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Departamento de Engenharia Civil

3
MATERIAIS E SUAS PROPRIEDADES

CARLOS FÉLIX

SETEMBRO / 2015
Departamento de Engenharia Civil

ÍNDICE
3 Materiais e suas propriedades 3.1

3.1 Introdução 3.1

3.1.1 Valores característicos 3.2

3.1.2 Valores de cálculo 3.3

3.1.3 Coeficientes parciais de segurança relativos aos materiais 3.4

3.2 Betão 3.4

3.2.1 Classes de resistência 3.4

3.2.2 Módulo de elasticidade 3.12

3.2.3 Tensão de rotura à tração por flexão 3.14

3.2.4 Valores de cálculo das tensões de rotura à compressão e à tração 3.15

3.2.5 Relação tensões-extensões 3.15

3.2.6 Fluência e retração 3.17

3.3 Aço para betão armado 3.30

3.3.1 Resistência 3.30

3.3.2 Ductilidade 3.31

3.3.3 Hipóteses de cálculo 3.32

3.3.4 Módulo de elasticidade 3.33

3.4 Bibliografia 3.33

Instituto Superior de Engenharia do Porto i


Departamento de Engenharia Civil

3 Materiais e suas propriedades

3.1 Introdução

As bases para o dimensionamento das estruturas e a quantificação das ações, a adotar


nas estruturas de betão, são especificadas nas normas EN1990 – Bases para o projeto de
estruturas (Eurocódigo 0 – EC0) e EN1991 – Ações em estruturas (Eurocódigo 1 – EC1).
Resume-se nesta introdução apenas os aspetos essenciais para compreensão dos
capítulos subsequentes.

O EC0 tem como objetivo principal o estabelecimento das bases para a verificação da
segurança das estruturas, definindo os princípios e os requisitos para a segurança,
utilização e durabilidade das estruturas, baseados no conceito de estados limites, em
conjugação com o método dos coeficientes parciais de segurança.

O EC1 quantifica as ações a considerar nas estruturas e, em particular, na Parte 1, em


edifícios. Este Eurocódigo divide-se nas seguintes partes:

Parte 1-1 – Pesos volúmicos, pesos próprios, sobrecargas em edifícios

Parte 1-2 – Ações em estruturas expostas ao fogo

Parte 1-3 – Ações da neve

Parte 1-4 – Ação do vento

Parte 1-5 – Ações térmicas

As situações de projeto, classificadas no EC0, estão resumidas no Quadro 3.1 (ver 3.2 do
EC0).

Quadro 3.1 — Classificação das situações de projeto.

Situações de projeto Definição Exemplo


Condições normais de
Persistentes —
utilização
Durante a construção ou
Transitórias Condições temporárias
reparação
De acidente Condições excecionais Fogo, explosão, impacto
Estruturas quando sujeitas a
Sísmicas Condições excecionais
sismos

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.1


Estruturas de Betão

O tempo de vida útil para o qual as estruturas devem ser dimensionadas é o dado no
Quadro 3.2 (ver 2.3 do EC0).

Quadro 3.2 — Classificação da vida útil de projeto.

Tempo de
Classe vida útil Exemplos
(anos)
1 10 Estruturas temporárias (escoramentos)
Partes substituíveis de estruturas como um tirante de aço,
2 10-25
aparelhos de apoio ou guardas
3 15-30 Estruturas agrícolas
4 50 Estruturas de edifícios correntes
Estruturas de edifícios especiais como hospitais ou
5 100 monumentos;
Obras de engenharia civil como pontes ou barragens

3.1.1 Valores característicos

As propriedades de resistência e de deformabilidade de um material numa obra (aço ou


betão) são obtidas em ensaios sobre provetes, segundo procedimentos especificados nas
normas respetivas. Nestes ensaios, os resultados apresentam uma certa dispersão que
depende sobretudo do controlo da qualidade do fabrico do material e do cuidado e do
rigor com que são conduzidos os ensaios.

Ensaiada a amostra de um dado material, constituída por n provetes, a questão que se


pode colocar é a da obtenção de um valor que seja representativo da série, e por
conseguinte, da propriedade do material. Surge assim o conceito de valor característico
Xk, que tem em consideração não só a média aritmética dos valores obtidos numa série
de ensaios, mas também o desvio em relação à média, dado pelo coeficiente de variação
.

Por exemplo, no caso de um betão, define-se valor característico da resistência à


compressão, fck, como o valor que tem uma probabilidade de ocorrência de 95%, ou seja,
numa série de ensaios à compressão, existe uma probabilidade de 0,95 de se obterem
valores de resistências iguais ou superiores a fck . De acordo com esta definição, e
1

1 Conforme adiante se apresenta, de acordo com o EC2, o valor de f ck refere-se a ensaios


conduzidos sobre provetes cilíndricos aos 28 dias de idade. Estas condições não afectam contudo
esta definição em termos de grandeza estatística, que se mantém válida para outros tipos de
provetes e para betões ensaiados a outras idades.

3.2 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

admitindo uma distribuição normal de probabilidade (ver Figura 3.1), o valor


característico da resistência, que corresponde ao quantilho dos 5%, pode ser obtido a
partir da expressão:

fck  fcm 1  1,64   (3.1)

onde fcm representa o valor médio da resistência à compressão.

Valor

Quantilho 95%
Frequência médio

Quantilho 5%

fk,0.05 fm fk,0.95 Propriedade

Figura 3.1 — Distribuição estatística das propriedades dos materiais.

Para as propriedades relativas às resistências, dependendo das situações, pode adotar-se


os quantilhos de 5% ou de 95% ou ainda o valor médio. Para as relativas à rigidez
adota-se, em geral, o valor médio.

3.1.2 Valores de cálculo

O valor de cálculo Xd de uma propriedade de um material é, geralmente, definido por


uma das duas relações:

Xd = Xk / M (3.2)

Xd =  Xk / M (3.3)

em que:

M — coeficiente parcial de segurança para a propriedade do material;

 — fator de conversão.

A consideração dos coeficientes parciais de segurança para as propriedades dos materiais


tem como objetivo ter em atenção:

— Desvios desfavoráveis dos valores característicos;

— Inexactidão dos valores adotados para os fatores de conversão ;

— A incerteza das propriedades geométricas e de resistência.

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.3


Estruturas de Betão

Os valores do fator de conversão  têm em atenção:

— Efeitos devidos à duração das cargas;

— Efeitos devidos ao volume e à escala;

— Efeitos devidos à temperatura.

