com sistemas de segurança aeroes- o mal. Quantas vezes algo que não prevíamos nos
pacial e esteve ligado a projetos grandiosos, como colocou em uma situa ão melhor para ficar no
o dos jatos Phantom e o Apollo. Certa vez, em um mun o as motos tenho um ami o que confian o
estu o so re as respostas a fisiolo ia humana no tamanho do tanque de sua nova Big Trail, aca-
acelera ão e esacelera ão ele esenvolveu um ou fican o sem asolina em plena uta acional
sistema de aferição da frequência cardíaca dos pi- a caminho e ão Pe ro o Atacama sso não
lotos durante os testes. O sistema era ótimo e espe- estava nos planos pensou omo tam m não es-
ravam se resulta os confi veis e sua utiliza ão tava nos planos o jipe que parou para socorrê-lo,
que ve a s o t cnico respons vel por sua instala- com um rupo e ovens tam m atr s e aven-
ção cometeu um erro banal, que colocou em risco turas. Entre eles, uma chilena linda que acabou se
não só a operação, como a vida do piloto que parti- transformando em sua esposa e mudando sua vida
cipava do teste. E o técnico nem sequer era russo... para sempre para melhor A vi a assim ão
O resultado foi a famosa frase do engenheiro: “se para prever tu o mesmo Felizmente eria mui-
existe mais de uma maneira de uma tarefa ser exe- to chato viver em um mundo totalmente previsível.
cutada, e alguma dessas maneiras resultar num de- Para finalizar om lem rar que a e ist ncia a
sastre certamente ser esta a escolhi a por al u m imprevisibilidade e o acaso não devem nos deses-
para e ecut la m outras palavras se e iste um timular a plane ar temos que nos lem rar e co-
fator que pode contribuir para que um projeto fra- locar esses dois travessos entre os elementos vari-
casse, existe a possibilidade de que esse fator se veis o plano o re isso isse hurchill temos
manifeste. E agora? Como fazemos para viver em que plane ar em para po er improvisar melhor
um mundo em que o axioma de Garrincha e a Lei de le evia sa er o que alava afinal anhou a uerra
urph reinam so eranos er que não melhor
desistir de controlar a vida e deixar as coisas acon-
tecerem uma vez que est prova o que o contro- EUGENIO MUSSAK
le não funciona, considerando que o número de va- escreveu esse texto se
ri veis imenso A chuva no meio o casamento no recuperando do acidente.
campo, o overbooking no avião, a baixa da bolsa de Mandou dizer que
Nova York e a moto que invade a rua são os vence- a perna quebrou, mas
dores e a nós só resta aceitar a derrota? É claro que a cabeça está boa.

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O U T R O S O L H A R E S

Dentro
Quando o medo é muito intenso, a resposta pode
estar em reencontrar a infinitude que nos habita _ POR CRIS GUERRA

. A decisão coletiva elimina intei- sar ninguém. Ele veio para nos dar medida, deixar-
ros e só deixa partidos. Amigos, encontros, famílias. -nos alertas, prontos para lutar ou fugir – o que é a
Todos tontos, golpeados, no meio de uma partida ciência, senão nossa recusa em permanecer temen-
que não escolheram jogar. A solidão multiplicada, do o que não conhecemos?
a sensação de não encontrar o caminho de volta. O Quando o mundo lá fora atormenta e assusta,
resultado do jogo afeta a todos, mas não sabemos quando esbarramos nos limites do outro, cuja es-
pensar senão em times caminho o meio ficou colha nos afeta e afronta. Quando repertórios par-
invisível, temos so- ticulares constro-
mente o medo em em pensamentos
comum. tão diversos. Quan-
Medo de não ar-
ranjar um empre- No quarto escuro da do em volta só exis-
tem muros. Nesse
go. Medo de perder
o emprego. De não
insegurança, crescem momento, é preci-
so voltar-se para
realizar um sonho,
de perder o que se
os fantasmas dentro. Fechar-se
no quarto e acen-
realizou. Está cer- der a luz. Desenco-
to, a vida nunca foi rajar o medo num
feita de certezas. golpe só. Olhar o
Mas, até outro dia, sabíamos insistir na ilusão de espelho azer um pacto com o infinito em n s o-
estar no controle. A vertigem do incerto nos fazia locar o pensamento em férias, abrir um livro de co-
construir portos, mesmo que nem tão seguros. lorir e escolher a dedo novos tons para o mundo.
Liberdade ameaçada, direitos jurados de morte. espirar serenar e confiar e o peri o vem e o-
Parece cena e filme não sa emos quan o come- ra o me o vem e entro aqui entro infinita-
çou nem se vai acabar. Nós, que amamos tão facil- mente maior que lá fora.
mente as pessoas. Nós, que éramos tão livres. Não
sabemos mais quem somos ou quem vamos nos tor-
nar. No quarto escuro da insegurança, crescem os CRIS GUERRA
fantasmas. É tenebroso o que não podemos ver. acaba de lançar Procurava
Em meio ao breu de notícias duvidosas, o medo o Amor em Jardins de
o maior inimi o orna se ele o pr prio peri o Cactos. Escritora, apaixonada
embaça a vista, bambeia as pernas, cria tropeços por moda, acha que até as
que cegam os passos. Não era missão dele parali- palavras servem para vestir.

