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ÍNDICE DO CAPÍTULO 5

LISTA DE FIGURAS ......................................................................................................................5.2

LISTA DE QUADROS ....................................................................................................................5.3

5 RADIAÇÃO SOLAR ..............................................................................................................5.4

5.1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................................................... 5.4

5.2 RADIAÇÃO SOLAR NO TOPO DA ATMOSFERA ............................................................................ 5.4

5.3 INTERAÇÃO COM A ATMOSFERA E A SUPERFÍCIE DO GLOBO .......................................... 5.13

5.4 RELAÇÕES EMPÍRICAS LOCAIS E BALANÇO MÉDIO GLOBAL........................................... 5.27

EXERCÍCIOS ........................................................................................................................................................ 5.30

BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................................................... 5.31


Radiação Solar

Lista de Figuras
Figura 5.1 – Espetros da irradiância de dois corpos negros a temperaturas iguais à do Sol (5735 K)
e à da Terra (15 ºC) ............................................................................................................................ 5.6
Figura 5.2 – Triângulo esférico.......................................................................................................... 5.7
Figura 5.3 – Ilustração dos fatores de variação da radiação solar recebida no topo da atmosfera ... 5.8
Figura 5.4 – Insolação astronómica .................................................................................................5.11
Figura 5.5 – Efeito da distância zenital nas áreas das secções transversais ao tubo de fluxo de
energia solar ......................................................................................................................................5.11
Figura 5.6 – Energia solar incidente por dia na unidade de área de um plano horizontal no topo da
atmosfera (MJ m-2 d-1) ......................................................................................................................5.12
Figura 5.7 – Ilustração da propagação de um feixe de energia radiante na atmosfera ...................5.15
Figura 5.8 – Transmissividades de Houghton .................................................................................5.17
Figura 5.9 – Radiação solar direta recebida por unidade de área de um plano horizontal à superfície
do Globo e por dia (MJ m-2 d-1)........................................................................................................5.19
Figura 5.10 – Ilustração da definição da posição de um plano inclinado .......................................5.20
Figura 5.11 – Influências do dia do ano e da orientação do plano inclinado na energia da radiação
solar direta recebida à superfície do Globo ......................................................................................5.22
Figura 5.12 – Ilustração da disposição da radiação global de pequeno comprimento de onda ......5.23
Figura 5.13 – Radiação global diária de pequeno comprimento de onda na Herdade do Outeiro,
Ferreira do Alentejo (http://www.cotr.pt) ........................................................................................5.24
Figura 5.14 – Ilustração da disposição da radiação de grande comprimento de onda ....................5.27
Figura 5.15 – Piranómetro Hukseflux Thermal Sensors, SR11 .............................................................

5.2
Radiação Solar

Lista de Quadros
Quadro 5.1 – Cor e comprimento de onda .........................................................................................5.6
Quadro 5.2 – Cálculo da radiação difusa à superfície do Globo.....................................................5.18
Quadro 5.3 – Albedo de superfícies naturais para radiação de pequeno comprimento de onda
(Eagleson, 1970) ..............................................................................................................................5.25
Quadro 5.4 – Valores de a e de b para a determinação da radiação global diária em Lisboa
(Peixoto, 1981) .................................................................................................................................5.28
I'g
Quadro 5.5 – Coeficientes da equação  a  b rH de Angstrom (Quintela, 1986) ..................5.29
I0
Quadro 5.6 – Distribuição dos valores médios anuais da radiação solar ........................................5.29

5.3
Radiação Solar

5 RADIAÇÃO SOLAR
5.1 INTRODUÇÃO

A energia disponível na Terra provém direta ou indiretamente do Sol na sua quase


totalidade. Com efeito, as outras fontes de energia que atuam de modo contínuo, como por exemplo
o calor do núcleo terrestre, a radiação proveniente da Lua, a radiação cósmica e a das outras
estrelas, não atingem sequer 0,1 por cento da radiação que nos chega do Sol. Um tremor de terra
forte não envolve mais do que cerca de 1 por cento da energia que a Terra recebe do Sol num dia.
Pode assim dizer-se que o Sol é o principal motor das circulações atmosférica e oceânica, das
condições meteorológicas, da evaporação da água e, por conseguinte, do ciclo hidrológico.

Neste capítulo descrevem-se as características da radiação solar, a sua distribuição no topo


da atmosfera e a sua interação com a atmosfera e a superfície do Globo.

5.2 RADIAÇÃO SOLAR NO TOPO DA ATMOSFERA

Designa-se por corpo negro todo o corpo que absorva totalmente a energia radiante de
qualquer comprimento de onda que sobre ele incida e que, portanto, não a reflita nem a transmita.
Designa-se por corpo branco, no outro extremo, todo o corpo que não absorva a energia de qualquer
comprimento de onda que sobre ele incida.

Designa-se por absorvidade, aλ, o inverso da relação entre a energia radiante de determinado
comprimento de onda (λ) que incide sobre um corpo e a que é por ele absorvida. Qualquer que seja
o comprimento de onda, para um corpo negro aλ será igual a 1 e para um corpo branco será igual a
0. Designa-se por corpo cinzento um corpo cuja absorvidade seja igual para todos os comprimentos
de onda e tenha, obviamente, um valor entre 0 e 1. Um corpo real pode comportar-se como um
corpo negro para determinados comprimentos de onda, como um corpo branco para outros
comprimentos de onda e, ainda, como um corpo cinzento para outros comprimentos de onda. Nessas
condições diz-se que o corpo é um absorvente seletivo.

Designa-se por constante solar, E0 (W m-2), a quantidade de energia de origem solar que
atravessa na unidade de tempo a unidade de área de um plano perpendicular à direção de
propagação dessa energia e colocado a uma distância do Sol igual à distância média que o separa da
Terra. O seu valor é de cerca de 1353 W m-2, e a primeira determinação experimental foi tentada
por Langley em 1881.

Designa-se por irradiância de um corpo, E (W m-2), a quantidade de energia radiante emitida


por esse corpo por unidade de área da sua superfície e por unidade de tempo.

De acordo com a lei de Stefan (1879) e de Boltzmann (1894) a irradiância de um corpo


negro, EB, é definida por

EB   T4 (5.1)

onde
T representa a temperatura do corpo (K), e

5.4
Radiação Solar

ζ, a constante de Stefan-Boltzmann (5,670  10-8 W m-2 K-4).

