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SOCIOLOGIA

Relações entre indivíduo e sociedade, distinção do espaço público e privado, o Estado e os direitos humanos,
cidadania e diversidade.

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A sociedade é a extensão do indivíduo. Se o indivíduo é cobiçoso, cruel, impiedoso, egoísta, assim será a
sociedade. Se o indivíduo é prestativo, educado e atencioso, assim será a sociedade.

O ser humano, individualmente, é um dos animais mais frágeis e desprotegidos, no aspecto físico, entre
todos os que existem na natureza. Conta, é verdade, com instintos básicos, de preservação da vida, de
perpetuação da espécie e outros tantos, que se desenvolvem, todavia, apenas com um par de anos após seu
nascimento. Todos precisamos de alguém, por algum motivo, em todos os estágios da nossa vida, para
sobrevivermos.

Nossos sentidos são muito mais frágeis do que os da maioria (para não dizer, totalidade) dos animais. Um
cavalo, um bezerro, um leão etc., por exemplo, conseguem ficar de pé, por seus próprios meios, alguns
minutos após o nascimento. E dão os primeiros passos logo a seguir, acompanhando a mãe. E nós?

Um bebê precisa de cerca de dois meses somente para se virar de lado, por seus próprios meios, no berço. E
assim mesmo é preciso que se fique atento para impedir que ele sufoque. Senta-se aos quatro ou cinco meses
e, só a partir daí, começa a engatinhar. Dá os primeiros e vacilantes passos, com o amparo dos pais, entre
dez meses e um ano. Se nesse período fosse deixado sozinho, por sua conta e risco... certamente não
sobreviveria.

Precisa ser ensinado de tudo, desde comer, a falar; desde como se livrar dos pequenos e grandes perigos, até
sobre noções elementares, como o próximo, a família, a escola, a sociedade e o País. É um processo lento,
vagaroso, de longo prazo, que exige completa atenção, paciência e amparo dos pais. Portanto, tem
dependência absoluta de semelhantes que já se tenham desenvolvido.

Mesmo depois de adulto, o ser humano dificilmente sobreviveria sem a companhia de outros indivíduos da
espécie. Precisa, pois, associar-se, pois ninguém é dotado de todos os talentos, de todas as habilidades e de
todas as potencialidades que garantam a satisfação de suas necessidades (materiais e espirituais) e, por
extensão, sua sobrevivência.

Em qualquer aspecto que se encare, quer físico, quer psicológico, quer emocional, pessoa algum
sobreviveria se tivesse que se virar sozinha, só, por sua conta e risco. Santo Tomás de Aquino enquadrou os
solitários (e ninguém o é por completo, frise-se) em três categorias: “excellentia naturae”, “corruptio
naturae” e “mala fortuna”.

No primeiro caso, estariam os que optam livremente por um retiro, pelo isolamento, pelo afastamento da
sociedade para meditação, livrando-se dos desejos materiais para se dedicar às coisas do espírito. Os
segundos, seriam aqueles indivíduos tão corrompidos e daninhos, que precisariam ser banidos, para não
ameaçar e nem prejudicar os outros. E os terceiros, seriam frutos da má sorte, com capacidade insuficiente
para conquistar seu espaço no contexto social e que cairiam na indigência e, por isso, optariam (ou seriam

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forçados pelas circunstâncias) pelo isolamento.

A vida em sociedade, no entanto (e pensamos numa que seja ideal, justa e solidária, e não na real, nesta que
aí está), inibe, quando não sufoca, a individualidade. Os interesses coletivos, que teoricamente ganham
prevalência, não raro se chocam com os individuais. Apesar dos grupos haverem instituído regras, preceitos
e leis reguladoras, a tão apregoada (e pouco praticada) igualdade de direitos e deveres, constante em todas as
Constituições do mundo, é meramente retórica e há muito não passa de utopia.

Somos frutos da educação que recebemos, cujas diretrizes são determinadas pelos detentores do poder.
Infelizmente, quer no lar, quer na escola, quer na sociedade, não somos educados para desenvolver e
exercer plenamente nossas potencialidades, físicas, mentais e espirituais, mas meramente “adestrados” para
determinadas tarefas que uma entidade abstrata, chamada Estado, nos determina.

Mesmo que não venhamos a nos dar conta, somos despersonalizados. Poucos se importam com nossas
sensações e emoções pessoais, com nossas carências ou necessidades, e muito menos se sentimos fome, sede,
dor, saudade, alegria, tristezas, iras etc. Somos tratados como ferramentas utilitárias de produção de bens e
serviços, que podem ser descartadas a qualquer momento, tão logo percam a utilidade ou reduzam a
produtividade ou quando os poderosos de plantão assim decidam.

Adam Smith alertou, no livro “A Riqueza das Nações”, que “nenhuma sociedade pode ser florescente e feliz
se a grande maioria de seus membros for pobre ou miserável”. Poucas, todavia, pouquíssimas (diria,
nenhuma), atingem esse grau de excelência. E mesmo as que conseguem se aproximar desse estágio ideal,
contam com imensos contingentes de miseráveis, sem lugar para morar, sem roupa adequada para se
aquecer, sem alimentos fartos e nutritivos para assegurar a saúde e a força etc.

Embora informalmente, os homens se dividem em castas. Há uma minoria que nada faz e tudo tem, em
detrimento de uma imensa maioria, que tudo produz e, contudo, tem que se contentar com meras migalhas
do produto do seu trabalho. Impera, na verdade, no mundo, a lei da selva, a do mais forte (e não
necessariamente no aspecto físico).

Teoricamente, ao nascermos, todos firmamos um pacto tácito, tendo por procuradores os nossos pais, em
que abrimos mão de parcela de nossos direitos individuais, em favor do coletivo. Na teoria isso até que soa
bem. Mas na prática...Funciona? Claro que não!

Urge, caso se queira, de fato, fazer justiça (e esse suposto desejo, por enquanto, se limita só a palavras) que a
maioria dos pretensos “sócios” (todos nós, sem exceção e nem distinção de sexo, raça, religião, posição social
ou crença política) seja, de fato e de direito, integrada à “sociedade”, e tratada como tal, conquistando
cidadania plena, pois este é o único caminho real para o desenvolvimento e até para a sobrevivência do que
se convencionou chamar de civilização.

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Como cobrado no edital, os temas estão todos relacionados entre si e veremos mais sobre as distinções e
diversidade mais adiante.

Distinção do espaço público e privado

O espaço público é considerado como aquele que, dentro do território urbano tradicional, onde a presença
do privado é predominante, seja de uso comum e posse coletiva (pertence ao poder público). A rua é
considerada o espaço público por excelência.

