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A Região Metropolitana de São Paulo e o conceito de “cluster”: considerações

estratégicas

Autores: José Luís Neves (josen@sebraesp.com.br)


Washington Franco Mathias (wfmathia@usp.br)

Resumo
Buenos Aires, Cidade do México, Miami e São Paulo são hoje cidades dominantes no
contexto latino-americano. Sua evolução tem mostrado uma dinâmica econômica,
tecnológica e social capaz de conferir interesse à análise e ao acompanhamento dos
aglomerados de empresas presentes nestas cidades e em suas regiões de influência. A
intenção de melhor conhecer os fenômenos ligados ao assunto, para entender sua
lógica, extensão e forma como se combinam, torna imperioso usar instrumentos teórico-
conceituais adequados a esse fim. O presente artigo apresenta brevemente o conceito de
“cluster”, discute e compara algumas visões conhecidas do processo de aglomeração de
empresas, identifica tendências visíveis na economia da cidade de São Paulo e aponta
oportunidades para ações estratégicas, assim como possíveis objetos de estudo posterior.

1. Cidades da América Latina


A base geográfica da América Latina inclui inúmeras cidades influentes em âmbito
regional ou local. O processo de globalização tem conferido uma conformação
particular à dinâmica das mudanças vividas por tais cidades, com profundas implicações
econômicas, tecnológicas e sociais; tal processo deverá alterar o panorama de primazia
e dominância nas próximas décadas.
Sassen1 cita Nova York, Londres, Tóquio, Paris, Frankfurt, Zurique, Amsterdã, Sydney
e Hong Kong como centros comerciais e financeiros internacionais, acrescentando que
se pode destacar outros centros como São Paulo e Cidade do México. Nesta linha,
Buenos Aires e São Paulo são cidades que, segundo esta autora, têm características de
primazia, por concentrar uma elevada porcentagem da população e do produto de suas
respectivas regiões. Esta posição dominante de centros comerciais dominantes latino-
americanos teria sido fortalecida pelos investimentos estrangeiros diretos que a cidade
do México, São Paulo e Buenos Aires receberam a partir da década de 1990.
Finalmente, neste contexto, é importante citar Miami, uma cidade que vem adquirindo
características de cidade global em função de seu histórico de imigração cubana inicial e
depois como centro comercial de referência para a Região do Caribe e para a América
Latina.
Entender estes fenômenos ao nível local, de modo a se poder fazer um planejamento de
políticas de governo e de atuação social, requer uma ferramenta teórica que facilite a
identificação das forças atuantes e seu aproveitamento.

2. A importância do uso da metodologia de “clusters” no processo de análise


locacional
A despeito da dinâmica dos processos de globalização por que passam as economias
regionais, boa parte das vantagens competitivas das empresas guarda dependência de
fatores locais. Neste sentido, vêm ganhando importância os aglomerados ou
concentrações geográficas de empresas pertencentes a certo segmento, juntamente com
empresas ou entidades que lhes sejam correlatas (universidades, entidades
normatizadoras, órgãos de apoio, associações comerciais, centros de desenvolvimento
1
Sassen, S. (1998): As cidades na economia mundial. Studio Nobel. São Paulo.

1
tecnológico e outros), porque dão direção, ritmo e intensidade ao processo de inovação
e criam condições propícias ao surgimento de novas empresas. Se, por um lado estar
situada em um “cluster” significa para uma empresa facilidade de acesso a mão-de-obra
qualificada e a fornecedores, por outro facilita a obtenção de informações
especializadas, a execução de atividades em conjunto, o acesso a instituições e o uso de
bens públicos.
Tais fatos estão a exigir que as empresas reconheçam a importância de fatores locais em
suas estratégias, e a apontar para a conveniência de novas abordagens de intervenção
pública.
Neste trabalho estaremos utilizando, como sinônimos, as palavras “cluster” (do original
em inglês) e aglomeração. A razão para isto é que a palavra aglomeração não traduz
com precisão o contexto econômico do termo em inglês. Deve ser ressaltado, entretanto
que, em termos semânticos, as duas palavras têm o mesmo sentido: ver Guralnik2 e
Houaiss3.

