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Notas do capítulo
2 6 Cumpre registrar que o termo dignidade, aqui empregado como relacionado à pe
ssoa humana, costuma ser utilizado em outras situações, de tal sorte que se fala até
mesmo em dignidade de certos cargos, funções, instituições. De outra
parte, considerando a perspectiva jurídico-constitucional deste ensaio, convém
sinalar também, que mesmo no tocante ao conceito e conteúdo da noção de
dignidade da pessoa humana, foi no âmbito da literatura jurídico-constitucional que,
em regra, acabou concentrando-se a coleta de material bibliográfico, muito embora
a
inserção gradativa, ao longo das diversas edições, de aportes
filosóficos. 7 Cfr. B. Edelman, “La dignité de la personne humaine, un concept nouve
au”, in: M.-L. Pavia et T. Revett (Dir), La dignité de la personne, p. 25. 8 Cf. E. C. B. B
ittar, “Hermenêutica e Constituição: a dignidade da pessoa hu- mana como legado à
pós-modernidade”, in: A. Almeida Filho; P. Melgaré
(Orgs.), Dignidade da Pessoa Humana. Fundamentos e Critérios Interpretativos. São
Paulo: Malheiros, 2010, p. 246-
247. 9 Basta lembrar aqui a conhecida passagem do livro de Genesis, de que Deus c
riou o Homem à sua imagem e semelhança, para governar sobre os demais
seres vivos e sobre a terra (Genesis 1: 26). Tal ideia, de resto, volta a aparecer de
modo emblemático na Trajédia Grega Antígona, de Sófocles, na passagem onde
o Homem é apresentado como maior milagre na terra e como senhor de todos
os seres vivos. 10 C. Starck, in: Bonner Grundgesetz, p. 34-
35, destacando, todavia, que não se haverá de encontrar na Bíblia um conceito de
dignidade, mas sim, uma concepção do ser humano que serviu e até hoje tem
servido como pressuposto espiritual para o reconhecimento e construção de um
conceito e de uma garantia
jurídico-constitucional da dignidade da pessoa, que, de resto, acabou passando por
um processo de secularização, notadamente no âmbito do pensamento
Kan- tiano. 11 Cf., dentre tantos, Podlech, in: Alternativ Kommentar, vol. I, p. 275. Ali
ás, também hoje ainda costuma se fazer uso desta dimensão específica da
dignidade, razão pela qual, na literatura francesa, há quem utilize a expressão
“dignité hon- neur”. Neste sentido, v., entre outros, B. Maurer, Notes sur le respect
de la
dignité humaine ... ou petite fugue inachevée autour d’un thème central, in: A. Seriau
x et. al. Le Droit, la Médicine et L’être Humain, p. 188. 12 Entre nós, v. as belas pá
ginas de F. K. Comparato, A afirmação histórica dos direitos humanos, especialment
e p. 11 e ss., retratando a evolução da noção de pes- soa humana e sua dignidade.
Também discorrendo sobre a evolução da noção
de dignidade humana, v., E. R. Rabenhorst, Dignidade Humana e Moralidade Democ
rática, p. 13 e ss. No mesmo sentido, v. R. Zippelius, in: Bonner Kommentar, p. 8-9,
referindo-se ao pensamento do filósofo e político romano Cícero.
Também M. Renaud, A dignidade do ser humano como fundamentação ética dos dir
eitos do homem, in: Brotéria nº 148 (1999), p. 137, destaca o pensamento de Cícero, i
nfor- mando que este filósofo estóico conferiu à dignidade um sentido mais amplo,
fundado na natureza humana e na posição superior ocupada pelo ser humano
no cosmos. Neste contexto, O. Höffe. Medizin ohne Ethik, p. 60, lembra que na China
, por volta do século IV a.C., o sábio confucionista Meng Zi afirmava que
cada homem nasce com uma dignidade que lhe é própria, atribuída por Deus, e que
é indisponível para o ser humano e os governantes. Também G.Peces-
Barba Martínez, La dignidad de la persona desde la filosofía del derecho, p. 21 e ss.,
oferece uma série de referências demonstrando que a noção de dignidade da pessoa,
ainda que não diretamente referida sob este rótulo, já se encontrava subjacente a
uma série de autores da antiguidade, inclusive além das fronteiras do mundo
clássico greco-romano e cristão ocidental. Aprofundando o tema da dignidade
humana no pensamento clássico, notadamente nas obras de Platão, Aristóteles,
Cícero
e Sêneca, v. A. Pele, La Dignidad Humana. Sus orígenes en el pensamiento clásico,
Madrid: Dykinson,
2010. 13 Cf. M.T. Cícero, Dos Deveres, Livro III, VI. 27, p. 137. 14 Cf. C.M. Ruiz, “Th
e Idea of Human Dignity”, in: Jahrbuch des öffentlichen Rechts – Neue Folge, vol. 50,
2002, p. 282-4, que, de resto, apresenta a evolução da noção de dignidade na esfera
do pensamento teológico e filosófico. Em
sentido similar, v. também U. Vincenti, Diritti e Dignità Umana, Bari: Editori Laterza,
2009,
p. 12 e
ss. 15 Buscando demonstrar – além de outros aspectos relevantes – que o princí- pi
o da dignidade da pessoa humana, tal qual compreendido atualmente,
corre- sponde, em termos gerais, muito mais à tradição dos “antigos” (a noção de
dig- nidade vinculada a honra, imagem, posição social, respeito) do que a uma
con- cepção contemporânea, posterior a II Grande Guerra Mundial, v. S.
Hennette- Vauchez, “A Human Dignitas? The Contemporary Principle of Human
Dignity as a Mere Reappraisal of an Ancient Legal Concept”, EUI Working Papers,
LAW 2008/ 18, European University Institute, Department of Law, p. 1-24
(http:// cadmus.eui.eu) 16 Cf. P. Becchi, “O princípio da dignidade humana”, in: Re
vista Brasileira de Estudos Constitucionais, vol. 7, julho/setembro 2008. p. 192-93. 1
7 Cf. M. Ruotolo, “Appunti sulla dignità umana”, in: Direitos Fundamentais & Justiç
a, n. 11, abr./jun. 2010, p. 125-26. 18 Cf. V. C. F. dos Santos, A Dignidade da Pessoa
Humana nas Decisões Judiciais: uma Exploração da Tradição Kantiana no Estado
Democrático de Direito Brasileiro, dissertação de mestrado, São Leopoldo,
UNISINOS, 2007, p. 15-16.
19 Cf., mais uma vez, os desenvolvimentos, devidamente documentados com referê
ncias extraídas da obra de Boécio, de V.C.F. dos Santos, A Dignidade da Pes- soa H
umana nas Decisões Judiciais..., p. 16-17. 20 Cf. K. Stern, Das Staatsrecht der Bunde
srepublik Deutschland, vol. III/1, p. 7. 21 Cf. M. Herdegen, “Neuarbeitung von Art. 1
Abs.1 – Schutz der Menschen- würde”, in: Maunz-Dürig, Grundgesetz Kommentar, p.
7, mediante referência direta a trechos extraídos da obra de Tomás de Aquino (no ca
so, a sua Summa Theologica) 22 Cf. G. Picco della Mirandola, Discurso sobre a digni
dade do homem, p. 52-3. Sobre a dignidade (da pessoa) humana no contexto e no
pensamento humanista da Renascença e na tradição cristã v., por todos e
recentemente, R. Gröschner,
S. Kirste e O.W. Lembcke (Ed.), Des Menschen Würde – entdeckt und erfunden im H
umanismus der italienischen Renaissance, Tübingen: Mohr Siebeck, 2008, con- tendo
um seleto elenco de contribuições sobre o
tema. 23 Cf. M. Kriele, Einführung in die Staatslehre, p. 212. 24 Cf., aponta, por tod
os, P. Bechi, “O princípio da dignidade humana”, p. 194
e
ss. 25 Cf., referência de P. Bechi, idem, p. 194. 26 V. aqui também a síntese de P. Be
chi, “O princípio da dignidade humana”, p.
194. 27 Cf. T. Hobbes, Leviatã, capítulo X, p. 54. 28 Cf. T. Hobbes, idem, p. 54. 29 C
f. também M. Kriele, Einführung in die Staatslehre, p. 214, bem como Podlech, Alter
nativ Kommentar, vol. I, p. 275. Para C. Starck, Menschenwürde als Verfassungsgaran
tie..., p. 460, Pufendorf fundamenta sua concepção de dignidade na natureza social
do ser humano, considerando a dignidade da pessoa humana como a base da
liberdade eticamente vinculada e da igualdade dos
homens. 30 Cf., novamente, P. Bechi, “O princípio da dignidade humana”, p. 194-
95. 31 Sobre a conexão entre as noções de autonomia, liberdade e dignidade em Kan
t, v., entre nós, especialmente e por último T. Weber, “Autonomia e
Dignidade da Pessoa Humana em Kant”, in: Direitos Fundamentais & Justiça, nº 9,
out./dez,
2009, p. 232 e
ss. 32 Sobre as distinções entre uma concepção religiosa (cristã) e laica (secular) de
dignidade, v., dentre outros, as ponderações de P. Cliteur e R. van
Wissen, “Human dignity as the foundation for human rights”, in: Rechtstheorie 35 (2
004), p. 160-61, apontando duas diferenças essenciais: a) de acordo com a tradição
laica, a dignidade é autônoma, no sentido de não derivada de um criador; b) para a
tese secular, a dignidade é “completa”, já que não se a pode deduzir de uma
percepção dos sentidos, que seria própria do pensamento
cristão. 33 Cf. G. Frankenberg, Autorität und Integration, p. 270, lembrando que a pa
rtir de Kant (embora com desenvolvimentos anteriores) o ponto de arquimedes
da moderna compreensão de dignidade passou a ser a autonomia ética,
evidenciada por meio da capacidade de o homem dar-se as suas próprias
leis. 34 Cf. bem lembra V. C. F. dos Santos, A Dignidade da Pessoa Humana nas De
- cisões Judiciais..., p. 131. 35 Kant, Fundamentos da Metafísica dos Costumes, in: O
s Pensadores, p. 134 e 141. De acordo com a versão original em alemão, Kant, Grun
dlegung zur Metaphysik der Sitten, especialmente, p. 59 e 69.
