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Desafios da Educação: limites e alternativas necessárias.

Adufes

Demerval Saviani.

Avalia os pareceres das políticas públicas - 5 dilemas gerais:

1) Diagnostico relativamente adequado X Incapacidade em oferecer orientações (ao


propor orientações, o diagnóstico desaparece... supõe igualdade de condições e
propõe educação remota)
2) Excessivos no acessório X restritos no essencial. (quase não abordam o
essencial, a questão pedagógica, domínio do conhecimento para atuar no campo
educacional)
3) Centralidade da noção da competência X Incapacidade de superar a
incompetência formativa. (Competência central no cenário atual. Parecer V
reafirma, reforça e reitera a questão das normas curriculares nacionais. O recurso
à competência imprime um tom próprio afinado à política oficial, impregnado
pela pedagogia das competências, cujo sentido está sintetizado no verbete que
está no livro A Pedagogia no Brasil- Historia e teoria, na parte final –
Glossário de 50 verbetes)// A aquisição de competências como tarefa pedagógica
foi interpretada na década de 1960 a partir da natureza behavorista. Nessa
acepção, as competências se identificavam com os objetivos operacionais.
Atingi-los, isto é, tornar-se capaz de realizar as operações por eles traduzidas,
significava adquirir as competências correspondentes. Numa tentativa de superar
os limites do behavorismo, emergiu a teoria construtivista, na qual as
competências vão se identificar com os próprios esquemas adaptativos
construídos pelos sujeitos na interação com o ambiente. Num processo, segundo
Piaget, de equilibração e acomodação. Atualmente, no âmbito do
neoconstrutivismo, essa ideia de fundo se mantem, mas é despida do caráter
cognitivo, ligado à ideia de que o processo adaptativo para ter êxito suporia em
algum grau o conhecimento do meio pelo sujeito obtido segundo esquemas
conceituais prévios como entendia Piaget. Mas agora isso já é afastado. A
questão da verdade é deixada de lado. O neoconstrutivismo se funde com o
neopragmatismo. E as competências resultam assimiladas aos mecanismos
adaptativos do comportamento humano ao meio natural e social. Para a
adaptação ao meio natural e material entrariam em cena as competências
cognitivas; e os mecanismos de adaptação ao meio social seriam constituídos
pelas competências afetivo-emocionais. Então essa redução das competências
aos mecanismos adaptativos restritos à cotidianidade acaba redundando numa
extrema incompetência dos novos profissionais formados pela educação superior
para lidar com a complexidade das tarefas que terão de desenvolver.
4) Formação do professor técnico X formação do professor culto (cursos de longa
duração)
5) Dicotomia entre os dois modelos básicos de formação de professores: o modelo
cultural cognitivo que prevalece nos cursos de licenciatura, e o modelo
pedagógico didático que prevalecia nos modelos normais.
Grau que a educação à distancia pode se equivaler à presencial – São
equivalentes?

Grande risco que enfrentamos nessa situação de excepcionalidade. Vem nos forçar a
substituir. Expressão alternativa de “ensino remoto” apenas para caracterizar que
não se trata de EAD. Mas o que ocorre é que o ensino remoto é feito à distancia
com o mesmo ferramental.

O que precisa ficar claro, como caracterizei no primeiro capitulo do livro (da
natureza e especificidade da Educação) Pedagogia Histórico-Critica: primeiras
aproximações, é que a Educação é uma atividade especificamente humana, que se
destina à própria produção do ser humano. O ser humano não tem a sua existência
garantida pela natureza, diferentemente, portanto, dos outros animais (que tudo o
que precisa para sobreviver a natureza provê, então, basta ele se adaptar à natureza),
enquanto que o homem precisa fazer o contrário, ele precisa adaptar a natureza a si,
ajustá-la às suas necessidades, portanto, agir sobre a natureza e transforma-la. Então,
a constituição do homem se dá pela via da Educação, da Cultura. Porque é isso que
faz o ser humano. Tanto assim é que um individuo humano fora do convívio
humano ele normalmente perece. E se por alguma circunstancia excepcional (os
exemplos históricos das crianças selvagens. Na França final sec. XVIII. Não andava
sobre os pés, não falava e se alimentava diretamente com a boca- isso mostra que
embora tendo sobrevivido, ele não assumiu a forma humana, mas a dos animais do
ambiente que ele sobreviveu). O homem se forma por um processo que envolve a
apropriação das objetivações humanas produzidas pela humanidade e que ao nascer
ele já encontra essa situação configurada. E para viver nessa sociedade, ele precisa
assimilar aqueles elementos que se acumularam historicamente, configurando a
forma de vida dessa sociedade. E esse processo é aquilo que se configura como uma
produção não-material. Então, o homem para existir precisa agir sobre a naureza,
transformando, criando aqueles elementos materiais que ele necessita para existir.
Isso é a produção material. Mas além disso, na medida em que para agir sobre a
natureza, ele precisa antecipar as suas ações mentalmente, então ele produz também
ideias, produz valores, produz as artes. Então isso configura a produção não
material. E é nesse âmbito que se situa a educação, uma modalidade da produção
não meterial. Mas esta ultima tem duas modalidades: Uma é aquela em que o
produto se separa do produtor, o que ocorre com os objetos artísticos de um modo
geral, a obra de arte é uma produção não material mas que se expressa
materialmente e se autonomiza do produtor e aí entra no processo de circulação
submetida ao capital comercial; os livros são não material também, mas na medida
em que ele é gravado no livro, também entra na circulação comercial e se distingue
do ato de produção; mas há uma modalidade que é aquela que o produto não se
separa do produtor. E a educação se situa nesse âmbito, como a medicina. Marx dá o
exemplo do medico, eu preciso do medico e não de um moleque de recado, pra curar
ele precisa examinar o paciente, e outro exemplo que ele dá é do professor. A aula é
produzida e consumida ao mesmo tempo e portanto supõe essa relação direta, essa
interrelação. Os recursos então são mediações para a realização desse ato que é
interpessoal e portanto supõe a presença do professor e do aluno em interação. O
fato de haver recursos não significa que esse ato deixe de existir ou possa ser
substituído pela relação com as máquinas. Basta considerar a historia da educação e
da Pedagogia para se considerar isso. Na Idade media não havia os recursos que
temos hoje, livros, cadernos.. Os alunos tinham uma prancheta na qual anotavam o
que o professor explicava, ele era até chamado de Lente porque ele lia. Monges
copistas. Gutemberg. Imprensa. Livros. Escolas passam a usar livros. Cadernos, a
escola passa a usar cadernos. Quando chegamos às novas tecnologias, também são
utilizadas como recursos para o desenvolvimento das aulas, mas supõe sempre essa
diferença do contato da produção não material que se materializa naqueles
elementos fora do momento em que foram produzidos e a que se dá no próprio
momento de produção, e é isso que diferencia a educação. Portanto, o ensino e as
aulas.