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P E L A S R U A S

Caminhar pelo desconhecido


Andar a pé proporciona uma vivência surpreendente e linda,
independentemente da cidade onde se esteja _ POR MAURO CALLIARI

seja Londres. Você sai do hotel e Você senta no banco e parece ouvir gritos de guer-
anda vagarosamente até encontrar um pub acon- ra, de morte e também de conquista.
chegante, com cheiro forte de madeira, fumaça e Talvez a cidade seja Milão, na Itália. Você sai do
gim. Em meio a engravatados e torcedores de um restaurante depois de um risoto diáfano e um vinho
time com uniforme vermelho e branco, você vê uma denso. Na noite gelada, em meio à névoa bastan-
única pessoa sozinha. Encostada no balcão, ela olha te espessa sur e a ma n fica cate ral A pequena
para voc com olhos calmos e confiantes como se estátua da Madonina parece flutuar naquela ne li-
estivesse ali ape- na. Você se prostra
nas esperando sua ali e chora um cho-
chegada. Você se ro que estava guar-
aproxima com dois
copos de Guinness Em busca de um pouco de dado havia anos e
nem sabia que exis-
na mão A noite ter-
mina numa praça
silêncio, seus passos tomam tia, tão escondido
que estava.
enevoada.
Talvez a cidade
posse das ruas vazias Talvez a cidade
seja a caótica São
seja o Rio de Janei- Paulo. Você desce
ro. Na noite quente a rua Au usta a p
e úmida, você se vê em direção ao cen-
no bairro da Lapa, bem embaixo de seus famosos tro, mistura-se à multidão estacionada na grande
arcos As pessoas se olham contato cil em praça acinzentada. Você ouve a voz bonita da me-
pensar muito, você aceita um convite de um des- nina com violão, desvia de um skate e decide entrar
conheci o qualquer para an ar A chuva vem or- num teatro com um nome sugestivo – Satyros. Você
te, a luz acaba de repente e você passa a madruga- se entrega à peça sem imaginar que essa noite vai
da à luz de uma vela machadiana que deixa entre- mudar sua vida para sempre.
ver apenas o brilho dos olhos castanhos.
alvez a ci a e se a usco no Peru A rua est
cheia, as pessoas falam as línguas de todos os paí- MAURO CALLIARI
ses e riem em alto oc se a asta a pra a e Ar- é autor do blog Caminhadas
mas em busca de um pouco de silêncio, seus passos Urbanas, gosta de caminhar
tomam posse das ruas vazias e silenciosas, e você pela cidade e acredita que
nota, com espanto, que por baixo dos prédios colo- andar é a experiência mais
niais espanhóis há pedras das construções incas. essencial de cidadania.