3.1.3 Coeficientes parciais de segurança relativos aos materiais

Os valores dos coeficientes parciais de segurança relativos às propriedades dos diversos


materiais são naturalmente definidos nos Eurocódigos respetivos. No EC2 são tabelados
os valores relativos às propriedades dos materiais que interessam às estruturas de
betão, conforme se apresenta no Quadro 3.3. Comparativamente, estes valores são
maiores para o betão do que para o aço, atendendo sobretudo à maior dispersão das
suas propriedades obtidas em ensaios de caracterização laboratorial. Na produção do
aço, atendendo ao controlo mais eficiente das propriedades do produto final, aquele
coeficiente é mais reduzido.

Quadro 3.3 - Coeficientes parciais de segurança relativos às propriedades dos materiais,


para estados limites últimos.

Aço para armadura de betão armado


Situações de projeto Betão — c
ou de pré-esforço — s
Persistentes e Transitórias 1.5 1.15
Acidental (exceto sismos) 1.2 1.10

3.2 Betão

3.2.1 Classes de resistência

Os betões são agrupados em classes de resistência, definidas pelo valor característico da


resistência à compressão aos 28 dias de idade (f ck), em ensaios conduzidos sobre
provetes cilíndricos. O Quadro 3.4 apresenta algumas das propriedades de resistência
dos betões com fck ≤50MPa. O EC2 apresenta valores até à classe C90.

Resistência à compressão

O valor de fck é determinado em ensaios de compressão aos 28 dias de idade sobre


provetes cilíndricos, com 15cm de diâmetro e 30 cm de altura (ver Figura 3.2), ou, em
alternativa, a partir de ensaios de provetes cúbicos de 15cm de aresta (fck,cub). Podem
ainda ser utilizados provetes cúbicos de 20cm de aresta.

3.4 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

Quadro 3.4 - Propriedades de resistência e de deformabilidade do betão.

Classe C12/16 C16/20 C20/25 C25/30 C30/37 C35/45 C40/50 C45/55 C50/60

fck
12 16 20 25 30 35 40 45 50
(MPa)
fck,cub
15 20 25 30 37 45 50 55 60
(MPa)
fcm
20 24 28 33 38 43 48 53 58
(MPa)
fctm
1.6 1.9 2.2 2.6 2.9 3.2 3.5 3.8 4.1
(MPa)
fctk, 0.05
1.1 1.3 1.5 1.8 2.0 2.2 2.5 2.7 2.9
(MPa)
fctk, 0.95
2.0 2.5 2.9 3.3 3.8 4.2 4.6 4.9 5.3
(MPa)
Ecm
27 29 30 31 33 34 35 36 37
(GPa)

Figura 3.2 - Prensa MTS, com um provete cilíndrico durante a realização do ensaio à compressão.

Quando o ensaio de compressão é realizado sobre provetes cilíndricos, o modo de rotura


que se obtém é próximo do que ocorre nas zonas comprimidas de elementos de betão
armado. O mesmo não acontece quando se recorre a provetes cúbicos, caso em que o
atrito que se mobiliza entre o provete e os pratos da prensa altera o modo de rotura (ver
Figura 3.3) e conduz a valores mais elevados da tensão de rotura.

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.5


Estruturas de Betão

a) Provetes cilíndricos. b) Provetes cúbicos.

Figura 3.3 - Roturas em ensaios de compressão do betão (NP EN 12390-3/2003).

Os valores das resistências medidos em cubos, de 15cm ou de 20cm de aresta, não


diferem significativamente, podendo por isso admitir-se na prática corrente que são
idênticos. A relação entre a tensão de rotura obtida em ensaios de resistência à
compressão em provetes cilíndricos e cúbicos será próxima de 0.80. Coutinho e
Gonçalves (1995) apresenta expressões que relacionam os valores médios da resistência
à compressão referidos a provetes cilíndricos (fcm) com os obtidos em provetes cúbicos
(fcm,cub).

Os valores característicos da tensão de rotura à compressão (f ck) podem então ser


obtidos a partir dos valores médios, utilizando os critérios de conformidade para a
resistência à compressão previstos na EN 206.

As propriedades de resistência do betão, e também as de deformabilidade, evoluem ao


longo do tempo, num processo que é designado de maturação do betão.

Pode ser necessário especificar o valor da resistência de um betão com idade diferente
dos 28 dias, quando está em causa, por exemplo, a desmoldagem ou a retirada de um
escoramento, ou a aplicação de pré-esforço. Naturalmente que esta evolução da
resistência depende de inúmeros fatores, de que se salienta o tipo de cimento e as
condições de cura e de endurecimento. Na ausência de adjuvantes, como os aceleradores
de presa, e a menos de avaliação mais precisa com recurso a ensaios laboratoriais, o EC2
apresenta expressões:

fck t   fcm t   8 MPa para 3  t  28 dias


(3.4)
fck t   fck para t  28 dias

sendo:

fcm t    cc t fcm (3.5)

3.6 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

em que  é um coeficiente que depende da idade do betão e do tipo de cimento utilizado


e é dado através da expressão:

  28 
 cc t   exps1   (3.6)
 
 
t 

O parâmetro s depende do tipo de cimento e é dado pelos valores do Quadro 3.5, e:

fcm(t) – é a tensão média de rotura do betão à compressão à idade de t dias;

fcm – é a tensão média de rotura aos 28 dias de idade, de acordo com o Quadro
3.4.

Quadro 3.5 – Valores do parâmetro s.

s Classes de resistência do cimento


0.20 CEM42.5R, CEM52.5N e CEM 52.5R Classe R
0.25 CEM32.5R, CEM42.5N Classe N
0.38 CEM32.5N Classe S

A Figura 3.4 representa a evolução do parâmetro  por aplicação da expressão (3.6) para
as classes de cimento S, N e R. Na Figura 3.5 indica-se a evolução do valor médio da
resistência à compressão de algumas classes de resistência de betões, quando
executados com cimento da classe N, por aplicação da expressão (3.5).

1.40
Classe S
1.20 Classe N
1.00 Classe R

0.80
βcc(t)
0.60

0.40

0.20

0.00
0 28 56 84 112 140 168
t (dias)

Figura 3.4 – Evolução do parâmetro  para as três classes de cimento S, N e R.