Uma das maiores responsabilidades do planejamento urbano é criar cidades que sejam convenientes para a
diversidade urbana, com qualidade de seus espaços públicos, como ruas, calçadas, praças, que muitas vezes
estão relacionadas com a natureza e constituição dos espaços privados.

O espaço público é o lugar de convívio da coletividade e do diálogo entre os mais diversos segmentos da
população de uma cidade. É o lugar de expressão das diferenças sociais.

Teresa Caldeira define:

“Apesar de as cidades ocidentais incorporarem várias e até contraditórias versões da modernidade, há um


grande consenso a respeito de quais são os elementos básicos da experiência moderna de vida pública
urbana: a primazia e a abertura de ruas; a circulação livre; os encontros impessoais e anônimos de pedestres;
o uso público e espontâneo de ruas e praças; e a presença de pessoas de diferentes grupos sociais passeando e
observando os outros que passam, olhando vitrines, fazendo compras, sentando nos cafés, participando das
manifestações políticas, apropriando as ruas para seus festivais e comemorações, ou usando os espaços
especialmente designados para o lazer das massas (parques, estádios, locais de exposições)”

Em contrapartida, quando a maioria da população abandona o espaço público deixando de transitar pelas
ruas, por medo ou impossibilidade de exercer a cidadania, retrata-se claramente a fragmentação da
sociedade, cujos espaços se encontram rigidamente segmentados e controlados.
Nas últimas décadas, como conseqüência da grande desigualdade social do país, a cidade de São Paulo sofreu
uma progressiva restrição do uso de seu espaço público tanto por parte das elites quanto das classes
populares.

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As classes alta e média criaram um novo padrão de sociabilidade. Abandonaram as ruas para se refugiar em
espaços confinados (casas, condomínios fechados, shopping centers, centros empresariais), protegidos por
sistemas de segurança que modificam a rotina dos moradores da cidade. Grades, alarmes, guardas, guaritas,
câmaras de vídeo interferem na vida pública. “Ao transformar a paisagem urbana, as estratégias de
segurança dos cidadãos também afetam os padrões de circulação, trajetos diários, hábitos e gestos
relacionados ao uso de ruas, ao transporte público, de parques e de todos os espaços públicos”, analisa Teresa
Caldeira.

A vida pública, portanto, ficou marcada pela tensão e discriminação.

Desde a década de 1970, os shopping centers, espaços artificiais de consumo e de lazer voltados para as
elites, espalharam-se por várias regiões da cidade. É interessante observar que tais empreendimentos
tiveram como modelo os centros de consumo norte-americanos, mas criam nos consumidores a ilusão de
que poderiam estar em qualquer lugar do Primeiro Mundo: o espaço não imprime nenhuma marca nem
referência às tradições culturais do país; trata-se de um campo global de consumo.

No entanto, com o crescimento da criminalidade nas ruas da cidade os shopping centers deixaram de
atender apenas às elites e voltaram-se também para os moradores da periferia. A partir da década de 1990,
começaram a surgir em bairros “distantes” e se constituíram como espaços de lazer e de sociabilidade,
resguardados – na medida do possível – da violência.

O complexo cenário urbano contemporâneo permite ao observador algumas deduções:

a) A vida pública tende a declinar na cidade.


b) As diferenças sociais consolidam-se pelo uso de espaços privatizados que segregam e discriminam.
c) Espaços privatizados e não-democráticos tentam substituir o que deveria ser público: o direito ao lazer, à
cidade e ao convívio.
d) Espaços públicos tendem a substituir o que deveria ser espaço privado: moradia, relações afetivas.

Esses fatores indicam um processo de desvalorização do espaço público, o que, em última instância, pode
levar à falência da cidade. “Mesmo que vários locais públicos ainda comportem uma razoável interação
interclasses, o conjunto dessas ocupações do espaço urbano resultaria numa propensão a um quadro
metropolitano fragmentado, segmentado e apartado que ameaçaria a dimensão da vida pública e a própria
idéia de uma “cidade comum”, analisa Heitor Frúgoli.38

Coloca-se, assim, mais um desafio à democracia brasileira: construir uma cidade mais justa e participativa,
que dissolva os núcleos de segregação. É uma tarefa grande e complexa – mas é o único caminho para a
revalorização da vida pública e para que os moradores possam apropriar-se de seu espaço e circular pelas

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ruas, calçadas, praças e becos de sua cidade.

Estado e os direitos humanos

Estado é uma instituição organizada política, social e juridicamente, ocupando um território definido,
normalmente onde a lei máxima é uma Constituição escrita, e dirigida por um governo que possui soberania
reconhecida tanto interna como externamente. Um Estado soberano é sintetizado pela máxima "Um
governo, um povo, um território". O Estado é responsável pela organização e pelo controle social, pois
detém, segundo Max Weber, o monopólio legítimo do uso da força (coerção, especialmente a legal).

Desde as primeiras formulações teóricas modernas, na Europa Ocidental do século XVIII, os direitos
humanos apareceram estreitamente vinculados ao Estado. Mas uma vinculação, contraditoriamente,
positiva e negativa ao mesmo tempo.

A concepção de direitos naturais do homem, anteriores e superiores à organização institucional dos Poderes
Públicos (ou seja, aquilo que se convencionou denominar Estado), foi sem dúvida a grande arma de combate
contra a monarquia absoluta da época. Diante da concentração de todos os poderes num só indivíduo,
sustentou-se a necessidade de se criarem instituições impessoais para o exercício do mando: ou seja, a
necessidade de se erigir um Estado, em lugar de se entronizar um monarca. No entanto, a Revolução
Francesa, ao final do século, veio demonstrar que a concentração de poderes incontroláveis, nesse
organismo impessoal, acarretava abusos iguais ou superiores aos do ancién régime. O Estado moderno
aparece assim, concomitantemente, desde o seu nascimento, como o protetor e o principal adversário dos
direitos humanos.

Essa contradição, aliás, estava ínscia no famoso teorema de Rousseau, o qual constitui, como disse ele: “O
problema fundamental” do Contrato social: “encontrar uma forma de associação que defenda e proteja, de
toda a força comum, a pessoa e os bens de cada associado, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só
obedeça no entanto a si mesmo e continue tão livre quanto antes”. Rousseau reconhecia que a sociedade
política implica a necessária submissão dos homens uns aos outros, e que isto representa a negação de uma
liberdade natural. Mas entendia que era possível encontrar uma fórmula social que preservasse a
superioridade dos direitos inatos do homem, com a transformação de força em poder e da liberdade em
liberdade civil.