Daí pode-se pensar que uma aula pode ser gravada e depois ouvida em diferentes
situação sem a presença do professor, bem como ser lida. Mas vejam que são coisas
diferentes. Exemplifica os cursos franceses que depois viravam livros. Proprio
Hegel, lições de filosofia, Lições de Estetica.

Mas vejam bem, são coisas diferentes. Podemos ler os livros, mas isso não é ensino.
Porque? Porque quando eu leio estou assimilando o conteúdo do que eu leio, mas
não se configura aí a relação pedagógica, educativa. É esse o problema com a
educação à distancia. Ela acaba sendo concebida como aulas de professores com
grande domínio, que são projetadas. Estar numa situação de ensino-aprendizagem é
diferente de assistir a um filme, um documentário, um programa de televisão. A
EAD pretende ser ensino, mas o que acontece, quem recebe essa instrução está em
situação que pode não ter os requisitos que foram pressupostos para aquela aula
gravada. É por isso que é preciso que aja um monitor num espaço de recepção
daquela aula a distancia. Esse monitor não é o professor, ele auxilia. Mas se entende
que ele não precisa ter a formação e nem o salario que corresponde a carreira do
docente. No entanto, de fato, é ele o verdadeiro professor, pois é ele que está na
relação pedagógica. Para que isso tenha a mesma qualidade do presencial, esse
monitor deveria ter uma formação especifica, dedicação exclusiva e um salario
justo, de professor habilitado. No entanto, não é isso que se concebe quando fala de
EAD. É por isso que tratamos de EAD como algo que corresponde às demandas do
mercado, porque reduz os custos com o trabalho docente e permite a extração de
mais valia nesse tipo de atividade.

É por isso que consideramos que a EAD não deve ser generalizada e nunca poderá
substituir a educação presencial.

Durante a pandemia, as recursos de tecnologia devem ser utilizados como meios de


comunicação, como forma dos professores das escolas e instituições se
comunicarem com os estudantes, a população, atividades que possam compensar a
redução e eliminação das atividades, mas sempre endo claro que não se trata de
atividades equivalentes, de substituição da educação presencial, que tem de ser
considerada em termos de um momento excepcional. Atividades formativas
complementares. Claro que é uma situação de suspenção das atividades regulares.

Desafios em torno da formação dos professores:

Superam o contexto da pandemia, mas se tornam candentes hoje.

