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O MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA E AS INICIATIVAS DE

FORMAÇÃO DOCENTE

CLARAS, Antonio Flavio - PUCPR 1


flavio.claras@bol.com.br

PINTO, Neuza Bertoni – PUCPR 2


neuzard@uol.com.br

Educação: Profissionalização Docente e Formação

Resumo

O presente estudo é parte de uma pesquisa em andamento no Programa de Mestrado em


Educação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e discute aspectos do Movimento da
Matemática Moderna (MMM) ocorrido no Brasil nas décadas de 1960 e 1970. O objetivo é
analisar a trajetória histórica da modernização da matemática escolar no Brasil e as primeiras
ações voltadas à formação dos professores para o ensino da Matemática Moderna. Para tanto
descreve e analisa as primeiras manifestações de modernização iniciadas na Europa, a partir
do final do século XIX e suas repercussões no Brasil. Na análise da segunda fase do
movimento, iniciada a partir de 1960, o estudo destaca o papel dos grupos criados para
estudar a proposta de modernização da Matemática, como o GEEM (Grupo de Estudo do
Ensino de Matemática) em São Paulo e o NEDEM (Núcleo de Ensino e Difusão do Ensino da
Matemática), no Paraná, bem como as iniciativas e ações dos representantes do movimento
voltadas para a implementação da reforma nas escolas, em especial, as primeiras experiências
de formação de professores para o ensino da Matemática Moderna, desenvolvidas pelo
GEEM, em São Paulo. O estudo, de dimensão histórico-bibliográfica, utiliza aportes de
pesquisas recentes da história da Educação Matemática: Miorim (1998), Valente (2006), Pinto
(2005), Burigo(1989), dentre outros O Movimento da Matemática Moderna que começou na
Europa e nos Estados Unidos, chegou ao Brasil num momento em que o país passava por
importantes mudanças políticas, econômicas, sociais e culturais. O estudo levanta novas
questões acerca do MMM tendo em vista contribuir para o avanço da pesquisa histórica do
movimento que pretendia revolucionar a matemática escolar adequando-a às transformações
científicas e tecnológicas que marcaram o período.

Palavras-chave: História da educação matemática; Movimento da matemática moderna;


GEEM; NEDEM; Formação de professores.

1
Mestrando em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná;
Orientando da Professora Doutora Neuza Bertoni Pinto
2
Professora Titular do Programa de Mestrado e Doutorado em Educação da Pontifícia Universidade Católica do
Paraná
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Introdução

O presente estudo faz uma discussão da trajetória do Movimento da Matemática


Moderna (MMM) no Brasil desde a sua primeira fase, iniciada no final do século XIX início
do século XX, na Europa, até o seu momento de maior repercussão no Brasil- 2ª. fase,
ocorrida a partir de 1960.
A primeira fase foi marcada pelas discussões iniciadas no final do século XIX e durou
até o início da I Guerra Mundial em 1914. O fato mais relevante ocorrido nesse período foi a
fundação da Internationale Mathematische Unterrichskomission (IMUK), associação
composta por professores de Matemática que defendiam as idéias de modernização dessa
disciplina escolar e tinha como tarefa principal estruturar as idéias discutidas pelos seus
membros durante os eventos organizados pelo grupo.
A segunda fase do movimento foi mais longa. As discussões retomadas após o final da
I Guerra Mundial, por volta da metade da década de 1920, culminaram com a disseminação
intensiva do movimento a partir da década de 1960.
Entre as décadas de 1930 e 1950, período marcado pela segunda Grande Guerra, o
movimento de modernização continuou ocupando espaços importantes nas discussões com a
preocupação maior centrada numa matemática escolar mais contextualizada, menos
complexa, mais acessível a todos os alunos, em especial aos da escola secundária. Tais
preocupações fizeram com que um grupo de matemáticos, na maioria franceses, chamado
Bourbaki publicasse trabalhos resultantes de seus estudos, que viriam se tornar referência para
o MMM. Também as mudanças econômicas, políticas, sociais, culturais e uma nova demanda
na educação, causadas principalmente em conseqüência da II Guerra Mundial tiveram um
peso importante no desenvolvimento dessa nova proposta.
Surgido na Europa e nos Estados Unidos, essa segunda fase do MMM foi trazida para
o Brasil no início da década de 1960. No Brasil se caracterizou por ter sido um movimento
surgido da base, com características próprias de organização. Sua principal particularidade,
entretanto, consistia no fato de que os representantes do movimento discutissem nos seus
grupos a nova proposta e propusessem formas de implementação nas escolas. Vários grupos
de professores se formaram nesse período em diversas regiões do Brasil com o objetivo de
conhecer, estudar e aplicar a nova proposta. Alguns deles como o GEEM (Grupo de Estudo
do Ensino de Matemática) de São Paulo e o NEDEM (Núcleo de Estudo e Difusão do Ensino
da Matemática) do Paraná, que além de aulas demonstrativas, dos cursos e treinamentos
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organizados por eles e oferecidos a outros professores em seus estados ou até em outras
regiões do país, como foi o caso do GEEM, chegaram a publicar coleções de livros didáticos
de Matemática Moderna, tendo em vista democratizar as idéias modernizadoras advindas do
movimento.
Os dois grupos GEEM e NEDEM, que servem como referências para nossa pesquisa,
foram fundados no início da década de 1960. Nasceram junto com o movimento e tiveram
grande influência na disseminação do MMM em seus estados. O grupo GEEM, liderado pelo
Professor Osvaldo Sangiorgi foi o grupo com maior destaque no Brasil.
Ao final da década de 1970 o movimento já estava em extinção. Com o fim do
movimento restaram questões importantes que merecem ser investigadas. E é na perspectiva
de contribuir com essa investigação que estamos desenvolvendo esse trabalho.

