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IMUNIDADES E ISENÇÕES

TRIBUTÁRIAS NA
CONSTITUIÇÃO E NO STF

Aula 4
Imunidades Tributárias
Específicas Previstas no
Sistema Tributário Nacional

Rafael Campos Soares da Fonseca


SUMÁRIO
Introdução .................................................................................................. 3

1. Exoneração das exportações em relação às contribuições e aos

impostos ..................................................................................................... 5

2. Demais exonerações relacionadas ao ICMS .................................... 9

3. Imunidades tributárias no Sistema Tributário Nacional voltadas

aos Tributos Diretos ............................................................................... 12

Conclusões ............................................................................................... 14

Referências bibliográficas .....................................................................16


AULA 4 IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

Introdução

Olá! Seja bem-vindo à nossa quarta aula do Curso “Imunidades e Isenções Tributárias
na Constituição e no STF”!

Na última aula, concluímos o estudo das imunidades genéricas, previstas no art.


150, VI, da Constituição da República. Compreendemos o regime jurídico, os elementos e as
características da exoneração tributária em nível constitucional referente aos entes federados
e respectivas administrações indiretas. Também tratamos das instituições confessionais
particulares que exercem atividades de interesse público, assim como dos livros, dos
periódicos, dos papéis, dos fonogramas e dos videogramas em consonância com o que
estudamos previamente. Conforme nosso plano de ensino, esta aula versará sobre as demais
normas imunizantes do Sistema Tributário Nacional.

Esse sistema desenvolve-se desde a década de 1960 como fruto de uma reforma
tributária levada a efeito com o Código Tributário Nacional e a Emenda Constitucional 18 à
Constituição da República de 1946. A partir da Carta Constitucional de 1967, esse expediente
tomou feições e estatura constitucionais, resultando nos atuais 17 artigos e seus diversos
parágrafos, alíneas e incisos sobre o tema, na ordem vigente.

Para compreender nosso sistema tributário, é imprescindível perpassar


Sa
cê bi por nossa tradição constitucional. Confira, a propósito, o relato do
Vo

a?

professor Ives Gandra Martins acerca do processo constituinte de


1987/1988: O Sistema Tributário Brasileiro: História, Perfil Constitucional
e Proposta de Reforma. Acesso em 3 de junho de 2018.

Ives Gandra da Silva Martins, doutor em Direito pela Universidade


Mackenzie. Especialização em Ciência das Finanças pela Faculdade
de Direito da Universidade de São Paulo. Especialização em
Direito Tributário pela Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo (USP). Professor emérito e honorário de diversas
universidades brasileiras e internacionais. Autor de mais de 80
livros individualmente e 350 em conjunto, com obras publicadas
em 21 países.
Fonte: Advocacia Gandra Martins
AULA 4 IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

Neste momento, entramos nas imunidades tributárias específicas, isto é, direcionadas


a um único tributo e obstativa a uma pessoa política em especial, por razões políticas variadas
assumidas pelo Poder Constituinte. Nesse sentido, optamos por dividir nosso estudo em duas
aulas, tendo como base o critério topográfico, de maneira a sistematizar o conhecimento das
imunidades por intermédio da arquitetura constitucional.

Segundo Costa (2015, p. 209),

[d]iante do texto constitucional pode-se verificar o grande número de imunidades específicas


relativas a impostos, maior do que nas Constituições anteriores, ao lado da previsão de várias
exonerações concernentes a taxas e, de maneira inédita, hipóteses relativas a contribuições.

Por conseguinte, é com esse vasto corpo normativo que nos ocuparemos nas Aulas 4
e 5 de nosso curso. Circunscritos nesta ocasião ao Sistema Tributário Nacional, abordaremos
eminentemente imunidades específicas contidas nas Seções III a V, relativas aos denominados
impostos em espécie – por serem autorizativos à competência legislativa dos entes federativos
e taxativos ao limitar as bases econômicas tributáveis pelas pessoas políticas, ressalvada a
competência tributária residual da União, disciplinada no art. 154 do Texto Constitucional.