Sabendo-se que o Sol se comporta como um corpo negro esférico com um raio (r S) de
aproximadamente 0,7 milhões de quilómetros, que a sua distância média da Terra (d0) é de cerca de
150 milhões de quilómetros e determinada a constante solar, pode calcular-se a irradiância do Sol
(EBS) e a sua temperatura (T S). Será

d2
E BS  E0 20  62,1 MW m 2
rs

1/ 4
E 
TS   BS   5735 K
  

Designa-se por irradiância monocromática, Eλ (W m-3), a densidade de irradiância de um


corpo em determinado comprimento de onda. Será então

dE
E 
d


E   E  d
0

O espetro da irradiância de um corpo negro pode ser calculado com base na lei de Planck
(1900):

2  h c2 5
E B  c h 1 (5.2)

e k  T 1

onde
h representa a constante de Planck (6,626  10-34 J s),
c, a velocidade de propagação da luz (2,998  108 m s-1),
k, a constante de Boltzmann (1,381  10-23 J K-1),
λ, o comprimento de onda da radiação (m), e
T, a temperatura absoluta do corpo negro (K).

Calculando os produtos das constantes obtém-se

c1 5
E B  c2
T
e 1

com
c1 = 3,742  10-16 W m2 e
c2 = 0,0144 m K.

5.5
Radiação Solar

Figura 5.1 – Espetros da irradiância de dois corpos negros a temperaturas iguais à do Sol (5735 K)
e à da Terra (15 ºC)

Na Figura 5.1 apresenta-se um gráfico dos espetros da irradiância de dois corpos negros às
temperaturas de 5735 K e 15 C, que são a do Sol (na fotoesfera) e a da Terra (em média). Nela se
apresentam também as bandas que correspondem às radiações ultravioleta, de luz visível e
infravermelha. Como se referiu, o Sol comporta-se como um corpo negro e, portanto, a sua
irradiância seguirá o espetro que na figura é identificado com a sua temperatura. A Terra comporta-
se aproximadamente como um corpo cinzento e, de acordo com a lei de Kirchoff que se referirá na
secção seguinte do texto, o seu espetro corresponderá a irradiâncias monocromáticas inferiores às
que na figura se identificam com a sua temperatura. Dadas as diferentes bandas de irradiância dos
dois corpos, é usual designar por radiação de pequeno comprimento de onda aquela que tem origem
solar (λ < 4 μm) e por radiação de grande comprimento de onda aquela que tem origem terrestre (λ
 4 μm).

Quadro 5.1 – Cor e comprimento de onda

Cor Comprimento de onda


(nm)
Violeta 400 a 435
Azul 435 a 490
Verde 490 a 570
Amarelo 570 a 595
Laranja 595 a 605
Vermelho 605 a 800

O comprimento de onda (λm) que corresponde ao máximo de irradiância monocromática de


um corpo negro pode ser calculado pela lei de Wien (1893):

m T  2,898  103 m K (5.3)

Para o Sol, a lei de Wien e a Figura 5.1 indicam que o comprimento de onda que
corresponde ao máximo de irradiância é 0,5 μm, bem perto portanto do limite entre as bandas verde

5.6
Radiação Solar

e azul do espetro de luz visível (Quadro 5.1). Este fato faz com que a grandes altitudes o Sol pareça
emitir uma luz de cor branca ligeiramente esverdeada e azulada (ciano).

Figura 5.2 – Triângulo esférico

Convém relembrar, antes de se prosseguir o estudo da radiação solar no topo da atmosfera,


alguns dos conceitos e leis da trigonometria esférica.

Assim, considerem-se três arcos de círculo máximo de uma esfera com pontos comuns em A,
B e C (Figura 5.2). Os ângulos ao centro (ponto O) dos arcos AB, BC e CA são representados
respetivamente por c, a e b. Definam-se os ângulos entre os arcos, α, β e γ, como sendo os ângulos
entre as tangentes aos arcos no ponto comum, ou seja, entre os planos que passam no centro da
esfera e cuja intersecção com a sua superfície define os respetivos arcos.

Designa-se por triângulo esférico a figura composta à superfície da esfera, com vértices em
A, B e C. Designam-se por lados do triângulo os arcos a, b e c, e por ângulos do triângulo os
ângulos α, β e γ.

Podem então demonstrar-se as seguintes leis, para cuja aplicação é apenas necessário manter
a ordem circular das grandezas intervenientes (ângulos e lados ordenados no sentido contrário ao
dos ponteiros dos relógios, com o lado a oposto ao ângulo α), que deviam ser bem conhecidas pelos
navegadores:

– Lei dos senos:

sen a sen b sen c


  (5.4)
sen  sen  sen 

– Lei dos cossenos para os lados:

cos a  cos b cos c  sen b sen c cos  (5.5)

– Lei dos cossenos para os ângulos:

cos    cos  cos   sen  sen  cos a (5.6)

– Lei de Napier:

5.7
Radiação Solar

  ab
sen tg
2  2 (5.7)
 c
sen tg
2 2

A radiação solar recebida no topo da atmosfera varia, em determinado lugar, de instante


para instante, em função dos movimentos de que a Terra está animada e, em determinado instante,
de lugar para lugar, em função da latitude (Figura 5.3).

Figura 5.3 – Ilustração dos fatores de variação da radiação solar recebida no topo da atmosfera

A órbita do sistema formado pela Terra e pela Lua é aproximadamente elítica com uma
ligeira excentricidade, definida por

d max  d 0 d 0  d min
  0,016 733
d0 d0

onde
d0 representa a distância média entre o Sol e a Terra (149,597 87  109 m),
dmax, a distância máxima, e
dmin, a distância mínima.

A Terra encontra-se à distância mínima do Sol (periélio, ponto A da Figura 5.3) cerca de 2
de janeiro (em 1992, às 15h do dia 3 de janeiro), e à distância máxima do Sol (afélio, ponto D)
cerca de 2 de julho (em 1992, às 13 h do dia 3 de julho), ou seja, 182 dias depois do início do ano.
Assim, considerando aproximadamente constante a velocidade angular de translação e um ano de
365 dias (o valor do período da translação da Terra, de equinócio a equinócio, é de 365,242 2 d),
pode estimar-se a distância do Sol à Terra pela seguinte expressão:

  2
d  d 0 1  0,017 cos  182  D  (5.8)
  365 

onde
d representa a distância do Sol à Terra num determinado dia, e
D, o número de dias desde o início do ano até esse dia.

5.8
Radiação Solar

Como se sabe, o ângulo que o eixo de rotação da Terra faz com o plano da órbita é de cerca
de 23 26' (23 26' 25" em 1992) e varia com o movimento de precessão. Este movimento cónico do
eixo tem um período muito grande, cerca de 25 800 anos, e, dada a escala de tempo que no âmbito
dos estudos hidrológicos se considera, é em geral desprezado.

