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Hospital Universitário Alcides Carneiro – HUAC

Unidade de Endocrinologia e Diabetes

PROTOCOLO PARA INTERNAÇÃO E TRATAMENTO DO PÉ DIABÉTICO

1. Situações em que se deve suspeitar de infecção:

 Em princípio, qualquer ferida em pé de paciente diabético é suspeita. Alguns sinais e


sintomas fortalecem essa suspeita;
 Presença de sinais e sintomas como rubor, calor, edema, dor, secreção purulenta,
tecidos friáveis, devem ser pesquisados;
 Presença de mais de 2 achados clássicos de infecção caracteriza uma ferida como
infectada.
 Pacientes com fatores de risco;
✓ Sondagem óssea positiva
✓ Ulceração presente por > 30dias
✓ História de úlceras recorrentes
✓ Ferida de etiologia traumática
✓ Presença de doença vascular
✓ Perda da sensibilidade protetora

2. Avaliação do paciente diabético com pé infectado:

 Avaliar presença de doença arterial obstrutiva, insuficiência venosa, perda da


sensibilidade protetora e problemas biomecânicos.
 Desbridar qualquer ferida com área necrótica ou calo circundantes.
 Avaliar o paciente como um todo (infecção local ou sistêmica), o aspecto da ferida e
a presença de infecção.

3. Determinando provável agente etiológico envolvido:

 Infecções superficiais (úlceras virgens de tratamento, celulite e erisipela): cocos


gram-positivos (incluindo Staphylococcus aureus, Streptococcus agalactiae,
Streptococcus pyogenes e staphylococci coagulase-negativo)
 Úlceras profundas, cronicamente infectadas e/ou tratadas com antibióticos são,
provavelmente, colonizadas por flora polimicrobiana (germes citados acima +
enterococcos, Enterobacteriaceae, Pseudomonas aeruginosa e anaeróbios).
 Lesões com inflamação extensa, necrose, secreção fétida e/ou toxemia, além dos
germes acima, há infecção presumida por anaeróbios ( Streptococcos, Bacteroides
species e Clostridium species)
4. Classificação de gravidade do pé diabético:

Sem infecção Não existem sinais ou sintomas de infecção local ou sistêmica.


Presença de 2 ou mais itens: dor, calor, rubor e secreção
Infecção leve purulenta
Presença de eritema < 2cm em torno da ferida.
Infecção envolvendo estruturas mais profundas (por exemplo,
Infecção ossos,
moderada articulações, tendões, músculos) ou eritema > 2cm a partir da
margem da ferida.
Sem sinais ou sintomas de infecção sistêmica.
Qualquer infecção no pé acompanhada da Síndrome da
Resposta
Inflamatória Sistêmica (SIRS), que se manifesta por 2 ou mais
Infecção grave dos seguintes itens:
∙ Temperatura > 38°C ou < 36°C
∙ Frequência cardíaca > 90 bpm
∙ Frequência respiratória > 20 irpm ou PaCO2 < 32 mmHg
∙ Leucócitos > 12.000 ou <4.000 ou + de 10 bastões

5. Critérios de internação e alta:

Critérios de internação
 Todos os pacientes com infecção grave ou com infecção moderada com
complicações por exemplo, Doença Arterial Obstrutiva Periférica (DAOP) grave;
 Falta de apoio familiar;
 Incapacidade de cumprir o tratamento ambulatorial por razões psicológicas ou
sociais;
 Os pacientes que não atendem a qualquer um desses critérios, mas que não estão
conseguindo melhorar com terapia ambulatorial, também podem precisar de
hospitalização.

Critérios de alta
 Estar clinicamente estabilizado;
 Ter sido submetido a qualquer cirurgia urgente necessária;
 Obter aceitável controle glicêmico;
 Ter um plano bem definido que inclui:
 Um regime antibiótico apropriado que ele vá aderir,
 Um esquema de redução da carga (se necessário),
 Instruções de cuidados de feridas específicos,
 Apropriado acompanhamento ambulatorial.