3. O conceito de “clusters”
Não existe uma definição de “cluster” universalmente aceita, e o vocábulo é por vezes
usado sem maior rigor para designar diversos tipos de arranjos industriais. Embora
necessários, elementos como a concentração de empresas, a presença de economias
externas consideráveis e baixos custos de transação não são suficientes para que um
conjunto de empresas em certa região possa ser reconhecido como um “cluster”. Uma
das características essenciais, a par dessas, é a interação das empresas, equilibrando
competição e cooperação.
A importância dessa interação é reconhecida por Altenburg & Meyer-Stamer4
segundo os quais não é possível pensar em um “cluster” se se deixa de lado esse
aspecto. Sua definição operacional de “cluster” é a seguinte:
“Cluster é uma aglomeração, de tamanho significativo, de firmas em
uma área espacialmente delimitada, que tem um perfil de especialização
diferenciada e na qual a especialização e o comércio entre firmas são
substanciais.”
Em um trabalho sobre o assunto, Michael Porter5 tece explicações dignas de
referência sobre o conceito, como segue:
"‘Clusters’ são concentrações geográficas de companhias e instituições
interrelacionadas num setor específico. Os ‘clusters’ englobam uma
gama de empresas e outras entidades importantes para a competição,
incluindo, por exemplo, fornecedores de insumos sofisticados, tais como
componentes, maquinário, serviços e fornecedores de infra-estrutura
especializada. Os ‘clusters’, muitas vezes, também se estendem para
baixo na cadeia produtiva até os consumidores, e lateralmente até
manufaturas de produtos complementares e na direção de empresas com
2
Guralnik, D. B. (1984): Webster’s new World dictionary. Second College Edition. Prentice Hall Press.
3
Houaiss, A. (2001): Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Objetiva.
4
Altenburg, T.; Meyer-Stamer, J. (1999): How to promote “clusters”: policy experiences in Latin
America. World Development, vol. 27, no. 9, pp. 1693-1713.
5
Porter, M. (1998): Clusters and the new economics of competition. Harvard Business Review, Nov-Dec,
p. 78.

2
semelhantes habilidades, tecnologia, ou de mesmos insumos.
Finalmente, muitos ‘clusters’ incluem órgãos governamentais e outras
instituições – tais como, universidades, agências de padronização, ‘think
tanks’, escolas técnicas e associações de classe – que promovem
treinamento, educação, informação, pesquisa e suporte técnico.”
No campo da análise de aglomerações industriais, pode-se citar pelo menos cinco
abordagens principais. Para fins de esquematização, é possível dividi-las em dois
grupos, a saber:
a) as que tratam as aglomerações como conseqüência natural da ação de forças de
mercado – nesse grupo estão os trabalhos de Paul Krugman6 e Michael Porter7; e
b) as que valorizam o apoio do governo por meio de políticas públicas e
cooperação entre as empresas do aglomerado – nesse grupo se encontram os
trabalhos de Economia Regional na linha de A. Scott8, a Economia da Inovação,
de D. B. Audrestch9 e outros, além da abordagem dos distritos industriais
voltados para empresas de pequeno porte, na qual se destacam trabalhos de
Schmitz10.