Designa-se por declinação solar, δ, o ângulo que a direção dos raios solares faz com o plano
equatorial terrestre (Figura 5.3, b)). A declinação solar varia ao longo do ano em virtude da
inclinação do eixo da Terra. Assim, no equinócio vernal ou equinócio da primavera (ponto B,
Figura 5.3, a)) que ocorre cerca de 21 de março, a declinação é de 0, o Sol encontra-se no plano
equatorial e os dias são iguais às noites. No solstício do verão do hemisfério norte (ponto C) que
ocorre cerca de 21 de junho, 172 dias depois do início do ano, com a Terra perto do afélio, a
declinação é de 23 26', o Sol encontra-se acima do plano equatorial e os dias são maiores do que as
noites. No equinócio do outono (ponto E) que ocorre cerca de 23 de setembro, a declinação volta a
ser de 0, com o sol no plano equatorial e os dias iguais às noites. Finalmente, no solstício do
inverno do hemisfério norte (ponto F) que ocorre cerca de 22 de dezembro, com a Terra perto do
periélio, a declinação é de –23 26', com o Sol abaixo do plano equatorial e os dias menores do que
as noites.

Com as hipóteses já adotadas para o cálculo da distância do Sol à Terra, pode estimar-se a
declinação solar por

23,44   2
 cos  172  D (5.9)
180  365 

onde
δ representa a declinação solar (rad) num determinado dia, e
D, o número de dias desde o início do ano até esse dia.

Designa-se por ângulo horário do Sol em determinado lugar, ε, o ângulo que o plano do
meridiano do lugar (NL, Figura 5.3, b))faz com o plano do meridiano que contém o Sol (NP). O
ângulo horário é negativo desde o nascer do Sol até ao meio-dia solar, que ocorre quando o centro
do Sol passa no plano do meridiano do lugar1. O ângulo horário é zero ao meio-dia solar. Depois do
meio-dia solar, o ângulo horário é positivo.

O ângulo horário pode ser calculado por

  
  (HL  t )  12  L  (5.10)
  

onde
HL  TUC  t representa o hora legal do local (h),
TUC, o tempo universal coordenado (h),
t, a diferença entre a hora legal do local e o tempo universal (h),
 L , a longitude do lugar, positiva para E (rad), e
  2 / 24 , a velocidade angular de rotação da Terra (rad).

1
Convém relembrar, a propósito, que em Portugal a hora legal é igual ao tempo universal coordenado (UTC) desde a 1 h UTC
do último domingo de outubro até à 1 h UTC do último domingo de março seguinte, instante em que avança 1 h. Assim,
durante o inverno em Lisboa (longitude 9,2 W), o Sol estará a pino cerca das 12,6 h legais e, no verão, cerca das 13,6 h legais.

5.9
Radiação Solar

Designa-se por distância zenital do Sol em determinado lugar, δ, o ângulo que a direção dos
raios solares faz num determinado instante com a perpendicular à superfície da Terra nesse lugar. A
distância zenital é positiva quando o centro do Sol se encontra acima do plano tangente à superfície
no lugar, ou seja, quando o centro do Sol se encontra acima do plano horizontal do lugar.

Na Figura 5.3, b) representa-se o polo norte por N, o lugar por L, o ponto onde os raios
solares são perpendiculares à superfície da Terra por P, a latitude do lugar por , e o azimute do Sol
em relação ao Sul por α.

Considerando que o achatamento da Terra é suficientemente pequeno para que possa, neste
âmbito, ser considerada esférica, então, a aplicação da lei dos cossenos para os lados (5.5) ao triân-
gulo NLP resulta na seguinte relação para a distância zenital do Sol:

cos   cos 90   cos 90    sen 90   sen 90   cos 

ou

cos   sen  sen   cos  cos  cos  (5.11)

Designa-se por insolação astronómica, H0, o período de tempo durante o qual o centro do
Sol está acima do plano horizontal em determinado dia e num dado lugar. Então, nesse dia e nesse
lugar, ao nascer do Sol (centro do Sol no plano horizontal), a distância zenital do Sol será


 rad 
2

e o ângulo horário do Sol, considerando um dia de 24 h (o valor do período da rotação da Terra é de


23,93 447 h e o Sol passa pelo meridiano de um lugar duas vezes sucessivas em culminação num
período médio de tempo ligeiramente superior devido ao movimento de translação da Terra), será

H0 2 
 rad 
2 24

Nas condições anteriores, pode escrever-se a equação (5.11) do seguinte modo:

   
cos   sen  sen  cos  cos  cos H 0 
2  24 

ou

  
cos  H0    tg  tg  (5.12)
 24 

5.10
Radiação Solar

Figura 5.4 – Insolação astronómica


(H0 = 0, 2, 4, 6, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 18, 20, 22, 24 h)

Na Figura 5.4 apresenta-se um gráfico da insolação astronómica, expressa em horas, cal-


culada a partir das equações (5.9) e (5.12). Na parte superior do gráfico representam-se os pontos
notáveis da órbita terrestre, já referidos no contexto da Figura 5.3, a).

A quantidade de energia de origem solar que atravessa num determinado lugar no topo da
atmosfera a unidade de área de um plano horizontal por unidade de tempo (I0) depende da constante
solar (E0), da distância a que a Terra se encontra do Sol (que se considera constante em cada dia) e
da distância zenital do Sol (Figura 5.5). Efetivamente, a energia que atravessa o plano A,
perpendicular aos raios solares, por unidade de tempo é a mesma que atravessa o plano B, tangente
ao topo da atmosfera em L, mas a relação entre as áreas das secções que os planos definem no tubo
de fluxo de energia é proporcional a cos δ.





Figura 5.5 – Efeito da distância zenital nas áreas das secções transversais ao tubo de fluxo de
energia solar

5.11
Radiação Solar

Assim, será

d 02
I0  E 0 cos  (5.13)
d2

A quantidade de energia que por dia atravessa a unidade de área de um plano horizontal no
topo da atmosfera (I0d) pode determinar-se a partir do integral

H
 0
I 0d   H
2 I 0 dt (5.14)
 0
2

Na Figura 5.6 apresenta-se um gráfico do integral anterior (5.14), calculado em função do


dia do ano e da latitude com base nas equações (5.8) a (5.13) e considerando constantes em cada dia
a distância entre o Sol e a Terra (d) e a declinação do Sol (δ).