De todo modo, com a promulgação da Emenda Constitucional 33/2001, incluiu-se, no


bojo do art. 149, §2º, I, da Carta Constitucional, norma imunizante relacionada às contribuições
sociais e de intervenção no domínio econômico. Portanto, por ordem numérica crescente,
iniciaremos nosso estudo por aqui, tudo bem?

Nosso objetivo nesta aula é compreender sistemicamente as opções do Poder


Constituinte no tocante a exonerações constitucionais pontuais previstas no Sistema Tributário
Constitucional, isto é, relativas a determinada pessoa política ou a tributo específico, embora
com reflexos importantes na tributação brasileira.

Então, vamos em frente!


AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

1. Exoneração das exportações em relação às contribuições e aos impostos


Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF

É consabido que a União possui competência exclusiva para instituir contribuições


sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesses das categorias profissionais ou
econômicas, por força do art. 149 da Constituição da República, o que, nitidamente, não exclui a
atuação concorrente em matéria de contribuições previdenciárias e de melhoria, decorrente de
obra pública.

Diante da progressiva relevância econômica e arrecadatória dessa espécie tributária


no curso da década de 1990, o Poder Constituinte Reformador decidiu exonerar as receitas
decorrentes de exportação das contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico,
nos termos do inciso I do §2º do artigo supracitado.

A lógica do livre comércio e da economia globalizada estimula a tributação da renda na


origem, onde o valor econômico é criado, e impele, em prol da competitividade comercial, a
desoneração da cadeia exportadora de tributos sobre o consumo. Em síntese, tudo se resume à
máxima: “o Estado produtor não exporta tributos”.

Assim, o STF, no Tema 8 da sistemática da repercussão geral, cujo caso líder é o RE 564.413,
de relatoria do Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, j. 12.8.2010, DJe 3.11.2010, defrontou-se
com a interpretação do termo “receitas”, porquanto existe uma série de contribuições sociais as
quais não possuem como aspecto material da regra-matriz a realização de receita.

No caso, tratava-se de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), que – como o
próprio nome denuncia – incide sobre o lucro decorrente das exportações, distinguindo-se, nesse
quesito, das receitas. Por apertada maioria, o STF decidiu que a imunidade prevista no artigo
149, §2º, I, da Constituição da República, na redação conferida pela EC 33/2001, não exonera o
exportador desse tributo direto. Na ótica minoritária, composta por 5 Ministros, a interpretação
vencedora levaria à proteção apenas da COFINS e do PIS pela norma imunizante em questão.
Por isso, seria necessário interpretar o dispositivo de maneira mais ampla, abarcando todas as
contribuições sociais.

De qualquer modo, na mesma sessão plenária, ao julgar o subsequente Tema 52 da


repercussão geral, cujo paradigma é o RE 566.259, de relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski,
Tribunal Pleno, j. 12.8.2010, DJe 24.9.2010, a Corte reafirmou a interpretação que privilegia a
literalidade da norma.

Nesse sentido, a tese de julgamento resumiu-se à seguinte: “A imunidade tributária prevista


no art. 149, §2º, I, da Constituição Federal é restrita às contribuições sociais e de intervenção no
domínio econômico incidentes sobre as receitas decorrentes de exportação. Não contempla,
assim, a CPMF, cuja hipótese de incidência – movimentações financeiras – não se confunde com
receitas”.

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Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

Posteriormente, no Tema 329 da repercussão geral, que versava sobre a incidência de PIS
e COFINS na variação positiva em contrato de câmbio predecessor à exportação, o STF afirmou
a inconstitucionalidade dessa imposição tributária, tendo em conta a finalidade da norma
imunizante, além disso, nas palavras da Relatora, Ministra Rosa Weber: “Consubstancia etapa
inafastável do processo de exportação de bens e serviços, pois todas as transações com residentes
no exterior pressupõem a efetivação de uma operação cambial, consistente na troca de moedas”.

Vale ressaltar, porém, que a Contribuição ao Financiamento da Seguridade Social


PIS / COFINS

(COFINS) e a Contribuição ao Programa de Integração Social (PIS), indiscutivelmente,


incidem sobre as receitas do contribuinte em exportação. Logo, a controvérsia, neste
último caso, consistia em saber quais operações são albergadas pela imunidade tributária
em tela.