Comparações entre as dinâmicas de evolução de “clusters” de diferentes países mostram


semelhanças importantes. Baptista & Swann11, comparando “clusters” dos Estados
Unidos e do Reino Unido assinalam o fato de que novas empresas são atraídas por sub-
segmentos que se mostram especialmente fortes em uma certa região, e empresas
localizadas em um “cluster” que é forte em seu segmento tendem a crescer mais do que
a média da indústria. Os autores não encontraram evidência de que os efeitos do
processo de aglomeração sejam mais fracos em um dos países estudados do que no
outro.
Aspectos geográficos, inovação e ciclo de vida da indústria são elementos
interrelacionados. Audretsch & Feldman12, baseando-se em dados sobre a atividade
inovadora de segmentos industriais dos Estados Unidos, registraram relação entre a
capacidade inovadora das empresas, o fato de estarem situadas em “clusters” e o estágio
em que se encontram o ciclo de vida do segmento. A evidência empírica sugere que a
propensão da empresa para inovar é maior se a indústria está nos estágios iniciais de seu
ciclo, e se torna mais dispersa durante os estágios de maturação e declínio.

6
Krugman, P. (1998): What´s new about the new economic geography? Oxford Review of Economic
Policy, vol. 14, no. 2, Summer, pp. 7-17.
7
Porter, M. (1998): Clusters and the new economics of competition. Harvard Business Review, Nov-
Dec., pp. 77-90.

8
Scott, A. (1995): The geographic foundations of industrial performance. Competition & Change, vol. 1,
no.1, pp. 51-66.
9
Audretsch, D. (1998): Agglomeration and the location of innovative activity. Oxford Review of
Economic Policy, vol. 14 no. 2, Summer, pp. 18-29.
10
Schmitz, H. (1999): Clustering and industrialization: introduction. World Development, vol. 27, no. 9.
11
Baptista, R.; Swann. G. (1999): A comparison of clustering dynamics in the US and UK computer
industries. Journal of Evolutionary Economics, vol. 9, no. 3, August, pp. 373-399.
12
Audretsch, D.; Feldman, M. (1996): Innovative “clusters” and the industry life cycle. Review of
Industrial Organization, vol. 11, April, pp. 253-273.

3
Embora possam ser alvo de normatização indutora do crescimento, as aglomerações
nem sempre o são. Apesar de ser possível e potencialmente útil orientar a ação
governamental para especificidades das empresas de certa região, os instrumentos
tradicionalmente usados de ação governamental não o fazem; sendo gerais, nem sempre
têm a efetividade desejada em termos de expansão permanente e auto-sustentada dessas
empresas.
Suzigan13 comenta que as limitações existentes à implementação de políticas industriais
de âmbito nacional fazem com que seja maior a relevância de manter o foco em
aglomerações industriais delimitadas geograficamente, para a formulação de políticas de
promoção de novos investimentos, crescimento econômico, aumento do emprego, do
volume de exportações e do desenvolvimento tecnológico. Porter14, porém, comenta que
políticas industriais de países em desenvolvimento não raro acabam atuando contra a
formação de “clusters” ao provocar deslocalizações de curto prazo, prejudiciais no que
diz respeito à possibilidade de obter os melhores resultados econômicos possíveis.
Suzigan15 comenta que no Brasil, desde 1988 os Estados e municípios se lançaram em
uma competição, que tomou a forma de um leilão de incentivos que distorcem a
localização de investimentos e “não constituem um first best do ponto de vista de
política industrial”.
Embora heterogêneos, os “clusters” têm características comuns quanto à natureza que
determinam largamente formas adequadas de tratamento. Considerando a conveniência
de ações governamentais de apoio, Altenburg & Meyer-Stamer16 distinguem três
exemplos de tipos de “clusters”, a requerer gêneros diferenciados de providências:
 “clusters” de empresas sobreviventes, que operam com pequena escala e a
despeito de condições macroeconômicas desfavoráveis;
 produtores de bens que floresceram em épocas de substituição de importações, e
que agora têm de se adaptar a processos de abertura da economia; e
 “clusters” dominados por empresas transnacionais, que comandam de forma
ampla o processo de produção ao conjugar e coordenar as atividades de seus
fornecedores.

