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Cálculo Diferencial e Integral 3

João A. M. Gondim

20 de junho de 2017
ii
Sumário

1 Cálculo Vetorial de Curvas 1


1.1 Funções Vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.2 Curvas Parametrizadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
1.3 Comprimento de Curvas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
1.3.1 Reparametrização pelo comprimento de arco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.4 Integral de Linha de funções reais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
1.4.1 Aplicações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
1.5 Integrais de Linha de campos vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
1.6 Campos Conservativos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
1.6.1 O Teorema Fundamental das Integrais de Linha . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
1.6.2 Independência do caminho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
1.6.3 Caracterização dos Campos Conservativos no Plano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1.7 O Teorema de Green . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
1.7.1 Cálculo de Áreas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
1.7.2 Versão estendida do Teorema de Green . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
1.7.3 Mais Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
1.8 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

2 Cálculo Vetorial de Superfı́cies 35


2.1 Superfı́cies Parametrizadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
2.2 Áreas de Superfı́cies . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
2.3 Integrais de Superfı́cie . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
2.3.1 Integrais de Superfı́cie de Funções Reais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
2.3.2 Orientação de Superfı́cies . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
2.3.3 Integrais de Superfı́cie de Campos Vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
2.3.4 Mais Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
2.4 Rotacional e Divergente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
2.4.1 Formas Vetoriais do Teorema de Green . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
2.5 Teorema de Stokes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
2.6 Teorema da Divergência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62
2.7 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67

3 Sequências e Séries 71
3.1 Sequências de Números Reais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
3.2 Séries Numéricas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
3.3 Séries de Termos Positivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
3.3.1 Teste da Integral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
3.3.2 Os Testes da Comparação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83
3.4 Convergência Absoluta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
3.4.1 Os Testes da Razão e da Raiz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
3.5 Exemplos gerais de séries - Estratégias para escolher os testes . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
3.6 Séries de Potências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92

iii
iv SUMÁRIO

3.6.1 Raio de convergência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93


3.6.2 Representação de funções por séries de potências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
3.6.3 Derivação e integração de séries de potências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
3.6.4 Série Binomial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99
3.7 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102
Capı́tulo 1

Cálculo Vetorial de Curvas

1.1 Funções Vetoriais

Ao longo destas notas, vamos estudar diversos tipos de funções, dentre os quais podemos destacar:

• Funções Reais: São funções que têm R como contradomı́nio, ou seja, são as funções estudadas nos
cursos anteriores de Cálculo;

• Funções Vetoriais: São as funções que têm como contradomı́nio um conjunto de vetores (para nós,
R2 ou R3 ). Por exemplo, são funções vetoriais f (t) = (cos(t), sen(t)), f (t) = (t, t2 , t3 ) e f (x, y) =
(xey , cos(xy)).

Funções da forma F~ : X ⊂ R2 → R2 ou F~ : X ⊂ R3 → R3 serão chamadas de campos vetoriais. Funções


vetoriais de uma variável serão nosso objeto de estudo no primeiro Capı́tulo, e serão representadas por ~r, α ~,
~γ , etc.
Seja ~r(t) = (x(t), y(t), z(t)) uma função vetorial em R3 (em R2 seria análogo). As funções reais x(t), y(t)
e z(t) são chamadas de componentes de ~r. Já sabemos calcular limites das funções componentes, já que são
funções como as que estudamos em Cálculo 1. Nada mais natural, então, que definir
 
lim ~r(t) = lim x(t), lim y(t), lim z(t) , (1.1.1)
t→a t→a t→a t→a

desde que os limites dos componentes existam.


Diremos que ~r é contı́nua em t = a quando

lim ~r(t) = ~r(a). (1.1.2)


ta

Se dissermos que ~r é contı́nua, sem especificar onde, então ~r é contı́nua em todo o seu domı́nio. Compa-
rando (1.1.1) e (1.1.2), é claro que ~r é contı́nua em t = a se, e somente se, x(t), y(t) e z(t) forem contı́nuas
em t = a.
Todas as regras operacionais de limites valem para funções vetoriais:

• limite da soma = soma dos limites;

• limite da multiplicação por uma constante = produto da constante pelo limite;

• limite do produto escalar = produto escalar dos limites;

• limite do produto vetorial = produto vetorial dos limites.

1
2 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

1.2 Curvas Parametrizadas


Definição 1.2.1. Uma curva é a imagem de uma função vetorial contı́nua de uma variável ~r(t), que é
chamada de uma parametrização da curva.
Exemplo 1.2.1. Parametrize o segmento de reta AB, percorrido de A = (1, 0, −1) a B = (3, −4, 2).
−−→
Solução. Usamos o vetor diretor ~v = AB = (2, −4, 3) na equação vetorial
−−→
~r(t) = A + tAB,
com 0 ≤ t ≤ 1. Logo,

~r(t) = (1, 0, −1) + t(2, −4, 3)


= (1 + 2t, −4t, −1 + 3t), 0 ≤ t ≤ 1.

Exemplo 1.2.2. Obtenha uma parametrização para a curva γ que em coordenadas polares é dada por
r = 1.
Solução. Sabemos que para passar de coordenadas polares para retangulares fazemos

x = r cos θ
(1.2.1)
y = r senθ
Como r = 1, fazendo θ = t obtemos x(t) = cos t e y(t) = sent. Logo,

~r(t) = (cos t, sent), 0 ≤ t ≤ 2π.

A curva do exemplo acima é uma circunferência de raio 1. Em geral, uma circunferência de raio R tem
parametrização

~r(t) = (R cos t, R sent), 0 ≤ t ≤ 2π. (1.2.2)


Exemplo 1.2.3. Identifique a curva de parametrização ~r(t) = (cos(2t), sen(2t)), 0 ≤ t ≤ 2π.
Solução. Fazendo 2t = θ, vemos que a curva também é representada por ~r(t) = (cos θ, senθ), logo é uma
circunferência, mas 0 ≤ θ ≤ 4π, portanto são dadas duas voltas!

Os exemplos acima ilustram a diferença entre uma curva e uma curva parametrizada: a curva é apenas
o conjunto dos pontos, enquanto a ordem e a quantidade de vezes com que esses pontos são percorridos
também são levadas em conta na parametrização.
Definição 1.2.2. Dizemos que uma curva C, de parametrização ~r(t), a ≤ t ≤ b, é simples se ela não se
auto-intersecta em pontos intermediários t1 e t2 , isto é, se ~r(t1 ) 6= ~r(t2 ) para todos t1 , t2 ∈ (a, b). A única
exceção permitida é termos ~r(a) = ~r(b), quando dizemos que a curva é fechada. Observe a Figura 1.2.1.

Exemplo 1.2.4. Mostre que a curva parametrizada ~γ (t) = ( sent, sent cos t), 0 ≤ t ≤ π, é fechada e simples.
Solução. Para mostrar que é fechada, basta ver que ~γ (0) = ~γ (π). De fato, temos ~γ (0) = (0, 0) = ~γ (π), logo
γ é fechada.
Para vermos que é simples, devemos mostrar que ~γ (t) é injetiva em (0, π). Se ~γ (t1 ) = ~γ (t2 ), com
t1 , t2 ∈ (0, π), temos 
sent1 = sent2
sent1 cos t1 = sent2 cos t2
Como sent 6= 0 nesse intervalo, segue que cos t1 = cos t2 , e portanto tan t1 = tan t2 . Como a função tan x é
injetiva em (0, π), concluı́mos que t1 = t2 e que γ é simples.
1.2. CURVAS PARAMETRIZADAS 3

Figura 1.2.1: Tipos de Curvas

Definição 1.2.3. Definimos a derivada de uma função vetorial ~r(t) como o limite

~r(t) − ~r(a)
r~0 (a) = lim . (1.2.3)
t→a t−a
Se ~r(t) = (x(t), y(t), z(t)), então segue de (1.1.1) que

r~0 (t) = (x0 (t), y 0 (t), z 0 (t)). (1.2.4)

Note que um vetor tangente à curva de parametrização ~r(t) em t = a é r~0 (a).


Exemplo 1.2.5. Encontre uma parametrização para a curva γ dada em coordenadas polares por r = 1+cos θ,
0 ≤ θ ≤ π, e ache a equação da reta tangente à curva num ponto P ∈ γ cuja distância até a origem vale 3/2.
Solução. Temos x = r cos θ = (1+cos θ) cos θ e y = (1+cos θ) senθ. Ponha θ = t, então uma parametrização

~γ (t) = (cos t + cos2 t, sent + sent cos t), 0 ≤ t ≤ π.
Agora vamos encontrar o ponto desejado. A distância dele à origem corresponde ao r das coordenadas
polares. Logo,
3 1 π
= 1 + cos t ⇒ cos t = e t ∈ [0, π] ⇒ t = .
2 2 3

Temos P = ~γ (π/3) = (3/4, 3 3/4) .
Temos ainda que
γ~0 (t) = (− sent − 2 cos t sent, cos t + cos2 t − sen2 t).

Substituindo, vamos obter γ~0 (π/3) = (− 3, 0) . Assim, as equações paramétricas da reta tangente são
(
3

x = 4√− 3t
3 3
y = 4

Exemplo 1.2.6. Parametrize a curva obtida pela interseção do cilindro x2 + y 2 = 1 com o plano y + z = 2.
Solução. Podemos resolver x(t) e y(t) pela equação do cilindro, fazendo x = cos t e y = sent, já que seus
pontos sempre pertencem a uma circunferência de raio 1. Como y + z = 2, obtemos z = 2 − y = 2 − sent.
Logo, a parametrização é dada por

~r(t) = (cos t, sent, 2 − sent), 0 ≤ t ≤ 2π.


4 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

Exemplo 1.2.7. Parametrize a interseção da esfera x2 + y 2 + z 2 = 1 com o plano x + y = 0.


Solução. Como y = −x, podemos substituir na equação da esfera para obter x2 + (−x)2 + z 2 = 1, ou seja,
2x2 + z 2 = 1, que representa um cilindro elı́ptico. Podemos parametrizar a elipse

x2 y2
+ =1
a2 b2
como se fosse uma “circunferência de raios distintos” correspondendo aos semi-eixos a e b:

x = a cos t
,
y = b sent

com 0 ≤ t ≤ 2π. Como a elipse tem equação

x2 z2
√ + 2 = 1,
(1/ 2)2 1

temos x = √1 cos t, z = sent e y = −x = − √12 cos t. Logo, a parametrização da curva é


2

 
1 1
~r(t) = √ cos t, − √ cos t, sent , 0 ≤ t ≤ 2π.
2 2

1.3 Comprimento de Curvas

Seja C uma curva plana lisa de parametrização ~r(t), a ≤ t ≤ b. Isso significa que r~0 é contı́nua e que
r~0 (t)6= (0, 0) para todo t. Na prática, isso significa que a curva não possui “bicos”. Vamos dividir o intervalo
[a, b] em n subintervalos [ti−1 , ti ], com a = t0 < t1 < · · · < tn−1 < tn = b. Cada ti fornece um ponto
Pi = ~r(ti ) sobre a curva. Chamaremos de ∆si o comprimento do segmento Pi−1 Pi .

Figura 1.3.1: Comprimento de curvas

Podemos aproximar o comprimento da curva por meio da soma dos comprimentos dos segmentos Pi−1 Pi ,
de modo que o comprimento do arco S é tal que
n
X Z b
S = lim ∆si = ds. (1.3.1)
n→∞ a
i=1
1.3. COMPRIMENTO DE CURVAS 5
p
Pela Figura 1.3.1, vemos que ds = dx2 + dy 2 , pelo Teorema de Pitágoras, logo
p s 2 2
dx2 dy 2

ds + dx dy p
= = + = (x0 (t))2 + (y 0 (t))2 = ||r~0 (t)||.
dt dt dt dt

Assim, definimos o elemento de comprimento de arco

ds = ||r~0 (t)||dt (1.3.2)


e o comprimento de arco de C: ~r(t), a ≤ t ≤ b, como
Z b
S= ||r~0 (t)||dt. (1.3.3)
a

Exemplo 1.3.1. Calcule o comprimento de arco da hélice circular de parametrização ~r(t) = (cos t, sent, t)
do ponto (1, 0, 0) até o ponto (1, 0, 2π).

Solução. Observe que t ∈ [0, 2π] e que r~0 (t) = (− sent, cos t, 1). Logo,
p √
||r~0 (t)|| = (− sent)2 + (cos t)2 + 1 = 2.

Pela fórmula (1.3.3), temos


Z 2π Z 2π √ √
S= ||r~0 (t)||dt = 2dt = 2 2π .
0 0

Exemplo 1.3.2. Calcule o comprimento da curva de parametrização ~r(t) = (1, t2 , t3 ), 0 ≤ t ≤ 1.

Solução. Temos r~0 (t) = (0, 2t, 3t2 ), logo


p p p
||r~0 (t)|| = 4t2 + 9t4 = t2 (4 + 9t2 ) = t 4 + 9t2 ,

pois t ∈ [0, 1]. Pela fórmula (1.3.3), temos


Z 1 Z 1 p
S= ~0
||r (t)||dt = t 4 + 9t2 dt.
0 0

Mude a variável para u = 4 + 9t2 , de modo que du = 18tdt, e então

13 √ 133/2 − 8
Z
1 1 2 3/2 13 1  3/2 
S= udu = u = 13 − 43/2 ⇒ .
18 4 18 3 4 27 27


Exemplo 1.3.3. Calcule o comprimento da curva de parametrização ~r(t) = ( 2t, et , e−t ), 0 ≤ t ≤ 1.

Solução. Temos r~0 (t) = ( 2, et , −e−t ), portanto
√ 2
q
p p
||r~0 (t)|| = 2 + (et )2 + (−e−t )2 = (et )2 + 2et e−t + (e−t )2 = (et + e−t )2 = et + e−t .

Daı́, pela fórmula (1.3.3) temos


Z 1
1
S= (et + e−t )dt = (et − e−t )10 = e − .
0 e
6 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

Exemplo 1.3.4. Calcule o comprimento da curva de parametrização ~r(t) = (12t, 8t3/2 , 3t2 ), 0 ≤ t ≤ 1.
Solução. Temos r~0 (t) = (12, 12t1/2 , 6t), logo
p p
||r~0 (t)|| = 144 + 144t + 36t2 = (12 + 6t)2 = 12 + 6t,
pois 0 ≤ t ≤ 1, portanto 12 + 6t > 0. Assim, pela fórmula (1.3.3), temos
Z 1
S= (12 + 6t)dt = (12t + 3t2 )10 = 15 .
0

1.3.1 Reparametrização pelo comprimento de arco

Observe que o comprimento de arco não depende da parametrização escolhida para C. De fato, isso é
uma consequência do Teorema de Mudança de Variáveis para integrais, e é uma propriedade esperada, já
que o comprimento de arco é uma propriedade da curva, e não da parametrização. Mesmo que o sentido da
parametrização seja invertido, ainda assim o comprimento de arco é preservado.
Definimos a função comprimento de arco de uma curva lisa com parametrização ~r(t), a ≤ t ≤ b, como
Z t
s(t) = ||r~0 (t)||dt, (1.3.4)
a
ou seja, o comprimento da curva entre os pontos ~r(a) e ~r(t). Frequentemente é útil parametrizar a
curva em relação ao comprimento de arco, pois este é uma propriedade natural da curva e não depende do
sistema de coordenadas utilizado, como vimos acima. O procedimento usado para fazer isso está ilustrado
nos exemplos a seguir:
Exemplo 1.3.5. Reparametrize pelo comprimento de arco a curva ~r(t) = (2t, 1 − 3t, 5 + 4t) a partir de t = 0
na direção crescente de t.

Solução. Temos r~0 (t) = (2, −3, 4), logo ||r~0 (t)|| = 29. Daı́,
Z t√ √
s(t) = 29dt = 29t.
0
Logo,
s
t= √ .
29
Agora substituı́mos na parametrização original para obter
 
2s 3s 4s
~r(t(s)) = √ , 1 − √ , 5 + √ .
29 29 29

Exemplo 1.3.6. Reparametrize pelo comprimento de arco a partir do ponto onde t = 0 na direção crescente
de t a curva de parametrização ~r(t) = (e2t cos(2t), 2, e2t sen(2t)).
Solução. Temos r~0 (t) = (2e2t cos(2t) − 2e2t sen(2t), 0, 2e2t sen(2t) + 2e2t cos(2t)), logo
rh i2 h i2
||r~0 (t)|| = 2e2t (cos(2t) − sen(2t)) + 2e2t ( sen(2t) + cos(2t))
r h i
= 4e4t (cos(2t) − sen(2t))2 + ( sen(2t) + cos(2t))2
p
= 2e2t cos2 (2t) − 2 cos(2t) sen(2t) + sen2 (2t) + sen2 (2t) + 2 cos(2t) sen(2t) + cos2 (2t)

= 2e2t 2
1.3. COMPRIMENTO DE CURVAS 7

Com isso,
Z t √ √ √
s(t) = 2 2eu du = 2eu |t0 = 2(et − 1).
0

Dessa forma, podemos escrever


   
s s 1 s
√ + 1 = e2t ⇒ 2t = ln 1 + √ ⇒ t = ln 1 + √ .
2 2 2 2
Substituindo na parametrização original, obtemos a reparametrização pelo comprimento de arco

         !
s s s s
~r(t(s)) = 1+ √ cos ln 1 + √ , 2, 1 + √ sen ln 1 + √ .
2 2 2 2

Note que se o parâmetro t já for o comprimento de arco a partir de t = a, então

ds
||r~0 (t)|| = = 1,
dt

já que nesse caso s = t − a. Reciprocamente, se ||r~0 (t)|| = 1, então


Z t Z t
s= ||r~0 (u)||du = du = t − a
a a

e t é o comprimento de arco a partir de t = a. Com isso, provamos a

Proposição 1.3.1. Uma curva de parametrização ~r(t), a ≤ t ≤ b, está parametrizada pelo comprimento de
arco se, e somente se, ||r~0 (t)|| = 1.
 
Exemplo 1.3.7. Considere a curva C de parametrização ~r(t) = sent−t cos t, cos t+t sent, 21 t2 , com t ≥ 0.

(a) A curva está parametrizada pelo comprimento de arco?

(b) Determine a função comprimento de arco a partir do ponto P = (0, 1, 0) no sentido de t crescente.
π2
(c) Ache as coordenadas de um ponto Q da curva cuja distância, sobre a curva, ao ponto P é √
2
.

Solução. Temos r~0 (t) = (t sent, t cos t, t), logo


p √ √
||r~0 (t)|| = t2 sen2 t + t2 cos2 t + t2 = 2t2 = t 2,

logo a curva não está parametrizada pelo comprimento de arco. Além disso, podemos ver que P = (0, 1, 0) =
~r(0), logo a função comprimento de arco a partir do ponto P é

t √ √ u2 t t2 2
Z
s(t) = u 2du = 2 =
.
0 2 0 2

π2 π2
Finalmente, se a distância do ponto Q = ~r(t) ao ponto P sobre a curva vale √
2
, então s(t) = √
2
. Daı́,


t2 2 π2 π2
 
= √ ⇒ t = π ⇒ Q = ~r(π) = π, −1, .
2 2 2
8 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

1.4 Integral de Linha de funções reais

Em Cálculo 1, aprendemos a calcular integrais de funções reais sobre intervalos fechados [a, b]. Nesta
seção estudaremos uma integral mais geral, que nos permitirá integrar sobre uma curva C.
Suponha que C seja lisa, com parametrização ~r(t) = (x(t), y(t)), a ≤ t ≤ b. Seja f uma função real
de duas variáveis cujo domı́nio contém a curva C. Sabemos que o gráfico de z = f (x, y) é uma superfı́cie.
Vejamos como podemos calcular a área A da faixa vertical que tem base na curva e está abaixo da superfı́cie,
conforme a Figura 1.4.1.

Figura 1.4.1: Construção da Integral de Linha

Assim como na seção anterior, vamos dividir o intervalo [a, b] em n subintervalos [ti−1 , ti ], com a = t0 <
t1 < · · · < tn−1 < tn = b. Os pontos Pi = ~r(ti ) = (xi , yi ) dividem C em n subarcos, cada um com um
comprimento ∆si . Vamos aproximar a área desejada pela soma de áreas de retângulos, de base ∆si e de
altura f (xi , yi ). À medida que n cresce, essa aproximação fica cada vez melhor e podemos escrever
n
X
A = lim f (xi , yi )∆si . (1.4.1)
n→∞
i=1
A expressão acima motiva a
Definição 1.4.1 (Integral de Linha - Função Real). Se f é definida sobre uma curva suave C de parame-
trização ~r(t) = (x(t), y(t)), a ≤ t ≤ b, então a integral de linha de f sobre C é
Z n
X
f (x, y)ds = lim f (xi , yi )∆si , (1.4.2)
C n→∞
i=1
se esse limite existir.
É possı́vel mostrar que o limite acima sempre existe quando f é contı́nua. Já vimos que ds = ||r~0 (t)||dt,
então escrevendo (1.4.2) em termos da parametrização vamos obter
1.4. INTEGRAL DE LINHA DE FUNÇÕES REAIS 9

Z Z b
f (x, y)ds = f (~r(t))||r~0 (t)||dt. (1.4.3)
C a
Como a integral está sendo calculada em relação ao comprimento de arco, ela não depende da parame-
trização escolhida para a curva C. Novamente, isso é consequência
R do Teorema de Mudança de Variáveis
para integrais. Além disso, note que se f (x, y) = 1, então C ds é o comprimento da curva, e aplicando
(1.4.3) reobtemos a fórmula que deduzimos na seção anterior.
Z
Exemplo 1.4.1. Calcule (2 + x2 y)ds, onde C é a metade superior do cı́rculo unitário x2 + y 2 = 1.
C

Solução. Começamos parametrizando a curva como ~r(t) =√(cos t, sent), 0 ≤ t ≤ π (pois queremos apenas
a metade superior). Logo, r~0 (t) = (− sent, cos t) e ||r~0 (t)|| = sen2 t + cos2 t = 1. Assim,
Z Z π Z π Z π
2 2
(2 + x y)ds = (2 + cos t sent)dt = 2dt + cos2 t sentdt.
C 0 0 0

A primeira integral vale 2π. Para a segunda integral, faça u = cos t, obtendo du = − sentdt e
Z π Z −1 Z 1 1
u3 2
cos2 t sentdt = −u2 du = u2 du = = 3.
0 1 −1 3 −1

Logo,
Z
2
(2 + x2 y)ds = 2π + .
C 3

Analogamente ao que vimos acima para o caso plano, definimos a integral de linha para curvas espaciais.
O exemplo a seguir ilustra esse fato:
Z
Exemplo 1.4.2. Calcule xy 3 ds, onde C é a curva de parametrização ~r(t) = (4 sent, 4 cos t, 3t), 0 ≤ t ≤ π2 .
C
√ √
Solução. Temos r~0 (t) = (4 cos t, −4 sent, 3), portanto ||r~0 (t)|| = 16 cos2 t + 16 sen2 t + 9 = 25 = 5. Segue
então que
Z Z π/2 Z π/2
xy 3 ds = (4 sent)(43 cos3 t)(5dt) = 1280 sent cos3 tdt.
C 0 0
Fazemos a substituição u = cos t, de modo que du = − sentdt, logo
Z Z 0 Z 1
3 3 1280 4 1
xy ds = −1280 u du = 1280 u3 du = u = 320 .
C 1 0 4 0

Z
Exemplo 1.4.3. Calcule (2x + 9z)ds, onde C é a curva de parametrização ~r(t) = (t, t2 , t3 ), 0 ≤ t ≤ 1.
C

Solução. Temos r~0 (t) = (1, 2t, 3t2 ), logo ||r~0 (t)|| = 1 + 4t2 + 9t3 . Daı́,
Z Z 1 p
(2x + 9z)ds = (2t + 9t3 ) 1 + 4t2 + 9t4 dt.
C 0

Fazendo a mudança de variável u = 1 + 4t + 9t , obtemos du = 8t + 36t3 = 4(2t + 9t3 ). Segue então que
2 4

14 √
143/2 − 1
Z Z
u 1 2 3/2 14
(2x + 9z)ds = du = u = .
C 1 4 43 1 6
10 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

A definição de integral de linha também vale para curvas C lisas por partes, isto é, C é uma curva lisa
por partes se C for a união de curvas lisas C1 , . . . , Cn tais que o ponto final de Ci coincide com o inicial de
Ci+1 . Nesse caso, temos
Z n Z
X
f (x, y)ds = f (x, y)ds (1.4.4)
C i=1 Ci

A integral de linha que estudamos até aqui nesta seção é com relação ao comprimento de arco. Também
podemos definir integrais de linha com relação a x e a y:
Z Z b Z Z b
0
f (x, y)dx = f (x(t), y(t))x (t)dt e f (x, y)dy = f (x(t), y(t))y 0 (t)dt. (1.4.5)
C a C a

Às vezes essas duas integrais aparecem juntas, e usamos a notação


Z Z Z
P (x, y)dx + Q(x, y)dy = P (x, y)dx + Q(x, y)dy (1.4.6)
C C C
Z
Exemplo 1.4.4. Calcule senxdx + cos ydy, onde C é consiste na metade superior da circunferência
C
x2 + y 2 = 1 de (1, 0) a (−1, 0) seguida pelo segmento de reta de (−1, 0) a (−2, 3).

Solução. Se C1 é o arco de cı́rculo e C2 o segmento de reta, podemos calcular a integral sobre C somando
as integrais sobre C1 e sobre C2 , conforme a fórmula (1.4.4).
C1 tem parametrização r~1 (t) = (cos t, sent), 0 ≤ t ≤ π. Logo,

Z Z π Z π
senxdx + cos ydy = sen(cos t)(− sent)dt + cos( sent) cos tdt
C1 0 0
Z −1 Z 0
= senudu + cos vdv
1 0
−1
= − cos u

1
= −(cos(−1) − cos 1) = −(cos 1 − cos 1) = 0.

C2 tem vetor diretor ~v = (−1, 3) e parametrização r~2 (t) = (−1 − t, 3t), 0 ≤ t ≤ 1. Assim,

Z Z 1 Z 1
senxdx + cos ydy = sen(−1 − t)(−1)dt + cos(3t)3dt
C2 0 0
Z −2 Z 3
= senudu + cos vdv
−1 0
−2 3
= − cos u + senv

−1 0
= − cos(−2) + cos(−1) + sen3 − sen0 = cos 1 − cos 2 + sen3.

Logo,
Z
senxdx + cos ydy = cos 1 − cos 2 + sen3.
C

Z
Exemplo 1.4.5. Calcule xey dx, onde C é o arco de x = ey de (1, 0) a (e, 1).
C
1.4. INTEGRAL DE LINHA DE FUNÇÕES REAIS 11

Solução. Usamos a parametrização ~r(t) = (et , t), 0 ≤ t ≤ 1, já que x é função de y. Temos que
1 1
e3 − 1
Z Z Z
y t t t 1 3t 1
xe dx = e e e dt = e3t dt = e = .
C 0 0 3 0 3

As integrais de linha com relação a x e a y também não dependem da parametrização, desde que seja
preservada a orientação da curva. Para ilustrar, suponha que no exemplo anterior a curva fosse percorrida
de (e, 1) a (1, 0). Poderı́amos usar a parametrização r~1 (t) = (e−t , −t), −1 ≤ t ≤ 0. Nesse caso,
0 0
1 − e3
Z Z Z
1 −3t 0
xey dx = e−t e−t (−e−t )dt = − e−3t dt = e −1 = .
C −1 −1 3 3

Esse fenômeno ocorre pois, quando invertemos a orientação da curva, ∆xi e ∆yi trocam
p de sinal. Observe
que isso não ocorre com a integral de linha pelo comprimento de arco, pois ∆si = ∆x2i + ∆yi2 é sempre
positivo.