A primeira fase do movimento.

A idéia de modernizar a Matemática surge a partir do final do século XIX em razão de


vários fatores. Dentre eles, as mudanças que ocorriam no campo da economia, resultantes dos
avanços tecnológicos e a expansão da indústria; as discussões e as reformulações dos
currículos da escola secundária, observadas em vários países da Europa e também nos Estados
Unidos, onde se discutia se o ensino deveria estar centrado na formação técnica ou na
formação humanista; as propostas de democratização do ensino; e por último a preocupação
em ensinar aos alunos uma Matemática mais prática, mais contextualizada, tendo em vista
eliminar o alto nível de abstração e complexidade da “velha matemática”. Segundo Miorim
(1998) esses fatores justificam as iniciativas dos educadores matemáticos daquele período em
buscar uma proposta modernizadora e com o objetivo de internacionalizar a matemática
escolar.
Esses aspectos tornaram-se evidentes no final do século XIX quando os educadores
matemáticos, em especial da Europa e dos Estados Unidos, começaram a se organizar em
eventos internacionais. O início foi marcado pelo I Congresso Internacional de Matemática
realizado em 1897 em Zurique. As discussões que aconteceram nesse evento permitiram que
se tornassem “(...) público os problemas relacionados ao ensino da Matemática, enfrentados
por diferentes países, e as formas encontradas para solucioná-los”. (MIORIM, 1998 p. 71)
Os dois congressos seguintes contribuíram para reforçar essas idéias, o que levou o
professor o norte-americano David Eugene Smith a escrever um artigo com base nas
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observações feitas por ele relacionadas às questões levantadas nos encontros, sugerindo a
criação de uma comissão internacional para discutir tais questões que eram comuns à
Matemática. (Miorim, 1998).
No IV Congresso Internacional de Matemática realizado em Roma, em 1908, foi
criada a IMUK (Internationale Mathematische Unterrichskomission) que a partir de 1954
passou a ser denominada ICMI (International Comission on Mathematical Instruction). A
criação dessa comissão e a aprovação de uma proposta para que os países participantes
informassem como estava o ensino de Matemática, em especial na escola secundária, marcou
o início da primeira fase do movimento pela modernização da Matemática. O Brasil, neste
evento, participou como país convidado, ou seja, não tinha direito a voto (Valente, 2006).
Quatro anos após, realizou-se em Cambridge, em 1912, o V Congresso Internacional
de Matemática, evento no qual o Brasil oficializou sua participação. Nesse período a IMUK
realizou várias reuniões para discutir a proposta aprovada no IV Congresso, realizado em
Roma. Essas discussões e eventos duraram até o início da I Guerra Mundial, em 1914. A
partir daí houve uma interrupção dos encontros em razão do envolvimento no conflito de
países que também participavam do movimento. Segundo Miorim (1998) nessa primeira fase
de modernização da matemática escolar foram produzidos resultados nunca vistos antes na
área da Educação Matemática.
Terminada a I Guerra Mundial e ainda na primeira metade da década de 1920 a IMUK
volta a se reunir, retomando as discussões anteriores e reacendendo, portanto, as idéias de
modernização da matemática escolar. Num primeiro momento foram impostas restrições aos
países que faziam parte da IMUK, mas que haviam sido derrotados no conflito. Felizmente
isso passou logo, e prevaleceu a preocupação com uma nova sistematização do ensino da
Matemática o que estimulou a retomada dos eventos e das discussões acerca da disciplina
Matemática.

