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Resenha de apresentação sobre Assunto: Fenomenologia, sociabilidade e interacionismo.

Capitulo 2 - O Nível Social e o Nível Individual (Questões fundamentais de Sociologia Simmel)

Referências Bibliográficas
SIMMEL, Georg. Questões fundamentais de Sociologia. Rio de Janeiro: Zahar, 2006. Capítulo 2 – O
nível social e o nível individual. p. 39-58.

Estudos de Sociologia, Revista do Programa de Pós Graduação de Sociologia UFPE. Volume 13, Nr 2,
p207-2011. Jacira França (acesso em 06 de maio de 2012.)

Portal SCRIBD. Biografia de Georg Simmel. http://pt.scribd.com/doc/13865681/George-Simmel (acesso


em 06 de maio de 2012).

Introdução
No texto abaixo estão apresentadas de maneira rápida as idéias do texto em tela. Neste
fichamento foi seguido um ritmo ditado pelo próprio autor em seu movimento de explicações e
ordem de argumentos. As intervenções são pequenas e meramente instrumentais à apresentação
em sala, que é ao que este se dedica. O número das páginas estão colocadas entre colchetes, sem
uma precisão exata1, apenas para dar uma localização relativa do texto original, caso se busque
uma leitura ipsis litteris de alguma parte específica. Segundo França (ver ref. bibliográfica), na
versão traduzida para o português, o livro foi dividido em subtópicos, o que não se dá na versão
original.
Georg Simmel nasceu em 1858 e morreu em 1918, aos 60 anos; foi um alemão de
ascendência judia; professor Doutor em Filosofia da Universidade de Berlin; casou-se 1890 com
Gertrud Kinel, diplomada também em Berlim, de família católica; teve fortes influencias de Kant;
é um neo-kantiano e, considera-se que ele foi um dos influenciadores da Escola de Chicago e do
Interacionismo Simbólico. Foi um dos responsáveis por criar a Sociologia na Alemanha,
juntamente com Max Weber e Karl Marx.

Capítulo 2 - O Nível Social e o Nível Individual (Exemplo de Sociologia Geral)

No inicio do capítulo, o autor indica que em fins do século XIX e inícios do XX - já


que este texto data de 1917 - modificou-se a maneira de olhar a vida dos grupos que, naqueles
momentos, já eram vistos como Unidades e não mais como mero destino histórico ou fruto de
práticas políticas de indivíduos, tão somente. Assim tornou-se possível o questionamento
sociológico sobre eles e o autor se pergunta o seguinte:
Quais as diferenças essenciais do sujeito sociológico (grupo) e da vida individual (indivíduo)? p.39

Esta pergunta resume o objetivo do presente trabalho. Dito de outra maneira: como
ficção ou como realidade, a unidade do grupo se sustenta sobre indivíduos que a compõe e deve
ser tratada com se fosse, ela mesma, um sujeito com vida, leis e características internas próprias.
O questionamento sociológico necessita esclarecer as diferenças entre este e a existência
individual.

As determinações do grupo e as hesitações do indivíduo


As ações da sociedade teriam um propósito e uma objetividade mais definida que as
individuais. O indivíduo é pressionado por diversos sentimentos / impulsos / pensamentos. Daí a
dificuldade de indicarmos o seu comportamento exato.
Os grupos sociais, mesmo com as mudanças que estão sujeitas a cada instante, sem
hesitações, possuem uma Orientação. [40] Sabem a quem considerar amigo ou inimigo.
Assim se os indivíduos são mais livres nas ações, os grupos seriam mais determinados
por uma “lei natural”. [41] Porém nas questões mais primitivas o individuo não se equivoca.

1
Exceto as citações diretas, que possuem a referência exata.
“O asseguramento da existência, a aquisição de novas propriedades, o desejo de
afirmar e expandir a própria esfera de poder, a defesa das posses conquistadas - estes
são os impulsos fundamentais para os indivíduos, impulsos a partir dos quais ele pode
se associar de modo conveniente a muitos outros indivíduos, a seu gosto."(p.41)