1.4.1 Aplicações

Se ρ(x, y) é a densidade linear de um arame fino com o formato de uma curva lisa C, então a massa m
do arame pode ser calculada por
Z
m= ρ(x, y)ds (1.4.7)
C
Além disso, o centro de massa do arame tem coordenadas
Z Z
1 1
xCM = xρ(x, y)ds e yCM = yρ(x, y)ds (1.4.8)
m C m C
Finalmente, os momentos de inércia do arame em relação aos eixos x e y são
Z Z
Ix = y 2 ρ(x, y)ds e Iy = x2 ρ(x, y)ds. (1.4.9)
C C

Exemplo 1.4.6. Um arame fino é entortado no formato de uma semicircunferência de equação x2 + y 2 = 4,


x ≤ 0, y ≤ 0. Se a densidade linear é dada por ρ(x, y) = x + y, determine a massa e o centro de massa do
arame.
Solução.
√ A parametrização é ~r(t) = (2 cos t, 2 sent), 0 ≤ t ≤ π/2. Logo, r~0 (t) = (−2 sent, 2 cos t) e ||r~0 (t)|| =
4 sen t + 4 cos2 t = 2. Dessa forma, a massa é
2

Z Z π/2  π/2
m= ρ(x, y)ds = (2 cos t + 2 sent)2dt = 4 sent − cos t = 8.
C 0 0

Para o centro de massa, temos


Z Z Z
1 1 2 1
xCM = xρ(x, y)ds = (x + xy)ds = (x2 + xy)ds
8 C 8 C 8 C
1 π/2 1 π/2
Z Z
= (4 cos2 t + 4 cos t sent)2dt = (2 cos2 t + 2 cos t sent)dt
8 0 2 0
π/2
1 π/2
Z 
1 sen(2t) cos(2t)
= (1 + cos(2t) + sen(2t))dt = t+ −
2 0 2 2 2 0
π+2
= .
4
12 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

Z Z
1 1
yCM = yρ(x, y)ds = (xy + y 2 )ds
8 C 8 C
π/2
1 π/2
Z Z
1 2
= (4 cos t sent + 4 sen t)2dt = ( sen(2t) + 1 − cos(2t))dt
8 0 2 0
 π/2
1 cos(2t) sen(2t) π+2
= t− + = .
2 2 2 0 4

Para o caso de curvas espaciais, as únicas fórmulas que mudam são as dos momentos de inércia:

Z Z Z
2 2 2 2
Ix = (y + z )ρ(x, y, z)ds, Iy = (x + z )ρ(x, y, z)ds, Iz = (x2 + y 2 )ρ(x, y, z)ds (1.4.10)
C C C

1.5 Integrais de Linha de campos vetoriais

Definição 1.5.1. Um campo vetorial é uma função da forma F~ : R2 → R2 ou F~ : R3 → R3 . Em outras


palavras, a cada ponto do plano (ou espaço) associa-se um vetor do plano (ou do espaço).

Seja F (x, y, z) = (P (x, y, z), Q(x, y, z), R(x, y, z)) um campo vetorial contı́nuo em R2 . Suponha que F~
representa um campo de forças. Vejamos como calcular o trabalho W realizado por F~ ao deslocar uma
partı́cula ao longo de uma curva lisa C de parametrização ~r(t) = (x(t), y(t), z(t)), a ≤ t ≤ b.
Novamente dividimos C em subarcos Pi−1 Pi , cada um com comprimento ∆si , que nos fornecem uma
partição a = t0 < t1 < · · · < tn−1 < tn = b para o intervalo [a, b] de definição do parâmetro t. Se ∆si for
suficientemente pequeno, então o movimento da partı́cula de Pi−1 a Pi se dá aproximadamente na direção
do versor tangente T~ (xi , yi , zi ) em Pi .
Da Fı́sica, sabemos que o trabalho realizado por F~ para mover a partı́cula de Pi−1 a Pi é aproximadamente
igual ao produto escalar
h i h i
F~ (xi , yi , zi ) · ∆si T~ (xi , yi , zi ) = F~ (xi , yi , zi ) · T~ (xi , yi , zi ) ∆si (1.5.1)

Daı́, o trabalho pode ser calculado somando os trabalhos sobre os n subarcos e tomando o limite dessa
soma com n → ∞. Assim,
Z Z
W = F~ (x, y, z) · T~ (x, y, z)ds = F~ · T~ ds (1.5.2)
C C

A fórmula acima nos diz que o trabalho realizado por F~ ao deslocar uma partı́cula ao longo de uma curva
C é igual à integral de linha com relação ao comprimento de arco da componente tangencial de F~ .
Como C tem parametrização ~r(t) = (x(t), y(t), z(t)), a ≤ t ≤ b, então o versor tangente pode ser calculado
pela fórmula
r~0 (t)
T~ (t) = .
||r~0 (t)||
Logo, a fórmula (1.4.3), temos
b
r~0 (t) ~0
Z Z  Z b Z
W = F~ · T~ ds = F~ (~r(t)) · ||r (t)||dt = F~ (~r(t)) · r~0 (t)dt = F~ · d~r.
C a ||r~0 (t)|| a C

Isso nos leva à definição


1.5. INTEGRAIS DE LINHA DE CAMPOS VETORIAIS 13

Definição 1.5.2. Seja F~ um campo vetorial contı́nuo definido sobre uma curva lisa C de parametrização
~r(t), a ≤ t ≤ b. Então, a integral de linha de F~ ao longo de C é
Z Z b
F~ · d~r = F~ (~r(t)) · r~0 (t)dt. (1.5.3)
C a

Observe ainda que, como F~ = (P, Q, R) e ~r(t) = (x(t), y(t), z(t)), então
Z Z Z Z
F~ · d~r = (P, Q, R) · (x0 (t), y 0 (t), z 0 (t))dt = P x0 (t)dt + Qy 0 (t)dt + Rz 0 (t)dt = P dx + Qdy + Rdz.
C C C C

Isso mostra a relação entre a integral de linha de campos vetoriais e as integrais de linha de funções reais
com relação a x, y e z, bem como mostra que trocando C por −C (ou seja, a curva percorrida no sentido
oposto) o sinal da integral é trocado, de modo que
Z Z
F~ · d~r = − F~ · d~r (1.5.4)
−C C


Z
Exemplo 1.5.1. Calcule F~ · d~r se F~ (x, y) = (x2 y 3 , −y x) e C tem parametrização ~r(t) = (t2 , t3 ),
C
0 ≤ t ≤ 1.
Solução. Temos r~0 (t) = (2t, 3t2 ). Logo,
1
Z Z 1 √ Z 1
2t15 3t7 31
~
F · d~r = 4 9 3 2 2
(t t , −t t ) · (2t, 3t )dt = 14 6
(2t − 3t )dt = − = − .
C 0 0 15 7 0 105

Z
Exemplo 1.5.2. Calcule F~ · d~r, se F~ (x, y, z) = (z, y, −x) e C tem parametrização ~r(t) = (t, sent, cos t),
C
0 ≤ t ≤ π.
Solução. Temos r~0 (t) = (1, cos t, − sent). Logo,
Z Z π
F~ · d~r = (cos t, sent, −t) · (1, cos t, − sent)dt
C 0
Z π
= (cos t + sent cos t + t sent)dt
Z0 π
1 π
Z Z π
= cos tdt + sen(2t)dt + t sentdt (2 sent cos t = sen(2t))
2 0
Z0 π Z π 0
π Z π
1
= cos tdt + sen(2t)dt − t cos t + cos tdt (Por partes)

2 0
0 0
π 0
1
= sent − cos(2t) − t cos t + sent = π.
4 0

Z !
x y
Exemplo 1.5.3. Calcule F~ · d~r, onde F~ (x, y) = p ,p e C é a parábola y = 1 + x2
C x2 + y 2 x2 + y 2
de (−1, 2) a (1, 2).
Solução. Como a curva é descrita por uma equação que define y em função de x, podemos escolher x = t
e parametrizá-la por ~r(t) = (t, 1 + t2 ), −1 ≤ t ≤ 1. Daı́, r~0 (t) = (1, 2t) e
Z 1 ! Z 1
2
3t + 2t3
Z
~ t 1 + t
F · d~r = p ,p · (1, 2t)dt = √ dt = 0 ,
C −1 t2 + (1 + t2 )2 t2 + (1 + t2 )2 −1 t4 + 3t2 + 1
já que o integrando é uma função ı́mpar e o intervalo de integração é simétrico em relação á origem.
14 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

1.6 Campos Conservativos

Definição 1.6.1. Dizemos que um campo vetorial F~ é conservativo quando existe uma função real tal que
∇f = F~ . Nesse caso, dizemos que f é uma função potencial para F~ .

Exemplo 1.6.1. Determine se F~ (x, y) = (6x + 5y, 5x + 4y) é um campo conservativo.

Solução. Precisamos procurar uma função f (x, y) tal que ∇f = F~ . Isso significa que

fx = 6x + 5y
fy = 5x + 4y

Integramos a primeira equação com respeito a x, obtendo

f (x, y) = 3x2 + 5xy + g(y),

onde g é uma função que só depende de y e portanto funciona como constante numa integral com respeito
a x.
Agora derivamos a expressão para f com respeito a y e igualamos a 5x + 4y:

fy = 5x + g 0 (y) = 5x + 4y ⇒ g 0 (y) = 4y ⇒ g(y) = 2y 2 + C.

Logo, os potenciais têm a forma


f (x, y) = 3x2 + 5xy + 2y 2 + C.

Como queremos um potencial, e não todos, podemos escolher o valor de C acima, por exemplo, C = 0.
Dessa forma, F~ é conservativo.

Exemplo 1.6.2. Determine se F~ (x, y) = (6x + 4y, 5x + 4y) é um campo conservativo.

Solução. Precisamos procurar uma função f (x, y) tal que ∇f = F~ . Isso significa que

fx = 6x + 4y
fy = 5x + 4y

Integramos a primeira equação com respeito a x, obtendo

f (x, y) = 3x2 + 4xy + g(y),

onde g depende apenas de y. Agora derivamos com respeito a y e comparamos com a segunda equação.
Temos
fy = 4x + g 0 (y) = 5x + 4y ⇒ g 0 (y) = x + 4y,
mas isso é um absurdo, pois se g depende apenas de y, sua derivada não pode depender de x. Assim, F~ não
é conservativo.

Em breve vamos estudar uma forma mais rápida de verificar que um campo não é conservativo.

Exemplo 1.6.3. Mostre que o campo F~ (x, y, z) = (2xz + y 2 , 2xy, x2 + 3z 2 ) é um campo conservativo.

Solução. Precisamos encontrar um potencial f (x, y, z) tal que



 fx = 2xz + y 2
fy = 2xy
fz = x2 + 3z 2

1.6. CAMPOS CONSERVATIVOS 15

Começamos integrando a primeira equação com relação a x para obter

f (x, y, z) = x2 z + xy 2 + g(y, z).

Agora derivamos com relação a y e comparamos com a segunda, equação, obtendo

fy = 2xy + gy = 2xy ⇒ gy = 0 ⇒ g(y, z) = h(z).

Assim, temos por enquanto


f (x, y, z) = x2 z + xy 2 + h(z).
Finalmente, derivamos com relação a z e comparamos com a terceira equação, para obter

fz = x2 + h0 (z) = x2 + 3z 2 ⇒ h0 (z) = 3z 2 ⇒ h(z) = z 3 + K.

Tomando K = 0, obtemos
f (x, y, z) = x2 z + xy 2 + z 3

e F~ é conservativo.

Exemplo 1.6.4. Mostre que o campo F~ (x, y, z) = (ey , xey , (z + 1)ez ) é conservativo.
Solução. Temos que determinar f (x, y, z) tal que

 fx = ey
fy = xey
fz = (z + 1)ez

Integrando a primeira equação com respeito a x, obtemos

f (x, y, z) = xey + g(y, z).

Derivando com respeito a y e comparando com a segunda equação, concluı́mos que

fy = xey + gy = xey ⇒ gy = 0 ⇒ g(y, z) = h(z),

e portanto
f (x, y, z) = xey + h(z).
Finalmente, derivamos com respeito a z e comparamos com a terceira equação, de modo que

fz = h0 (z) = (z + 1)ez ⇒ h(z) = zez + K,

(usamos integração por partes). Escolhendo K = 0 obtemos o potencial

f (x, y, z) = xey + zez ,

e o campo é conservativo.

1.6.1 O Teorema Fundamental das Integrais de Linha

Campos conservativos fornecem uma versão do Teorema Fundamental do Cálculo para integrais de linha,
como mostra o Teorema a seguir:
Teorema 1.6.1 (Teorema Fundamental das Integrais de Linha). Seja C uma curva lisa de parametrização
~r(t), a ≤ t ≤ b. Seja f uma função real de duas ou três variáveis tal que ∇f é contı́nuo sobre C. Então
Z
∇f · d~r = f (~r(b)) − f (~r(a)). (1.6.1)
C
16 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

Demonstração. Vamos supor, sem perda de generalidades, que f é uma função real de três variáveis. Então

Z Z b
∇f · d~r = ∇f (~r(t)) · r~0 (t)dt
C a
Z b  
∂f dx ∂f dy ∂f dz
= + + dt
a ∂x dt ∂y dt ∂z dt
Z b
d
= f (x(t), y(t), z(t))dt (Pela Regra da Cadeia)
a dt
= f (x(b), y(b), z(b)) − f (x(a), y(a), z(a)) (Pelo Teorema Fundamental do Cálculo)
= f (~r(b)) − f (~r(a))

Z
O Teorema acima mostra que, se F~ for conservativo, então a integral de linha F~ · d~r depende apenas
C
do valor do potencial nos pontos inicial e final da curva C.
Z
Exemplo 1.6.5. Calcule F~ · d~r, onde F~ (x, y) = (6x + 5y, 5x + 4y) e C é a curva de parametrização
C
~r(t) = (et sent, et cos t), 0 ≤ t ≤ π/2.

Solução. Já vimos no Exemplo 1.6.1 que F~ é conservativo, e um potencial é f (x, y) = 3x2 + 5xy + 2y 2 .
Então, o Teorema Fundamental nos fornece
Z
F~ · d~r = f (~r(π/2)) − f (~r(0)) = f (eπ/2 , 0) − f (0, 1) = 3eπ − 2 .
C

Z
Exemplo 1.6.6. Calcule F~ · d~r, onde F~ (x, y, z) = (2xz+y 2 , 2xy, x2 +3z 2 ) e C é a curva de parametrização
C
~r(t) = (t2 , t + 1, 2t − 1), 0 ≤ t ≤ 1.

Solução. Já vimos no Exemplo 1.6.3 que F~ é conservativo e que um potencial é f (x, y, z) = x2 z + xy 2 + z 3 .
Assim, pelo Teorema Fundamental temos
Z
F~ · d~r = f (~r(1)) − f (~r(0)) = f (1, 2, 1) − f (0, 1, −1) = 6 − (−1) = 7 .
C

Z
Exemplo 1.6.7. Calcule F~ · d~r, onde
C

F~ (x, y, z) = (yz cos(xz) + 1, sen(xz) + 2, xy cos(xz) + 3)

e C é o segmento de reta de A = (0, 0, 1) a B = (1, 1, 1).

Solução. Vejamos primeiro que F~ é conservativo. Para isso, precisamos obter uma função f (x, y, z) tal que

 fx = yz cos(xz) + 1
fy = sen(xz) + 2
fz = xy cos(xz) + 3

Integrando a segunda equação com respeito a y, obtemos f (x, y, z) = y sen(xz) + 2y + g(x, z). Agora
derivando com respeito a x e comparando com a primeira equação vemos que yz cos(xz)+gx = yz cos(xz)+1,
1.6. CAMPOS CONSERVATIVOS 17

logo g(x, z) = x + h(z). Daı́, f (x, y, z) = y sen(xz) + x + 2y + h(z). Finalmente, derivando com respeito a
z e comparando com a terceira equação obtemos xy cos(xz) + h0 (z) = xy cos(xz) + 3, portanto h0 (z) = 3 e
h(z) = 3z + C. Podemos escolher C = 0 e obter o potencial

f (x, y, z) = x + 2y + 3z + y sen(xz)

para o campo F~ que, portanto, é conservativo.


Pelo Teorema Fundamental, teremos
Z
F~ · d~r = f (1, 1, 1) − f (0, 0, 1) = 6 + sen(1) − 3 = 3 + sen(1) .
C

1.6.2 Independência do caminho


Z
Se F~ for um campo vetorial contı́nuo com domı́nio D, diremos que a integral F~ · d~r é independente
C
do caminho se
Z Z
F~ · d~r = F~ · d~r (1.6.2)
C1 C2

para quaisquer caminhos C1 e C2 contidos em D que tenham os mesmos pontos iniciail e final. O Teorema
1.6.1 mostra, em particular, que as integrais de linha de campos conservativos são independentes do caminho.
O Teorema a seguir, por sua vez, mostra que os únicos campos vetoriais independentes do caminho são
os conservativos. Vamos admitir que o domı́nio D do campo é aberto (isto é, que não contém nenhum ponto
de sua fronteira) e conexo por caminhos (ou seja, que quaisquer dois pontos de D podem ser ligados por um
caminho inteiramente contido em D).

Teorema 1.6.2. Seja F~ um campo vetorial contı́nuo sobre uma região aberta e conexa por caminhos D. Se
Z
F~ · d~r for independente do caminho, então F~ é conservativo.
C

Demonstração. Faremos a demonstração para curvas planas, pois o caso espacial é análogo. Seja (a, b) um
ponto fixo em D. Vamos mostrar que que uma função potencial para F~ = (P, Q) é
Z (x,y)
f (x, y) = F~ · d~r,
(a,b)
Z
com (x, y) ∈ D. Como a integral F~ · d~r é independente do caminho, não há ambiguidade na definição de
C
f pois não importa a forma como iremos de (a, b) a (x, y).
Considere um ponto (x1 , y) ∈ D, com x1 < x. Um ponto dessa forma sempre existe, pois como D é
aberto então (x, y) não está na fronteira de D. Seja C1 um caminho qualquer de (a, b) a (x1 , y) e C2 o
segmento de reta horizontal de (x1 , y) a (x, y). Seja C o caminho de (a, b) a (x, y) composto por C1 seguido
por C2 .
Temos Z Z Z Z Z (x1 ,y)
f (x, y) = F~ · d~r = F~ · d~r + F~ · d~r = F~ · d~r + F~ · d~r.
C C1 C2 (a,b) C2

Note que a primeira integral do lado direito não depende de x, logo derivando a equação acima com respeito
a x vamos obter Z
∂f ∂
=0+ P dx + Qdy.
∂x ∂x C2
18 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

Sobre C2 , y é constante, logo dy = 0, e usando t como parâmetro para C2 , x1 ≤ t ≤ x, temos


Z x
∂f ∂
= P (t, y)dt = P (x, y)
∂x ∂x x1

pelo Teorema Fundamental do Cálculo.


Analogamente, tomando um ponto (x, y1 ), com y1 < y e usando um segmento de reta vertical mostra-se
que
∂f
= Q(x, y),
∂y

logo ∇f = F~ e F~ é conservativo.

Z
Suponha que F~ é um campo conservativo. Sabemos que F~ · d~r é independente do caminho. Considere
C
uma curva fechada C qualquer e escolha dois pontos A e B sobre C, de modo que C seja igual a um caminho
C1 de A até B seguido de um caminho C2 de B até A. Observe que as curvas C1 e −C2 possuem os mesmos
pontos inicial e final, logo
Z Z Z
~
F · d~r = ~
F · d~r = − F~ · d~r.
C1 −C2 C2

Assim,
Z Z Z
F~ · d~r = F~ · d~r + F~ · d~r = 0,
C C1 C2

ou seja, se F~ é conservativo então


Z
F~ · d~r = 0
C

para toda curva fechada C. Z


Reciprocamente, suponha que F~ · d~r = 0 para toda curva fechada C. Sejam C1 e C2 dois caminhos
C
quaisquer ligando os pontos A e B. A curva C formada por C1 seguida de −C2 é uma curva fechada, logo
Z
F~ · d~r = 0.
C

Mas então
Z Z Z Z Z Z
F~ · d~r + F~ · d~r = 0 ⇒ F~ · d~r − F~ · d~r = 0 ⇒ F~ · d~r = F~ · d~r,
C1 −C2 C1 C2 C1 C2

logo a integral independe do caminho. Com isso, provamos o seguinte Teorema:

Teorema 1.6.3. Seja D uma região aberta e conexa por caminhos e F~ um campo vetorial contı́nuo com
domı́nio D. São equivalentes:

(i) F~ é conservativo;
Z
(ii) F~ · d~r é independente do caminho em D;
C
Z
(iii) F~ · d~r = 0 para toda curva fechada C contida em D.
C
1.6. CAMPOS CONSERVATIVOS 19

Exemplo 1.6.8. Considere o campo


 
y x
F~ (x, y) = − , .
x2 + y 2 x2 + y 2
Z
Vamos calcular F~ · d~r ao longo da circunferência C de parametrização ~r(t) = (a cos t, a sent), 0 ≤ t ≤ 2π.
C
Temos r~0 (t) = (−a sent, a cos t), logo
Z Z 2π  
a sent a cos t
F~ · d~r = − 2 , · (−a sent, a cos t)dt
C 0 a cos2 t + a2 sen2 t a2 cos2 t + a2 sen2 t
Z 2π  
sent cos t
= − , · (−a sent, a cos t)dt
0 a a
Z 2π
= ( sen2 t + cos2 t)dt
0
= 2π.

Como C é uma curva fechada e a integral de F~ ao longo de C não é igual a 0, concluı́mos pelo Teorema
anterior que F~ não é conservativo.

1.6.3 Caracterização dos Campos Conservativos no Plano

Até aqui a única forma que temos de determinar se um campo F~ é conservativo é calculando um potencial.
Nesta seção vamos obter condições mais práticas para decidir quando F~ é conservativo.
Suponha que F~ = (P, Q) é conservativo e que P e Q possuem derivadas parciais de primeira ordem
contı́nuas. Logo, existe uma função f tal que ∂f /∂x = P e ∂f /∂y = Q. Daı́, as derivadas de segunda ordem
de f são contı́nuas. Pelo Teorema de Clairaut,
∂2f ∂2f ∂Q ∂P
= ⇒ = .
∂x∂y ∂y∂x ∂x ∂y
Com isso, provamos o
 
Teorema 1.6.4. Se F~ (x, y) = P (x, y), Q(x, y) é um campo conservativo e P e Q possuem derivadas
parciais de primeira ordem contı́nuas, então
∂P ∂Q
= .
∂y ∂x

Observe que essa condição é apenas necessária. Todo campo conservativo tem essa propriedade, mas nem
todo campo com essa propriedade é conservativo. Como vimos no Exemplo 1.6.8, o campo
 
y x
F~ (x, y) = − 2 ,
x + y 2 x2 + y 2
não é conservativo, apesar de termos
∂P ∂Q y 2 − x2
= = 2 .
∂y ∂x (x + y 2 )2

No entanto, ainda podemos usar o Teorema 1.6.4 para mostrar que um campo F~ = (P, Q) não é conser-
vativo. Basta mostrar que
∂P ∂Q
6= .
∂y ∂x
20 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

Exemplo 1.6.9. Mostre que F~ (x, y) = (x3 + 4xy, 4xy − y 3 ) não é conservativo.

Solução. Temos P (x, y) = x3 + 4xy e Q(x, y) = 4xy − y 3 , logo

∂P ∂Q
= 4x 6= 4y = ,
∂y ∂x

logo F~ não é conservativo.

A recı́proca do Teorema 1.6.4 só vale se considerarmos um tipo especial de região: diremos que uma
região D é simplesmente conexa se for conexa e se toda curva fechada e simples contida em D contorna
apenas pontos que estão em D. Intuitivamente, isso significa que D não contém buracos nem é formado por
dois ou mais pedaços separados. Em particular, R2 e R3 são simplesmente conexos.
 
Teorema 1.6.5. Seja F~ (x, y) = P (x, y), Q(x, y) um campo vetorial cujo domı́nio D é uma região aberta
e simplesmente conexa. Suponha que P e Q possuem derivadas parciais de primeira ordem contı́nuas e que

∂P ∂Q
=
∂y ∂x

em D. Então F~ é conservativo.

Demonstraremos esse resultado na próxima seção com o auxı́lio do Teorema de Green.

Exemplo 1.6.10. Determine se o campo vetorial F~ (x, y) = (3 + 2xy, x2 − 3y 2 ) é ou não conservativo.

Solução. Temos
∂P ∂Q
= 2x = .
∂y ∂x
Como o domı́nio de F~ é R2 , que é simplesmente conexo, concluı́mos que F~ é conservativo.

1.7 O Teorema de Green

Nesta seção vamos estudar o Teorema de Green, que fornece a relação entre uma integral de linha ao
longo de uma curva plana fechada e simples C e uma integral dupla sobre a região D do plano cercada por
C.
Diremos que uma curva fechada e simples C está orientada positivamente se, ao percorrermos a curva, a
região plana delimitada por ela fica à esquerda.

Figura 1.7.1: Orientações de Curvas


1.7. O TEOREMA DE GREEN 21

Teorema 1.7.1 (Green). Seja C uma curva plana simples, fechada, lisa por partes, orientada positivamente
e seja D a região delimitada por C. Se as funções de duas variáveis P e Q possuem derivadas parciais de
primeira ordem contı́nuas sobre uma região aberta que contenha D, então
Z ZZ  
∂Q ∂P
P dx + Qdy = − dA.
C ∂x ∂y
D
I Z
• Às vezes usamos a notação no lugar de para indicar que estamos integrando sobre uma curva
C C
fechada orientada positivamente.
• A notação para a curva fronteira de D, orientada positivamente, é ∂D.
• O Teorema de Green pode ser visto como a versão do Teorema Fundamental do Cálculo para a integral
dupla, pois relaciona uma expressão envolvendo derivadas dentro da região com uma outra que envolve
as funções originais sobre a fronteira dessa região.

Demonstração. Vamos demonstrar o Teorema de Green apenas quando D é uma região retangular, ou seja,

D = {(x, y) : a ≤ x ≤ b, c ≤ y ≤ d}.

Note que o Teorema estará demonstrado se verificarmos que


Z ZZ Z ZZ
∂P ∂Q
P dx = − dA e Qdy = dA.
C ∂y C ∂x
D D

Vamos provar apenas a primeira dessas igualdades, pois a segunda é análoga.


Primeiramente, note que
ZZ Z bZ d Z bh
∂P ∂P i
dA = (x, y)dydx = P (x, d) − P (x, c) dx, (1.7.1)
∂y a c ∂y a
D

onde usamos o Teorema Fundamental do Cálculo.


