Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
CURSO DE HISTÓRIA
BANCA EXAMINADORA
RESUMO
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................... 7
2. FRONTEIRAS, DIÁLOGOS E INTERSECÇÕES: HISTÓRIA, LITERATURA E
ORIENTALISMO ....................................................................................................... 10
2.1 Mudanças paradigmáticas no campo da história ........................................... 10
2.2 História e Literatura........................................................................................... 12
2.2 Literatura e Orientalismo .................................................................................. 17
3. AS LEBRES CONFERENCIAM, PARA RESOLVER COMO IRÃO EXPULSAR
AS ÁGUIAS .............................................................................................................. 21
3.1 Svoboda ili Smert! – Liberdade ou Morte! ....................................................... 21
3.2 Tolstói fala aos puros ....................................................................................... 24
3.3 Todos os caminhos levam a Allah ................................................................... 28
4. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 32
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 35
7
1. INTRODUÇÃO
1
TOLSTÓI, Liev. Khadji-Murat. Traduzido por Boris Schnaiderman. São Paulo: Cosac Naify, 2009, p. 23.
9
2
BURKE, Peter et. al. A escrita da história: novas perspectivas. Tradução de Magda Lopes. São Paulo: Editora
da Universidade Estadual Paulista. 1992, p. 25.
10
O século XIX está mais caracterizado como o século do triunfo das ideias
e da suposta superioridade técnico-administrativa da Europa do que qualquer outro
aspecto que se possa pensar. Evidentemente, tal assertiva se mostra
completamente influenciada por um modelo de concepção histórica não
comprometida com as atuais posturas assumidas pela disciplina em termos de
elucidação e dissecação cada vez mais profunda das camadas onde o passado se
condensa.
A história, enquanto disciplina, passou por uma grande mudança nos
últimos cem anos; aquilo que se convencionou chamar de “método histórico” na
época de Leopold Von Ranke, por exemplo, hoje é posto em xeque. As relações que
a humanidade estabeleceu com o seu passado transformaram-se de maneira
significativa durante o século XX. Há cada vez mais pontos nebulosos rondando a
história, o que leva alguns teóricos a cogitar inclusive um suposto “fim” da mesma.
Esta não é uma perspectiva puramente contemporânea da qual ainda não
temos total consciência – pelo fato de estarmos ainda vivenciando-a – mas uma
indagação já antiga na ciência histórica. Encontramos a necessidade de rever as
fronteiras e parceiros das ciências históricas desde o início do século XX, e,
principalmente, a partir da Escola dos Annales. A escola teórica que vem ao mundo
através das mãos habilidosas de dois professores da Universidade de Estrasburgo:
Lucien Fevbre (1878-1956) e Marc Bloch (1886-1944).3
Os dois lançam em 1929 a revolucionária revista Annales d’ histoire
économique et sociale, que ficou famosa por sua tendência anti-positivista e o
rompimento com a escola metódica, imperante na época. Propôs-se, assim, uma
aproximação da história com as demais ciências e principalmente com as ciências
sociais. Este foi sem dúvida um momento impar para a disciplina, pois a colocou em
contato com outras ciências como a sociologia, a economia e a antropologia,
aumentando o seu leque de atuação.
3
TÉTART, Philippe. Pequena História dos históriadores. Traduzido por Maria Leonor Loureiro. Bauru:
EDUSC, 2000, p. 108.
11
Esse foi um importante passo que desde a década de 1930 até os dias
atuais vem sendo a marca registrada da disciplina histórica. Esta nova concepção de
história estimula a renuncia do uno em favor do múltiplo, o múltiplo olhar que traz a
tona novos personagens, novos lugares possíveis e mais que isso, propicia o
surgimento de novos olhares.