Por seu turno, no RE 759.244, por sua vez veiculador do Tema 674, decidiu-se se a
exportação intencionada no art. 149, §2o, I, do Texto Constitucional abrange etapas intermediárias
e preparatórias do negócio de compra e venda internacional. Nesse contexto, o Tribunal Pleno
assentou a natureza objetiva da norma imunizante em questão, por isso fixou a seguinte tese
de julgamento: ‘[a] norma imunizante contida no inciso I do §2º do art. 149 da Constituição da
República alcança as receitas decorrentes de operações indiretas de exportação caracterizadas
por haver participação negocial de sociedade exportadora intermediária.’

Igualmente, embora o julgamento tenha-se iniciado, ainda pende decisão definitiva sobre o
Tema 207 da repercussão geral, no qual se indaga se o contribuinte optante pelo Sistema Integrado
de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno
Porte (SIMPLES), previsto no art. 146, “d” e parágrafo único, do Sistema Tributário Nacional,
também usufrui das exonerações tributárias voltadas à exportação, seja das contribuições sociais
e de intervenção no domínio econômico (art. 149, §2º, I, CF), seja do Imposto sobre Produtos
Industrializados (art. 153, §3º, III, CF).

Em relação ao último, dado o caráter extrafiscal do IPI e o anseio de industrialização


do país, o texto original da Constituição da República já previa a “não incidência” do tributo
IPI

sobre produtos destinados ao exterior.

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AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

Por outro lado, além das contribuições já estudadas, o Imposto sobre Operações
Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF

relativas à Circulação de Mercadorias e aos Serviços de Transporte Interestadual e


ICMS
Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) era cobrado nas operações de exportação de
produtos semielaborados, definidos por lei complementar, por força da redação original
do art. 155, §2º, X, “a”, da Constituição da República.

Assim, a norma imunizante que albergava somente os produtos industrializados possuía


seu alcance e sua eficácia dependente de legislação infraconstitucional. Ademais, antes do advento
da LC 87/96, cabia aos próprios Estados e ao Distrito Federal definir os contornos do conceito de
semielaborado, conforme o art. 34, §2º, do texto constitucional, juntamente ao beneplácito da
jurisprudência do STF, v.g. o RE 205.634, de relatoria do Ministro Maurício Corrêa.

Segundo Scaff (2012), tratava-se de um erro primário do Constituinte, visto que a guerra
fiscal entre os Estados terminava por prejudicar o desenvolvimento nacional, ao onerar com
tributação as mercadorias e os serviços.

Fernando Facury Scaff, possui graduação em Direito pela Universidade


Federal do Pará (1983), doutorado em Direito Econômico e Financeiro pela
Universidade de São Paulo (1988), pós-doutorado pela Università Degli
Studi di Pisa em Direito Público (2007) e livre-docência pela Universidade
de São Paulo (2013). Atualmente é professor da Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo e professor da Universidade Federal do Pará.
Atua nas áreas de direito tributário, econômico e financeiro.
Fonte: Currículo Lattes

A Emenda Constitucional 42/2003 veio para resolver a questão, prevendo que “não incidirá”
ICMS sobre “operações que destinem mercadoria para o exterior, nem sobre serviços prestados
a destinatários no exterior”. Logo, a atual proteção do contribuinte exportador encontra-se
equiparada no tocante ao IPI e ao ICMS, almejando-se o fomento das exportações e os bons
resultados no balanço de pagamentos.

A respeito dos serviços prestados a destinatários no exterior, a Primeira Turma do STF


entendeu, no RE-AgR 395.195, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, j. 13.8.2013, que o serviço de
transporte interestadual de mercadorias destinadas ao exterior não se acopla à mercadoria, nem
é propriamente serviço prestado para destinatário no exterior. Assim, eventual desoneração tem
matiz de isenção fiscal decorrente da Lei Complementar 87/1996.
Pelas perdas arrecadatórias e pela impossibilidade de os Estados e o DF pagarem ou
compensarem de imediato os contribuintes, o dispositivo constitucional mencionado preconizou
“assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações
e prestações anteriores”.