As primeiras mudanças ocorridas no Brasil e o grupo Bourbaki

No Brasil, as discussões desencadeadas na primeira fase do movimento se refletiram


na proposta apresentada em 1928, pelo Professor Euclides Roxo, então diretor do Colégio
Pedro II, localizado no Rio de Janeiro, uma instituição que era referência em educação no
Brasil naquele período. Essa proposta foi desenvolvida pela congregação do referido colégio,
com base nas discussões apontadas na IMUK e sugeria alterações significativas para o ensino
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da Matemática. Apresentava como inovação a idéia de unificação das matemáticas, ou seja,


consistia em tornar a Álgebra, Geometria e Aritmética uma só disciplina, denominada
Matemática. É importante ressaltar que essa idéia, que era novidade no Brasil, já havia sido
adotada em outros países como Alemanha e Estados Unidos, e também questionada sua
aplicação em outros, como Itália e Inglaterra. E apesar da proposta ter sido prescrita quase
sem nenhuma alteração na Reforma Francisco Campos em 1931, sofreu forte resistência da
ala dos professores de Matemática mais conservadores da época, que tinham como base para
sua resistência principalmente os argumentos levantados por esses países que não aderiram à
nova proposta. (Miorim, 1998).
Outra iniciativa de modernização da matemática escolar que também veio provocar
mudanças no Brasil, surgiu em meados da década de 1930, com o grupo Bourbaki. Era um
grupo de matemáticos composto na sua maioria por franceses. Esse grupo publicou vários
trabalhos cuja proposta consistia em apresentar uma Matemática avançada, pautada no rigor e
na simplicidade. Essa “nova matemática” tinha como eixo norteador de sua proposta a Teoria
dos Conjuntos, de George Cantor, publicada em 1874. Nesse ponto residia o diferencial entre
a segunda e a primeira fase do movimento, cujo eixo integrador da proposta era o tema
funções.
A proposta de Bourbaki, que o próprio grupo definia como sendo rigorosa, simples,
axiomática e independente, provocou grandes impactos mundo afora. Suas observações foram
tão importantes que os trabalhos produzidos por eles tornaram-se referência na elaboração da
proposta do Movimento da Matemática Moderna (MMM) a partir do final da década de 1950
na Europa.

O momento histórico do movimento

Segundo Julia (2000) para se ter uma concepção de um dado momento histórico é
necessário “(...) compreender antes suas relações conflituosas ou pacíficas que ele mantém
com o conjunto das culturas que lhes são contemporâneas”.
Para Valente (2006) é necessário “(...) que sejam construídos referenciais da Educação
Matemática levada a cabo em grande parte da segunda metade do século XX no Brasil”. Para
tanto, é imprescindível intensificar as pesquisas, objetivando atingir a maior proximidade
possível do que efetivamente esse MMM representou na sua época e as influências que, por
ventura, ainda exerça nas ações pedagógicas dos professores de Matemática.
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A construção desses referenciais torna-se fundamental para que se tenha uma idéia
mais elaborada da abrangência dos fatos produzidos por esse movimento e as implicações
destes fatos nas práticas escolares.

A compreensão do alcance de um movimento envolve a investigação do contexto


de sua emergência, dos interesses e motivações de seus protagonistas, das forças
que o apoiaram ou a ele se opuseram, de sua capacidade de conquistar adesões e
das condições, enfim, com as quais se defrontou e que pretendeu ou pôde ou não
modificar. (BÚRIGO, 2006, p 36).

