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FACULDADE DAMÁSIO

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATU SENSU EM DIREITO


PROCESSUAL CIVIL

HADNA ORENHA

NEGÓCIOS JURÍDICOS PROCESSUAIS SOB A ÓTICA DO


NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Campo Grande – MS
2018
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HADNA ORENHA

NEGÓCIOS JURÍDICOS PROCESSUAIS SOB A ÓTICA DO


NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Trabalho de conclusão de curso apresentado à


instituição Damásio Educacional, curso de
Pós-Graduação em Direito Processual Civil,
como requisito parcial para conclusão de
curso.

Orientador:

CAMPO GRANDE – MS
2018
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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

CAPÍTULO I - BREVE HISTÓRICO E PRINCÍPIOS DO NEGÓCIO JURÍDICO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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CAPÍTULO I – BREVE HISTÓRICO E PRINCÍPIOS DO NEGÓCIO


JURÍDICO

No cerne das inovações trazidas pelo Novo Código de Processo Civil, o Negócio
Jurídico Processual que foi estabelecido nos artigos 190, 191 e 373, §3º do novo código,
visando, especialmente, o acordo entre as partes e a celeridade do processo. Entende-se por
negócio jurídico:

Negócio jurídico é aquela espécie de ato jurídico que, além de se originar de um ato
de vontade, implica a declaração expressa de vontade, instauradora de uma relação
entre dois ou mais sujeitos tendo em vista um objetivo protegido pelo ordenamento
jurídico (REALE, 2009, p. 208).

Antes que se possa analisar o negócio jurídico, insta estudar os fatos jurídicos, e,
posteriormente, os atos jurídicos, de onde o negócio jurídico se origina. Pontes de Miranda
atenta para a questão do fato e do fato jurídico:

Quando se fala de fatos alude-se a algo que ocorreu, ou ocorre, ou vai ocorrer. O
mundo mesmo, em que vemos acontecerem os fatos, é a soma de todos os fatos que
ocorreram e o campo em que os fatos futuros se vão dar. Por isso mesmo, só se vê o
fato como novum no mundo. Temos, porém, no trato do direito, de discernir o
mundo jurídico e o que, no mundo, não é mundo jurídico. Por falta de atenção aos
dois mundos muitos erros se cometem e, o que é mais grave, se priva a inteligência
humana de entender, intuir e dominar o direito (MIRANDA, 1999, p. 52).

Sobre a distinção entre fato e ato jurídico, Emílio Betti assevera que:

Na realidade, a distinção entre atos e fatos jurídicos só tem sentido na medida em


que tome por base o modo como a ordem jurídica considera e valoriza determinado
fato. Se a ordem jurídica toma em consideração o comportamento do homem em si
mesmo, e, ao atribuir-lhe efeitos jurídicos, valoriza a consciência que,
habitualmente, o acompanha, e a vontade que, normalmente, o determina, o fato
deverá qualificar-se como ato jurídico. Mas deverá, pelo contrário, qualificar-se
como fato, quando o direito tem em conta o fenômeno natural como tal, prescindido
da eventual concorrência da vontade: ou então quando ele considera, realmente, a
ação do homem sobre a natureza exterior, mas, ao fazê-lo, não valora tanto o ato
humano em si mesmo, quanto o resultado de fato que ele tem em vista: quer dizer, a
modificação objetiva que ele provoca no estado de coisas preexistente (BETTI,
2008, p. 30).

Ou seja, é possível compreender que a principal diferença entre fato e ato jurídico
é que o segundo denota essencialmente ser determinado pela vontade das partes.

No antigo código civil, o negócio jurídico era reconhecido como uma subdivisão
de atos jurídicos lícitos, ou seja, considerado de maneira genérica. Ainda de acordo com
Reale:

Tais atos, que culminam numa relação intersubjetiva, não se confundem com atos
jurídicos em sentido estrito, nos quais não há acordo de vontade, como, por
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exemplo, sé da nos atos chamados matérias, como os da ocupação ou posse de um


terreno, a edificação de uma casa no terreno, apossado, um contrato de compra e
venda, ao contrário, tem sua forma especifica de um negócio jurídico (REALE,
2009, p. 209).  

Desta feita, há que se considerar as diferenças entre ato jurídico e negócio


jurídico: embora a manifestação de vontade esteja presente em ambos os casos, no negócio
jurídico encontra-se presente a autonomia privada, a vontade declarada; em contrapartida, no
ato jurídico estrito, a vontade não se dedica à escolha da categoria jurídica – o efeito
produzido é preestabelecido em lei, como assevera Marcos Bernardes de Mello:

[...] é o fato jurídico cujo elemento nuclear do suporte fáctico consiste em


manifestação ou declaração consciente de vontade, em relação à qual o sistema
jurídico faculta às pessoas, dentro de limites predeterminados e de amplitude vária, o
poder de escolha de categoria jurídica e de estruturação do conteúdo eficacial das
relações jurídicas respectivas, quanto ao seu surgimento, permanência e intensidade
no mundo jurídico (MELLO, 2013, p. 225).