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Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

No Tema 283 da sistemática da repercussão geral, cujo paradigma é o RE 606.107, de


relatoria da Ministra Rosa Weber, em que se discutiu a constitucionalidade da incidência
PIS / COFINS

das contribuições ao PIS/COFINS não cumulativos auferidos por empresa exportadora


em razão da transferência a terceiros de créditos de ICMS, assentou-se que a finalidade
do multicitado art. 155, §2º, X, “a”, na redação atual, é o “incentivo às exportações,
desonerando as mercadorias nacionais do seu ônus econômico” e o objeto da citada
norma são as operações de exportação.

Para compreender a decisão desse caso, é necessário ter em mente que o exportador
faz valer sua imunidade ao creditar-se dos valores pagos a título de ICMS até a ponta da cadeia
interna. É o acerto de contas de créditos e débitos tributários perante o Fisco estadual, à luz do
princípio da não cumulatividade. Afinal, antes disso, não se poderia, em princípio, ter a certeza de
que os componentes ou insumos seriam integrados em uma mercadoria exportada. Assim, esse
crédito pode ser oposto ao Estado tributante em compensação de dívidas, mas também tem valor
econômico e é passível de transação entre particulares.

A situação ficou clara até o momento?

Portanto, a discussão do Tema citado era saber se a operação de cessão de crédito da


exportadora a um terceiro está sujeita à incidência das contribuições ao PIS/COFINS, consistindo
em receita ou faturamento alheio à exportação que originou o saldo credor acumulado.

Com base no entendimento de que a cessão só se viabiliza pela exportação, e que as verbas
recebidas pela cessão são qualificadas como decorrentes da exportação, a corrente majoritária
do STF julgou não incidir a COFINS e a contribuição ao PIS sobre os créditos de ICMS cedidos a
terceiros.

3º Cessionário
Cadeia Produtiva Adquirente
dos Créditos
Mercado Interno exportador
Fiscais

Operação de exportação:
ficção jurídica responsável pelos créditos dos
valores recolhidos na etapa anterior da cadeia Operação de cessão decorre da
segundo a lógica da não cumulatividade. exportação; logo, também é imune.

Por outro lado, pende ainda de julgamento definir exatamente a extensão desse
creditamento de ICMS, uma vez que os contribuintes exportadores buscam neutralizar os tributos
pagos ao longo de toda a cadeia de comércio ou trânsito de mercadorias ao exterior, aproveitando-
se dos créditos das etapas anteriores.

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AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

Precisamos ter como referência dessa temática o Tema 475 da repercussão geral, no qual
Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF

se discutirá a “extensão da imunidade relativa ao ICMS para a comercialização de embalagens


fabricadas para produtos destinados à exportação”, enquanto no Tema 633 dessa sistemática
recursal, intenciona-se deliberar sobre o “direito ao creditamento, após a Emenda Constitucional
42/2003, do ICMS decorrente da aquisição de bens de uso e de consumo empregados na
elaboração de produtos destinados à exportação, independentemente de regulamentação
infraconstitucional”. Ambos ainda sem julgamento definitivo pelo Plenário.

Quadro resumo - Desoneração da cadeia produtiva exportadora

1) Imunidade de impostos sobre o consumo: IPI e ICMS.


Obs. Isenção fiscal do ISS na exportação de serviços para o exterior (Art. 2º, I e parágrafo único,
da LC 116/2003.

2) Imunidade de contribuições sociais e de intervenção sobre o domínio econômico incidentes


sobre as receitas decorrentes da exportação, como a contribuição ao PIS/COFINS.
Obs. Interpretação literal de receita exclui contribuições cujas materialidades não são receitas,
tais como CSLL e CPMF.

Tudo bem até aqui? Resta agora retornar para o mercado interno e estudar as demais
imunidades direcionadas ao ICMS e outras exonerações presentes no Sistema Tributário Nacional
voltadas aos tributos diretos.

Vamos lá?

2. Demais exonerações relacionadas ao ICMS

Além das imunidades direcionadas ao ICMS em operações de exportação, o


mesmo inciso X do §2º do art. 155 da Carta Constitucional prevê limitações à competência
ICMS

tributária dos Estados e do Distrito Federal no tocante ao ICMS. Em regra, essas normas
imunizantes ostentam caráter objetivo e político, uma vez que incidem nas operações e
são liberalidades do Poder Constituinte, dada a existência de capacidade contributiva dos
potenciais contribuintes.