São muitos os exemplos de aglomerações industriais e distritos industriais em países


como os Estados Unidos, Suécia, Finlândia, Israel, Taiwan ou Singapura17. Entre eles,
pode-se citar:
 o do Vale do Silício, no sul da Califórnia (Estados Unidos), com empresas de
eletrônica e informática;
 as empresas de calçados em Franca (Estado de São Paulo, Brasil) e do Vale dos
Sinos (Estado do Rio Grande do Sul, Brasil);

13
Suzigan, W. (s/d): Aglomerações industriais: avaliação e sugestões de políticas. URL:
http://www.eco.unicamp.br/projetos/neit/documentos/w_suzigan4.htm.
14
Clusters e competitividade por Michael Porter (s/d). Vide URL:
http://www.hsmmanagement.com.br/edicao15/15pg_100.htm. Vide também comentário de Scott Stern
em URL: http://www.janelanaweb.com/livros/porter2.html.
15
Suzigan, W. (s/d): Aglomerações industriais: avaliação e sugestões de políticas. URL:
http://www.eco.unicamp.br/projetos/neit/documentos/w_suzigan4.htm.
16
Meyer-Stamer, J. (1999): How to promote “clusters”: policy experiences from Latin América. World
Development, vol. 27, no. 9, 1999, pp. 1693-1713.
17
Rodrigues, J. (s/d) : Os “clusters” estão de volta. URL: http://www.janelaweb.com/livros/porter2.html.

4
 os distritos industriais de Biella, no Piemonte Italiano (têxtil); Tiruppur, no sul
da Índia (malhas de algodão); Cachoeiro do Itapemirim, no Estado do Espírito
Santo, Brasil (mármore e granito); Herning-Ikast, na Dinamarca (têxtil) e
Salling, na Dinamarca (movelaria); Baden-Württemberg, na Alemanha (bens de
capital).18

Discussões apressadas sobre as virtudes da chamada “Nova Economia” situaram em


segundo plano a questão da localização geográfica. Recentemente, entretanto, Michael
Porter pôde reafirmar a importância de relacionar competitividade de regiões e de
nações com a organização econômica baseada em aglomerações bem delimitadas e
geograficamente bem definidas.Em trabalho de 2001, Porter & Stern19 explicam que
tradicionalmente a discussão sobre inovação se concentrou em fatores internos, cabendo
considerar que também elementos do ambiente externo (em particular, o fluxo de
informação, o conhecimento dos consumidores da região, as relações com as empresas
do lugar – associações empresariais e fóruns de participação conjunta, a qualificação de
pessoal e o acesso a instituições locais) são importantes para determinar a capacidade de
inovação da empresa, uma vez que se trata de coisas difíceis de serem imitadas por
empresas de outros lugares. Na verdade, o efeito da localização é, segundo os autores,
capaz de explicar as diferenças existentes entre regiões e nações no que diz respeito à
capacidade de inovar. As vantagens competitivas tendem a estar mais fundamentadas
em fatores ligados à localização e menos baseadas em elementos a que alguém possa ter
acesso à distância (idéias, conhecimento tecnológico e controle dos processos, por
exemplo).

4. Transformações da economia da cidade de São Paulo


A cidade de São Paulo possui um PIB de US$ 47 bilhões, 10,4 milhões de habitantes,
um orçamento anual da ordem de US$ 4 bilhões e uma renda per capita de US$ 4.708.
Se considerarmos os 39 municípios da Região Metropolitana, a população sobe para
17,2 milhões de habitantes.
Nos últimos anos esta Região vem apresentando mudanças significativas em sua
economia. A produção industrial, que representava 35,9% do total do Estado de São
Paulo em 1980, passou para 21,9% em 1999. A indústria de serviços aumentou sua
participação no total de empregos, de 44,1% em 1989 para 54,8% dez anos depois. 20
Suzigan et alii21 (2001, 695-697) constataram nesse processo de transformação a
presença de um importante contraste: a Região Metropolitana de São Paulo vem
perdendo participação no total do emprego industrial do Brasil, enquanto se vê
aumentar a participação do interior do Estado; os autores explicam o fato pelo sucesso
das aglomerações industriais do interior. Ao identificar aglomerações relevantes