O MMM ocorreu num momento histórico em que o mundo passava por grandes
mudanças culturais, políticas, sociais e econômicas. O momento pós II Guerra Mundial, que
entre outros fatos, trouxe como conseqüências uma proposta de massificação do ensino
básico, o crescimento da demanda pelo ensino superior, o aumento dos postos de trabalho, os
grandes avanços tecnológicos e a modernização das ciências, a expansão da indústria, e por
tudo isso, a necessidade de uma mão-de-obra melhor qualificada (Búrigo, 2006) implicava
uma nova proposta para a educação. No Brasil, era um período de transição da base
econômica e política. O país passava de uma economia de base agropecuária para uma
economia de base industrial com uma política de abertura da economia à uma grande entrada
de capital estrangeiro. E tudo acontecia sob um regime de ditadura. Nesse contexto no campo
da política todos os discursos estavam voltados para a idéia de modernização e de
desenvolvimentismo, mesmo com o país apresentando muitos problemas sociais graves. Na
educação o clamor por uma reestruturação, por uma proposta que atendesse essa nova
realidade, se contrapunha ao regime político da época. Isso resultava em poucos
investimentos, levando a uma progressiva diminuição na qualidade da educação,
comprometendo, portanto, todo o processo educacional, desde o cotidiano da sala de aula, até
a formação de novos professores. No caso da Matemática a situação já era mais precária
ainda, pois havia um número baixíssimo de profissionais habilitados nessa área atuando em
sala de aula, não ultrapassando os 16% (Lima, 2006). Entendemos que esses fatores foram
preponderantes e contribuíram terminantemente para que o movimento alcançasse a
abrangência que alcançou.
Para Miorim,

“(...) A “modernização” proposta naquele momento, entretanto, estava ligada a uma


“moderna matemática”, que surgiu no momento em que um novo contexto sócio-
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histórico-econômico exigia “um estudo mais rigoroso do movimento, um estudo


quantitativo, que permitisse medir e prever” (MIORIM, 1998. p 104).

Os acontecimentos que ocorriam no campo da economia e da política, mas que


mantinham estreitas ligações com o campo científico-tecnológicos fundamentavam as idéias
de mudanças apresentadas pelos idealizadores do Movimento da Matemática Moderna. A
possibilidade de mensuração e quantificação pautada no rigor científico proposta por essa
“nova matemática” permitia explicar, comprovar e generalizar os resultados observados em
experiências, o que tornava possível comprovar na prática as teorias (Miorim, 1998). Para os
idealizadores, essa nova proposta se contrapunha à forma platônica, abstrata, como era
ministrada a disciplina Matemática até então.
Enfim, esse quadro assim apresentado, asssegurava toda a autoridade do conceito de
“moderna” por considerar que esta “nova matemática” “(...) representava a superação dos
limites estabelecidos pela antiga matemática” (Miorim, 1998, p.104) de Euclides.