Não escondeu, toda via, seu ceticismo quanto à generalização desse tipo de associação política, fundada no
consenso geral. Pôr a lei acima da vontade dos homens, dizia, equivale à quadratura do círculo em
geometria.

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Seja como for, a concepção política de Rousseau fundava-se no postulado de que o Estado só se legitima
quando existe para proteger os direitos naturais do homem. Qualquer desvio dessa finalidade última, por
menor que fosse, transformaria a livre associação em intolerável opressão e justificaria a ruptura do vínculo
associativo.

Ora, a humanidade veio a conhecer, neste século, organizações estatais cuja capacidade de opressão
superou, de longe, tudo o que se havia experimentado, até então, ao longo da história. Alguns desses Estados
absolutíssimos filiaram-se a uma ideologia que, nos seus albores, manifestou as mais expressas reservas
quanto ao poder estatal e propugnou mesmo a supressão, pura e simples, do Estado. Como sabido, todos os
primeiros socialistas, inclusive o jovem Marx, vaticinaram o desaparecimento do Estado com o advento
irrelutável do socialismo. Este, ao realizar plenamente a liberdade e a igualdade de todos, sem divisões de
classes, dispensaria definitivamente a opressão estatal. O Marx provecto, no entanto, seguido e aperfeiçoado
por Lênin, pregou a instalação da ditadura do proletariado, como condição indispensável da passagem do
socialismo para o comunismo. E o que isto significou, como supressão efetiva das liberdades para todos os
cidadãos, trabalhadores ou não, a crônica dos últimos 70 anos tem ilustrado com cores dramáticas.

Tudo isso ilumina o caráter essencialmente ambíguo da relação entre Estado e direitos humanos e justifica a
divisão desta exposição em duas partes, que se completam ao se contraporem: 1) a realização dos direitos
humanos pelo Estado e 2) o controle do abuso do poder estatal como condição de proteção dos direitos
humanos.

Ora, a humanidade veio a conhecer, neste século, organizações estatais cuja capacidade de opressão
superou, de longe, tudo o que se havia experimentado, até então, ao longo da história.

A realização dos direitos humanos pelo Estado

Se a primeira geração dos direitos humanos consistiu na definição e preservação das liberdades
fundamentais – de locomoção, de religião, de pensamento e opinião, de docência e aprendizado, de
correspondência, de voto etc., a segunda, inaugurada no início deste século, correspondeu à montagem de
um mecanismo estatal que dispensasse, a todos, certas prestações sociais consideradas básicas, como a
educação, a saúde, as oportunidades de trabalho, a moradia, o transporte, a previdência social. A diferença
específica entre essas duas gerações de direitos humanos é de primeira intuição: enquanto o respeito à
liberdade supõe a não-interferência estatal na esfera de vida própria do ser humano, seja individualmente,
seja em grupos sociais, a realização daquelas prestações sociais implica, ao contrário, uma sistemática
intervenção do Estado nas relações privadas, limitando a liberdade individual ou grupal. Assim as liberdades
são, basicamente, direitos humanos contra a ação estatal, ao passo que a exigência de prestações sociais se
dirige contra a omissão do Estado.

De qualquer forma, tanto num campo quanto no outro, os direitos fundamentais da pessoa humana só se
realizam graças à boa organização dos Poderes Públicos.

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Quanto às liberdades

No que tange à liberdades, como já foi assinalado, a proteção estatal passa pela eficiente atuação do Poder
Judiciário. Não farei o elenco de todos os remédios judiciais aptos à defesa das liberdades, mas vou deter-me
nos principais e, ainda assim, de modo a chamar a atenção unicamente sobre os aperfeiçoamentos jurídicos
que se impõem.

Comecemos pelo primeiro, cronologicamente, dos remédios judiciais de defesa das liberdades: o habeas
corpus. Ele se destina, como se sabe, a proteger a livre locomoção, a liberdade de ir e vir e, portanto, a de
não ser preso, exilado ou confinado, fora das hipóteses delituosas ou dos casos excepcionais (estado de sítio),
definidos na Constituição e nas leis.

A respeito do habeas corpus, gostaria de lembrar que se trata de um provimento judicial criado no direito
inglês, com as peculiaridades próprias desse sistema jurídico. No direito anglo-saxônico, com efeito, os
tribunais do rei sempre ostentaram uma supremacia sobre todas as demais autoridades, inclusive
eclesiásticas, como manifestações institucionais da própria soberania da Coroa. O habeas corpus faz parte do
gênero dos writs ou ordens judiciais que não podem ser descumpridas, sob pena do cometimento do delito
gravíssimo de contempt of court, equivalente ao crime de lesa-majestade.

Ora, a especialidade do habeas corpus, na classe do writs, parece ter se perdido, ou não se ter jamais
realizado, fora do ambiente anglo-saxônico. Na tradição inglesa, a ordem judicial, que consiste na imediata
apresentação do detido ao magistrado, a fim de que este possa se informar, direta e pessoalmente, da
existência individual do paciente.

Entre nós, no entanto, essa providência utilíssima foi desde o início substituída pelo pedido de informações
judiciais à autoridade coatora. Não é difícil imaginar o que significa isso, em termos de demora na solução
judicial, de possibilidade de ocultação do tratamento desumano infligido ao paciente nesse meio tempo, ou
mesmo de transferência abusiva do preso de uma autoridade para outra, para nos darmos conta de como
pode ser frustrada, na prática, essa garantia judiciária da liberdade de locomoção. Pense-se, por exemplo, no
caso mais banal de pedido de habeas corpus numa imensa comarca como São Paulo: a necessidade de
distribuição do feito entre as diferentes varas competentes, a autuação do pedido em cartório, a expedição
do mandado judicial de informações à autoridade coatora, o cumprimento do mandado pelo oficial de
justiça, a redação das informações pela autoridade que detém o paciente, a entrega dessas informações em
cartório e, finalmente, a sua apreciação pelo juiz. Tudo isso, antes que possa ser prestado alívio à pessoa
privada de sua liberdade e, em não raros casos, sujeita à tortura ou mesmo a ser morta em detenção.

Tal situação é tanto mais aberrante, quando se pensa que em matéria de mandado de segurança as medidas
liminares são normalmente concedidas sem audiência de autoridade coatora. Seria a liberdade de ir e vir

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menos importante, como valor jurídico, que as demais liberdades e direitos protegidos pelo mandado de
segurança?