36 Cf. T. Weber, “Autonomia e Dignidade da Pessoa Humana em Kant”, op. cit.,
233. 37 Kant. Fundamentos..., p. 134-35. Para conferência com o original em alemão
(Cf. Kant, Grundlegung ..., p. 59-60): “nun sage ich: der Mensch, und überhaupt jede
s vernünftige Wesen, existiert als Zweck a n sich selbst, nicht bloss als Mittel zum
beliebigen Gebrauche für diesen oder jenenWillen, sondern muss in allein sein,
sowohl auf sich selbst, als auch auf andere vernünftige Wesen
gerichteten Handlungen jederzeit zugleich als Zweck betrachtet werden... Also ist der
Wert aller durch unsere Handlungen zu erwerbenden Gegenstände jederzeit
bedingt. Die Wesen, deren Dasein zwar nicht auf unseren Willen, sondern der Natur
beruht, haben dennoch, wenn sie vernunftlose Wesen sind, nur einen relativen Wert,
als Mittel, und heissen daher Sachen, dagegen vernünftige Wesen Personen
genannt werden, weil ihre Natur sie schon als Zwecke a nn sich selbst, d.i. als etwas,
dass nicht bloss als Mittel gebraucht werden darf, auszeichnet, mithin so fern
alle willkür einschränkt (und ein Gegenstand der Achtung
ist)”. 38 Kant, Fundamentos..., p. 140. De acordo com o original em alemão ,”Im Re-
iche der Zwecke hat alles entweder einen Preis, oder eine Würde. Was einen
Preis hat, a n dessen Stelle kann auch etwas anderes, als Äquivalent, gesetzt werden;
was
dagegen über allen Preis erhaben ist, mithin kei Äquivalent verstattet, hat
eine Würde... Diese Schätzung gibt also den Wert einer solchen Denckungsart
als Würde zu erkennen, und setzt sie über allen Preis unendlich weg, mit dem sie
gar nicht in Anschlag und Vergleichung gebracht werden kann, ohne sich gleichsam
an der Heiligkeit derselben zu vergreifen.” (Kant, Grundlegung..., p. 68-69). 39 Cf. J.
Waldrom, “Dignity and Rank”, op. cit., p. 211-214. 40 Cf., novamente, J. Waldrom, “
Dignity and Rank”, op. cit., p. 214. 41 Apenas a título meramente ilustrativo, a conce
pção Kantiana de dignidade da pessoa encontrou lugar de destaque, entre outros,
nos seguintes autores. Entre nós, v., por exemplo, as recentes e preciosas
contribuições de C. L.
Antunes Rocha, O princípio da dignidade da pessoa..., p. 23 e ss., e F. K. Comparato,
A afir- mação histórica dos direitos humanos, p. 19 e ss, assim como os trabalhos de
F. Fer- reira dos Santos, Princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, p.
20 e ss., e J. Afonso da Silva, A dignidade da pessoa humana como valor supremo da
democracia, in: RDA nº 212, p. 89 e ss. Na literatura lusitana, v., dentre outros, J. Mir
anda, Manual de Direito Constitucional, vol. IV, p. 188, bem como, P. Mota Pinto, O
direito ao livre desenvolvimento da personalidade, in: Portugal-Brasil ano 2000, p.
151, sem falar na expressiva maioria dos autores alemães, alguns dos
quais já
referidos. 42 B. Pascal, Pensamentos, 113 (348), p. 40. Igualmente destacando a imp
ortân- cia da razão para a distinção entre o homem e os demais seres, Pascal (ob.
cit., p. 39, 111(339), averba que “Posso até conceber um homem sem mãos, sem
pés, sem cabeça, pois é só a experiência que nos ensina que a cabeça é mais
necessária do que os pés. Mas não posso conceber um homem sem pensamento.
Seria uma pedra ou um
bicho”. 43 O que se percebe, neste contexto, na esteira da lição de F. Moderne, La d
ig- nité de la personne comme principe constitutionnel dans les Constitutions
Portugaise
et Française, in: J. Miranda (Org.), Perspectivas Constitucionais – Nos 20 anos da C
onsti- tuição de 1976, vol. I, p. 199, é que a concepção de dignidade da pessoa huma
na como constituindo qualidade distintiva do ser humano, por ser dotado de razão
e consciência, encontra-se vinculada à tradição do pensamento judaico-
cristão, traduzindo, ademais, uma evidente noção de superioridade do ser
humano. 44 Dentre a doutrina disponível (e as referências não indiciam concordânci
a com o conteúdo dos aportes de cada autor), remetemos – a título exemplificativo
– inicialmente ao clássico e altamente controverso contributo de P. Singer,
Ética Prática, especialmente p. 65 e ss. Dentre os desenvolvimentos mais recentes, v.
o
instigante mas equilibrado artigo de C. Sunstein, “The rights of animals”, in: The Uni
versity of Chicago Law Review, vol 70, 2003, p. 387 e ss., onde, embora não se tenha
reconhecido propriamente uma dignidade dos animais, admite a possi- bilidade de
se atribuir certos direitos a determinadas categorias de animais, a depender,
especialmente, de suas capacidades. Revelando seu ceticismo em re- lação ao
reconhecimento de uma autonomia dos animais em relação ao próprio ser humano,
o autor prefere enfatizar a ideia de que os animais têm direito a uma vida decente,
livre de sofrimento e maus-tratos, o que, de qualquer modo, não se mostra
completamente incompatível com alguns componentes da própria
noção de dignidade. Indispensável, de outra parte, a teorização de M. Nussbaum, Fr
on- tiers of Justice, especialmente no capítulo 6, p. 325-407. No que diz com a recep
ção desta concepção pelo direito constitucional positivo, designadamente no tocante
a uma noção ampliada e inclusiva de dignidade, vale mencionar o exemplo da
Con- stituição da Suíça, onde foi inserido um dispositivo impondo ao Estado o dever
de respeitar a dignidade da criatura e a segurança do Homem, dos animais e do
meio- ambiente. Sobre o tema (precisamente comentando o mencionado
dispositivo) v., entre outros, o recente contributo de H. Zaborowski e C. A. Stumpf,
“Menschen- würde versus Würde der Kreatur”, in: Rechtstheorie 36 (2005), p. 91-115.
No âmbito da literatura em língua portuguesa, priorizando a questão do
reconhecimento de
“direitos dos animais” v., por todos, F. Araújo, A hora dos direitos dos animais, Coi
mbra: Almedina, 2003. Já explorando a noção de uma dignidade da vida e de um
mínimo existencial ambiental, inclusive fazendo referência à nossas ponder- ações, v.