O movimento da matemática moderna no Brasil: 1960 - 1970

No Brasil, o MMM começa a tomar forma no início da década de 1960, sob influência
das idéias modernizadoras que circulavam por países da Europa e também nos Estados
Unidos. Em 1959, durante o III Congresso Nacional de Ensino de Matemática, realizado no
Rio de Janeiro, apareceram as primeiras discussões sobre a modernização. A idéia foi
encampada pelo Professor Osvaldo Sangiorgi de São Paulo.
É importante destacar que Osvaldo Sangiorgi nessa época já era um conceituado
professor de Matemática no Estado de São Paulo, com um vasto currículo acadêmico e muito
respeitado como escritor de livros didáticos no Brasil. Seu envolvimento com essa nova
proposta teve um peso importante para que outros profissionais da área também se
enveredassem por esse novo caminho.
Em 1961, o Professor Sangiorgi participou de um curso de atualização nos Estados
Unidos, onde teve contato efetivo com as idéias modernizadoras propostas pelos americanos.
Retornando ao Brasil, decidiu organizar em São Paulo um curso semelhante para professores
da rede de ensino estadual de São Paulo, para o qual contou com a presença de George
Springer da Universidade de Kansas. Foi a partir deste evento que as idéias do movimento
começaram a se disseminar mais fortemente, especialmente no Estado de São Paulo. As
primeiras experiências foram feitas em classes experimentais. Estas experiências se deram
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através do grupo GEEM (Grupo de Estudos do Ensino de Matemática) fundado em 1961, com
o propósito discutir e implantar a nova proposta, sob a liderança do próprio Professor
Sangiorgi (Miorim, 1998).
Baseado nas leituras de autores como Burigo (1989), Valente (2006) e Pinto (2005)
que estudam a história do Movimento da Matemática Moderna no Brasil, é possível perceber
que essa nova proposta tomou forma mais especificamente a partir de 1962 no IV Congresso
Brasileiro de Ensino de Matemática, realizado em Belém no Pará. Nesse evento o grupo
GEEM apresentou os resultados das primeiras experiências feitas com alunos em salas
experimentais sob o signo do MMM. Nessa ocasião e a partir destas experiências é que os
educadores matemáticos brasileiros participantes do evento tiveram o primeiro contato efetivo
com as idéias do Movimento da Matemática Moderna. Essas experiências motivaram a
criação de grupos em outras regiões do Brasil, assim como discussões e a elaboração de uma
proposta de conteúdos mínimos para sua implantação. (Miorim, 1998).
Seguindo a tendência daquele momento foi fundado no Paraná, em outubro de 1962
(um ano após a fundação do GEEM), o NEDEM (Núcleo de Estudos e Difusão do Ensino da
Matemática) liderado pelo Professor Antonio Osny Dacol, diretor do Colégio Estadual do
Paraná de Curitiba (Pinto, 2005).
O NEDEM assim como o GEEM era composto por professores de várias escolas e
atuavam basicamente nos níveis primário e secundário de ensino, que atuavam principalmente
em escolas públicas de Curitiba. Suas discussões e sua proposta de trabalho seguiam a mesma
linha de trabalho desenvolvida pelo GEEM. Esses grupos além de desenvolverem
experiências com seus alunos, também ministravam cursos, treinando outros professores sob a
nova proposta.
A fundação destes dois grupos, o GEEM em São Paulo e o NEDEM no Paraná,
marcaram a efetiva implantação do movimento nesses Estados.
No Brasil, o GEEM desenvolveu experiências com professores que atuavam nas
escolas públicas. As atividades desenvolvidas no grupo eram depois aplicadas aos alunos dos
professores participantes. Essas atividades eram elaboradas com base nas discussões dentro
do grupo e nas trocas de experiências entre seus pares. Assim, as atividades aplicadas nas
turmas experimentais que tivessem resultados considerados positivos eram selecionadas e
repassadas a outros colegas e trabalhadas nos cursos, e posteriormente viriam a fazer parte da
coleção de livros didáticos de Matemática Moderna publicada por Sangiorgi. O NEDEM,
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assim como o GEEM, desenvolveu um trabalho semelhante no Paraná e também publicou


uma coleção de livros didáticos sobre a nova proposta.
Observa-se, portanto, que foi um movimento com características próprias de
organização de conteúdos que alcançou seu ápice, especialmente nos Estados do Paraná e de
São Paulo, nas décadas de 1960 e 1970. Destacamos esses dois grupos e esse período por ser
este o foco principal da pesquisa que estamos desenvolvendo no Mestrado. Cabe ressaltar que
o MMM foi um movimento que ocorreu em nível mundial e que no Brasil se estendeu a
vários estados.

Inquietações de hoje sobre o MMM

De acordo com Ferreira (2006), nos Estados de São Paulo e do Paraná, o MMM foi
influenciado basicamente por duas escolas diferentes, a européia liderada pelo grupo
Bourbaki e a americana representada, principalmente, pelo professor Springer. Essas
influências somando-se às variáveis culturais de cada Estado suscitam questões relevantes a
serem investigadas. No que se refere às idéias, como estas foram concebidas e como elas
embasaram a elaboração das atividades e dos materiais dos grupos GEEM e NEDEM? E
ainda, de como esses grupos sugeriam que os professores trabalhassem, e como efetivamente
eram conduzidas as atividades com os alunos? Sendo a teoria dos conjuntos o eixo norteador
dessa “nova” matemática, ascendem questões entre outras sobre como esses materiais
tratavam esse tema? Que idéias e teorias efetivamente subsidiaram os precursores do
Movimento da Matemática Moderna do GEEM e do NEDEM na elaboração de suas
propostas para dar forma ao “movimento” em seus estados? Quais as marcas históricas
deixadas e qual o alcance que o MMM provocou na ocasião de seu desenvolvimento, e que
reflexos ainda podemos encontrar nas práticas pedagógicas dos Professores atualmente em
nossas escolas? Quais foram as maiores dificuldades enfrentadas por esses grupos em relação
à formação dos professores para o ensino da Matemática Moderna? Quais foram as maiores
dificuldades enfrentadas por esses grupos em suas discussões e no seus desafios de passarem
essa proposta adiante?
Essas questões postas tornam a investigação desse movimento fundamental para o
avanço da história da educação matemática.
Retomando Valente (2006), entendemos ser necessário a construção de referenciais da
Educação Matemática em especial da segunda metade do século XX no Brasil “(...) há que se
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buscar os vestígios deixados nos cotidianos escolares passados”. Para tanto, é imprescindível
intensificar as pesquisas, objetivando atingir a maior proximidade possível do que
efetivamente esse movimento representou na sua época e as influências que ainda exerce nas
ações pedagógicas dos professores nas aulas de matemática hoje.