Para calcular a integral de linha, vamos dividir a curva C em quatro partes: os segmentos de reta C1 de
(a, c) a (b, c), C2 de (b, c) a (b, d), C3 de (b, d) a (a, d) e C4 de (a, d) a (a, c). Daı́, temos
Z Z Z Z Z
P dx = P dx + P dx + P dx + P dx.
C C1 C2 C3 C4

Como x não varia ao longo de C2 e C4 , temos dx = 0 ao longo dessas curvas, logo


Z Z
P dx = P dx = 0.
C2 C4

Para as outras duas curvas, podemos parametrizar C1 por ~r1 (x) = (x, c), a ≤ x ≤ b e −C3 por ~r3 (x) = (x, d),
a ≤ x ≤ b. Em ambos os casos, x0 (t) = 1, portanto
Z Z Z Z b Z b Z b h i
P dx = P dx − P dx = P (x, c)dx − P (x, d)dx = P (x, c) − P (x, d) dx. (1.7.2)
C C1 −C3 a a a

Comparando (1.7.1) e (1.7.2) vemos que


Z ZZ
∂P
P dx = − dA,
C ∂y
D

como querı́amos.
22 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

Apesar de termos demonstrado o Teorema de Green apenas para retângulos, ele vale para regiões menos
simples, como as do Tipo 1 e do Tipo 2 estudadas em Cálculo 2, como ilustra o exemplo a seguir.
Z
Exemplo 1.7.1. Calcule x2 y 2 dx + 4xy 3 dy, onde C é o triângulo com vértices (0, 0), (1, 3) e (0, 3),
C
orientado positivamente.

Solução. Para calcular a integral de linha pela definição precisarı́amos resolver três integrais. Vejamos que
o Teorema de Green permite realizar um cálculo mais prático. A região D pode ser expressa como

D = {(x, y) ∈ R2 : 0 ≤ x ≤ 1, 3x ≤ y ≤ 3}.

Temos P (x, y) = x2 y 2 e Q(x, y) = 4xy 3 , logo


Z Z 1 Z 3
x2 y 2 dx + 4xy 3 dy = (4y 3 − 2x2 y)dydx
C 0 3x
Z 1 y=3
= (y 4 − x2 y 2 ) dx

0 y=3x
Z 1
= (81 − 9x2 − 81x4 + 9x4 )dx
0
1
72x5 3
= 81x − 3x −
5 0
318
= .
5


Z
x
Exemplo 1.7.2. Calcule (y + e )dx + (2x + cos(y 2 ))dy, onde C é a fronteira da região delimitada pelas
C
parábolas y = x2 e x = y 2 , orientada positivamente.

Solução. A região D pode ser expressa como



D = {(x, y) ∈ R2 : 0 ≤ x ≤ 1, x2 ≤ y ≤ x}.

x
Temos P (x, y) = y + e e Q(x, y) = 2x + cos(y 2 ). Pelo Teorema de Green, temos que

Z √
Z 1 Z x
x 2
(y + e )dx + (2x + cos(y ))dy = (2 − 1)dydx
C 0 x2
Z 1 y=√x
= y dx

0 y=x2
Z 1 √
= ( x − x2 )dx
0
2 1
= x3/2 − x3
3 3
1
= .
3

Z
Exemplo 1.7.3. Calcule F~ · d~r, onde F~ (x, y) = (ex + x2 y, ey − xy 2 ) e C é a circunferência x2 + y 2 = 25,
C
orientada no sentido horário.
1.7. O TEOREMA DE GREEN 23

Solução. Temos Z Z
F~ · d~r = (ex + x2 y)dx + (ey − xy 2 )dy.
C C

Note que C está orientada negativamente, portanto vamos aplicar o Teorema de Green à curva −C. Temos
que P (x, y) = ex + x2 y e Q(x, y) = ey − xy 2 , logo
Z ZZ
~
F · d~r = (−y 2 − x2 )dA.
−C
D

Como a região D é circular, usamos coordenadas polares



x = r cos θ
,
y = r senθ

logo dA = rdrdθ, de modo que


Z Z 2π Z 5
F~ · d~r = −(r2 cos2 θ + r2 sen2 θ)rdrdθ
−C 0 0
Z 2π Z 5
=− r3 drdθ
0 0
2π r=5
r4
Z
=− dθ
0 4 r=0
Z 2π
625
=− dθ
0 4

625θ
=−
4 0
625π
=− .
2

Z Z
Como F~ · d~r = − F~ · d~r, concluı́mos que
−C C
Z
625π
F~ · d~r = .
C 2

Z
Exemplo 1.7.4. Calcule F~ · d~r, onde F~ (x, y) = (3 + 2xy, x2 − 3y 2 ) e C é qualquer curva fechada simples.
C

Solução. Temos
∂Q ∂P
= 2x = ,
∂x ∂y
logo
Z ZZ  
∂Q ∂P
F~ · d~r = − dA = 0,
C ∂x ∂y
D

qualquer que seja a curva fechada simples C.

Agora, como prometido, exibimos a demonstração do Teorema 1.6.5.


24 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

Demonstração. Vamos usar o Teorema de Green para mostrar que se C for uma curva fechada simples em
D, então Z
F~ · d~r = 0.
C
Temos que, se R é a região delimitada por C, então
Z ZZ  
~ ∂Q ∂P
F · d~r = − dA = 0.
C ∂x ∂y
D

Agora se C for fechada (não necessariamente simples), então C pode ser quebrada em um certo número
finito de curvas fechadas simples.
Mostramos que as integrais de linha de F~ sobre essas curvas simples são todas iguais a zero, e somando
as integrais vemos que Z
F~ · d~r = 0,
C

qualquer que seja a curva fechada C. Pelo Teorema 1.6.3, isso garante que F~ é conservativo.

1.7.1 Cálculo de Áreas

Nos exemplos da seção anterior usamos o Teorema de Green para calcular a integral de linha, pois o cálculo
da integral dupla era bem mais simples (tente calcular as integrais de linhas desses exemplos diretamente
pela definição para se convencer disso rapidamente). Também podemos usar o Teorema no sentido oposto,
quando calcular uma integral de linha for mais fácil. ZZ
Uma aplicação disso é no cálculo de áreas. Como a área de uma região D é 1dA, devemos escolher
D
funções P e Q tais que
∂Q ∂P
− = 1.
∂x ∂y
Algumas possibilidades são:
• P (x, y) = 0 e Q(x, y) = x;
• P (x, y) = −y e Q(x, y) = 0;
• P (x, y) = − y2 e Q(x, y) = x2 .

x2 y2
Exemplo 1.7.5. Calcule a área da elipse + = 1.
a2 b2
Solução. Usamos a terceira opção apresentada acima, parametrizando C por ~r(t) = (a cos t, b sent), 0 ≤ t ≤
2π. Temos pelo Teorema de Green que
Z
y x
A= − dx + dy
C 2 2
Z 2π h
1 i
= (−b sent)(−a sent) + (a cos t)(b cos t) dt
2 0
ab 2π
Z
= ( sen2 t + cos2 t)dt
2 0
ab 2π
Z
= dt
2 0
= πab .
1.7. O TEOREMA DE GREEN 25

Resumindo, podemos usar as fórmulas abaixo para calcular a área da região D delimitada pela curva C:
I I I
1
A= xdy = − ydx = xdy − ydx (1.7.3)
C C 2

Exemplo 1.7.6. Calcule a área da curva de parametrização ~r(t) = (cos3 (t), sen3 (t)), 0 ≤ t ≤ 2π. Essa
curva é chamada de astroide.

Solução. Usando novamente a terceira fórmula apresentada, temos


Z 2π
1  
A= cos3 t(3 sen2 t cos t) − sen3 t(−3 cos2 t sent) dt
2 0
Z 2π
3  
= cos4 t sen2 t + sen4 t cos2 t dt
2 0
Z 2π
3
= cos2 t sen2 t(cos2 t + sen2 t)dt
2 0
Z 2π
3
= 4 cos2 t sen2 tdt
8 0
Z 2π
3
= (2 sent cos t)2 dt
8 0
Z 2π
3
= sen2 (2t)dt
8 0

1 − cos(4t)
Z
3
= dt
8 0 2
 2π
3 sen(4t)
= t−
16 4 0

= .
8

1.7.2 Versão estendida do Teorema de Green

O Teorema de Green também pode ser aplicado a regiões com furos, como na figura a seguir:

Figura 1.7.2: Uma região com furo

Observe que a fronteira de D é formada por duas curvas fechadas simples C1 e C2 . Note também que a
orientação positiva de C1 é no sentido anti-horário, mas a de C2 é no sentido horário. Vamos dividir a região
D em duas regiões D1 e D2 introduzindo os cortes mostrados na figura seguinte:
26 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

Figura 1.7.3: Cortes em uma região com furo

Vamos aplicar o Teorema de Green às regiões D1 e D2 . Temos


ZZ   Z ZZ   Z
∂Q ∂P ∂Q ∂P
− dA = P dx + Qdy e − dA = P dx + Qdy.
∂x ∂y ∂D1 ∂x ∂y ∂D2
D1 D2

Somando as duas equações acima, as integrais sobre os cortes se cancelam, já que em cada integral eles
são percorridos em sentidos opostos. A parte restante forma as curvas C1 e C2 , orientadas positivamente,
ou seja, a fronteira da região D. Logo,
ZZ   Z
∂Q ∂P
− dA = P dx + Qdy, (1.7.4)
∂x ∂y ∂D
D

que é o Teorema de Green para a região D.


Cuidado com a orientação das curvas! A fronteira exterior deve ser orientada no sentido anti-horário
como de costume, mas a fronteira interior deve ser orientada no sentido horário!
Exemplo 1.7.7. Se  
y x
F~ (x, y) = − , ,
x2 + y 2 x2 + y 2
mostre que F~ · d~r = 2π para toda curva fechada simples que circunde a origem.
Solução. Não podemos usar o Teorema de Green diretamente pois P e Q não possuem derivadas parciais
contı́nuas na origem. Consideremos o cı́rculo C1 de raio a e centro na origem, com a suficientemente pequeno
para que C1 esteja contida no interior de C, e orientada no sentido anti-horário. A região D compreendida
entre C e C1 pode ser usada no Teorema de Green, pois P e Q têm derivadas parciais contı́nuas em um
aberto contendo essa região.

Figura 1.7.4: Região do Exemplo 1.7.7

Usamos a observação que fizemos acima:


ZZ   Z
∂Q ∂P
− dA = P dx + Qdy. (1.7.5)
∂x ∂y ∂D
D
1.7. O TEOREMA DE GREEN 27

A fronteira de D é formada pelas curvas C e C1 . Já vimos no Exemplo 1.6.8 que

∂Q y 2 − x2 ∂P
= 2 2 2
= ,
∂x (x + y ) ∂y

logo a equação (1.7.5) pode ser reescrita como


Z Z Z Z Z
0= F~ · d~r + F~ · d~r ⇒ F~ · d~r = − F~ · d~r = F~ · d~r.
C −C1 C −C1 C1

Basta calcular essa última integral, mas já vimos, também no Exemplo 1.6.8, que
Z
F~ · d~r = 2π
γ

para toda circunferência γ centrada na origem orientada positivamente. Assim,


Z
F~ · d~r = 2π
C

para toda curva fechada e simples que circunde a origem.

1.7.3 Mais Exemplos



Exemplo 1.7.8. Seja  C a curva dada pelo  gráfico da função y = x 1 − x, x ∈ [0, 1], e considere o campo
vetorial F~ (x, y) = (y + 1)2 , 2x + sen3 y .

(a) Encontre uma parametrização ~r(t) de C.


(b) Encontre uma parametrização ~r1 (t) do segmento de reta C1 que junta os extremos de C.
Z
(c) Usando o Teorema de Green, calcule a integral de linha F~ · d~r.
C

Figura 1.7.5: Curvas do Exemplo 1.7.8



Solução. Para o item (a), basta considerar ~r(t) = (t, t 1 − t), 0 ≤ t ≤ 1. Para o item (b), consideramos
~r1 (t) = (t, 0), 0 ≤ t ≤ 1. Vamos usar o Teorema de Green na região D limitada pelas curvas C e C1 . Observe
28 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

a Figura 1.7.5. Podemos fazer isso pois as funções P (x, y) = (y + 1)2 e Q(x, y) = 2x + sen3 y possuem
derivadas parciais de primeira ordem contı́nuas sobre D e sobre sua fronteira, que é ∂D = (−C) ∪ C1 , já
com orientação positiva.
Temos
∂Q ∂P
=2e = 2y + 2,
∂x ∂y
logo pelo Teorema de Green
Z ZZ   ZZ
∂Q ∂P
F~ · d~r = − dA = 2 ydA. (1.7.6)
∂D ∂x ∂y
D D

Podemos expressar D na forma



D = {(x, y) : 0 ≤ x ≤ 1, 0 ≤ y ≤ x 1 − x},

logo

1

x 1−x 1 y=x√1−x 1
y 2 1 1 2 x3 x4
ZZ Z Z Z Z
1
ydA = ydydx = dx = x (1 − x)dx = − = .
0 0 0 2 y=0 2 0 3 4 0 24
D

Substituindo em (1.7.6), vamos obter


Z Z
1
F~ · d~r + F~ · d~r = − . (1.7.7)
−C C1 12
Agora calculamos a integral ao longo de C1 . Note que como y é constante ao longo desta curva, temos
dy = 0, logo
Z Z Z Z 1
~
F · d~r = P dx + Qdy = P dx = (0 + 1)2 dt = 1.
C1 C1 C1 0
Z Z
Finalmente, substituindo em (1.7.7) e usando o fato de que F~ · d~r = − F~ · d~r, temos
−C C

Z
13
F~ · d~r = .
C 12

Exemplo 1.7.9. Considere o campo vetorial


!
y3 xy 2
F~ (x, y) = − 2 , 2
(x + y ) (x + y 2 )2
2 2

em R2 \ {(0, 0)} e sejam γ e δ, respectivamente, as circunferências x2 + y 2 = 1 e (x − 1)2 + y 2 = 4, ambas


percorridas no sentido anti-horário.

(a) Esboce γ e δ em R2 .
Z
(b) Calcule F~ · d~r.
γ

∂Q ∂P
(c) Sendo F~ = (P, Q), mostre que = .
∂x ∂y
Z
(d) Use o Teorema de Green para calcular F~ · d~r.
δ
1.7. O TEOREMA DE GREEN 29

Solução. O esboço das curvas está na Figura 1.7.6. A curva γ tem parametrização ~r(t) = (cos t, sent),
0 ≤ t ≤ 2π, logo

Z Z 2π
F~ · d~r = (− sen3 t, cos t sen2 t) · (− sent, cos t)dt
γ 0
Z 2π
= ( sen4 t + cos2 t sen2 t)dt
0
Z 2π
= sen2 t( sen2 t + cos2 t)dt
0

1 − cos(2t)
Z
= dt
0 2

t cos(2t)
= −
2 4 0
= π.

Figura 1.7.6: Circunferências γ e δ

Temos ainda que


∂Q y 4 − 3x2 y 2 ∂P
= 2 2 3
= .
∂x (x + y ) ∂y
Como P e Q possuem derivadas parciais contı́nuas sobre as curvas γ e δ e na região D limitada por elas, o
Teorema de Green nos fornece
Z Z ZZ  
∂Q ∂P
F~ · d~r − F~ · d~r = − dA = 0,
δ γ ∂x ∂y
D

já orientando a fronteira de D positivamente (considerando −γ ao invés de γ). Dessa forma, concluı́mos que
Z Z
F~ · d~r = F~ · d~r = π .
δ γ
30 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

1.8 Exercı́cios
Exercı́cio 1.1. Parametrize o segmento de reta que liga os pontos P e Q nos seguintes casos:

(a) P (0, 0, 0) e Q(1, 2, 3).


(b) P (−1, 3, 5) e Q(0, 2, 9).

Exercı́cio 1.2. Parametrize a curva obtida pela interseção das superfı́cies nos seguintes casos:

(a) O cilindro x2 + y 2 = 4 e a superfı́cie z = xy.


p
(b) O cone z = x2 + y 2 e o plano z = 1 + y.
(c) O paraboloide z = 4x2 + y 2 e o cilindro parabólico y = x2 .

Exercı́cio 1.3. Determine


√ o ponto na curva ~r(t) = (2 cos t, 2 sent, et ), 0 ≤ t ≤ π, em que a reta tangente é
paralela ao plano 3x + y = 1.
Exercı́cio 1.4. Encontre uma equação para a reta tangente à curva de interseção dos cilindros x2 + y 2 = 25
e y 2 + z 2 = 20 no ponto (3, 4, 2).
Exercı́cio 1.5. Determine as equações paramétricas para a reta tangente à curva dada pelas equações
paramétricas, no ponto especificado.

(a) x = t, y = e−t , z = 2t − t2 ; (0, 1, 0).



(b) x = 2 cos t, y = 2 sent, z = 4 cos(2t); ( 3, 1, 2).

Exercı́cio 1.6. Determine o comprimento da curva dada:

(a) ~r(t) = (t, 3 cos t, 3 sent), −5 ≤ t ≤ 5.


(b) ~r(t) = (2t, t2 , 31 t3 ), 0 ≤ t ≤ 1.
(c) ~r(t) = (cos t, sent, ln(cos t)), 0 ≤ t π4 .
π
(d) ~r(t) = (cos3 t, sen3 t, 2), 0 ≤ t ≤ 2.

(e) ~r(t) = (t2 , cos t + t sent, sent − t cos t), 0 ≤ t ≤ π.

Exercı́cio 1.7. Reparametrize a curva pelo comprimento de arco a partir do ponto onde t = 0 na direção
crescente de t.

(a) ~r(t) = (3 + cos t, 2 + sent).


(b) ~r(t) = (cos3 (t), sen3 (t)).
(c) ~r(t) = ( 13 t3 , 21 t2 ).

(d) ~r(t) = ( sen(et ), cos(et ), 3et ).
(e) ~r(t) = (a cos t, a sent, ct).

Exercı́cio 1.8. Encontre uma função potencial para o campo F~ do Exemplo 1.6.10.
Exercı́cio 1.9. Considere a curva parametrizada por
π
α(t) = (et/2 cos t, et/2 sent), 0 ≤ t ≤ .
2
(a) Ache ds, o elemento de comprimento de arco da curva parametrizada α.
1.8. EXERCÍCIOS 31

(b) Calcule o comprimento desta curva.

(c) Calcule Z
yds.
α

Exercı́cio 1.10. Considere a curva C parametrizada por


 
1 2
~r(t) = cos(t) + t sen(t), sen(t) − t cos(t), t , 0 ≤ t ≤ `.
2

(a) Para cada valor do parâmetro t encontre um vetor tangente e um vetor tangente unitário no ponto
correspondente de C.

(b) Encontre o comprimento da curva C.

(c) Existe algum α ∈ [0, `] tal que ~r(0) = ~r(a)?

(d) Se f (x, y, z) = z, calcule Z


f (x, y, z)ds.
C

(e) Calcule a integral de linha Z


F~ · d~r,
C

onde F~ (x, y, z) = (x, y, z 2 ).

Exercı́cio 1.11. Seja C o quarto de elipse de equação

x2 y2
+ = 1, x ≥ 0, y ≥ 0,
16 25
9
ou seja, aquele trecho da elipse localizado no primeiro quadrante, e considere a função escalar f (x, y) = xy,
10
definida em R2 .
~ no ponto ~r(t).
(a) Encontre uma parametrização ~r(t) de C, o vetor tangente r0 (t) e um vetor normal N

(b) Calcule a integral Z


f (x, y)ds
C
em relação ao comprimento de arco.

(c) Calcule a integral Z


f (x, y)dy
C
em relação à variável y.
 
Exercı́cio 1.12. Calcule o comprimento da curva C de parametrização ~r(t) = et/2π cos t, et/2π sent do
ponto (1, 0) ao ponto (e, 0).

Exercı́cio 1.13. Sendo F~ (x, y, z) = (x, 0, yz 2 ) e C o segmento de reta de A = (1, 2, 3) a B = (0, 1, 2), calcule
Z
F~ · d~r.
C
 
Exercı́cio 1.14. Considere a cicloide de parametrização ~r(θ) = a(θ − senθ), a(1 − cos θ) .
32 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS

  r
θ 1 − cos θ
(a) Calcule o comprimento do arco da cicloide para 0 ≤ θ ≤ π. Dica: Use a identidade sen = .
2 2
(b) Seja ~r(s) = (x(s), y(s)) a reparametrização pelo comprimento de arco da cicloide partindo de θ0 = 0.
Encontre y(s).

Exercı́cio √1.15. Seja γ √a curva


√ de interseção dos cilindros x2 + z 2 = 16 e y 2 + z 2 = 16 entre os pontos
~
A = (2, 2, 2 3) e B = (2 3, 2 3, 2) e seja F (x, y, z) = (x + z 2 , x2 + y 2 , y 2 + z 2 ).
2

(a) Parametrize γ no sentido de A para B.


(b) Calcule Z
F~ · d~r.
C

Exercı́cio 1.16. Calcule a integral de linha do Exemplo 1.6.7 sem usar o Teorema Fundamental do Cálculo
para Integrais de Linha.
Exercı́cio 1.17. Considere o campo vetorial F~ (x, y, z) = (2xyz + 1, x2 z + z, x2 y + y).

(a) Determine uma função potencial para F~ .

(b) Calcule a integral de linha de F~ ao longo da curva dada pela interseção do paraboloide z = 4 − x2 − y 2
com o plano x − y = 0, com z ≥ 0.

Exercı́cio 1.18. Seja C a curva dada pela interseção do cilindro x2 + y 2 = 1 com a superfı́cie z = exy , na
região do espaço onde x ≥ 0 e y ≥ 0. Considere o campo de força

F~ (x, y, z) = (yz 2 , xz 2 + 1, 2xyz).

(a) Encontre uma parametrização ~r(t) de C, um vetor tangente a C no ponto ~r(t) e os extremos de C.

(b) Encontre um potencial f (x, y, z) de F~ (x, y, z).

(c) Calcule o trabalho feito pelo campo F~ (x, y, z) para mover uma partı́cula ao longo de C, utilizando o
Teorema Fundamental do Cálculo para integrais de linha.

Exercı́cio 1.19. Considere o campo de vetores


!
3x 6y 3
F~ (x, y) = p ,p .
x2 + y 4 x2 + y 4

(a) Ache um potencial para F~ .

(b) Calcule ~
√ o trabalho realizado por F ao deslocar uma √ partı́cula
√ ao longo do arco de circunferência
2
y = 1 − x do ponto A = (1, 0) até o ponto B = (−1/ 2, 1/ 2).

Exercı́cio 1.20. Considere o campo vetorial


y2
 
F~ (x, y) = , 2y arctan(x) + 1 .
1 + x2

(a) F~ (x, y) é conservativo?

(b) Determine uma função f tal que F~ = ∇f .


(c) Calcule Z
F~ · d~r,
C

onde C é dada por ~r(t) = (t2 , 2t), 0 ≤ t ≤ 1.


1.8. EXERCÍCIOS 33

Exercı́cio 1.21. Considere a cicloide γ(t) = (t − sent, 1 − cos t), 0 ≤ t ≤ 2π.

(a) Calcule Z
ydx − xdy,
γB,O

onde γB,O é o arco de cicloide entre os pontos O = (0, 0) e B = (2π, 0), percorrido de B para O.
(b) Calcule a área da região plana limitada superiormente pelo arco de cicloide do item anterior e inferi-
ormente pelo eixo Ox.

Exercı́cio 1.22. Use o Teorema de Green e o Exemplo 1.7.5 para calcular


Z
ex senydx + (ex cos y + 3x)dy,
C

x2 y2
onde C é a elipse + = 1.
4 9
34 CAPÍTULO 1. CÁLCULO VETORIAL DE CURVAS
Capı́tulo 2

Cálculo Vetorial de Superfı́cies

2.1 Superfı́cies Parametrizadas

Vimos no Capı́tulo 1 que uma curva parametrizada é o conjunto imagem de uma função vetorial contı́nua
de uma variável. Analogamente, uma função vetorial f (u, v) = (x(u, v), y(u, v), z(u, v)) de duas variáveis
contı́nua determina o que chamamos de superfı́cie parametrizada, onde u e v são os parâmetros, com (u, v) ∈
[a, b] × [c, d]. As equações x = x(u, v), y = y(u, v) e z = z(u, v) são as equações paramétricas da superfı́cie.
Exemplo 2.1.1. O plano 2x − 3y + 2z = 15 pode ser parametrizado fazendo x = u, y = v, e então
15 − 2u + 3v
z= . Uma parametrização é
2
 
15 − 2u + 3v
~r(u, v) = u, v, .
2

Exemplo 2.1.2. Usando coordenadas cilı́ndricas, o cilindro x2 + y 2 = R2 tem parametrização

~r(θ, z) = (R cos θ, R senθ, z).

Exemplo 2.1.3. A esfera x2 + y 2 + z 2 = a2 pode ser parametrizada, usando coordenadas esféricas, por

~r(φ, θ) = (a senφ cos θ, a senφ senθ, a cos φ),

com 0 ≤ φ ≤ π, 0 ≤ θ ≤ 2π.
Exemplo 2.1.4. O paraboloide elı́ptico z = x2 +2y 2 pode ser parametrizado usando x e y como parâmetros:

~r(x, y) = (x, y, x2 + 2y 2 ) .

Em geral, sempre que uma das variáveis for dada como função das outras duas, podemos usar as duas
variáveis independentes como parâmetros, como nos Exemplos 2.1.1 e 2.1.4.
Exemplo 2.1.5. A metade inferior do elipsoide 2x2 +4y 2 +z 2 = 1 pode ser parametrizada como no Exemplo
2.1.3. Reescrevendo a equação como

x2 y2
√ + + z 2 = 1,
(1/ 2)2 (1/2)2

35
36 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

podemos fazer  
1 1
~r(φ, θ) = √ senφ cos θ, senφ senθ, cos φ ,
2 2
π
com 2 ≤ φ ≤ π e 0 ≤ θ ≤ 2π.
p
Exemplo 2.1.6. Parametrize a parte da esfera x2 + y 2 + z 2 = 4 que está acima do cone z = x2 + y 2 .

Solução. A uma altura z, a seção transversal do cone é um cı́rculo de raio z, logo o ângulo de abertura do
cone é π/4. Logo, a superfı́cie pode ser parametrizada em coordenadas esféricas como

~r(φ, θ) = (2 senφ cos θ, 2 senφ senθ, 2 cos φ),

com 0 ≤ φ ≤ π/4, 0 ≤ θ ≤ 2π.

Figura 2.1.1: Interseção de Esfera e Cone

Exemplo 2.1.7. A superfı́cie de revolução gerada pela rotação da curva y = f (x), a ≤ x ≤ b (com f (x) ≥ 0),
em torno do eixo x pode ser parametrizada como x = x, y = f (x) cos θ, z = f (x) senθ, onde θ é o ângulo de
rotação.

Figura 2.1.2: Superfı́cie de Revolução


2.1. SUPERFÍCIES PARAMETRIZADAS 37

Por exemplo, a superfı́cie gerada pela rotação de y = e−x , 0 ≤ x ≤ 3, em torno do eixo x, tem
parametrização ~r(x, θ) = (x, e−x cos θ, e−x senθ), 0 ≤ x ≤ 3, 0 ≤ θ ≤ 2π.

Seja S uma superfı́cie de parametrização ~r(u, v). Como podemos determinar um vetor tangente a S num
ponto ~r(u0 , v0 )? Isso pode ser feito obtendo um vetor tangente a uma curva simples contida na superfı́cie e
que passe nesse ponto.

