Agravo de Instrumento nº 0060502-75.2015.8.19.0000
Agravante: Ricardo Salomão Agravado: Marcos Ferreira de Souza Relator: Des. Elton M. C. Leme
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE
REINTEGRAÇÃO DE POSSE. COMODATO VERBAL. COMPROVAÇÃO. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL PARA DESOCUPAÇÃO REALIZADA. ESBULHO CARACTERIZADO. PRESENÇA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR. RECURSO PROVIDO. 1. Interposição de recurso contra decisão singular que indeferiu o pedido liminar de reintegração de posse de imóvel, ao fundamento de ausência de prova do alegado esbulho, entendendo necessária a observância à ampla defesa e ao contraditório. 2. Nos termos do art. 927 do CPC, o deferimento da liminar de reintegração de posse dependerá apenas da comprovação, pelo autor, da posse e do esbulho praticado, sua data, e a perda da posse, presumindo o legislador nestes casos a urgência. 3. É entendimento assente na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que no caso de imóvel dado em comodato, mediante contrato verbal, em que não há, obviamente, prazo assinalado, a reintegração liminar pode ser empreendida mediante a prova da notificação do comodatário, não sendo necessário demonstrar a necessidade de retomada do bem. 4. No caso concreto, estão presentes os requisitos autorizadores da liminar, porquanto restaram
ELTON MARTINEZ CARVALHO LEME:000015384 Assinado em 15/12/2015 21:16:10
Local: GAB. DES ELTON MARTINEZ CARVALHO LEME 32
comprovadas a propriedade do imóvel pelo agravante, a
posse anterior, a existência do comodato verbal e a realização da notificação extrajudicial, bem como o esbulho, consubstanciado na permanência no imóvel após o transcurso do prazo contido na notificação. 5. Recurso provido, com aplicação do art. 557,§ 1º-A, do CPC.
DECISÃO
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra
decisão proferida pelo Juízo da 35ª Vara Cível da Comarca da Capital que, em ação de reintegração de posse, indeferiu, por ora, o pedido liminar de reintegração de posse do imóvel, ao fundamento de ausência de prova do alegado esbulho e por não estarem presentes os requisitos para, em juízo de cognição sumária, antecipar-se o provimento de reintegração de posse. Entendeu pela necessidade de observância dos princípios do contraditório e ampla defesa.
Em suas razões, sustenta o agravante, em resumo, que em
janeiro de 2008, estando o agravado em vias de ser despejado de imóvel que ocupava e por ser seu cunhado, irmão da esposa do agravante, este consentiu que o agravado passasse a residir, temporariamente, em regime de comodato (art. 579, do Código Civil), no imóvel mencionado na peça recursal, o qual se encontrava inteiramente mobiliado, inclusive com eletrodomésticos, além de recentemente pintado. Afirma que, em 06/08/2015, por não ter mais interesse em manter o comodato, o agravante notificou o agravado, para que, no prazo de 60 dias, desocupasse o imóvel e restituísse a posse, sob pena de incidência de aluguel no valor de R$ 4.000,00. Menciona que o agravado recebeu, formalmente, tal notificação, 33
em 11/08/2015. Contudo, em 10/10/2015 o agravado não desocupou o
imóvel. Ressalta que o agravado não efetuou a contranotificação. Acrescenta que permanecendo no imóvel sem realizar os pagamentos o agravado comete esbulho possessório, causando prejuízos ao agravante. Dessa forma, requer a reforma da decisão para deferir o pedido liminar de reintegração na posse do imóvel.
A fls. 13-14 consta documento acostados pelo agravante.
Decisão a fls. 15 recebeu o agravo na modalidade de
instrumento, solicitou as informações ao juízo singular e determinou a intimação da parte agravada, nos termos do art. 527, V, do CPC.
Informações prestadas pelo juízo a quo a fls. 19.
Manifestação do agravante a fls. 20-21.
Manifestação do agravante a fls. 26 juntando
substabelecimento sem reservas a fls. 27.
Aviso de recebimento positivo juntado a fls. 29.
É o relatório. Passo a decidir.
Trata-se, na origem, de ação de reintegração de posse,
tendo sido formulada a pretensão pelo proprietário que cedeu a ocupação de seu imóvel em comodato verbal, por prazo indeterminado, desde 2008, aduzindo ter notificado o comodatário para desocupação, por não ter mais interesse no comodato, e que este se negou a desocupar o imóvel. 34
Inicialmente, para melhor elucidação, transcreve-se a parte
final da decisão impugnada: “(...) 5) INDEFIRO por ora a liminar. Ausência de prova do alegado esbulho. Verifico não estarem presentes os requisitos para, em juízo de cognição sumária, antecipar-se o provimento de reintegração de posse. Necessidade de observância dos princípios do contraditório e ampla defesa 6) Cite-se. Intime(m)-se.”
A ação de reintegração de posse é o remédio processual
hábil à restituição da posse àquele que a tenha perdido em razão de esbulho, sendo privado do poder físico sobre a coisa.
