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Música, padrões de beleza e proporcionalidade étnica: o(s) show(s) da Tuyo no Pátio Batel

Seja pela Simonami (primeira formação da banda), pelo The Voice Brasil (as irmãs Lay e Lio
Soares se apresentaram no programa em 2016, antes de Machado e Jan integrarem a atual
formação), pelo primeiro álbum de estúdio (Pra curar, lançado no dia 9 de novembro de 2018), ou
pelo feat. com Baco Exu do Blues (a faixa Flamingos, do álbum Bluesman de Baco, tem mais de 10
milhões de reproduções no Spotify): não faltam exemplos de que a banda curitibana Tuyo tem
oferecido ao público brasileiro muito o que escutar e também assistir. Porém, a última ação não se
refere somente a assistir clipes e shows: também tem o documentário nude, de onde vem a beleza
(Tuyo, Hai Studio e Hyena Tapes), postado em julho de 2018 no YouTube. O documentário e os
demais trabalhos da banda me parecem um incentivo a construir e encontrar a própria beleza.

A partir do depoimento de uma série de negras e negros a respeito de padrões estéticos, o


documentário tem por intenção reforçar que se sentir bem consigo – com a própria imagem, com o
próprio cabelo, com a própria cor da pele – é necessário, possível, e um processo de transformação
e enfrentamento diário aos padrões sociais majoritariamente magros, lisos e brancos. O último
depoimento é da Lio: diz que “estabelecer um lugar de estética negra é inevitável se você é negro”;
que discussões sobre padrões de beleza levam a sociedade a um processo de “consciência do dano”;
que sua presença no palco diz menos respeito a si, mas a possibilidade de mulheres negras
encontrarem espaço de identificação por meio das narrativas interpretadas por ela, Lio, uma mulher
negra. É como diz a música :’( – o nome da música é um emoji triste, mas a letra não: toda beleza
que você não vê em si / sei que ela chega aqui / em um milhão de formas. Independente do que o
documentário possa vir a despertar em cada pessoa que o assista, na noite de ontem (3) fui ao show
da Tuyo no shopping Pátio Batel.

Às 20 h 12 min, a Tuyo subiu ao palco da 10ª edição do LABmoda – evento de moda curitibano
que, desde 2011, tem promovido o trabalho de designers e artistas da área através de vendas e
divulgação de marcas. A edição desse ano (de 25 de junho à 14 de julho) está instalada no piso S1
do shopping Pátio Batel e, além de uma série de produtos em exposição, conta com um palco onde
apresentações e palestras vêm sendo realizadas. Devido a localização do shopping (a tradicional
Avenida do Batel que, desde 2013, possui os únicos calçamentos de granito da cidade) e às lojas de
alta grife ali franqueadas (Louis Vuitton, Gucci, Emporio Armani, etc.), cheguei mais cedo para
observar a representatividade (a presença) de negras e negros nas propagandas das lojas. Pequena:
ainda que na faxada do shopping a atual campanha da Prada seja protagonizada por uma mulher
negra, as lojas do piso térreo têm uma proporção de representatividade similar a da publicidade do
site do LABmoda: uma pessoa negra para cada cinco pessoas brancas – segundo dados da Pesquisa
Nacional Por Amostra de Domicílios (PNAD, 2015), 54% da população brasileira se autodeclara
negra ou parda. Ao menos no palco e na plateia, observei uma proporção mais condizente à
realidade do país.

O show foi como dito no começo: o público brasileiro (e também internacional: 13 de julho Lisboa,
Portugal; 19 Ostrava, República Checa) tem muito o que escutar e assistir dessa banda curitibana.
Além do carisma nos intervalos de uma música para outra, Lay, Lio e Machado atenderam a todos
os pedidos de fotos e abraços ao final da apresentação. Depois consegui conversar com a Lio no
camarim enquanto ela comia um sanduíche: quando perguntei o que ela achava da
representatividade de uma mulher negra em um palco de shopping no Pátio Batel, respondeu que
também é importante pensar na proporcionalidade. Também disse que apesar de já ter sido cuidada
por seguranças (“Acontece de ir em shoppings que os seguranças ficam olhando”), ficou feliz de se
reconhecer na plateia; de sentir que da plateia se reconheciam no palco. Que shows. E o ingresso foi
gratuito.
por Richard Roch

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