T. Fensterseifer, “Dignidade e Ambiente: a dignidade da vida para
além do animal humano?”, in: A. H. Benjamim (Org/Ed), Direitos Humanos e Meio
Ambiente, vol. 1, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2006, p. 915 e ss. Priv- ile
giando a noção de um “mínimo existencial ecológico” v. ainda, no mesmo vol- ume,
a contribuição de C. A. Molinaro, “Mínimo existencial ecológico e o
princípio de proibição da retrogradação ambiental”, p. 427 e ss. T. Fensterseifer. Dire
itos Fundamentais e Proteção do Ambiente, Porto Alegre; Livraria do Advogado, 2008
, esp. p. 31 a 92. Por último, v. C. A. Molinaro. F. L. F. de Medeiros; I. W. Sarlet;
T. Fensterseifer (org.). A Dignidade da Vida e os Direitos Fundamentais para
além dos Humanos. Uma discussão necessária. Belo Horizonte: Editora Fórum,
2008. 45 Cf. bem aponta D. Birnbacher, “Mehrdeutigkeiten im Begriff der Menschen-
würde”, p. 4 (acesso em http://www.gkpn.de/). 46 No âmbito da vasta produção cie
ntífica encontrada nesta seara, desta- camos, a título exemplificativo e apenas
considerando a produção monográfica
na- cional, para além dos já clássicos trabalhos de S. Ferraz, Manipulações Biológica
s e
Princípios Constitucionais, Porto Alegre: Sergio Fabris, 1991 e E. de Oliveira Leite, Pr
ocriações Artificiais e o Direito, São Paulo: RT, 1995, os contributos mais recentes d
e J. M. L. de Meirelles, A vida humana embrionária e sua proteção jurídica, Rio de Ja
neiro: Renovar, 2000, M. C. C. L. dos Santos (Org.), Biodireito, São Paulo: RT, 2001,
R. P. e Silva, Introdução ao Biodireito, São Paulo: LTR, 2002, M. C. C. Brauner, Direit
o, Sexualidade e Reprodução Humana, Rio de Janeiro: Renovar, 2003, H.H. Barboza,
J.M.L. de Meirelles; V. P. Barreto (Org.), Novos Temas de Direito e Bioética, Rio de Ja
neiro: Renovar, 2003, P. de Jesús L. Alarcón, Patrimônio Genético Humano e sua Pro
teção na Constituição Federal de 1988, São Paulo: Método, 2004, M. Gar- cia, Limite
s da Ciência, São Paulo: RT, 2004; v., Sporleder de Souza. Bem jurídico- penal e eng
enharia genética. São Paulo: RT, 2004, D. Sarmento e F. Piovesan (Co- ords.), Nos Li
mites da Vida, Clonagem Humana e Eutanásia sob a Perspectiva dos Direitos Huma
nos, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007; S. R. Petterle. O Direito Fundamental à Identi
dade Genética na Constituição Brasileira, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007;
por último, v. I.W. Sarlet e G.S. Leite (org.) Direitos Funda- mentais e Biotecnologia,
São Paulo: Método, 2008, e R. da Rocha. O Direito à Vida e a Pesquisa com Células
-Tronco, São Paulo: Elsevier, 2008. 47 A respeito deste ponto, v., dentre tantos – em
bora reconhecendo a ausência de unanimidade a respeito das conclusões do autor –
R. Dworkin, El Domínio de la
Vida, Barcelona: Ariel, 1998. 48 Neste sentido, v. as referências, dentre tantos, de D.
Birnbacher, “Men- schenwürde – abwägbar oder unabwägbar”, p. 249 e
ss. 49 Cf. M. Herdegen, Neuarbeitung von Art. 1 Abs. 1- Schutz der Menschenwürde,
p.
9. 50 Cf. K. Seelmann, “Person und Menschenwürde in der Philosophie Hegels”, p.
141. 51 Cf. K. Seelmann, idem, p. 142. A respeito das diversas dimensões da dig- nid
ade encontradas no pensamento de Hegel, v., ainda, as referências de O.
Höffe, “Menschenwürde als ethisches Prinzip”, in: Gentechnologie und Menschenwür
de, p. 133. 52 Cf. C. R. Miguel, “Human dignity: history of a n idea”, p. 297-98. 53 Cf
r. G. W. F. Hegel, Grundlinien der Philosophie des Rechts, § 36, p. 95. 54 Neste senti
do, a lição de K. Seelmann, “Person und Menschenwürde in der Philosophie Hegels”,
p. 132-33.
55 É o que se extrai das ponderações de S. Kirste, “A dignidade humana e o conceito
de pessoa de direito”, in: I.W. Sarlet (org.), Dimensões da Dignidade. En- saios de Fi
losofia do Direito e Direito Constitucional, 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2009, especialmente p. 194 e
ss. 56 Cf. também K. Seelmann, ob. cit., p. 143. 57 Ao menos esta é a lição de C. Sta
rck, Menschenwürde als Verfassungsgarantie..., p. 461-2. Neste contexto, cumpre cita
r a posição de M. Kriele, Einführung in die Staatslehre, p. 215-6, para quem a corrent
e mais forte que se opôs à concepção da dignidade da pessoa humana (como sendo
o valor intrínseco e in- tangível de todos os seres humanos) e dos direitos humanos
dela decorrentes foi a ética utilitarista, principalmente de Bentham, que justificou
restrições e agressões aos direitos humanos em função dos valores de natureza
permanente da comunidade ou da humanidade em seu todo (o sacrifício eventual da
felicidade de um ou de alguns justifica a maior felicidade da maioria), de tal sorte
que a dout- rina utilitarista acabou servindo para justificar, por exemplo, práticas
como a es- cravidão e o extermínio dos povos indígenas. Registre-se, ainda, que aqui
não nos detivemos em averiguar até que ponto a crítica tecida por Kriele é correta, já
que acabamos não conferindo o pensamento dos autores referidos. No que diz com
a
concepção behaviorista (Skinner) e marxista, cabe, neste ponto, reproduzir a
lição de T. Geddert-Steinacher, Menschenwürde als Verfassungsbegriff, p. 125-26, pon
- derando que para Skinner liberdade e dignidade são categorias ultrapassadas,
já que a autonomia não é empiricamente comprovável, não sendo o próprio ser
hu- mano quem dirige o seu comportamento, mas sim, este é controlado pela
na- tureza, de tal sorte que os conceitos jusnaturalistas de liberdade e dignidade
deve- riam ser substituídos por uma “tecnologia do comportamento”, ao passo que
para muitos autores marxistas não há como aceitar a ideia de um estatuto da
liberdade (e dignidade) pré-estatal, já que são as forças econômicas e a luta de
classes os fa- tores condicionantes do fenômeno jurídico. De modo particular no que
diz com os autores de inspiração marxista, cumpre destacar, todavia, que não há
como afirmar – e muito menos de modo generalizado – que estes estejam
propriamente a negar a dignidade da pessoa ou o seu reconhecimento. Basta, neste
contexto, referir a
ex- pressiva obra de Ernst Bloch, Naturrecht und menschliche Würde, especialmente
p. 215 e ss. (existe tradução para o espanhol sob o título Derecho Natural y Dignida
d Humana, Madrid, 1980) que, embora considerando serem liberdade e igualdade ilu
sões do jusnaturalismo burguês, e mesmo afirmando a negativa da existência
de direitos naturais (no sentido de inatos), já que todos os direitos foram
conquis- tados ou necessitam ser conquistados pela luta, reconhece uma vontade
para a
liberdade e dignidade, além de construir uma fundamentação crítica e marxista
da dignidade. 58 Aqui nos valemos da já célebre expressão cunhada por E. Hobsbaw
m, A Era dos Extremos, p. 7 e ss., onde o autor coloca as razões pelas quais optou p
or assim denominar o século XX, colocando como referenciais as datas de 1914 e
1991. 59 Sobre o sentido e a compreensão da noção de Estado democrático de Dire-
ito, especialmente retratando a evolução desde o Estado liberal de Direito
(assim como elucidando as possíveis diferenças em relação ao assim denominado
Estado social de Direito), v., entre outros, a recente e didática contribuição de L.
Luiz Streck e J. L. Bolzan de Morais, Ciência Política e Teoria Geral do Estado, p. 83
e ss. 60 Neste sentido, vale averbar a lição de M. Kriele, Einführung in die Staatslehr
e, p. 214, apontando para a circunstância de que foi justamente a ideia de que
o homem, por sua mera natureza humana, é titular de direitos possibilitou o
recon- hecimento dos direitos humanos e a proteção também dos fracos e excluídos,
e não apenas dos que foram contemplados com direitos pela lei, por contratos,
em virtude de sua posição social e
econômica. 61 Especificamente sobre a concepção de dignidade (no caso, enfocand
o o
tema pelo prisma da doutrina social da Igreja Católica Romana) v., entre nós,
o contributo de, C. F. Alves, O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Hu-
mana: O Enfoque da Doutrina Social da Igreja, Rio de Janeiro: Renovar, 2001. 62 Cf
. a oportuna lembrança de C. Starck, in: Bonner Grundgesetz, p. 36-37. Vale agregar,
quanto a este ponto, que mesmo autores que refutam uma concepção metafísica da
dignidade, em especial quando impregnada por elementos de direito natural ou
marcada por uma fundamentação religiosa, acabam, no mais das vezes – conforme,
ao menos, sugere Karl E. Hain (“Konkretisierung der
Menschenwürde durch Abwägung?, in: Der Staat, 2007, p. 197) – sendo “infectados
por um vírus metafísico”, designadamente quando seguem reconduzindo a
dignidade da pessoa humana à autonomia e autodeterminação do ser humano,
enfatizando, com tal as- sertiva, a vinculação entre um conceito jurídico de dignidade
e a
filosofia. 63 Cf. O. Höffe, Medizin ohne Ethik, p. 49, afirmando que para assegurar a
vali- dade intercultural do princípio da dignidade da pessoa humana, de tal sorte a
al- cançar vinculatividade mundial, o próprio conteúdo e significado do princípio
deve ser necessariamente compreendido como interculturalmente válido e
secularizado, portanto, mediante renúncia a qualquer específica mundovisão ou
concepção reli- giosa.
64 Neste sentido, v. os desenvolvimentos de M.J. Perry, Toward a Theory of Human
Rights, especialmente p. 3-32 (primeira parte), empenhado em controverter a tese da
existência de um fundamento secular para a dignidade da pessoa hu- mana e os
direitos
humanos. 65 Cf. sempre tem sido lembrado no âmbito da literatura jurídica alemã.
Neste sentido, v., dentre tantos e recentemente P. Tiedemann, “Die Würde des
Menschen ist Unantastbar”, in: Rechtstheorie 35 (2004), p. 118. 66 Neste sentido, de
ntre tantos, a lição de Maunz/Zippelius, Deutsches Staatsrecht, p. 179. 67 Assim o s
ustenta C. L. Antunes Rocha, O princípio da dignidade da pessoa ..., p.
