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COMITÊ BRASILEIRO DE BARRAGENS

XXV SEMINÁRIO NACIONAL DE GRANDES BARRAGENS


SALVADOR, 12 A 15 DE OUTUBRO DE 2003
T91 - A22

COMPACIDADE RELATIVA DE AREIAS: UMA PROPOSTA PRÁTICA


PARA CONTROLE DE CAMPO

Emídio Neto de Souza Lira


Cláudia Henrique de Castro
Geraldo Martins Filho

FURNAS CENTRAIS ELÉTRICAS S.A.

André Luiz Araújo Silva

UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS

RESUMO

A partir do levantamento de resultados de ensaios de determinação de


densidades máxima e mínima, realizados em 250 amostras de areia das mais
diversas regiões do país, foi feito um estudo estatístico do comportamento da
relação entre densidade mínima e densidade máxima. Uma boa correlação foi
encontrada para esta relação para os resultados separados em duas faixas de
coeficiente de uniformidade. Este artigo apresenta, para areias, uma proposta
prática para controle de compacidade relativa de campo.

ABSTRACT

From the results of maximum and minimum densities tests made in 250
different sand samples from various regions of Brazil, a statistical study of the
behavior of the relationship between maximum and minimum densities was
made. A good correlation to this relationship was found for separated results in
two sets of uniformity coefficients. This paper presents a practical proposal for
relative density field control for sands.

1 – INTRODUÇÃO

Barragens de terra implicam na utilização de filtros e drenos, de areias naturais


ou artificiais, de forma a se poder disciplinar o fluxo inevitável da água
represada através do núcleo impermeabilizante ou através da fundação.

1
As características dos filtros são definidas a partir da disponibilidade de
materiais de construção – por exemplo, areia natural adequada e em
quantidade suficiente – e de critérios de projeto (e.g. compacidade relativa
superior a 65 %). Conhecer as características geotécnicas dos materiais de
filtro oriundos de depósitos naturais se torna, por vezes, difícil em função da
heterogeneidade das jazidas disponíveis. Faz-se necessário, normalmente, um
acompanhamento sistemático de granulometria e de densidades máxima e
mínima a fim de se ter um adequado controle sobre os critérios de filtro e da
compacidade relativa obtida durante a construção. Segundo Tavenas (1972),
passou-se a analisar com mais atenção estes resultados após a publicação do
trabalho de Burmister´s (1948).

Muitos pesquisadores têm estudado relações de comportamento de areias


utilizadas como filtros e drenos, como Sandroni (1983) que buscou uma relação
da densidade relativa com a diferença entre a densidade in situ e a densidade
mínima.

Segundo Porto (1980), normalmente a compacidade relativa em filtros de


barragens é limitada apenas na compacidade relativa mínima e raramente à
compacidade relativa máxima, subestimando-se a redução da permeabilidade.
Observa-se em areias naturais de granulometria média a grossa com finos não
coesivos que o aumento da compacidade relativa de 60% para 70% e 70%
para 80% reduz a permeabilidade em 28 a 30 % respectivamente (Porto,
1980).

Segundo Lee & Singer (1971), citado por Silveira et al (1973) um erro de
apenas 1% na densidade seca de campo introduz erro de 5% na compacidade
relativa; e, segundo Tavenas (1971), também citado por Silveira et al (1973) o
erro introduzido pela execução de ensaios diferentes de densidades máxima e
mínima é de ± 5% a ± 20%, sendo o erro médio de campo de ± 14%, para um
método conveniente de determinação.

A densidade mínima, apesar da norma (NBR 12004/1990) prescrever um


procedimento artesanal, é obtida de forma relativamente simples, mas que
requer cuidados, pois qualquer descuido do procedimento redundará em um
estado mais denso e conseqüentemente a um menor valor de compacidade
relativa.

Por outro lado, a obtenção da densidade máxima (NBR 12051/1991) requer


equipamento especial, de custo elevado (da ordem de R$ 50.000,00) e de
procedimentos rigorosos para se atender critérios de calibração prescritos.

Em busca de métodos que visam a viabilização de tempo e custo de controle


da compacidade relativa, objetiva-se neste trabalho apresentar uma
metodologia simples de acompanhamento do controle de compacidade relativa
e que atenda, em linhas gerais, às determinações de projeto.

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2 - ESTUDO REALIZADO

2.1 - METODOLOGIAS NBR

Há mais de dez anos, através das normas brasileiras NBR 12004/1990 e NBR
12051/1991, estão estabelecidos procedimentos para execução de ensaios de
determinação de densidades máxima e mínima. Os resultados dos ensaios
apresentados neste trabalho foram obtidos segundo os procedimentos
prescritos nestas normas técnicas. A seguir os procedimentos para
determinação das densidades mínima e máxima são descritos de forma
sucinta.

• Densidade mínima (NBR 12004/1990)


A determinação da densidade mínima é feita através de simples
derramamento de material, por meio de um funil padronizado, em
movimento espiral, em recipiente apropriado e de volume conhecido.