Na alínea “b” do referido inciso, o objeto da imunidade é a operação que destina petróleo,
inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, assim como energia
elétrica a outros Estados. Merece especial atenção o fato de que somente a circulação interestadual
é alcançada pela norma.
Por isso, o STF já reconheceu, no RE 358.956, relatado pelo Ministro Joaquim Barbosa e
com acórdão redigido pelo Ministro Gilmar Mendes, a constitucionalidade da incidência de ICMS
sobre operação de bombeamento e “tancagem” de combustível no Estado do Rio de Janeiro, em
razão da não comprovação de venda do produto em outros Estados. Entendeu-se na ocasião que
a mencionada operação não é subsidiária a de destinação interestadual.

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AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

De acordo com Costa (2015), intenciona-se com a norma diminuir os custos dessas
Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF

mercadorias, por conta de sua essencialidade, assim como manter o pacto federativo, pois os
Estados federados em que não estivessem situadas as atividades de extração e refino do petróleo
ou as usinas geradoras de energia elétrica restariam com enorme prejuízo de viés tributário.

Portanto, por considerar que o beneplácito fiscal visa ao Estado de destino do petróleo e
da energia elétrica, a norma imunizante não exonera todo o ciclo econômico dos produtos, de
maneira a beneficiar o consumidor final, limitando-se ao Estado de origem. Nesse sentido, confira
o RE 198.088, Rel. Min. Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, j. 17.5.2000, DJ 5.9.2003.

De todo modo, há uma válvula de escape no art. 155, XII, “h”, do texto constitucional,
sob o controle do Legislador nacional, que pode, por intermédio de lei complementar, definir
os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o ICMS incidirá uma única vez, seja qual for a sua
finalidade. Nesse caso, a ordem constitucional afasta a aplicação da imunidade tributária em questão.

Por sua vez, a alínea “c” do mesmo dispositivo inviabiliza a tributação sobre o ouro quando
definido como ativo financeiro ou instrumento cambial, porquanto, nesses casos de transações
com o chamado ouro-ativo financeiro, o tributo devido é exclusivamente o Imposto sobre
Operações Financeiras (IOF), nos termos do art. 153, §5º, do texto constitucional. Na dicção do
Tribunal Pleno, o RE 190.363, Rel. Min. Carlos Velloso, “[o] ouro, definido como ativo financeiro ou
instrumento cambial, sujeita-se, exclusivamente, ao IOF, devido na operação de origem: C.F., art.
153, §5º.” Fica, então, evitada a bitributação na espécie.

Consideradas essas imunidades originárias, surgiu a Emenda Constitucional 42/2003, que


incluiu a alínea “d” no parágrafo em xeque com nova hipótese atinente às prestações de serviço de
comunicação nas modalidades de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita.

Assim, sabemos, pela leitura do


dispositivo constitucional, que o ICMS retira
do âmbito de incidência genérica do Imposto
Materialidade do ISS
sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) Prestação onerosa Exceção
os serviços de transporte interestadual e de serviços Sujeição ao ICMS em
intermunicipal e o serviço de comunicação. de qualquer decorrência de finalidades
Neste último caso, por justiça fiscal, somente natureza; arrecadatórias e federativas;
Prestação de serviços de
a prestação de serviços de comunicação de
comunicação e de transportes
natureza onerosa está sujeita à tributação interestadual e intermunicipal.
pelo imposto estadual.

Na condição de última imunidade tributária relativa ao ICMS, devemos estudar o §3º do


art. 155 da Constituição da República, pois lá se encontra a ideia de que as operações de energia
elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais devem
sujeitar-se somente ao ICMS na cadeia interna, cumuláveis os Impostos sobre Importações (II) e
Exportações (IE) em operações internacionais.