24. 68 Cf. F. Delpérée, O direito à dignidade humana, p. 153. Assim também M-L. Pa
via, Le principe de dignité..., p. 99. 69 Cf. J. M. Alexandrino, “Perfil constitucional da
dignidade da pessoa humana: um esboço traçado a partir da variedade de concepçõe
s”, in: Estudos em Honra ao Professor Doutor José de Oliveira Ascensão, vol. I, Coi
mbra: Almedina, 2008, p. 481.
70 Cf. M. Sachs, Verfassungsrecht II – Grundrechte, p. 173. 71 Esta a oportuna adver
tência de J. Tischner, in: Böckenförde/Spaemann (Org.), Menschenrechte und Mensc
henwürde, p. 317. Na mesma linha de entendi- mento situa-se a lição de M. Renaud,
A dignidade do ser humano..., p. 36, susten- tando, todavia, que, não obstante todos
tenhamos uma compreensão espontânea e implícita da dignidade da pessoa
humana, ainda assim, em sendo o caso de ex- plicitar em que consiste esta
dignidade, teríamos grandes
dificuldades. 72 Cf. J. González Pérez, La dignidad de la persona, p. 115. 73 Cf. a op
ortuna lembrança de P. Kunig, in: I. von Münch, (Org.), Grundgesetz Kommentar, p. 7
9, arrrimado na lição de Christian Pestallozza. 74 Quando aqui se fala em uma noçã
o jurídica de dignidade, pretende-se ape- nas clarificar que se está simplesmente
buscando retratar como a doutrina e a ju- risprudência constitucional – e ainda
assim de modo apenas exemplificativo – estão compreendendo, aplicando e
eventualmente concretizando e desenvolvendo uma (ou várias) concepções a
respeito do conteúdo e significado da dignidade da pessoa. Por outro lado, não se
questiona mais seriamente que a dignidade seja também um conceito jurídico.
Neste sentido, por todos e mais recentemente, P.
Kunig, in: I. von Münch (Org.), Grundgesetz Kommentar, p. 76. 75 Neste sentido, de
ntre outros, v. C. Neirinck, La dignité de la personne ou le mauvais usage d’une noti
on philosophique, in: PEDROT, Philippe (Dir), Ethique Droit et Dignité de la Person
ne, p. 50, advertindo que as noções filosóficas (como é o caso da dignidade), não
encontram solução no Direito. Na mesma direção,
F. Borella, Le concept de dignité de la personne humaine, p. 37, nega que a dignidad
e seja um conceito de direito positivo, embora admita que possa ser reconhecida
e protegida pelo
direito. 76 Neste sentido, a sugestiva lição de P. Häberle, Die Menschenwürde als G
rundlage der staatlichen Gemeinschaft, in: Isensee-Kirchhof (Org.), Handbuch des St
aatsrecht der Bundesrepublik Deutschland, vol. I, p. 853, para quem se revela indis- p
ensável a utilização de exemplos concretos para obter uma aproximação com
o conceito de dignidade da pessoa humana, salientando, além disso, a
importância de um preenchimento desta noção “de baixo para cima”, no sentido de
que a própria ordem jurídica infraconstitucional fornece importante material para
a definição dos contornos do conceito. Registre-se, por oportuno, a crítica de
N. Luhmann, Grundrechte als Institution, p. 57, salientando que a dogmática jurídica
habitualmente define a dignidade sem qualquer consideração pelas ciências que se
ocupam do Homem e da Sociedade, aferrando-se a uma tradição aristotélica. Ainda
que Luhmann possa ter parcial razão, convém destacar que sua obra foi es- crita na
década de 60, quando a ciência jurídica recém estava iniciando o estudo mais
sistemático da
dignidade. 77 Cf., entre nós, E. Pereira de Farias, Colisão de Direitos, p. 50, por sua
vez arri- mado nas lições de Gomes Canotilho e de Celso
Lafer. 78 Tal como propôs, recentemente, C.L. Antunes Rocha, O princípio da dig- n
idade da pessoa..., p. 24. 79 Cf. averba R. Zippelius, in: Bonner Kommentar, p. 14. 80
Cf. também adverte P. Tiedemann, “Die Würde des Menschen ist Unan- tastbar”, in:
Rechtstheorie 35 (2004), p. 121. Seguindo uma linha argumentativa sim- ilar, v. ainda
D. Birnbacher, “Menschenwürde – abwägbar oder unabwägbar”,
in: M. Kettner (Hsgb), Biomedizin und Menschenwürde, Frankfurt am Main: Suhrkam
p, 2004, p. 249 e
ss. 81 Esta a lição de G. Dürig, Der Grundsatz der Menschenwürde..., in: AÖR nº 81 (
1956), p. 9. Entre nós, por último, v. W. G. Di Lorenzo, Teoria do Estado de
Solidariedade. São Paulo: Elsevier, 2010, p. 55. 82 Assim, entre tantos, K. Stern, Staa
tsrecht, vol.III/1, p. 6. 83 Cf. J. C. Gonçalves Loureiro, O Direito à Indentidade Genét
ica do Ser Humano, in: Portugal-Brasil 2000, p. 280, citando lição de C. Hodgkinson,
filósofo dinamarquês, admitindo, para além disso, a inequívoca inspiração kantiana
desta assertiva. 84 Cf. M. A Alegre Martínez, La dignidad de la persona..., p. 21. Entr
e nós, v. J. Afonso da Silva, A dignidade da pessoa humana..., p. 91, inspirado em Ka
nt, referindo que a dignidade da pessoa “não é uma criação constitucional, pois ela
é um desses conceitos a priori, um dado preexistente a toda experiência especu- lati
va, tal como a própria pessoa humana”, lição compartilhada, mais
recen- temente, também por C. L. Antunes Rocha, O princípio da dignidade da pess
oa..., p. 26. 85 Neste sentido, a ponderação de H.C. Nipperdey, in: Neumann/Nippe
rdey/ Sche-uner (Org.), Die Grundrechte, vol. II, p. 1. 86 Cf. J. González Pérez, Digni
dad de la Persona, p. 111. No mesmo sentido,
Peter Badura, Generalprävention und Würde des Menschen, in: JZ 1964, p. 341, em m
ulticitado ensaio, já havia ponderado que a clareza suficiente a respeito do
con- teúdo da dignidade da pessoa tal qual reconhecida e protegida por uma
deter- minada ordem constitucional constitui pressuposto para a solução adequada
dos casos concretos. 87 Cf. J. González Pérez, Dignidad de la Persona, p. 19-
20. Neste contexto, emb- ora criticando o recurso direto ao princípio da dignidade da
pessoa
(especialmente por seu cunho indeterminado e “nebuloso”), B. Mathieu, Reflexões s
obre o Papel dos Direitos Fundamentais na Ordem Jurídica Constitucional, in: Barro
s-Zilveti (Coord), Direito Constitucional – Estudos em Homenagem a Manoel Gonçal
ves Ferreira Filho, p. 29, destaca que o princípio da dignidade serve, ao mesmo
tempo, para justificar o respeito à vida humana e até mesmo o seu fim, como ocorre
nos casos em que se reconhece o direito de morrer com dignidade
(eutanásia). 88 Com efeito, J. Habermas, Die Zukunft der menschlichen Natur, p. 70
e ss., argumenta, em síntese, que o Estado secularizado e neutro, quando
constituído de modo democrático e procedendo de modo inclusivo, não pode tomar
partido numa controvérsia ética relacionada com a dignidade da pessoa humana e o
dire- ito geral ao livre desenvolvimento da personalidade (artigos 1º e 2º da Lei
Fundamental da Alemanha). Além disso – segue argumentando Habermas –
quan- do a pergunta a respeito do tratamento dispensado à vida humana antes do
nasci- mento envolve questões de conteúdo ético, o razoável será sempre contar
com um fundado dissenso, tal qual encontrado na esfera do debate parlamentar
por ocasião da elaboração das leis (no caso, Habermas fez referência expressa ao
de- bate no Parlamento da Alemanha, ocorrido no dia
31.05.2001). 89 Cf. E. Denninger, “Embryo und Grundgesetz. Schutz des Lebens und
der Menschenwürde vor Nidation und Geburt”, in: KritV (2003), p. 195/6, lembrand
o, nesta perspectiva (da necessária intervenção da jurisdição constitucional no
plano das decisões envolvendo a dignidade da pessoa humana), a arguta
argumentação da Ex-Presidente do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha,
Juíza Jutta Lim- bach (extraída de voto proferido em decisão envolvendo a
descriminalização do aborto), no sentido de que assim como é correto afirmar que a
ciência jurídica não é competente para responder à pergunta de quando inicia a vida
humana, também é certo que as ciências naturais não estão em condições de
responder desde quan- do a vida humana deve ser colocada sob a proteção do
direito constitucional (ob.cit., p.