• Densidade máxima (NBR 12051/1991)


O método tem como objetivo a determinação das densidades máximas
utilizando-se a compactação vibratória para se obter a densidade máxima
através dos métodos seco e molhado e sem reuso de material.

A mesa vibratória eletromagnética de aço é acionada por um vibrador de


freqüência (60 Hz), instalada sobre uma base fixa, com amplitude dupla de
vibração de 0,33 mm, em mesas com amplitude de vibração constante. No
caso de mesas com vibrações ajustáveis recomenda-se que as amplitudes
devam estar no intervalo entre 0,20 mm e 0,64 mm.

2.2 - LEVANTAMENTO DE DADOS

Foi feito um levantamento dos ensaios de determinação de densidades máxima


e mínima realizados no Centro Tecnológico de Engenharia Civil de FURNAS
Centrais Elétricas S.A., localizado no município de Aparecida de Goiânia
(GO), distante cerca de 18 km do centro da capital do estado. Os dados
pesquisados abrangem materiais de depósitos naturais – areias de rio de
diversas regiões do país e uma jazida de quartzito altamente friável e de
aspecto sacaróide –, totalizando 250 amostras, e encontram-se apresentados
na Tabela 1.

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TABELA 1 – Origem dos materiais estudados
ORIGEM ESTADO DE ORIGEM
Jazida de Quartzito Norte de Goiás
Norte de Goiás
Rio Tocantins Sul do Tocantins
Centro do Tocantins
Rio Paraíba do Sul Rio de Janeiro
Rio Jequitinhonha Bahia
Rio Santo Antônio Minas Gerais
Rio Grande Divisa de São Paulo e Minas Gerais
Rio Jauru Mato Grosso
Rio da Prata (Paracatu) Minas Gerais

Buscou-se através de ferramentas estatísticas uma correlação entre densidade


mínima e densidade máxima das areias que melhor tendência fosse explicitada
de forma a tornar prática sua utilização. Dentre as muitas tentativas, a
separação das areias em duas faixas de coeficiente de uniformidade
apresentou-se como a mais promissora: coeficiente de uniformidade Cu = 2
(148 amostras) e Cu > 2 (102 amostras). As Figuras 1 e 2 apresentam as faixas
granulométricas dos materiais analisados, onde pode-se observar que as
granulometrias das areias variaram desde areias finas muito uniformes até
areias grossas pouco uniformes, abrangendo assim uma vasta gama de
possibilidades de ocorrência em novos empreendimentos.

3 - RESULTADOS

Apresenta-se na Figura 3 a relação entre as densidades máxima e mínima das


250 amostras analisadas. Pode-se observar uma nítida alteração na
declividade para as duas faixas de coeficientes de uniformidade selecionados,
o que permite se separar e estudar os resultados para coeficientes de
uniformidade menores ou igual a 2 e coeficientes de uniformidade maiores que
2. A análise estatística dos resultados apresentados na Figura 3, levando-se
em consideração um intervalo de confiança de 95 %, leva às faixas
apresentadas na Figura 4. Nesta figura estão apresentadas as faixas prováveis
para um intervalo de confiança de 95 %, para as faixas de coeficiente de
uniformidade selecionadas (Cu = 2 e Cu > 2).

4
Curva Granulométrica

100 0

90 10

80 20
Percentagem que passa

70 30

Percentagem retida
60 40

50 50

40 60

30 70

20 80

10 90

0 100
0,0100 0,1000 1,0000 10,0000 100,0000
Diâmetro das partículas (mm)

FIGURA 1 – Faixa granulométrica dos materiais com Cu = 2.

Curva Granulométrica

100 0

90 10

80 20
Percentagem que passa

70 30
Percentagem retida

60 40

50 50

40 60

30 70

20 80

10 90

0 100
0,0100 0,1000 1,0000 10,0000 100,0000
Diâmetro das partículas (mm)

FIGURA 2 - Faixa granulométrica dos materiais com Cu > 2.

5
22

21

Densidade máxima - ρ máx (kN/m3 )


20

19

18

17

16

15

14
11 13 15 17 19
Densidade mínima - ρ mín (kN/m )
3

FIGURA 3 – Relação entre densidades máxima e mínima e faixas de 95 % de


confiança.

4 - METODOLOGIA PROPOSTA

A partir da obtenção, no laboratório de campo, da densidade mínima (ρmín) e da


curva granulométrica (ambas de fácil determinação) pode-se buscar na Figura
4 – que apresenta os valores médios prováveis de densidades máxima (ρmáx) e
suas respectivas faixas de variação dentro de um intervalo de confiança de 95
%, para Cu= 2 e Cu > 2 – o valor de densidade máxima mais provável e, a
partir dele e da densidade obtida in situ se fazer a determinação da
compacidade relativa provável.

A partir da densidade mínima e dos gráficos apresentados na Figura 4 pode-se


determinar três diferentes valores de densidade máxima – valor médio, valor
mínimo e valor máximo prováveis – que podem ser analisados para
determinação da faixa de variação do valor da compacidade relativa de campo.
O grau de confiança nos valores assim obtidos vai depender da importância do
controle para o projeto e deverá ser estabelecido pelo projetista (e.g.
compacidade relativa maior ou igual a 70 %).