Não vejo, portanto, como se possa manter inalterado o procedimento do habeas corpus, entre nós, sem
abandonarmos toda esperança de evitar a institucionalização de detenções arbitrárias, sobretudo dos mais
pobres e carentes, por todo este imenso país.

No tocante ao mandado de segurança, que é outra garantia fundamental das liberdades, o necessário
aperfeiçoamento deveria ser feito em outra direção. Pelo mandado de segurança, podem ser defendidos os
chamados direitos líquidos e certos, distintos da liberdade de locomoção, contra atos ou omissões abusivas
do Poder Público. São considerados líquidos e certos os direitos cujo reconhecimento independe de uma
instituição probatória no processo (testemunhas ou vistorias, por exemplo). O mandado de segurança tem
sido sempre, no entanto, uma ação judicial movida pelo próprio titular do direito violado. A lei reconhece a
legitimidade de mandado de segurança impetrado por alguém, em nome próprio, no interesse alheio.
Assim, se o ato abusivo do Poder Público atingir toda uma categoria de pessoas – um conjunto de
funcionários públicos, por exemplo – cada indivíduo deve constituir advogado e figurar no processo,
explicitamente, como autor.

Essa condição de legitimidade processual tornou-se indefensável numa sociedade de massas, em que a ação
das autoridades estatais costuma produzir efeitos sobre grupos e categorias sociais, e não apenas sobre
determinados administrados, isoladamente considerados. Daí o movimento, largamente difundido entre os
especialistas, para a criação de um mandado de segurança coletivo, que poderia funcionar tal como a class
action do direito norte-americano (o integrante de uma categoria social age judicialmente em prol de todos
os que a integram), ou então segundo a estrutura das ações populares, isto é, qualquer do povo atua em juízo
no interesse coletivo. Uma medida desse tipo seria entre nós da maior importância para a defesa, por
exemplo, dos direitos e liberdades das nações indígenas, que vivem dispersas em nosso território.

O Estado contemporâneo, no entanto, não se limitou a atender contra a liberdade física e a esfera jurídica,
sigamos assim, exterior da pessoa humana. Foi mais além, ao organizar a invasão sistemática da vida íntima
e a manipulação da imagem pessoal, com apoio nas técnicas eletrônicas mais avançadas. Contra isso, os
remédios tradicionais do habeas corpus e do mandado de segurança revelaram-se inadequados. É que ambos
pressupõe uma violação patente, isto é, pública e aberta das liberdades e direitos subjetivos; ao passo que
aquelas práticas de invasão da intimidade e da manipulação da imagem pessoal se desenvolvem no segredo
dos arquivos e das fitas magnéticas dos computadores.

A esse respeito, tive oportunidade de propor, em anteprojeto de Constituição de fevereiro de 1986, duas
medidas, a meu ver fundamentais, de proteção da dignidade da pessoa humana. De um lado, a proibição de
o Estado operar serviços de informação sobre a vida particular das pessoas, exceto na esfera estritamente
policial ou militar, determinando-se portanto a imediata dissolução do Serviço Nacional de Informações. De
outro lado, o direito reconhecido de qualquer pessoa de tomar conhecimento do que constar a seu respeito
nos registros oficiais, ainda que policiais ou militares, e de exigir a retificação de dados incorretos ou

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inverídicos. É o que passou a ser denominado entre nós, com o acolhimento da sugestão de um jurista
estrangeiro, habeas data.

Quanto aos direitos a prestações sociais pelo Estado

Neste capítulo, está em causa não a liberdade da pessoa humana, mas a fundamental igualdade de todos os
homens. A função do Estado já não é de abstenção, mas sim de transformação social, pela eliminação
progressiva das desigualdades. Função ativa, portanto, de decidida interferência no jogo dos interesses
privados.

Estabelecem-se, nos últimos tempos, um razoável consenso a respeito da necessidade de igualdade básica, de
todos os homens, quanto a determinadas situações sociais concernentes à educação, à saúde, à habitação, ao
transporte coletivo, ao trabalho e à previdência social. Ainda não se firmou, universalmente, a consciência
do direito essencial de todos à informação e à comunicação social, mas o movimento em prol dessa
reivindicação fundamental ganha corpo em vários países.

É preciso reconhecer que, em sociedades subdesenvolvidas, onde as condições de desigualdade tendem a


acelerar-se, provocando a desintegração social pelo aviltamento crescente das massas, o estabelecimento de
mecanismos aptos a realizar essas prestações sociais configura a instituição não propriamente do estado do
bem-estar, característico das sociedades desenvolvidas, mas simplesmente do estado da dignidade social.

Esses mecanismos jurídicos de realização dos direitos humanos a prestações sociais podem ser classificados,
de modo um tanto impreciso mas significativo, em coletivos e individuais.

A condição maior para a transformação da sociedade por via da ação estatal é a instituição de um
planejamento global e vinculante. O Estado brasileiro encontra-se, hoje, em momento histórico decisivo: ou
seremos capazes de transformá-los, instituindo poderes incumbidos de dirigir, de modo racional e
democrático, as transformações sociais, ou sucumbiremos na desintegração social, da que a presente crise
aguda de anomia (desrespeito generalizado às normas de vida em comum) é o sintoma mais alarmante. Sem
planejamento, atribuído como função proveniente do Estado a órgãos independentes do Congresso e do
Executivo, absolutamente nada será feito de duradouro e profundo em matéria de desenvolvimento neste
país.

Isto posto e reafirmado, diante da insensatez da classe política e da incompetência arrogante do meio
universitário, é preciso dizer que a realização dos direitos humanos a essas prestações sociais fundamentais
poderá ser reforçada com a instituição de meios judiciários adequados. Nesse particular, tirando a ação
popular, ressente-se o nosso sistema jurídico da inexistência de ações judiciais de defesa individual dos
interesses coletivos. Nos Estados Unidos, por exemplo, tem sido muito útil o recurso às chamadas class
actions, pelas quais o indivíduo, membro de um grupo social qualquer, tem qualidade para agir

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judicialmente na defesa dos interesses grupais, esteja ou não o grupo organizado como pessoa jurídica.
Enfim, a problemática aqui é idêntica àquela a que me referi há pouco, a respeito da mandado de segurança.

Por outro lado, ressentimo-nos também da falta de provimentos judiciais específicos para impor ao Estado o
cumprimento de deveres positivos. Em geral, os remédios jurídicos utilizáveis – como mandado de
segurança e a ação popular – objetivam anular ou desconstituir atos praticados por agentes estaduais. Ainda
nos Estados Unidos, é das mais largas a utilização da injunction, pela qual o judiciário manda à
Administração Pública que pratique certo ato ou desenvolva certa atividade, sob as penas de lei.