Freddie Didier assevera que negócio jurídico “é o fato jurídico voluntário em cujo
suporte fático confere-se ao sujeito o poder de escolher a categoria jurídica ou estabelecer,
dentro dos limites do próprio ordenamento jurídico, certas situações jurídicas processuais”
(DIDIER, 2013).

Podemos encontrar mais distinções entre ato jurídico e negócio jurídico na


doutrina, como afirma Renan Lotufo:

Ato jurídico e negócio jurídico são manifestações de vontade, mas diferem quanto à
estrutura, à função e aos respectivos efeitos. Quanto à estrutura, enquanto nos atos
jurídicos temos uma ação e uma vontade simples, nos negócios jurídicos temos uma
ação e uma vontade qualificada, que é produzir um efeito jurídico determinado,
vontade caracterizada pela sua finalidade específica, que é a constituição,
modificação ou extinção de direitos (LOTUFO, 2004, p. 271).

A assertiva de Lotufo expressa que o negócio jurídico tem, por finalidade e


propósito, produzir efeito jurídico.

Tendo o negócio jurídico surgido no ordenamento jurídico alemão, é importante


considerar o entendimento de juristas como Hans Kelsen:

[...] o negócio jurídico típico é o contrato. Num contrato, as parte contratantes


acordam em que devem conduzir-se da mesma maneira, uma em face da outra. Este
dever-ser é o sentido subjetivo do ato jurídico-negocial, mas também seu sentido
objetivo. Na medida em que a ordem jurídica institui o negócio jurídico como fato
produtor de Direito, confere aos indivíduos que lhe estão subordinados o poder de
regular as suas relações mútuas, dentro dos quadros das normas gerais criadas pela
via jurídico-negocial (KELSEN, 1998, p. 284).
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É possível deduzir que, ainda, para a existência do negócio jurídico lícito, esse
efeito necessita de reconhecimento social, sempre composto por valores e princípios
existentes no ordenamento jurídico.

Faz-se importante pontuar que, com o advento do novo Código de Processo Civil,
o juiz passa de parte obrigatória para eventual do processo, e as partes são os agentes do
negócio processual. Cabe ao juiz, no entanto, controlar a licitude do pacto (BRASIL, 2015).

Tal assertiva faz-se clara no art. 190:

Art. 190 Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição é lícito às
partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às
especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e
deveres processuais, antes ou durante o processo.
Parágrafo único.  De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das
convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de
nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se
encontre em manifesta situação de vulnerabilidade (BRASIL, 2015).

Ou seja, ainda que haja a declaração de vontade das partes, ficou estabelecido que
estas não poderão transgredir direitos do juiz.

O jurista Pontes de Miranda estabelece o que ficou conhecido como “escada


Ponteana”, que podem ser definidos como os três planos do negócio jurídico:

TABELA 1 – ESCADA PONTEANA

Plano da existência Plano da validade Plano da eficácia


Capacidade do agente Condição
Agente
Liberdade de vontade Termo
Vontade
Licitude, possibilidade e determi- Consequências do inadimplemento
Objeto
nabilidade do objeto negocial
Forma
Adequação das formas Outros elementos
Fonte: a autora, com informação recolhida e sintetizada de TARTUCE, 2017.

O termo se denomina “escada Ponteana” por colocar um plano como essencial


para a existência do outro, ou seja: para que um negócio jurídico seja eficaz ele precisa ser
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válido e existente; para que seja válido, ele precisa existir, mas não necessariamente será
eficaz e; a existência de um negócio jurídico não necessariamente o torna válido ou eficaz.

Como se pode observar, no plano da existência, existem quatro elementos que são
necessários para a existência de um negócio jurídico – ou seja, na falta de qualquer destes
elementos, o negócio jurídico pode ser considerado inexistente. No entanto, não existe no art.
104 do Novo Código Civil qualquer especificação direta a pressupostos de existência ou
inexistência de um negócio jurídico.

No entendimento de Miranda,

Concluindo: quer porque se trata de uma categoria lógico-racional, imposta pela


própria natureza das coisas (ao existente deve necessariamente contrapor-se o
inexistente, sob pena de uma arbitrária transposição de planos), que porque só a
inexistência jurídica é capaz de explicar por que, para além da nulidade, um negócio
pode ser absolutamente insusceptível de produzir quaisquer efeitos, nada obsta,
antes tudo recomenda, a aceitação da figura da inexistência jurídica e,
consequentemente, de negócio jurídico inexistente sempre que carecer de um de
seus elementos ou pressupostos essenciais, acima referidos (MIRANDA, 2009, p.
153).