Como forma de se ‘calibrar’ o método proposto, para um empreendimento


qualquer, uma bateria de ensaios preliminares pode ser realizada de forma a
se conhecer as características da jazida, plotando-se seus resultados nos
gráficos apresentados neste artigo. Em situações onde os resultados se
enquadram dentro da faixa de 95 % de confiança fornecida (Figura 4) a
metodologia proposta pode ser utilizada, com as restrições impostas pelo

6
próprio projeto, diminuindo a freqüência de realização de ensaios de densidade
máxima ao longo da construção.
3
ρmín (kN/m )
11 12 13 14 15 16 17 18 19
20
19 Cu≤2
(kN/m3)
18
17
máx

16
15
14

22
21

(kN/m3)
20
Cu>2
19

máx
18

17
16
11 12 13 14 15 16 17 18 19
3
ρmín (kN/m )
FIGURA 4 – Faixas de 95 % de confiança para Cu = 2 e Cu > 2.

5 - CONSIDERAÇÕES

A relação entre as densidades máxima e mínima, para as 250 amostras


analisadas, apresentam uma visível quebra de comportamento, quando
analisada sob a ótica de diferentes faixas de coeficientes de uniformidade.

Os resultados de densidade máxima podem ser deduzidos a partir dos


resultados de densidade mínima com um relativo grau de acerto, coerente para
muitas especificações de obras de pequeno e médio porte.

Após a realização de alguns ensaios preliminares de determinação de


densidades máxima e mínima a relação apresentada neste trabalho pode ser
checada e ajustes poderão ser feitos daí em diante permitindo sua utilização
mesmo em projetos com especificações mais rigorosas.

Tem-se observado que a amplitude de vibração da mesa vibratória, utilizada na


realização do ensaio, influência significativamente a densidade seca máxima,

7
para uma determinada amostra do solo. A tendência geral é do acréscimo da
densidade do material granular, quando a amplitude é elevada até um
determinado nível do reostato. Entretanto, esse mesmo material pode
apresentar resultados menores de densidade, caso a amplitude de vibração da
mesa continue sendo acrescida. A dispersão do método proposto se
assemelha àquelas advindas do próprio processo de determinação das
densidades máxima e mínima.

Para barragens de pequeno e médio porte em áreas limitadas, em geral, se


deseja freqüentemente a especificação de densidade relativa igual ou maior a
60% (Silveira, 1980). Principalmente para esses projetos a metodologia
apresentada, dentro de suas limitações (previsão de comportamento a partir de
uma análise estatística), permite significativa redução de prazos na obtenção
dos valores de compacidade relativa, bem como de custos de construção, uma
vez que se por um lado o equipamento instalado no laboratório de controle de
campo implica em alto custo inicial de implantação, por outro os novos
empreendimentos normalmente se encontram distante de grandes centros
urbanos com laboratórios equipados para realização dos ensaios de interesse.

O método apresentado não possui considerações acerca da variação da


permeabilidade em função das variações de compacidade relativa, cabendo ao
projetista estabelecer estes critérios de forma combinada com a compacidade
relativa desejável.

Não levou-se em consideração neste artigo o comportamento da densidade


máxima e densidade mínima em função da forma das partículas, aqui
apresentado como sugestão para futuro estudo.

6 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

4. Burmister, D.M. (1948). “The Importance and Pratical Use of the Relative
Density in Soil Machanics”, Proc. Vol. 48, ASTM, pg. 1249.

5. Hoffman, R., Vieira, S. . (1942). “Análise de Regressão: Uma Introdução à


Econometria”. Ed. HUCITEC.

6. Morimoto, S. (1972), “Investigação Sobre o Grau de Compactação dos


Solos Granulares na Barragem de Terra da Usina Capivara”, VIII Seminário
Nacional de Grandes Barragens (São Paulo), tema III.

7. Porto, N. L. F. (1980), “Algumas Considerações Sobre a Construção de


Filtros e Transições Finas em Barragens”. XIII Seminário Nacional de
Grandes Barragens (Rio de Janeiro), tema IV.

8. Sandroni, S. S. (1983), “Densidade Relativa a Partir da Diferença entre a


Densidade In Situ e a Densidade Mínima”. XV Seminário Nacional de
Grandes Barragens (Rio de Janeiro), tema IV.

8
9. Souto Silveira, E.B., Avila, L.P., Eigenheer, L.P.Q.T. & Franco, J.O.J.
(1973), “Problemas Relativos aos Projetos e Construção de Drenagem
Interna de Barragens de Terra”, IX Seminário Nacional de Grandes
Barragens (Rio de Janeiro), Tema II.

10. Speciegel, M. R. (1976), “Estatística”, Ed. McGraw-Hill do Brasil Ltda.

11. Stevsnson, W.J. (1981), “Estatística Aplicada à Administração “. Ed.


Harbra.

12. Tavenas, F., Ladd, R.S. & La Rocheles, P. (1972), “Accuracy of Relative
Density Measurements”, Geotechnique, vol.22, nº4, pg. 549.

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