Você está na página 1de 2

Pontifícia Universidade Católica do Paraná entram, como ideal, nessa atividade normativa que é a terapêutica.

As constantes
Escola de Educação e Humanidades fisiológicas são, portanto, normais no sentido estatístico, que é um sentido
Programa de Pós-Graduação em Filosofia descritivo, e no sentido terapêutico, que é um sentido normativo" (p. 77).
Seminário Patologia e Insurgência: o desvio a partir de Darwin, Freud e 6- "A atribuição de um valor `normal` às constantes cujo conteúdo é determinado
Canguilhem cientificamente pela fisiologia reflete a relação da ciência da vida com a atividade
04/09/19, 19h30, sala 1 pós, bloco 1, PUCPR normativa da vida e, no que se refere à ciência humana, com as técnicas biológicas
A precariedade da vida de produção e de instauração do normal, mais especificamente com a medicina.
Vinícius Armiliato Ocorre com a medicina o mesmo que com todas as técnicas. É uma atividade que
tem raízes no esforço espontâneo do ser vivo para dominar o meio e organizá-lo
CANGUILHEM, Georges. O normal e o patológico. 6. ed. Revisada. Rio de segundo seus valores de ser vivo. É nesse esforço espontâneo que a medicina
Janeiro: Forense Universitária, 2014. encontra seu sentido. [...] Eis por que, sem ser ela própria uma ciência, a medicina
1- "Definir a anormalidade a partir da inadaptação social é aceitar mais ou menos a utiliza os resultados de todas as ciências a serviço das normas da vida.
ideia de que o indivíduo deve aderir à maneira de ser de determinada sociedade, e, Portanto, existe medicina, em primeiro lugar, porque os homens se sentem doentes.
portanto, adaptar-se a ela como a uma realidade que seria, ao mesmo tempo, um É apenas em segundo lugar que os homens, pelo fato de existir uma medicina,
bem. [...] Se as sociedades são conjuntos mal unificados de meios, podemos negar- sabem em que consiste sua doença.
lhes o direito de definir a normalidade pela atitude de subordinação que elas [...] Não é, portanto, um método objetivo que qualifica como patológico um
valorizam com o nome de adaptação. No fundo, transportado para o terreno da determinado fenômeno biológico. É sempre a relação com o indivíduo doente, por
psicologia e da sociologia, esse conceito de adaptação volta à sua acepção original. intermédio da clínica, que justifica a qualificação de patológico. [...] É claro que a
É um conceito popular de descrição da atividade técnica. O homem adapta seus patologia pode ser metódica, crítica, armada de meios experimentais. Essa patologia
instrumentos e, indiretamente, seus órgãos e seu comportamento a determinada pode ser considerada objetiva, em relação ao médico que a pratica. Mas a intenção
matéria, a determinada situação" (p. 231) do patologista não faz com que seu objeto seja uma matéria desprovida de
2- "como um fato físico, e não como um fato biológico, como um fato constituído e subjetividade. Pode-se praticar objetivamente, isto é, imparcialmente, uma pesquisa
não como um fato a ser constituído. Ao passo que, se considerarmos a relação cujo objeto não pode ser concebido e construído sem referência a uma qualificação
organismo-meio como consequência de uma atividade verdadeiramente biológica, positiva e negativa; cujo objeto, portanto, não é tanto um fato mas, sobretudo, um
como a procura de uma situação na qual o ser vivo, em vez de sofrer influências, valor" (p. 166-7).
recolhe as influências e as qualidades que correspondem a suas exigências, então os 7- "Se existisse uma finalidade perfeita, consumada, um sistema completo de
meios nos quais os seres vivos estão colocados estão delimitados por eles, centrados relações de conveniência orgânica, o próprio conceito de finalidade não teria
neles. Nesse sentido, o organismo não está jogando em um meio ao qual ele tem de nenhum sentido como conceito, como projeto e modelo para pensar a vida, pela
se dobrar, mas, ao contrário, ele estrutura seu meio ao mesmo tempo que desenvolve simples razão de que não haveria motivo para pensar nem razão para o pensamento,
suas capacidades de organismo" (p. 231) não havendo nenhuma defasagem entre a organização possível e a organização real.
3- "A vida, só se eleva à consciência de si mesma pela inadaptação, pelo fracasso e O pensamento da finalidade exprime a limitação de finalidade da vida. Se esse
pela dor" (p. 149). conceito tem um sentido, é porque ele é o conceito de um sentido, o conceito de uma
4- "é o pathos que condiciona o logos porque é ele que o chama". p. 149) organização possível, e, portanto, não garantida" (p. 229)
5- "[...] compreende-se perfeitamente que os médicos se desinteressem de um
conceito que lhes parece excessivamente vulgar ou excessivamente metafísico [o CANGUILHEM, Georges. Sobre a história das ciências biológicas depois de
conceito de normal]. O que lhes interessa é diagnosticar e curar. Teoricamente, curar Darwin. In: _______. Ideologia e Racionalidade nas Ciências da Vida. Lisboa:
é fazer voltar à norma uma função ou um organismo que dela se tinham afastado. O Edições 70, 1977.
médico geralmente tira a norma de seu conhecimento da fisiologia, dita ciência do 8- "[...] para que se tornasse concebível a ideia de uma transmutação das espécies,
homem normal, de sua experiência vivida das funções orgânicas, e da representação através de uma adaptação aleatória às coações do meio, a partir das diferenças
comum da norma em um meio social em dado momento. [...] A fisiologia moderna individuais na reprodução dos organismos, era necessário destruir a ideia de uma
se apresenta como uma antologia canônica de constantes funcionais em relação com adaptação pré-ordenada, para cada espécie de criaturas, entre a sua estrutura e o seu
funções de regulação hormonais e nervosas. Essas constantes são classificadas como modo de vida" (CANGUILHEM, 1977, p. 92)
normais enquanto designam características médias e mais frequentes de casos
praticamente observáveis. Mas são também classificadas como normais porque
CANGUILHEM, Georges. Libres propos, Du temps – notes militaires. In: _______. CORNU, Laurence. Le parti pris humain. In: FERTÉ, Louise; JACQUARD, Aurore;
Oeuvres Complètes. Vol I - Écrits philosophiques et politiques (1926-1939). Paris: VERMEREN, Patrice. La formation de Georges Canguilhem: Un entre-deux-
Libraire Philosophique J. Vrin, 2011. guerres philosophique. Paris: Hermann, 2013
9- "De sorte que, tout en étant prévu afin d’aller vite, tout finit par se faire selon 14- « le concept central de ‘normativité’ précisément élaboré dans la même période
l’imprévu, pour cette raison précisément qu’il faut aller vite" (pp. 202-203). déplace cette question de la morale idéaliste vers le champ de la vie." (p. 111)