196). 90 Cf., entre nós e dentre outros, J. Afonso da Silva, A dignidade da pessoa
humana..., p. 93. Registre-se também a lição de J. González Pérez, Dignidad de la Pe
rsona, p. 25, destacando que a dignidade da pessoa não desaparece por mais baixa
que seja a conduta do ser humano, divergindo, nesta linha de entendimento, de São
Tomás de Aquino, já que este – como igualmente bem lembrou o autor citado –
justificando a pena de morte, sustentava que o homem, ao delinquir, decai da
dignidade, rebaixando-se à condição de besta. Assim, devem ser repudiadas todas as
concepções que consideram a dignidade como mera prestação, isto é, algo que
depende eminentemente das ações da pessoa humana e algo a ser con- quistado,
aspecto sobre o qual voltaremos a nos
pronunciar. 91 Cf. J. Miranda, Manual de Direito Constitucional, vol. IV, p. 183. 92
Decisão extraída da obra de F. Rubio Llorente (Org.), Derechos Funda- mentales y Pr
incipios Constitucionales, p. 72. 93 Cf. G. Dürig, Der Grundsatz der Menschenwürde..
.in: AÖR nº 81 (1956), p. 125. 94 Cf. A Bleckmann, Staatsrecht II – Die Grundrechte,
p. 541. 95 Cf. J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição,
p. 219.
96 Neste sentido, a lição de G. Dürig, Der Grundsatz der Menschenwürde..., in: AÖR
nº 81 (1956), p. 125, que, com base neste ponto de vista, sustenta que mesmo o
consentimento do ofendido não descaracteriza uma efetiva agressão à dignidade da
pessoa. Pelo mesmo motivo, também o nascituro (embrião) encontra-se prote- gido
na sua dignidade, admitindo-se até mesmo que os reflexos da proteção da dignidade
venham a alcançar a pessoa inclusive após a morte, posicionamento que vai também
por nós acolhido. Sobre este ponto, de resto objeto de aguda polêmica,
especialmente no que concerne ao marco inicial do reconhecimento de uma
proteção jurídica da dignidade e da própria vida, v., entre outros, I.
von Münch, in: Grundgesetz Kommentar, p. 73-75 e, mais recentemente, também na
doutrina constitucional alemã, M. Herdegen, Neuarbeitung von Art. 1 Abs.1 GG, p. 2
9 e ss. Na França, vale conferir, dentre tantos outros, o ensaio de B. Matieu, La digni
té de la personne humaine: quel droit? Quel titulaire?, in: Recueil Dalloz Sirey 1996,
p. 283-84. De modo particular, parece-nos oportuno registrar a lição de
W. Höfling, in: M. Sachs (Org.), Grundgesetz, p. 117, apontando para a necessidade
de uma interpretação aberta e ampliativa do conceito vida, de tal sorte a agasalhar
as necessárias respostas normativas às agressões atuais e potenciais que ameaçam
a vida
humana. 97 Cf. a crítica, entre outros, de U. Neumann, “Die Tyrannei der Würde”, in
ARSP 84 (1998), p. 156 e ss. 98 Cf. P. Häberle, Die Menschenwürde als Grundlage...,
p. 860, destacando-se que a despeito da referida dimensão cultural, a dignidade da
pessoa mantém sem- pre sua condição de valor próprio, inerente a cada pessoa
humana, podendo falar- se assim de uma espécie de “constante antropológica”, de
tal sorte que a dig- nidade possui apenas uma dimensão cultural relativa (no sentido
de estar situada num contexto cultural), apresentando sempre também traços
tendencialmente universais (ob. cit., p. 842-
43). 99 De acordo com o seguinte trecho extraído da referida decisão do Tribunal Fe
deral Constitucional da Alemanha (v. BverfGE vol. 45, p. 229), ora objeto de
livre tradução, “não se pode perder de vista que a dignidade da pessoa humana é
algo irrenunciável, mas o reconhecimento daquilo que é exigido pelo postulado
que impõe a sua observância e respeito não pode ser desvinculado da evolução
históri- ca. A história das políticas criminais revela que penas cruéis foram sendo
gradati- vamente substituídas por penas mais brandas. Da mesma forma a evolução
de penas gravosas para penas mais humanas e de formas simples para formas
mais diferenciadas de penalização tem prosseguido, permitindo que se vislumbre
o quanto ainda deve ser superado. Por tal razão, o julgamento sobre o que
corresponde à dignidade da pessoa humana, repousa necessariamente sobre o
es- tado vigende do conhecimento e compreensão e não possui uma pretensão
de validade indeterminada”. 100 Acórdão nº 90-105-
2, de 29.03.90, Relator Bravo Serra, onde, para além do aspecto já referido, entendeu-
se ser do legislador “sobretudo quando, na comu- nidade jurídica, haja de
reconhecer-se e admitir-se como legítimo um pluralismo mundividencial ou de
concepções” a tarefa precípua de “em cada momento histórico, ‘ler’, traduzir e verter
no correspondente ordenamento aquilo que nesse momento são as decorrências,
implicações ou exigências dos princípios ‘abertos’ da
Constituição”. 101 Sobre este tópico, v. os desenvolvimentos de D. Shultziner, “Hu
man Dig- nity – Functions and Meanings”, in: Global Jurist Topics, vol. 3, 2003, espe
cialmente p. 4 e ss., apontando para o que designa de densas (ou fortes) e finas (ou
fracas) dimensões ou sentidos da dignidade da pessoa humana. Entre nós, v., por
último, L. R. Barroso, “A dignidade da pessoa humana no direito constitucional
contem- porâneo: natureza jurídica, conteúdos mínimos e critérios de aplicação”,
versão provisória para debate público. Mimeografado, dezembro de 2010, p. 9
(“como intuitivo, a noção de dignidade humana varia no tempo e no espaço,
sofrendo o
impacto da história e da cultura de cada povo, bem como de circunstâncias
políti- cas e
ideológicas”). 102 Cf. E. Benda, “Die Menschenwürde ist Unantastbar”, in: ARSP nº
22 (1984), p.
23. 103 A respeito da dignidade como limite e tarefa v., dentre tantos e mais recen- t
emente, no contexto de uma dúplice função defensiva (negativa) e
prestacional (positiva) a lição de M. Sachs, Verfassungsrecht II – Grundrechte, p. 178
e ss. 104 Entre nós, v., sobre o princípio da subsidiariedade, especialmente as mono
grafias de J. A. O. Baracho, O Princípio da Subsidiariedade: conceito e evolução, Rio
de Janeiro: Forense, 1997; S. F. Torres, O Princípio da Subsidiariedade no Direito P
úblico Contemporâneo, Rio de Janeiro: Renovar, 2001. C. Prediger, A atuação do Es-
tado na ordem econômica da Constituição de 1988 sob a ótica da subsidiariedade
es- tatal ou horizontal, UFRGS, 2006, ainda não publicada. Por último, v. W. G. Di Lo
renzo, Teoria do Estado de Solidariedade, op. cit., especialmente p. 101 e ss. 105 Es
ta a lição de Podlech, in: Alternativ Kommentar, vol. I, p. 280-1. 106 Cf. K.-H. Ladeur
e I. Augsberg, Die Funktion der Menschenwürde im
Verfassungstaat, Tübingen: Mohr-Siebeck, 2008, p. 10-12. 107 Nesta quadra convém
lembrar que, de modo geral e de acordo com a influ- ente lição de H. Hofmann, Die
versprochene Menschenwürde, p. 357 e ss., as diversas teorias sobre a dignidade da
pessoa, notadamente no que diz com o seu conteúdo e fundamentação, podem ser
agrupadas em torno de duas concepções,
quais sejam, as teorias que compreendem a dignidade como dádiva (Mitgifttheorien)
, no sentido de que a dignidade constitui uma qualidade ou propriedade peculiar e
dis- tintiva da pessoa humana (inata, ou fundada na razão ou numa dádiva
divina), bem como as teorias assim denominadas de prestacionais (Leistungstheorie
n), que veem na dignidade o produto (a prestação) da subjetividade humana. Sem
que se vá aqui arrolar e dissecar as principais concepções elaboradas no âmbito
destas duas correntes e lembrando que mesmo esta classificação não se encontra
imune à controvérsia, parece-nos – tal como lembra o próprio Hofmann (ob. cit., p.
358), que, em verdade, não se verifica uma oposição fundamental entre ambas as
teorias (dádiva e prestação), já que ambas repousam, em última análise, no
postulado da subjetividade e autonomia do indivíduo. A despeito disso, que ambas
as con- cepções apresentam aspectos passíveis de crítica, é ponto que já obteve e
voltará a obter alguma atenção ao longo deste ensaio. Também mencionando a
classi- ficação proposta por Hofmann, v., em língua portuguesa, a recente e
importante
contribuição de J. C. Gonçalves Loureiro, O direito à identidade genética ..., p, 280- 8
1, referindo uma terceira concepção teórica extraída do texto de Hofmann, e
que visualiza a dignidade como reconhecimento (Annerkennung). Muito embora tal a
s- pecto careça de maior digressão, parece-nos que Hofmann, após apresentar e
dis- cutir criticamente as duas concepções da dignidade como dádiva e
prestação, passa a propor uma noção de dignidade como reconhecimento, no
sentido de que “a dignidade significa reconhecimento recíproco do outro no que diz
com a
sua especifidade e suas peculiaridades como indivíduo...” (Die versprochene Mensch
enwürde, p. 370). 108 Cf. a leitura de P. Häberle, Die Menschenwürde als Grundlage.