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.7


Estruturas de Betão

60.0
C40
50.0 C35
C30
40.0
C25
fcm(t) 30.0 C20
(MPa)
20.0

10.0

0.0
0 28 56 84 112 140 168
t (dias)

Figura 3.5 – Evolução de fcm para betões com cimento de classe N.

Resistência à tração

A resistência à tração refere-se à tensão mais elevada sob esforços de tração simples
(EC2 3.1.2-7). Este valor pode ser obtido a partir de ensaios de rotura à tração por
compressão diametral (Splitting Tensile Strengh), conforme EN 12390-6/2003,
recorrendo ao dispositivo representado na Figura 3.6. Neste ensaio, a resistência à
tração é avaliada através das tensões de tração transversal num provete cilíndrico
disposto na horizontal. Os valores da resistência à tração por compressão diametral fct,sp,
é geralmente um pouco maior que no caso do ensaio de tração axial, uma vez que as
fissuras começam no interior do provete.

A tensão de rotura à tração por compressão diametral obtém-se a partir da expressão:

2F
fct,sp  (3.7)
 LD

Onde,

F – é a carga máxima na compressão diametral medida na prensa

L – é o comprimento da linha de contacto entre a prensa e o provete

D – é o diâmetro da secção transversal do provete

A tensão de rotura à tração simples pode ser obtida a partir de fct,sp através da expressão
(ver EC2 3.1.2 - 8):

fct  0.9 fct, sp (3.8)

3.8 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

2F
fct,sp 
fct,sp  LD

Tração Compressão
F Peça em aço para
Faixas de cartão
prensado
aplicação da carga

a) Mecanismo de rotura b) Posicionador do provete

c) Cilindro na prensa d) Prisma após a rotura

Figura 3.6 - Ensaio de tração por compressão diametral.

A resistência à tração simples pode também ser avaliada através de ensaios de


resistência à tração por flexão (Bending Tensile Strength) de provetes prismáticos, de
acordo com a norma NP EN 12390-5/2003, utilizando, por exemplo, o dispositivo de
ensaio, conforme se ilustra na Figura 3.7.

F/2 F/2
Rolete de aplicação de
carga (susceptível de
rotação e inclinação)
150 = d2

Rolete de apoio (susceptível


de rotação e inclinação)
Rolete de apoio

Dimensões em mm

Figura 3.7 – Dispositivo de ensaio para determinação da resistência à tração por flexão.

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.9


Estruturas de Betão

Neste exemplo, recorre-se a um prisma com dimensões de 550×150×150mm³, e carga


aplicada em 2 pontos. O valor do momento flector aplicado ao provete é constante entre
pontos de aplicação da carga e dado pela expressão:

F
M a (3.9)
2

em que:

F — valor da força aplicada pelo atuador

a — a distância do ponto de aplicação da carga ao prisma ao apoio mais próximo.

A máxima tensão de tração aplicada ao provete nestas condições é dada por:

6M
fct,fl  (3.10)
bh2

onde b e h representam a base e a altura, respetivamente, da secção transversal do


provete.

Em elementos de betão a resistência à tração na flexão é maior do que a resistência à


tração axial ou à obtida por compressão diametral, porque a maior tensão ocorre apenas
na fibra mais extrema, e, por conseguinte, as fibras vizinhas, menos solicitadas,
colaboram na resistência (F.Leonhart e E.Monning, 1977).

No EC2 são apresentados os valores médios (fctm) e característicos (fctk,0.05 e fctk,0.95) da


resistência à tração do betão para cada classe de resistência (ver Quadro 3.1 do EC2). O
Quadro 3.4 apresenta um excerto daqueles valores para betões de classes de resistência
até C45.

Os valores médios da resistência à tração são obtidos a partir dos correspondentes


valores característicos e médios da resistência à compressão, a partir da expressão:

23
fctm  0.3 fck para fck  50MPa
fcm (3.11)
fctm  2.12 ln(1  ) para fck  50MPa
10

Os valores característicos da resistência à tração, para os quantilhos de 5% e de 95%


(ver Figura 3.1) obtêm-se, respetivamente, a partir das expressões:

fctk,0.05  0.7 fctm (3.12)

fctk,0.95  1.3 fctm (3.13)

3.10 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

Conforme se pode observar na Figura 3.8, a resistência do betão à tração apresenta para
uma da classe de betão uma grande variabilidade. Os valores extremos podem diferir em
mais de 30% do seu valor médio. A escolha do valor da resistência à tração a adotar em
cada verificação da segurança deve ser por isso cuidada e devidamente fundamentada.

7.0
fctk,0.95
6.0

5.0 fctm

4.0
fct fctk,0.05
(MPa) 3.0

2.0

1.0

0.0
0 10 20 30 40 50 60 70 80
fck (MPa)

Figura 3.8 – Valores da resistência à tração do betão.

A evolução com o tempo da resistência à tração é fortemente influenciada pelas


condições de cura e de secagem e também pelas dimensões dos elementos estruturais.
Em primeira aproximação, o EC2 indica a seguinte expressão (ver EC2 3.1.2-9):

fctm(t)   cc t  fctm (3.14)


em que cc(t) é dado pela expressão (3.6) e:

=1 para t<28 dias

=2/3 para t≥28 dias

A Figura 3.9 ilustra a evolução do valor de fctm para betões realizados com cimento da
classe N, por aplicação da expressão (3.14).

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.11


Estruturas de Betão

5.0

4.0 C40
C35
3.0 C30
C25
fctm(t)
C20
(MPa) 2.0

1.0

0.0
0 28 56 84 112 140 168
t (dias)

Figura 3.9 – Evolução de fctm para betões de cimento da classe N.

3.2.2 Módulo de elasticidade

Os valores das propriedades dos materiais necessários ao cálculo das deformações


instantâneas e diferidas do betão dependem não só da classe de resistência do betão,
mas também das propriedades dos agregados e de outros parâmetros relacionados com
a composição do betão e com as condições ambientais.

Figura 3.10 - Dispositivo de ensaio para obtenção do módulo de elasticidade.