CANGUILHEM, Georges. Traité de logique et morale. In: _______. Oeuvres JACQUARD, Aurore. Comment la mort nous fait-elle penser? Précarité du vivant et
Complètes. Vol I - Écrits philosophiques et politiques (1926-1939). Paris: Libraire reconfiguration des conditions de l'expérience possible. In: FERTÉ, Louise;
Philosophique J. Vrin, 2011. JACQUARD, Aurore; VERMEREN, Patrice. La formation de Georges
10- « devenir ce que nous ne sommes pas » (racionais, conscientes e livres). Canguilhem: Un entre-deux-guerres philosophique. Paris: Hermann, 2013.
Embrião da ideia de normatividade : « sauvegarder le mieux possible en autrui et en 15- "L'état normal n'est pas conçu objectivement et positivement par Canguilhem
soi, cette puissance de choix et d’invention de fins qu’on nomme volonté […] comme un certain nombre de lois physico-chimiques que la médecine comme
[avoir] plutôt une conception d’une vie à faire que d’une vie toute faite » (p. 837) technique devrait viser: l'état normal est l'état qui est "pris pour norme" par un
individu vivant. C'est donc à partir de la maladie, c'est-à-dire de l'expérience de la
FOUCAULT, Michel. O nascimento da clínica. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense précarité de son existence, que l'individu peut prendre pour norme l'état dans lequel
Universitária, 2013. sa vie est maintenue et se développe" (JACQUARD, p. 235).
11- "Nem todos os poderes de um espaço visionário por meio do qual se 16- "c'est bien dans sa précarité que le vivant trouve une puissance plastique, une
comunicavam médicos e doentes, fisiólogos e práticos [...] desapareceram; foram puissance créatrice de formes que Canguilhem désigne sous le terme de 'labilité' [...]
antes deslocados e como que encerrados na singularidade do doente, na região dos comme le souligne Guillaume Leblanc: 'La labilité désigne [alors] le moment
'sintomas subjetivos' que define para o médico não mais o modo de conhecimento, originaire où la vie se désolidarise de sa forme dominante, ce par quoi la vie est
mas o mundo dos objetos a conhecer. [...] a presença da doença no corpo, suas toujours en déphasage par rapport à elle-même'. La labilité est ce par quoi le vivant
tensões, suas queimaduras, o mundo surdo das entranhas, todo o avesso negro do s'individualise ouvrant par là d'autres possibilités de la vie à l'espèce" (JACQUARD,
corpo, que longos sonhos sem olhos recobrem, são tão contestados em sua 236).
objetividade pelo discurso redutor do médico quanto fundados como objetos para
seu olhar positivo" (FOUCAULT, 2013, p. IX).

MENSAGEM DE WHATSAPP
12- "Cara, tava aqui pensando que é muito difícil entender racionalmente esse troço
de normatividade do indivíduo, eu acho que sem análise eu não entenderia. Acho
que só depois que a gente entende na carne a tal de castração, é que começa a rolar
um entendimento, depois de perceber que o mundo maravilhoso, que a gente teima
em querer, não existe e a gente tem que se virar com o que tem" (DELGATTI;
GREENWALD, 2019. Grifo nosso)

Y. DUROUX. Inactuel Marx. Remarques sur le noed politique. Critique, n. 601-


602, juin-juillet, 1997.
13- "Très schématiquement, Canguilhem a cherché à penser la spécificité du rapport
entre trois termes: le vivant, la médecine, la science du vivant. Il a discerné dans le
concept de norme (conçu comme normativité et non pas comme normalité) le point
à partir duquel on pouvait déplacer les équations classiques du grand positivisme
(science et technique, ordre et progrès) pour faire droit à l’imprévisible et à la
décision". (p. 533).

Você também pode gostar