O controle do abuso de poder estatal

Até aqui, vimos os meios e os modos de realização dos direitos humanos por via do aparelho estatal.
Observamos, então, que se o poder do Estado serve, utilmente, para a defesa da pessoa humana,
notadamente pela ação do judiciário, não é menos exato que a violação desses direitos tem sido praticada,
largamente, também por agentes estatais. De onde a necessidade de estabelecer mecanismos eficazes de
controle do poder do Estado, em todos os níveis.

Essa foi a idéia central de outro grande pensador francês, Montesquieu. Para ele, o único antídoto eficaz ao
abuso do poder é a instituição de contrapoderes adequados. Só o poder controla o poder, não a moral nem o
direito. Mas é evidente a necessidade moral, isto é, jurídica; como não é menos evidente a necessidade
moral, assinalada também por Montesquieu, de se desenvolver no povo a virtude, ou seja, o espírito de
comunhão social. O que Montesquieu quis sublinhar, no entanto, é que a simples regra jurídica, despida de
poder, é ineficaz para impedir o abuso. E isto, tanto no plano interno, quanto no plano internacional.

Ora, esses contrapoderes, suscetíveis de deter o abuso – isto é, capazes de evitar que o poder se transforme
em força bruta -, são de vários tipos. O próprio Montesquieu apontou a diferença importante entre o que
ele chamava faculdade de estatuir e a faculdade de impedir. É justamente da sábia combinação desses
diferentes tipos de poder – e não de uma arquitetura triangular entre Executivo, Legislativo e Judiciário,
considerados como trindade natural e imutável – que se podem extrair todas as esplêndidas virtualidades da
teoria da separação de poderes. A faculdade de estatuir corresponde ao poder de ditar normas ou de dar
ordens. A faculdade de impedir, ao poder de aprovar ou vetar normas ou ordens dadas.

Vejamos então, separadamente, os controles internos e os controles internacionais do abuso de poder


estatal.

No plano interno

Para facilidade da exposição, tomemos os três órgãos ou Poderes da teoria clássica, tal como eles aparecem

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constitucionalmente estruturados: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.

O Executivo é sempre apontado como o grande fator de abuso, sem dúvida, porque ele, muito mais do que
os outros órgãos do Estado, é dotado de poder ativo, ou seja, das prerrogativas constitucionais de impelir,
comandar e tomar as iniciativas. Justamente por isso, convém assinalar o fato de que os grandes abusos do
Executivo não são apenas os comissivos, como prender, comandar ou destruir, contra a lei e a razão jurídica.
Na civilização contemporânea, em que as exigências de igualdade e bem-estar social tendem à
universalidade, as omissões estatais tornam-se verdadeiros crimes coletivos. A falta de escolas, de saúde
pública, de controle ecológico, por exemplo, aparecem sempre mais como violações caracterizadas dos
direitos humanos.

Ora, em relação a esses abusos omissivos, o direito tradicional é singularmente carente de remédios
adequados. No Brasil, foi só recentemente, isto é, em 1985, que se editou a primeira lei atribuidora de um
direito de ação pública, ao Ministério Público e às associações de consumidores, para suprir a falta de
medidas governamentais adequadas na proteção ao consumidor. Ainda assim, esse suprimento das omissões
do Governo não é feito com a ação propriamente dita, que visa à reparação de danos, mas com as medidas
cautelares, que são provimentos judiciais preliminares ao processo principal. De qualquer modo, foi graças a
esse novo remédio judicial, consubstanciado na Lei nº 7.347, que um competente e denodado representante
do Ministério Público paulista logrou obter do Judiciário, malgrado a escandalosa resistência do Governo
federal, a apreensão, nos estabelecimentos comerciais e centros distribuidores, do leite irradiado pela
catástrofe de Chernobyl e que havia sido criminosamente importado da Europa.

Uma lição a tirar-se do episódio é a de que, se o Ministério Público pôde agir no caso, foi graças ao fato de
que o órgão não pertencia à unidade da Federação responsável pelo abuso. Na verdade, o verdadeiro fiscal
do Poder deve ser sempre o cidadão, ou o conjunto dos cidadãos organizados em associações. Sob esse
aspecto, a Lei nº 7.347 representa um marco de progresso, na história da defesa dos direitos humanos entre
nós, ao atribuir às associações de consumidores a legitimidade para agir em juízo em defesa do interesse
geral dos consumidores e não apenas do de seus membros associados.

No tocante aos abusos comissivos, essa legitimidade dos cidadão para propor ações judiciais no interesse
coletivo já existe, felizmente, há muito. É a ação popular, pela qual qualquer eleitor pode pedir em juízo o
desfazimento de atos da Administração Pública lesivos ao Erário, ou ao patrimônio artístico e cultural do
país.

O controle mais enérgico dos abusos governamentais, porém realiza-se por meio de ações penais. No
entanto, a persistência da atribuição, ao Ministério Público, do monopólio da persecução criminal tem sido,
entre nós, um fator de larga impunidade dos agentes públicos.

É que, apesar de alguns progressos institucionais, o Ministério Público continua submetido à suserania do
Executivo, sendo portanto praticamente impossível que o vassalo controle adequadamente os atos de seu

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senhor. É por isso que incluí, entre as medidas inovadoras constantes de meu anteprojeto de Constituição, a
ação penal privada subsidiária, como direito subjetivo público de qualquer pessoa, nas hipóteses em que o
Ministério Público deixa de oferecer denúncia contra os agentes públicos (chefe do Poder Executivo,
Ministros ou Secretários de Estado, por exemplo). Essa medida, completada pela definição legal do crime
genérico de violação dos direitos humanos inscritos na Constituição – proposta também incluída em meu
anteprojeto -, reforçaria sobremaneira a proteção da pessoa humana contra os abusos governamentais.

No que se refere, agora, aos abusos do Poder Legislativo contra os direitos humanos, deve-se assinalar que
eles se cingem à sua função precípua, que é a votação de leis. O controle das leis abusivas faz-se pela sua
referência às normas e princípios constitucionais.

Nesse particular, além do veto oposto pelo chefe do Executivo, caracterizados daquele poder impediente de
que falava Montesquieu, há também a ação judicial de declaração de inconstitucionalidade da lei. O direito
brasileiro, a par da declaração de inconstitucionalidade incidente em qualquer processo judicial, criou uma
ação direta desse tipo, proposta por certas autoridades públicas e também por qualquer cidadão. Mas a
jurisprudência do Suprema Tribunal Federal interpretou essa lei no sentido de atribuir, ao Procurador Geral
da República, chefe do Ministério Público Federal, o arbítrio de dar seguimento ou não a essa ação direta,
transformando-a, portanto, em mera iniciativa particular, não vinculante para o Ministério Público. A
correção desse defeito, no texto constitucional, é uma das medidas saneadoras que contam com o mais largo
consenso, atualmente.