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C O N V E R S A E M FA M Í L I A

Relações mais próximas


Para ser exemplo para filhos, amigos, parceiros, é preciso, antes,
saber ouvir, acolher e observar _ POR LUA FONSECA

a promoção dos seus sonhos acon- É um convite a quebrar paradigmas e desfazer


teceu e você tem o emprego que sempre desejou. certezas, mas para isso é preciso ir além do saber
Agora, imagine qual seria o percurso natural na natural. É preciso buscar informação e estar dis-
busca por ser a sua melhor versão nessa nova fun- posto a ouvir mais do que falar, acolher mais do que
ção: você poderia conversar com colegas que pas- mandar, observar mais do que controlar.
saram pela mesma experiência, poderia fazer cur- Nesse processo, acontece uma mudança no pa-
sos, ler matérias sobre o tema, até fazer viagens se pel do pai e da mãe. Saímos da posição em que
fosse preciso, para um mandar e o ou-
desempenhar seu tro obedece, para
trabalho, correto? estar lado a lado,
Tornar-se pai e
mãe é como rece- Filho é uma oportunidade sendo a margem
que a criança pre-
ber essa promo-
ção. Filho é uma
de entregar ao mundo cisa. Estabelece-
mos limites a par-
oportunidade de
entregar ao mun-
a sua melhor versão tir do afeto, do en-
tendimento de que
do a nossa melhor somos rios, preci-
versão. Mas, diante samos correr para
esse esafio pre- crescer. Olhamos
erimos apenas confiar no instinto e naquilo que para as crianças como seres iguais, que merecem
trazemos como lembrança de infância. Reverencia- respeito e precisam de orientação e buscamos nos
mos ou negamos nossos pais e, com isso, traçamos melhorar como pessoas, entendendo que para ser
o jeito de parentar. Esquecemos apenas um detalhe: exemplo é preciso equilíbrio. É uma missão dura,
nossos filhos ha itam um novo tempo s ramas e mas me coloco à disposição para quem quiser que-
esafios que en rentamos ho e não são os mesmos brar os muros das certezas e abrir novos caminhos.
do passado. As pessoas dessa geração não estão dis-
postas a obedecer a quem não admiram. Essa nova
postura não é privilégio apenas das crianças . Nós LUA FONSECA
adultos também não conseguimos mais sustentar é pernambucana, educadora
relações em que não nos sentimos respeitados. As parental e mãe de quatro
rela es entre pais e filhos entram nesse mesmo fi os, mas tam m
modelo e precisam estar construídas sob pilares onse ue ser outras
menos rígidos e mais amorosos. oisas uando so ra tempo

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V I A G E N S T R A N S F O R M A D O R A S

A senda mágica na Lituânia


A presença do agora ao longo de uma ciclovia
cheia de histórias e encantos _ POR JULIANA REIS

cruzando a Lituânia. Acho que ela dia - faixa de areia que avança no Mar Báltico e dá
tem um qu e ma ia uan o ur a ami a e anfitriã no exclave russo de Kaliningrado. Suas dunas mó-
naquela esta ia me mostrou o mapa o pa s eu me veis, hoje domadas por pinheiros, atordoaram mer-
propus a avançá-la aos poucos – sozinha e sempre cadores medievais que buscavam atalho. Ali, o ven-
voltando à base, a casa dela na cidade de Klaipeda. to uiva e retorce troncos preciso firmar a i e
A cada vez que deixava o limite urbano e aden- Teve a vez em que pedalei no encalço de um gru-
trava a ciclovia, um universo à parte me capturava. po levando tochas, que foi parar num pântano meti-
Nas primeiras pe- do em brumas. Lá,
daladas, eu já de- as pessoas embar-
tectava a coexis- caram em canoas e
tência harmonio-
sa entre presença No caminho, entre as condenaram à fo-
ueira fi uras mi-
humana e nature-
za al o e v nculo
pedaladas, era comum tológicas de madei-
ra montadas sobre
espiritual entre os
dois. Dizem que ri-
o passado virar presente a água. Ordenaram
abandonar ques-
tuais pa ãos acon- tões passadas –
teceram na Lituâ- chegava o outono.
nia (que tardou a Quando voltei nes-
ser cristã at o s culo Pelos osques ao lon- se dia, Jurga me serviu um peixe capturado na Li-
go da via, brotavam cruzes e formas mitológicas ta- tuânia no inverno, quando se arrisca a subir até a
lhadas em madeira; gente silenciosa enchia cesti- superf cie con ela a m anquete em homena em
nhas e co umelos entre uma curva e outra o chão queles que superam travessias Ah nos mapas ofi-
a floresta po ia virar areia ur ia uma praia e- ciais a ciclovia aparece cruzan o os pa ses lticos
serta, um solitário catando âmbar, o mar prateado. e escandinavos e se chama EuroVelo10.
No caminho, era comum o passado virar presente.
Como quando meu pneu topou num pedaço de con-
creto - o gigante Memel Nord despertava de uma JULIANA REIS
duna entre bosque e beira-mar. Atrás da porta de é uma viajante de
a o esse un er e uerra corre ores som rios e coração inquieto em
armas alemãs e sovi ticas o telha o unto a ar- busca de histórias, pessoas,
tilharia antiaérea, assisti ao pôr do sol entorpecida. lugares e experiências
m ia pe alei com mais or a e entrei na url n- ue a modifi uem