Considerações finais

Os fatos e considerações assinaladas nesse texto apontam várias questões relevantes


que merecem estudos mais aprofundados.
Pelo que observamos, com o que as pesquisas conseguiram elucidar desse passado
histórico, talvez não seja ainda possível estabelecer que relações há, além da proposta de uma
matemática contextualizada, entre as idéias que embasaram a primeira fase do movimento de
modernização da matemática escolar pensadas no início do século XX e as que culminaram
com o Movimento da Matemática Moderna no Brasil, nas décadas de 1960 e 1970.
É razoável afirmar que o Movimento da Matemática Moderna ocorrido no Brasil, com
suas particularidades, está entre os momentos mais importantes da história da educação do
país. Mesmo não havendo ainda um montante expressivo de pesquisas sobre o tema, as que
estão disponíveis evidenciam a contribuição do movimento para o desenvolvimento e
estruturação da Educação Matemática, ratificando a dimensão das reflexões e influências que
este momento provocou e ainda provoca nas discussões relativas à matemática escolar.
O mais relevante desse período talvez, consista no fato de ter sido um movimento que
motivou os professores de Matemática a prosseguir seus estudos e organizarem-se em grupos,
num momento da história do país em que as políticas eram contrárias a qualquer mudança que
não estivesse de acordo com as idéias dos dirigente políticos.
Assim como os educadores, também se envolveram pais, lideranças políticas e
intelectuais importantes da época. Foi um momento em que todas as mídias abriram espaços
para a divulgação e discussão sobre o tema. Isto é importantíssimo, pois além de contrariar
toda a história dos movimentos e reformas educacionais ocorridas antes e depois deste
período no Brasil, provocou nas pessoas a necessidade de que se tivesse uma opinião sobre o
assunto. Mexeu com toda a sociedade da época, fazendo com todos de alguma forma tivessem
um conceito sobre a Matemática Moderna.
Fica, entretanto, a sugestão para que as pesquisas sobre o MMM investiguem com
mais profundidade as ações desencadeadas no país para a formação de professores para o
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ensino da Matemática Moderna. algumas das questões que foram apontadas nesse texto, como
por exemplo, quais as relações (se elas existem) que há entre as idéias na primeira e na
segunda fase do movimento; Se houver, quais seriam as relações do movimento com os
problemas econômicos, políticos e sociais que o Brasil enfrentava na época? Quais foram as
diferenças na concepção e implantação das novas idéias matemáticas em cada região do
Brasil? De onde vieram as idéias que influenciaram o movimento em cada Estado? Tais
questões apontam para a complexidade da reforma que pretendia revolucionar o ensino da
matemática escolar em nível mundial.

REFERÊNCIAS

BURIGO, E. Z. Matemática Moderna: Progresso e Democracia na Visão de Educadores


Brasileiros nos anos 60. Teoria & Prática, Porto Alegre, Pannonica, v. 2, 1990, p 255-265

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Ambigüidades. Curitiba, PR. In: Revista Diálogo Educacional/PUCPR, v. 6 n. 18, 2006, p
35-47

LIMA, F. R. Grupo de Estudo do Ensino de Matemática – GEEM: Formação de Professores e


o Movimento da Matemática Moderna no Brasil. Dissertação de Mestrado. Ponfitifícia
Universidade Católica de São Paulo, 2006.

MIORIM, M. A. Introdução a História da Matemática. São Paulo, SP: Atual, 1998

PINTO, N. B. Marcas Históricas da Matemática Moderna no Brasil. Curitiba, PR. In: Revista
Diálogo Educacional/PUCPR, v. 5 n. 16, 2005, p 113-122

VALENTE, W. R. A Matemática Moderna nas Escolas do Brasil: Um Tema Para Estudos


Históricos Comparativos. Curitiba, PR. In: Revista Diálogo Educacional/PUCPR, v. 6 n. 18,
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