Interessante é verificar que o autor não cita, neste momento, a questão da procriação, a
defesa da prole, entre outros. Talvez pelo fato que estes eventos implicam numa relação que traria
a um formato que se aproxima de um micro-grupo e poderia por ambigüidade a sua explicação?
Tal especulação é um ponto a ser explorado futuramente.
Nestas ambições primitivas não conhece escolha ou indecisão, o indivíduo não hesita:
realiza ações puramente egoístas. Assim também é a massa - não conhece o dualismo entre o
impulso egoísta e de desapego. Se o indivíduo poderá ficar perplexo entre dois pólos, a massa não
terá esta dúvida em relação aos fins que se propõe. Pois quando dizem respeito as primeiras e
essenciais condições de vida dos conjuntos grandes ou pequenos são como um "mínimo ético",
segundo Simmel.
O indivíduo necessita, no entanto, da normas que também são necessárias ao todo (ao
grupo) mas ao primeiro é condicionada a sua existência por elas e também pelas demais leis que
ele está sob efeito. Ao grupo, tão somente às normas já lhe dão existência. [42]

O indivíduo e seu pertencimento grupal


Há uma diferença de nível entre o indivíduo e a massa. As qualidades e os modos de
comportamentos com os quais ele forma a massa e que se introduz no espírito comum, se separam
do contexto partilhado.
Os aspectos que todos têm em comum, segundo Simmel, são os elementos mais
primitivos e inferiores em contrapartida aos mais sofisticados e de inteligência. Destes, os mais
antigos sempre são os primeiros (primitivos e inferiores) e são os mais disseminados entre às
"espécies". Mas com relação aos segundos "os mais sofisticados" e seus Órgãos2 ele informa que
não estão disponíveis a todos. O autor afirma que "A longevidade de um atributo herdado é o laço
que estabelece uma verdadeira união entre as dimensões mais inferiores e sua expansão." (p.43).
A hereditariedade que Simmel fala não é a puramente biológica; mas os elementos espirituais -
que se objetivam por palavras e conhecimento; as inclinações afetivas, normas de vontade e
juízos - que estão no indivíduo como as tradições, conscientes e inconscientes. Tais fenômenos
ocorrem de maneira mais segura e universal quanto maior o tempo que existirem; assim, mais
consolidadas e evidentes mostram-se numa sociedade.
São menos complexas e mais rudimentares, portanto, os atributos que ficam mais
próximas às expressões imediatas e de necessidades da vida. E, quando se elevam, diminuem a
possibilidade de que sejam acessados por todos.

Apreço pelo antigo e apreço pelo novo


Segundo Simmel o antigo e o novo possuem apreços específicos e ele considera
ambos importantes mas com as diferenças apresentadas abaixo.
ANTIGO: é que sempre existiu e que foi herdado não só por sua antiguidade e
encanto [44] romântico e místico, mas por ser mais disseminado em cada indivíduo. É de onde "...
brotam os juízos mais instintivos, indemonstráveis e inatacáveis." (p.44). Ele dá o exemplo dos
documentos da Alta Idade Média - o mais antigo era considerado o mais justo por supostamente
ter estado mais tempo acessível à maioria justamente por ser mais antigo e por, supostamente, ter
sido transmitido a cada indivíduo com maior segurança. Ou seja: pelo fato de estar mais exposto,
então, era mais legítimo.
NOVO: deve ser apreciado justamente em oposição ao outro. Se o antigo representa o
mais disseminado em todos, o novo representa a transposição para se ter pensamentos dignos de
valor. Sem isto não seria possível a individualidade e a novidade na sociedade. Ele cita o exemplo
da Índia - na ordenação hierárquica dos ofícios onde os mais novos possuem uma complexidade
maior - para indicar que o novo é mais complexo, aprimorado e realizável por talentos
2
O autor utiliza a palavra Órgão, e com letra maiúscula, mas não introduz o quê se trata, nem explica em que
implicaria este conceito ou sua função no contexto de sua explicação geral.
individuais. Também ele é necessário para estimular o dinamismo que para tanto precisa
desprender-se do óbvio que está em todos.

A significação sociológica da semelhança e diferença entre os indivíduos


Para Simmel a História da Cultura da Humanidade poderia ser visto tão somente entre
as lutas e tentativas de conciliação entre os dois princípios: semelhanças e diferenças. Para uma
ação dinâmica que garanta vantagem ou desvantagens perante outros indivíduos não as nossas
semelhanças que suportam mais as diferenças. [46]. Para ele: igualdade (semelhança) = existência
inconsciente; diferença = existência consciente. Nos diversos tipos de Associações - quando
possuem outros grupos a quem se opor com reconhecida diferença, se mobilizam e se fortalecem
para a contraposição àquele grupo. Inclusive, muitas vezes, tal diferença pode ser criada
artificialmente onde não existia tão somente para fortalecer a solidariedade e unidade interna.