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C A M I N H O D A S V I R T U D E S

A dificuldade de falar a verdade


Quando inventamos pequenas mentiras para o outro e para nós
mesmos, estamos nos afastando de quem somos _ POR GUSTAVO TANAKA

atr s um ami o me isse a veraci- zer a verdade machuca os outros, ou que fazer isso
dade é a base de todas as virtudes”. Eu vinha numa não é educado. Comigo talvez isso tenha aconteci-
busca por compreender as virtudes e como me tor- do quando, criança, não gostei de um presente que
nar um ser humano mais virtuoso então fiquei com anhei e isseram que eu everia a ra ecer e ficar
essa frase martelando na cabeça por alguns dias. feliz. Ou quando recusei um pedaço de bolo, mes-
Veracidade era uma palavra que não fazia parte do mo estando com vontade de comer, porque recusar
meu voca ul rio Fui esco rir na internet que era mais educado. Não sei muito bem.
a capacidade de di- O fato é que hoje
zer a verdade”. compreendo que
Será que eu tenho ser virtuoso não é
a capacidade de di-
zer a verdade? A Meu maior desafio é ser mais educado,
mas ser coerente
resposta que veio
de bate-pronto era
aprender a ser eu mesmo com a minha ver-
dade. Às vezes, ser
que sim, já que eu
não era de contar
e ficar em paz com isso virtuoso não é aju-
dar os outros, se a
mentiras. Mas me minha verdade é
observando com que estou com dor
muita honestida- nas costas. Ser vir-
de, percebi que não era exatamente assim. Fui to- tuoso é poder não ir ao aniversário do amigo, tendo
mando consciência de que contava pequenas men- a coragem de dizer que preciso descansar.
tiras para os outros e para mim mesmo. Algumas Quanto maior a minha capacidade de fazer is-
vezes, eu dizia que estava chegando em cinco mi- so, mais eu consigo ser eu mesmo. E esse é um dos
nutos, quando na verdade, ainda iria demorar uns maiores esafios que tenho ho e apren er a ser eu
15. Em outras , quando alguém tinha um compor- mesmo e ficar em paz com isso
tamento que me incomodava profundamente e se
desculpava, eu dizia que não tinha sido nada, que
não tinha me incomodado, por exemplo. GUSTAVO TANAKA
Fui percebendo, então, que não apenas eu tinha é escritor e empreendedor.
ificul a e e alar a ver a e mas que esse um Idealizador do Brotherhood,
comportamento normal em nossa sociedade. Uma um movimento para apoiar
ificul a e eneraliza a e izer a ver a e m al- homens no caminho do
gum momento de nossas vidas, aprendemos que di- autoconhecimento.