18
Informações detalhadas sobre esses “clusters” podem ser obtidas em GALVÃO, O. (2000): “Clusters” e
distritos industriais: estudos de casos em países selecionados e implicações de política. URL:
http://www.ipea.gov.br/pub/ppp/ppp21/Parte1.pdf.
19
Porter, M.; Stern, S. (2001): Innovation: location matters. Sloan Management Review, Summer 2001,
vol. 42, no. 4, pp. 28-36.
20
Caixeta, N. (2001): As melhores cidades para fazer negócios. Exame, ed. 755, ano 35, no. 25, 12/dez.,
pp. 48-78.
21
Suzigan, W.; Furtado, J.; Garcia, R.; Sampaio, S. (2001): Aglomerações industriais no Estado de São
Paulo. Economia Aplicada, vol. 5, n. 4, pp. 695-717. Uma versão preliminar do trabalho pode ser
encontrada em URL: http://www.cedeplar.ufmg.br/download/wilson%20suzigan.pdf.

5
conforme a especialização das microrregiões do Estado de São Paulo, perceberam nelas
grande diversidade no que diz respeito a sua evolução histórica, morfologia, instituições
de apoio, aspectos culturais, atributos organizacionais e políticas públicas que compõem
o contexto no qual operam.
Esta desconcentração tem sido acompanhada por uma mudança de perfil. Se antes a
cidade de São Paulo se caracterizava pela concentração de indústrias, ela tem
experimentado crescimento da importância da prestação de serviços, combinando
negócios, cultura e prestação de serviços. Um dos maiores desafios da cidade é o de se
consolidar como um pólo de serviços, isto é, um centro informação, aprendizado,
turismo, tecnologia e consumo.22
Algumas evidências deste processo de aglomeração podem ser referidas:

 São Paulo tem pelo menos 20 restaurantes de alta gastronomia, com 100 lugares
ou mais e uma cozinha de nível internacional;
 estão sendo construídos centros hoteleiros, culturais e complexos comerciais de
grande porte, como é o caso do Rochaverá Plaza, na marginal do Rio Pinheiros,
que deverá ser o maior complexo comercial do país. Até 2003, estima-se que a
cidade terá em funcionamento 100 novos hotéis. Pelo menos quatro redes
hoteleiras internacionais de alto padrão deverão se fixar na cidade de São Paulo
até 2003. São elas a Hyatt, Hilton, Marriott e Ritz-Carlton.23
 calcula-se em cerca de 1,3 milhão o número anual de turistas oriundos do
exterior que visitam a cidade de São Paulo. Parte deles tem por objetivos fechar
negócios, participar de feiras e comparecer em encontros de empresários.24
 São Paulo possui uma quantidade significativa de shopping centers, que vem
aumentando. Quatro foram inaugurados desde 1999, o que perfaz um total de 74
em funcionamento na cidade25.
 São Paulo ganhou força como centro financeiro sobre o Rio de Janeiro, antiga
capital do Brasil.
 por suas características, a cidade de São Paulo tem atraído as sedes regionais de
grandes empresas transnacionais, que dependem de um conjunto desenvolvido
de empresas especializadas em serviços financeiros, auditoria, direito,
consultoria, propaganda e informática. Também atua nesse sentido o fato de São
Paulo abrigar número considerável de feiras de negócios, congressos,
convenções, conferências e outros eventos do gênero, e de contar com uma rede
expressiva de restaurantes, lojas e centros de entretenimento.26

22
SP: de pólo industrial para centro de serviços (2002). Jornal O Estado de S. Paulo, 11/jan. URL:
http://www.jt.estadao.com.br/editorias/2002/01/11/eco018.html.
23
Promessa do setor é de expansão (2002). Estado de S. Paulo, 12/fev. URL:
http://www.estado.estadao.com.br/jornal/02/02/12/news017.html
24
Aumenta o turismo, brotam hotéis (2001). Estado de S. Paulo, 24/jun. URL:
http://www.estado.estadao.com.br/jornal/01/06/24/news197.html