Verifica-se que o máximo de I0d ocorre perto do solstício de dezembro, a 90 de latitude sul,
e tem um valor de 48,1 MJ m-2 d-1. No solstício de junho, a 90 de latitude norte, a energia recebida,
I0d, é 44,9 MJ m-2 d-1. Este valor, ligeiramente inferior ao anterior, é justificado pela maior distância
entre o Sol e a Terra no solstício de junho.

Figura 5.6 – Energia solar incidente por dia na unidade de área de um plano horizontal no topo da
atmosfera (MJ m-2 d-1)

Em Lisboa, com coordenadas de 38,7 N e 9,2 W, a energia recebida no topo da atmosfera


no solstício de junho é de 41,4 MJ m-2 d-1 e seria suficiente para evaporar 16,8 kg m-2 d-1 de água a
15 C, ou seja, cerca de 17 mm por dia.

Como se perceberá, e se explica na secção seguinte do texto, a radiação cuja energia se


indica na Figura 5.6 é atenuada pela atmosfera e atinge a superfície do Globo com valores muito
inferiores.

5.12
Radiação Solar

5.3 INTERAÇÃO COM A ATMOSFERA E A SUPERFÍCIE DO GLOBO

A propagação da energia radiante no vazio entre o Sol e a Terra, descrita na secção anterior
do texto, é extremamente simples quando comparada com a propagação na atmosfera. Efetivamente,
a propagação da energia radiante do Sol na atmosfera está sujeita a todos os tipos de fenómenos que
são individualizáveis nos estudos de ótica, como por exemplo, reflexão, refração, difusão, absorção
e atenuação.

Assim, considere-se que sobre um corpo incide a energia radiante monocromática Iλ. Parte
dessa energia será absorvida pelo corpo, Aλ, parte será difundida, Dλ, parte será refletida, Rλ, e outra
parte será diretamente transmitida, Tλ. O princípio da conservação da energia permite então escrever
que

I  A  D  R   T (5.15)

Dividindo a equação anterior pelo valor da energia monocromática incidente, obtém-se

1  a   d  r  t  (5.16)

onde as razões de quociente Iλ representam respetivamente a absorvidade (aλ), a difusividade (dλ), a


refletividade (rλ) e a transmissividade (tλ) do corpo.

Note-se que a energia absorvida será reemitida de acordo com a lei de Kirchhoff, segundo a
qual a relação entre a irradiância monocromática de um corpo real e a irradiância de um corpo
negro à mesma temperatura é igual à absorvidade do corpo real para esse comprimento de onda.
Designa-se a relação anterior por emissividade monocromática do corpo real (ελ) e será

E     E B (5.17)

onde
Eλ representa a irradiância monocromática do corpo,
EBλ, a irradiância monocromática do corpo negro à mesma temperatura, definida pela lei de
Planck, equação (5.2), e
ελ, a emissividade monocromática do corpo.

Note-se, ainda, que a energia difundida se propaga em todas as direções, isotropicamente ou


anisotropicamente, e que, portanto, uma parte da energia difundida terá percursos de propagação
que a farão atingir pontos que se encontram na direção da energia diretamente transmitida.

Designa-se por atenuação da energia monocromática incidente a diferença entre esta energia
e a que é diretamente transmitida, será

  I  I  T  A  D  R  (5.18)

e, dividindo por Iλ, obtém-se

 I
K    a   d   r (5.19)
I

5.13
Radiação Solar

onde Kλ representa a atenuavidade do corpo e é igual à adição da absorvidade, da difusividade e da


refletividade.

As propriedades da atmosfera, como a pressão, a temperatura e a composição, variam em


altitude e, portanto, as suas propriedades óticas também. Por outro lado, as propriedades óticas dos
seus componentes são também diversas.

Assim, na absorção da energia solar têm papel relevante o ozono e o oxigénio existentes na
estratosfera e em camadas superiores, que absorvem praticamente toda a energia com comprimento
de onda inferior a 0,3 μm, na banda da radiação ultravioleta nociva para os tecidos orgânicos, e o
vapor de água e o dióxido de carbono existentes na troposfera, que absorvem frações importantes
(no total cerca de 17 por cento) da energia com comprimento de onda superior a 1,0 μm,
especialmente na banda da radiação infravermelha emitida pela Terra (Figura 5.1). Estes dois
últimos absorventes são os responsáveis pelo chamado efeito de estufa que mantém a Terra mais
aquecida do que estaria se a energia irradiada se perdesse no espaço.

Na difusão da energia solar têm papel relevante as moléculas do vapor de água e as dos
outros gases atmosféricos, os núcleos de condensação nas nuvens e as poeiras em suspensão. Sendo
a difusão um fenómeno seletivo, que afeta os comprimentos de onda em função das dimensões das
partículas que a provocam, então, tratando-se da difusão molecular, espera-se que os comprimentos
de onda difundidos sejam os mais pequenos, ou seja, na banda da luz visível, os violetas e os azuis.
Assim, pode atribuir-se à difusão molecular o azul do céu e a cor amarelada do Sol em dias com
pouca nebulosidade e Sol descoberto.

Nos estudos de atenuação da energia incidente no topo da atmosfera, por absorção e por
difusão, é usual considerarem-se individualmente, pela sua importância ou variabilidade na
composição da atmosfera, os seguintes fatores:

1) absorção pelo vapor de água;


2) absorção e difusão por poeiras;
3) difusão pelo vapor de água;
4) difusão molecular pelo ar seco e sem poeiras.

Suponha-se então que ao longo de um percurso elementar, ds, com uma distância zenital δ
(Figura 5.7), a atenuação da energia monocromática incidente, por absorção e por difusão, é
definível por

  k i i ds 
dI
(5.20)
I i

onde
kiλ representa o coeficiente de atenuação por unidade de massa do componente pertinente na
coluna elementar de área unitária e comprimento ds atravessada pela radiação (kg-1 m2) e
ρi, a massa volúmica do componente pertinente (kg m-3).

5.14
Radiação Solar

Figura 5.7 – Ilustração da propagação de um feixe de energia radiante na atmosfera

Desprezando os efeitos da refração e da curvatura da Terra, substituindo a variável s por z:

ds   sec  dz

e integrando da superfície do Globo (suposta à altitude zero e à pressão atmosférica normal,


pn = 101 325 Pa) ao topo da atmosfera (suposta à altitude zta e pressão nula):

 sec     k i i dz 
I0  dI  z ta
I (5.21)
i  
s I 0

obtém-se a lei de Beer:

sec 
    i 
Is  I0  e i 
 (5.22)
 

com

zta
 i   k i i dz
0

e onde
Isλ representa a radiação monocromática direta que atinge a superfície do Globo (W m-3),
I0λ, a radiação monocromática que incide no topo da atmosfera (W m-3), e
αiλ, o coeficiente de atenuação total monocromática na direção zenital para o componente
pertinente (-).