6. Critérios para solicitação de culturas:

 Para feridas clinicamente não infectadas, não recomendamos coleta de cultura;


 Para feridas infectadas, as amostras para cultura devem ser obtidas de forma
adequada antes do início da antibioticoterapia (ATB) empírica, principalmente nos
casos de infecção crônica e uso prévio de ATB. Culturas não são necessárias para
infecções de pequena monta;
 As amostras para cultura devem ser obtidas a partir de tecidos profundos, por
biópsia ou curetagem após limpar a ferida e desbridá-la;
 Evitar swab, especialmente de feridas inadequadamente desbridadas, porque eles
fornecem resultados menos precisos.

7. Critérios para escolha e modificação de um esquema de antibiótico(s) para infecção


em pé diabético:

 Para feridas clinicamente não infectadas, não recomendamos uso de ATB;


 Prescrever ATB para todas as feridas infectadas, devendo-se ter em mente que pode
não ser suficiente necessitando de tratamento cirúrgico;
 O esquema antibiótico empírico deve ser baseado na gravidade da infecção e no
agente etiológico provável(is).
 Tratamento Cirúrgico:
 Pacientes com infecção que também necessitam de desbridamento
cirúrgico devem receber antibioticoterapia intravenosa no pré-operatório,
mantendo o ATB até que o paciente não apresente mais sinais de infecção (duas a
quatro semanas de terapia é geralmente suficiente, não necessariamente
internado).
 Os pacientes que necessitam de amputação devem receber
antibioticoterapia intravenosa antes da cirurgia. Se a área de infecção for
completamente ressecada, um breve curso de antibioticoterapia (cerca de uma
semana), preferencialmente oral e no domicílio, deve ser feito.

 Infecções leves a moderadas: paciente que não recebeu ATB recentemente, a terapia
será para gram-positivos, por via oral. Na presença de secreção purulenta deve-se
utilizar ATB contra S. aureus MRSA. Na falha terapêutica cobrir S. aureus MRSA,
gram-negativos e anaeróbios.
 Infecções mais graves, começar com ATB de amplo espectro empiricamente, cobrindo
os patógenos acima, e reavaliar com os dados da cultura, quando disponível.
 Teste terapêutico dirigido a Pseudomonas aeruginosa é geralmente desnecessário,
exceto para pacientes com fatores de risco para infecção verdadeira com este
organismo.
 Considerar a possibilidade de terapêutica empírica dirigida contra Staphylococcus
aureus Resistentes à Meticilina (MRSA) em um paciente com:
 Internação prévia prolongada;
 História prévia de infecção por MRSA;
 Quando a prevalência local é alta;
 Se a infecção é clinicamente grave.

 A terapia definitiva deve ser baseada na cultura adequadamente obtida da ferida


(quando disponível) e no teste de sensibilidade, bem como a resposta clínica do
paciente ao esquema empírico.
 A via de administração do ATB deve ser escolhida baseada na gravidade da infecção.
 A terapia antibiótica deve ser contínua até, mas não além, da resolução da infecção.
Evitar manter antibioticoterapia até completar a cicatrização da ferida.
Gravi Fatores Patógen Antibioticoterapia empírica
dade adicionais o usual
Sem Gram+ Sem risco para MRSA: Cefalexina ou amoxicilina com clavulonato
complicações Com risco para MRSA: Clindamicina ou linezolida ou associar
sulfametoxazol com trimetropina ou doxiciclina a penicilina ou
cefalexina
Alergia ou Gram+ Clindamicina; Quinolona (levofloxacin);
Le intolerância Sulfa/Trimetropim; Macrolídeo; Doxiciclina
ve aos β
lactâmicos
Uso recente Gram+ e Amoxicilina/clavulonato; Ampicilina
de Gram- com Sulbactam; Sulfa/Trimetropim; Quinolona(levofloxacin).
antimicrobian
o
Alto risco de MRSA Linezolida; Sulfa/Trimetropim;
MRSA Doxiciclina; Macrolídeo; Quinolona(levofloxacin).
Sem Gram+ e Amoxicilina/Clavulonato;
complicações Gram- Ampicilina/Sulbactam; Cefalosporina de 2 ou 3 geração;
Levofloxacino + Clindamicina