25
Caixeta, N. (2001): As melhores cidades para fazer negócios. Exame, ed. 755, ano 35, no. 25, 12/dez.,
pp. 48-78.
26
Souza, Álvaro (2002): O que é que São Paulo tem? Exame SP, no. 11, 31/jan., pp. 25-26. Parte
integrante da edição 759 de Exame.

6
Tais movimentos parecem pertencer a um padrão observado em países desenvolvidos,
em que a participação do produto industrial diminui e as grandes metrópoles se tornam
menos atrativas para a instalação de indústrias, ao mesmo tempo em que se mantêm
como importantes centros de compras e de passeio (o que favorece, por exemplo, as
atividades turísticas).
Em grandes núcleos urbanos de outros países, as experiências de transição de uma
economia predominantemente industrial para uma de serviços têm tomado duas direções
bem distintas que coexistem. Uma delas assumiu a forma de crescimento dos segmentos
de alto valor agregado (tecnologia, informação, turismo e entretenimento). É o caso, por
exemplo, de Detroit: célebre capital mundial do automóvel, a cidade foi abandonada nos
anos 80 por grande número de indústrias. Nos anos 90, viu recuperada sua base
automotiva mas abriu espaço para turismo e entretenimento.27 Em Nova York e Tóquio,
por seu turno, observou-se firme crescimento da importância do trabalho intelectual
(design, informática, consultoria, etc.).
A outra direção do processo de transição da atividade industrial para a de serviços se dá
pela expansão do segmento formado por fornecedores de atividades de segunda linha
(limpeza, segurança, vigilância, serviços de manobrista)28. Esta forma predominou, por
exemplo, na cidade do México, onde o crescimento do setor de serviços provocou a
geração de empregos de menor valor agregado, com redução da renda média. Os
franceses referem-se a este tipo de geração de emprego, jocosamente, como “McJobs”.
Parte da importância de ações públicas bem orientadas é a de contribuir para que haja
equilíbrio, no processo de transição, entre as vertentes da maior ou da menor
qualificação.
Na cidade de São Paulo, o emprego de tecnologias e processos avançados, poupadores
de mão-de-obra, tem feito parte do processo contínuo de reestruturação da indústria, e
vem liberando mão-de-obra para o setor de serviços com intensidade crescente. Essa
tendência se mostrou mais forte a partir da década de 90, e tem influenciado em grande
medida a geração de ocupações como serviços domésticos, vigilantes, mensageiros com
motos (o que parece ser uma invenção brasileira), balconistas e atendentes de
telemarketing. O setor de serviços ocupa hoje cerca de 4 milhões de pessoas, mais da
metade dos trabalhadores da Região Metropolitana de São Paulo.29
Trata-se de fenômenos complexos que devem ser entendidos em conjunto, uma vez que
se complementam e se influenciam mutuamente. A existência de tradição no que diz
respeito a certos serviços (por exemplo, hotelaria e restaurantes) e a realização de
eventos (feiras, encontros profissionais, convenções, exposições) favorece a criação de
outros serviços correlatos (centros de qualificação profissional, empresas de oferta
terceirizada de mão-de-obra). A evolução do segmento de gastronomia, por exemplo,
abre espaço para a criação de escolas que qualifiquem pessoas para gerenciar empresas
de serviços alimentícios, planejamento de cardápios, administração de cozinhas de
hotéis, empresas aéreas e restaurantes.
Outro aspecto a considerar é que ao dispensar funcionários, a indústria cria contingentes
de pessoas que orientam suas atividades para serviços de baixa qualificação (porteiros,
vigilantes, recepcionistas, balconistas, manobristas).
27
Comentário de Márcio Pochmann, secretário municipal de Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade,
em Peixoto, F.; Jamous, L. (2002): Uma cidade dividida. Exame SP, no. 11, 31/jan., pp. 5-6. Parte
integrante da edição 759 de Exame.
28
Masano, T. (2002): Geografia complicada. Exame SP, no. 11, 31/jan, p. 7. Parte integrante da edição
759 de Exame.
29
Peixoto, F.; Jamous, L. (2002): Uma cidade dividida. Exame SP, no. 11, 31/jan., p. 6. Parte integrante
da edição 759 de Exame.