Nos termos do art. 104 do Código Civil, os mesmos elementos presentes no plano
da existência recebem qualidades no plano da validade: partes ou agentes capazes; vontade
livre, sem vícios; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; forma prescrita ou não
defesa em lei (BRASIL, 2002).

A não caracterização do negócio jurídico nos elementos supracitados acarreta


nulidade absoluta se atingir todo o negócio jurídico ou parcial, caso atinja apenas parte do
negócio jurídico.

No plano de validade do negócio jurídico, é importante considerar o agente como


capaz de declarar a vontade que é essencial para a existência do negócio. Os arts. 3 e 4 do
Código Civil consideram que os absolutamente incapazes devem ser representados pelos seus
pais, enquanto os relativamente incapazes devem ser assistidos por pessoas capazes
determinadas pela lei.

No entendimento de Caio Mário da Silva Pereira,

[...] vontade interna ou real é que traz a força jurígena, mas é a sua exteriorização
pela declaração que a torna conhecida, o que permite dizer a produção de efeitos é
um resultado da vontade mas que esta não basta sem a manifestação exterior
(PEREIRA, 2002, P. 308).
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A declaração de vontade encontra escopo no princípio jurídico de pacta sunt


servanda (ou seja, o contrato gera lei entre as partes).

Também é importante considerar o objeto deste negócio jurídico no plano da


validade, ou seja, o objeto, além de existir, deve ser lícito, determinado ou determinável.
Neste sentido, não pode ir de encontro à norma jurídica. Esta assertiva encontra suporte nos
estudos de Orlando Gomes:

O objeto do negócio jurídico deve ser idôneo. Não vale se contrário a uma
disposição de lei, a moral, ou aos bons costumes, numa palavra, aos preceitos
fundamentais que, em determinada época e lugar, governam a vida social (GOMES,
2001, p. 382).

Além do objeto, é importante observar de que forma o negócio jurídico é


exteriorizado, ou seja, qual é a forma do negócio jurídico. No Código Civil Brasileiro, há um
princípio de liberdade das formas do negócio jurídico, encontrado no artigo 107 do referido
código, qual seja: “Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma
especial, senão quando a lei expressamente a exigir”.

Por fim, conforme visto anteriormente na escala Ponteana, encontra-se o plano da


eficácia. Podemos considerar os efeitos gerados pelo negócio jurídico em relação às partes ou
a terceiros.

São exemplos de eficácia: condição, um evento futuro e incerto; termo, um evento


futuro e certo; encargos, ou ônus; resoluções; multas; juros; direito de resilição. Regime de
bens e registro imobiliário (TARTUCE, 2017).

Na redação do código de 2002, encontramos, no art. 2.035:

A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em


vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2.045,
mas os seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se
subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de
execução (BRASIL, 2002).

Conforme dito anteriormente, a legislação não prevê expressamente a existência


ou inexistência do negócio jurídico, ou seja, podemos considerar o plano da validade como
um pressuposto da existência do negócio jurídico. Isto implica o entendimento de que a
verificação da validade do negócio jurídico deva ser efetivada no momento de sua celebração.

Se considerarmos que os efeitos do negócio jurídico estão inseridos no plano da


eficácia, também podemos concluir, neste sentido, que os princípios devem ser verificados no
momento da produção ou concretização de seus efeitos.
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REFERÊNCIAS PRELIMINARES

BETTI, Emilio. Teoria geral do negócio jurídico. Campinas, SP: Servanda Editora, 2008,
pág. 30.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília:


Senado, 1988.

______. Código de processo civil. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Website disponível
em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm > Acessado
em 21 de janeiro de 2018.

______. Código de processo civil. Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Website disponível
em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm > Acessado em 22 de
outubro de 2015.

DIDIER JR, Fredie. Princípio do respeito ao autorregramento da vontade no processo


civil, in Negócios Processuais, Coleção Grandes Temas do Novo CPC. Coord. Antonio do
Passo Cabral e Pedro Henrique Nogueira. Salvador: Editora JusPodivm, 2015, p. 19.

GOMES, O. Contratos. 24. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

LOTUFO, Renan. Código civil comentado: parte geral (arts. 1º a 232) vol. 1 – 2ª ed. atual.
São Paulo: Saraiva, 2004.

MIRANDA, Francisco Cavalcante Pontes de. Tratado de Direito Privado. Campinas:


Bookseller, Tomo I, 1999.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito Civil. 19ªed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. v.1,

REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27 Ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil: Volume Único. 7. ed. rev., atual. e ampl. Rio de
Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2017.

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