Considere-se o coeficiente de atenuação total na direção zenital devida à difusão molecular


pelo ar seco e sem poeiras, α4λ, admitindo uma distribuição hidrostática de pressão:

dp  d g dz

5.15
Radiação Solar

e um coeficiente de atenuação, k4λ, constante, será

1 0 d 1
 4   k 4
g p n 
d
dp  k 4 p n
g

por onde se reconhece a proporcionalidade existente entre α4λ e a pressão atmosférica à superfície.
Assim, quando a pressão no lugar, p, for diferente da pressão normal de 101 325 Pa e se conhecer
α4λ para a pressão normal, deve corrigir-se o coeficiente de atenuação total na direção zenital devida
à difusão molecular, multiplicando-o pelo fator:

p
101325

Considerando-se, agora, o coeficiente de atenuação total devida à absorção pelo vapor de


água, α1λ, e admitindo um coeficiente de atenuação, k1λ, constante, será

z ta
1  k1 0  v dz  k1 W

por onde se reconhece a proporcionalidade existente entre α1λ e a água precipitável, W (kg m-2 ou
mm), entre a superfície do Globo no lugar e o topo da atmosfera.

De modo idêntico pode mostrar-se a proporcionalidade entre α3λ e W.

Nas aplicações, é usual considerar α2λ uma constante ou uma função do vento à superfície,
não se utilizando portanto o integral atrás definido, o qual apenas foi incluído no texto para
sistematização da exposição.

A lei de Beer, equação (5.22), pode ainda ser escrita na forma:

Is  I0  t i (5.23)


i

com

t i  ei sec (5.24)

onde
tiλ representa a transmissividade total monocromática na direção δ, tendo em consideração a
atenuação provocada pelo fator i.

É usual admitir-se que a integração da lei de Beer ao longo do espetro da radiação solar
conduz a uma expressão da mesma forma, mas, obviamente, referida à energia total e não à energia
monocromática. Assim, será

sec
  i 
Is  I0  e i  (5.25)
 

onde
αi representa o coeficiente de atenuação total na direção zenital (-)

ou, utilizando o conceito da transmissividade total na direção δ, ti (-),

5.16
Radiação Solar

Is  I 0  t i (5.26)
i

Houghton (1954) publicou sob forma gráfica os valores das transmissividades t 1, t3 e t4


calculadas com base em dados do Observatório Astrofísico Smithsoniano. Na Figura 5.8 apresenta-
-se uma adaptação do gráfico de Houghton. Como abcissas deve utilizar-se na obtenção de t4 a sec δ
e, na obtenção de t1 e de t3, o produto da sec δ pela água precipitável em g cm-2 ou em cm. Para t2,
dado que o conteúdo de poeiras na atmosfera é muito variável e parece depender da velocidade do
vento à superfície do Globo, fatos que dificultam a sua determinação, Houghton considerou no seu
estudo sobre o hemisfério norte a seguinte função

t 2  0,95 sec

à qual, como se deduz a seguir, corresponde um valor de α2 = 0,0513.

Figura 5.8 – Transmissividades de Houghton (W em cm)

Como se reconhece, a relação entre as transmissividades (ti) e os coeficientes de atenuação


(αi) é

  1 
i  ln t i  sec  (5.27)
 
 

e, de modo análogo ao indicado para α4λ, deve corrigir-se α4, quando a pressão atmosférica no lugar
em estudo for diferente da pressão atmosférica normal. O valor corrigido de α4 será igual a

p
4
101325

e, portanto, o valor corrigido de t4 será igual a

t 
p
101 325
4

Convém notar que o método de Houghton permite também o cálculo da radiação difusa que
atinge a superfície. Assim, quando se considera que, da radiação perdida para o feixe direto por
difusão, fatores 2, 3 e 4, metade atinge a superfície do Globo como radiação difusa ou do céu, I ds,
será

5.17
Radiação Solar

I ds 1  
  t 1   t i  (5.28)
I0 2 i 

como se ilustra no Quadro 5.2.

Quadro 5.2 – Cálculo da radiação difusa à superfície do Globo

Fator de Transmissi- Radiação Atenuação(2) Radiação difusa(2)


atenuação(1) vidade direta(2)
1 t1 t1 1-t1 -
2 t2 t1t2 t1(1-t2) col. ant.
 0,5
3 t3 t1t2t3 t1t2(1-t3) col. ant.
 0,5
4 t4 t1t2t3t4 t1t2t3(1-t4) col. ant.
 0,5
Radiação difusa total à superfície (t1-t1t2t3t4)
(igual à soma dos valores da última coluna)  0,5
(1) Página 5.14.
(2) Valores adimensionalizados por divisão por I0.

Note-se que a radiação difusa calculada depende da ordem das operações. Assim, deve
sempre utilizar-se a ordem indicada no Error! Reference source not found., que corresponde à
utilizada por Houghton na estimação das transmissividades.

Eagleson (1970) indica para o cálculo de α4 a seguinte expressão:

4  0,128  0,054 log10 sec  

e indica que

 i  n  4
i2

onde n é um fator de turbidez que varia de cerca de 2, para uma atmosfera limpa de montanha, até 4
ou 5, para uma atmosfera urbana ou industrial.

A quantidade de energia que incide diretamente na superfície do Globo por unidade de área
e por dia pode ser calculada pelo seguinte integral:

H0

I sd 
 
2
H0
2
I s dt (5.29)

5.18
Radiação Solar

Figura 5.9 – Radiação solar direta recebida por unidade de área de um plano horizontal à superfície
do Globo e por dia (MJ m-2 d-1)

Na Figura 5.9, apresenta-se um gráfico do integral anterior (5.29), calculado em função do


dia do ano e da latitude, com base nas equações (5.8) a (5.13) e (5.25). Na definição dos
coeficientes de atenuação utilizou-se o método indicado por Eagleson com um fator de turbidez n =
3.

A análise da Figura 5.9, em comparação com a Figura 5.6, revela a forte atenuação da
energia recebida no topo da atmosfera nas regiões polares e o deslocamento para latitudes médias,
entre 30 e 40 norte ou sul, dos máximos da radiação direta à superfície do Globo, que nessas
zonas e no respetivo solstício de verão atinge valores de 25,5 MJ m-2 d-1.