Até aqui, examinamos formas de controle de abuso de poder estatal por via judiciária. Tem-se, pois, a
impressão de que a defesa dos direitos humanos repousa, em última instância, no poder dos juizes de dizer o
direito de modo definitivo e no geral acatamento, pelos outros órgãos estatais, das decisões proferidas pelos
magistrados. Mas se estes últimos prevaricarem, por ação ou omissão, na correção dos abusos ou desvios de
poder, quem atuará contra os juizes? É a indagação capital, formulada pelos romanos, com o seu agudo
senso da coisa pública: Qui custodiet custodes? Quem controlará o controlador?

É preciso reconhecer que, na teoria constitucional clássica, os magistrados são os grandes irresponsáveis, no
conjunto dos agentes estatais. Essa irresponsabilidade constitui uma falha grave na arquitetura do chamado
estado de direito, no qual todos os que exercem o poder público são sujeitos ao império impessoal da lei. Se
a vida, a liberdade e a honra de cada um de nós dependem de uma ordem de habeas corpus ou da concessão
de um mandado de segurança, e se o magistrado encarregado de proferir essa decisão salvadora descumpre o
seu dever, por desídia, corrupção, ou acumpliciamento com os fatores do abuso, quem chamará o
magistrado prevaricador à ordem, punindo-o se necessário? O próprio Poder Judiciário. Aqui, o princípio da
separação de Poderes não encontra aplicação e esse defeito substancial é capaz de comprometer a eficácia de
todas as garantias constitucionais.

No direito brasileiro vigente, os casos de responsabilidade por atos de magistrados estão regulados no
Código de Processo Civil, no Código de Processo Penal e na Lei Orgânica da Magistratura. Mas a aplicação
das normas daqueles Códigos é estritamente nenhuma e, no caso da Lei Orgânica da Magistratura, muito

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deficiente.

O art. 639 do Código de Processamento Penal prevê a responsabilidade do Estado e, por via regressa, dos
juizes, no caso de decisões dolosas contra os jurisdicionados. No Código de Processo Civil (art. 133), regula-
se a responsabilidade direta dos juizes por perdas e danos, no caso de descumprimento de normas
processuais, ou de decisões proferidas de má-fé.

Quanto à Lei Orgânica da Magistratura, ferozmente combatida pelos magistrados – o que explica, sem
dúvida, a sua deficiente aplicação -, prevê ela seis modalidades escalonadas de punição: advertência,
censura, remoção compulsória, disponibilidade, aposentadoria e demissão.

Em meu anteprojeto de Constituição, ao invés de criar um órgão suprajudicial para o controle dos
magistrados, preferi atribuir poderes ampliados de interpelação ao Poder Legislativo, sobre assuntos
administrativos do Poder Judiciário, e, sobretudo, dar a qualquer do povo, por via da ação penal privada
subsidiária, a legitimidade para propor ações criminais contra juizes e membros de tribunais superiores,
quando o Ministério Público deixa de oferecer denúncia.

Seja como for, essa falha no anel final que fecha o sistema de poderes do Estado está a nos indicar, com
inafastável clareza, a necessidade de se completar o conjunto das garantias dos direitos humanos mediante
instituições e poderes não-estatais. Essa função garantidora cabe nos dias atuais, inquestionavelmente, aos
órgãos de comunicação de massa: a imprensa, o rádio e a televisão. Eis por que pareceu-me indispensável
regular esses órgãos, que exercem uma autêntica função pública, na própria Constituição, excluindo-os
tanto da dominação estatal, quanto da exploração capitalista. Os veículos de comunicação de massa devem
ser os faróis a iluminar, incessantemente, a ação do Estado, em todos os setores. Eles não podem, pois, ser
manejados pelo próprio Estado, ou por proprietários privados, cujas concessões de instalação empresarial
dependem do Governo ou do Congresso. Não é de se admitir, por conseguinte, que a classe política reagiu
negativamente a essa proposta.

No plano internacional

A proteção dos direitos humanos não pode, porém, cingir-se ao território onde cada Estado atua. A época
contemporânea assistiu ao surgimento de aparelhos estatais, dotados de poderes incomensuravelmente
maiores do que os detidos por qualquer organização política em épocas anteriores. Esse reforço descomunal
de poderes, acoplado à teoria da soberania absoluta do Estado, criou situações de esmagamento completo da
pessoa humana, como nas trágicas experiências nazista e stalinista deste século. Impõe-se, portanto, um
controle internacional sobre a ação de cada Estado, no que tange ao respeito aos direitos humanos.

Ora, a situação do direito internacional vigente está longe de ser satisfatória, nesse particular (como em
vários outros, aliás). O princípio de não-ingerência dos Estados, ou de organismos internacionais, nos

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assuntos internos de outros Estados, inscrito no art. 2º, § 7º, da Carta das Nações Unidas, tem servido de
pretexto para se evitar a aplicação de sanções internacionais aos Estados para se evitar a aplicação de
sanções internacionais aos Estados que violam sistematicamente os direitos da pessoa humana. Trata-se,
obviamente, de um pretexto, uma vez que, a toda evidência, a violação de direitos humanos não é assunto
de competência interna dos Estados, mas interessa, antes, a toda a humanidade.

A aceitação dos indivíduos como sujeitos do direito das gentes, com legitimidade para recorrer diretamente
às instâncias internacionais, tem sido parcimoniosamente admitida. Ela existe, no âmbito da Organização
dos Estados Americanos, pelo disposto no art. 44 da Convenção de São José de Costa Rica, que criou a
Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Mas essa medida, por si só, tem sido perfeitamente inócua,
dado que há sempre a possibilidade de os Estados recusarem a jurisdição internacional.