Figura 2.1.3: Um vetor tangente a S em P0

Podemos considerar a curva obtida percorrendo a superfı́cie ~r(u, v) variando u mas fazendo v = v0
constante. Obtemos uma curva ~r(t, v0 ), com parâmetro t = u. Para obter um vetor tangente, tomamos a
∂r
sua derivada, ou seja, (u0 , v0 ). Outra curva é obtida fazendo u = u0 constante e variando v, cujo vetor
∂u
∂r
tangente é (u0 , v0 ). Essas curvas obtidas mantendo um dos parâmetros constantes e variando o outro são
∂v
chamadas de curvas da grade.
O plano tangente a S no ponto P0 = ~r(u0 , v0 ) é o conjunto dos vetores tangentes a S nesse ponto. Se os
vetores ~ru (u0 , v0 ) e ~rv (u0 , v0 ) não forem paralelos (ou seja, se ~ru ∧ ~rv 6= ~0), então esses vetores formam uma
base para o plano tangente em P0 . Nesse caso, diremos que S é uma superfı́cie lisa. Um vetor normal ao
plano é ~n = ~ru ∧ ~rv .
Exemplo 2.1.8. Determine uma equação para o plano tangente à superfı́cie de parametrização ~r(u, v) =
(u + v, 3u2 , u − v) no ponto (2, 3, 0).
Solução. O ponto (2, 3, 0) é obtido quando u + v = 2, 3u2 = 3 e u − v = 0, ou seja, quando u = 1 e v = 1.
Temos ~ru (u, v) = (1, 6u, 1) e ~rv (u, v) = (1, 0, −1), logo ~ru (1, 1) = (1, 6, 1) e ~rv (1, 1) = (1, 0, −1). Portanto
um vetor normal é
(1, 6, 1) ∧ (1, 0, −1) = (−6, 2, −6).
Daı́, uma equação para o plano tangente é
−6(x − 2) + 2(y − 3) − 6(z − 0) = 0 ⇒ −6x + 2y − 6z = −6 ou 3x − y + 3z = 3 .

Exemplo 2.1.9. Determine uma equação para o plano tangente à superfı́cie de parametrização ~r(u, v) =
(u2 , v 2 , uv) no ponto P = ~r(1, 1).
Solução. Temos P = ~r(1, 1) = (1, 1, 1), ~ru (u, v) = (2u, 0, v) e ~rv (u, v) = (0, 2v, u), logo ~ru (1, 1) = (2, 0, 1) e
~rv (1, 1) = (0, 2, 1). Com isso, u vetor normal ao plano é
(2, 0, 1) ∧ (0, 2, 1) = (−2, −2, 4).
Assim, uma equação para o plano tangente é
−2(x − 1) − 2(y − 1) + 4(z − 1) = 0 ⇒ −2x − 2y + 4z = 0 ou x + y − 2z = 0 .
38 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

2.2 Áreas de Superfı́cies

Nesta seção vamos obter uma expressão para a área da superfı́cie S dada pela parametrização ~r(u, v),
onde (u, v) está em uma região D do plano, a qual vamos supor retangular: D = [a, b] × [c, d]. Particionamos
os intervalos [a, b] e [c, d], como de costume, dividindo o retângulo D em vários sub-retângulos, que são
levados por ~r em um pedaço quase retangular de S, o qual chamaremos de retalho.

Figura 2.2.1: Os retalhos na superfı́cie

Na figura da direita, o vetor vermelho é ~r(u0 + ∆u, v0 ) − ~r(u0 , v0 ). Observe que se ∆u for pequeno, então
~ru (u0 , v0 ) é aproximadamente igual a
~r(u0 + ∆u) − ~r(u0 , v0 )
,
∆u
logo o vetor vermelho é aproximadamente igual a ~ru (u0 , v0 )∆u, se ∆u for pequeno. Analogamente, o vetor
laranja pode ser aproximado por ~rv (u0 , v0 )∆v se ∆v for pequeno. Assim, a área do retalho verde pode ser
aproximada pela área do paralelogramo de lados ~ru ∆u e ~rv ∆v. Logo,
X ZZ
A(S) = lim ||~ru ∧ ~rv ||∆u∆v = ||~ru ∧ ~rv ||dA.
∆u,∆v→0
D

Isso nos leva à definição:

Definição 2.2.1. A área de uma superfı́cie lisa S, de parametrização ~r(u, v), com (u, d) ∈ D, é dada por
ZZ
A(S) = ||~ru ∧ ~rv ||dA. (2.2.1)
D

Exemplo 2.2.1. Calcule a área da parte do plano x + 2y + z − 4 que está dentro do cilindro x2 + y 2 = 4.
2.2. ÁREAS DE SUPERFÍCIES 39

Solução. Temos ~r(x, y) = (x, y, 4 − x − 2y), logo ~rx = (1, 0, −1) e ~ry = (0, 1, −2). Daı́,

~rx ∧ ~ry = (−1, 2, 1),



logo ||~rx ∧ ~ry || = 6. A área é igual a
ZZ √ √ ZZ √
6dA = 6 dA = 6A(D),
D D

onde D é o cı́rculo x2 + y 2 ≤ 4, cuja área é 4π. Logo,



A(S) = 4π 6 .

Exemplo 2.2.2. Determine a área da superfı́cie de uma esfera de raio R.


Solução. Uma parametrização é

~r(φ, θ) = (R senφ cos θ, R senφ senθ, R cos φ),

com (φ, θ) ∈ [0, π] × [0, 2π]. Temos

~rφ = (R cos φ cos θ, R cos φ senθ, −R senφ) e ~rθ = (−R senφ cos θ, R senφ cos θ, 0),

logo após algumas contas vemos que

~rφ ∧ ~rθ = (R2 sen2 φ cos θ, R2 sen2 φ senθ, R2 senφ cos φ).

Após mais algumas contas concluı́mos que

||~rφ ∧ ~rθ || = R2 senφ .

Logo,
ZZ
A= ||~rφ ∧ ~rθ ||dA
D
Z 2π Z π
= R2 senφdφdθ
0 0
Z 2π Z π
= R2 dθ senφdφ
0 0
= R2 · 2π(− cos φ)π0
= −2πR2 (cos π − cos 0)
= 4πR2 .

Exemplo 2.2.3. Calcule a área da parte do paraboloide hiperbólico z = y 2 − x2 que está entre os cilindros
x2 + y 2 = 1 e x2 + y 2 = 4.
Solução. Temos ~r(x, y) = (x, y, y 2 − x2 ), onde (x, y) pertence à coroa circular 1 ≤ x2 + y 2 ≤ 4. Temos
~rx = (1, 0, −2x) e ~ry = (0, 1, 2y), logo
~rx ∧ ~ry = (−2x − 2y, 1).
p
Daı́, ||~rx ∧ ~ry || = 4x2 + 4y 2 + 1.
40 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

Assim, ZZ p
A= 4x2 + 4y 2 + 1dA.
D

Usando coordenadas polares x = r cos θ, y = r senθ, 1 ≤ r ≤ 2 e 0 ≤ θ ≤ 2π, temos


Z 2π Z 2 p Z 2π Z 2 p Z 2π Z 2 p
A= 2 2 2 2
4r cos θ + 4r sen θ + 1rdrdθ = 2
4r + 1rdrdθ = dθ 4r2 + 1rdr.
0 1 0 1 0 1

A primeira integral vale 2π, enquanto a segunda usa a substituição u = 4r2 + 1, logo du = 8rdr, e então
√ 17 √ √
17
π √ 3 √ 5  π(17 17 − 5 5)
Z
u 1 2 3/2
A = 2π du = 2π u = 17 − 5 = .
5 8 83 5 6 6

Vejamos uma outra forma de calcular dS, que não envolva o produto vetorial. Sabemos que

dS = ||~ru ∧ ~rv ||dA.

Seja θ o ângulo entre ~ru e ~rv . Então sen2 θ + cos2 θ = 1, mas sabemos da Geometria Analı́tica que

||~ru ∧ ~rv || ~ru · ~rv


senθ = e cos θ = .
||~ru ||||~rv || ||~ru ||||~rv ||

Assim,
||~ru ∧ ~rv ||2 (~ru · ~rv )2
2 2
+ = 1.
||~ru || ||~rv || ||~ru ||2 ||~rv ||2
Fazendo E = ||~ru ||2 = ~ru · ~ru , F = ~ru · ~rv e G = ||~rv ||2 = ~rv · ~rv e arrumando a expressão acima, podemos
escrever
p
||~ru ∧ ~rv || = EG − F 2 .
Logo, p
dS = EG − F 2 dA (2.2.2)
Essa é uma fórmula mais prática de calcular o dS, pois é dada apenas em termos do produto escalar.

2.3 Integrais de Superfı́cie

2.3.1 Integrais de Superfı́cie de Funções Reais

De forma análoga à que fizemos para construir a integral de linha de uma função real em relação ao com-
primento de arco, podemos construir a integral de superfı́cie. Seja S uma superfı́cie lisa com parametrização
~r(u, v), com (u, v) ∈ D, e f uma função cujo domı́nio contém S. Então:
ZZ ZZ
f (x, y, z)dS = f (~r(u, v))||~ru ∧ ~rv ||dA (2.3.1)
S D

ZZ
Exemplo 2.3.1. Calcule x2 yzdS, onde S é a parte do plano z = 1+2x+3y que está acima do retângulo
S
[0, 3] × [0, 2].
2.3. INTEGRAIS DE SUPERFÍCIE 41

Solução. A parametrização de S pode ser dada por

~r(x, y) = (x, y, 1 + 2x + 3y).

O conjunto D é o retângulo [0, 3] × [0, 2]. Temos ~rx = (1, 0, 2) e ~ry = (0, 1, 3), logo usando a fórmula 2.2.2
temos E = ~rx · ~rx = 5, F = ~rx · ~ry = 6 e G = ~ry · ~ry = 10, portanto

p √
dS = EG − F 2 = 14dA.

Logo,

ZZ Z 2 Z 3 √
x2 yzdS = x2 y(1 + 2x + 3y) 14dxdy
0 0
S
Z 2 Z 3 √
= (x2 y + 2x3 y + 3x2 y 2 ) 14dxdy
0 0
x=3
√ 2
x3 y 2x4 y
Z 
3 2
= 14 + +x y dy
0 3 4 x=0
√ Z 2
 
81y
= 14 9y + + 27y 2 dy
0 2
2

 2
9y 81y 2 27y 3
= 14 + +
2 4 3 0

= 171 14 .

ZZ
Exemplo 2.3.2. Calcule x2 z 2 dS, onde S é a parte do cone z 2 = x2 + y 2 que está entre os planos z = 1
S
e z = 3.

Solução. Uma parametrização é


p
~r1 (x, y) = (x, y, x2 + y 2 ),

com 1 ≤ x2 + y 2 ≤ 9. Uma outra parametrização mais agradável é

~r(s, θ) = (s cos θ, s senθ, s),

com 0 ≤ θ ≤ 2π e 1 ≤ s ≤ 3. Usaremos a segunda opção, que nos fornece ~rs = (cos θ, senθ, 1) e ~rθ =
(−s senθ, s cos θ, 0), logo E = ~rs · ~rs = 2, F = ~rs · ~rθ = 0 e G = ~rθ · ~rθ = s2 , de modo que a fórmula 2.2.2 nos
dá

dS = s 2dA

.
42 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

Daı́,
ZZ
2 2
ZZ √
x y dS = (s2 cos2 θ)(s2 )(s 2)dA
S D
√ Z 2π Z 3
= 2 s5 cos2 θdsdθ
0 1
√ Z 3
5
Z 2π
= 2 s ds cos2 θdθ
1 0
√ Z 3
1 + cos(2θ)
5
Z 2π
= 2 s ds dθ
1 0 2
√ s6 3 θ
 2π
sen(2θ)
= 2 +
6 1 2 4 0
√ (36 − 1)
= 2 π.
6

ZZ
Exemplo 2.3.3. Calcule xydS, onde S é a fronteira da região sólida limitada pelo cilindro x2 + z 2 = 1
S
e pelos planos y = 0 e x + y = 2.

Solução. A superfı́cie S é formada pelos pedaços S1 , S2 e S3 indicados na Figura 2.3.1 abaixo. Vamos
calcular a integral em cada pedaço e somar os resultados obtidos.

Figura 2.3.1: Um cilindro truncado

A superfı́cie S1 tem parametrização

~r(θ, y) = ( senθ, y, cos θ),

com 0 ≤ θ ≤ 2π e 0 ≤ y ≤ 2 − x = 2 − senθ. Temos que ~rθ = (cos θ, 0, − senθ) e ~ry = (0, 1, 0), portanto
E = ~rθ · ~rθ = 1, F = ~rθ · ~ry = 0 e G = ~ry · ~ry = 1, logo

dS = 1dA.
2.3. INTEGRAIS DE SUPERFÍCIE 43

Daı́,
ZZ Z 2π Z 2− senθ
xydS = senθydydθ
0 0
S1
2π 2− senθ
y 2
Z
= senθ dθ
0 2 0
Z 2π
1
= senθ(2 − senθ)2 dθ
2 0
Z 2π  
1
= 2
2 senθ − 2 sen θ + sen3 θ
0 2
Essa última integral pode ser dividida em três, que calculamos a seguir:
Z 2π
senθdθ = − cos θ|2π
0 = −(cos(2π) − cos(0)) = 0. (2.3.2)
0
Z 2π Z 2π 2π 
2 sen(2θ)
−2 sen θdθ = − (1 − cos(2θ))dθ = − θ − = −2π. (2.3.3)
0 0 2 0
Z 2π Z 2π Z 2π Z 1
3 2 2
sen θdθ = sen θ senθdθ = (1 − cos θ) senθdθ = (u2 − 1)du = 0, (2.3.4)
0 0 0 1
onde fizemos a substituição u = cos θ.
Usando os resultados de (2.3.2), (2.3.3) e (2.3.4), obtemos
ZZ
xydS = −2π .
S1

A superfı́cie S2 tem parametrização ~r(x, z) = (x, 2 − x, z), onde x2 + z 2 ≤ 1. Temos ~rx = (1, −1, 0) e
~rz = (0, 0, 1), logo E = 2, F = 0 e G = 1, de modo que

dS = 2dA.

Daı́, usando coordenadas polares, temos


ZZ ZZ √
xydS = x(2 − x) 2dA
S2 D
√ Z 2π Z 1
= 2 (2r senθ − r2 sen2 θ)rdrdθ
0 0
√ Z 2π Z 1
= 2 (2r2 senθ − r3 sen2 θ)drdθ
0 0
r=1
√ Z 2π
2r3 senθ r4 sen2 θ

= 2 − dθ
0 3 4 r=0
√ Z 2π 2
 
1
= 2 senθ − sen2 θ dθ
0 3 4
!
√ 2 Z 2π 1 2π
Z
= 2 senθdθ − sen2 θdθ
3 0 4 0

π 2
= −
4

por (2.3.2) e (2.3.3).


44 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

Finalmente, na superfı́cie S3 temos y = 0, logo


ZZ
xydS = 0 .
S3

Daı́, somando os três resultados obtidos, concluı́mos que


ZZ √
π 2
xydS = −2π − .
4
S

2.3.2 Orientação de Superfı́cies

Para definirmos integrais de superfı́cie de campos vetoriais precisamos considerar superfı́cies orientadas.
Orientar uma superfı́cie significa dizer, intuitivamente, qual é o seu “lado de cima”. Existem superfı́cies em
que isso não é possı́vel: a faixa de Möbius é o exemplo mais conhecido. Para construir uma faixa de Möbius,
pegue uma tira de papel retangular e comprida, dê meia volta em um dos lados e cole as extremidades, como
na Figura 2.3.2 a seguir.

Figura 2.3.2: Faixa de Möbius

Se uma partı́cula se deslocasse sobre a faixa de Möbius, ela poderia passar do lado de dentro para o lado
de fora sem cruzar nenhuma borda. Em outras palavras, essa superfı́cie só tem um lado.
Para uma superfı́cie orientável S, de parametrização ~r(u, v), uma parametrização natural é dada pelo
versor normal
~ru ∧ ~rv
~n = .
||~ru ∧ ~rv ||
O lado de cima é o lado para o qual ~n aponta. No caso de S ser fechada, a orientação positiva é convencionada
como sendo aquela em que ~n aponta para fora de S.

2.3.3 Integrais de Superfı́cie de Campos Vetoriais


2.3. INTEGRAIS DE SUPERFÍCIE 45

Definição 2.3.1. A integral de superfı́cie de um campo vetorial F~ sobre uma superfı́cie S, de parametrização
~r(u, v), com (u, v) ∈ D, é dada pela integral de superfı́cie da componente normal de F~ , isto é, F~ · ~n, que é
uma função real.
Assim,
~ru ∧ ~rv
ZZ ZZ ZZ
F~ · dS
~= F~ · ~ndS = F~ (~r(u, v)) · ||~ru ∧ ~rv ||dA.
||~ru ∧ ~rv ||
S S D
Portanto, obtemos a fórmula
ZZ ZZ
F~ · dS
~= F~ (~r(u, v)) · (~ru ∧ ~rv )dA (2.3.5)
D
S

A integral de superfı́cie de um campo F~ é também conhecida como o fluxo de F~ através de S, pois mede
como o campo “perfura” a superfı́cie S. Em Eletrostática, por exemplo, a integral de superfı́cie aparece na
Lei de Gauss:
Teorema 2.3.1 (Lei de Gauss). A carga contida por uma superfı́cie S é dada por
ZZ
Q = 0 E~ · dS,
~
S

~ é o campo
onde 0 é a permissividade do váculo, que vale aproximadamente 0 ≈ 8, 85 · 10−12 C 2 /N m2 , e E
elétrico.
Exemplo 2.3.4. Calcule o fluxo de F~ (x, y, z) = (xy, yz, zx) através da parte do paraboloide z = 4 − x2 − y 2
que está acima do quadrado 0 ≤ x ≤ 1, 0 ≤ y ≤ 1, com orientação para cima.
Solução. Começamos parametrizando S por
~r(x, y) = (x, y, 4 − x2 − y 2 ).
Logo, ~rx = (1, 0, −2x) e ~ry = (0, 1, −2y). Temos
~rx ∧ ~ry = (2x, 2y, 1).
Como a componente z desse vetor é positiva, isso significa que ele aponta para cima e a orientação está
correta.
Assim,
ZZ ZZ
~ ~
F · dS = F~ (~r(x, y)) · (~rx ∧ ~ry )dA
S D
Z 1 Z 1  
= xy, y(4 − x2 − y 2 ), x(4 − x2 − y 2 ) · (2x, 2y, 1)dxdy
0 0
Z 1 Z 1
= (2x2 y + 8y 2 − 2x2 y 2 − 2y 4 + 4x − x3 − xy 2 )dxdy
0 0
1 1
2x3 y 2x3 y 2 x4 x2 y 2
Z 
= + 8xy 2 − − 2xy 4 + 2x2 − − dy
0 3 3 4 2 0
Z 1 2 2

2y 2y 1 y
= + 8y 2 − − 2y 4 + 2 − − dy
0 3 3 4 2
 2 1
y 8y 3 2y 3 2y 5 y y3
= + − − + 2y − −
3 3 9 5 4 6 0
1 8 2 2 1 1
= + − − +2− −
3 3 9 5 4 6
713
= .
180
46 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES
ZZ
F~ · dS,
~ onde F~ (x, y, z) = (x, y, z 4 ) e S é a parte do cone z =
p
Exemplo 2.3.5. Calcule x2 + y 2 abaixo
S
do plano z = 1, orientada para baixo.
Solução. Já vimos no Exemplo 2.3.2 que o cone pode ser parametrizado por

~r(s, θ) = (s cos θ, s senθ, s),

com 0 ≤ s ≤ 1 e 0 ≤ θ ≤ 2π. Temos ~rs = (cos θ, senθ, 1) e ~rθ = (−s senθ, s cos θ, 0), portanto

~rs ∧ ~rθ = (−s cos θ, −s senθ, s).

Como 0 ≤ s ≤ 1, a componente z é não-negativa, portanto essa parametrização induz a orientação para


cima. Logo, devemos usar o vetor (s cos θ, s senθ, −s), ou então fazer a conta com o primeiro vetor e lembrar
de trocar o sinal da integral no final dos cálculos.
Assim,
ZZ ZZ
F~ · dS
~= (s cos θ, s senθ, s4 ) · (s cos θ, s senθ, −s)dA
S D
Z 2π Z 1
= (s2 cos2 θ + s2 sen2 θ − s5 )dsdθ
0 0
Z 2π Z 1
= dθ (s2 − s5 )ds
0 0
1
s3 s6

= 2π −
3 6 0
 
1 1
= 2π −
3 6
π
= .
3

Exemplo 2.3.6. Use a Lei de Gauss para calcular a carga contida no hemisfério sólido x2 + y 2 + z 2 ≤ a2 ,
~
z ≥ 0, se o campo elétrico é E(x, y, z) = (x, y, 2z).
Solução. A fronteira do hemisfério é S = S1 ∪ S2 , onde S1 e S2 são, respectivamente, a parte esférica a
parte plana, como na Figura 2.3.3.
Pela Lei de Gauss, ZZ
Q = 0 ~ · dS.
E ~
S
Temos que calcular o fluxo do campo elétrico sobre S1 e S2 , lembrando que como S é fechada, a orientação
positiva é para fora.
Sobre S2 , que está contida no plano z = 0, a parametrização é ~r(x, y) = (x, y, 0) e podemos usar
~n = (0, 0, −1). Logo,
ZZ ZZ ZZ
~ · dS
E ~= E~ · ~ndS
~= ~= 0.
(x, y, 0) · (0, 0, −1)dS
S2 S2 S2

Sobre S1 , a parametrização é

~r(φ, θ) = (a senφ cos θ, a senφ senθ, a cos φ),

com 0 ≤ φ ≤ π/2 e 0 ≤ θ ≤ 2π. Usando cálculos já feitos no Exemplo 2.2.2, temos

~rφ ∧ ~rθ = (a2 sen2 φ cos θ, a2 sen2 φ senθ, a2 senφ cos φ).
2.3. INTEGRAIS DE SUPERFÍCIE 47

Figura 2.3.3: Um hemisfério sólido

Como φ ∈ [0, π/2], temos que senφ ≥ 0 e cos φ ≥ 0, logo a componente z desse vetor aponta para cima, ou
seja, para fora de S.
Daı́,

Assim,
ZZ ZZ ZZ 3
~ · dS
E ~= ~ · dS
E ~+ ~ = 8πa ,
~ · dS
E
3
S S1 S2

portanto
8πa3 0
Q= .
3

2.3.4 Mais Exemplos

Também podemos calcular massas usando integrais de superfı́cie. Se a densidade for dada por ρ(x, y, z),
então a massa da superfı́cie S é ZZ
m= ρdS.
S

Além disso, o centro de massa tem coordenadas (xCM , yCM , zCM ) dadas por
ZZ ZZ ZZ
xCM = xρdS, yCM = yρdS e zCM = zρdS.
S S S

Exemplo 2.3.7. Calcule a massa da superfı́cie S de parametrização ~r(u, v) = (u cos v, u senv, u), u ∈ [1, 3],
v ∈ [0, π/2], sabendo que a densidade em cada ponto é ρ(x, y, z) = x2 y 2 .
2
Solução.
√ Temos ~ru = (cos v, senv, 1) e ~rv = (−u senv, u cos v, 0), de modo que E = 2, F = 0 e G = u . Daı́,
dS = u 2dA. Com isso, temos
48 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

ZZ
m= ρdS
S
Z π/2 Z 3 √
= u2 cos2 vu2 sen2 vu 2dudv
0 1
√ Z π/2
2
Z 3
= 2 (cos v senv) dv u5 du
0 1
√ Z π/2
sen2 (2v)
Z 3
= 2 dv u5 du
0 4 1
√ Z π/2
1 − cos(4v)
Z 3
= 2 dv u5 du
0 8 1
 π/2 6 3
sqrt2 sen(4v) u
= v−
8 4 0 6 1
√ 6
π 2(3 − 1)
=
96

91π 2
= .
12

Exemplo 2.3.8. Chamamos de toro a superfı́cie obtida pela rotação ao redor do eixo z da circunferência
(y − b)2 + z 2 = a2 , x = 0. Se a < b, ela pode ser parametrizada por

 x = (b + a cos θ) cos φ
~r(θ, φ) = y = (b + a cos θ) senφ ,
z = a senθ

com θ, φ ∈ [0, 2π]. Calcule a área dessa superfı́cie.

Solução. Temos que ~rθ = (−a senθ cos φ, −a senθ senφ, a cos θ) e ~rφ = (−(b+a cos θ) senφ, (b+a cos θ) cos φ, 0).
Logo, após algumas contas podemos ver que E = a2 , F = 0 e G = (b + a cos θ)2 , portanto
p
dS = EG − F 2 dA = (ab + a2 cos θ)dA.

Assim, temos
ZZ
A(S) = dS
S
Z 2π Z 2π
= (ab + a2 cos θ)dφdθ
0 0
Z 2π Z 2π
= dφ (ab + a2 cos θ)dθ
0 0

= 2π(abθ + a2 senθ)

0
2
= 4π ab .
2.4. ROTACIONAL E DIVERGENTE 49

Figura 2.3.4: Um toro

Exemplo 2.3.9. Considere a superfı́cie S parametrizada por

~r(u, v) = (u, v, 1 − u2 ),

com u > 0, v > 0 e u + v < 1. Calcule o fluxo do campo F~ (x, y, z) = (1, xyz, −2x) através de S, em relação
ao campo normal que aponta para baixo.

Solução. Temos ~ru = (1, 0, −2u) e ~rv = (0, 1, 0), logo

~ru ∧ ~rv = (2u, 0, 1),

que aponta para cima já que sua componente z é positiva. Assim devemos considerar o vetor (−2u, 0, −1),
no cálculo da integral, que fazemos a seguir:

ZZ ZZ
F~ · dS
~= (1, uv(1 − u2 ), −2u) · (−2u, 0, −1)dA
S
ZDZ
= (−2u + 2u)dA
D

= 0,

onde D é o domı́nio dos parâmetros, que é dado por

D = {(u, v) : u > 0, v > 0, u + v < 1}.

2.4 Rotacional e Divergente

Nesta seção apresentamos duas operações entre campos vetoriais que são muito importantes nos Teoremas
que veremos a seguir. Uma delas produz outro campo vetorial, enquanto a outra produz uma função escalar.
50 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

Definição 2.4.1 (Rotacional). Se F~ = (P, Q, R) é um campo vetorial em R3 , então o rotacional de F~ é o


campo vetorial em R3 definido por
 
~ ∂R ∂Q ∂P ∂R ∂Q ∂P
rot F = − , − , − .
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y

Para obtermos uma forma mais simples de memorizar esta fórmula, vamos considerar o operador dife-
rencial ∇:  
∂ ∂ ∂
∇= + + ,
∂x ∂y ∂z
que quando opera sobre uma função real f produz seu gradiente:
 
∂f ∂f ∂f
∇f = + + .
∂x ∂y ∂z

Assim, o operador ∇, ao atuar sobre uma função f , produz seu gradiente. Pensando no operador ∇ como
um vetor, podemos calcular seu produto vetorial com o campo F~ :

~i ~j ~k

∇ ∧ F~ = ∂x ∂y
∂ ∂


∂z
P Q R
 
∂R ∂Q ∂P ∂R ∂Q ∂P
= − , − , −
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y
~
= rot F .