.., p. 836, referindo-se especificamente ao pensamento de
Luhmann. 109 Para Luhmann, Grundrechte als Institution, p. 60 e ss., adotando nitid
a- mente uma perspectiva Hegeliana, assim como a liberdade, a dignidade é o
resul- tado e condição de uma exitosa autorre-presentação. Além disso, os conceitos
de liberdade e dignidade constituem condições fundamentais para a
autorrep- resentação do Homem como pessoa individual, o que, de resto, se
processa ape- nas no contexto social, de tal sorte que a dignidade e a liberdade
referem-se a problemas específicos de comunicação.
110 Cf. a crítica de C. Starck, in: Das Bonner Grundgesetz, p. 46, destacando que a
dignidade não se restringe aos que logram construí-la pessoalmente, pois, em sendo
assim, poderá acabar sendo justificado – como a história já demonstrou –
o sacrifício dos deficientes mentais, pessoas com deformidades físicas e até
mesmo dos “monstros espirituais” (os traidores da pátria e inimigos da
classe). 111 Cf. a ponderação de P. Häberle, Die Menschenwürde als Grundlage..., p.
838. 112 Cf. M. Nettesheim, “Die Garantie der Menschenwürde Zwischen Metaph- y
sischer Überhöhung und bloßem Abwägungstopos”, in: AÖR, nº 130 (2005), p. 92. 1
13 Cf., novamente, a lição de P. Häberle, Die Menschenwürde als Grundlage, ... p.
838. 114 Cf. M. Koppernock, Das Grundrecht auf bioethische Selbstbestimmung, p. 1
8-20. 115 Assim também M. Koppernock, Das Grundrecht auf bioethische Selbstbest
immung, p. 19-20, salientando, neste mesmo contexto, que mesmo pre- sente, em
sua plenitude, a autonomia da vontade (dignidade como capacidade de
autodeterminação) esta poderá ser relativizada em face da dignidade na
sua dimensão assistencial (protetiva), já que, em determinadas circunstâncias,
nem mesmo o livre consentimento autoriza determinados procedimentos, tal
como ocorre, v.g., com a extração de todos os dentes de um paciente sem qualquer
tipo de indicação médica, especialmente quando o consentimento estiver fundado
na ignorância técnica. Até que ponto, nesta e em outras hipóteses até mesmo
mais gravosas, é possível falar na presença de uma plena autonomia, é, de resto,
as- pecto que refoge ao âmbito destas considerações, mas que, nem por isso, deixa
de merecer a devida atenção. 116 Cf. R. Dworkin, El dominio de la vida, p. 306-
7. 117 Embora – importa destacá-lo já neste momento – não se possa concordar co
m uma noção exclusivamente biológica da dignidade, não sendo poucas as críti- cas
que têm sido assacadas no âmbito da produção doutrinária, ao tematizar a assim
designada “biologização” da dignidade, também é certo que a desvinculação total
entre vida e dignidade igualmente se revela incompatível com uma
concepção suficientemente produtiva da dignidade e capaz de abarcar os inúmeros e
diversi- ficados desafios que lhe são direcionados. Posicionando-se contrariamente a
uma biologização, v., entre outros, U. Neumann, “Die Tyrannei der Würde”, in: ARSP
84
(1998), p. 156 e ss., especialmente no contexto da problemática das
manipulações genéticas, assim como, mais recentemente, E. Denninger, “Embryo
und Grundge- setz. Schutz des Lebens und der Menschenwürde vor Nidation und
Geburt”,
in: KritV 2003, p. 201 e ss., este aderindo à concepção de Habermas, no sentido de q
ue a dignidade não decorre da natureza humana (não sendo, portanto, um atrib- uto
inato e natural, tal como a cor dos olhos, etc.), mas sim do reconhecimento do valor
intangível de cada pessoa no âmbito da reciprocidade das relações humanas. A
despeito dos diversos problemas vinculados à discussão ora retratada, deixare- mos
de desenvolver, pelo menos por ora, este ponto, que, de resto, será em
parte retomado mais adiante, quando do comentário a respeito das relações entre a
dig- nidade e o direito à vida. Em sentido diverso, criticando enfaticamente a
tendência a uma desconexão entre vida e dignidade, v., dentre tantos, J. Isensee,
“Der Grun- drechtliche Status des Embryos. Menschewürde und Recht auf Leben als
Determi- nanten der Gentechnik”, in: Gentechnik und Menschenwürde, p. 62 e ss. Da
mesma forma, aproximando-se aqui de Habermas, mas sem deixar de reconhecer
uma vinculação entre os atributos naturais da pessoa, registre-se o entendimento de
O. Höffe, “Menschenwürde als ethisches Prinzip”, in: Gentechnologie und Menschen
würde, p. 115, ao afirmar que se, por um lado, a dignidade consiste em um axioma,
no sentido de um princípio diretivo da moral e do direito, também é certo
que a dignidade se refere a características biológicas da pessoa, sem contudo ser ela
própria (dignidade) uma destas
características. 118 Cf. R. Dworkin, El dominio de la vida, p. 307-9, que, nesta linha
de entendi- mento, distingue o direito a um tratamento digno do direito à
beneficência, exem- plificando tal distinção com a situação peculiar dos presos, que,
por serem encar- cerados, não são tratados de forma benéfica (já que o objetivo é a
prevenção de delitos para o benefício geral da comunidade), mas ainda assim, na
condição de seres humanos, devem ser tratados com dignidade, não podendo ser
torturados, humilhados, assegurando-se-lhes um mínimo de privacidade e direitos
básicos. 119 Cf. R. Dworkin, El dominio de la vida, p. 310, referindo, com base no ex
em- plo dos presos, que tal concepção impõe que, apesar das razões que levaram
ao encarceramento, que poderão exigir e justificar esta ofensa (a prisão), estas
não autorizam que se venha a tratar o preso como mero objeto, à disposição dos
de- mais, como se apenas importasse a utilidade da
prisão. 120 Cf. Kant, Fundamentos ..., p. 134-35. 121 Cf. U. Neumann, “Die Tyrannei
der Würde”, in: ARSP 84 (1998), p. 161. Explorando o tema da instrumentalização,
propondo uma diferenciação entre
instrumentalização (e sua vedação na perspectiva moral e jurídica) e violação
da dignidade (apenas em parte coincidentes) e apresentando possíveis critérios
para identificar quando uma conduta qualificada como instrumentalização implica
uma violação da dignidade, v., em especial, D. Birnbacher, “Annäherungen an das
In- strumentalisierungsverbot”, in: G. Brudermüller; K. Seelmann (Ed.), Menschen- w
ürde. Begründung, Konturen, Geschichte, Würzburg: Königshausen & Neumann, 200
8, p. 09-
24. 122 Cf. D. Grimm, apud M. Koppernock, Das Grundrecht auf bioethische Selbstb
estimmung, p. 21-22, muito embora posicionando-se de forma crítica em re- lação ao
reconhecimento da dignidade exclusivamente com base na pertinência bi- ológica a
uma espécie e centrando a noção de dignidade no reconhecimento de direitos ao
indivíduo, sem os quais este acaba não sendo levado a sério como tal. Nesta mesma
linha, já havia decidido o Tribunal Federal Constitucional da Ale- manha (in: BverfGE
39, 1 [41]), considerando que onde existe vida humana esta deve ter assegurada a
proteção de sua dignidade, não sendo decisivo que o titular tenha consciência de sua
dignidade ou que saiba defender-se a si próprio, bas- tando, para fundamentação da
dignidade, as qualidades potenciais inerentes a todo o ser humano.
123 Assim já lecionava H.C. Nipperdey, in: Neumann/Nipperdey/Scheuner (Org.), D
ie Grundrechte, vol. II, p. 3. 124 Neste sentido, v. o magistério de J. Miranda, Manua
l..., vol. IV, p. 184 (“a dignidade da pessoa é da pessoa concreta, na sua vida real e
quotidiana; não é
de um ser ideal e abstrato”). Assim também K. Stern, Das Staatsrecht..., vol. III/1, p.
11- 12. 125 Assim, também para o nosso direito constitucional positivo, é a dignidad
e da pessoa humana (de cada e, à evidência, de todas as pessoas) concreta e
indi- vidualmente considerada o objeto precípuo do reconhecimento e proteção
pela ordem
constitucional. 126 Cf. K Bayertz, “Die Idee der Menschenwürde: Probleme und Para
doxien”, in: ARSP 81 (1995), p. 472-3, apontando, ainda, para uma permanente e ine
vitável zona de tensão entre a dignidade da pessoa e a dignidade
humana. 127 Kant, Fundamentos..., p. 136-37. No original, “Nun würde zwar die Me
n- schheit bestehen können, wenn niemand zu des anderen Glückseligkeit
was beitrüge, dabei aber ihr nichts vorsätzlich entzöge; allein es ist dieses doch
nur eine negative und nicht positive Übereinstimmung zur Menschheit, als Zweck a
n
sich selbst, wenn jedermann auch nicht die Zwecke anderer, so viel a n ihm ist,
zu befördern trachtete. Denn das Subjekt, welches Zweck na sich selbst ist,
dessen Zwecke müssen, wenn jede Vorstellung bei mir alle Wirkung tun soll, auch,
so
viel möglich, meine Zwecke sein.” (Kant, Grundlegung..., p. 63). 128 Cf. A. E. Pérez L
uño, Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución, p. 318. Este também pa
rece ser o entendimento de J. Miranda, Manual..., vol. IV, p. 189, ao sustentar que
“cada pessoa tem de ser compreendida em relação com as demais. Por isso, a
Constituição completa a referência à dignidade com a refer- ência à mesma
dignidade social que possuem todos os cidadãos e todos os
trabal- hadores [arts. 13, nº 1, e 59, nº 1, alínea b], decorrente da inserção numa com
u- nidade determinada.” No mesmo sentido, v. M. A. Alegre Martinez, La dignidad d
e la persona ..., p. 19, referindo, no âmbito de uma dimensão social, a necessidade d
e que a dignidade, como atributo de pessoa individual, deve ser acompanhada
da necessidade de que as demais pessoas e a comunidade respeitem sua liberdade
e seus direitos. 129 Cf. F. Moderne, La dignité de la personne..., p. 198-
199, em passagem con- fessadamente influenciada pela obra de Ronald Dworkin.