Creio que o progresso jurídico, nessa matéria, adviria da adoção de três providências. Em primeiro lugar, a
geral aceitação da legitimidade da queixa individual junto aos tribunais internacionais, no caso de ausência
de mecanismos adequados de produção dos direitos humanos no plano interno dos Estados. Em segundo
lugar, a submissão obrigatória de todos os Estados-membros das Nações Unidas, ou de organismos regionais,
à jurisdição internacional. Em terceiro lugar, o estabelecimento de sanções adequadas, no plano
internacional, para a violação estatal dos direitos humanos. Penso, nesse particular, em duas espécies de
sanções. De um lado, a suspensão do direito do voto do Estado-réu, nos organismos internacionais a que
pertence. De outro lado, na hipótese de não-cooperação do Estado com o tribunal internacional (criando,
por exemplo, obstáculos às investigações in loco, ou recusando-se a apresentar os agentes do Poder Público
responsáveis por abusos), no proferimento de uma sentença de pronúncia, pela qual se declara a existência
de crime contra os direitos humanos e de indícios veementes de autoria, na pessoa de agentes públicos
designados. Proferida essa sentença, qualquer Estado teria competência para prender os indiciados que se
encontrarem em seu território; ainda que transitoriamente, submetendo-os a julgamento segundo as leis
desse Estado.

Ao cabo desta exposição, penso ter deixado claro que a proteção dos direitos humanos é uma questão de
organização de poderes na sociedade. É claro que, nessa organização, os poderes do Estado (os chamados
Poderes Públicos) assumem papel decisivo. Mas a experiência histórica indica que uma sociedade bem
organizada deve sempre manter uma boa cópia de poderes nas mãos dos próprios cidadãos, como o
necessário corretivo aos desvios e abusos que acabam sempre por se instalar na organização estatal. Afinal,
superada a polêmica entre os adeptos da democracia direta e os da democracia representativa, é preciso
convir na necessidade de cada um desses sistemas completar e aperfeiçoar o outro. Da sábia montagem de
mecanismos de fertilização recíproca, entre esses duas técnicas políticas, dependerá a sobrevivência do
homem, em sua eminente dignidade de pessoa.

Cidadania e diversidade

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A idéia de cidadania surgiu na Idade Antiga, após a Roma conquistar a Grécia (séc. V d.C.), se expandindo
para o resto da Europa. Apenas homens (de maior) e proprietários de terras (desde que não fossem
estrangeiros), eram cidadãos. Diminuindo assim a idéia de cidadania, já que mulheres, crianças, estrangeiros
e escravos não eram considerados cidadãos.

Na Idade Média (2ª era - séc. V até XV d.C.), surgiram na Europa, os feudos (ou fortalezas particulares). A
idéia de cidadania se acaba, pois os proprietários dos feudos passaram a mandar em tudo, e os servos que
habitavam os feudos não podiam participar de nada.
Após a Idade Média, terminaram-se as invasões Bárbaras, terminando-se também os feudos, entrando assim,
em uma grande crise. Os feudos se decompõem, formando cidades e depois países (Os Estados Nacionais).
Entra a 3ª era (Idade Moderna - séc XV ao XVIII d.C). Os países formados após o desaparecimento dos
feudos foram em conseqüência da união de dois grupos: o Rei e a Burguesia.

O Rei mandava em tudo e tinha um grande poder, graças aos impostos que recebia. Com todo esse dinheiro
nas mãos, o rei construía exércitos cada vez mais fortes, além de dar apoio político à Burguesia.
Em conseqüência dessa união, a Burguesia ficava cada vez mais rica e era ela quem dava apoio econômico
aos Reis (através dos impostos).
Com o tempo, o Rei começou a atrapalhar a Burguesia, pois ele usava o poder para "sacaneá-la". A Burguesia
ficava cada vez mais rica e independente, vendo o Rei como um perigo e um obstáculo ao seu progresso.
Para acabar com o Absolutismo (poder total do Rei), foram realizadas cinco grandes revoluções burguesas:

Revolução Industrial;
Iluminismo (Revolução Filosófica);
Revolução Francesa (A maior de todas);
Independência dos Estados Unidos;
Revolução Inglesa.

Todas essas cinco revoluções tinham o mesmo objetivo: tirar o Rei do poder.

Com o fim do Absolutismo, entra a Idade Contemporânea (séc. XVIII até os dias de hoje), surgindo um
novo tipo de Estado, o Estado de Direito, que é uma grande característica do modelo atual. A principal
característica do Estado de Direito é: "Todos tem direitos iguais perante a constituição", percebendo assim,
uma grande mudança no conceito de cidadania.
Por um lado, trata-se do mais avançado processo que a humanidade já conheceu, por outro lado, porém,
surge o processo de exploração e dominação do capital.

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A burguesia precisava do povo e o convencia de que todos estavam contra o Rei e lutando pela igualdade,
surgindo assim, as primeiras constituições (Estado feito a serviço da Burguesia).

Acontece a grande contradição: cidadania X capitalismo. Cidadania é a participação de todos em busca de


benefícios sociais e igualdade. Mas a sociedade capitalista se alimenta da pobreza. No capitalismo, a grande
maioria não pode ter muito dinheiro, afinal, ser capitalista é ser um grande empresário (por exemplo). Se
todos fossem capitalistas, o capitalismo acabaria, ninguém mais ia trabalhar, pois não existiriam mais
operários (por exemplo).
Começaram a ocorrer greves (pressão) contra os capitalistas por parte dos trabalhadores, que visavam uma
vida melhor e sem exploração no trabalho.
Da função de político, o homem passa para a função de consumidor, o que é alimentado de forma acentuada
pela mídia. O homem que consome satisfaz as necessidades que outros impõem como necessárias para sua
sobrevivência. Isso se mantém até os dias de hoje (idéia de consumo). Para mudar essas idéias, as pessoas
devem criar seus próprios conceitos e a escola aparece como um fator fundamental.

Uma questão central quando se pensa em direitos humanos e diversidade é justamente e exatamente a
manutenção da suas múltiplas formas de vida, seja a vida humana ou outras formas de vida que se abrigam
dentro da nossa realidade do nosso planeta ou do nosso universo, isso significa dentre outras coisas que a
proteção à vida dentre aqueles que têm algum tipo de diferença que acarreta a eles prejuízo na relação de
conviveu no cotidiano, mas que não tira deles a comunidade de direitos como humano. Implica então numa
percepção e numa estruturação de condições de exercício da sua cidadania da sua humanidade que
ultrapassa uma mera relação que fique no cuidado da doença ao contrário è muito mais do que isso. O
direito humano é aquele que protege eleva, supera as condições que diminuiriam a capacidade de
estruturação e de ação de alguém na vida.

Em última instância falar em direitos humano, especialmente no campo dos portadores de deficiência é
pensar na preservação da dignidade coletiva e é aí que eles se encerem”.