Obtemos então a fórmula


rot F~ = ∇ ∧ F~ , (2.4.1)
que certamente é mais simples de ser memorizada.
Exemplo 2.4.1. Se F~ (x, y, z) = (x2 yz, xy 2 z, xyz 2 ), determine rot F~ .
Solução. Pela fórmula (2.4.1), temos

~i ~j ~k


~ = (xz 2 − xy 2 , x2 y − yz 2 , y 2 z − x2 z).
∂ ∂ ∂

rot F = ∂x

∂y ∂z
x2 yz xy 2 z xyz 2

Dada uma função real f de três variáveis, sabemos que seu gradiente é um campo vetorial em R3 . É isso
o que fazemos no Teorema a seguir:
Teorema 2.4.1. Se f é uma função real de três variáveis que tem derivadas parciais de segunda ordem
contı́nuas, então rot ∇f = ~0.
Demonstração. Pela fórmula (2.4.1), temos

~i
~j ~k
∂ ∂ ∂
rot ∇f = ∂x ∂y ∂z
∂f ∂f ∂f
∂x ∂y ∂z
 2
∂2f ∂2f ∂2f ∂2f

∂ f ∂f
= − , − , −
∂y∂z ∂z∂y ∂z∂x ∂x∂z ∂x∂y ∂y∂x
= (0, 0, 0) = ~0

pelo Teorema de Clairaut.


2.4. ROTACIONAL E DIVERGENTE 51

Como todo campo conservativo é da forma F~ = ∇f , uma consequência direta do Teorema 2.4.1 é o

Corolário 2.4.2. Se F~ é um campo vetorial em R3 conservativo, então rot F~ = ~0.

Exemplo 2.4.2. Mostre que o campo vetorial F~ (x, y, z) = (xz, xyz, −y 2 ) não é conservativo.

Solução. Vamos calcular rot F~ . Pela fórmula (2.4.1), temos

~i ~j ~k

 
rot F~ = ∂x
∂ ∂ ∂

= − y(2 + x), x, yz ,
∂y ∂z
xz xyz −y 2

portanto pelo Teorema 2.4.1, F~ não é conservativo.

Mais uma vez, o leitor deve entender bem o conteúdo do Teorema 2.4.1 e de seu Corolário. Eles afirmam
que se F~ é um campo conservativo, então seu rotacional é igual a ~0. Em outras palavras, se rot F~ 6= ~0,
então F~ não é conservativo, como fizemos no Exemplo acima. A recı́proca do Teorema 2.4.1, em geral, não é
verdadeira, mas quando F~ está definido em uma região aberta e simplesmente conexa de R3 , ela vale. Este
resultado é a versão tridimensional do Teorema 1.6.5, e para efeito de completude, o enunciamos a seguir.
Sua demonstração, no entanto, só poderá ser feita após estudarmos o Teorema de Stokes.

Teorema 2.4.3. Se F~ for um campo vetorial cujo domı́nio é uma região aberta e simplesmente conexa de
R3 e rot F~ = ~0, então F~ é conservativo.

Exemplo 2.4.3. Mostre que F~ (x, y, z) = (y 2 z 3 , 2xyz 3 , 3xy 2 z 2 ) é um campo conservativo.

Solução. Temos
~i ~j ~k


rot F~ = ∂x
∂ ∂ ∂

= (0, 0, 0),
∂y ∂z
y2 z3 2xyz 3 2 2
3xy z

logo F~ é conservativo pois seu domı́nio é todo o R3 , que é aberto e simplesmente conexo.

A razão para o nome rotacional” pode ser encontrada na Mecânica dos Fluidos. Vamos supor que F~
representa um campo de velocidades. As partı́culas próximas de (x, y, z) no fluido tendem a girar em torno
do eixo que aponta na direção de rot F~ , e a norma desse vetor nos indica a velocidade com que essa rotação
acontece. Quando rot F~ = ~0 em um ponto P , então não há rotações no ponto P (por exemplo, não se forma
nenhum redemoinho nesse ponto) e o fluido é dito irrotacional em P .
Vamos agora estudar a segunda operação importante desta seção.

Definição 2.4.2 (Divergente). Se F~ = (P, Q, R) é um campo vetorial em R3 , então o divergente de F~ é a


função real
∂P ∂Q ∂R
div F~ = + + .
∂x ∂y ∂z
Novamente, em termos do operador gradiente
 
∂ ∂ ∂
∇= , , ,
∂x ∂y ∂z

podemos escrever
div F~ = ∇ · F~ .

Exemplo 2.4.4. Se F~ (x, y, z) = ( sen(yz), sen(zx), sen(xy)), calcule div F~ .


52 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

Solução. Temos P (x, y, z) = sen(yz), Q(x, y, z) = sen(zx) e R(x, y, z) = sen(xy), logo

∂P ∂Q ∂R
div F~ = + + = 0.
∂x ∂y ∂z

Se F~ é um campo vetorial sobre R3 , então rot F~ também é um campo vetorial em R3 , portanto podemos
calcular seu divergente. É isso que fazemos no Teorema a seguir.

Teorema 2.4.4. Se F~ = (P, Q, R) é um campo vetorial em R3 e P , Q e R possuem derivadas parciais de


segunda ordem contı́nuas, então div rot F~ = 0.

Demonstração. Temos

div rot F~ = ∇ · (∇ ∧ F~ )
     
∂ ∂R ∂Q ∂ ∂P ∂R ∂ ∂Q ∂P
= − + − + −
∂x ∂y ∂z ∂y ∂z ∂x ∂z ∂x ∂y
2 2 2 2 2 2
∂ R ∂ Q ∂ P ∂ R ∂ Q ∂ P
= − + − + −
∂x∂y ∂x∂z ∂y∂z ∂y∂x ∂z∂x ∂z∂y
= 0,

novamente pelo Teorema de Clairaut.

Exemplo 2.4.5. Mostre que o campo vetorial F~ (x, y, z) = (xz, xyz, −y 2 ) não pode ser escrito como o
rotacional de outro campo vetorial.

Solução. Se fosse verdade que F~ = rot G


~ para algum campo vetorial G,
~ então o Teorema acima garante que

div F~ = div rot G


~ = 0.

Como div F~ = z + xz 6= 0, concluı́mos que F~ não pode ser o rotacional de outro campo vetorial.

A razão para o nome “divergente” também pode ser encontrada na Mecânica dos Fluidos. Se F~ (x, y, z)
é a velocidade de um fluido em um ponto P = (x, y, z), então div F~ (x, y, z) fornece a taxa de variação, em
relação ao tempo, da massa de fluido que escoa do ponto P por unidade de volume. Assim, div F~ mede a
tendência do fluido de divergir do ponto P . Quando div F~ = 0, dizemos que F~ é incompressı́vel.
Para finalizar esta seção, vamos analisar o Teorema de Green sob o contexto do rotacional e do divergente.

2.4.1 Formas Vetoriais do Teorema de Green

Lembramos que se uma região plana D tem fronteira formada por uma curva fechada e simples C
orientada positivamente, e F~ = (P, Q) é um campo vetorial em R2 cujas componentes P e Q têm derivadas
parciais contı́nuas sobre a curva C e sobre a região D, então
I ZZ  
∂Q ∂P
F~ · d~r = − dA,
C ∂x ∂y
D

pelo Teorema de Green.


Vamos considerar F~ como um campo em R3 cuja terceira componente é nula, isto é,

F~ (x, y, z) = (P (x, y), Q(x, y), 0).


2.4. ROTACIONAL E DIVERGENTE 53

Nesse caso, podemos calcular seu rotacional, obtendo


~i ~j ~k 


∂Q ∂P ~
rot F~ =
∂ ∂


∂x ∂y ∂z
= − k.
P (x, y) Q(x, y) ∂x ∂y
0

Com isso,  
∂Q ∂P ~ ~ ∂Q ∂P
(rot F~ ) · ~k = − k·k = − ,
∂x ∂y ∂x ∂y
portanto podemos reescrever o Teorema de Green na sua primeira forma vetorial:
I ZZ
~
F · d~r = (rot F~ ) · ~kdA .
C
D

Vejamos agora uma outra forma de escrever o Teorema de Green usando o divergente. Suponha que C
tem parametrização
~r(t) = (x(t), y(t)), a ≤ t ≤ b.
Então o vetor tangente unitário a C é dado por
 0
y 0 (t)

x (t)
T~ (t) = , .
||r~0 (t)|| ||r~0 (t)||

É fácil ver que o vetor normal unitário que aponta para fora de C é dado por
 0
y (t) x0 (t)
~n(t) = − .
||r~0 (t)|| ||r~0 (t)||
Então, temos
I Z b
F~ · ~nds = (F~ · ~n)(t)||r~0 (t)||dt
C a
b
P (x(t), y(t))y 0 (t) Q(x(t), y(t))x0 (t) ~0
Z  
= − ||r (t)||dt
a ||r~0 (t)|| ||r~0 (t)||
Z b
= P (x(t), y(t))y 0 (t)dt − Q(x(t), y(t))x0 (t)dt
a
I
= P dy − Qdx
C
ZZ  
∂P ∂Q
= + dA
∂x ∂y
D

pelo Teorema de Green. Observe que o integrando na integral dupla é exatamente div F~ , portanto podemos
escrever a segunda forma vetorial do Teorema de Green:
I ZZ
F~ · ~nds = div F~ (x, y)dA .
C
D

Segundo essa versão, a integral de linha da componente normal de F~ ao longo de C é igual à integral
dupla do divergente de F~ na região delimitada por C.
As formas vetoriais do Teorema de Green já nos ilustram a importância do rotacional e do divergente,
mas veremos realmente o poder desses conceitos nas próximas seções, em que estudaremos os Teoremas de
Stokes e de Gauss (ou da Divergência).
54 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

2.5 Teorema de Stokes

Nesta seção vamos obter uma nova versão do Teorema Fundamental do Cálculo, no contexto das integrais
de superfı́cie. Ela generaliza a primeira forma vetorial do Teorema de Green, estudada na seção anterior.
Dada uma superfı́cie orientada S, com fronteira C, dizemos que as orientações de C e S são compatı́veis se
elas satisfizerem a Regra da Mão Direita, isto é, ao girarmos a mão aberta no sentido percorrido pela curva,
o polegar aponta no sentido do campo normal da superfı́cie.
Teorema 2.5.1 (Stokes). Seja S uma superfı́cie orientada, lisa por partes, cuja fronteira é formada por
uma curva C simples, fechada, lisa por partes e com orientação compatı́vel com a de S. Seja F~ um campo
vetorial cujos componentes tenham derivadas parciais contı́nuas em um aberto de R3 que contenha S. Então
Z ZZ
F~ · d~r = rot F~ · dS
~ (2.5.1)
C
S

Demonstração. Não demonstraremos o Teorema de Stokes em toda a sua generalidade, pois isso requer
Matemática mais avançada do que temos disposição nesse Curso. Entretanto, somos capazes de demonstrar
o caso particular em que S é um gráfico. Suponha então que S é dada por

z = g(x, y), (x, y) ∈ D,

onde g tem derivadas parciais de segunda ordem contı́nuas. Nesse caso, uma parametrização para S é dada
por ~r(x, y) = (x, y, g(x, y)), com (x, y) ∈ D. Nesse caso,
   
∂z ∂z
~rx = 1, 0, e ~ry = 0, 1, .
∂x ∂y

Daı́,
~i ~j ~k


∂z
~rx ∧ ~ry = 1 0 ∂x ,
0 1 ∂z
∂y

o que nos dá a fórmula  


∂z ∂z
~rx ∧ ~ry = − ,− ,1 . (2.5.2)
∂x ∂y
Assim, lembrando que  
∂R ∂Q ∂P ∂R ∂Q ∂P
rot F~ = − , − , − ,
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y
a integral de superfı́cie no Teorema de Stokes pode ser calculada fazendo
ZZ ZZ
rot F~ · dS
~= rot F~ · ~rx ∧ ~ry dA
S D
ZZ    
∂R ∂Q ∂P ∂R ∂Q ∂P ∂z ∂z
= − , − , − · − , − , 1 dA
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y ∂x ∂y
D
ZZ "      #
∂R ∂Q ∂z ∂P ∂R ∂z ∂Q ∂P
= − − − − + − dA,
∂y ∂z ∂x ∂z ∂x ∂y ∂x ∂y
D

onde as derivadas parciais de P , Q e R são calculadas em (x, y, g(x, y)).


Suponha também que a curva C1 , projeção de C sobre o plano xy e fronteira da região D, como na Figura
2.5.1, tem parametrização x = x(t), y = y(t), a ≤ t ≤ b. Nesse caso, a curva C pode ser parametrizada por
x = x(t), y = y(t) e z = g(x(t), y(t)), a ≤ t ≤ b.
Dessa forma, a integral de linha do Teorema de Stokes pode ser calculada da seguinte forma
2.5. TEOREMA DE STOKES 55

Figura 2.5.1: Curvas C e C1

Z Z b
F~ · d~r = (P x0 (t) + Qy 0 (t) + Rz 0 (t))dt
C a
Z b"  #
0 0 ∂z 0 ∂z 0
= P x (t) + Qy (t) + R x (t) + y (t) dt (Pela Regra da Cadeia)
a ∂x ∂y
Z b "    #
∂z 0 ∂z 0
= P +R x (t) + Q + R y (t) dt
a ∂x ∂y
Z    
∂z ∂z
= P +R dx + Q + R dy
C1 ∂x ∂y
ZZ "    #
∂ ∂z ∂ ∂z
= Q+R − P +R dA (Pelo Teorema de Green)
∂x ∂y ∂y ∂x
D
∂2z
ZZ 
∂Q ∂Q ∂z ∂R ∂z ∂R ∂z ∂z
= + + + +R
∂x ∂z ∂x ∂x ∂y ∂z ∂x ∂y ∂x∂y
D
∂2z

∂P ∂P ∂z ∂R ∂z ∂R ∂z ∂z
− − − − −R dA (Pela Regra da Cadeia)
∂y ∂z ∂y ∂y ∂x ∂z ∂y ∂x ∂y∂x
ZZ "      #
∂R ∂Q ∂z ∂P ∂R ∂z ∂Q ∂P
= − − − − + − dA (Pelo Teorema de Clairaut)
∂y ∂z ∂x ∂z ∂x ∂y ∂x ∂y
D
ZZ
= rot F~ · dS,
~
S

o que completa a demonstração, pelo que vimos acima.


Z
Exemplo 2.5.1. Calcule F~ · d~r, onde F~ (x, y, z) = (−y 2 , x, z 2 ) e C é a curva da interseção do plano
C
y + z = 2 com o cilindro x2 + y 2 = 1, orientada no sentido anti-horário quando vista de cima.
Solução. Temos rot F~ = (0, 0, 1 + 2y). Para usar o Teorema de Stokes, precisamos de uma superfı́cie S que
tenha C como fronteira, com orientações compatı́veis. Uma possibilidade é a porção do plano y + z = 2
56 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

situada no interior do cilindro x2 + y 2 = 1, com orientação para cima. Uma parametrização de S é ~r(x, y) =
(x, y, 2 − y), e então o campo normal que aponta para cima é ~rx ∧ ~ry = (0, 1, 1). Logo,
Z ZZ
F~ · d~r = rot F~ · dS
~
C
S
ZZ
= (0, 0, 1 + 2y) · (0, 1, 1)dxdy
x2 +y 2 ≤1
ZZ
= (1 + 2y)dxdy
x2 +y 2 ≤1
Z 2π Z 1
= (1 + 2r senθ)rdrdθ (Coordenadas polares)
0 0
Z 2π Z 1
= (r + 2r2 senθ)drdθ
0 0
2π r=1
r2 2r3
Z 
= + senθ dθ
0 2 3 r=0
Z 2π  
1 2
= + senθ dθ
0 2 3
 2π
θ 2
= − senθ
2 3 0
= π.

Z
Exemplo 2.5.2. Calcule F~ · d~r, onde F~ (x, y, z) = (x + y 2 , y + z 2 , z + x2 ) e C é o triângulo de vértices
C
(1, 0, 0), (0, 1, 0) e (0, 0, 1), percorrido no sentido anti-horário quando visto de cima.
Solução. O rotacional de F~ é rot F~ = (−2z, −2x, −2y). Para aplicar o Teorema de Stokes, vamos considerar
a superfı́cie S dada pela parte do plano determinado pelos 3 pontos dados, limitada pelo triângulo. Esse
plano tem equação z = 1 − x − y, e o vetor normal compatı́vel com a orientação de C é (1, 1, 1), pois aponta
para cima. O domı́nio dos parâmetros é a região
D = {(x, y) : 0 ≤ x ≤ 1, 0 ≤ y ≤ 1 − x},
um triângulo retângulo no plano xy. Daı́,
Z ZZ
~
F · d~r = rot F~ · dS
~
C
S
ZZ
= (−2(1 − x − y), −2x, −2y) · (1, 1, 1)dA
D
ZZ
= −2 (x + y + 1 − x − y)dA
D
ZZ
= −2 dA
D

= −2Área(D).
Como D é um triângulo retângulo cujos catetos medem 1, sua área vale 1/2, portanto
Z
F~ · ~r = −1 .
C
2.5. TEOREMA DE STOKES 57

Exemplo 2.5.3. Seja S a superfı́cie formada pelos planos coordenados e limitada inferiormente pela curva C
do Exemplo anterior, com a mesma orientação. Calcule o fluxo do rotacional do campo do Exemplo anterior
através de S, orientada de modo compatı́vel com a curva C.
Solução. Como S tem fronteira orientada C, o Teorema de Stokes garante que
ZZ Z
~ ~
rot F · dS = F~ · d~r = −1
C
S

pelo Exemplo anterior.

Esse fato é muito importante e merece ser registrado. Se S1 e S2 são superfı́cies orientadas com mesma
curva fronteira orientada C e ambas satisfazem as hipóteses do Teorema de Stokes, então
ZZ ZZ
~ ~
rot F · dS = rot F~ · dS.
~ (2.5.3)
S1 S2

~ ~
Z a semelhança com o que estudamos no Capı́tulo 1. Se F = ∇f , ou seja, F é conservativo, vimos
Note
que F~ · d~r = f (B) − f (A), onde C é uma curva de ponto inicial A e ponto final B, ou seja, a integral
C
de linha de F~ era calculada a partir dos valores de f na fronteira de C, os seus extremos, de modo que
a integralZ Znão depende daZ Zcurva (mantendo a mesma orientação). Agora, vimos que se F~ = rot G, ~ então
~ · d~r =
G ~ · dS
rot G ~= F~ · dS
~ para qualquer superfı́cie S que tenha fronteira C, com orientações com-
S S
patı́veis, ou seja, a integral de linha de um rotacional não depende da superfı́cie!
Isso é bastante útil quando queremos integrar sobre uma superfı́cie, mas é mais simples integrar sobre
outra, como veremos no Exemplo a seguir.
ZZ
Exemplo 2.5.4. Calcule rot F~ · dS,
~ onde F~ (x, y, z) = (xyz, xy, x2 yz) e S é formada pelo topo e pelos
S
quatro lados (mas não pelo fundo) do cubo de vértices (±1, ±1, ±1), orientado para fora.
Solução. A superfı́cie está representada na Figura 2.5.2.

Figura 2.5.2: Cubo sem fundo

A fronteira é a curva C formada pelo quadrado de vértices (±1, ±1, −1), orientada no sentido anti-horário
quando visto de cima (note que uma “normal resultante” sobre S aponta para cima). Observe que calcular
58 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES
ZZ
rot F~ · dS
~ diretamente pela definição envolve o cálculo de cinco integrais, portanto é melhor procurar
S
outra saı́da. Z
Pelo Teorema de Stokes, podemos obter a resposta calculando F~ · d~r, mas para isso teremos que
C
resolver quatro integrais. Ao invés disso, vamos considerar S1 , a parte do plano z = −1 limitada por C (com
orientação para cima para ficar compatı́vel com C). Tanto S como S1 possuem mesma fronteira orientada,
logo ZZ ZZ
rot F~ · dS
~= rot F~ · dS,
~
S S1

como vimos. A segunda integral, como veremos, é bem mais simples!


S1 tem parametrização ~r(x, y) = (x, y, −1), logo ~rx ∧~ry = (0, 0, 1), que aponta para cima, como querı́amos.
O rotacional de F~ é rot F~ = (x2 z, −2xyz + xy, y − xz), logo
ZZ ZZ
~ ~
rot F · dS = rot F~ · dS~
S S1
ZZ
= rot F~ (~r(x, y)) · ~rx ∧ ~ry dA
D
Z 1 Z 1
= (−x2 , 3xy, x + y) · (0, 0, 1)dxdy
0 0
Z 1 Z 1
= (x + y)dxdy
0 0
1 x=1
x2
Z 
= + xy dy
0 2 x=−1
Z 1
= 2ydy
0
1
= y2

−1

= 0.

Já mencionamos acima, mas vale a pena ressaltar: esse método de trocar a superfı́cie por outra não vale
para qualquer integral de superfı́cie, apenas quando o campo for um rotacional!
Exemplo 2.5.5. Seja C a curva interseção do cilindro de equação x2 + y 2 = 1 com o paraboloide hiperbólico
z = 2xy.
(a) Parametrize C no sentido anti-horário quando vista de cima.

(b) Calcule o rotacional do campo F~ (x, y, z) = (y + senx, z 2 + cos y, x3 ).


Z
(c) Calcule (y + senx)dx + (z 2 + cos y)dy + x3 dz.
C

Solução. Parametrizamos C fazendo x(t) = cos t, y(t) = sent, pois x e y sempre pertencem a um cilindro
de raio 1 e centro na origem, e daı́ z(t) = 2 cos t sent, 0 ≤ t ≤ 2π. De fato, essa parametrização faz com que
a curva seja percorrida no sentido anti-horário quando vista de cima.
Além disso,
~k

~i ~j
rot F~ = ∂/∂x ∂/∂z = (−2z, −3x2 , −1).

∂/∂y
y + senx z 2 + cos y x3
2.5. TEOREMA DE STOKES 59
Z
A integral é igual a F~ · d~r. Para usar o Teorema de Stokes, precisamos de uma superfı́cie S que tenha
C
C como fronteira e com orientação compatı́vel com a de C, ou seja, com campo normal apontando para cima.
Uma possibilidade é a porção do gráfico de z = 2xy que está no interior do cilindro x2 + y 2 = 1. (Guarde
essa ideia: considerar a superfı́cie S como sendo um gráfico sempre que possı́vel.) Assim, o vetor normal é
dado por (−2y, −2x, 1), que aponta para cima, devido à fórmula (2.5.2). Os parâmetros x e y variam no
cı́rculo x2 + y 2 ≤ 1.
Dessa forma, fazendo z = 2xy no rotacional, obtemos

Z ZZ
F~ · d~r = rot F~ · dS
~
C
S
ZZ
= (−2(2xy), −3x2 , −1) · (−2y, −2x, 1)dxdy
x2 +y 2 ≤1
ZZ
= (8xy 2 + 6x3 − 1)dxdy
x2 +y 2 ≤1
Z 2π Z 1
= (8r3 cos θ sen2 θ + 6r3 cos3 θ − 1)rdrdθ (Coordenadas polares)
0 0
Z 2π Z 1
= (8r4 cos θ sen2 θ + 6r4 cos3 θ − r)drdθ
0 0
2π r=1
8r5 6r5 r2
Z 
2 3
= cos θ sen θ + cos θ − dθ
0 5 5 2 r=0
Z 2π  
8 6 1
= cos θ sen2 θ + cos3 θ − dθ
0 5 5 2
Z 2π  
8 6 1
= cos θ sen2 θ + cos θ(1 − sen2 θ) − dθ
0 5 5 2
Z 2π  
2 2 6 1
= cos θ sen θ + cos θ − dθ
0 5 5 2
2 0 
Z  6 2π Z 2π
2  1
= u du + senθ − dθ (Fizemos u = senθ na primeira integral)

50 5 0 2 0
= −π .

Exemplo 2.5.6. Considere o campo vetorial F~ (x, y, z) = y( senz − 1), 0, 0 e S a porção do paraboloide


z = 1 − x2 − y 2 acima do plano z = 0.

(a) Parametrize a superfı́cie S.

(b) Calcule o fluxo do rotacional de F~ através da superfı́cie S com a normal apontando para cima.

Solução. Basta parametrizar S como gráfico: ~r(x, y) = (x, y, 1 − x2 − y 2 ). Pela fórmula (2.5.2), o campo
normal é dado por (2x, 2y, 1), que aponta para cima, conforme desejado. A fronteira C de S é dada pela
interseção de S com o plano z = 0, que é a circunferência x2 + y 2 = 1, z = 0, e deve ser orientada no sentido
anti-horário quando vista de cima para que fique compatı́vel com S. Para isso, devemos parametrizá-la como
60 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

~r(t) = (cos t, sent, 0), 0 ≤ t ≤ 2π. Assim, vamos usar o Teorema de Stokes:
ZZ Z
rot F~ · dS
~= F~ · d~r
C
S
Z 2π
= F~ (~r(t)) · r~0 (t)dt
0
Z 2π
= (− sent, 0, 0) · (− sent, cos t, 0)dt
0
Z 2π
= sen2 tdt
0
Z 2π
1
= (1 − cos(2t))dt
2 0
 2π
1 sen(2t)
= t−
2 2 0
= π.

Exemplo 2.5.7. Seja S a porção do paraboloide z = x2 + 2y√2 que fica abaixo do plano 4x + 4y − z + 3 = 0.
Considere o campo vetorial F~ (x, y, z) = (− senz cos z − (4 + 2)y, 3 + ln(y 6 + 1), 2y cos2 z).

(a) O que é a fronteira C de S? Parametrize-a.

(b) Parametrizando S como gráfico, qual é a região D em que os parâmetros variam?

(c) Encontre outra superfı́cie limitada cuja fronteira é C e parametrize-a.

(d) Calcule o rotacional de F~ .

(e) Calcule o fluxo do rotacional de F~ através de S, com orientação para cima.

Solução. A fronteira de S é uma elipse. Para obtermos equações que a descrevam, vamos eliminar z no
sistema
z = x2 + 2y 2
z = 4x + 4y + 3
Obtemos x2 + 2y 2 = 4x + 4y + 3. Passando para o outro lado e completando os quadrados, chegamos a

x2 − 4x + 2(y 2 − 2y) = 3 ⇒ (x − 2)2 + 2(y − 1)2 = 9,

logo a projeção da fronteira de C no plano xy tem equação

(x − 2)2 (y − 1)2
+ = 1. (2.5.4)
9 9/2

Essa elipse no plano xy pode ser parametrizada fazendo

3
x(t) = 2 + 3 cos t e y(t) = 1 + √ sent, 0 ≤ t ≤ 2π,
2

3
logo substituindo na equação do plano obtemos z(t) = 4(2 + 3 cos t) + 4 1 + √ sent. Essa parametrização
2
percorre C no sentido anti-horário quando vista de cima, que é a orientação compatı́vel com a desejada para
S.
2.5. TEOREMA DE STOKES 61

Nossos cálculos acima nos permitem descrever a região D como


(x − 2)2 (y − 1)2
 
D = (x, y) : + ≤1 ,
9 9/2

que nada mais é que uma elipse de centro (2, 1), a = 3 e b = 3/ 2. Uma outra superfı́cie S1 que tem C
como fronteira é a porção do plano z = 4x + 4y + 3 que está no interior do paraboloide z = x2 + 2y 2 , com
(x, y) ∈ D. O vetor normal, novamente usando a fórmula (2.5.2), é (−4, −4, 1), que aponta para cima, que
também é compatı́vel com a orientação de C.
O rotacional de F~ é
~i ~j ~k



rot F~ = = (2 cos2 z, sen2 z − cos2 z, 4 + 2).