7
Se antes a proximidade dos consumidores era vantagem crucial para a decisão de onde
situar uma indústria, hoje em dia a decisão leva em conta um quadro mais complexo, do
qual fazem parte menores custos de transação e novas formas de organização produtiva.
O exame da história recente da cidade de São Paulo permite vislumbrar a perspectiva
de que, nos próximos anos, se consolidará seu papel de centro de decisão (a alta
administração e escritórios centrais continuam a se localizar na cidade de São Paulo,
mesmo que as instalações fabris tenham se transferido para outras cidades) e de serviços
financeiros (segmento que vem se fortalecendo e que historicamente ocupou seu espaço
na cidade).
Cabe ainda referir que da tendência de transformação da cidade faz parte o
fortalecimento de novos serviços de tecnologia da informação. Dados do governo do
Estado de São Paulo indicam que 78,7% das indústrias de telecomunicações e
informática se encontram na grande São Paulo30. Além disso, observa-se a vinculação
dos serviços a segmentos industriais cuja operação depende da existência de uma rede
de empresas complexa e consolidada (gráfica e moda, entre outras).

5. Aspectos Normativos e Estratégicos para a Formulação de uma Política de


Assuntos Metropolitanos para São Paulo e seus efeitos nas empresas
Os fatos e dados levantados no item anterior permitem apontar direções para a
formulação de diretrizes estratégicas gerais que tenham a dinâmica econômica como
base para a ação metropolitana. Em especial, sugerem a conveniência de que o trabalho
analítico parta de conceitos como o de “cluster” e o de cadeia produtiva. Nessa medida,
uma entidade de Governo Estadual poderia promover ou complementar levantamentos
que contribuíssem para auxiliar a compreensão dos fenômenos econômicos em bases
locais.
Um dos papéis do Governo seria então o de aprimorar a capacidade microeconômica
das regiões por meio da melhoria de eficiência e da qualidade dos insumos de caráter
geral: força de trabalho qualificada, infra-estrutura física adequada e bases de
informações econômicas confiáveis. Este papel poderia ser provido diretamente ou pela
adequada articulação com instituições competentes.
Um outro papel importante seria o de zelar para que as empresas operem em ambientes
propícios à obtenção de aumentos de produtividade crescentes, por meio de mecanismos
adequados de regulação e de incentivo à inovação.
O objetivo maior, principalmente para a Região Metropolitana de São Paulo, é o de
contribuir para o equilíbrio e o direcionamento do processo de transição para a
Economia de Serviços, ou seja, para além da competição em termos de custos dos
fatores. Isto pode ser obtido, em princípio, por externalidades e contribuições de órgãos
do Governo e Universidades, de maneira a motivar, facilitar e prover incentivos para a
ação coletiva na Região Metropolitana. Um exemplo nesse sentido é o da Prefeitura da
Cidade de São Paulo, a qual está criando a Agência para o Desenvolvimento do
Centro31, que poderá contribuir para desencadear um processo do tipo indicado,
semelhantemente ao que já ocorreu com sucesso em outras cidades no exterior.
Um contra-exemplo, no que diz respeito à forma de organizar atividades de apoio, pode
ser encontrado nas ações de planejamento de Estado de São Paulo, dispersas entre
diferentes órgãos, sem uma lógica visível de agregação segmentar. A Secretaria dos
Transportes Metropolitanos é um órgão com perfil próprio para atuar como uma

30
Caixeta, N. (2001): As melhores cidades para fazer negócios. Exame, ed. 755, ano 35, no. 25, 12/dez.,
pp. 48-78.
31
Marta planeja agência para reabilitar o Centro (2002): Gazeta Mercantil, 18/abr.