Em Lisboa, a radiação direta à superfície no solstício de junho, admitida a turbidez indicada,


é de 25,4 MJ m-2 d-1, e, dado que a radiação no topo da atmosfera é de 41,4 MJ m-2 d-1, a
transmissividade total média que lhe corresponde nesse dia é de 0,61.

Peixoto (1981) indica que a transmissividade média em Lisboa no mês de junho é de 0,69.
Assim, pensa-se que o valor adotado para o fator de turbidez (n = 3) será ligeiramente excessivo.

5.19
Radiação Solar

Figura 5.10 – Ilustração da definição da posição de um plano inclinado

A orientação do plano sobre o qual incide a radiação solar direta é também um importante
fator a considerar, dado que a quantidade de energia recebida por unidade de área e de tempo varia
dramaticamente com essa orientação.

Considere-se o lugar L (Figura 5.3, b) e Figura 5.10) e imagine-se o plano horizontal que
por ele passa. Tal plano pode ser definido pelas tangentes ao meridiano (direção norte-sul) e ao
paralelo (direção oeste-leste) do lugar (Figura 5.10, canto superior esquerdo).

Para definir a orientação do plano inclinado, suponha-se que numa primeira fase se eleva o
plano de um ângulo β, que se designa por elevação do plano, em torno de um eixo com a direção da
tangente oeste-leste (Figura 5.10, canto inferior esquerdo) e que, numa segunda fase, se roda o plano
de um ângulo γ, que se designa por azimute do plano, em torno da vertical do lugar (Figura 5.10,
canto superior direito). O azimute do plano considera-se negativo quando a normal ao plano se
situar à direita do meridiano do lugar, ou seja, apontar para nascente. O plano inclinado
representado no canto superior direito da Figura 5.10 tem um azimute negativo.

Defina-se o triângulo esférico LAP através da intersecção com a superfície do Globo de uma
paralela à normal ao plano que passe pelo seu centro (Figura 5.10, canto inferior direito, ponto A).

O azimute do Sol, α, que se considera negativo quando o ângulo horário é negativo, obtém-
-se por aplicação da lei dos senos (5.4) ao triângulo NLP:

sen 90   sen 



sen 180    sen 

5.20
Radiação Solar

 cos  sen  
  arc sen   (5.30)
 sen  

O ângulo de incidência dos raios solares no plano inclinado, δβγ, obtém-se por aplicação da
lei dos cossenos para os lados (5.5) ao triângulo LAP:

cos   cos  cos   sen  sen  cos    (5.31)

Quando o Sol se encontra na vertical do lugar, o seu azimute não se define e será

   

Então, a energia que por unidade de área e de tempo incide num determinado instante sobre
o plano inclinado pode obter-se substituindo em (5.25)ou (5.26) I0 por

d 02
I   E 0 cos   (5.32)
d2

que é aplicável quando δ e δβγ forem simultaneamente menores ou iguais a /2, ou seja, quando o
Sol já tiver nascido para os dois planos, o horizontal e o inclinado. Em caso contrário, o valor de Iβγ
será nulo.

Na Figura 5.11 ilustram-se, para um lugar situado à latitude de 40 N, os efeitos do dia do
ano, da elevação do plano inclinado e do seu azimute na distribuição ao longo do dia da energia da
radiação solar direta incidente à superfície do Globo.

Reconhece-se, como se referiu anteriormente, que para um plano horizontal (β = 0, γ = 0),


no hemisfério norte, a insolação astronómica e a energia recebida são maiores no solstício de junho
do que no solstício de dezembro (Figura 5.11, a)).

Para um plano inclinado, com um azimute nulo, as alterações produzidas na quantidade de


energia recebida pela elevação do plano podem ser muito grandes (Figura 5.11, b)). Reconhece-se
que tanto a insolação astronómica como a energia incidente serão tanto maiores quanto menor for o
ângulo de incidência ao meio-dia solar verdadeiro (definido por ε = 0), e que a insolação varia de
forma simétrica, ou seja, que, quando o Sol nasce mais tarde, então, o seu ocaso ocorre mais cedo.

Faz-se notar que um ângulo de incidência nulo, ao meio-dia solar, corresponde a



e que se a elevação do plano for

 180    90    
ou
 90        180

então, sobre ele não incidirá radiação solar direta, ou seja, a insolação astronómica no plano
inclinado será nula:

H  0

5.21
Radiação Solar

a) Influência do dia do ano

b) Influência da elevação do plano

c) Influência do azimute do plano

Figura 5.11 – Influências do dia do ano e da orientação do plano inclinado na energia da radiação
solar direta recebida à superfície do Globo

5.22
Radiação Solar

Os fatos relatados provocam diferenças acentuadas nas características climáticas e de


cobertura vegetal entre as encostas de montanha viradas a norte (β < 0) e as viradas a Sul (β > 0).
Assim, no hemisfério norte, nas regiões acima do trópico de Câncer, a neve desaparece primeiro e a
evapotranspiração é maior nas encostas voltadas a sul, as quais por receberem mais radiação solar
direta se tornam mais quentes e secas do que as voltadas a norte. Tem-se observado que nessas
regiões o crescimento de vegetação bravia é menos acentuado nas encostas viradas a sul do que nas
viradas a norte.

O azimute do plano inclinado (Figura 5.11, c)) tem também influência não só na quantidade
de energia recebida como na insolação astronómica. Assim, qualquer azimute diferente de zero (γ 
0) tem por efeito a diminuição do máximo de energia incidente e a diminuição da insolação. Se o
azimute for negativo, plano virado para nascente, o pôr do Sol no plano inclinado antecede o do
plano horizontal, e, se o azimute for positivo, plano virado para poente, o nascer do Sol no plano
inclinado sucede ao do plano horizontal.

A análise anterior pode ser resumida na afirmação de que um plano paralelo ao plano
inclinado no topo da atmosfera em L recebe em cada instante a mesma energia que o plano
horizontal no topo da atmosfera em A recebe nesse instante e que, no entanto, a insolação no plano
inclinado e a atenuação sofrida por essa energia são as correspondentes à latitude e às condições da
atmosfera em L.

Note-se, ainda, que a radiação difusa recebida no plano inclinado, quando se admite uma
distribuição uniforme no céu, pode ser calculada pelo produto da radiação difusa que se obtém pelo
método de Houghton para um plano horizontal pelo seguinte fator:

1  cos 
2

A radiação recebida à superfície em dias de céu limpo pode ainda ser atenuada pela presença
de nuvens e de vegetação (Figura 5.12).