Note-se, de outra parte, que as assim denominadas concepções ontológica e
instrumental da dignidade, de
certa forma correspondem à já referida classificação proposta por Hofmann
(dig- nidade como dádiva e prestação). Nesta mesma linha de entendimento,
também no âmbito da doutrina francesa, vale mencionar o magistério de L. Cassiers,
“la dignité et l’embryon humain”, in: Revue Trimmestrielle des Droits de L’Homme, v
ol. 54 (2003), especialmente p. 407-13, entre outros aspectos apontando para a
cir- cunstância de que – na condição de uma criação da sociedade (como
elaboração cultural e simbólica) – a dignidade adquire uma dimensão coletiva, no
sentido de que a relação do sujeito com ele próprio depende largamente da relação
da pessoa com os seus
semelhantes. 130 Cf. J. C. Gonçalves Loureiro, O Direito à Identidade Genética do S
er Humano, p. 281. 131 Cf. H. Ahrendt, A Condição Humana, p. 15 e ss. (capítulo I},
onde discorre, entre outros aspectos (e sem uma referência direta à noção de
dignidade da pes- soa humana), sobre o conceito e os pressupostos da condição e
da existência hu- mana, noções que, a despeito de vinculadas, não se confundem.
Assim, para a au- tora “A ação, única atividade que se exerce entre os homens sem a
mediação das coisas ou da matéria, corresponde à condição humana da pluralidade,
ao fato de que homens, e não o Homem, vivem na Terra e habitam o mundo. Todos
os
aspectos da condição humana têm alguma relação com a política; mas esta
plural- idade é especificamente a condição – não apenas a conditio sine qua non, ma
s a conditio per quam – de toda a vida política. Assim, o idioma dos romanos – talve
z o povo mais político que conhecemos – empregava como sinônimas as
expressões ‘viver’ e ‘estar ente os homens’ (inter homines esse), ou ‘morrer’ e ‘deixar
de estar entre os homens’ (inter homines esse desinere)”. Em suma, ainda para a filó
sofa (p. 16), “a pluralidade é a condição da ação humana pelo fato de sermos todos
os mesmos, isto é, humanos, sem que ninguém seja exatamente igual a qualquer pess
oa que tenha existido, exista ou venha a existir” (grifo
nosso). 132 Cf. H. Ahrendt, A Condição Humana, p. 15-16, de acordo com trecho já
tran- scrito na nota
anterior. 133 Cf. J. Habermas, Die Zukunft der menschlichen Natur, p. 62 e ss. 134 C
f. J. Habermas, ob. cit., p. 65. 135 Cf. R. Timm de Souza “A dignidade humana desde
uma antropologia dos intervalos – uma síntese”, in: VERITAS v. 53, n.2, abr./jun.
2008, p.
148. 136 Cf. H. Hofmann, Die versprochene Menschenwürde, in: AÖR 118 (1993), p.
364, posicionando-se – ao sustentar que a dignidade, na condição de conceito
ju- rídico, assume feições de um conceito eminentemente comunicativo e relacional
– no sentido de que a dignidade da pessoa humana não poderá ser destacada
de uma comunidade concreta e determinada onde se manifesta e é reconhecida.
No mesmo sentido, reconhecendo que a dignidade também assume a condição
de conceito de comunicação, v., no âmbito da doutrina lusitana, a referência de
J. Machado, Liberdade de Expressão, p. 360. 137 P. Häberle, Die Menschenwürde al
s Grundlage..., especialmente p. 843 e ss., advogando igualmente uma dimensão
necessariamente intersubjetiva, social e comunicativa da
dignidade. 138 A. Honneth, Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflit
os sociais, São Paulo: Editora 34, 2003. Para uma introdução (em língua portuguesa)
do pensamento de Honneth, v. G. A. Saavedra; G. A. Sobottka, “Introdução à
Teoria do Reconhecimento de Axel Honneth”, in: Civitas, vol. 8, nº 1, jan./abr., 2008,
p. 9-18. Desenvolvendo a relação entre dignidade da pessoa humana e
reconhec- imento (com destaque para as noções de pessoa e reconhecimento),
embora em perspectiva diferenciada da de Axel Honneth, v. L. F. Barzotto, “Pessoa e
reconhec- imento – uma análise estrutural da dignidade da pessoa humana”, in: A.
de
Almeida Neto e P. Melgaré (Orgs.), Dignidade da Pessoa Humana. Fundamentos e C
ritérios Interpretativos, São Paulo: Malheiros, 2010, p. 39 e ss. 139 Cf. F. Fukuyama,
Nosso Futuro Pós-Humano, p. 23. 140 Cf. M. A. Alegre Martínez, La dignidad de la
persona..., p. 26. No mesmo sentido, frisando que a despeito da dignidade ser um
valor constante, o que asse- gura dignidade às pessoas acaba sendo definido por
fatores históricos e sociais,
v. C.Gearty, Principles of Human Rights Adjudication, p. 87. 141 Cf. R. Dworkin, El
Dominio de la Vida, p. 305. Neste contexto, a respeito da diversidade de tratamento
da dignidade da pessoa, mesmo pelo ordenamento ju- rídico, vale lembrar, entre
outros, o exemplo da Constituição Iraniana de
1980 (referido por B. Mathieu, La dignité de la personne humaine..., p. 286), que, no
seu artigo 22, dispõe que “a dignidade dos indivíduos é inviolável...salvo nos
casos autorizados por lei”, o que demonstra igualmente que – ao menos para
algumas ordens jurídicas – nem mesmo a dignidade encontra-se imune a restrições
pelo legislador, aspecto do qual voltaremos a nos pronunciar. Da mesma forma,
vale lembrar aqui, dentre outros tantos exemplos que poderiam ser colacionados,
a prática da tortura, das mutilações genitais, da discriminação sexual e
religiosa, ainda toleradas (inclusive pelo direito positivo) em alguns Estados.
142 Caso Campbell v. Wood, U.S. Supreme Court, 1994. Ainda a respeito da dig- nida
de da pessoa no âmbito das controvérsias relativas à pena de morte,
convém registrar que não faltam, na literatura norte-americana, vozes que se opõem
à pena de morte, vislumbrando nesta uma violação da dignidade da pessoa, não
re- stringindo a incidência da dignidade ao modo de execução da pena, tal como
no caso apreciado pela Suprema Corte. Neste sentido, dentre outros, v. o recente
en- saio de A . K. Eklund, “The death penalty in Montana: a violation of the
consti- tutional right to individual dignity”, in: Montana Law Review vol. 65 (2004), p.
135 e ss., avaliando a jurisprudência da Suprema Corte dos EUA e da Suprema Corte
do Estado de Montana. De acordo com a autora, cujos principais argumentos
aqui são sinteticamente apresentados, a imposição da pena de morte, para além
do direito à vida, ofende a dignidade da pessoa pelo fato de: a) que se está a forçar
o condenado a conviver com a circunstância de que esteja com a sua morte
iminente decretada, o que representa uma inadmissível tortura psicológica (p. 141 e
ss.); b) a pena de morte implica violação da integridade corporal da pessoa (que, por
sua vez, diz com os elementos essenciais da dignidade) e o direito de cada um de
de- cidir a respeito do que acontece ao seu próprio corpo (p. 148-40); c) ao executar
a pena, o Estado toma ao executado a sua autonomia pessoal e não o
considera como pessoa com um valor próprio, de tal sorte que não apenas a
dignidade do
condenado é violada, mas de todos os envolvidos no processo, já que este, em
si mesmo, já é desumano e indigno (p. 150-
53). 143 Versando justamente sobre o problema do multiculturalismo, vale referir aq
ui pelo menos o instigante ensaio de B. Sousa Santos, Por uma
concepção multicultural de direitos humanos, in: Revista Crítica de Ciências Sociais
, nº 48 (1997), especialmente p. 18 e ss., onde o festejado sociólogo lusitano
sustenta que o conceito de direitos humanos e a própria noção de dignidade da
pessoa assen- tam num conjunto de pressupostos tipicamente ocidentais, quando,
em verdade, todas as culturas possuem concepções de dignidade humana, muito
embora nem todas elas a concebam em termos de direitos humanos, razão pela qual
se impõe o estabelecimento de um diálogo intercultural, no sentido de uma troca
perma- nente entre diferentes culturas e saberes, que será viabilizada pela aplicação
daqui- lo que o autor designou de uma “hermenêutica diatópica”, que, por sua vez,
não pretende alcançar uma completude em si mesma inatingível, mas sim, ampliar
ao máximo a consciência da incompletude mútua entre as diversas culturas por
meio do diálogo. Mais recentemente, também enfrentando a questão da dignidade à
luz da globalização e do multiculturalismo, v., entre outros, D.N. Weisstub,
“Honor, Dignity, and the Framing of Multiculturalist Values”, in: D. Kretzmer e E.
