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Revista de Psicologia
TRABALHO E RENDA
Vol. 14, Nº. 20, Ano 2011
Renata Mendes
Associação Mundaréu RESUMO
renata.m@mundareu.org.br
Esse artigo pretende ser um panorama de elementos que compõem a
realização de alguns projetos de impacto social, pontuado pelo relato
de experiências de trabalho no terceiro setor. O recorte é o fomento à
formação de negócios de produção artesanal ou manufatureira como
alternativa à exclusão do mercado formal de trabalho. A efetivação
dessa alternativa depende, a primeira vista, da boa qualificação dos
produtores ou prestadores de serviços para entregarem o que o
mercado necessita e deseja. Com um olhar na superfície da questão, o
ciclo começa com a qualificação técnica e se fecha com a venda do que
se produz, resultando na geração de renda para os produtores. Mas o
negócio não se sustenta somente pela renda gerada, muitas vezes esse
elemento nem é o mais importante. Indo mais a fundo, as
transformações pessoais decorrentes de todos os processos vividos em
projetos sociais são impulsionadoras das transformações coletivas e
essas, por fim, são responsáveis maiores pela maturação e continuidade
do empreendimento. Desta maneira os apontamentos sugerem que a
formação manufatureira pode proporcionar desenvolvimento de renda
bem como maior inserção destes indivíduos na sociedade, favorecendo
a melhoria de sua qualidade de vida.
ABSTRACT
1. INTRODUÇÃO
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para ampliar as oportunidades de vendas aos produtores que, em sua maioria, estavam
distantes dos centros comerciais. Além disso, tinham seus ganhos achatados pelo
intermédio de comerciantes atravessadores, que recebiam a maior parcela do lucro sobre a
venda dos produtos, já que faziam a ponte entre o produtor e o mercado consumidor
(Nóbrega, 2005). A World Fair Trade Organization (WFTO), instituição responsável por
monitorar e legitimar a ação de organizações que seguem o comércio justo, prescreve 10
normas a serem seguidas. São elas:
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O que o artesão tem de retirada é o que ele consegue se organizar para produzir e
vender. A suposição é que, em conjunto haja maior possibilidade de sucesso e de
estabilidade, visto que estar inserido em um grupo é potencialmente mais produtivo do
que batalhar sozinho (Manzini, 2002). A possibilidade de construir o próprio trabalho abre
espaço para a realização de um sonho: ter o próprio negócio, fazendo o que se tem talento
e o que se gosta de fazer. Observamos em boa parte das mulheres beneficiárias dos
projetos, que essa possibilidade interfere em seu desabrochar pessoal. Elas desenvolvem
autoestima, posturas mais firmes, voz mais projetada em discursos com mais conteúdo e
com mais clareza do que querem. Sentem o sabor da conquista, de que a partir de agora
podem.
Dona Renildes, 60 anos, era analfabeta. Quis aprender a escrever para poder ter
e-mail. Ela participa de uma rede de produção artesanal no Guarujá, formada por cinco
grupos de diferentes bairros. Eles resolveram sua comunicação via internet e ela não
queria ficar de fora.
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A constituição de um negócio próprio se mostra como uma boa opção para essas
mulheres que não escolhem deixar de cuidar da casa e da família em favorecimento da
atuação profissional. Em oposição a isso, elas normalmente vivem o dilema de se
estruturar profissionalmente e lidar com a falta de apoio e a cobrança de seus
companheiros. Aparece aqui mais um exemplo das sutilizas capazes de por abaixo um
projeto de geração de renda: as mulheres não querem só trabalho, querem compatibilizar
suas vidas doméstica e profissional, mesmo que isso signifique trabalhar menos que seu
potencial, ganhar menos do que poderiam e ser menos independentes do que desejam.
A tarefa de tornar uma pessoa agente econômico gerador de sua renda depende
do envolvimento de muitos protagonistas no processo: governo, comunidades, ONGs,
empresas, instituições de ensino, usuários da cadeia de valor, e, fundamentalmente, do
empreendedor (Borges, 2011). O empreendedorismo é o motor. Empreender não diz
respeito somente à construção de negócios. Antes disso e fundamental para isso
acontecer, é um conjunto de características comportamentais, que pode ser desenvolvido
através de exemplos, educação e treinamento. Tem a ver com a capacidade de inovar, a
perspectiva de futuro, a persistência, a coragem, a resiliência diante das dificuldades de se
implementar uma ideia.
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outros apoios (Thackara, 2008; Manzini, 2002). Segundo porque um negócio próprio é
formado por sócios, que são capacitados para se autogerirem, para frequentemente
resolverem com suas próprias habilidades os desafios do dia-a-dia, que não se restringem
aos assuntos profissionais. Terceiro porque a capacidade de empreender não é
comumente desenvolvida na formação das pessoas que tiveram a oportunidade de
estudar, que dirá na vida das pessoas que são público dos projetos sociais.
Para os profissionais que fazem parte da construção dessa alternativa, é preciso pedir
licença antes de entrar na casa do outro. É preciso ser expectador e aprendiz, antes de
pretender ensinar (Borges, 2011). Há que se desenvolver empatia, entender
profundamente a realidade das pessoas, o contexto cultural do lugar, fazer o que estiver
ao alcance para compreender suas experiências. “Entender o comportamento nos capacita
a identificar necessidades físicas, cognitivas, sociais e/ou culturais a que podemos atender
com produtos, serviços e experiências que criamos” (IDEO, 2009).
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Replicável enquanto modelo norteador, visto que, quando extraímos um modelo de uma
experiência, não necessariamente a aplicação do modelo vai nos dar a experiência.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Neste sentido sugere-se que novos diálogos se deem entre todos os agentes,
baseados em estudos e apontamentos recentes, de modo a favorecerem a solidez das
ações com essas populações. Além disso, cabe a criação de plataformas que apoiem,
influenciem e norteiem as políticas públicas voltadas para a inclusão social das
populações de baixa ou nenhuma renda.
REFERÊNCIAS
A Casa, museu do objeto brasileiro (2010). EntreVistas: design + artesanato.
IDEO, Global design consultancy (2009). Tool kit Human Centered Design, páginas 18 e 49. A empresa
se associou à outras três organizações para criação de um método que servisse como guia de
inovação e design para pessoas que vivem com menos de dois dólares por dia.
Borges, Adélia (2011). Design + artesanato: o caminho brasileiro.
De Masi, Domenico (2000). O ócio criativo.
Flusser, Vilém (2007). O mundo codificado: por uma filosofia do design e da comunicação.
Manzini, Ezio (2002). O Desenvolvimento de Produtos Sustentáveis.
Nóbrega, Christus (2005). Renda Renascença: uma memória de ofício da paraibana.
Pink, Daniel (2009). TED Global 2009 / Dan Pink e a surpreendente ciência da motivação.
Psicologia social. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. 2012-01-25].
URL: http://www.infopedia.pt/$psicologia-social.
Rodrigues, Graziela Estela Fonseca (2005). Bailarino-pesquisador-intérprete: processo de formação.
Sennett, Richard (2009). O artífice.
Thackara, John (2008). Plano B: o design e as alternativas viáveis em um mundo complexo.
Renata Mendes
Designer – diretora adjunta da OSCIP Associação
Mundaréu.
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