O módulo de elasticidade pode ser obtido experimentalmente conforme especificado na


E397/1993. A Figura 3.10 ilustra um dispositivo de ensaio que recorre à utilização de três
transdutores de deslocamento (LVDTs) para a medição da distância relativa de dois anéis
afastados entre si de L0. O afastamento desde anéis aos pratos da prensa minimiza
qualquer efeito local de cintagem do betão. De acordo com a Especificação, é realizado
um conjunto de ciclos de carga/descarga, a velocidade controlada, entre valores máximo
e mínimo da tensão de compressão do betão previamente definido, e medida a respetiva

3.12 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

deformação que o provete experimenta. Eliminados os resultados dos ciclos iniciais, o


ensaio prossegue até que a diferença da extensão entre dois ciclos consecutivos seja
inferior a 10×10-6 m/m.

O EC2 apresenta valores aproximados do módulo de elasticidade para cada classe de


resistência, Ecm (ver Quadro 3.1 do EC2), conforme se exemplifica no Quadro 3.4 para
betões até à classe C45. É definido como o módulo de elasticidade secante, obtido a
partir da curva que relaciona tensões-deformações do betão, entre c=0 e c=0.4fcm,
conforme esquematizado na Figura 3.11.

Figura 3.11 – Relação tensões-extensões para a análise estrutural.

Este valor do módulo de elasticidade deve ser entendido como um valor aproximado,
válido para betões com agregados contendo quartzo. Para outros tipos de agregados, o
módulo de elasticidade Ecm deve ser corrigido de acordo com a expressão:

Ecm,corr  k Ecm (3.15)

usando os fatores k que constam do Quadro 3.6.

Quadro 3.6 – Fator corretivo do Ecm , função do tipo de agregados.

Agregados Basalto Quartzíticos Calcário Grés

k 1.2 1.0 0.9 0.7

A variação do módulo de elasticidade com o tempo pode ser estimada a partir da


expressão (ver EC2 3.1.3-3):

 f t  
0.3
E cm t    cm  E cm (3.16)
 fcm 

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.13


Estruturas de Betão

A Figura 3.12 ilustra a variação do módulo de elasticidade com o tempo para betões
realizados com cimento da classe N, por aplicação da expressão (3.16).

40.0

C40
35.0 C35
C30
C25
C20
Ecm(t) 30.0
(GPa)

25.0

20.0
0 28 56 84 112 140 168
t (dias)

Figura 3.12 – Evolução de Ecm para betões de cimento da classe N.

3.2.3 Tensão de rotura à tração por flexão

A tensão média de rotura à tração por flexão dos elementos de betão armado depende
da tensão média de rotura à tração simples (fctm) e da altura da secção transversal do
elemento em causa (h). A menos de indicação mais precisa, o EC2 propõe a seguinte
expressão, para a obtenção da tensão média de rotura à tração por flexão (ver Figura
3.13):

 h  
fctm,fl  max 1.6  fctm; fctm , com h em mm (3.17)
 1000  

Idêntica expressão pode ser usada para a obtenção do respetivo valor característico.

1.6

fctm,fl
fctm 1.0

0.0
0 600
h (mm)

Figura 3.13 – Variação de fctm,fl com a espessura.

3.14 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

3.2.4 Valores de cálculo das tensões de rotura à compressão e à tração

O valor de cálculo da tensão de rotura à compressão de um betão é definido por:

fck
fcd  (3.18)
c

onde:

c é o coeficiente parcial de segurança relativo ao betão, igual a 1.5 para


situações de projeto persistente e transitórias e 1.2 para situações de
acidente (ver Quadro 3.3).

O valor de cálculo da tensão de rotura à tração, fctd, é definido por:

fctk,0.05
fctd  (3.19)
c

O Quadro 3.7 resume os valores de fcd e de fctd para algumas das classes de betões.

Quadro 3.7 – Valores de cálculo das tensões de rotura à compressão e à tração.

Classe C12/16 C16/20 C20/25 C25/30 C30/37 C35/45 C40/50 C45/55 C50/60

fcd
8.0 10.7 13.3 16.7 20.0 23.3 26.7 30.0 33.3
(MPa)

fctd
0.7 0.9 1.0 1.2 1.4 1.5 1.6 1.8 1.9
(MPa)

3.2.5 Relação tensões-extensões

Relação tensões-extensões para a análise estrutural não linear

Em carregamento uniaxial de curta duração pode considerar-se, para efeitos de análise


estrutural, que o betão exibe o comportamento representado na Figura 3.11, com
valores de c1 e cu1 indicados no Quadro 3.1 do EC2.

Relações tensões-extensões para o cálculo de secções transversais

O diagrama que melhor ilustra a relação tensões-extensões para o betão comprimido,


para efeito do cálculo de secções transversais, é o diagrama parábola-retângulo
representado na Figura 3.14a. Para betões com fck≤50MPa, os valores das extensões aí
representados são:

c2 = 2‰
(3.20)
cu2 = 3.5‰

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Estruturas de Betão

Sendo o diagrama parábola-retângulo expresso por:

 
 c  f cd  c  250 c2  103 para 0≤ c ≤ c2
(3.21)
σ c  f cd para c2 ≤ c ≤ cu2

Para outras classes de resistência superiores, consultar o EC2 (3.1.7).

a) Diagrama parábola-retângulo b) Diagrama bilinear

Figura 3.14 - Relação tensões-extensões para o cálculo de secções transversais.

Poderão também utilizar-se outras idealizações simplificadas deste diagrama, desde que
os resultados sejam equivalentes ou mais conservativos, como é o caso do diagrama
representado na Figura 3.14b. Neste caso, os valores das extensões representadas para
betões com fck≤50MPa são:

c3 = 1.75‰
(3.22)
cu3 = 3.5‰

c

fcd

0 1.75‰ 2.0‰ 3.5‰ c

Figura 3.15 – Comparação entre os diagramas parábola-rectângulo e o bilinear.

3.16 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

A Figura 3.15 estabelece a comparação entre os diagramas tensões-extensões de cálculo


parábola-retângulo e bilinear, para betões com fck≤50MPa, podendo constatar-se que este
último dará origem, em geral, a resultados mais conservativos.

No cálculo de secções à flexão pode ainda considerar-se uma distribuição retangular de


tensões, conforme se ilustra na Figura 3.16. Para betões com fck≤50MPa, os parâmetros
aí representados tomam os seguintes valores:

=0.8
(3.23)
=1.0

Figura 3.16 – Distribuição retangular de tensões.

