Você está na página 1de 3

TRABALHO DE DIREITO PENAL – PARTE FLÁVIA e WILK.

DA CONSTITUCIONALIDADE DO CRIME DE INCITAÇÃO AO CRIME

Nossa legislação pátria resguarda a todos os cidadãos o direito à liberdade de


expressão/pensamento, tornando-as fundamental, ao passo que é garantido a sua
inviolabilidade, conforme consta expressamente em nossa Constituição Federal, em seu
art. 5º, LIV. No entanto, é sabido que não há em nosso ordenamento jurídico um direito
absoluto, que seja de caráter inviolável, nas palavras de Sarmento (2006, p. 293):

“Apesar da relevância ímpar que desempenham nas


ordens jurídicas democráticas, os direitos fundamentais
não são absolutos. A necessidade de proteção de outros
bens jurídicos diversos, também revestidos de
envergadura constitucional, pode justificar restrições aos
direitos fundamentais. ”

Em se tratando de direito fundamental, é possível que em determinadas situações haja a


colisão entre dois ou mais direitos. Pois, conforme ensina Marmelstein (2008, P. 365):

“As normas constitucionais são potencialmente


contraditórias, já que refletem uma diversidade
ideológica típica de qualquer Estado democrático de
Direito. Não é de se estranhar, dessa forma, que elas
freqüentemente, no momento aplicativo, entrem em rota
de colisão. ”

Por serem os direitos fundamentais de natureza principiológica, quando houver a colisão


de direitos fundamentais, é possível que haja um juízo de ponderação em cada caso,
para verificar qual desses direitos deverá prevalecer, por força do princípio da
proporcionalidade. Marmelstein (2008, p. 385) aduz que:

“O princípio da proporcionalidade não é útil apenas para


verificar a validade material de atos do Poder Legislativo
ou do Poder Executivo que limitem direitos fundamentais,
mas também para, reflexivamente, verificar a própria
legitimidade da decisão judicial, servindo, nesse ponto,
como verdadeiro limite da atividade jurisdicional. O juiz,
ao concretizar um direito fundamental, também deve estar
ciente de que sua ordem deve ser adequada, necessária
(não excessiva e suficiente) e proporcional em sentido
estrito. ”

No entanto, cumpre esclarecer que não haverá a anulação de um direito fundamental,


ele apenas ficará em detrimento de outro, que, no caso concreto, entendeu-se que
deveria prevalecer.

É o que acontece com o art. 286 do nosso Código Penal. Como dito anteriormente, o
presente artigo aduz que será punido aquele que incitar, publicamente, a prática de
crime. Claramente é possível verificar que há o detrimento da liberdade individual de
um indivíduo, pois a própria legislação cerceia sua opinião, que por sua vez não deveria
ser punido, pois, é garantido a este indivíduo, por força da nossa carta magna, o direito
de manifestar-se livremente, sem censura.

No entanto, cumpre esclarecer que a intenção do legislador ao reprimir a liberdade de


expressão/pensamento individual, era preservar outro bem jurídico, que também é
tutelado pelo estado – e é considerado tão importante quanto a liberdade de
expressão/pensamento – a segurança pública, prevista em nossa constituição federal, no
art. 144, que aduz:

“Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e


responsabilidade de todos, é exercida para a preservação
da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio, através dos seguintes órgãos (...)”

Segurança é um direito fundamental difuso, que os ambos os cidadãos e a sociedade


possuem de se sentirem protegidos, interna e externamente, em decorrência das políticas
públicas de segurança pública praticada pelo Estado e da prestação adequada, eficiente e
eficaz do serviço público de segurança pública. Aos olhos de Moraes, a segurança
pública é:

“Elemento necessário à prática democrática, é


indissoluvelmente compatibilizada com a manutenção da
ordem pública. Através desta se garante a incolumidade
das pessoas e o patrimônio público e privado. Os
objetivos mencionados consubstanciam um dever do
Estado para com os seus cidadãos, que têm direito à
própria segurança, vinculando-se, contudo, às
responsabilidades que dela decorrem. A lei disciplina a
organização e o funcionamento dos órgãos de segurança
pública, tendo em vista a eficiência de suas atividades”.
(MORAES, 2010, p.80)

Portanto, ao analisarmos o art. 286 à luz da constituição, temos a colisão de dois direitos
fundamentais, o da liberdade de pensamento/expressão, e o da segurança pública.
Contudo, não há que se falar em inconstitucionalidade, visto que neste caso, por força
do princípio da proporcionalidade, temos o detrimento de um direito fundamental
(liberdade de pensamento/expressão) em prol de outro (segurança pública), já que o
interesse público prevalece face ao particular, pois como bem defende Raquel Melo
Urbano de Carvalho:

“A necessidade de prevalência do bem comum enquanto


objetivo primordial a ser perseguido pelo Estado é um
pressuposto da própria sobrevivência social. Da
superioridade do interesse da coletividade decorre a sua
prevalência sobre o interesse do particular, como
condição, até mesmo, da sobrevivência e asseguramento
deste último. ”

Você também pode gostar