As atuais abordagens da disciplina estão sobremaneira interessadas em
renunciar do uno em favor do múltiplo. Pretende-se, cada vez mais, trazer à tona
novos personagens e novos lugares e, principalmente, novos olhares sobre estas
camadas do passado. Neste sentido, a disciplina tem passado por uma renovação
metodológica, estabelecido o diálogo com outras ciências que possam contribuir
para um entendimento mais sistêmico do passado.
4
FERREIRA, Antonio Celso. A fonte fecunda. In: PINSKY, Carla Bassanezi et. al. O históriador e suas
fontes. São Paulo: Contexto, 2009, p. 63.
12
5
Criador de um método muito particular de análise, interpretação e sistematização da história partindo de
elementos da vida cotidiana para acessar camadas mais amplas da realidade que ficou conhecida como micro-
história.
6
GINZBURG, Carlo. Nenhuma ilha é uma ilha: Quatro visões da literatura inglesa. Traduzido por Samuel
Titan Jr. São Paulo: Companhia das Letras, 2004, p. 14.
13
Já vimos que a resposta dada pela história foi de que ela é uma ficção
controlada, seja pelo método, seja pelas fontes, tal como pelo fato de que
lida sempre com o acontecido, embora variem as formas de representar
aquilo que aconteceu.7
7
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História e história cultural. 2. e.d. Belo Horizonte: Autêntica, 2005, p.82.
15
8
DARNTON, Robert. O beijo de Lamourette: cultura, mídia e revolução. Traduzido por Denise Bottmann:
Companhia da Letaras, 1990, p. 132.
9
SANTOS, Zeloí Aparecida Martins dos, História e Literatura: uma relação possível. Disponível em
HTTP://www.fap.pr.gov.br/arquivos/File/RevistaCientifica2/zeloidossantos.pdf . Acessado em: 15/06/2010 às
20:30h.
10
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História e história cultural. 2. e.d. Belo Horizonte: Autentica, 2005, p. 80.
16
11
DARNTON, Robert. O beijo de Lamourette: Cultura, mídia e revolução. Traduzido por Denise Bottmann:
Companhia da Letaras, 1990, p. 147.
17
12
JAUSS, Robert Hans. A história da literatura como provocação à Teoria Literária. São Paulo: Ática,
1994, p. 48.
18
Ele falava por ela e a representou. Ele era estrangeiro, relativamente rico,
do sexo masculino, e esses eram fatos históricos de dominação que lhe
permitiam não apenas possuir fisicamente Kuchuk Hanem, mas falar por
ela e contar aos seus leitores de que maneira ela era “tipicamente
oriental”.14
13
SAID. Edward W. Orientalismo: O oriente como invenção do ocidente. Traduzido por Rosaura Eichenberg.
São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p.33.
14
Ibidem, p. 33.
19
15
BHABHA, Homi K. O local da cultura. Traduzido por Myriam Ávila, Eliana Lourenço de Lima Reis,
Gláucia Renate Gonçalves. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998, p. 105.
16
Ibidem, p. 106.
17
SAID. Edward W. Orientalismo: O oriente como invenção do ocidente. Traduzido por Rosaura Eichenberg.
São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 35
20
18
O trecho na integra é o seguinte: “A única novidade que temos é que todas as lebres conferenciam, para
resolver como vão expulsar as águias. E as águias fazem em pedaços ora uma, ora outra. TOLSTOI. Khadji-
Murát, p. 27.
19
Os clãs que remontam a antiga organização social dos chechenos.
20
ROSHCHIN, Mikhail. Sufism and fundamentalism in Dagestan and Chechenya. Disponível em:
http://www.ceri-sciencespo.com/publica/cemoti/textes38/roshchin.pdf. Acessado em: 15/10/2010 as 23h.
22
21
Disponível em: http://www.flashpoints.info/countries-conflicts/Chechnya-web/Chechnya_briefing.htm.
Acessado em 20/11/2010.
22
MOURADIAN, Claire in FERRO, Marc et. al. O livro negro do colonialismo. Traduzido por Joana Angélica
D’Ávila Melo. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004, p. 445.