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E NT R E NÓ S

O dia da coragem
recebi um e-mail com esse título. Te- sei que não po emos evoluir sem vencer es-
nho rece i o muitas mensa ens es e quan o ses me os me i a que ui ama urecen o e
se tornou pública a nova fase da Vida Simples. A epen en o apenas e mim ui perce en o o
pro imi a e com o leitor traz to os os ias mui- quanto everia cui ar esse meu ponto raco Fiz
tas mensa ens enerosas e a ra ecimento pela terapia treinamentos corporativos e vencer
continui a e o pro eto al umas reclama es esafios via ei sozinha ei entrevistas em i io-
mas na maioria as vezes te tos e apoio eio mas que não omino fiz mer ulho saltei e para-
tu o mas essa me chamou a aten ão pelo t tulo que as conversei com muitas pessoas u o
inha e uma leitora chama a Paula que o ere- isso oi aumentan o meu estoque e cora em
cia seus servi os profissionais o e mail muito Talvez meu ápice tenha sido a coragem de pedir
amoroso ela contava um pouco e sua hist ria emissão numa multinacional e a rir meu peque-
e vi a o momento e trans orma ão pelo que no ne cio numa ci a e ran e e esconheci a
passa e o quanto precisou e cora em para se- ssas pequenas oses e cora em que ui a-
uir em rente com aquela mensa em screvia nhan o com o tempo me permitiram estar aqui
não enviava apa ava escrevia novamente at empreen en o na i a imples ão oi cil a
que respirou un o e Apertou o otão e enviar ecisão parecia loucura em um momento compli-
ma ino que por al uns se un os ela ain a se ca o o setor as teve um ia em que apertei o
questionou mas não tinha mais eito o e mail es- otão e enviar e fiz a proposta em ro me em
tava em al um lu ar entre io e ão Paulo o rio o arri a a ansie a e provoca a por
Uma frase muito forte e atribuída ao grande lí- aquele me inho que ain a mora entro e mim
er e pr mio o el a Paz elson an ela ala as tam m me lem ro a ale ria provoca a
que cora em não a aus ncia e me o mas sim pela resposta im aceito c estou com to os
o triun o so re ele Fiquei refletin o so re isso e os meus me os as tam m com minha cora em
como em momentos a minha tra et ria o me o que a ora re or a a por mais autoconfian a cal-
venceu minha cora em e o que tinha as cr ti- ma e consci ncia que ui anhan o ustamente
cas o racasso o ul amento os erros u não por en rentar esses me os e não ei ar que eles
tinha maturi a e para isso Pre eria ficar quieta se tornassem mais ortes o que eu assim vivo
sem sair do lugar. Talvez isso tivesse origem na um ia a mais e cora em to os os ias espon i
am lia numa poca em que os pais eram muito Paula no mesmo ia a ra ecen o e a para eni-
mais severos com a e uca ão u não talvez os- zan o pela cora em Ain a não fizemos na a un-
se da minha natureza introspectiva. tas mas quem sa e isso aconte a

LUCIANA PIANARO
FOTO DANIELA PICORAL

Publisher e CEO da Vida Simples


luciana@vidasimples.co

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P O E SI A PA R A O D I A A DI A

Resiliência
Quando um vaso foi
derrubado pelo vento
As flores que tocaram
o chão pela primeira vez
Resolveram morar ali
Resolveram ser jardim
Foi assim que nasceu a Primavera

ZACK MAGIEZI, POETA

@zackmagiezi

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Nosso propósito é inspirar cada vez mais
pessoas na busca por algo que faça sentido,
para que cada uma possa SER melhor para
si mesma e para o outro, a fim de CONVIVER
ILUSTRAÇÃO ISTOCK

de forma mais harmoniosa onde quer que


esteja, e assim tenha força, equilíbrio e sabedoria
para TRANSFORMAR o mundo ao redor

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NA PRÓXIMA EDIÇÃO

SER CONVIVER TRANSFORMAR


A IMPERFEIÇÃO DAS COISAS E DA ROTINA OS APRENDIZADOS DE UMA RELAÇÃO O QUE PERDEMOS QUANDO SOMOS
E A INFLUÊNCIA DISSO EM NÓS PROFUNDA DE UM NETO COM O AVÔ LEVADOS PELA TECNOLOGIA

ASSINE VIDA SIMPLES!

W W W.V I D A S I M P L E S .C O • W H AT S A S P P : ( 1 1 ) 9 4 4 9 8 - 1 47 9

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