O que significa estar bem? Estar bem é estar em paz e estar m paz não significa ausência de atribulação.
Ausência de atribulação significa ausência de impossibilidade, ausência de desespero, isso que é estar bem.
Estar bem é não ser vitimizado por uma sexualidade que fica fraturada e não ser atacado por uma doença
que não tem alternativa individual e coletiva. Estar bem é não ser vitimado também pela ausência de
escolaridade, pela ausência de convivência, de lazer saudável, pela pratica de uma religiosidade que possa
ser livre e não alienante, portanto indicadores outros de qualidade de vida que não aqueles que
exclusivamente são utilizados como dado técnico são todos aqueles que permitem que a pessoa se sinta
integral na sua condição independente até de eventuais dificuldades ou deficiências que carregue que ele
não se sinta de forma nenhuma diminuído, que ele possa até se sentir limitado como cada um de nos tem na
vida em relação a várias circunstâncias, mas não se sinta menos, menos digno, menos possível, menos
humano. Daí indicador de qualidade de vida são todos aqueles que protegem a vida humana do conjunto

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das suas perspectivas. O transporte que me leva, claro, mas o transporte que também me ofereça uma
condição de conforto e as habilidades do mundo junto com os outros e a possibilidade de um local de
trabalho que me acolha e não me exclua dentro do processo que me sinta em última estância bem. Estar em
paz, ora isso me exige antes de mais nada que a gente tenha clareza de que a paz é um direito coletivo e não
um privilegio individual.

Um direito humano fundamental é o direito da capacidade de ser humano, parece redundante a expressão,
mas ela não é. Humano significa ser livre, só que a noção de liberdade é um conceito coletivo. Há uma frase
que circula por aí que é meio estranha que diz que ‘a minha liberdade acaba quando começa a do outro’,
isso não é verdadeiro, há minha liberdade não começa quando acaba a do ouro, há minha liberdade acaba
quando acaba a do outro. Se algum ser humano não é livre ninguém é livre.

É fundamental nos percebermos o quanto à expressão de um movimento de preconceito de uma


compreensão excludente ela é aquilo que Paulo Freire chamava miopia da realidade, de tornar míope a
compreensão do outro e da diferença e é claro isso produz não uma ilusão de ética, apesar de ser miopia,
mais aí uma ilusão marcada pela condição de ser uma ilusão de ótica a mediada que se deturpa a visão sobre
o outro e sobre a compreensão dele.

É fundamental nós percebermos o quanto a expressão de um movimento de preconceito, de uma


compreensão excludente, é aquilo o que Paulo Freire chamava de miopizar a realidade, de tornar míope a
compreensão do outro e da diferença. E é claro, isso produz não uma ilusão de óptica, apesar de ser miopia,
mas aí uma ilusão marcada pela condição de ser uma ilusão de ética também, à medida em que se deturpa a
visão sobre o outro e sobre a compreensão dele.

Os latinos que geraram boa parte do nosso idioma tinham uma expressão para eu, que era ego e usavam
duas outras para identificar o não eu. Uma delas é alter, significa o outro, mas também utilizavam alios,
significa o estranho. Ora, olhar o outro como outro, é fundamental para que ele não seja percebido como o
estranho. De maneira geral, quando se fala de alguém que não é do nosso mundo, ele é olhado como o
estrangeiro, como o forasteiro, aquele que é de fora, aquele que é estranho, aquele que não pertence à nossa
comunidade, ou que não é igual a nós.

Isso significa que um ponto central para afastar o preconceito é uma visão de alteridade, em que se possa
olhar o outro como outro e não como um estranho. Olhar o outro como o outro, implica também em
acolhê-lo como um igual. Afinal de contas, um dos elementos centrais para se pensar isso, é observar que
reconhecer as diferenças não significa ressaltar as desigualdades. Homens e mulheres são diferentes, não são
desiguais; brancos e negros são diferentes, não são desiguais; cegos e pessoas com visão completa são
diferentes, não são desiguais. A diferença é um dado cultural ou biológico, a igualdade é um dado ético.

Independentemente de alguém ser eventualmente portador de alguma coisa que acumule um agravamento
na condição dele, por comparação a outros seres humanos, é claro que ele não pode ou ela, abrir mão do seu

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direito, da sua sexualidade completa. São os nossos sonhos, os nossos desejos, as nossas possibilidades de
imaginar que ninguém pode seqüestrar, ninguém pode seqüestrar de mim, homem, ou de mim mulher,
independentemente da minha condição, a minha procura de ser mais feliz, de ter a felicidade, de ter alegria,
de partilhar o meu corpo com outro, de repartir a minha amorosidade, de expressar a minha capacidade
estética na produção de algo e especialmente da minha possibilidade de conviver.

É necessário uma vigilância contínua, uma atenção permanente em relação aos direitos de uma sociedade.

Por isso, numa sociedade, o Conselho do idoso, o Conselho da pessoa portadora de deficiência, o Conselho
de educação, o Conselho de saúde, os Conselhos tutelares, precisam não só ser freqüentados como, ora
assiduidade, como amparados, como procurados, e onde eles não existem, fortalecidos e criados, onde eles já
existem, vigiados na sua propositura porque afinal de contas, eles são um veículo, um instrumento
extremamente poderoso para que a gente não deixe escapar e esvair o cuidado com a vida na sua totalidade.

Incluir não significa tolerar, significa acolher.

Essa inclusão não é uma inclusão de trazer para junto, é trazer para junto para repartir, portanto é outra
noção de inclusão. É incluir para promover, incluir para elevar, incluir para repartir, e não para dividir,
porque há uma diferença entre repartição e divisão. Quando você divide, você fragmenta, quando você
reparte, você aumenta, você distribui, você oferece uma possibilidade de acesso que seja muito mais
extensa. Inclusão é repartição.

Questões

1 - (UFMA) Os principais fatos histórico-sociais que propiciaram o surgimento da sociologia foram:

a)a Revolução dos cravos em Portugal e a Revolução Moçambicana.


b)a Revolução Industrial e a Revolução Francesa.
c)a Revolução Russa e a Revolução Chinesa.
d)a Revolução Mexicana e a Revolução Nicaragüense.
e)a Revolução Cubana e a Revolução Chinesa.

2 - (UFMA) A afirmação segundo a qual o indivíduo tem consciência de seus direitos, deveres e de que
participa ativamente de todas as questões da sociedade refere-se a:

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a)tirania.
b)plutocracia.
c)cidadania.
d)bonapartismo.
e)monarquia.

3 - (UFMA) O modo de produção que se caracteriza pela relação entre trabalho assalariado e capital é
definido como modo de produção:

a)asiático.
b)camponês.
c)mercantilista;
d)capitalista.
e)socialista.

Gabarito

1-B
2-C
3-D

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