23
mas que foi na verdade uma herança de outro grande líder espiritual do Cáucaso
Norte, o Shaykh Elisha Mansour Ushurma, ou mais conhecido como Shaykh
Mansour.
Shaykh Mansour foi um erudito islâmico. Não temos informações precisas
sobre sua juventude, o que sabemos é que ele nasceu no vilarejo de Aldi (na
Chechênia) e ingressou na irmandade sufista – uma das vertentes do Islam de
cunho místico contemplativo – naqshbandi em sua sede – na cidade de Bukhara, na
Ásia Central. A primeira vez que caucasianos atacaram um destacamento russo foi
em 1785 no rio Shunzha. A partir desse episódio, Shaykh Mansour buscou unir os
muçulmanos do Cáucaso em uma ghazavat – guerra santa – contra os russos que
perdurou até sua captura em 1791.23
Toda essa encarniçada resistência só será neutralizada em 1859,
quando, já sem condições materiais para continuar a luta, Chamil resolve se render.
Apesar da aparente sensação de controle que os russos impuseram após a vitória
sob Chamil, o Cáucaso – especialmente a região da Chechênia – continuou sendo
uma terra hostil à dominação estrangeira e pequenos levantes perduraram por
muitas décadas.
O fato mais trágico de toda a história do povo checheno, no entanto, foi à
grande deportação ocorrida em 1944 a mando de Josef Stalin. Após terem sido
acusados de conspirar contra a Rússia em favor dos nazistas – os alemães nunca
estiveram no Cáucaso do Norte – os chechenos e seus vizinhos inguches foram
condenados à deportação em massa para os Gulags – os campos de trabalhos
forçados para onde eram mandados os opositores ao regime soviético – na Sibéria e
para os desertos da Ásia Central, sobretudo os desertos do Cazaquistão.
Recebendo permissão para retornar à sua pátria só em 1959, os
chechenos já haviam sido reduzidos à metade da população pré-deportação.
Reintegrados à sua terra natal, houve um período de estabilidade que seria rompido
com o fim da União Soviética e o surgimento dos movimentos separatistas da
década de 1990.
Após esse breve levantamento histórico, passamos, então, à análise de
obras literárias com o propósito de observar como tais eventos foram registrados a
partir do olhar do escritor Liev Tolstói.
23
BASHIRI, Iraj. The murid wars. Disponível em: http://www.angelfire.com/rnb/bashiri/CentAsia/Murid.html.
Acessado em 5/10/2010 as 16h.
24
24
TOLSTÓI, Liev. Khadji-Murat. Traduzido por Boris Schnaiderman. São Paulo: Cosac Naify, 2009. p. 24.
25
Grande líder dos muçulmanos caucasianos que lutou por mais de 20 anos contra os russos rendendo-se
somente em 1859.
25
26
Ibidem, p.21-22.
26
27
RAM, Harsha. Prisoners of the Caucasus: Literary Myths and Media Representations of the Chechen Conflict.
Disponível em: http://iseees.berkeley.edu/sites/default/files/u4/bps_/publications_/1999_01-ram.pdf. Acessado
em: 10/7/2010 as 20:30hs. p. 6.
28
Ibidem, p. 5.
27
29
Ibidem, p.8.
30
WHITE, Hayden. Trópicos do discurso: Ensaios sobre a Critica da Cultura. Traduzido por Alípio Correia de
Franca Neto. 2. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2001. (p. 204)
31
Ibidem, p. 208.
32
A verdadeira tradução da palavra árabe murid é discípulo.
28
33
ROBINSON, Francis. O mundo islamita : esplendor de uma fé. Madrid: Del Prado, 1996. p.118.