O art. 924 do CPC prevê os procedimentos possessórios a
serem utilizados para a tutela do direito à posse, dependendo apenas da verificação, no caso concreto, se a ação foi proposta dentro do ano e dia do esbulho ou posteriormente a este prazo. É oportuno acrescentar que a contagem do prazo de ano e dia inicia a partir da agressão à posse, ou seja, a partir do efetivo esbulho.
Assim sendo, enquanto não passado ano e dia do esbulho
praticado, a tutela possessória será postulada por meio do procedimento especial estabelecido a partir do artigo 926 do Código de Processo Civil, cujo deferimento da liminar de reintegração de posse dependerá apenas da comprovação, pelo autor, da posse e esbulho praticado, sua data, e a perda da posse (art. 927 do CPC), presumindo o legislador a urgência, nestes casos.
No caso em exame, a narrativa dos fatos da causa indica
que a ocupação do imóvel iniciou-se em janeiro de 2008, por comodato 35
verbal, conforme pode ser inferido pela comunicação havida entre as
partes litigantes, tendo sido o comodatário notificado para desocupação em 11/08/2015, portanto, há menos de ano e dia.
Observa-se que, no caso em análise, estão presentes os
requisitos autorizadores da liminar, porquanto restaram comprovadas a propriedade do imóvel pelo agravante, a posse anterior, a existência do comodato verbal e a realização da notificação extrajudicial. As alegações formuladas são verossímeis e denotam a probabilidade do direito do agravante, notadamente porque os documentos acostados a fls. 14 e fls. 21-25 comprovam a existência de comodato verbal entre as partes.
Com efeito, o agravante juntou aos presentes autos cópia
da autorização para cancelamento da propriedade fiduciária fornecida pela Caixa Econômica Federal, datada de 09/01/2009 (fls. 12 do Anexo 1), onde o agravante figurava como fiduciante com a respectiva anotação efetuada pelo cartório de imóveis, em 30/03/2009, conforme certidão a fls. 13 do Anexo 1 e guia de IPTU do ano de 2015 em seu nome (fls.16-18 do Anexo 1), demonstrada, portanto, a titularidade do imóvel pelo agravante, bem como a posse anterior.
O agravante efetuou a notificação extrajudicial do
agravado (fls. 14 do anexo 1) comunicando a extinção do comodato verbal entre as partes que vige por prazo indeterminado, com desocupação no prazo máximo de 60 dias, contados a partir do recebimento da notificação, solicitando a devolução das chaves, com todo o mobiliário que nele havia e no mesmo estado de conservação. Notificou ainda que, nos termos do art. 582 do Código Civil, a não desocupação do imóvel no prazo estipulado implicará na responsabilidade do ocupante pelo 36
pagamento do aluguel mensal arbitrado em R$ 4.000,00, além das taxas
incidentes sobre o imóvel (taxa condominial, de incêndio e IPTU).
A certidão do cartório extrajudicial a fls. 15 do Anexo 1
comprova ainda que a notificação foi entregue ao agravado em 11/08/2015. Assim, ficou demonstrado que o agravado não desocupou o imóvel, embora transcorrido o prazo concedido na notificação, e tampouco procedeu à contra notificação.
Sob essa perspectiva, uma vez evidenciado o
descumprimento pelo agravado dos termos contidos na notificação extrajudicial para desocupação do imóvel e tendo em conta que o início de prova colhido demonstra de forma inequívoca todos os requisitos do art. 927 do CPC, justifica-se a imediata reintegração na posse do imóvel, cuja posse atualmente é exercida pelo agravado por força do comodato verbal firmado entre as partes.
Ressalte-se que, à luz do art. 581 do Código Civil, na
ausência de prazo convencional, como na hipótese em exame, deve ser assegurado o prazo necessário ao uso concedido, o que se concretizou, posto que o comodatário, irmão da esposa do agravante, ocupa o imóvel desde 2008, não tendo mais o comodante interesse em manter o comodato verbal.
Assim, caracterizado o esbulho pela permanência do
comodatário no imóvel após o fim do prazo estabelecido na notificação extrajudicial, conforme fls. 14-15 do Anexo 1, impõe-se o deferimento da liminar, já que presentes os requisitos autorizadores para tanto. 37
Nesse sentido, vale trazer os seguintes julgados deste
Tribunal:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE
REINTEGRAÇÃO DE POSSE. COMODATO VERBAL. NOTIFICAÇÃO. DESOCUPAÇÃO. ESBULHO. LIMINAR. DEFERIMENTO. Cuida-se de ação de reintegração de posse ajuizada pela Agravante, com pedido liminar, alegando ser proprietária do imóvel cedido ao Agravado em comodato verbal. Agravante não tem mais interesse em manter o comodato, por isso requereu a desocupação do imóvel pelo réu, notificando-o. Agravado sustenta de que a compra do imóvel foi realizada com investimento financeiro seu e de sua falecida esposa (irmã da Agravante). Simulação. Venire contra factum proprium. Título de propriedade lavrado exclusivamente em nome da Agravante. Presunção absoluta de que é a proprietária do imóvel. É inegável a posse anterior da Agravante, que se funda em justo título e resta comprovada pelo fato de ela por vontade própria ter transferido a posse direta do imóvel ao Agravado através do comodato verbal. Esbulho está caracterizado pela notificação para desocupação. Precedentes desta Corte. PROVIMENTO DO RECURSO. (0026387- 28.2015.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO - DES. TERESA ANDRADE - Julgamento: 11/11/2015 - SEXTA CÂMARA CÍVEL). 38
Agravo Interno no Agravo de Instrumento. Possessória.
