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MÁXIMAS DE PETRE ŢUŢEA

Petre Ţuţea (1902-1991), filósofo romeno, foi preso-político do governo


comunista da Romênia por 13 anos.

“Homem de estado não fui; professor não fui; escritor não fui; sim, mas,
então, o que sou eu? Pois, não sou nem mesmo o último parasita que
cresce nas pregas da sociedade… Parece que sou alguém difícil de
fixar”, disse certa vez o filósofo – filósofo e “quase santo”, segundo Olavo
de Carvalho – romeno Petre Ţuţea (1902-1991) acerca de si mesmo. Tal
descrição, que poderia muito bem ser entendida como simples resultado
de profundas digressões filosóficas, também encontra amparo na mais
concreta existência histórica de seu pronunciante. De fato, Ţuţea
(pronuncia-se “Tsutsea”) graduou-se em direito pela Universidade de
Cluj e doutorou-se em direito administrativo, mas pensou e escreveu
sobre os mais variados temas, como economia, política, filosofia,
antropologia e religião.

Após um rápido namoro com as ideologias de esquerda, Ţuţea tornou-se


simpatizante da Legião de São Miguel Arcanjo, de onde se originou a
Guarda de Ferro, movimento de cariz nacionalista alinhado à direita.
Embora seu flerte com a Legião tenha permanecido no terreno das
simpatias, Ţuţea ocupou cargo de alto funcionário no Ministério de
Economia Nacional do governo nacional-legionário. Após a Segunda
Guerra Mundial, no entanto, a Romênia caiu sob o jugo comunista, que
condenou o filósofo a 13 anos de prisão política, nos anos de 1948-1953
e 1956-1964. Depois de sua libertação, Ţuţea foi redescoberto pela
jovem boemia bucarestina pós-89 e passou a publicar esporadicamente
sob o pseudônimo “Petre Boteanu”. Morreu em 1991, após gozar de um
curto período de notoriedade.

Ţuţea, que já foi descrito como “uma mistura de Sócrates com Jó”,
publicou quase uma dezena de livros, todos póstumos (até o momento,
nenhum foi publicado no Brasil). Algumas de suas obras compõem-se
de entrevistas ou trechos de conversas. Os aforismos que você lerá a
seguir – traduzidos e publicados pela primeira vez no país – foram
pinçados de um trabalho desse tipo: 322 de vorbe memorabile ale lui
Petre Ţuţea (322 máximas memoráveis de Petre Ţuţea), coletânea de
falas colhidas de entrevistas publicada pela editora Humanitas, de
Bucareste, em 1993. Com tradução de Elpídio Mário Dantas Fonseca e
revisão de Cristina Nicoleta Mănesc, essas máximas analisam a
natureza totalitária do movimento comunista e a condição do homem
cristão.

“Treze anos de prisão… Tinha apenas um trajezinho de presidiário.


Davam-nos uma sopa aguada e polenta frita. Bateram em mim…
Prenderam-me em casa. Nem me lembro do ano. Quando me
interrogaram, desmaiei de tanto apanhar. E eis que não morri! Estive
preso no Ministério das Relações Internas três anos. Estive, depois
disso, em Jilava, em Ocnele Mari e, finalmente, em Aiud. Admiro-me
como ainda estou aqui. Muitas vezes queria morrer. Tive muitas vezes a
covardia de não ter a coragem de suicidar-me. Por motivos religiosos…
Treze anos! Não posso contar tudo o que sofri porque não posso ofender
o povo romeno, dizendo-lhe que, em seu meio, aconteceram tamanhas
monstruosidades.”

“O comunismo, onde triunfou, esfola-te sistematicamente.”

“Opor-se ao comunismo significa proteger a pureza do Código Penal. Os


comunistas não devem ser tratados como infratores políticos. Devem
ser tratados como infratores de direito comum; como batedores de
carteira, como salteadores, como estupradores de mulheres…”

*
“Tanto a extrema esquerda quanto a extrema direita são falimentares. O
comunismo, por exemplo: a sua premissa maior é a igualdade real,
absoluta, dos homens. Em nenhum dos reinos conhecidos existe
igualdade – nem no reino mineral, pois o ouro não é igual ao carbono;
nem no reino vegetal, pois as plantas não são iguais; nem no reino
animal, pois o gato não é igual ao leão, pelo menos em força. E muito
menos na espécie humana funciona o princípio da igualdade. O
comunismo está condenado essencialmente pela sua premissa maior: a
igualdade real dos homens, que é uma utopia. E ainda… Sim, como diz
Berdiaev, o vício das utopias não está na construção delas, mas no fato
de todas serem realizáveis. É um paradoxo, mas é verdade que o
paradoxo é o limite até onde pode ir a inteligência humana, depois do
qual aparece o nada.”

“Também entre os comunistas há senhores e servos, mas eles são


hipócritas, porque sabem que a igualdade dos homens não pode existir
nenhures; são escroques perfeitos, precisamente porque afirmam que a
essência do comunismo é a igualdade real dos homens. A premissa da
igualdade absoluta é nula, mas os socialistas acrescentam um pouco de
água gasosa nesse vinho.”

“Os sistemas sociais devem ser definidos pela finalidade, por aquilo a
que visam. Os comunistas visam à igualdade anárquica final. Isto são o
comunistas-anarquistas! Por sua finalidade, o marxismo não é hostil à
anarquia, porque não podes ser igualitário se não fores anarquista.”

“Os comunistas são boiadeiros. Consideram as pessoas como os


boiadeiros sua manada. Como podes pensar em igualdade absoluta –
pois nisso deves pensar para seres comunista – quando nem bem sais à
rua, e te encontras com ela, com a desigualdade?”