Uso recente Gram+ e Tazocin; Cefalosporina de 3 geração;


de Gram- Ertapenem
antimicrobian
o
Úlcera Gram- Tazocim, Penicilina + Ceftazidima;
macerada e incluindo Penicilina + Ciprofloxacino; Imipenem;
Mod quente Pseudom Meropenem
onas
erad
Membro Gram+ e
a
isquêmico, Gram- e Ampicilina/Sulbactam; Tazocim; Cefalosporina de 2 ou 3 geração
necrose ou anaeróbi + Clindamicina ou metronidazol; Carbapenêmicos
formação de os
gás
Fator de risco MRSA Glicopeptídeos; Doxiciclina;
para Sulfa/Trimetropim; Linezolida; Daptomicina;
MRSA Quinolona(levofloxacin).
Fator de risco ESBL Carbapenêmicos; Quinolonas;
para Aminoglicosídeos
Gram-
resistentes
MRSA MRSA, Vancomicina + Ceftazidima, Cefepime
Enteroba ou Piperacilina/Tazobactam; Carbapenem; Imipenem;
Gr ctceriaca Meropenem
av e,
e Pseudom
onas e
anaeróbi
os
obrigatór
ios
 O tempo de tratamento com antibiótico deve ser de:
 1 a 2 semanas em caso de infecções leves
 2 a 3 semanas em infecção moderada a grave (não necessariamente em
ambiente hospitalar).
 Há pouca evidência para apoiar a necessidade de antibióticos anti-anaeróbicos na
maioria das feridas adequadamente desbridadas.
 Em caso de boa resposta clínica mesmo com cultura evidenciando algum germe
resistente ao ATB empírico deve-se manter o tratamento inicial.
 Nos lugares onde a colonização por Pseudomonas é prevalente deve-se iniciar o
tratamento empírico
 Antibióticos podem ser interrompidos uma vez que os sinais e sintomas clínicos de
infecção tenham desaparecido

7. Antibióticos
 Infecções leves – geralmente tratada com ATB oral.
 Infecções moderadas – geralmente o tratamento é feito inicialmente com ATB EV ou
oral.
 Infecções graves – ATB EV para MRSA, Enterobacteriacae, Pseudomonas, e
anaeróbios obrigatórios. Observar critérios de infecção por MRSA para iniciar
Vancomicina.

● Sugestão de esquemas:

Mononoterapia oral sem risco para MRSA

Cefalexina ou amoxicilina com clavulonato ou clindamicina

Terapia oral combinada quando há risco de MRSA

Clindamicina ou

Linezolinda ou

Penicilia ou cefalexina
COM
sulfa/tripetropina ou doxiciclina

Terapia oral combinada contra gram positivos, negativos,


anaeróbios e MRSA
Sulfa/tripetropina
COM
Amoxicilina com clavulonato
OU
Clindamicina
COM
Cipro ou levo ou moxifloxacino

Doses em adultos

Cefalexina 500 mg a cada 6 horas

Clindamicina 300 a 450 mg a cada 6 ou 8 horas

Lenezolinda 600 mg a cada 12 horas

Penicillina V 500 mg a cada 6 horas

Sulfametoxazol trimetropina 160 mg e sulfametoxazol 800 mg a cada 12


com trimetropina horas

Doxiciclina 100 mg oral a cada 12 horas

Amoxicilina com 875/125 mg a cada 12 horas ou 500/125mg a cada 12


clavulonato horas
Ciprofloxacino 500 a 750 mg a cada 12 horas

Levofloxacino 750 mg a cada 24 horas

Moxifloxacino 400 mg a cada 24 horas

● Terapia parenteral para infecções moderadas a severas

Atividade contra
Doses
pseudomonas
Beta-lactâmicos / inibidores de beta-lactamase
Ampicillin- 3 ga cada 6 horas Não
sulbactam
Pipe-tazo 4.5 ga cada 8 a 6 horas Sim, quando feito de
6/6h

Carbapenêmicos

Imipenem 500 mg a cada 6 horas Sim

Meropenem 1 g a cada 8 horas Sim

Ertapenem 1 g a cada 24 horas Não

Fluoroquinolones

Moxifloxacin 400mg IV a cada 24 Sim


horas

Outros esquemas

Metronidazol 500 mg IV a cada 8 Não


COM um dos horas

seguintes:
Ceftriaxona 1 to 2 g a cada 24 horas Não
Ceftazidima 2 g a cada 8 a 12 horas Sim

