Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
BR/ESPECIAL/2019/DIPLOMACIA-BRASILEIRA)
22.abr.2020 às 16h00
Guilherme Casarões
SÃO PAULO Desde o início do mandato de Jair Bolsonaro, a política externa sob
influência direta do guru intelectual Olavo de Carvalho
(https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2018/12/sobre-o-que-fala-olavo-de-carvalho.shtml) foi um dos traços mais
marcantes do novo governo.
O desejo manifesto de ruptura fez com que muitos buscassem adjetivos para
caracterizá-la. Conservadora? Nacionalista? Antiglobalista? Subserviente?
A total submissão das diretrizes diplomáticas ao projeto pessoal (ou familiar) de poder
de Jair Bolsonaro, marcado pelo reacionarismo ideológico e pela truculência política, é
algo inédito no Brasil, mesmo nos períodos autoritários, e desconhecido entre
democracias consolidadas.
O chanceler Ernesto Araújo, à esq., e o presidente Jair Bolsonaro durante reunião do G20, por
teleconferência, em Brasília - Marcos Correa - 26.mar.20/Presidência da República via AFP
Ao tentar indicar seu filho Eduardo, de parcas credenciais, para chefiar a embaixada
brasileira em Washington (https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2019/10/planalto-deixa-indicacao-de-eduardo-bolsonaro-
a-embaixada-em-washington-em-suspenso.shtml), Bolsonaro deixou claro que se vê como um monarca
E nem todo líder populista faz da diplomacia a extensão de seu jogo político interno. A
atuação internacional de Getúlio Vargas, até durante o Estado Novo, ficou conhecida
por seu pragmatismo na relação com Berlim e Washington.
A ideia é rezar pela cartilha trumpista, sem filtros, ressalvas ou concessões, numa
adaptação da folclórica frase do ex-chanceler Juracy Magalhães: o que é bom para
Donald Trump é bom para Jair Bolsonaro (https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/04/bolsonaro-compete-
com-trump-para-ser-pior-criminoso-do-planeta-diz-noam-chomsky.shtml) (e, portanto, para o Brasil).
O recurso às massas se traduz na utópica ideia, repetida diversas vezes pela cúpula
bolsonarista, de que a política externa deve refletir os valores profundos do povo
brasileiro.
Para atingir o “povo”, a política externa populista precisa de inimigos, que sempre
devem ser descobertos, denunciados e combatidos. Ela se nutre, portanto, de
espantalhos externos e teorias conspiratórias.
A paranoia bolsonarista que inunda o WhatsApp não poupou nem o papa Francisco
(https://www1.folha.uol.com.br/colunas/nelsondesa/2019/09/conflito-de-bolsonaro-com-igreja-sobre-amazonia-chega-ao-exterior.shtml),
Como voz institucional do Itamaraty, Ernesto Araújo costuma ser discreto ao revelar
seu apetite conspiracionista, deixando suas elucubrações quixotescas para palestras
longas ou ensaios em seu blog pessoal.
Todos que bebem da fonte de Olavo de Carvalho são versados nas táticas de guerrilha
informacional do ideólogo e estrategista da alt-right americana, Steve Bannon
(https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2019/03/inclusao-de-bannon-em-agenda-de-bolsonaro-nos-eua-incomoda-casa-branca.shtml).
O principal método de ação da política externa populista é disparar fake news contra
desafetos internacionais do governo, como no episódio do vazamento de óleo na costa
nordestina, que seria parte de uma trama venezuelo-ambientalista.
(https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2019/10/bolsonaro-diz-ter-quase-certeza-que-derramamento-de-oleo-foi-criminoso.shtml)
Essa lógica binária e belicosa, inspirada na obra do jurista nazista Carl Schmitt, é um
dos pilares da chamada “metapolítica” da extrema direita, que atribui grande
importância à guerra cultural, que antecede a disputa política, e opera tanto no campo
das ações quanto das narrativas.
Por fim, a cantilena do nós contra eles agora busca demonizar a China como fabricante
de um vírus para destruir o Ocidente. Nascida na ultradireita americana, a expressão
“vírus chinês (https://www1.folha.uol.com.br/colunas/pablo-ortellado/2020/03/o-virus-chines.shtml)”, de contornos
racistas, caiu nas graças do bolsonarismo e estimula delírios conspiratórios de
funcionários do governo.
comunista.shtml)
Não restam dúvidas de que esse empreendimento populista tem pés de barro. Ao
equiparar presidente e Estado, submetendo os interesses estratégicos do país às
veleidades e às idiossincrasias da família Bolsonaro e de seus assessores próximos, a
política externa populista causa danos irreparáveis à imagem do país.
Pior ainda: caso o resultado das eleições americanas não seja o que os conselheiros
palacianos desejam, o Brasil será jogado no abismo da irrelevância mundial.
ENDEREÇO DA PÁGINA
https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/04/politica-externa-sob-bolonaro-e-
ernesto-araujo-inaugura-a-diplomacia-populista.shtml