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Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

A respeito dessa norma constitucional, convido você a ler a manifestação


Sa
cê bi do Ministro Nelson Jobim no MS 24.312, Rel. Min. Ellen Gracie,
Vo

a?
Tribunal Pleno, j. 19.2.2003, DJ 19.12.2003, no qual fundamentou sua
compreensão da controvérsia no arranjo federativo desenhado na
Assembleia Nacional Constituinte:

“Em 1988, quando se discutiu a questão do ICMS, o que tínhamos? Houve uma grande
discussão na constituinte sobre se o ICMS tinha que ser na origem ou no destino.
A decisão foi que o ICMS tinha de ser na origem, ou seja, os estados do Sul
continuavam gratuitamente tributando as poupanças consumidas nos estados
do Norte e do Nordeste.
Aí surgiu um problema envolvendo dois grandes assuntos: energia elétrica -
recursos hídricos - e petróleo.
Ministro Nelson Jobim Ocorreu o seguinte: os estados onde ficasse sediada a produção de petróleo e a
produção de energia elétrica acabariam recebendo ICMS incidente sobre o petróleo e energia elétrica.
O que se fez? Participei disso diretamente, lembro-me que era, na época, o Senador Richard quem
defendia os interesses do Estado do Paraná e o Senador Almir Gabriel quem defendia os interesses do
Estado do Pará, além do Rio de Janeiro e Sergipe, em relação às plataformas de petróleo.
Então, qual foi o entendimento político naquela época que deu origem a dois dispositivos na
Constituição? Daí por que preciso ler o § 1º do Art. 20, em combinação com o inciso X do art. 155, ambos
da Constituição Federal.
O que se fez? Estabeleceu-se que o ICMS não incidiria sobre operações que se destinassem a outros
estados - petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos, gasosos e derivados e energia elétrica -,
ou seja, tirou-se da origem a incidência do ICMS.
Vejam bem, toda a produção de petróleo realizada no Estado do Rio de Janeiro, ou toda produção de
energia elétrica, no Paraná e no Pará, eram decorrentes de investimentos da União, porque o monopólio
era da União. Toda a arrecadação do País contribuiu para aquela produção.
Assim, decidiu-se da seguinte forma: tira-se o ICMS da origem e se dá aos estados uma compensação
financeira pela perda dessa receita. Aí criou-se o §1º do art. 20”.

A redação original do dispositivo foi alterada pelas Emendas Constitucionais 3/1993 e


33/2001, com a finalidade de incluir os serviços de telecomunicações, os derivados de petróleo,
os combustíveis de maneira geral e os minerais no âmbito de proteção da imunidade.

A despeito do referido elastecimento em sede constitucional das hipóteses, o Supremo


Tribunal Federal não admite interpretações extensivas da imunidade, como, por exemplo, diante
da pretensão de retirar a tributação de serviços de transporte de minerais, comumente submetidos
ao ISS, no RE 170.784, Rel. Min. Nelson Jobim, Segunda Turma, j. 14.3.2006, DJ 11.2.2005.

Ademais, a EC 33/2001 também precisou a expressão originária que dizia que “nenhum
outro tributo” para a formulação contemporânea de que “nenhum outro imposto poderá
incidir” (grifos nossos). Isso porque havia controvérsia doutrinária e jurisprudencial a respeito
da intributabilidade das bases mencionadas por contribuições sociais, inclusive as de natureza

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Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

previdenciária. O STF manteve sua jurisprudência exsurgida na ordem constitucional anterior que
previa o Imposto Único sobre Minerais (IUM) em seu art. 21, IX, da CF/67, porém não obstaculizava
a incidência legítima do PIS.

Esse entendimento foi cristalizado na Súmula 659 do STF, nos seguintes termos: “É legítima
a cobrança da COFINS, do PIS e do FINSOCIAL sobre as operações relativas a energia elétrica,
serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País”.

Quadro resumo - Imunidades Específicas de ICMS

Operações imunes:
1) Destinação INTERESTADUAL de petróleo e energia elétrica;
Obs. Inaplicabilidade da norma imunizante nos casos definidos em lei complementar como
combustíveis e lubrificantes para fins de incidência do ICMS uma única vez.
2) Ouro na condição de ativo financeiro, e não mercadoria;
3) Serviços de comunicações na modalidade radiodifusão sonora e de sons e imagens de
recepção livre e gratuita; e
4) Operações com energia elétrica, telecomunicações, derivados do petróleo, combustíveis e
minerais Incidência exclusiva de ICMS.
Obs. Cadeia interna: somente ICMS. Operação internacional: somam-se ao ICMS os Impostos
de Importação e Exportação.