∂/∂x √ ∂/∂y ∂/∂z
− senz cos z − (4 + 2)y 3 + ln(y 6 + 1) 2y cos2 z

Finalmente, vamos calcular a integral sobre S1 ao invés de calculá-la sobre S, o que nos é permitido pelo
Teorema de Stokes. Temos que fazer z = 4x + 4y + 3 no rotacional, mas vamos esperar para fazer isso após
simplificarmos as contas, se necessário, para que elas não fiquem tão grandes.
ZZ ZZ
rot F~ · dS
~= rot F~ · S
~
S S
Z 1Z √
= (2 cos2 z, sen2 z − cos2 z, 4 + 2) · (−4, −4, 1)dA

ZDZ √
= (−8 cos2 z − 4 sen2 z + 4 cos2 z + 4 + 2)dA
D
ZZ √
= (−4 cos2 z − 4 sen2 z + 4 + 2)dA
D
ZZ √
= (−4 + 4 + 2)dA
D
√ ZZ
= 2 dA
D

= 2Área(D)

 
3
= 2 π·3· √
2
= 9π ,
onde usamos que a área de uma elipse é A = πab, como vimos no Exemplo 1.7.5.

Finalmente, finalizamos a seção mostrando como o Teorema de Stokes pode ser usado para demonstrar o
Teorema 2.4.3 no caso em que R3 é o domı́nio do campo F~ . Suponha que rot F~ = ~0 em todo o R3 . Dada uma
curva fechada e simples C, é sempre possı́vel obter uma superfı́cie orientada S que tenha C como fronteira.
Isso é bastante difı́cil de se demonstrar, mas vamos admitir este fato como verdade. Adequando a orientação
de S à de C, o Teorema de Stokes garante que
Z ZZ
F~ · d~r = rot F~ · dS
~ = 0.
C
S

Se C não fosse simples, poderı́amos dividi-la em várias curvas fechadas e simples C1 ∪ C2 · · · ∪ Cn = C,


com a integral de linha ao longo deZ cada uma delas igual a zero pelo que acabamos de mostrar. Somando
todas essas integrais, vamos obter F~ · d~r = 0. Como isso vale para qualquer curva fechada, o Teorema
C
1.6.3 nos permite concluir que F~ é conservativo, como querı́amos.
62 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

2.6 Teorema da Divergência

O Teorema da Divergência é a versão do Teorema Fundamental do Cálculo para a Integral Tripla. Ele
também é conhecido como Teorema de Gauss-Ostrogradski em homenagem aos matemáticos Carl F. Gauss
e Mikhail Ostrogradski, alemão e ucraniano, respectivamente. O enunciado do Teorema é o seguinte:
Teorema 2.6.1 (Teorema da Divergência). Seja E uma região sólida simples e S a sua fronteira (que é
uma superfı́cie fechada), orientada positivamente (para fora). Seja F~ = (P, Q, R) um campo vetorial cujos
componentes têm derivadas parciais de primeira ordem contı́nuas em uma região aberta que contenha E.
Então ZZ ZZZ
F~ · dS
~= div F~ dV (2.6.1)
S E

O Teorema da Divergência fornece uma generalização para a segunda forma vetorial do Teorema de Green.
No enunciado do Teorema dizemos que E é uma região simples sólida simples. Isso significa que E é
uma região dos tipos 1, 2 e 3, conforme a nomenclatura adotada nos cursos de Cálculo 2. Nessas condições,
provemos o Teorema, por meio de argumentos semelhantes aos usados na demonstração do Teorema de
Green:
Demonstração. Como F~ = (P, Q, R), temos
∂P ∂Q ∂R
div F~ = + + ,
∂x ∂y ∂z
logo ZZZ ZZZ ZZZ ZZZ
∂P ∂Q ∂R
div F~ dV = dV + dV + dV.
∂x ∂y ∂z
E E E E

Por outro lado, se ~n é o campo normal unitário para fora de S, então


ZZ ZZ
F~ · dS
~= (P~i + Q~j + Q~k) · ~ndS
S
ZSZ ZZ ZZ
= P~i · ~ndS + Q~j · ~ndS + R~k · ~ndS.
S S S

Assim, vemos que o Teorema estará provado se mostrarmos que


ZZZ ZZ ZZZ ZZ ZZZ ZZ
∂P ∂Q ∂R
dV = P~i · ~ndS, dV = Q~j · ~ndS e dV = R~k · ~ndS.
∂x ∂y ∂z
E S E S E S

As três igualdades podem ser demonstradas de formas inteiramente análogas, por isso provaremos apenas
a terceira igualdade. Como E é uma região do tipo 1, podemos escrevê-la como

E = {(x, y, z) : (x, y) ∈ D, u1 (x, y) ≤ z ≤ u2 (x, y)},

onde D é a projeção de E sobre o plano xy. Daı́,


ZZZ Z Z " Z u2 (x,y) #
∂R ∂R
dV = (x, y, z)dz dA,
∂z u1 (x,y) ∂z
E D

e pelo Teorema Fundamental do Cálculo segue que


ZZZ ZZ h
∂R i
dV = R(x, y, u2 (x, y)) − R(x, y, u1 (x, y)) dA.
∂z
E D

A fronteira de S é formada, em geral, por três superfı́cies:


2.6. TEOREMA DA DIVERGÊNCIA 63

• A superfı́cie inferior S1 , a porção do gráfico de z = u1 (x, y) que está acima da região D no plano xy;

• A superfı́cie superior S2 , a porção do gráfico de z = u2 (x, y) que está acima da região D no plano xy;

• Possivelmente, também exista uma superfı́cie lateral S3 , que é vertical e situa-se exatamente acima da
região D. Note que em alguns casos S3 não existe, por exemplo, se S for uma esfera.

Ao longo de S3 o vetor ~n é horizontal. Como ~k é vertical, temos que ~k · ~n = 0, logo


ZZ
R~k · ~ndS = 0,
S3

logo sempre podemos escrever


ZZ ZZ ZZ
R~k · ~ndS = R~k · ~ndS + R~k · ~ndS,
S S1 S2

independente da superfı́cie vertical


 S3 existir ou
 não.
∂u2 ∂u2
Em S2 o vetor normal é − ,− , 1 , pela fórmula (2.5.2). Daı́,
∂x ∂y
ZZ ZZ ZZ   ZZ
∂u2 ∂u2
R~k · ~ndS = R~k · dS
~= (0, 0, R(x, y, u2 (x, y))) · − ,− , 1 dA = R(x, y, u2 (x, y))dA.
∂x ∂y
S2 S2 D D

 
∂u1 ∂u1
Analogamente, em S1 o vetor normal é , , −1 , pois ele deve apontar para baixo, portanto
∂x ∂y
ZZ ZZ ZZ   ZZ
∂u1 ∂u1
R~k · ~ndS = R~k · dS
~= (0, 0, R(x, y, u1 (x, y))) · , , −1 dA = − R(x, y, u1 (x, y))dA.
∂x ∂y
S1 S1 D D

Com isso, concluı́mos que


ZZ ZZ h i
~
Rk · ~ndS = R(x, y, u2 (x, y)) − R(x, y, u1 (x, y)) dA,
S D

exatamente o mesmo resultado que havı́amos obtido para a integral tripla do Teorema, o que concui a
demonstração.

Exemplo 2.6.1. Calcule o fluxo de F~ (x, y, z) = (z, y, x) sobre x2 + y 2 + z 2 = 1.

Solução. Temos que div F~ = 1, logo


ZZ ZZZ

F~ · dS
~= 1dV = V (E) = ,
S 3
E

pois E é uma esfera de raio 1.

ZZ
Exemplo 2.6.2. Calcule ~ se F~ (x, y, z) = (xy, y 2 + exz2 , sen(xy)) e S é a fronteira do sólido
F~ · dS,
S
limitado pelo cilindro parabólico z = 1 − x2 e pelos planos z = 0, y = 0 e y + z = 2.
64 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

Solução. O divergente de F~ é div F~ = 3y. A região E pode ser descrita como

E = {(x, y, z) : −1 ≤ x ≤ 1, 0 ≤ z ≤ 1 − x2 , 0 ≤ y ≤ 2 − z}.

Assim,
ZZ Z 1 Z 1−x2 Z 2−z
F~ · dS
~= 3ydydzdx
S −1 0 0
1 1−x2
y 2 y=2−z
Z Z
=3 dzdx
2 y=0

−1 0
Z 1 Z 1−x2
3
= (2 − z)2 dzdx
2 −1 0
Z 1 Z 1−x2
3
= (4 − 4z + z 2 )dzdx
2 −1 0
1 z=1−x2
z3
Z 
3 2
= 4z − 2z + dx
2 −1 3 z=0
Z 1
(1 − x2 )3
 
3
= 4(1 − x2 ) − 2(1 − x2 )2 + dx
2 −1 3
Z 1
1
= (7 − 3x2 − 3x4 − x6 )dx (Simplificando)
2 −1
Z 1
= (7 − 3x2 − 3x4 − x6 )dx (Pois o integrando é uma função par)
0
1
3x5 x7

= 7x − x3 − −
5 7 0
184
= .
35

Exemplo 2.6.3. Calcule o fluxo de F~ (x, y, z) = (3xy 2 , xez , z 3 ) através da fronteira do sólido limitado pelo
cilindro y 2 + z 2 = 1, por x = −1 e x = 2.
Solução. O divergente de F~ é div F~ = 3(y 2 + z 2 ). Usando coordenadas cilı́ndricas x = x, y = r cos θ e
z = r senθ, com −1 ≤ x ≤ 2, 0 ≤ r ≤ 1 e 0 ≤ θ ≤ 2π, temos
ZZ ZZZ
~ ~
F · dS = 3(y 2 + z 2 )dV
S E
Z 2π Z 2 Z 1
= 3r2 rdrdxdθ
0 −1 0
Z 2π Z 2 Z 1
=3 dθ dx r3 dr
0 −1 0
1
r4
= 18π
4 0

= .
2

Exemplo 2.6.4. Calcule o fluxo de F~ (x, y, z) = (cos z + xy 2 , xe−z , seny + x2 z) através da fronteira do sólido
limitado pelo paraboloide z = x2 + y 2 e pelo plano z = 4.
2.6. TEOREMA DA DIVERGÊNCIA 65

Solução. Temos div F~ = x2 + y 2 , logo


ZZ ZZZ
F~ · dS
~= (x2 + y 2 )dV.
S E

Usamos coordenadas cilı́ndricas x = r cos θ, y = r senθ e z = z, com 0 ≤ θ ≤ 2π, 0 ≤ r ≤ 2 e z variando do


paraboloide, ou seja, de z = x2 + y 2 = r2 , a z = 4.
Daı́,
ZZ Z 2π Z 2 Z 4
F~ · dS
~= r2 rdzdrdθ
0 0 r2
S
Z 2π Z 2 z=4
= zr3 2 drdθ

0 0 z=r
Z 2π Z 2
= (4r3 − r5 )drdθ
0 0
Z 2π Z 2
= dθ (4r3 − r5 )dr
0 0
2
r6

4
= 2π r −
6 0
32π
= .
3

Exemplo 2.6.5. Calcule o fluxo de p F~ (x, y, z) = (x3 + p


y sen(z), y 3 + z sen(x), 3z) através da fronteira do
sólido limitado pelos hemisférios z = 4 − x − y , z = 1 − x2 − y 2 e pelo plano z = 0.
2 2
ZZ ZZZ
~ 2 2
Solução. Temos div F = 3(x + y + 1), logo ~ ~
F · dS = 3(x2 + y 2 + 1)dV . Usamos coordenadas
S E
esféricas x = ρ senφ cos θ, y = ρ senφ senθ e z = ρ cos φ, com 1 ≤ ρ ≤ 2, 0 ≤ φ ≤ π/2 e 0 ≤ θ ≤ 2π. Daı́,
ZZ Z 2π Z π/2 Z 2
~ ~
F · dS = 3(ρ2 sen2 φ + 1)ρ2 senφdρdφdθ
0 0 1
S
Z 2π Z π/2 Z 2
=3 (ρ4 sen3 φ + ρ2 senφ)dρdφdθ
0 0 1
2π π/2 ρ=2
ρ5 sen3 φ ρ3 sen3 φ
Z Z 
=3 + dφdθ
0 0 5 3 ρ=1
Z 2π Z π/2  
31 3 7
=3 sen φ + senφ dφdθ
0 0 5 3
Z 2π Z π/2  
31 7
=3 dθ sen3 φ + senφ dφ
0 0 5 3
"  #π/2
31 cos3 φ

7
= 6π − cos φ − cos φ
5 3 3
0
 
31 31 7
= 6π − + +
15 5 3
194π
= .
5
66 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

Exemplo 2.6.6. Considere o campo vetorial em R3 − {(0, 0, 0)} definido por


!
x y z
F~ (x, y, z) = p ,p ,p .
(x2 + y 2 + z 2 )3 (x2 + y 2 + z 2 )3 (x2 + y 2 + z 2 )3

(a) Calcule a divergência do campo F~ .

(b) Calcule diretamente o fluxo de F~ através da superfı́cie esférica S de equação x2 + y 2 + z 2 = 1, em


relação ao campo normal que aponta para fora da esfera.

(c) Explique por que não é correto usar o Teorema da Divergência para efetuar o cálculo acima.

(d) Calcule o fluxo de F~ através do elipsoide P 4x2 + 9y 2 + 6z 2 = 36, em relação ao campo normal que
aponta para fora do elipsoide.

Solução. Se F~ = (P, Q, R), então

∂P −2x2 + y 2 + z 2 ∂Q x2 − 2y 2 + z 2 ∂R x2 + y 2 − 2z 2
= 2 , = e = ,
∂x (x + y 2 + z 2 )5/2 ∂y (x2 + y 2 + z 2 )5/2 ∂z (x2 + y 2 + z 2 )5/2

logo div F~ = 0.
A superfı́cie esférica tem parametrização

~r(φ, θ) = (cos θ senφ, senθ senφ, cos φ),

com 0 ≤ φ ≤ π e 0 ≤ θ ≤ 2π. Daı́, ~rφ = (cos θ cos φ, senθ cos φ, − senφ) e ~rθ = (− senθ senφ, cos θ senφ, 0),
logo
~rφ ∧ ~rθ = (cos θ sen2 φ, senθ sen2 φ, senφ cos φ).
Na parte superior da esfera sabemos que o vetor normal deve apontar para cima, ou seja, sua componente
z é positiva. Essa região corresponde a 0 ≤ φ ≤ π/2, e nesse intervalo a componente z de ~rφ ∧ ~rθ é positiva,
logo esse vetor normal aponta para cima.
Note que nos pontos da superfı́cie esférica vale x2 +y 2 +z 2 = 1, portanto F~ (~r(φ, θ)) = (cos θ senφ, senθ senφ, cos φ).
Dessa forma,
ZZ Z 2π Z π
F~ · dS
~= (cos θ senφ, senθ senφ, cos φ) · (cos θ sen2 φ, senθ sen2 φ, senφ cos φ)dφdθ
0 0
S
Z 2π Z π
= (cos2 θ sen3 φ + sen2 θ sen3 φ + senφ cos2 φ)dφdθ
0 0
Z 2π Z π
= ( sen3 φ + senφ cos2 φ)dφdθ
0 0
Z 2π Z π
= senφdφdθ
0 0
Z 2π
= 2π senφdφ
0

= 2π − cos φ)π0

= 4π .

Observe que, se usássemos o Teorema da Divergência para fazer o cálculo acima, terı́amos
ZZ ZZZ
~ ~
F · dS = div F~ dV = 0,
S E
2.7. EXERCÍCIOS 67

onde E é a região delimitada por S, o que não é verdade. Como o campo F~ não está definido na origem, que
está no interior da região delimitada por S, as suas componentes P , Q e R não possuem derivadas parciais de
primeira ordem contı́nuas em um aberto que contém E, o que é necessário para podermos aplicar o Teorema.
Assim, não é correto usá-lo nesse momento.
Finalmente, note que a superfı́cie S está contida na região interior a P . Seja E1 a região compreendida
entre S e P . Como a origem não está em E1 , temos que P , Q e R possuem derivadas parciais de primeira
ordem contı́nuas em um aberto contendo E1 , logo nessa região vale o Teorema da Divergência. Lembrando
que a orientação da fronteira de E1 deve ser para fora, de modo que em S o campo normal deve apontar
para dentro da esfera, e em P para fora do elipsoide. Considerando ∂E1 = (−S) ∪ P , temos
ZZZ ZZ ZZ ZZ
0= ~
div F dV = = ~ ~
F · dS + F~ · dS,
~
E1 ∂E1 −S P

logo ZZ ZZ ZZ
F~ · dS
~=− F~ · dS
~= F~ · dS
~ = 4π .
P −S S

2.7 Exercı́cios

Exercı́cio 2.1. Calcule a área da região do plano x + y + z = 2 contida no interior do cilindro x2 + y 2 = 1.


2 2 2
Exercı́cio 2.2. Calcule a massa p da superfı́cie S dada por z = x + y , 1 ≤ z ≤ 2, cuja densidade em um
2 2 2
ponto (x, y, z) é f (x, y, z) = x + y + z .

Exercı́cio 2.3. Calcule o fluxo do campo vetorial F~ (x, y, z) = (xzey , −xzey , z) através da porção do plano
x + y + z = 1 situada no primeiro octante, em relação ao campo normal que aponta para baixo.
Exercı́cio 2.4. Calcule o fluxo do campo F~ (x, y, z) = (y, x, z 2 ) através do helicoide ~r(u, v) = (u cos v, u senv, v),
com 0 ≤ u ≤ 1 e 0 ≤ v ≤ π.
Exercı́cio 2.5. Calcule a área da superfı́cie S de parametrização ~r(u, v) = (u cos v, u senv, u), com u ∈ [1, 3]
e v ∈ [0, π/2].
Exercı́cio 2.6. Considere a superfı́cie S de equações paramétricas ~r(u, v) = (uv, u+v, u−v), com u2 +v 2 ≤ 1.

(a) Mostre que o ponto P (2, 3, −1) pertence à superfı́cie.


(b) Encontre uma equação para o plano tangente à superfı́cie nesse ponto.
(c) Encontre uma equação cartesiana para S.
(d) Calcule a área da superfı́cie S.

Exercı́cio 2.7. Obtenha fórmulas semelhantes a (2.5.2) quando S é da forma x = g(y, z) e y = g(x, z).
~ em R3 tal que rot G
Exercı́cio 2.8. Existe algum campo G ~ = (x seny, cos y, z − xy)? Explique.

Exercı́cio 2.9. Calcule o trabalho realizado pelo campo F~ (x, y, z) = (2y, −z, 2x) no deslocamento de uma
partı́cula sobre a curva de interseção do cilindro x2 + y 2 = 4 com o plano 2y + z = 0, orientada no sentido
anti-horário quando vista de cima.
Exercı́cio 2.10. Considere o campo vetorial F~ (x, y, z) = (xy 2 , 3z, 5y).

(a) Calcule rot F~ .


68 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

(b) Parametrize a porção do plano x + z = 4 limitada pelo cilindro x2 + y 2 = 16.


Z
(c) Use o Teorema de Stokes para calcular F~ · d~r, onde C é a curva obtida pela interseção entre o plano
C
x + z = 4 e o cilindro x2 + y 2 = 16, orientada no sentido anti-horário quando vista de cima.

Exercı́cio 2.11. Considere aZporção da esfera x2 +y 2 +z 2 = 9 que está no primeiro octante. Seja F~ (x, y, z) =
2
(ex cos x + z 2 , 0, 0). Calcule F~ · d~r, onde C é a fronteira desta porção, orientada no sentido anti-horário
C
quando vista da origem.

Exercı́cio 2.12. Considere a curva C de interseção do cilindro x2 + y 2 = 4 com o plano z = x + 4 e o campo


F~ (x, y, z) = (2z, 4x, 5y).
Z
(a) Use o Teorema de Stokes para calcular F~ · d~r.
C

(b) Explicite uma parametrização de C compatı́vel com o vetor normal usado no item anterior.

Exercı́cio 2.13. Considere a superfı́cie S definida por z = 1 − x2 − y 2 com z ≥ 0 e o campo de vetores


F~ (x, y, z) = (−y + cos x, x, x2 + y 2 ).

(a) Determine o elemento de área dS e o campo normal unitário ~n que aponta para cima da superfı́cie S.

(b) Calcule rot F~ .


Z
(c) Use o Teorema de Stokes para calcular a integral de linha F~ · d~r, onde C é a fronteira da superfı́cie
C
S orientada no sentido anti-horário quando vista de cima.
5 3
Exercı́cio
p 2.14. Considere o campo F~ (x, y, z) = (x sen(xz) + ey z , y 2 , 1) e seja S a parte do hemisfério
x = 9 − y 2 − z 2 que está dentro do cilindro y 2 + z 2 = 4. Calcule, usando o Teorema de Stokes, o fluxo de
rot F~ através de S, em relação ao campo normal que tem a primeira componente positiva.
ZZ
Exercı́cio 2.15. Calcule rot F~ · dS,
~ onde F~ (x, y, z) = (x − x2 z, yz 3 − y 2 , x2 y − xz) e S é a superfı́cie
S

x2 y2 z2
+ + = 1, z ≥ 0,
4 9 16
com a normal apontando para fora de S.
Z
Exercı́cio 2.16. Use o Teorema de Stokes para calcular F~ · d~r, onde
C

F~ (x, y, z) = (x2 y − xy 2 , z 3 )

e C é a curva de interseção do plano 3x + 2y + z = 6 e do cilindro x2 + y 2 = 4, orientada no sentido horário


quando vista de cima.
ZZ
Exercı́cio 2.17. Use o Teorema de Stokes para calcular rot F~ · dS,
~ onde
S

y3
 
F~ (x, y, z) = sen(y + z) − yx2 − , x cos(y + z), cos(2y)
3

e S é formada pelo topo e pelos quatro lados (mas não pelo fundo do cubo de vértices (±1, ±1, ±1), orientado
para fora.
2.7. EXERCÍCIOS 69

Exercı́cio 2.18. Considere o campo vetorial

F~ (x, y, z) = (0, −z 2 , yz).

~ tal que rot G


(a) Existe um campo vetorial G ~ = F~ ? Justifique.

(b) F~ é um campo conservativo? Justifique.


(c) Considere o hemisfério S = {(x, y, z) : x2 + y 2 + z 2 = 1, x ≥ 0}. Calcule diretamente a integral de
superfı́cie ZZ
rot F~ · dS,
~
S

escolhendo uma orientação para S.


(d) Usando o Teorema de Stokes, verifique se a sua resposta para o item anterior está correta (lembre-se
de parametrizar a fronteira de S de forma adequada à orientação que você escolheu para S).
 
Exercı́cio 2.19. Sejam F~ (x, y, z) = − y, x, sen(x7 y 8 z 9 ) e S a superfı́cie z = 9 − x2 − y 2 , z ≥ 0.

(a) Parametrize a curva fronteira de S.

(b) Calcule o fluxo do rotacional de F~ através da superfı́cie S, em relação ao campo normal que aponta
para fora.

Exercı́cio 2.20. Seja F~ (x, y, z) = (−y, x, xyz) e seja S a parte da superfı́cie esférica x2 + y 2 + z 2 = 25 que
está abaixo do plano z = 4, orientada de modo que o vetor normal unitário em (0, 0, −5) seja (0, 0, 1).

(a) Obtenha uma parametrização para a fronteira C de S. Qual é a orientação de C que é compatı́vel com
a de S?
ZZ
(b) Use o Teorema de Stokes para calcular rot F~ · dS.
~
S

Exercı́cio 2.21. Mostre que podemos calcular o volume de um corpo sólido por meio de uma integral de
superfı́cie.
Exercı́cio 2.22. Considere o campo vetorial
!
~ z−y x−z y−x
E(x, y, z) = 3 , 3 , 3 .
(x2 + y 2 + z 2 ) 2 (x2 + y 2 + z 2 ) 2 (x2 + y 2 + z 2 ) 2

~
(a) Calcule a divergência do campo E.
(b) Calcule o fluxo do campo através da superfı́cie esférica x2 + y 2 + z 2 = a2 .
(c) Calcule o fluxo do campo através de uma superfı́cie esférica de raio b < 1 e centrada no ponto (1, 0, 0).
Faça o mesmo para b > 1. Em ambos os casos, justifique.

Exercı́cio 2.23. Calcule o fluxo do campo F~ (x, y, z) = (x3 − y 3 , y 3 − z 3 , z 3 − x3 ) através da fronteira do


sólido limitado por z = 2 − x2 − y 2 com x ≥ 0, y ≥ 0 e z ≥ 0, com orientação para cima.
Exercı́cio 2.24. Calcule o fluxo do campo

F~ (x, y, z) = (cos z + xy 2 , xe−z , seny + x2 z)

através da superfı́cie do sólido limitado pelo paraboloide z = x2 + y 2 e pelo plano z = 4, com orientação
para fora do sólido.
70 CAPÍTULO 2. CÁLCULO VETORIAL DE SUPERFÍCIES

Exercı́cio 2.25. Considere a superfı́cie fechada S, definida pelo gráfico de z = 4 − x2 e pelos planos
y = −1, y = 1 e z = 0, e a região E do espaço limitada por S.

(a) Esboce a superfı́cie ilustrando o campo normal que aponta para fora.

(b) Calcule div F~ , onde F~ (x, y, z) = (x2 yz, x2 z, y 2 z 2 ).


(c) Use o Teorema da Divergência para calcular a integral
ZZ
F~ · dS,
~
S

com orientação para fora.

Exercı́cio 2.26. Considere o campo vetorial F~ (x, y, z) = (z arctan(y 2 ), z 3 ln(x2 + 1), z) e seja Ω a região do
espaço delimitada superiormente pelo paraboloide z = 2 − x2 − y 2 e inferiormente pelo plano z = 1. Calcule
o fluxo do campo F~ através da superfı́cie fronteira do sólido Ω, em relação à normal que aponta para fora
de Ω.
Exercı́cio 2.27. Sejam S a fronteira da região {(x, y, z) ∈ R3 : x2 + y 2 ≤ 1, x ≥ 0, y ≥ 0, 0 ≤ z ≤ 2} e o
campo F~ (x, y, z) = (x2 sen(2y) − z arctan(y), x(z 3 + cos(2y)), x2 y 2 + x2 z 2 + y 2 z 2 ). Calcule o fluxo de F~ que
sai da superfı́cie S (normal exterior).
Exercı́cio 2.28. Seja V uma região fechada e limitada do R3 , cuja fronteira é a união de duas superfı́cies
S1 e S2 , orientadas com vetor normal exterior à região V . Calcule o fluxo de F~ através de S2 , onde
F~ (x, y, z) = (2x + y 2 e3z − cos(y 2 + z 2 ), xz 2 + ln(1 + x2 ), 4 − z), sabendo que S1 é uma porção do plano z = 0
com 6 unidades de área, que S2 está abaixo do plano z = 0 e que V tem 20 unidades de volume.
Exercı́cio 2.29. Seja W uma região fechada e limitada de R3 , cuja fronteira é a união de duas superfı́cies
S
1 e S2 , orientadas
 com vetor normal exterior a W . Cacule o fluxo de F~ através de S2 , onde F~ (x, y, z) =
2 2
ey +z , y, −2y , sabendo que S1 é uma porção do plano 2y + z = 1 com 5 unidades de área e que W possui
30 unidades de volume.
Exercı́cio 2.30. Considere o campo vetorial
1
F~ (x, y, z) = 3 (x, y, z).
(x2 + y2 + z2 ) 2

(a) Calcule o fluxo do campo F~ através da esfera Sa , de centro na origem e raio a > 0, com vetor normal
apontando para fora.
(b) Calcule o fluxo de F~ através do cubo −17 ≤ x ≤ 17, −17 ≤ y ≤ 17, −17 ≤ z ≤ 17, com vetor normal
apontando para fora.

