Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resumo: O artigo apresenta observações sobre como a centralidade do trabalho pode ser percebida
na atualidade, buscando embasamento na teoria marxiana e discutindo fenômenos atuais que
exemplifiquem tal condição. Buscamos desenvolver uma investigação teórica que permitisse ilustrar
como é possível interpretar a centralidade do trabalho e como as contradições do trabalho se
manifestam atualmente. Assim, o presente estudo analisa o papel do trabalho a partir de Marx e
exemplifica suas contradições à luz de problemáticas atuais como a manutenção da lucratividade
diante do drama da pandemia de Covid-19, as preocupações da OIT com o Trabalho Decente e a
frustração de trabalhadores com as funções que exercem.
Palavras-chave: Trabalho; Estranhamento; Trabalhadores.
2 A CENTRALIDADE DO TRABALHO
2 O sentido de capital utilizado no decorrer da pesquisa é o atribuído por David Harvey: “O capital é um
processo, e não uma coisa. É um processo de reprodução da vida social por meio da produção de mercadorias
em que todas as pessoas do mundo capitalista avançado estão profundamente implicadas. Suas regras
internalizadas de operação são concebidas de maneira a garantir que ele seja um modo dinâmico e
revolucionário de organização social que transforma incansável e incessantemente a sociedade em que está
inserido. O processo mascara e fetichiza, alcança crescimento mediante a destruição criativa, cria novos desejos
e necessidades, explora a capacidade do trabalho e do desejo humano, transforma espaços e acelera o ritmo da
vida. Ele gera problemas de superacumulação para os quais há apenas um número limitado de soluções
possíveis” (HARVEY, 2016, p.307.)
Segundo Marx, na sociedade burguesa3 - sociedade que tem por princípio a divisão
do trabalho e a propriedade privada - o trabalho se manifesta de forma alienada e estranhada.
Compreender a distinção entre alienação e estranhamento, segundo a compreensão
marxiana, nos auxilia no conhecimento das relações entre homem, trabalho e capital. A partir
da crítica à economia política e da fenomenologia hegeliana - nos Manuscritos econômicos-
filosóficos de 1844 - Marx passa a esboçar sua compreensão sobre a alienação e o
estranhamento humano. Teoria que, por se basear na análise da divisão do trabalho e da
propriedade privada, ainda se faz atual, uma vez que tais pressupostos ainda não foram
superados.
A respeito das categorias alienação e estranhamento, Ranieri (2001) afirma que a
unidade entre alienação e estranhamento no interior da teoria de Marx está associada não
exatamente a uma mesma significação, mas à determinação de um pelo outro. Ao objetivar-
se no produto de seu trabalho, o homem se aliena para que possa ser realizada a produção
de si – como ser que se constrói pelo trabalho - e dos meios que saciam suas carências. Em
virtude da acentuada divisão do trabalho, caráter imprescindível do capital, essa alienação se
apresenta de forma negativa, pois o mantém cada vez mais distante de sua realização.
A alienação que mantém o homem apartado de sua criação se exprime como
estranhamento quando o homem não se reconhece em seu próprio trabalho. Não se
reconhecer naquilo que produz, naquilo que o efetiva como ser humano, faz com que se
3Segundo Marx é a sociedade (bürgerlicheGesellschaft), na qual cada indivíduo é um todo de carências, e apenas é
para o outro, assim como o outro apenas é para ele, na medida em que se tornam reciprocamente meio.
3 A PRIORIDADE DO CAPITAL
Ao despir a economia nacional de sua pretensa análise crítica, Marx elogia suas
posições diante da teoria fisiocrata mas pontua suas limitações e suas consequências nocivas
ao homem. Ao não perceber o estranhamento e reivindicar a propriedade privada como
essência do homem, a economia nacional anula suas próprias pretensões de uma
compreensão da natureza do trabalho.
A não percepção do estranhamento, que produz carências de todo tipo no gênero
humano, é apontada por Marx como o ponto alto da falha dos economistas nacionais. De
acordo com Marx (2010) as análises dos economistas nacionais sobre o trabalho não
percebem as contradições que engendram a atividade produtora e, dessa forma, naturalizam
a exploração do trabalho e não enxergam a perversidade do estranhamento para a
coletividade humana.
No interior da sociedade amparada pela propriedade privada o que se tem é a
constante criação de carências. Cada homem busca formas de desenvolver no outro uma
nova carência para, com isso, forçá-lo a um novo sacrifício; a fruição de um está condicionada
à ruína econômica de outro. “Cada qual procura criar uma força essencial estranha sobre o
outro, para encontrar aí a satisfação de sua própria carência egoísta [...]” (MARX, 2010, p.
139).
4The course of the global health crisis and the fate of the global economy are inseparably intertwined. Fighting
the pandemic is a necessity for the economy to rebound. That is why the WHO and IMF are cooperating
closely with one another, and with other international organisations, to help address countries’ priority needs
5A Organização Internacional do Trabalho (OIT) mantém 40 escritórios pelo mundo e é integrada por 187
países, sendo composta por governos, representantes dos empregadores e dos trabalhadores.
6 https://valor.globo.com/carreira/recursos-humanos/noticia/2013/05/08/maioria-das-pessoas-nao-gosta-
de- seu-trabalho.ghtml acessado em 09/04/2020.
7
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2017/12/11/trabalhador-com-carteira-assinada-teme-mudanca-
com-a-reforma-revela-pesquisa.ghtml
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dos apontamentos feitos até aqui, consideramos que o trabalho é fator
central na vida do ser humano. Sem ele não há a possibilidade da vida social, pois somente
através dele garantimos a satisfação das carências materiais e espirituais. Fato que afasta a
hipótese de uma sociedade sem trabalho ou emancipada do trabalho, mas, ao mesmo tempo,
coloca a necessidade da superação da forma de trabalho atualmente predominante.
O modo como o trabalho se expressa na sociedade atual assume um caráter
estranhado, que afasta o sujeito da possibilidade de autorrealização no ato de produção da
vida e nos seus produtos. A contradição existente no trabalho – quando este se apresenta
como prática que simultaneamente é formadora e deformadora – nos coloca a questão de
como criar condições de plena satisfação dentro de um sistema que aliena o trabalhador dos
Referências
LUKÁCS, György. Para uma ontologia do ser social II. 1ª. ed. São Paulo: Boitempo,
2013. Para uma ontologia do ser social I. São Paulo: Boitempo, 2012.
Crescimento de salários desacelera no mundo para nível mais baixo em 4 anos, 2020c.
Disponível em <https://brasil.un.org/pt-br/75241-crescimento- de-salarios-desacelera-no-
mundo-para-nivel-mais-baixo-em-4-anos>. Acessado em 27 de ago. de 2021.
OIT mostra que apenas 10% dos trabalhadores recebem quase metade do salário global,
2020d. Disponível em https://news.un.org/pt/story/2019/07/1679002. Acessado em 27
de ago. de 2021.
PARO, Vitor Henrique. Parem de preparar para o trabalho!!! Reflexões acerca dos efeitos
do neoliberalismo sobre a gestão e o papel da escola básica. In: FERRETI, João Celso;
JUNIOR, João dos Reis Silva; OLIVEIRA, Maria Rita N. Sales (Orgs). Trabalho,
Formação e Currículo: para onde vai a escola? São Paulo: Xamã, 1999. p. 101-120
VÁSQUEZ, Adolfo Sánchez. Filosofia da Práxis. 2ª Ed. São Paulo: Expressão Popular,
2011.