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Manual de instruções da casa de banho moderna

Uma pessoa só percebe até que ponto é provinciana quando entra numa casa de banho
moderna. Para aqueles, como eu, que estão habituados às casas de banho de snacks
manhosos, em que temos de suster a respiração até ficarmos roxos, usar o WC de um
restaurante da moda é uma experiência inesquecível.

Isto, claro, quando conseguimos entrar, pois às vezes encontram-se tão bem camuflados
que não damos com eles nem mesmo depois de termos recebido indicações detalhadas
de dois ou três empregados…

A segunda tarefa espinhosa passa por descobrir qual é a dos homens e qual a das
senhoras. Por vezes temos a sensação de que o design contemporâneo só existe para nos
confundir com hieróglifos esotéricos. Nesse caso, o melhor para tirar as dúvidas é entrar
e ver qual das casas de banho tem urinol: normalmente essa é a dos homens.

Aqui não há cerâmicas Valladares encardidas pelo uso nem bolas de naftalina no ralo.
Só sanitas tão bonitas que parecem jacuzzis. Costumam estar equipadas com um sistema
de auto-desinfecção e uma película protectora que permite que o traseiro de quem as usa
não entre em contacto com o do seu antecessor. Mas a substituição é tão complexa que a
maioria das pessoas prefere simplesmente não se apoiar na sanita.

Uma advertência: nestas casas de banho convém não demorar mais do que 30 segundos,
ou corremos o risco de ficar às escuras. Em geral, esbracejar de forma desenfreada,
como se estivéssemos a afogar-nos, acende a luz por mais 30 segundos.

Lavar as mãos também pode revelar-se uma tarefa complicada. Há várias hipóteses para
nos confundir (os inventores de torneiras ainda não se decidiram): o fluxo de água pode
ser accionado por um sensor de infra-vermelhos, um pedal ou um botão escondido na
bancada. Pouco importa, pois o resultado costuma ser o mesmo, ou seja, termos de lavar
as mãos à vez. Enquanto uma acciona o sensor, ou carrega no botão, a outra fica
debaixo de água e tenta lavar-se a si mesma.

Chegou pois a hora de secar as mãos. Já todos apanhámos desde secadores automáticos
que são verdadeiros grelhadores de mãos a outros que seguramente se inspiraram nos
túneis de vento usados para testar a aerodinâmica dos aviões. O meu modelo favorito
chama-se airblade (‘lâmina de ar’), mas não corta. O que merece a medalha para o mais
complicado, por sua vez, é um dispensador em que a toalha de papel só desce se
passarmos com a mão à frente de um sensor, num movimento semelhante ao que os
ilusionistas usam para fazer desaparecer qualquer coisa. Acontece que a magia nem
sempre resulta e não é raro termos de limpar as mãos às calças. Ao contrário das
tecnologias modernas, os bons velhos métodos nunca nos deixam ficar mal. L

Jornal Sol Nov. 13

Palavras: 474

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