Exercı́cio 2.31. Seja E1 a região sólida delimitada pelo cilindro x2 + y 2 = 1 e pelos planos z = 0 e z = 1.
Seja E2 a região sólida cônica acima de E1 , delimitada pelo cone x2 + y 2 = (2 − z 2 ), de vértice (0, 0, 2) e
pelos planos z = 1 e z = 2. Seja agora E = E1 ∪ E2 a região sólida obtida como união das duas. Considere
o campo de força
F~ (x, y, z) = (1 − x2 − y 2 , z(1 − x2 − y 2 ), 2xz + yz 2 + z − 1).

(a) Descreva a fronteira de E, ∂E.

(b) Calcule a componente normal de F~ sobre a face lateral S1 de E1 e sobre a sua face de baixo D.

(c) Calcule a divergência de F~ .

(d) Calcule o fluxo de F~ através da superfı́cie lateral S2 de E2 (a porção do cone), com a orientação externa
a E.
Capı́tulo 3

Sequências e Séries

3.1 Sequências de Números Reais

Uma sequência é uma lista ordenada (infinita) de números reais. Mais precisamente, trata-se de uma
função f : N → R, onde escrevemos f (n) = an , o termo geral da sequência.

Notação: (an )∞
n=1 = (a1 , a2 , a3 , . . .). Muitas vezes abreviaremos a notação apenas como (an ).

Exemplo 3.1.1.

(a) (an )∞
n=1 = (1, 2, 3, 4, 5, . . .).

(b) (bn )∞
n=1 = (1, −1, 1, −1, 1, −1, . . .).

(c) (cn )∞
n=1 = (1, 1/2, 1/3, 1/4, 1/5, . . .).

Além de podermos representar a sequência listando todos os seus termos (o que é complicado por serem
infinitos), podemos fazê-lo de duas outras formas. A primeira é através de uma lei de formação, isto é, uma
fórmula que fornece an em função de n. No Exemplo acima, as leis de formação seriam

1
an = n, bn = (−1)n+1 e cn = .
n
A segunda forma é por meio de uma fórmula de recorrência, ou seja, a fórmula nos permite obter cada
termo a partir de termos anteriores. Um exemplo clássico de fórmula de recorrência é a Sequência de
Fibonacci (fn )∞
n=1 , que é dada pela relação de recorrência

f1 = 1, f2 = 1, fn = fn−1 + fn−2 se n ≥ 3,

isto é, os dois termos iniciais são iguais a 1 e os demais são iguais á soma dos dois termos anteriores. Assim,
vemos que
(fn ) = (1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, . . .).
Fórmulas de recorrência são menos desejáveis que leis de formação, já que para determinar o termo an em
uma recorrência precisamos conhecer todos os termos anteriores, o que não ocorre quando temos a lei de
formação.
Voltando ao exemplo, as duas primeiras sequências não parecem se aproximar de nenhum número real
à medida que n cresce. A terceira sequência, no entanto, parece aproximar-se de 0. Dessa ideia surge o
conceito de limite de sequência:

71
72 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES

Definição 3.1.1. Uma sequência (an ) é convergente, com limite L, se pudermos tornar an tão próximo
de L quanto quisermos, desde que tomemos n suficientemente grande. Nesse caso, escrevemos

lim an = L ou an → L.

Quando (an ) não é convergente, dizemos que é divergente.

Formalmente, dizemos que lim an = L se para todo  > 0 existir n0 ∈ N tal que |an − L| <  sempre que
n ≥ n0 .
Note que a definição dada para limite de sequência é praticamente a mesma de limite de uma função
f (x), de variável real, quando x tende a +∞. Dessa forma, as propriedades de limites de funções de variável
real possuem versões análogas no caso de sequências, de modo que valem:

• Limite da soma (subtração) = Soma (subtração) dos limites.

• Limite do produto = Produto dos limites.

• Limite do quociente = Quociente dos limites, desde que o limite do denominador não seja zero.

• O Teorema do Confronto.

Um conceito com o qual também temos familiaridade é o de limite infinito. Por exemplo, lim an = ∞ se
pudermos tornar an tão grande quanto quisermos, desde que n seja tomado suficientemente grande.
Como vimos, a definição precisa de limite é complicada. Para contornar este problema, usaremos algumas
propriedades. A primeira delas está enunciada a seguir.

Teorema 3.1.1. Se limx→∞ f (x) = L e f (n) = an para n ∈ N, então lim an = L.


x3 + 15x + 3
A figura a seguir ilustra esse Teorema. Temos o gráfico da função f (x) = , e nele estão
x3 + 4x + 1
3
n + 15n + 3
marcados os pontos em que x é natural, ou seja, os pontos da sequência an = 3 . Sabemos que
n + 4n + 1
limx→∞ f (x) = 1, e como os pontos da sequência fazem parte do gráfico de f , esses pontos são carregados
para o mesmo limite.

Assim, podemos trocar an , uma função de variável natural, por uma função de variável real que tenha a
mesma fórmula que an , trocando n por x, e usar nossos conhecimentos de Cálculo 1. Em particular, como
limx→∞ 1/x = 0, concluı́mos que lim 1/n = 0.
Podemos obter uma sequência omitindo termos de uma outra sequência e preservando a ordem dos termos
restantes. A nova sequência é uma subsequência da original. Por exemplo, xn = n + 1 = (2, 3, 4, . . .) e
yn = 2n = (2, 4, 6, . . .) são subsequências de an = n. É claro que se an → L, então todas as suas subsequências
também convergem para L. Assim, se (an ) tem duas subsequências com limites distintos, então (an )
tem que ser divergente. Desse modo, bn = (−1)n+1 é divergente, pois se considerarmos apenas n ı́mpar,
teremos b2n−1 = (1, 1, 1, . . .) convergindo para 1, e para n par, teremos b2n = (−1, −1, −1, . . .) convergindo
para −1.
Um outro Teorema importante está enunciado abaixo:
3.1. SEQUÊNCIAS DE NÚMEROS REAIS 73

Teorema 3.1.2. Se lim |an | = 0, então lim an = 0.


Não demonstraremos esse Teorema, mas a ideia por trás dele é a seguinte. Digamos que |an | → L, com
L 6= 0. Então nada podemos concluir sobre lim an : poderiámos ter an → L, an → −L, ou até nenhuma das
duas possibilidades. Por exemplo, na sequência bn = (−1)n+1 , temos |bn | = 1, logo é claro que |bn | → 1, mas
bn é divergente. Essas possibilidades não ocorrem quando L = 0, já que +0 e −0 são iguais. Ressaltamos
mais uma vez que isso não é uma demonstração, apenas uma tentativa de justificar. Um bom exercı́cio para
o leitor é tentar demonstrar essa propriedade usando a definição formal de limite.
Exemplo 3.1.2. Calcule os limites das seguintes sequências:
n+1
(a) an = . Dividimos numerador e denominador pela maior potência de n:
3n − 1

n+1 1 + 1/n 1
lim = lim = .
3n − 1 3 − 1/n 3
x+1
Também poderı́amos ter considerado a função f (x) = 3x−1 e usado a Regra de L’Hospital.

(−1)n−1 n n
(b) an = . Temos |an | = n2 +1 . Dividimos novamente pela maior potência de n, obtendo
n2 + 1
n 1/n
lim |an | = lim = lim = 0,
n2 + 1 1 + 1/n2

logo lim an = 0 pelo Teorema 3.1.2. Novamente poderı́amos ter usado a Regra de L’Hospital, porém
havia uma maneira mais simples de resolver.
ln n ln x
(c) an = . Usamos f (x) = e notamos que
n x
ln x 1
lim = lim =0
x→∞ x x→∞ x

pela Regra de L’Hospital. Logo, lim an = 0 pelo Teorema 3.1.1.


n!
(d) an = . Observe que
nn  
1 · 2 · 3 · ... · n 1 2 · 3 · ... · n 1
an = = ≤ .
n · n · n · ... · n n n · n · ... · n n
Logo,
1
0 < an ≤
n
para todo n, mas lim 0 = lim 1/n = 0. Pelo Teorema do Confronto, concluı́mos que lim an = 0 .
(e) an = cos(nπ). Note que a1 = −1, a2 = 1, a3 = −1, a4 = 1, e assim por diante, ou seja, cos(nπ) =
(−1)n . Com isso, vemos que (an ) é divergente por ter duas subsequências que convergem para limites
diferentes.
(n − 1)!
(f) an = . Nesse caso, basta escrever
(n + 1)!

(n − 1)! (n − 1)! 1
an = = = ,
(n + 1)! (n + 1)n(n − 1)! (n + 1)n

logo é claro que an → 0.

Os próximos dois exemplos possuem mais importância, por isso vamos separá-los dos demais:
74 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES
 n
1
Exemplo 3.1.3. Considere a sequência an = 1+ . Ao tentarmos calcular o limite de an quando
n
n → ∞ obtemosx uma indeterminação da forma 1∞ . Precisamos usar a Regra de LH́ospital na função
1 1
f (x) = 1 + . Note que ln f (x) = x ln 1 + , o que nos permite escrever
x x

f (x) = ex ln(1+1/x) .

Pela continuidade da função exponencial, temos

lim f (x) = lim ex ln(1+1/x) = elimx→∞ x ln(1+1/x) .


x→∞ x→∞

O novo limite é do tipo 0 · ∞, portanto


1 0
ln(1 + 1/x) 1+1/x (1/x)
lim x ln(1 + 1/x) = lim = lim = 1.
x→∞ x→∞ 1/x x→∞ (1/x)0

Isso nos permite concluir que


 n
1
lim 1 + =e.
n

Usamos acima o seguinte resultado, que é bastante útil pois nos permite “passar o limite para dentro”
de uma função contı́nua.

Teorema 3.1.3. Se (an ) e (bn ) são sequências tais que an = f (bn ), onde f é uma função contı́nua de
variável real, então lim an = f (lim bn ).

Esse resultado simplifica algumas contas. Por exemplo, se an = sen(1/n), então lim an = sen(lim 1/n) =
sen(0) = 0.

Exemplo 3.1.4. Considere an = n n = n1/n . Fazendo n → ∞, obtemos uma indeterminação do tipo ∞0 ,
1
logo novamente fazemos ln an = ln(n), logo
n
ln(n)
an = e n .

Usando a continuidade da função exponencial, temos


ln(n)
lim an = elim n = e0 = 1,

pelo que vimos no Exemplo 3.1.2. Logo, √


lim n n = 1.

Note que também podemos mostrar que lim n a = 1, se a > 0, com contas praticamente iguais (até um
pouco mais simples):
√ ln(a)
lim n a = elim n = e0 = 1.
Não precisamos usar a Regra de L’Hospital, e observe que precisamos ter a > 0 para não encontrar problemas
quando n for par e para que o ln(a) faça sentido.

Vejamos mais algumas definições:

Definição 3.1.2. Diremos que (an ) é monótona nos seguintes casos:

• (an ) é crescente se an+1 > an para todo n. É não-decrescente se an+1 ≥ an para todo n.
3.2. SÉRIES NUMÉRICAS 75

• (an ) é decrescente se an+1 < an para todo n. É não-crescente se an+1 ≤ an para todo n.

Exemplo 3.1.5.

3
(a) A sequência an = é decrescente, pois
n+5
3 3 3
an = > = = an+1 .
n+5 n+6 (n + 1) + 5

n x
(b) A sequência an = também é decrescente. Note que f (x) = 2 tem derivada igual a
n2 + 1 x +1

1 − x2
f 0 (x) = ,
(x2 + 1)2

que é negativa para x > 1, que é onde os naturais se encontram.

Definição 3.1.3. Diremos que (an ) é limitada superiormente se existir M ∈ R tal que an ≤ M para
todo n, e é limitada inferiormente se existir m ∈ R tal que an ≥ m para todo n. Se (an ) for limitada
superiormente e inferiormente, diremos apenas que é limitada.

Exemplo 3.1.6.

(a) A sequência an = (−1)n é limitada inferiormente por −1 e superiormente por 1.

(b) an = n é limitada inferiormente por 1 mas é ilimitada superiormente.

(c) an = (−1)n n não é limitada nem superiormente, nem inferiormente.

(d) an = 1 − 1/n é limitada inferiormente por 0 e superiormente por 1. Note que lim an = 1 e que an é
crescente. Esse exemplo ilustra o seguinte Teorema, que é importantı́ssimo e será usado mais à frente:

As duas últimas definições se unem no seguinte resultado, importantı́ssimo do ponto de vista teórico e
que nos permitirá saber muitas vezes que uma sequência é convergente sem calcular o seu limite.

Teorema 3.1.4 (Teorema da Sequência Monótona). Toda sequência monótona limitada é convergente.

3.2 Séries Numéricas

Seja (an ) uma sequência de números reais. A partir de (an ) construiremos uma nova sequência (Sn )
definida por

n
X
S1 = a1 , S2 = a1 + a2 , S3 = a1 + a2 + a3 , . . . , Sn = a1 + . . . + an = ai .
i=1

Essa sequência (Sn ) é chamada de sequência das somas parciais de (an ). Se (Sn ) for convergente,
X∞
com lim Sn = S, diremos que a série infinita an é convergente, com soma S. Se (Sn ) for divergente,
n=1

X
diremos que a série an é divergente.
n=1
76 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES

P∞
Exemplo 3.2.1. A série geométrica a + ar + ar2 + . . . = n=1 arn−1 é convergente se |r| < 1 , com
a
soma igual a , e é divergente caso contrário.
1−r
Com efeito, temos Sn = a + ar + ar2 + . . . + arn−1 . Daı́, rSn = ar + ar2 + ar3 + . . . + arn−1 + arn . Se
fizermos Sn − rSn , vamos obter
Sn (1 − r) = a − arn ,
logo
a − arn
.
Sn =
1−r
Fazendo n → ∞ e notando que rn → 0 se |r| < 1 (basta ver que |r|x é uma exponencial decrescente e usar
o Teorema 3.1.2), vamos obter
a
S= ,
1−r
como querı́amos demonstrar.

X ∞
X
Note que a série arn−1 também pode ser escrita como arn .
n=1 n=0

Exemplo 3.2.2.
∞  n−1
X 2
(a) A série 5 é convergente, pois |2/3| < 1.
n=1
3
∞ X 1  π n
X πn
(b) Como = , essa série é divergente pois π/3 > 1.
n=0
3n+1 n=0
3 3
∞ ∞ ∞  n
X X 4n · 3 X 4
(c) Como 22n 31−n = n
= 3 , essa série diverge pois 4/3 > 1.
n=1 n=1
3 n=1
3

X 1
Exemplo 3.2.3. . Esta série não é geométrica, então precisamos de outra análise. Vamos olhar
n=1
n(n + 1)
para as somas parciais. Para isso, precisamos escrever o termo geral
1
an =
n(n + 1)
de outra forma, usando frações parciais:
1 A B A(n + 1) + Bn
= + = ⇒ A(n + 1) + Bn = 1.
n(n + 1) n n n(n + 1)

Daı́, fazendo n = 0 obtemos A = 1 e n = −1 nos dá B = −1 , ou seja,

1 1
an = − .
n n+1

Portanto,
1
S1 = a1 = 1 −
2
1 1 1 1
S2 = a1 + a2 = 1 −  +  − = 1 −
2 2 3 3
1 1 1 1
S3 = a1 + a2 + a3 = S2 + a3 = 1 − + − =1− ,
3 3
 4 4
3.2. SÉRIES NUMÉRICAS 77

de modo que o padrão é


1
Sn = 1 − .
n+1
Assim, lim Sn = 1 , e a série é convergente com soma 1 .

X 2
Exemplo 3.2.4. 2−1
. Nesse caso,
n=2
n

2 2 A B A(n − 1) + B(n + 1)
= = + = ⇒ A(n − 1) + B(n + 1) = 2.
n2 − 1 (n + 1)(n − 1) n+1 n−1 n2 − 1
Assim, fazendo n = 1 obtemos B = 1 e fazendo n = −1 obtemos A = −1, de modo que

2 1 1
an = = − .
n2 − 1 n−1 n+1

Vamos calcular algumas somas parciais até encontrarmos um padrão:


1
S2 = 1−
3
1 1 1
S3 = 1− + −
3 2 4
1 1 1 1 1 1 1 1
S4 = 1 −  + − + − = 1 + − −
3 2 4 3 5 2 4 5
1 1 1 1 1 1 1 1
S5 = 1 + −  − +  − = 1 + − − ,
2 4 5 4 6 2 5 6

de modo que o padrão é


1 1 1
Sn = 1 + − − .
2 n n+1
Dessa forma, lim Sn = 3/2 , e a série converge, com soma igual a 3/2 .

Exemplos como os dois anteriores, em que as somas parciais possuem parcelas que se cancelam, são
chamadas de séries telescópicas.

X 1
Exemplo 3.2.5. . Vamos mostrar que essa série, conhecida como série harmônica, é divergente.
n=1
n
Para isso, vamos mostrar que a sequência das somas parciais possui uma subsequência divergente. Observe:

S1 = 1
1
S2 = 1+
2
1 1 1 1 1 1 2
S4 = 1+ + + >1+ + + =1+
2 3 4 2 |4 {z 4} 2
1/2
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 3
S8 = 1+ + + + + + + >1+ + + + + + + =1+ .
2 3 4 5 6 7 8 2 |4 {z 4} |8 8 {z 8 8} 8
1/2 1/2

Em geral, o padrão é
n
S2n > 1 + .
2
Como lim(1 + n/2) = ∞, temos que S2n → ∞, logo essa subsequência é divergente, de modo que a sequência
das somas parciais é divergente, provando que a série harmônica é divergente.
78 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES


X 1
Exemplo 3.2.6. Na próxima seção mostraremos que 2
é convergente. Um fato impressionante é que
n=1
n
é possı́vel demonstrar (embora não faremos isto nestas notas) que

X 1 π2
2
= .
n=1
n 6
P
Nossa intuição nos indica que se an converge, então lim an = 0, para que a contribuição dos termos
com n grande não altere a soma. Mostraremos a seguir que isso é verdade, mas cuidado, pois a recı́proca
é falsa! Como vimos no exemplo anterior, a série harmônica tem termo geral que tende a zero, mas é
divergente!
P
Teorema 3.2.1. Se an é convergente, então lim an = 0.
P
Demonstração. Como an converge, então existe lim Sn = S, onde (Sn ) é a sequência das somas parciais.
Como an = Sn − Sn−1 , temos

lim an = lim Sn − lim Sn−1 = S − S = 0.

P
Podemos usar esse Teorema da seguinte forma: se lim an 6= 0, então an é divergente. Esse é o nosso
primeiro critério para testar séries, que chamaremos de Teste para Divergência.

X n2 n2 1
Exemplo 3.2.7. 2+4
diverge, pois lim 2+4
= 6= 0.
n=1
5n 5n 5
P P P P
Se as Pséries an e Pbn forem convergentes, com an = A e bn = B, então também são convergentes
as séries (an ± bn ) e can (c ∈ R), com somas A ± B e cA, respectivamente.
∞ ∞ ∞
"   n # X "   n #
n n
X 3n + 2n X 3 2 1 1
Exemplo 3.2.8. Como n
= + = + , essa série é conver-
n=1
6 n=1
6 6 n=1
2 3
gente, pois (1/2)n e (1/3)n são séries geométricas convergentes.
P P

∞  
X 3 2 P
Exemplo 3.2.9. Vamos mostrar que a série n
+ é divergente. De fato, sabemos que 2/n =
n=1
5 n
3/5n = 3(1/5)n converge. Se (3/5n + 2/n) convergisse, terı́amos
P P P P
2 1/n diverge e que
X2 X 3 2
 X
3
= + − ,
n 5n n 5n
P
logo 2/n seria convergente por ser diferença entre séries convergentes. Como sabemos que isso não é
verdade, temos que (3/5n + 2/n) diverge.
P

O argumento acima serveP


para mostrar quePa soma de uma série
P convergente com uma divergente
é sempre divergente! Se an converge e bn diverge, então (an ± bn ) diverge.
Definição 3.2.1. Uma série é alternada se seus termos são alternadamente positivos e negativos.
Exemplo 3.2.10. As seguintes séries são alternadas:

X (−1)n+1 1 1 1 1 1
(a) = 1 − + − + − + . . ..
n=1
n 2 3 4 5 6

X (−1)n n 1 2 3 4 5 6
(b) = − + − + − + − . . ..
n=1
n + 1 2 3 4 5 6 7
3.3. SÉRIES DE TERMOS POSITIVOS 79

(−1)n+1 bn ou (−1)n bn , onde bn > 0 para todo n, dependendo se o


P P
Toda série alternada é da forma
termo inicial é positivo ou negativo.

Teorema 3.2.2 (Teste da Série Alternada - Leibniz).



X X∞
Se uma série alternada (−1)n+1 bn ou (−1)n bn satisfizer
n=1 n=1

(i) bn+1 ≤ bn para todo n;

(ii) lim bn = 0,

então a série é convergente.



X (−1)n−1
Exemplo 3.2.11. . Aqui temos bn = 1/n. É claro que lim bn = 0. Além disso,
n=1
n

1 1
bn+1 = < = bn ,
n+1 n
logo (bn ) é decrescente. Pelo Teste da Série Alternada, esta série é convergente.

X (−1)n+1
Note que (−1)n−1 = (−1)n+1 , portanto a série do exemplo anterior é igual a .
n=1
n

X n2 n2
Exemplo 3.2.12. (−1)n+1 . Dessa vez temos b n = . Também é claro que lim bn = 0. Para
n=1
n3 + 1 n3 + 1
x2
mostrar que bn+1 ≤ bn , vamos estudar a derivada da função f (x) = 3 . Temos
x +1

x(2 − x3 )
f 0 (x) = (Faça as contas!!!)
(x3 + 1)2

Como
√ só estamos interessados em valores positivos de x, teremos f 0 negativa se 2 − x3 < 0 ⇒ x3 > 2 ⇒
3
x > 2 > 1. Logo, (bn ) é decrescente para n ≥ 2. Isso basta para nossos propósitos: a sequência (bn ) deve
ser eventualmente decrescente, ou seja, a partir de certo valor de n ser decrescente (ou não-crescente).
Logo, a série converge pelo Teste da Série Alternada.

X n2
Na prática, mostramos que a série (−1)n converge, mas então
n=2
n3 + 1

∞ ∞
X n2 1 X n n
2
(−1)n = − + (−1)
n=1
n3 + 1 2 n=2 n3 + 1

também converge! Isso ilustra o seguinte fato: omitir uma quantidade finita de termos iniciais não
altera a convergência da série!

3.3 Séries de Termos Positivos


P
Seja an uma série tal que an ≥ 0 para todo n. Então teremos

Sn = a1 + . . . + an ≤ a1 + . . . + an + an+1 = Sn+1 ,

ou seja, (Sn ) é uma sequência monótona não-decrescente. Assim, se mostrarmos que (Sn ) é limitada
superiormente, então teremos garantida a convergência da série pelo Teorema 3.1.4.
80 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES

3.3.1 Teste da Integral


Começamos esta subseção com uma breve revisão sobre integrais impróprias. Existem outros tipos de
integrais impróprias, mas para nós elas serão integrais da forma
Z ∞
f (x)dx, (3.3.1)
a

ou seja, uma integral definida, mas com um intervalo de integração infinito. Como integrais definidas foram
construı́das apenas em intervalos limitados da forma [a, b], a ideia da definição dessa integral será trocar o
limite ∞ por um parâmetro t, calcular a integral, e em seguida fazer t → ∞, ou seja,
Z ∞ Z t
f (x)dx = lim f (x)dx. (3.3.2)
a t→∞ a

Quando o limite acima existe, dizemos que a integral converge. Caso contrário, ela diverge.
Z ∞
dx
Exemplo 3.3.1. Calcule .
1 x
Solução. Pela definição acima, temos
Z ∞ Z t
dx dx
= lim
1 x t→∞ 1 x
t
= lim ln(x)

t→∞ 1
= lim ln(t)
t→∞
= ∞,

logo a integral diverge.

Z ∞
dx
Exemplo 3.3.2. Calcule .
1 x2
Solução. Temos
Z ∞ Z t
dx dx
= lim
1 x2 t→∞ 1 x2
 t
1
= lim −
t→∞ x 1
 
1
= lim 1 −
t→∞ t
= 1,

logo a integral converge.

O Teste da Integral relaciona a convergência de uma série infinita com a de uma integral imprópria.
Teorema 3.3.1 (Teste da Integral). Suponha que f (x) seja uma função contı́nua, positiva e decrescente
(eventualmente) em [1, ∞) e seja an = f (n). Então:
Z ∞ ∞
X
(i) Se f (x)dx converge, então an converge.
1 n=1
Z ∞ ∞
X
(ii) Se f (x)dx diverge, então an diverge.
1 n=1
3.3. SÉRIES DE TERMOS POSITIVOS 81

Demonstração. Comecemos supondo que a integral imprópria converge. Na Figura 3.3.1 temos o gráfico de
uma função f (x) contı́nua, positiva e decrescente para x ≥ 1.
O primeiro retângulo tem base medindo 1 e altura igual a f (1) = a1 , logo sua área é igual a a1 . Em
geral, observe que o n-ésimo
P∞retângulo tem base medindo 1 e altura igual a f (n) = an , logo a soma das áreas
dos retângulos é igual a n=1 an . Excluindo o primeiro retângulo, a soma das áreas dos restantes é menor
Z ∞
que a área sob o gráfico de y = f (x) para x ≥ 1, ou seja, f (x)dx.
1
Assim,
n
X ∞
X ∞
X Z ∞
Sn = ak < an = 1 + an < 1 + f (x).
k=1 n=1 n=2 1

Como a integral imprópria converge, ela é igual a um número real L, logo a expressão acima nos mostra
que Sn é menor que 1 + L para todo n, ou seja
P∞(Sn ) é limitada! Pela observação feita no começo desta seção,
temos que (Sn ) é convergente, logo a série n=1 an é convergente.
Suponha agora que a integral diverge e considere a Figura 3.3.1.

Agora a área abaixo da curva para x ≥ 1 é menor que a soma das áreas dos retângulos, ou seja
Z ∞ ∞
X
f (x)dx < an .
1 n=1

Como a integral diverge, ela deverá ser igual a ∞, logo a série também é igual a infinito por ser maior que
a integral, e portanto diverge.