“Pensei em escrever um panfleto anticomunista e pensei em apanhar os


antigos e modernos, os maiores panfletários que encontrasse, para tirar
daí as imagens mais ácidas ou figuras de estilo. E convenci-me de que é
um trabalho odioso, gratuito, e não vale dois caracóis. E tive uma
intuição muito mais correta para definir qualquer movimento
comunista. Pego um Código Penal com tricotomia, a divisão tripartida
das infrações: crimes, delitos e contravenções. Defino os crimes em
fileiras, os delitos em fileiras e as contravenções em fileiras, e escrevo
em baixo: „o comunismo é infrator da ordem universal, natural,
presente em todo este Código Penal.‟ Os comunistas são infratores, não
são homens políticos. Aliás, Douglas, o ministro das relações exteriores
da América, deu uma definição do comunismo: existem no direito penal
crimes contínuos e crimes continuados; o comunismo é um crime
contínuo.”

“Os comunistas quiseram fazer-nos felizes pela força: „ora, ou ficardes


felizes ou irdes para o inferno!‟ Ou seja, dormir bem, beber bem, dormir
bem e direita volver!”

“Para perceberes que o comunismo é incapaz de governar, não é


necessário teres um doutorado em Ciência Social. Qualquer imbecil vê
que o comunismo não é bom. Vê o que sua mãe agüenta, o que sua
mulher agüenta, o que seus filhos agüentam… Vê tudo e tudo fede.”

“O comunismo é o maior ludíbrio da história humana.”

“A Rússia demonstrou – técnica, prática e teoreticamente – a nulidade


do comunismo.”

“O stalinismo é a definição do comunismo. Onde não há stalinismo,


depois de três meses, caem do poder, porque não estão em condições de
fornecer nem mesmo… água. Não se pode impor o comunismo senão
com o cacete, com a maça!”

“Não se pode fazer economia no comunismo e pelos comunistas. Estes


não estão em condições de conduzir nem mesmo uma comunidade
rural. Atrapalham os cursos das águas, entopem os poços…”

“O comunismo é um câncer social. Onde se instala, permanece


deserto.”

*
“O comunista sabe que é animal, sabe que é racional e sabe que é
absolutamente mortal. Mas deste modo, com toda a sua racionalidade,
entre ele e um texugo não há nenhuma distinção.”

“O comunismo é o imanentismo absoluto: ele prende completamente o


homem neste mundo. O comunismo significa a negação do homem
total, pois o homem total pertence aos dois mundos: ao mundo
passageiro e ao mundo eterno.”

“Os comunistas são tão terrestres que eu não os deixaria sequer subir
num avião, e, entre Bucareste e Moscou, eu os faria ir a pé, enchendo
os alforjes com comida, de parada em parada…”

“O comunismo se ancora na dimensão do mundo passageiro, e, desse


modo, não é humano. Porque se disseres a um homem normal: „meu, és
um animal racional mortal e depois de ti só o que resta são vermes e
minerais‟, ele vai dar-te uma cacetada na cabeça!”

“O homem é um animal que reza para algo. Procura um modelo ideal. E


algumas vezes encontra, outras não. Os que descobriram o modelo ideal
e a sucessão de seu fenômeno foram os cristãos.”

“Jesus Cristo é a eternidade que pontua a história.”

“O cristianismo não é ideologia, pois então se pareceria com o


marxismo. A religião é a expressão de um mistério vivido, ao passo que
a ideologia é algo construído.”

“Diante de Deus, o gênio é primo carnal do idiota.”

“Soberano diante da natureza, submetido à Divindade, imortal e livre


pela ultrapassagem extramundana de sua condição – este é o homem
cristão.”
*

“O cristianismo não pode ser identificado com nenhum sistema


filosófico, monista, dualista ou pluralista. O cristianismo é, pura e
simplesmente. Acerca do cristianismo, Bergson diz que nós o
respiramos. Tem a materialidade do ar. Assemelha-se ao ar. Somos
cristãos sem querermos. E mesmo quando somos ateus, somos cristãos:
pois respiramos o cristianismo como respiramos o ar.”

“Ser cristão significa descer o Absoluto ao nível cotidiano. Apenas os


santos são cristãos absolutos. Doutro modo, o cristianismo,
considerado realmente, é inaplicável, precisamente por ser absoluto.”

“Nada pode substituir o cristianismo, nem mesmo toda a cultura antiga


pré-cristã. Sou de parecer de que o apogeu da Europa não está em
Atenas, mas na Idade Média, quando Deus andava de casa em casa.
Defino o brilho das épocas históricas em função do gênio religioso da
época, não em função das realizações políticas.”

“Um filósofo que debate, seja para encontrar os argumentos para a


existência de Deus, seja para combater os argumentos acerca da
inexistência de Deus, representa uma porta em direção ao ateísmo. O
Deus de Moisés é não-atributivo. Quando Moisés pergunta a Deus: „Que
digo aos de lá debaixo acerca de Ti?‟, Deus lhe diz: „Eu sou o que sou‟.”

“O bem e o mal são conceitos da pedagogia de Deus diante do homem.”

“Eu não sou um homem pitoresco, eu sou um homem grave. Creio que
estais de acordo que, no nível de minha mente, não sou pitoresco. Mas
na imprensa apareço pitoresco. E a mídia de massa morre de prazer
quando lê estas patranhas. Diz: „Ai, que gracinha que ele é!‟ Eu não sou
uma gracinha, eu sou um homem solene.”
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