A superioridade da indivíduo sobe a massa.


Para Simmel, aqui, ocorre o que ele chama de o Trágico da Sociologia. O indivíduo
pode possuir qualidades altamente desenvolvidas, ser aprimorado mas isto não lhe ajudará com
relação à igualdade, em sua conformação de uma unidade com os outros. Pois esta igualdade se
fará muito mais por características inferiores e sensorialmente primitivas; Para Simmel, no
momento que se falar pejorativamente de Povo ou Massa, tal indivíduo não se sentirá atingido,
ante sua postura de se considerar com qualidades superiores.
Simmel cita Heine3:
Raramente vocês me compreenderam:
Raramente os compreendi;
somente no lamaçal nos encontramos,
logo nos compreendemos

Simmel, para demonstrar esta diferença entre o sujeito indivíduo e o sujeito massa e,
ainda por suas extremas conseqüências, passa a citar diversos exemplos de comportamentos:
- O Parlamento de Paris durante as Frondas e o Cardeal Ritz (1653-9);
- Frederico O Grande e o comentário sobre seus generais;
- Historiador Freaman sobre a Câmara dos Comuns inglesa como "tola";
- Ele fala ainda que em reuniões em que ocorrem por meio do "comer" e "beber" e
outras funções antigas e espiritualmente mais vazias, são a maneira de verificar que, comumente,
mesmo nos círculos mais cultos, ocorre que decai-se em relatos de anedotas baixas e vulgares,
brincadeiras espiritualmente mais primitivas, etc. Mesmo assim é justamente este clima de falta de
ambição, de alegria sem limites e sentimentos de união sem qualquer reservas que demonstra um
importante aspecto das massas: arruína facilmente o caráter, rebaixa o indivíduo e faz com que
possa se adequar a qualquer um.
Simmel ressalta [50] que a massa não é a soma das existências puramente individuais,
que poderia ser elogiável. Não! A massa é um novo fenômeno que surge não da individualidade
plena de cada um dos participantes, mas é a soma daqueles fragmentos que de cada um coincide
com os demais. Que fragmentos comuns da individualidade são estes? São os mais primitivos,
aqueles que ocupam o lugar mais abaixo no desenvolvimento, pois a massa é acessível a todos e a
cada um. Para Simmel, por isto, a massa serve às personalidades ética/espiritualmente em perigo.

A simplicidade e o radicalismo da massa


Para o nosso autor, a massa foge dos desvios, segue seu objetivo pela linha mais
curta, dominada por uma idéia - a mais simples possível. Ele diz que uma idéia para ser apoiada,
nas condições em que se vive (Alemanha e Europa de inicio do século XX) e que busca adeptos
será o quanto mais radical que puder e, o quanto mais se postar negando outras explicações,
melhor será considerada. Assim [51] os partidos mediadores, que buscam ver o direito de ambos
os lados tendem a se enfraquecerem. "Dessa homofonia espiritual da massa surge certas virtudes
3
Presume-se que seja Christian Johann Heinrich Heine, 1797 a 1856, sarcástico poeta alemão. Ver
"http://www.citador.pt/frases/citacoes/a/heinrich-heine" ou “http://pensador.uol.com.br/autor/heinrich_heine/”.
negativas"(p.51), opostas a uma ênfase de pluralismo de alternativas4. Pois a massa não mente e
não dissimula, mas lhe falta consciência de responsabilidade dos seus atos.

A emotividade da massa e da atração da massa.