8
Secretaria de Assuntos Metropolitanos; entretanto, quando se examina o principal plano
desta Secretaria, o PITU 202032, verifica-se que está a refletir a visão e a influência do
“transporteiros”, ou seja, busca produzir meios de transporte e gerenciar os sistemas
existentes, não havendo preocupação clara e explícita quanto à dinâmica econômica e
social das Regiões Metropolitanas.
A alternativa, dentro da abordagem aqui discutida, é formular um programa de longo
prazo para promover o processo de melhoria dos aglomerados (“clusters”) identificados
de modo a mobilizar o Governo, as Empresas, as Instituições e as lideranças da Região
Metropolitana.
Finalmente, pode-se dizer que a cidade de São Paulo está a ponto de se tornar uma
metrópole mundial, com forte ênfase em serviços. Entre os aglomerados mais evidentes
merecedores de análise, podemos citar os seguintes:

- serviços financeiros;
- serviços de educação e pesquisa;
- serviços de feiras, eventos comerciais e similares;
- atividades complementares: turismo de compras, restaurantes, teatros,
restaurantes e hospedagem; e
- atividades culturais associadas a exposições, museus e eventos culturais.

6. Considerações finais
A Região Metropolitana de São Paulo está se transformando em um grande centro de
serviços. Trata-se de um processo que pode ser beneficiado pela existência de ações
públicas bem planejadas, capazes de aproveitar as vantagens competitivas de segmentos
de maior dinamismo, mais modernos e com maior potencial de geração de emprego e
renda. Para isso, será útil dispor de uma metodologia que permita aferir a extensão do
processo de mudanças na economia, e situar nele a dinâmica das transformações que
vêm ocorrendo.
É possível que ações governamentais de incentivo e desenvolvimento de infra-estrutura,
venham a ser mais bem aproveitadas:
- se estiverem orientadas para as necessidades e as particularidades de certos
“clusters”; e
- se forem concebidas dentro de uma estratégia que considere a natureza e a
tendência das mudanças econômicas em curso, na medida em que favorecem
mais a evolução de certos “clusters” do que de outros.
Mostra-se recomendável que entidades normatizadoras e de apoio (secretarias de
governo, representantes da comunidade local, instituições educacionais e outras) tenham
como ver identificados os “clusters” existentes e conhecer sua natureza, história e
dinâmica, assim como necessidades e intenções dos agentes que os compõem.
Clara identificação e aferição do processo de evolução dos “clusters” facilitarão a
promoção de ações condizentes com sua forma de ser e com suas necessidades atuais e
futuras, contribuindo para criar condições favoráveis à interação das empresas e ao
desenvolvimento de sua capacidade de inovar. Além disso, o melhor conhecimento dos
“clusters” existentes poderá auxiliar iniciativas voltadas para a promoção do acesso e da
absorção de novas tecnologias pelas empresas que os compõem, com benefícios para
elas, para a comunidade em que operam e para a sociedade.
Nessa linha, a pesquisa e a análise do papel de certos serviços33 na dinâmica econômica
da Região Metropolitana de São Paulo auxiliarão a conhecer a conformação e as
32
PITU 2020 – Plano Integrado de Transportes Urbanos. Governo do Estado de São Paulo (1999).
Secretaria de Estado dos Transportes Metropolitanos (STM).

9
características do processo de evolução deste grande centro urbano, contribuindo para
tornar possível uma atuação bem direcionada de todos os grupos de interesse
envolvidos.

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Dos quais são exemplos os serviços financeiros, de educação e pesquisa, organização de feiras e
eventos, além de outros citados.

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