Klein (Ed.), The Concept of Human Dignity in Human Rights Discourse, p. 263-93.
Demonstrando não apenas a necessidade, mas algumas das possibilidades
vincu- ladas a um diálogo entre as diversas fontes normativas (no caso, enfrentando
o tema da dignidade da pessoa humana) v. o estudo de V. Jackson,
“Constitutional Dialogue and Human Dignity: States and Transnational
Constitutional Discourse”, in: Montana Law Review vol. 65 (2004), p. 15-
40, propondo, em síntese, uma aber- tura para os aportes do direito comparado e, de
resto, o diálogo produtivo entre as fontes de direito constitucional, especialmente no
caso dos EUA, onde, a despeito da ausência de previsão expressa na Constituição
(muito embora o reconhec- imento da dignidade – ainda que de modo não unânime
e carente de uma série de desenvolvimentos – como valor subjacente ao sistema
constitucional) existe pre- visão explícita do princípio na esfera estadual, como dá
conta o exemplo do Estado de
Montana. 144 Neste sentido, v., a advertência de B. Maurer, Notes sur le respect de
la dig- nité humaine, p. 186. 145 Cf. G. Dürig, Der Grundsatz der Menschenwürde...,
in: AÖR nº 81 (1956), p. 127. No direito brasileiro, a fórmula do homem-objeto, isto
é, o enunciado de que tal condição é justamente a negação da dignidade, encontra-
se – ao menos assim nos parece – formulada expressamente na Constituição,
notadamente quando o
nosso Constituinte, no art. 5º, inciso III, da Constituição de 1988,
estabelece de forma enfática que “ninguém será submetido à tortura e a
tratamento
desumano ou degradante.” Neste contexto, vale, ainda, lembrar a lição de P
. Häberle, Men- schenwürde als Grundlage..., p. 842, quando afirma que a c
oncepção de Dürig (a fór- mula do “objeto”) acaba por transformar-se
também numa “fórmula-sujeito”, já que o estado constitucional efetiva a
dignidade da pessoa, na medida em que reconhece e promove o indivíduo
na condição de sujeito de suas ações. Ainda
a respeito da fórmula “objeto”, v., numa perspectiva comparada, A.P.C. Bar
bosa, Die Menschenwürde im Deutschen Grundgesetz und in der
Brasilianischen Verfassung
von 1988, p. 33 e ss., e 154 e ss. 146 Cf. M. Sachs, Verfassungsrecht II – G
rundrechte, p. 174. 147 Apenas pinçando uma das diversas decisões onde t
al concepção foi ado- tada, verifica-se que, para o Tribunal Federal
Constitucional da Alemanha, a dig- nidade da pessoa humana está
vinculada ao valor social e pretensão de respeito do ser humano, que não
poderá ser reduzido à condição de objeto do Estado ou sub- metido a
tratamento que comprometa a sua qualidade de sujeito (v. BverfGE 96,
p. 399). Convém lembrar, todavia (a despeito de outras críticas possíveis)
que a fór- mula do homem-objeto não afasta a circunstância de que, tanto
na vida privada
quando na esfera pública, as pessoas constantemente se colocam a si
próprias na condição de objeto da influência e ação alheias, sem que com
isto se esteja
colo- cando em dúvida a sua condição de pessoa (Cf. a observação de H. H
ofmann, Die versprochene Menschenwürde, in: AÖR nº 118 (1993), p. 360. I
gualmente não se deve desconsiderar a precoce objeção de N. Luhmann, G
rundrechte als Institution, p. 60, que considerou a fórmula-objeto vazia, já
que não afasta a necessidade de decidir quando e sob que circunstâncias
alguém estará sendo tratado como objeto, a ponto de restar configurada
uma violação da sua
dignidade. 148 Neste contexto, há mesmo quem tenha criticado a utilizaçã
o da “fórmula- objeto” como sendo praticamente tão vazia de sentido e
imprecisa quanto as de- mais fórmulas que pretendeu substituir e quanto a
própria noção de dignidade da pessoa humana. Neste sentido, v. P.
Tiedemann, “Die Würde des Menschen ist Unantastbar”, p.
118. 149 Assim, por exemplo, não restam dúvidas de que a dignidade da p
essoa hu- mana engloba necessariamente o respeito e a proteção da
integridade física do indivíduo, do que decorrem a proibição da pena de
morte, da tortura, das penas de cunho corporal, utilização da pessoa
humana para experiências científicas, esta- belecimento de normas para os
transplantes de órgãos, etc., tudo conforme refere
Höfling, in: M. Sachs (Org.), Grundgesetz, p. 107-9. De outra parte, percebe
-se que os exemplos citados demonstram a existência de uma íntima
relação entre os dire- itos fundamentais e a dignidade da pessoa, aspecto
que ainda será objeto de análise mais aprofundada e que aqui foi apenas
referido com o objetivo de demon- strar algumas das dimensões concretas
desenvolvidas a partir da noção da dig- nidade da pessoa humana.
Registre-se, ademais, que o próprio Tribunal
Federal Constitucional da Alemanha, tal como refere M. Sachs, Verfassungs
recht II – Grun- drechte, p. 174, tem relativizado a fórmula do “homem-
objeto”, reconhecendo ser a mesma insuficiente para apreender todas as
violações e assegurar, por si só, a pro- teção eficiente da dignidade da
pessoa humana. 150 Neste sentido, parece situar-
se o entendimento de M. Sachs, Verfas- sungsrecht II – Grundrechte, p. 17
4 e ss., sugerindo que o âmbito de proteção da garantia da dignidade da
pessoa humana restaria melhor definido em se perquirindo, em cada caso
concreto, se à luz da fórmula do homem-objeto a su- posta conduta
violadora efetivamente desconsidera o valor intrínseco da
pessoa. Por sua vez, Udo Di Fabio, Der Schutz der Menschenwürde, ..., p. 2
2 e ss., destaca que não é possível definir a dignidade como bem
juridicamente protegido para além da fórmula-objeto (que reconhece ser
vaga e indeterminada), sem que se acabe invadindo a seara nebulosa da
autodefinição do ser humano, de tal sorte
que apenas uma determinação do âmbito de proteção com base no critério
da con- duta ofensiva se revela juridicamente controlável. Mesmo
considerando o peso deste argumento, vale colacionar a posição crítica de
M. Nettesheim, “Die Garantie der Menschewürde Zwischen
Metaphysischen Überhöhung und bloßem
Abwä- gungstopos”, in: AÖR 130 (2005), p. 79 e ss., no sentido de que a fór
mula objeto acaba sendo submetida exclusivamente ao processo subjetivo
da ponderação por parte do detentor do poder de decisão, o que reforça a
ideia de que, a despeito de sua relevância, a formula objeto não pode servir
como critário
exclusivo. 151 Sobre este tema remetemos o leitor ao nosso Dimensões da
Dignidade. Estu- dos de Filosofia do Direito e Direito Constitucional, 2ª ed
. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, coletânea que inclui, além de
texto introdutório de nossa lavra (consistente, em termo gerais, de uma
reconstrução do presente capítulo desta obra) contributos de outros
autores, apontando e explorando diversas das pos- síveis dimensões da
dignidade. 152 Sobre o tema da dignidade da vida e da própria dimensão e
cológica da dig- nidade, remetemos às referências bibliográficas já citadas
(v. nota de rodapé nº 40, p. 40), mas destacamos, pela especial relevância,
a contribuição de T.
Fenster- seifer, Direitos Fundamentais e Proteção do Ambiente, Porto ALegr
e: Livraria do
Advogado, 2008, texto que corresponde, salvo alguns ajustes e atualizações, à dissertação de
mestrado apresentada pelo autor no âmbito do Programa de Pós- Graduação em Direito da
PUCRS, que tivemos o privilégio de orientar, assim como a coletânea organizada por C.A.
Molinaro, F.L.F. Medeiros, I.W. Sarlet e T.
Fenster- seifer, Dignidade da Vida: os direitos fundamentais para além dos humanos – uma
discussão necessária, Belo Horizonte: Editora Forum, 2008, em especial o artigo de nossa
autoria, em parceria com T. Fensterseifer, desenvolvendo a questão da dimensão ecológica
da dignidade e da dignidade da vida em
geral. 153 Como critério aferidor do que seja uma vida saudável, parece-nos apro- priado
utilizar os parâmetros estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde, quando se refere a
um completo bem-estar físico, mental e social, parâmetro este que, pelo seu
reconhecimento amplo no âmbito da comunidade internacional, poderia igualmente servir
como diretriz mínima a ser assegurada pelos Estados.