29
Isto só foi possível graças a um fato que a primeira vista pode passar
despercebido, mas que é fundamental para entender o processo de conversão
desses povos: a natureza da conversão e o ramo da religião islâmica ao qual esses
indivíduos foram introduzidos. O referido ramo da religião islâmica predominante na
região é o sufismo, a vertente mística do Islam que remonta aos tempos de
Muhammed:
34
Sufismo: O esoterismo secreto do Islã. Planeta. São Paulo: Ed. Três, nº 412, p. 54, jan. 2007
35
BASHIRI, Iraj. The murid wars. Disponível em: http://www.angelfire.com/rnb/bashiri/CentAsia/Murid.html.
Acessado em 05/10/2010 as 16h00min.
30
eles estão, em sua maioria, retratando cenas corriqueiras. Elas podem estar
associadas a uma seção legislativa na presença de um conselho de sábios na
aldeia, ou ao simples ato de receber um convidado.
O Islã é apresentado muitas vezes no romance pela sua peculiar prece
voluntaria, que aplicada a diversas situações remete ao espírito de gratidão, forte
traço da teologia islâmica. A cena a seguir descreve uma visita de Khadji-Murát a um
ancião como intuito de pedir ao filho do ancião que o guie até o lado russo da
fronteira. Observem como foi à recepção do ancião antes de iniciar um dialogo com
Khadji-Murát:
“O velho sentou-se em frente, sobre os calcanhares nus, cerrou os olhos e
levantou as mãos com as palmas para cima. Khadji-Murát fez o mesmo. Em
seguida, ambos proferiram uma oração e alisaram o rosto com as mãos,
36
que se tocaram na extremidade da barba.
36
TOLSTÓI, Liev. Khadji-Murat. Traduzido por Boris Schnaiderman. São Paulo: Cosac Naify, 2009. p. 27.
37
Ibidem. p. 164.
31
Desejo-vos paz eterna com Deus onipotente. Ouvi dizer que os russos vos
fazem e vos convidam a submissão. Não lhes deis credito e tende
paciência. Se não fordes premiados por isso na vida presente, sê-lo-eis na
futura. Lembrai-vos do que sucedeu outrora, quando vos tiraram as armas.
Se, em 1840, deus não tivesse feito descer sobre vós a razão, serieis
agora soldados, usaríeis baioneta em vez de punhal, as vossas mulheres
não usariam charovári e estariam desonradas. Julgai o futuro pelo
passado. É melhor morrer na guerra contra os russos do que viver com os
infiéis. Tende paciência, e eu irei até onde estais, com o sabre e o Corão, e
conduzir-vos-eis contra os russos. E agora vos ordeno severamente que
não tenhais intenção ou sequer o mais ligeiro desígnio de vos submeter
aos russos. 38
38
Ibidem. p. 169 e 170.
32
4. CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
BHABHA, Homi K. O local da cultura. Traduzido por Myriam Ávila, Eliana Lourenço
de Lima Reis, Gláucia Renate Gonçalves. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998.
BURKE, Peter et. al. A escrita da história: novas perspectivas. Tradução de Magda
Lopes. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista. 1992.
FERREIRA, Antonio Celso. A fonte fecunda. In: PINSKY, Carla Bassanezi et. al. O
históriador e suas fontes. São Paulo: Contexto, 2009.
GINZBURG, Carlo. Nenhuma ilha é uma ilha: Quatro visões da literatura inglesa.
Traduzido por Samuel Titan Jr. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História & História Cultural. 2. ed. Belo Horizonte:
Autentica, 2005.
ROBINSON, Francis. O mundo islamita : esplendor de uma fé. Madrid: Del Prado,
1996.
36
SANTOS, Zeloí Aparecida Martins dos, História e Literatura: uma relação possível.
Disponível em
HTTP://www.fap.pr.gov.br/arquivos/File/RevistaCientifica2/zeloidossantos.pdf.
Acessadoem: 15/06/2010 as 20:30.
Sufismo: O esoterismo secreto do Islã. Planeta. São Paulo: Ed. Três, nº 412, p. 54,
jan. 2007
Mapas:
ROBINSON, Francis. O mundo islamita : esplendor de uma fé. Madrid: Del Prado,
1996.