1) Fragmentação e dispersão das iniciativas justificadas pela chamada


diversificação de modelos de organização da educação superior; (propõe uma
concepção orgânica, as faculdades como locais privilegiados para a formação
dos professores)
2) Descontinuidade das politicas educacionais; (defende uma politica de longo
prazo que priorize a formação de prof. Cultos e cursos de longa duração)
3) Burocratismo da organização e funcionamento dos cursos, no qual o formalismo
do cumprimento das normais legais se impõe sobre o domínio dos
conhecimentos necessários para o exercício da profissão; (transformação das
faculdades de educação em espaços de ensino e pesquisa que possam colocar os
jovens proponentes ao magistério colocando-os em um ambiente de tenso e
exigente estimulo intelectual)
4) Separação entre as instituições formativas e o funcionamento das escolas no
âmbito do sistema de ensino; (forte articulação entre os cursos de formação e o
funcionamento das escolas, considerando dois aspectos: tomar o modo de
funcionamento das escolas como ponto de partida da organização do processo
formativo e redimensionar os estágios como um instrumento que situe a
administração dos sistemas de ensino, as escolas de educação básica e as
faculdades de educação, atuando conjuntamente em regime de colaboração na
formação dos novos professores)
5) O paradoxo pedagógico expresso na contraposição teoria e pratica, entre
conteúdo e forma, entre conhecimento disciplinar e saber pedagógico-didatico;
(sua solução demanda uma formulação teórica que supere as oposições
excludentes e consiga articular teoria e pratica, conteúdo e forma, assim como
professor e aluno em uma unidade compreensiva desses dois polos, e
contrapondo-se entre si, dinamizam e põem em movimento o trabalho
pedagógico. E essa nova formação teoria foi a tarefa a que se propôs a teoria
pedagógica histórico-critica).
6) Jornada de trabalho exaustiva e baixos salários (formação não terá êxito sem
medidas correlatas à carreira e trabalho que valorizem o professor, envolvendo
jornada de trabalho de tempo integral em uma única escola e salários dignos que
valorize socialmente o papel do professor).

A questão estrutural e a Educação


A Igualdade de acesso às escolas pressupõe a igualdade das condições de vida,
das condições sociais. Politicas sociais que favoreçam os que mais precisam,
contra a exploração excessiva do capital. Se não se levar em conta isso, não
conseguimos resolver os problemas de vários tipos, não só da educação, mas da
saúde., etc.
Pensar as questões educacionais a partir das práticas sociais. Articular a
formação social com o processo de transformação dessa forma de sociedade.
Problema da pandemia se dá em um contexto de problemas sociais crônicos.

Política atual no Brasil

Golpe 2016. Aprofundamento das mazelas do neoliberalismo, submissão ao


rentismo e capitalismo financeiro. Destruição das industrias. Operando uma espécie
inédita de autocolonização do país.

Politica de substituição de importações vem sendo revertido. O entendimento


corrente de um país subdesenvolvido era a de um país menos desenvolvido. Daí a
ideia de que ele precisa e desenvolver para chegar a se tornar desenvolvido. Mas o
conceito de subdesenvolvimento não significa isso, porque isso seria um pré-
desenvolvimento. O subdesenvolvido significa um desenvolvimento subordinado
(exporta matéria prima e importa manufaturado).

Resistência Ativa – Estratégia que ele propôs ao final do livro sobre a nova LDB.
Participou da aprovação da LDB 87/88. Houve um revertério no senado, projeto
mudado por Darcy Ribeiro, sob o efeito de FHC. Uma politica educacional que já
apontava nessa direção neoliberal que veio a prevalecer. Lei aprovada em dezembro
de 1996. Em 1997 lança o livro A nova lei da educação.

Resistencia ativa: não adiantava resistir passivamente. Eu resisto, eu discordo. Mas


apenas manifesto a minha discordância. Então a resistência ativa supunha dois
requisitos: 1) que fosse coletiva. Mobilização de todos os profissionais da educação,
articulados com os professores, sindicatos de demais trabalhadores, movimentos
sociais populares; 2) tivesse proposta alternativa.

Ultimamente tenho retomado isso. Na resistência à politica atual, a essa direita.


Resistencia que implica mobilização ampla, coletiva (sindicatos, movimentos
sociais, partidos de oposição).

O Papel da escola

Não é verdade que vivemos na sociedade do conhecimento. Vivemos na sociedade


da informação, que não é a mesma coisa que conhecimento. Conhecimento supõe a
compreensão das relações, das estruturas, do modo como a realidade está
estruturada. Do modo como a sociedade se desenvolveu, funciona. O conhecimento
é o domínio dessas relações.
O que está acessível a um clique são as informações. Pra ter acesso ao conhecimento
eu preciso ir além desses meios, desses instrumentos. E ainda é a escola onde posso
ter acesso aos conhecimentos. Alias, o próprio elemento pressuposto para eu ter
acesso as informações pela internet é na escola que se obtem, é a alfabetização.

A forma mais apropriada para se passar da condição de analfabeto para alfabetizado


é a forma escolar. Além disso, há um problema de outra ordem. Está bem, com os
meios das chamadas tecnologias digitais, tenho acesso aos mais varados tipos de
informações. Mas como é que eu vou distinguir as informações relevantes das
irrelevantes? E como é que eu vou distinguir as verdadeiras das falsas? Isso não está
dado pelos meios de informação. Isso está dado pelo domínio dos conhecimentos
que eu vou adquirir nas escolas. A partir ds escolas tenho uma formação que me
permite captar como a realidade está estruturada, quais são as relações fundamentais
que preside a vida humana, e a partir daí aprendo a distinguir, desenvolvo critérios
de distinção. Passo a acessar a internet, as informações, mas tenho esses critérios.

Papel fundamental e ainda mais importante nessas condições em que as informações


são disseminadas de forma caótica e com uma mistura enorme do que é falso e
verdadeiro. Relevante e irrelevante.

Até 1:48:39

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