Cefepime 2 g a cada 12 horas Sim

Ciprofloxacina◊ 400 mg IV a cada 8 a 12 Sim


horas

Levofloxacino 750 mg IV a cada 24 Sim


horas

COM um dos seguintes se há necessidade de cobrir MRSA

Vancomicina 15 a 20 mg/kg a cada


8 a 12 horas
Linezolida 600 mg IV a cada 12
horas
Daptomicina 4 a 6 mg/kg a cada 24
horas

8. Critérios para solicitação de exames de imagem para avaliar uma infecção no pé


diabético:

 Todos os pacientes que apresentam infecção nova devem fazer Rx do pé afetado


para procurar anormalidades ósseas (deformidade, destruição), bem como para
ver gás nos tecidos moles e corpos estranhos radiopacos.
 RM é exame de escolha para os pacientes que requerem imagens adicionais,
particularmente quando suspeitado de abscesso de partes moles ou o diagnóstico
de osteomielite permanece incerto.

9. Quando considerar o diagnóstico e o tratamento de osteomielite:

 Considerar osteomielite como uma complicação potencial de qualquer infecção


profunda ou grande, especialmente aquela que é crônica ou recobre uma
proeminência óssea.
 Fazer sondagem óssea, quando disponível, em qualquer infecção em pé diabético
com uma ferida aberta.
 A forma definitiva para diagnosticar osteomielite em PD é a combinação de cultura
óssea e histologia.
 Quando a ressecção radical não deixa restos de tecido infectado, sugerimos
antibioticoterapia por um curto período (2-5 dias). Quando há persistência de osso
infectado ou necrosado, sugerimos prolongar o tratamento com ATB (≥ 4 semanas).
 Para tratar especificamente osteomielite em PD, não há, atualmente, suporte para o
uso de tratamentos adjuvantes, como oxigenoterapia hiperbárica, fatores de
crescimento, larvas ou terapia de pressão negativa.

10. Quando considerar a intervenção cirúrgica e qual tipo de procedimento apropriado:

 Solicitar avaliação de um cirurgião para pacientes com infecção moderada ou grave.


 Intervenção cirúrgica urgente para a maioria das infecções acompanhadas de gás
em partes moles mais profundas, abscesso ou fasceíte necrotizante, e menos
urgente para feridas com tecido desvitalizado ou compromentimento ósseo extenso
ou ambos.
 Avaliação do cirurgião vascular sempre que complicar com isquemia.

11. Técnicas de tratamento de feridas e curativos apropriados para as feridas do pé


diabético:

 Desbridamento, visando a remoção de detritos, escara e calo circundante.


 Métodos cirúgicos são geralmente melhores, técnicas de desbridamento autolítico
pode ser apropriado para algumas feridas.
 Redistribuição de pressão para fora da ferida.

12. Curativos

 Gaze umedecida salina: em ferimentos secos ou necróticos;


 Hidrogéis: para feridas secas e ou necróticas (facilitam autólise);
 Filmes: oclusivos ou semioclusivos, para umedecer feridas secas;
 Alginatos: para secar as feridas exsudativas;
 Hidrocoloides: para a absorção de exsudato e facilitar autólise;
 Espumas: para feridas exsudativas;

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Lipsky BA, Peters EJ, Berendt AR, Senneville E, Bakker K, Embil JM, Lavery LA,
Urbanic- Rovan V, Jeffcoate WJ. International Working Group on Diabetic Foot:
Guidance on Infection, 2015.
2. Lipsky BA, Berendt AR, Cornia PB, Pile JC, Peters EJ, Armstrong DG, Deery HG, Embil
JM, Joseph WS, Karchmer AW, Pinzur MS, Senneville E: 2012 Infections Disease
Society of America Clinical Practice Guideline for the Diagnosis and Treatmente of
Diabetic Foot Infections. Clin Infect Dis 54:e132-e173, 2012.
3. WEINTROB, Amy C; SEXTON, Daniel J. Clinical manifestations, diagnosis, and
management of diabetic infections of the lower extremities. 2016. Disponível em:
<https://www.uptodate.com/contents/clinical-manifestations-diagnosis-and-
management-of-diabetic-infections-of-the-lower-extremities?
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abr. 2017.

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