Em geral, a expressão do espírito através do sentimento pode ser tomado como o quê
há de mais primário e universal, como os desejos, a dor, etc, enquanto que a expressão a partir do
intelecto, pelo uso de conceitos, juízos e das conclusões com que trabalha, agrega uma elevação
do nível do indivíduo. Tal elevação do nível para Simmel, que é social, não corre com o
sentimento. Portanto, ele diz que o primeiro está próximo da massa e o segundo distante. Assim,
Simmel assevera que para se ter influência sobre a massa deve-se apelar para os sentimentos e não
para as discussões teóricas e articuladas.
Para o autor existe o que ele chama de Nervosismo Coletivo (p.52), que seria uma
sensibilidade, uma paixão, uma excentricidade freqüentemente própria das massas e que
raramente será apresentado por um indivíduo que lhe constitui. Ele compara a massa ao bando
animal que também reage a estímulos causais. Um pequeno fato pode produzir efeitos de uma
avalanche, por impulsos de amor ou ódio. É a excitação que leva do pensamento a ação arrastando
consigo o indivíduo irresistivelmente. Pois o indivíduo [53] é tomado pelo "humor" da massa com
que assaltado por uma violenta força exterior que é indiferente ao seu ser e seu querer individual -
mas, no entanto, a massa consiste nestes indivíduos! Ou seja: o indivíduo é arrebatado e ao
mesmo tempo arrebata (ou ajuda coletivamente a arrebatar).
Ele cita novos exemplos:
- o caso dos Quakers - que ficam horas de silêncio em comunhão coletiva;
- o caso das piadas [54] que são "ótimas" no teatro público, mas em casa perdem a graça;
- os crimes de massa, que depois de ocorridos o individuo (sente) declara-se inocente;
E, em tais casos o que ocorre é o que Simmel chama de Estado Sociológico de
Inebriação - uma espécie de predominância excessiva de sentimentos que destroem as forças do
espírito que habitualmente sustentam a consciência e a estabilidade da pessoa - que neste caso em
coletivo se embotam - retirando a responsabilidade dos indivíduos. Podem também produzir
entusiasmos nobres e dedicações irrestritas, mas que de qualquer maneira comprovam que o
arrebatamento coloca padrões fora dos padrões normais.

O nível da sociedade como aproximação do nível comum inferior de seus integrantes


Para Simmel entende-se a formação de um nível social por meio da seguinte fórmula:

O que é comum a todos pode ser de posse daquele que menos possui. (p.54)

Tal assertiva está simbolizada na noção material de "propriedade". Noção esta que foi
reconhecida em 1407, na Inglaterra, onde a dotação financeira deveria pertencer à Câmara dos
Comuns (não a Câmara dos Lordes, por exemplo) pois "... o que todos podem dar de maneira
igual equivale à cota do mais pobre." E que está por trás disto é o questionamento de se deve-se
rebaixar os mais altos ou levantar os mais baixos? Para o autor, não se trata de fazer uma média
simples, pois o caráter do comportamento coletivo não se situa no "meio" e sim no limite inferior
dos participantes.
Ele afirma que, para a concepção geral dos níveis sociais [56], devemos (àquela época
e contexto!) apenas esboçar um forma e um método de lidar com esta matéria e sugere duas
qualidades das inúmeras que poderiam ser mencionadas (que vão em uma mesma direção e, em
nossa opinião, um tanto elitista!):
PRIMEIRA - Que já foi indicada - que o nível jamais será fixado no mais inferior de
todos, somente tenderá a este nível, mantendo-se acima dele;
SEGUNDA - O ser e o ter igual a todos só pode ser aquele no qual quem menos tem
é o de nível inferior.

4
Nesse momento o autor se posta profeticamente em relação à virulência das ideologias e suas conseqüências durante
os próximos anos no Seculo XX.
A massa como constructo intelectual é a equiparação de nível entre pessoas
heterogêneas - que só pode ocorrer pelo rebaixamento dos elementos mais elevados e não pela
elevação dos mais inferiores. O autor está pensando em uma estrutura espiritual dividida em
camadas onde na parte inferior estão os elementos primitivos, desprovidos de espírito,
biologicamente mais estabelecidos e mais universais; no topo situam-se as camadas excepcionais
pelo conteúdo, as mais jovens, [57] as mais sutis que se diferenciam pela completa
individualidade.
O autor em vias de finalizar o capítulo, traz uma comparação por onde deixa dúvidas
sobre a sua postura elitizada, ante as afirmações que lhe sucede. Ele dirá que "O serviçal
certamente não entende o herói justamente porque não pode se elevar a sua altura. Mas o herói
também não entende o serviçal exatamente porquê não pode se rebaixar a sua posição
subordinada." (p.57) Pois, também existem homens que não saberiam silenciar seus interesses
perante interesses e forças inferiores, e, sabendo que em certa medida tais interesses também estão
presentes nele, declinam de participar da vida pública. Pois, para estes, tal papel de liderança [58]
trariam sentimentos que não conseguiriam lidar e que a frase "Sou seu líder portanto devo segui-
los", traduz.
Citando Bismark, que diz que a "... política sempre corrompe o caráter", Simmel
afirma mesmo discordando deste, que, em última análise significa que as classes de cima não
ousam rebaixarem-se o nível social: condição primeira para lutar contra "a hierarquia". E que,
quando os seres humanos mais elevados fazem isto, impedem a elevação social dos de baixo.

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