Figura 5.12 – Ilustração da disposição da radiação global de pequeno comprimento de onda

Designa-se por radiação global a soma da radiação direta com a radiação difusa, será

5.23
Radiação Solar

Ig  Is  Ids (5.33)

A atenuação produzida pelas nuvens, devida à reflexão, difusão e absorção da radiação,


depende do tipo das nuvens, das suas dimensões, especialmente em altura, e da altitude da sua base.
Designando por nebulosidade a fração de céu coberta por nuvens, N, pode utilizar-se a seguinte
expressão empírica (Bras, 1990) para a determinação da radiação global abaixo da base das nuvens,
I 'g :

I'g
 1  0,65 N 2 (5.34)
Is

Na Figura 5.13 apresenta-se a radiação global diária de pequeno comprimento de onda ( I 'g ) medida
pelo piranómetro da Herdade do Outeiro, em Ferreira do Alentejo (= 38º 02’ 42” N, = 08º 15’
59” W, z = 74 m).
30

25
Radiação Global Diária (MJ/m )
2

20

15

10

0
Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set

Ano Hidrológico - 2004/05

Figura 5.13 – Radiação global diária de pequeno comprimento de onda na Herdade do Outeiro,
Ferreira do Alentejo (http://www.cotr.pt)

Em Portugal continental, a radiação global anual média é de cerca de 6300 MJ m-2.

A atenuação produzida pela vegetação depende da sua altura, da densidade da sua


distribuição no terreno e, tratando-se de árvores, da densidade de folhagem nas suas copas. A
radiação que incide no solo, I 'g' , pode ser definida por uma expressão do tipo:

I'g'
 tv (5.35)
I'g

O valor da transmissividade tv é de cerca de 0,68 para erva rasteira, com cerca de 10 cm de


altura, e de 0,18 para erva mais alta, com 50 cm ou mais de altura. Em florestas densamente
arborizadas, o valor da transmissividade é de cerca de 0,05.

5.24
Radiação Solar

Designa-se por albedo da superfície de um determinado corpo, A, a fração da energia da


radiação dos comprimentos de onda de uma determinada banda que incidindo na superfície do corpo
é por ela refletida.

Apresentam-se no Quadro 5.3 valores do albedo de algumas superfícies naturais para


radiação de pequeno comprimento de onda, As.

Quadro 5.3 – Albedo de superfícies naturais para radiação de pequeno comprimento de onda
(Eagleson, 1970)
Superfície Albedo
Água* 0,03-0,40
Solo preto seco 0,14
Solo preto húmido 0,08
Solo cinzento seco 0,25-0,30
Solo cinzento húmido 0,10-0,12
Areia amarela 0,35
Areia branca 0,34-0,40
Rochas 0,12-0,15
Áreas densamente urbanizadas 0,15-0,25
Neve 0,40-0,85
Ervas densas e altas 0,18-0,20
Erva verde 0,26
Erva seca 0,19
Copas de carvalho 0,18
Copas de pinheiro 0,14
Copas de abeto 0,10
Algodão 0,20-0,22
Arrozal 0,12
*
O albedo das superfícies de água depende fundamentalmente do ângulo de incidência da radiação e da
agitação da superfície. Para ângulos de incidência menores do que 70, o albedo é muito pequeno.

A radiação global de pequeno comprimento de onda disponível à superfície, R s, pode então


ser calculada por

R s  1  A s  I 'g' (5.36)

A radiação recebida do Sol aquece a atmosfera e o Globo que passam assim a emitir de
acordo com as leis de Kirchhoff e de Stefan-Boltzmann:

E i   i  Ti4 (5.37)

onde
Ei representa a irradiância do corpo i,
εi, a emissividade do corpo,
ζ, a constante de Stefan-Boltzmann (5,670  10-8 W m-2 K-4), e
Ti, a temperatura do corpo.

5.25
Radiação Solar

A emissividade de uma atmosfera sem nuvens depende principalmente da quantidade de


vapor de água que contém. Idso indica a seguinte expressão para o cálculo da emissividade (εa) de
uma atmosfera sem nuvens:

a  0,740  0,0049 e (5.38)

onde
e representa a tensão do vapor de água (hPa).

No cálculo da irradiância da atmosfera (Ea), com a emissividade anterior (εa), deve utilizar-
-se a temperatura do ar (T a) a uma altura da superfície igual a 2 m.

A irradiância da atmosfera é aumentada pela presença de nuvens. Assim, deve corrigir-se a


sua irradiância em função da nebulosidade (N), do seguinte modo:

 
E a  1  0,17 N 2  a  Ta4 (5.39)

À superfície do Globo, os corpos comportam-se para a radiação de grande comprimento de


onda de modo muito semelhante a corpos negros. A sua absorvidade e emissividade são portanto
aproximadamente unitárias. No entanto, é usual distinguir-se a água cuja emissividade (εw) se
considera igual a 0,97, e, portanto, o seu albedo para a radiação de grande comprimento de onda
será de 0,03.

Então, para a superfície do Globo, será

Es  s  Ts4 (5.40)

onde
εs representa a emissividade do material da superfície e terá o valor 0,97 para a superfície da
água e 1 para as outras superfícies, e
Ts, a temperatura da superfície.

Quando a área da superfície estiver coberta por florestas é usual considerar também a
irradiância das copas das árvores (Ef). Será

Ef  f  Tf4 (5.41)

onde
εf representa a emissividade das copas das árvores, em geral considerada unitária, e
Tf, a sua temperatura.

Então, quando se considera que a fração de superfície que se encontra coberta por árvores é
F, pode escrever-se a seguinte equação para o balanço da energia da radiação de grande
comprimento de onda (Figura 5.14):

R1  1  F 1  Al  Ea  Es   F Ef  Es  (5.42)

5.26
Radiação Solar

Figura 5.14 – Ilustração da disposição da radiação de grande comprimento de onda

Num balanço global da energia radiante de pequeno e de grande comprimento de onda


disponível à superfície do Globo num determinado instante, Rn, obtém-se então

R n  R s  R1 (5.43)

5.4 RELAÇÕES EMPÍRICAS LOCAIS E BALANÇO MÉDIO GLOBAL

A medição da radiação solar é feita através de instrumentos que se designam genericamente


por radiómetros ou actinómetros. Destes, o pireliómetro, que mede a radiação solar direta, o
piranómetro (Figura 5.15), que mede a radiação solar global, direta e difusa, e o difusómetro, que
mede a radiação difusa e que consiste essencialmente num piranómetro em que a radiação direta é
interceptada por um arco, são os mais utilizados. A radiação de grande comprimento de onda
emitida pela superfície é medida com pirgeómetros. O elemento básico dos radiómetros é
geralmente constituído por termopares, ou termopilhas, cuja tensão de saída é proporcional a uma
diferença de temperatura.