3.2.6 Fluência e retração

Considerações gerais

A fluência e a retração do betão são propriedades reológicas cujos efeitos afetam


significativamente a fendilhação e a deformação dos elementos estruturais, devendo, por
isso, ser devidamente considerados na verificação dos estados limites de utilização. Os
seus efeitos na verificação dos estados limites últimos são em geral reduzidos, exceto
nos casos em que os efeitos de segunda ordem assumem uma maior importância, como
é o caso dos pilares mais esbeltos, cuja deformabilidade pode induzir alteração
significativa de esforços (EC2 – 5.8.4).

A fluência e a retração do betão dependem essencialmente da humidade ambiente, das


dimensões do elemento e da composição do betão. A fluência também depende da idade
do betão no primeiro carregamento, assim como da duração e da intensidade da carga.
Ainda que não considerada nos modelos atualmente disponíveis, a retração é também
afetada pela sua exposição a outros agentes climáticos, nomeadamente à pluviosidade e
à exposição solar.

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.17


Estruturas de Betão

Quando considerada nos cálculos, os efeitos da fluência podem ser associados às ações
permanentes e avaliados com a combinação quase permanente de ações (EC2 –
2.3.3.3).

As consequências das deformações devidas à retração e à fluência, a que se junta


também a temperatura, devem ser devidamente consideradas no projeto, conforme as
diversas disposições previstas no EC2. Deve contudo minimizar-se os seus efeitos,
nomeadamente através de uma composição cuidada do betão, da colocação de aparelhos
de apoio ou de juntas de dilatação.

Na análise global das estruturas de edifícios, os efeitos da variação da temperatura e da


retração podem não ser considerados desde que sejam dispostas juntas para acomodar
as deformações resultantes com afastamento máximo de 30m (EC2 – 2.3.3).

Fluência

A fluência depende das condições de humidade ambiente, das dimensões das peças e da
composição do betão. Além destes fatores está também relacionada com a intensidade e
a duração da carga e com a maturação do betão à data do carregamento.

Desde que a tensão de compressão no betão não exceda o valor de 0.45f ck(t0) na idade
t0, idade do betão à data do primeiro carregamento, pode considerar-se que a fluência se
desenvolve no domínio linear. Caso contrário, deve considerar-se a não linearidade da
fluência (EC2 – 3.1.4).

Por definição, no domínio da fluência linear, o coeficiente de fluência φ é dado pela razão
entre a deformação diferida e a deformação elástica. A expressão que traduz esta
definição é:

 c (t )   c (t0 )  cc (t, t0 )
 (t , t o )   (3.24)
 c (t 0 )  c (t 0 )

No modelo preconizado no EC2 a extensão de fluência experimentada por um betão entre


t0 e t é dada pela expressão:

c
 cc (t, t0 )   (t, to ) (3.25)
Ec

onde,

c — é a tensão aplicada ao betão na idade t0;

Ec — é o módulo tangente que pode ser considerado igual a 1,05Ecm

3.18 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

A quantificação do coeficiente de fluência assenta num produto de dois fatores, um dos


quais traduz o valor do coeficiente de fluência a longo prazo, e o outro a evolução do
fenómeno no tempo. A expressão do coeficiente de fluência é dada por:

 (t, to )  o c (t, to ) (3.26)

em que,

to  é a idade do betão expressa em dias à data do carregamento;

φo  é o coeficiente nominal de fluência;

c(t,to)  é o coeficiente que define o desenvolvimento da fluência no tempo.

O coeficiente nominal de fluência é dado pela expressão:

 0  RH  (fcm )  (t 0 ) (3.27)

em que φRH é um coeficiente que depende da humidade relativa do meio ambiente e da


espessura equivalente do elemento e é dado por:

1  RH 100
RH  1  , para fcm ≤ 35MPa (3.28)
0.1 3 h0

 1  RH 100  35 
0.7 
 
0.2
 RH  1        35  , para fcm > 35MPa (3.29)
   fcm 

 0.1 3 h0  fcm   

onde h0 representa a espessura equivalente do elemento, em mm, dada por:

2A c
h0  (3.30)
u

em que,

Ac — área da secção transversal

u — parte do perímetro da secção transversal do elemento em contacto com o


ambiente

(fcm) é um fator que tem em conta a influência da resistência do betão e é dado por:

16.8
 (fcm )  (3.31)
fcm

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.19


Estruturas de Betão

(t0) pode ser estimado a partir da seguinte expressão:

1
 (t 0 ) 
0.1  t  0.20
0
(3.32)

O coeficiente que traduz a evolução da fluência no tempo, após o carregamento, pode


ser estimado pela seguinte expressão:

 c t, t 0   
 t  t 0  
0.3
(3.33)

 H  t  t0 

sendo H um coeficiente que depende da humidade relativa e da espessura equivalente


do elemento e pode ser estimado a partir de uma das seguintes expressões:

 
H  1.5 1  0,012RH18 h0  250  1500 , para fcm≤35 (3.34)

 
0.5 0.5
 35   35 
 H  1.5 1  0,012RH 18
h0  250 
  1500 
 , para fcm>35 (3.35)
 fcm   fcm 

O modelo exposto é válido para um betão com cimento da Classe N. Para outros tipos de
cimento o EC2 (ver Anexo B do EC2) apresenta correções a este modelo que permitem a
consideração de outras classes de cimento, assim como uma correção para ter em conta
a influência de temperaturas, elevadas ou baixas.

Para as situações em que não é necessária elevada precisão, poderá ser suficiente a
obtenção do valor final do coeficiente de fluência (∞,t0) a partir dos gráficos da Figura
3.17, que são válidos no domínio da fluência linear, para temperaturas ambientes
compreendidas entre -40ºC e +40ºC e humidades relativas médias entre RH=40% e
RH=100%.

3.20 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

a) Ambiente interior – RH=50%

Notas:

O ponto de intersecção entre as


linhas 4 e 5 também pode estar
acima do ponto 1.

Para t0 > 100 é suficientemente


rigoroso considerar t0 = 100 (e
utilizar a linha tangente)

b) Ambiente exterior – RH=80%

Figura 3.17 – Método para a determinação do coeficiente de fluência, (,t0), para betão
em condições ambientais normais (Figura 3.1 do EC2).

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.21


Estruturas de Betão

Retração

O modelo da retração proposto pelo EC2 inclui a consideração de duas parcelas, de


acordo com a expressão:

 cs  t    ca  t    cd  t  (3.36)

onde:

εca(t) ― é a retração autogénea;

εcd(t) ― é a retração de secagem.