Com essas considerações, estudamos todas as exonerações constitucionais relacionadas


ao ICMS. Agora, devemos estudar as imunidades tributárias relativas aos tributos diretos.

3. Imunidades tributárias no Sistema Tributário Nacional voltadas aos Tributos


Diretos

Conforme já explanamos no decorrer do curso, utilizamos a classificação de tributos diretos


para as imposições sobre o patrimônio e a renda dos contribuintes.

Vistos o IPI e o ICMS, no âmbito dos impostos, falta o estudo das imunidades
topograficamente localizadas no Sistema Tributário Nacional cujos objetos são o Imposto sobre
a Renda (IR), o Imposto Territorial Rural (ITR) e o Imposto sobre a Transmissão Inter Vivos de Bens
Imóveis (ITBI).

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Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

Em relação ao IR, importa apenas uma observação relativa à redação originária do


art. 153, §2º, II, da Constituição da República, segundo a qual eram imunes ao imposto
os rendimentos provenientes de aposentadoria e pensão pagos a pessoa maior de 65
IR

anos cuja renda total fosse constituída, exclusivamente, de rendimentos de trabalho, nos
termos e nos limites da lei. Tratava-se de uma imunidade tributária subjetiva e política
vocacionada ao amparo do idoso pelo Poder Público.

Porém, na reforma previdenciária levada a efeito pela EC 20/1998, o Poder Constituinte


revogou o citado dispositivo, suprimindo a norma imunizante do ordenamento jurídico. Nesse
cenário, o Supremo Tribunal Federal não rechaçou o expediente constituinte, sob o fundamento
de inexistência de um direito adquirido a não tributação de rendimentos.

Em razão disso, é importante contemporizar a expansão do assentado pelo STF na ADI 939
sobre o IPMF, da qual tratamos na segunda aula de nosso curso, quanto ao fato de as imunidades
serem intangíveis pelo Constituinte Derivado. No RE 372.600, Rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma,
j. 16.12.2003, DJ 23.4.2004, a ementa trouxe a seguinte proposição: “[m]ostra-se impertinente a
alegação de que a norma do art. 153, §2º, II, da Constituição Federal não poderia ter sido revogada
pela EC nº 20/98 por se tratar de cláusula pétrea”. Em suma, na dicção do STF, não são todas as
imunidades tributárias que formam cláusulas pétreas, à luz da fundamentalidade da garantia ou
do direito protegido.

No tocante ao ITR, temos, no art. 153, §4º, II, da Carta Constitucional, que “não
incidirá” o imposto sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as explore o
ITR

proprietário que não possua outro imóvel. Nesse sentido, almeja-se o incentivo à função
social da propriedade rural de pequenos agricultores, não gravando o patrimônio deste
com mais impostos.

No que se refere ao ITBI, há três normas imunizantes previstas no art. 156 da


Constituição da República. No próprio inciso II, ao estabelecer a base de incidência,
o Constituinte excepcionou os direitos reais de garantia, definíveis pelo Direito Civil
e disciplinados no respectivo Código como hipoteca, anticrese e penhor (este último
desimportante para nossa explicação, por
ITBI

versar sobre coisa móvel), diante de coisa de Anticrese: contrato em que o devedor entrega um
titularidade alheia. Trata-se de imunidade imóvel ao credor, transferindo-lhe o direito de auferir
os frutos e rendimentos desse mesmo imóvel para
política, por ser uma opção do Constituinte compensar a dívida; consignação de rendimento.
em não onerar mais o potencial sujeito
passivo da relação tributária.

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Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

As demais imunidades relacionadas ao imposto de transmissão possuem assento no art.


156, §2º, I, da Constituição, que assim dispõe: “não incide sobre a transmissão de bens ou direitos
incorporados ao patrimônio da pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre transmissão
de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica”.