Ação de reintegração de posse. Ex-companheira do falecido genitor dos autores que ocupa o imóvel a título de comodato verbal. Decisão que indefere o pleito liminar. Inconformismo dos herdeiros. 1 ¿ Nos termos dos artigos 926 e 927 do Código de Processo Civil, o possuidor tem direito a ser reintegrado na posse no caso de esbulho, incumbindo-lhe, contudo, demonstrar a posse e a sua perda bem como o esbulho praticado pelo réu e a data do despojo. 2 ¿ Prova documental formada que possui força suficiente para a concessão da liminar pleiteada, demonstrando com clareza a ocorrência do esbulho possessório. 3 ¿ Direito real de habitação da companheira afastado por decisão já transitada em julgado. 4 ¿ Alegação de usucapião não apreciada pela instância inferior que impede a análise do tema neste recurso. 5 ¿ Recurso monocraticamente provido para deferir a medida liminar de reintegração de posse. 6 ¿ Decisão monocrática que se mantém por seus próprios fundamentos. 7 Agravo desprovido. (0021670- 70.2015.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO - DES. EDUARDO GUSMAO ALVES DE BRITO - Julgamento: 07/07/2015 - DÉCIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL).
Agravo de Instrumento. Ação de Procedimento Comum
Ordinário, por meio da qual pretendeu a autora a reintegração na posse do imóvel de sua propriedade. 39
Decisão que deferiu a medida liminar. Inconformismo do
réu. Comodato verbal. O deferimento de liminar em ação de reintegração de posse tem como requisitos a observância do que estabelece o artigo 927 do Código de Processo Civil, ou seja, a posse anterior, o esbulho praticado e a data de sua ocorrência. Transcorrido o prazo de 30 (trinta) dias, previsto na notificação extrajudicial, sem que o imóvel fosse desocupado pelo agravante, resta configurado o esbulho. Ato judicial que não é teratológico nem contrário à lei ou à evidente prova dos autos. Aplicação da Súmula 58 deste Tribunal. Recurso a que se nega seguimento, nos termos do caput do artigo 557 do Código de Processo Civil. (0051906- 05.2015.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO - DES. GEORGIA DE CARVALHO LIMA - Julgamento: 30/09/2015 - VIGÉSIMA CÂMARA CÍVEL).
É entendimento assente na jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça no sentido de que, dado em comodato o imóvel, mediante contrato verbal, onde, evidentemente, não há prazo assinalado, basta à desocupação a notificação ao comodatário da pretensão do comodante, não se lhe exigindo prova de necessidade imprevista e urgente do bem.
A propósito, os seguintes precedentes:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. COMODATO/CESSÃO. 40
PEDIDO DE DESOCUPAÇÃO. AUSÊNCIA DE PRAZO.
IMPOSSIBILIDADE DE ETERNIZAÇÃO DO COMODATO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. I. "Dado em comodato o imóvel, mediante contrato verbal, onde, evidentemente, não há prazo assinalado, bastante à desocupação a notificação ao comodatário da pretensão do comodante, não se lhe exigindo prova de necessidade imprevista e urgente do bem." (REsp 605.137/PR, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 18/05/2004, DJ 23/08/2004, p. 251) 2. Aplicação da regra do art. 581 do Código Civil. 3. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (AgRg no REsp 1424390/PB, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/02/2015, DJe 24/02/2015)
CIVIL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE.
COMODATO VERBAL. PEDIDO DE DESOCUPAÇÃO. NOTIFICAÇÃO. SUFICIÊNCIA. CC ANTERIOR, ART. 1.250. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL COMPROVADO. PROCEDÊNCIA. I. Dado em comodato o imóvel, mediante contrato verbal, onde, evidentemente, não há prazo assinalado, bastante à desocupação a notificação ao comodatário da pretensão do comodante, não se lhe exigindo prova de necessidade imprevista e urgente do bem. II. Pedido de perdas e danos indeferido. III. Precedentes do STJ. IV. Recurso especial conhecido e parcialmente provido. Ação de reintegração de posse julgada procedente em parte. (REsp 605.137/PR, 41
Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA
TURMA, julgado em 18/05/2004, DJ 23/08/2004, p. 251)
Por tais fundamentos, dou provimento ao recurso, com
aplicação do art. 557, § 1º-A, do CPC, para deferir a medida liminar de reintegração do agravante na posse do imóvel objeto da lide, expedindo-se o competente mandado.
O Direito Privado e o Novo Código de Processo Civil - Repercussões, Diálogos e Tendências (2018) - Felipe Peixoto Braga Netto, Michael César Silva e Vinícius Lott Thibau