A retração autogénea é originada pelo processo de hidratação do cimento que conduz a


uma redução da quantidade de água nos poros. Esta parcela da retração dá-se durante o
processo de cura do betão e ocorre, principalmente, durante os primeiros dias de idade.
De acordo com o modelo apresentado no EC2, o seu valor está diretamente relacionado
com a resistência do betão e com a idade através da expressão:

 ca (t)   as (t)  ca () (3.37)

sendo,

as  t   1  exp(0.2t 0.5 ) (3.38)

 ca ()  2.5fck  10 10 6 (3.39)

Sabe-se, contudo, que a composição do betão, nomeadamente a relação água/cimento e


o teor de finos, podem afetar significativamente esta parcela da retração.

A retração de secagem resulta de uma diminuição de volume devido às perdas de água


para o exterior. Está por isso associada à migração da água no seio do betão endurecido,
inicia-se em geral alguns dias após a betonagem (o EC2 refere o fim da cura do betão) e
desenvolve-se, lentamente, no tempo. Depende de numerosos fatores, assumindo maior
importância o tipo de cimento, a resistência do betão e as condições ambientais em que
a peça está inserida. Segundo o EC2 pode ser obtida a partir da expressão:

 cd t    ds t, t s  k h  cd,0 (3.40)

sendo,

3.22 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

 ds t, t s  
t  t s 
(3.41)
t  t s   0.04 h30

ts a idade do betão em dias, no início da retração por secagem (normalmente


corresponde ao fim da cura);

kh um coeficiente que depende da espessura equivalente do elemento (ver Quadro


3.8) dado por:

k h  2.5  10 6 h20  2.25  10 3 h0  1.2 para h0<500mm (3.42)

kh = 0.70 para h0≥500mm

  fcm 
 cd,0  0.85220  110 ds1  exp   ds2 .10  6. RH (3.43)
  10 

com fcm expresso em MPa, onde ds1 e ds2 são coeficientes que dependem do tipo de
cimento (ver Quadro 3.9) e βRH depende da humidade relativa do ambiente através da
expressão:

  RH  
3
 RH  1.551     (3.44)
  100  

Quadro 3.8 – Valores de kh. Quadro 3.9 – Valores de ds1 e ds2.

h0 (mm) kh Cimento ds1 ds2


100 1.00 Classe S 3 0.13
200 0.85 Classe N 4 0.12
300 0.75 Classe R 6 0.11
≥500 0.70

O Quadro 3.10 apresenta os valores finais (t=5000dias) da retração de betões de


diferentes classes de resistência, realizados com cimento CEM da classe N, para dois
tipos de humidade relativa ambiente e diferentes espessuras equivalentes, admitindo
ts=8dias.

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.23


Estruturas de Betão

Quadro 3.10 – Valores finais da extensão total de retração cs (×10-6) para betão com
cimento da classe N.

h0 [mm]
fck
100 200 300 500 100 200 300 500
[MPa]
RH=50% (ambiente interior) RH=80% (ambiente exterior)
20 564 477 416 374 326 277 243 220
25 545 463 406 366 321 275 243 221
30 528 451 397 360 317 274 244 223
35 513 440 390 354 314 273 245 225
40 499 430 383 350 312 273 247 228
45 487 422 378 346 310 274 249 232
50 476 415 373 344 310 276 252 236

Estudo de sensibilidade da retração

Na Figura 3.18 representa-se a evolução da retração livre autogénea, por secagem e


total de um elemento livre de se deformar de um betão da classe de resistência C25/30,
no meio ambiente com humidade relativa de 50% e espessura equivalente h 0=500mm.
Como se pode constatar, a retração autogénea ocorre essencialmente nos primeiros dias
após a betonagem, enquanto a de secagem evolui lentamente ao longo do tempo.
Verifica-se que nas condições expressas, ao fim de três anos a retração por secagem, e
por consequência a total, ainda não atingiu o seu valor final. De facto, a retração total ao
fim do terceiro ano é de 284×10-6m/m enquanto a retração a tempo infinito neste caso
se aproxima de 370×10-6m/m. Verifica-se neste exemplo que a retração ocorrida ao fim
de três anos corresponde a cerca de 75% do valor final.

600
Betão C25/30
Total ho=500mm
500
Secagem RH=50%
400 ts=8 dias
Autogénea
cs (x10-6)

Cimento da classe N
300

200

100

0
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900 100
0
t (dias)

Figura 3.18 – Evolução das parcelas da retração.

3.24 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

Na Figura 3.19 representa-se o valor da extensão total devido à retração a tempo infinito
para betões das classes de resistência indicadas e realizados com cimento da classe N.
Admite-se que a retração por secagem se inicia ao fim de oito dias (t s=8). São
apresentados os valores para as humidades relativas de 50%, típico de ambientes
interiores) e de 80%, mais frequente em ambientes exteriores.

600
RH=50%
550 ts=8 dias
Cimento da classe N
500
cs (x10-6)

C20/25
450 C25/30
C30/37
400 C35/45
C40/50
350

300
0 200 400 600 800 1000
ho (mm)

a) Humidade relativa ambiente de 50% (ambiente interior)

400
RH=80%
350 ts=8 dias
Cimento da classe N
300
cs (x10-6)

250
C20/25
200 C25/30
C30/37
150 C35/45
C40/50
100
0 200 400 600 800 1000
ho (mm)

b) Humidade relativa ambiente de 80% (ambiente exterior)

Figura 3.19 – Extensão por retração livre para t=∞.

A contribuição da parcela da retração autogénea para a retração total é reduzida (ver


Figura 3.20) ainda que a sua importância aumente para betões de classe de resistência
superiores (Figura 3.21).

Da análise da Figura 3.20 pode ainda constatar-se que o modelo proposto pelo EC2
simula uma redução significativa da retração por secagem para humidades relativas
elevadas.

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.25


Estruturas de Betão

600 600
Betão C25/30 RH=50%
500 ts=8 dias 500 ts=8 dias
Cimento da classe N Cimento da classe N
400 ho=500mm 400 h0=500mm
cs (x10-6)

cs (x10-6)
300 300
Total Total
200 200
Secagem Secagem

100 Autogénea 100 Autogénea

0 0
0 20 40 60 80 100 10 20 30 40 50
RH (%) fck (MPa)

Figura 3.20 – Sensibilidade da retração à Figura 3.21 – Sensibilidade da retração à


humidade relativa ambiente. classe de resistência do betão.