Figura 5.15 – Piranómetro Hukseflux Thermal Sensors, SR11

5.27
Radiação Solar

A insolação, número de horas de Sol a descoberto por dia, H, é medida através de


instrumentos que se designam por heliógrafos, sendo o mais utilizado o heliógrafo de Campbell-
-Stokes.

Peixoto (1981), baseado em observações feitas no Instituto Geofísico Infante D. Luís, indica
que a radiação global em dias de céu limpo, Ig (MJ m-2 d-1), pode ser calculada em Lisboa por

 2D  
Ig  23,53  11,87 sen   0,4466   (5.44)
 365  

Note-se que esta fórmula dá valores superiores aos que são indicados na Figura 5.9 e que se
encontram mais perto dos valores da Figura 5.6, que correspondem à radiação solar no topo da
atmosfera.

Para dias de céu enublado, Peixoto indica que a radiação global diária, I 'g , pode ser
calculada através de

I'g  Ig a rH  b (5.45)

onde
rH representa a razão entre a insolação medida no heliógrafo e a insolação astronómica, e
a e b são constantes cujo valor se indica no Quadro 5.4 em função do mês.

Quadro 5.4 – Valores de a e de b para a determinação da radiação global diária em Lisboa


(Peixoto, 1981)

Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

a 0,631 0,630 0,679 0,673 0,649 0,677 0,670 0,685 0,627 0,608 0,582 0,610

b 0,339 0,325 0,271 0,281 0,318 0,339 0,308 0,281 0,335 0,336 0,380 0,347

Quintela (1986) apresenta para o Porto (Serra do Pilar), Coimbra, Lisboa e Faro valores dos
coeficientes da relação que Ångstrom estabeleceu entre os valores mensais da radiação global à
superfície do Globo, I 'g , e a radiação no topo da atmosfera, I0, em função da razão de insolação, rH.
São as seguintes as expressões de Quintela :

– Porto (Serra do Pilar) :


I'g
 0,18  0,66 rH (5.46)
I0

– Coimbra :

I'g
 0,27  0,55 rH (5.47)
I0

– Lisboa :

5.28
Radiação Solar

I'g
 0,20  0,60 rH (5.48)
I0

– Faro :

I'g
 0,10  0,80 rH (5.49)
I0

Quintela (1986) apresenta ainda um quadro-resumo dos valores dos coeficientes de


Ångstrom, que são referidos para vários locais por Doorenbos e Pruitt (1977), e que se reproduz no
Quadro 5.5.

I'g
Quadro 5.5 – Coeficientes da equação  a  b rH de Angstrom
I0
(Quintela, 1986)
Latitude * Valor médio
Intervalo Valor médio a b a+b
49 - 65 54 0,21 0,55 0,76
34 - 43 36 0,23 0,53 0,76
18 - 30 24 0,28 0,49 0,77
7 - 16 13 0,26 0,50 0,76
0 - 6 3 0,25 0,49 0,74
* Norte ou sul, com excepção do primeiro intervalo em que se trata apenas de latitude norte.

Allen et al. (1998) sugerem que, para dias de céu limpo, quando não se dispõe dos
coeficientes de Ångstrom calibrados localmente, se utilize

I g  (0,75  2  10 5 z) I 0 (5.50)

onde z representa a altitude do lugar (m).

Com a utilização crescente de piranómetros nas estações meteorológicas, tem vindo a ser
substituída a razão de insolação, rH, pela razão entre a radiação global medida, I 'g , e a radiação
global que atingiria a superfície, caso o céu estivesse limpo, I g ,

'
a  b Ig a
rH   (5.51)
b Ig b

Apresenta-se no Quadro 5.6, adaptado de Peixoto (1981), a distribuição percentual dos


valores médios anuais da radiação solar na atmosfera e no Globo, para uma nebulosidade média.

Quadro 5.6 – Distribuição dos valores médios anuais da radiação solar

Destino da Radiação Fração (%) Total


(%)

5.29
Radiação Solar

Incidente no topo da atmosfera - 100


Absorvida na atmosfera 18
– Ozono 3
– Vapor de água e poeiras 13
– Nuvens 2
Refletida e difundida para o espaço 35
– Gases atmosféricos 7
– Nuvens 24
– Superfície do Globo 4
Absorvida pela superfície do Globo 47
– Radiação solar direta 22
– Radiação através das nuvens 14
– Radiação difusa 11

Constata-se que em média 18 por cento dessa energia é absorvida pela atmosfera, 35 por
cento é refletida para o espaço e 47 por cento é absorvida pela superfície do Globo.

EXERCÍCIOS

5.1 Estime a irradiância de um corpo negro cuja temperatura superficial seja 200 ºC.

5.2 Para o dia 20 de Abril de 2003, suposto descoberto, às 15 h legais, estime o comprimento e o
azimute da sombra num plano horizontal de uma haste vertical com 1 m situada à latitude de
38 ºN e à longitude de 8 ºW. Faça um esboço do plano horizontal com a haste e a orientação
da sombra, para ilustrar o problema.
Qual a potência da radiação solar direta, por unidade de área de um plano horizontal, a essa
hora? Suponha o Sol descoberto, uma atmosfera sem poeiras e um coeficiente de turvação de
Eagleson n = 3.

5.3 Para o dia 12 de setembro, suposto descoberto, às 15 horas legais de Moçambique, estime a
potência da radiação solar global (direta e difusa) à superfície em Maputo (f = 25,96 ºS, l =
32,57 ºE). Admita que W = 20 mm.

5.4 No passado verão, um navegador solitário fez-se ao mar do porto de Lisboa com destino a
Cabo Verde. No dia 10 de agosto, com céu limpo, verifica pelo seu relógio, acertado pela
hora legal de Portugal continental, que o Sol culmina sobre si cerca das 15 h 40 min, com
uma distância zenital que ele estima em cerca de 0,5º para norte.
Nas condições referidas, estime a posição da embarcação (longitude e latitude) e, por
unidade de área horizontal, a potência da radiação solar global (direta e difusa) que atinge
nesse momento a embarcação.

5.5 Estime a orientação e a área mínima de um painel solar que com o rendimento de 0,3
forneça 12 W de potência média diária por captação da radiação solar direta à latitude de 40
ºN e no dia 1 de janeiro, suposto descoberto (n = 3).

5.6 Estime a irradiância da atmosfera quando a temperatura do ar é 35 ºC, a nebulosidade é 30


por cento e a tensão parcial do vapor de água é 2000 Pa.

5.30
Radiação Solar

BIBLIOGRAFIA

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5.31

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