Em suma, a norma dirige-se apenas a pessoas jurídicas e veda a tributação nas operações
de realização de capital ou transmissões modificativas ou extintivas do destinatário da imunidade.
Contudo, ressalva explicitamente não abranger o adquirente cuja atividade preponderante seja
a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.
Assim, não exonera sistematicamente todo um setor econômico, como o da construção civil, e
atinge a finalidade de facilitar a desmobilização de bens imóveis, dando liquidez no mercado a
uma empresa em crise ou crescimento.

A própria finalidade da norma imunizante apresenta questionamentos judiciais em casos


limítrofes. É o que ocorre no Tema 796 da repercussão geral, cujo paradigma é o RE 796.376,
Rel. Min. Marco Aurélio, no qual o Tribunal Pleno irá julgar se a imunidade também alcança a
integralização ao capital social da empresa mediante imóveis com valores de mercado superiores
às cotas realizadas. Saberemos, então, se é constitucional a operação de realização de capital em
que haja diferença entre o valor dos imóveis e a quantia integralizada no contrato social, indicando
utilização de forma jurídica artificiosa para beneficiar-se de imunidade tributária.

Conclusões

Finalizamos mais uma aula!

Trabalhamos aqui com as imunidades tributárias específicas, presentes no Sistema


Tributário Nacional. Esse exame operou-se em três partes: imunidades tributárias relacionadas
à cadeia produtiva de exportações de impostos e contribuições; demais exonerações relativas ao
ICMS; e as normas imunizantes direcionadas aos Estados, ao Distrito Federal e à União.

No primeiro ponto, abordamos o alcance do texto constitucional originário e alterado


pelas Emendas Constitucionais 33/2001 e 42/2003, abrangendo as contribuições sociais e de
intervenção no domínio econômico em receitas decorrentes de exportação, o IPI e o ICMS em
produtos, mercadorias e serviços destinados ao exterior. A propósito, tratamos sobre os temas
constitucionais submetidos à sistemática da repercussão geral.

Posteriormente, estudamos as normas imunizantes listadas no inciso X do §2º e no §3º do


art. 155 da Constituição da República, direcionadas ao ICMS, na qualidade de imposto estadual de
características nacionais e de significativa presença na carga tributária.

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AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

Enfim, partimos para o estudo das imposições sobre o patrimônio e a renda dos
Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF

contribuintes, pessoas físicas e jurídicas, especialmente as imunidades topograficamente


localizadas no Sistema Tributário Nacional, cujos objetos são o Imposto sobre a Renda (IR), o
Imposto Territorial Rural (ITR) e o Imposto sobre a Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis (ITBI).

Para fixar melhor os tópicos de imunidades tributárias específicas trabalhados, que tal
acessar o mapa mental da aula? Mapa Mental - Imunidades tributárias no Sistema Tributário
Nacional

No próximo encontro, enfrentaremos a última aula sobre as imunidades tributárias da


alçada de nosso curso, isto é, os impostos, taxas e contribuições sociais obstados por normas
imunizantes espraiadas pela Constituição da República e fora do Sistema Tributário Nacional,
muitas das quais como direitos e garantias individuais, com previsão do art. 5º do Texto
Constitucional, ou receitas financiadoras da Seguridade Social.

Até o próximo encontro!

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AULA 4 – IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS ESPECÍFICAS PREVISTAS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

Referências bibliográficas
Imunidades e Isenções Tributárias na Constituição e no STF

COSTA, Regina Helena. Imunidades Tributárias: teoria e análise da jurisprudência do STF. 3 ed.
São Paulo: Malheiros, 2015.

PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da


jurisprudência. 17 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015.

SCAFF, Fernando Facury. Recuperação de créditos acumulados de ICMS na exportação. In: ROCHA,
Valdir de Oliveira (coord.). Grandes questões atuais de Direito Tributário. v. 16. São Paulo:
Dialética, 2012, p. 52-74.

________. Royalties do Petróleo, Minério e Energia: aspectos constitucionais, financeiros e


tributários. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.

TORRES, Ricardo Lobo. Os Direitos Humanos e a Tributação: imunidades e isonomia. Rio de


Janeiro: Renovar, 1995.

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