Comparação com resultados laboratoriais

Apresenta-se de seguida os resultados obtidos na medição das extensões devidas à


retração de um prisma de betão (ver Figura 3.22) mantido em laboratório durante o
processo de cura e endurecimento. Os valores experimentais são comparados com os
obtidos a partir das expressões apresentadas no EC2.

Figura 3.22 – Prisma com extensómetro antes da betonagem.

Após a betonagem, as trocas de humidade com o exterior do provete foram minimizadas


através da interposição de uma película plástica na superfície de betonagem, logo desde
o início. Esta película foi removida apenas aos oito dias de idade, aquando da
descofragem, tendo sido esta a idade considerada para o início da retração de secagem
(ts).

De acordo com o registo de humidade relativa ambiente do laboratório adotou-se no


modelo o valor médio de HR=55%. Os valores experimentais da retração foram

3.26 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

considerados tomando por referência a extensão medida 12h após a betonagem. O


Quadro 3.11 resume os valores adotados no modelo de retração aplicado aos prismas. A
Figura 3.23 apresenta a evolução dos resultados experimentais da retração observados
durante quase um ano de medições. Nesta figura foi também representada a curva
teórica do modelo proposta pelo EC2.

Quadro 3.11 – Valores adotados no modelo de retração nos prismas.

ts fck fcm fcm0 h0 kh αds1 αds2 RH βRH


[dias] [MPa] [MPa] [MPa] [mm]

8 25.55 30.55 10.0 75 1 4 0.12 55 -1.29

-100 Modelo do
EC2
cs (x10-6m/m)

-200

-300 Valores
experimentais
-400

-500

-600
0 50 100 150 200 250 300 350
t (dias)

Figura 3.23 – Retração do betão: resultados experimentais versus modelo do EC2.

Da observação dos resultados experimentais verifica-se que existe uma descontinuidade


da curva aos oito dias de idade. Esta descontinuidade coincide com a fase de
desmoldagem e define o início da retração de secagem. Dadas as condições de
isolamento higrométrico em que o modelo foi mantido até esta data, pode considerar-se
que a totalidade da retração observada neste período foi autogénea.

A observação experimental do efeito da fluência num prisma de betão implica a utilização


de um sistema que aplique uma carga com carácter permanente. Tais sistemas são em
geral constituídos por uma estrutura de reação, por um atuador, ligado a um circuito
hidráulico, um compensador de pressão e um manómetro. A Figura 3.24 ilustra um
exemplo de um destes sistemas, produzido pelo LNEC.

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.27


Estruturas de Betão

Figura 3.24 – Sistema de aplicação de carga em prisma.

Utilizando um prisma de betão com as mesmas características e dimensões do utilizado


anteriormente foram medidas as extensões durante aproximadamente um ano, após a
aplicação de uma dada carga inicial, carga essa que foi mantida em permanência, no seio
do referido sistema de fluência. As extensões totais assim medidas incluem a soma de
duas parcelas: a deformação devida à retração e a devida à fluência. Em simultâneo
foram também medidas as extensões no outro prisma que por não estar sujeito a
qualquer carga, correspondem à deformação devida apenas à retração. Atendendo a que
ambos os prismas foram realizados com o mesmo betão, nas mesmas condições de
betonagem e durante todo o período de observação ficaram expostos às mesmas
condições termohigrométricas, a diferença entre ambas as extensões fornece a
informação necessária à caracterização da fluência.

Ao aplicar ao provete a tensão inicial c, esta provoca uma extensão instantânea dada
por:

c
 c (t 0 )  (3.45)
Ecm (t0 )

em que:

Ecm(t0)  é o módulo de elasticidade secante à idade do carregamento.

Daí que o coeficiente de fluência que se obtém experimentalmente esteja relacionado,


não com o módulo de elasticidade tangente como preconiza o EC2, mas com o módulo
secante, de acordo com a expressão:

c
 cc (t, t0 )  exp (t, to ) (3.46)
Ecm (t0 )

3.28 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

Para referir os valores experimentais do coeficiente de fluência ao módulo de elasticidade


tangente, conforme consta do EC2, propõe-se a correção:

Ec
exp,corr (t, to )  exp (t, to ) (3.47)
Ecm (t0 )

O valor medido da deformação inicial aplicada ao prisma compensador da fluência foi de


296µε. Adotando Ecm(8)=29.7GPa obtém-se a tensão inicial c=8.80MPa. Este valor, não
obstante ser elevado, é inferior a 45% do valor característico da tensão de rotura por
compressão à data da aplicação da carga, podendo por isso considerar-se a fluência no
domínio linear. Os valores adotados no modelo de fluência do prisma estão resumidos no
Quadro 3.12.

Quadro 3.12  Valores adotados no modelo de fluência nos prismas.

t0 c fcm Ec
RH φRH βH
[dias] [MPa] [MPa] [GPa]

8 8.8 30.55 32.3 55 2.067 363

A evolução do valor experimental da extensão por fluência foi obtida a partir da diferença
entre as extensões medidas nos prismas compensadores da retração e da fluência. A
Figura 3.25 ilustra os resultados obtidos com o modelo proposto pelo EC2 (φEC2), assim
como os valores experimentais observados no mesmo período. No exemplo apresentado,
a tempo infinito, o coeficiente de fluência obtido a partir do modelo será
aproximadamente 71% do valor indicado no EC2.

3.5
Modelo do
3.0 EC2

2.5
(t,t0)

2.0
Valores
1.5
experimentais
1.0

0.5

0.0
0 50 100 150 200 250 300 350
t (dias)

Figura 3.25 – Verificação experimental da evolução do coeficiente de fluência.

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.29


Estruturas de Betão

3.3 Aço para betão armado

3.3.1 Introdução

As cláusulas do EC2 são válidas para armaduras para betão armado em forma de varões,
fios, redes electrossoldadas e vigas em treliça pré-fabricada. Aplica-se ainda a armaduras
nervuradas e soldáveis (ver Quadro 3.4 do EC2).

O EC2 especifica os requisitos das propriedades no corpo do texto (ver 3.2 do EC2) e
quantifica esses requisitos em Anexo Normativo (Anexo C do EC2), remetendo para a
EN10080 os procedimentos para a sua verificação.

O atraso na publicação da EN10080 conduziu a que no Anexo Nacional se refira que são
aplicáveis as especificações LNEC relativas a este material (ver NA.4.3 do EC2),
nomeadamente:

LNEC E 455: 2010 – Varões de aço A400 NR de ductilidade especial para armaduras
de betão armado. Características, ensaios e marcação.

LNEC E 456: 2008 – Varões de aço A500 ER para armaduras de betão armado.
Características, ensaios e marcação.

LNEC E 458: 2008 – Redes electrossoldadas para armaduras de betão armado.


Características, ensaios e marcação.

LNEC E 460: 2010 – Varões de aço A500 NR de ductilidade especial para armaduras
de betão armado. Características, ensaios e marcação.

LNEC E 479:2008 – Redes electrossoldadas de pequeno diâmetro. Campo de


aplicação, características e ensaios.

3.3.2 Resistência

Os aços são caracterizados pelo valor característico da sua tensão de cedência. A tensão
de cedência (fyk) é definida como o valor característico da força de cedência a dividir pela
área nominal da secção transversal da armadura (ver Figura 3.26a). Num aço endurecido
a frio (ver Figura 3.26b), que não exibe um pronunciado patamar de cedência com nítido
valor da tensão de cedência, é defina a tensão limite convencional de proporcionalidade a
0.2% (f0.2k), que é o valor característico da força máxima em ensaios de tração simples,
dividido pela mesma área nominal da secção transversal.

3.30 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

f 
k   f 
 fk k

a) Aço laminado a quente b) Aço endurecido a frio

Figura 3.26 – Diagrama tensões-extensões do aço típico de armaduras para betão


armado (Figura 3.7 do EC2).

As classes de resistência dos aços a usar em Portugal (fyk ou f0.2k) deverão ser 400 ou
500 (ver NA.3 do EC2), ainda que o articulado do EC2 seja válido até f yk=600MPa (ver
3.2.2 do EC2).

3.3.3 Ductilidade

A ductilidade do aço para betão armado é definida pela relação entre a resistência à
tração (tensão máxima) e a tensão de cedência (ft/fy)k (ver Figura 3.26) e pela extensão
na carga máxima (uk).

Para uma mesma tensão máxima, a ductilidade é inversamente proporcional à tensão de


cedência e será tanto maior quanto maior for o alongamento do aço (para a tensão
máxima).

A ductilidade é um aspeto essencial no projeto de estruturas em zonas sísmicas, como é


o caso de Portugal, e sempre que se faz uso do comportamento plástico das estruturas,
ou de zonas das estruturas. Estruturas de betão com aço de maior ductilidade estão mais
bem preparadas para acomodar maiores rotações das secções permitindo, por exemplo,
uma maior redistribuição de esforços de flexão em vigas e em lajes.

O EC2 define três classes de ductilidade, conforme se resume no Quadro 3.13, para
varões, fios e redes electrossoldadas (Quadro C.1 e Quadro NA.II do EC2).

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.31


Estruturas de Betão

Quadro 3.13 – Classes de ductilidade para varões, fios e redes electrossoldadas.

Classe de ductilidade A B C
Armaduras A500EL ou ER A400 ou A500NR A400 ou A500NRSD
K = (ft/fy)k ≥ 1.05 ≥ 1.08 1.15 ≤ k ≤ 1.35
uk (%) ≥ 2.5 ≥ 5.0 ≥7.5

3.3.4 Hipóteses de cálculo

As diferenças introduzidas neste capítulo tornam os cálculos das secções à flexão simples
ou composta mais complexos, ainda que o resultado final não se traduza numa alteração
significativa em relação ao anteriormente estabelecido.

Para o cálculo de secções de betão armado o EC2 propõe duas possibilidades de


diagramas bilineares de tensões-extensões de cálculo (ver Figura 3.27):

(i) O primeiro, com um ramo superior cuja inclinação se faz depender da


ductilidade do aço (através do parâmetro k) e com a limitação das extensões a
ud; neste diagrama ud = 0.9 uk e a tensão é, na prática, limitada a k.fyk/s.

(ii) O segundo, com um ramo superior horizontal sem limitação das extensões.

Diagrama idealizado

Diagrama de cálculo

Figura 3.27 – Diagramas tensões-extensões, idealizado (A) e de cálculo (B) do aço para
armaduras para betão armado (Figura 3.8 do EC2).

Na prática, a utilização do primeiro diagrama pode introduzir uma ligeira economia nas
soluções, que pode atingir os 8%. Não são, contudo, frequentes, além de que a
complexidade dos cálculos aumenta significativamente. Os melhores resultados são
obtidos quando se utilizam aços de elevada ductilidade e, para estados limites últimos, a
profundidade do eixo neutro se situe próxima de 0.25d (sendo d a altura útil). Para

3.32 Departamento de Engenharia Civil


Materiais e suas propriedades

valores superiores da profundidade do eixo neutro, a tensão no aço será inferior,


aproximando-se do valor de fyd, enquanto que para valores inferiores, a condição imposta
ao alongamento do aço conduz a tensões médias na zona comprimida da secção
inferiores às que se instalariam caso aquele alongamento não fosse limitado e, por
consequência, a uma menor capacidade resistente da secção.

3.3.5 Módulo de elasticidade

O módulo de elasticidade a considerar para o aço é Es=200GPa.

3.4 Bibliografia

NP EN 1990 (2009) – Eurocódigo 0: Bases para o projeto de estruturas. Instituto


Português da Qualidade.

NP EN 1991-1-1 (2009) – Eurocódigo 1: Ações em Estruturas. Parte 1-1: Ações Gerais –


Pesos Volúmicos, pesos próprios, sobrecargas em edifícios. Instituto Português da
Qualidade.

NP EN 1992-1-1 (2010) – Eurocódigo 2: Projeto de estruturas de betão. Parte 1-1:


Regras gerais e regras para edifícios. Instituto Português da Qualidade.

NP EN206-1 (2007) – Betão Parte 1: Especificação, Desempenho, produção e


conformidade. Instituto Português da Qualidade.

Caracterização do Betão Endurecido Auto Compactável / Betão Convencional. Carla


Teixeira; Elisabete Barbosa; Maria José Teixeira; Paula Silva. Relatório Final da Disciplina
de Seminário. ISEP. Julho de 2005.

Hormigón Armado. Jiménez Montoya/García Meseguer/Morán Cabré. 14ª Edição. Gustavo


Gili, 2007.

Designers' Guide to EN1992-1-1 and EN1992-1-2. Narayanan, R. S.; Beeby, A. Thomas


Telford, 1995.

Instituto Superior de Engenharia do Porto 3.33

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