X 1
Exemplo 3.3.3. O Exemplo 3.3.1 nos fornece outra demonstração de que a série harmônica diverge,
n=1
n

X 1
e o Exemplo 3.3.2 nos mostra que a série 2
converge.
n=1
n
82 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES


X 1
Exemplo 3.3.4. Vamos generalizar o Exemplo anterior e determinar para que valores de p a série p
n=1
n
converge. Estas séries são conhecidas como p-séries. Vamos fazer uma análise geral do caso p 6= 1.
Se p = 0, o termo geral da série é an = 1, portanto lim an = 1 6= 0 e a série diverge pelo Teste para
Divergência. Além disso, se p < 0, então q = −p > 0 e o termo geral é an = n−p = nq , portanto lim an = ∞
e a série diverge pelo mesmo motivo. Se 0 < p 6= 1, então a função f (x) = 1/xp é contı́nua, positiva e
decrescente para x ≥ 1. Aplicamos o Teste da Integral:
Z ∞ Z t
dx dx
p
= lim p
1 x t→∞ 1 x
x=t
x1−p
= lim
t→∞ 1 − p
x=1
1
= lim (t1−p − 1)
1 − p t→∞

∞, se p < 1
= 1
p−1 , se p > 1

Com isso, podemos afirmar que uma p-série converge se p > 1 e diverge se p ≤ 1.

∞ ∞ ∞
X 1 X 1 X 1
Como aplicação do Exemplo acima, temos que 3
converge e √ = 1/2
diverge.
n=1
n n=1
n n=1 n

X 1 1
Exemplo 3.3.5. 2+1
. Considere a função f (x) = 2 . Essa função é contı́nua e positiva. Além
n=1
n x +1
2x
disso, f 0 (x) = − 2 < 0 para x ∈ [1, ∞). Assim, podemos usar o Teste da Integral:
(x + 1)2
Z ∞ Z t x=t
dx dx π π π
= lim = lim arctan(x) = lim (arctan(t) − arctan(1)) = − = .

x 2+1 t→∞ x 2+1 t→∞

x=1 t→∞ 2 4 4
1 1

Logo, a série é convergente.


X ln n ln x
Exemplo 3.3.6. . Temos que a função f (x) = é não-negativa para x ≥ 1, é contı́nua. Além
n=1
n x
1 − ln x
disso, f 0 (x) = < 0 para x > e, logo f é eventualmente decrescente. Assim, fazendo a substituição
x2
u = ln x, obtemos du = dx/x, logo
Z ∞ Z t Z ln t u=ln t
ln x ln x u2 (ln t)2
dx = lim dx = lim udu = lim = lim = ∞,
1 x t→∞ 1 x t→∞ 0 t→∞ 2
u=0
t→∞ 2
logo a série é divergente pelo Teste da Integral.


X 2 2 2
Exemplo 3.3.7. ne−n . A função f (x) = xe−x é positiva e contı́nua para x ≥ 1 e f 0 (x) = (1−2x2 )e−x
n=1
é negativa se x > 1. Assim, podemos usar o Teste da Integral. Fazendo a substituição u = −x2 , temos
du = −2xdx, logo
Z ∞ Z t Z −t2 u u=−t2
2 2 e 1 1 2 1
xe−x dx = lim xe−x dx = − lim du = − lim eu = − lim (e−t − e−1 ) = ,

1 t→∞ 1 t→∞ −1 2 2 t→∞ u=−1 2 t→∞ 2e
logo a série é convergente.
3.3. SÉRIES DE TERMOS POSITIVOS 83

3.3.2 Os Testes da Comparação


P P
Teorema 3.3.2 (Teste da Comparação). Sejam an e bn duas séries de termos positivos e tais que
an ≤ bn . Então:
P P
(i) Se bn for convergente, então an é convergente.
P P
(ii) Se an for divergente, então bn é divergente.
P Pn Pn
Demonstração. (i) Suponha que bn = B. Sejam Sn = i=1 ai e TnP= i=1 bi . Então, como 0 ≤ an ≤ bn ,
temos Sn ≤ Tn < B, logo (Sn ) é limitada superiormente, e portanto an é convergente pelo comentário no
inı́cio desta seção.
P P
(ii) Se bn fosse convergente, então
P a parte (i) garantiria que an teria que ser convergente, mas essa
série é divergente por hipótese. Logo, bn tem que ser divergente.


X 5
Exemplo 3.3.8. . Note que n2 < 2n2 + 4n + 3, logo
n=1
2n2 + 4n + 3

1 1 5 5
< 2 ⇒ 2 < 2.
2n2 + 4n + 3 n 2n + 4n + 3 n
5/n2 é convergente e as duas séries são de termos positivos, então a série dada converge pelo Teste
P
Como
da Comparação.

X ln n
Exemplo 3.3.9. . Já vimos que essa série diverge pelo Teste da Integral, mas usemos esse exemplo
n=1
n
para mostrar que às vezes mais de um teste pode se aplicar para determinar se uma série converge. Temos
que
1 ln n
<
n n
P
se n ≥ 3. Como 1/n é divergente e os termos são todos positivos, concluı́mos que a série dada diverge
pelo Teste da Comparação.

X 1
Exemplo 3.3.10. . Note que
n=1
n!

n! = 1 · 2 · 3 · 4 · . . . · (n − 1) · n ≥ 1 · 2 · 2 · 2 · . . . · 2 · 2 = 2n−1
(as igualdades ocorrem para n = 1 e n = 2). Logo
 n−1
1 1 1
≤ n−1 = .
n! 2 2
Como (1/2)n−1 é uma série geométrica convergente (pois |1/2| < 1) e os termos gerais são todos positivos,
P
concluı́mos que a série dada converge pelo Teste da Comparação.

X 1
Mostraremos no Exemplo 3.6.6 que = e.
n=1
n!

X n!
Exemplo 3.3.11. . Note que
n=1
nn

n! 1 · 2 · 3 · . . . · (n − 1) · n 2
= ≤ 2
nn n · n · n · ... · n · n n
3 · ... · n
2/n2 converge e os termos são positivos, a série dada
P
se n ≥ 2, já que ≤ 1 se n > 2. Como
n · ... · n
converge pelo Teste da Comparação.
84 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES

P P
Teorema 3.3.3 (Teste da Comparação do Limite). Sejam an e bn duas séries de termos positivos tais
que
an
lim = c,
bn
onde c ∈ R e c > 0. Então as duas séries têm o mesmo comportamento, ou seja, ou ambas convergem ou
ambas divergem.
Demonstração. Como existe o limite lim an /bn = c > 0, podemos tornar abnn tão próximo de c quanto
quisermos, desde que tomemos n suficientemente grande. Assim, podemos obter um n0 ∈ N tal que

an c
<
bn 2

se n ≥ n0 . Em outras palavras, se n ≥ n0 , então


c an 3c
< < ,
2 bn 2
logo
c 3c
bn < an < bn .
2 2
Como c > 0¡ as três sequências que aparecem na desigualdade acima P são de termos positivos, logo podemos
usar o Teste da Comparação para determinar as convergências. Se an converge, então a desigualdade
c
bn < an
2
P P
garante que bn converge. Da mesma forma, se bn converge, então a desigualdade
3c
an < bn
2
P
garante que an converge, portanto quando uma das séries converge, a outra também converge, e analoga-
mente podemos mostrar que quando uma diverge, o mesmo ocorre com a outra, o que conclui a demonstração.

∞ ∞ ∞
X n2 − 1 X n2 X 1
Exemplo 3.3.12. 4
. Compare com 4
= , que é convergente (tome as maiores potências
n=1
3n + 1 n=1
n n=1
n2
de n presentes no numerador e no denominador). Como
n2 −1
3n4 +1 n4 − n2 1
lim 1 = lim = > 0,
n2
3n4 + 1 3
a série dada também converge.
∞ ∞ ∞
X 2n2 + 3n X n2 X 1
Exemplo 3.3.13. √ . Compare com √ = √ , que é divergente. Como
n=1
5+n 5
n=1 n 5
n=1
n
2
2n
√ +3n
r
5+n5 n5 2n2 + 3n 
lim 2 = lim = 2 > 0,
√n 5 + n5 n2
n5

a série dada também diverge.


∞  2
X 1
e−n . Temos que
P −n P
Exemplo 3.3.14. 1+ e = (1/e)n é uma série geométrica convergente e
n=1
n
 2
1 + n e−n
1  2
1
lim = lim 1 + = 1 > 0,
e−n n
logo a série dada também converge.
3.4. CONVERGÊNCIA ABSOLUTA 85

3.4 Convergência Absoluta


P P
Definição 3.4.1. Uma série an é absolutamente convergente se |an | for convergente.
Exemplo 3.4.1.

X (−1)n−1
(a) A série é convergente pelo Teste da Série Alternada e é absolutamente convergente pois
n=1
n2
∞ ∞
(−1)n−1 X

X
= 1

n2 converge.
n=1
n2
n=1

X (−1)n−1
(b) A série é convergente pelo Teste da Série Alternada, mas não é absolutamente convergente
n=1
n
∞ ∞
(−1)n−1 X

X 1
pois = diverge.

n=1
n n
n=1
P P
Definição 3.4.2. Se an converge, mas não converge absolutamente, dizemos que an converge con-
dicionalmente.
Uma das importâncias da convergência absoluta dá-se pelo seguinte resultado:
Teorema 3.4.1. Toda série absolutamente convergente é convergente.
P P
Demonstração. Suponha que an converge absolutamente. Logo, |an | converge. Note que

0 ≤ an + |an | ≤ 2|an |.
P P P P
Pelo Teste da Comparação, a série (an + |an |) é convergente. Mas então an = (an + |an |) − an
converge por ser igual à diferença entre séries convergentes.

X cos n
Exemplo 3.4.2. . Observe que
n=1
n2

cos n 1
0 ≤ 2 ≤ 2 .

n n

X cos n
Assim, n2 converge pelo Teste da Comparação. Concluı́mos que a série dada converge absolutamente

n=1
e, portanto, converge.

3.4.1 Os Testes da Razão e da Raiz

Dois dos testes de convergência mais poderosos envolvem a convergência absoluta. Eles levam uma
enorme vantagem sobre os Testes da Comparação pois não necessitam de uma outra série que saibamos de
antemão se converge ou diverge. De certa forma, estes testes comparam uma série com ela própria, como
veremos na demonstração do próximo Teorema.

an+1
Teorema 3.4.2 (Teste da Razão - D’Alembert). Suponha que lim = L. Então:
an
P
(a) Se L < 1, então an converge absolutamente.
P
(b) Se L > 1, então an diverge.
(c) Se L = 1, nada podemos afirmar.
86 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES

Demonstração. Primeiramente, note que L ≥ 0 pois an+1 /an > 0 para todo n. Suponha que L < 1 e escolha
c ∈ R tal que L < c < 1. Novamente, a ideia será usar o Teste da Comparação. Como lim |an+1 /an | = L < c,
existe N ∈ N tal que
an+1
an < c < 1

para todo n ≥ N (conforme a Figura 3.4.1). Com isso, temos |an+1 | < c|an | para todo n ≥ N , ou
seja, |aN +1 | < c|aN |, |aN +2 | < c|aN +1 | < c2 |aN |, |aN +3 | < c|aN +2 | < c3 |aN |, etc. Em geral, temos
|aN +n | < cn |aN |, dePmodo que para n ≥ N , a sequência (|an |) torna-se sempre menor que o termo geral
da série geométrica
P |cn , que é convergente pois 0 ≤ c < 1, logo o Teste da Comparação garante que
|aNP
|an | converge, ou seja, an é absolutamente convergente.
Por outro lado, se L > 1, então existe N ∈ N tal que

an+1
an > 1

sempre que n ≥ N (novamente, conforme a Figura 3.4.1. Daı́, |an+1 | >P|an | para todo n ≥ N , logo (|an |) é
(eventualmente) crescente, de modo que lim an 6= 0, o que garante que an diverge.

Figura 3.4.1: Ilustração da demonstração


X (−1)n n3
Exemplo 3.4.3. . Temos
n=1
3n

(n+1)3 3 3
3n 3n
 
an+1 3n+1 n+1 n+1 1 1
lim = lim
n3
= lim = lim = 13 · = < 1,
an 3n
n 3n+1 n 3 · 3n 3 3

logo a série converge absolutamente.



X n!
Exemplo 3.4.4. n
. Nesse caso,
n=1
e

(n+1)!
(n + 1)! en (n + 1)n! en

an+1 en+1 1
lim = lim
n!
= lim n+1
= lim = lim(n + 1) = ∞ > 1.
an en
n! e n! een e

Logo, a série diverge.


3.4. CONVERGÊNCIA ABSOLUTA 87


X nn
Exemplo 3.4.5. . Temos que
n=1
n!

(n+1)n+1 n
(n + 1)n+1 (n + 1)(n + 1)n n!

an+1 (n+1)! n! n+1
lim
= lim
nn = lim = lim = lim
an n!
nn (n + 1)! nn (n + 1)n! n

Mas  n  n
n+1 1
lim = lim 1 + =e>1
n n
pelos cálculos que fizemos acima. Logo, a série diverge.

X 2 · 4 · 6 · 8 · . . . · (2n)
Exemplo 3.4.6. . Note que
n=1
n!

2 · 4 · 6 · 8 · . . . · (2n) (2 · 1) · (2 · 2) · (2 · 3) · (2 · 4) · . . . · (2n) 2n n!
= = = 2n .
n! n! n!

X
Logo, a série é igual a 2n , uma série geométrica divergente.
n=1


X 10n
Exemplo 3.4.7. . Temos
n=1
(n + 1)42n+1

10n+1
10n+1 n + 1 42n+1

an+1 [(n+1)+1]42(n+1)+1 1 10
lim
= lim
10n = lim = 10 · 1 · 2 = < 1.
an (n+1)42n+1
10n n + 2 42n+3 4 16

Logo, a série converge absolutamente.


p
n
Teorema 3.4.3 (Teste da Raiz - Cauchy). Suponha que lim |an | = L. Então:
P
(i) Se L < 1, então an converge absolutamente.
P
(ii) Se L > 1, então an diverge.

(iii) Se L = 1, nada podemos afirmar.

Demonstração. A ideia é a mesmapda demonstração do Teste da Razão. Se 0 ≤ L < 1, escolha c tal que
L < c < 1. Existe N ∈ N tal que n |an | < c < 1 para todo n ≥ N (mais uma vez, de acordo com a Figura
3.4.1), portanto |an | < cn para todo n ≥ N . Assim, para os valores de n a partir de N P, a sequência (|an |)
é menor que o termo geral de uma série geométrica
P convergente, pois 0 < c < 1, logo |an | converge pelo
Teste da Comparação, o que garante que an converge absolutamente.
Por outro lado, se L > 1, então existe N ∈ N tal que
P |an | > 1 se n ≥ N (observe, novamente, a Figura
3.4.1), mas isso impede que lim an seja igual a zero e an diverge.
∞  n
X 2n + 3
Exemplo 3.4.8. . Temos
n=1
3n + 2

p
n 2n + 3 2
lim |an | = lim = < 1,
3n + 2 3
logo a série é absolutamente convergente.
88 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES


X (−1)n
Exemplo 3.4.9. . Temos
n=1
(arctan n)n

p
n 1 1 1 2
lim |an | = lim = = = < 1,
arctan n lim arctan n π/2 π

logo a série converge absolutamente.


X (−1)n
Exemplo 3.4.10. Determine se a série converge ou não. Em caso afirmativo, determine se a
n=2
n ln n
convergência é condicional ou absoluta.

1
Para determinar se a série converge, usamos o Teste da Série Alternada. É claro que lim = 0. A
n ln n
1
função f (x) = é positiva e e decrescente para x ≥ 2 por ser produto de funções positivas e decrescentes.
x ln x
1
Logo, bn = é decrescente, e a série converge.
n ln n

X 1 1
Para verificar a convergência absoluta, temos que analisar . Como f (x) = é contı́nua,
n=1
n ln n x ln x
positiva e decrescente para x ≥ 2, vemos que o Teste da Integral se aplica. Fazendo a mudança de variável
u = ln x, de modo que du = dx/x, obtemos
Z ∞ Z t Z ln t u=ln t
dx dx du  
= lim = lim = lim ln u = lim ln(ln t) − ln(ln 2) = ∞,

2 x ln x t→∞ 2 x ln x t→∞ ln 2 u t→∞ u=ln 2 t→∞

portanto a série diverge. Assim, a convergência da série dada é apenas condicional.

Exemplo 3.4.11. Vale ressaltar que sempre que um dos Testes da Razão ou da Raiz for incon-
clusivo (ou seja, se L = 1), então o outro Teste também é! Vejamos dois casos que mostram quem
realmente nada podemos concluir no caso L = 1.


X 1
(a) . Temos
n=1
n

an+1
lim
= lim 1/(n + 1) = lim n = 1,
an 1/n n+1
e a série é divergente.

X 1
(b) 2
. Temos
n=1
n
2
1/(n + 1)2

an+1 n
lim
= lim = lim = 12 = 1,
an 1/n2 n+1
e a série é convergente.

Os
testes
da Razão e da Raiz também podem ser usados para calcular limites de sequências, pois se
an+1 p P
lim < 1 ou lim n |an | < 1, então lim an = 0, pois nesses casos os testes afirmam que an é conver-
an
gente.
3.5. EXEMPLOS GERAIS DE SÉRIES - ESTRATÉGIAS PARA ESCOLHER OS TESTES 89

3.5 Exemplos gerais de séries - Estratégias para escolher os testes

Nas seções anteriores, nosso trabalho de escolher qual teste de convergência usar foi facilitado pois cada
uma abordava um teste especı́fico (por exemplo, quando falamos sobre o Teste da Integral, os exemplos que
fizemos obviamente usariam esse teste). Nesta seção vamos resolver mais Exemplos, mas sem tratar apenas
de um teste especificamente, e com isso definiremos algumas estratégias de quais testes são mais eficazes com
determinados tipos de séries.

X n−1
Exemplo 3.5.1. 2+n
. Como o termo geral é uma função racional, podemos usar o Teste da Com-
n=1
n
∞ ∞
X n X 1
paração do Limite comparando com 2
= , que é uma p-série divergente. Assim,
n=1
n n=1
n
n−1
n2 +n n2 − n
lim 1 = lim = 1,
n
n2 + n
que é um número real positivo, logo o Teste da Comparação do Limite garante que as duas séries divergem.

X n−1
Exemplo 3.5.2. (−1)n . A série é alternada, então a estratégia óbvia é usar o Teste da Série
n=1
n2 + n
Alternada. Antes disso convém verificar se a série é absolutamente convergente, pois se fosse, sua convergência
já estaria garantida, mas isso não ocorre pois
∞ X ∞
(−1)n n − 1 = n−1
X
2 + n 2+n
,
n=1
n n=1
n

que é a série divergente do Exemplo anterior.


n−1
Então, aplicamos o Teste da Série Alternada. Temos bn = , logo é claro que lim bn = 0. Falta
n2 + n
mostrar que (bn ) é (eventualmente) decrescente, o que faremos calculando a derivada da função f (x) =
x−1
, que é
x2 + x
−x2 + 2x + 1
f 0 (x) = .
(x2 + x)2
O denominador é positivo para x > 0, e o numerador é uma função quadrática côncava para baixo, portanto
torna-se negativo a partir de um certo valor de x (observe a Figura 3.5.1), logo f é decrescente a partir desse
valor de x.
Daı́, (bn ) é eventualmente decrescente, e portanto a série converge pelo Teste da Série Alternada.

X n3 + 3n + 1
Exemplo 3.5.3. . Nesse caso, o termo geral também é uma função racional, então o Teste
n=1
n3 + 7n + 9
da Comparação do Limite já deve surgir como candidato, mas não é necessário. Como
n3 + 3n + 1
lim = 1 6= 0,
n3 + 7n + 9
a série diverge pelo Teste para Divergência.
∞  n
X 3n
Exemplo 3.5.4. . O termo geral é uma grande potência, portanto o Teste da Raiz é uma
n=1
1 + 8n
escolha um tanto quanto óbvia. Temos
s n
n 3n 3n 3
lim = lim = < 1,
1 + 8n 1 + 8n 8
logo a série converge!
90 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES

Figura 3.5.1: Parábolas côncavas para baixo


X 2n n!
Exemplo 3.5.5. . Como o termo geral apresenta fatoriais, o Teste da Razão é o mais indicado.
n=1
(n + 2)!
Temos
2n+1 (n+1)!
an+1 (n+3)! (n + 1)n! (n + 2)! n+1
lim
= lim
2n n!
= lim 2 = 2 lim = 2 > 1,
an (n+2)!
n! (n + 3)(n + 2)! n+3
logo a série diverge.

X 3
Exemplo 3.5.6. n2 e−n . Uma série como essa é uma das poucas que chama pelo Teste da Integral,
n=1
pois seu termo geral pode ser simplificado através de uma substituição. Antes de usar esse teste, precisamos
3
mostrar que a função f (x) = x2 e−x é contı́nua, positiva e (eventualmente) decrescente para x ≥ 1.
Bem, é claro que f (x) é contı́nua e positiva. Além disso, sua derivada é
2
f 0 (x) = xe−x (2 − 3x3 ).
Como estamos pinteressados apenas em valores positivos depx, basta analisar o sinal de 2 − 3x3 , que é negativo
3 3
para todo x > 2/3, portanto f é decrescente para x > 2/3, e o mesmo vale para (bn ).
Agora podemos calcular a integral. Temos
Z ∞ Z t
3 3
x2 e−x dx = lim x2 e−x dx
1 t→∞ 1
−t3
eu du
Z  
= lim − (Fazendo u = −x3 , du = −3x2 dx)
t→∞ −1 3
u=−t3
1 u

= − lim e
3 t→∞ u=−1
1 3
= − lim (e−t − e−1 )
3 t→∞
1
=
3e

Como a integral imprópria é convergente, a série também é.



X
Exemplo 3.5.7. senn. Basta ver que, como lim senn não existe, a série diverge pelo Teste para
n=1
Divergência.
3.5. EXEMPLOS GERAIS DE SÉRIES - ESTRATÉGIAS PARA ESCOLHER OS TESTES 91


X n
Exemplo 3.5.8. (−1)n 2 + 25
. Novamente, temos uma série alternada. Testando a convergência
n=1
n

X n
absoluta, temos que analisar a série 2
, que pode ser testada usando o Teste da Comparação do
n=1
n + 25
P
Limite com a série 1/n, que é divergente. No entanto,

n
n2 +25 n2
lim 1 = lim = 1,
n
n2 + 25

portanto ambas as séries divergem e a série deste Exemplo não converge absolutamente.
n
Então, usamos o Teste da Série Alternada. Temos bn = 2 , logo é claro que lim bn = 0. Além disso,
n + 25
x
a derivada da função f (x) = 2 é
x + 25
−x2 + 25
f 0 (x) = ,
(x2 + 25)2

que é negativa para x > 5, portanto (bn ) decresce para n > 5. Daı́, a série é convergente.


X ln n
Exemplo 3.5.9. . Nesse caso, podemos ver pela Regra de L’Hospital que
n=1
n2

ln n 1/n 1
lim 2
= lim = lim 2 = 0,
n 2n 2n

logo o Teste para Divergência não nos ajuda. O Teste da Razão também é inconclusivo, pois
2
ln(n + 1)/(n + 1)2

ln(n + 1) n
lim = lim
ln(n)/n2 ln(n) n+1
 
ln(n + 1) n
= lim lim (Propriedade dos Limites)
ln(n) n+1
ln(n + 1)
= lim
ln(n)
1/(n + 1)
= lim (Pela Regra de L’Hospital)
1/n
n
= lim
n+1
= 1.

Assim, o Teste da Raiz também é inconclusivo. Como não há nenhuma série óbvia para fazermos com-
ln x
paração, vamos usar o Teste da Integral. Temos que mostrar que a função f (x) = 2 é contı́nua, positiva
x
e (eventualmente) decrescente para x ≥ 1.
É claro que f é contı́nua e positiva para x > 1, então só falta mostrar que é decrescente. Temos que

1 − 2 ln x
f 0 (x) = .
x3

Como x > 1, o denominador será sempre positivo, portanto


√ o sinal da derivada é o mesmo do numerador,
que é negativo se 1 − 2 ln x < 0 ⇔ ln x > 1/2 ⇔ x > e, logo f é eventualmente decrescente.
92 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES

Com isso, podemos calcular a integral:


Z ∞ Z t
ln x ln x
2
dx = lim dx
1 x t→∞ 1 x2
t Z t
ln x dx
= lim − + 2
(Integramos por partes)
t→∞ x 1 1 x
 t
ln x 1
= lim − −
t→∞ x x 1
 
ln t 1
= lim − − +1
t→∞ t t
 
ln t
= 1 + lim −
t→∞ t
1/t
= 1 − lim (Pela Regra de L’Hospital)
t→∞ 1
= 1.

Daı́, a integral imprópria é convergente, e portanto a série também é.



X n+5
Exemplo 3.5.10. . Como o termo geral contém uma potência, podemos usar tanto o Teste da
n=1
5n
Razão quanto o Teste da Raiz. Usaremos o da Razão:
(n+1)+5 n+6
5n+1 5n+1 1 n+6 1
lim n+5 = lim n+5 = lim = < 1,
5n 5n
5 n+5 5

logo a série converge.



X 1
Exemplo 3.5.11. . O termo cos2 n indica que o Teste da Comparação pode ser útil. Temos
n=1
n + n cos2 n
cos2 n ≤ 1 para todo n, logo n cos2 n ≤ n para todo n. Daı́, n + n cos2 n ≤ 2n, logo
1 1

n + n cos2 n 2n
P
para todo n. Como a série de termo geral 1/2n é divergente, concluı́mos pelo Teste da Comparação que
a série dada é divergente.

3.6 Séries de Potências



X
Uma série de potências é uma série da forma cn xn , onde os cn ’s são os coeficientes da série e x é uma
n=0
variável. Mais geralmente, podemos considerar séries de potências de (x − a), ou ao redor de x = a, cuja
X∞
forma é cn (x − a)n .
n=0
Para cada valor de x fixado, uma série de potências torna-se uma série numérica, que pode convergir ou

X 1
não. Por exemplo, se cn = 1 para todo n, temos uma série geométrica xn , que converge para se
n=0
1−x
|x| < 1 e diverge caso contrário.
1
Como vimos no exemplo acima, a soma da série é a função , cujo domı́nio é |x| < 1, o conjunto no
1−x
qual a série converge. Nosso objetivo inicial será estudar o conjunto no qual uma dada série de potências é
3.6. SÉRIES DE POTÊNCIAS 93


X
convergente. É claro que uma série de potências cn (x − a)n sempre converge quando x = a (a soma da
n=0
série é igual a zero).

3.6.1 Raio de convergência

Exemplo 3.6.1. Determine onde as séries de potências são convergentes.



X
(a) n!xn . Vamos usar o Teste da Razão:
n=0

(n + 1)!xn+1

an+1
lim
= lim
= lim(n + 1)|x| = ∞ > 1
an n!xn

se x 6= 0. Logo, a série converge apenas para x = 0, pela observação acima.



X xn
(b) . Nesse caso,
n=0
n!
n+1
an+1 x /(n + 1)! |x|
lim
= lim

= lim n + 1 = 0 < 1
an xn /n!

para todo x. Logo, a série converge (absolutamente) para todo x ∈ R.



X (x − 3)n
(c) . Aqui temos
n=1
n

(x − 3)n+1 /(n + 1)

an+1
lim
= lim
= lim |x − 3| n = |x − 3|.
an (x − 3)n /n n+1
Assim, o Teste da Razão nos diz que:

• A série converge (absolutamente) se |x − 3| < 1, ou seja, se x ∈ (2, 4).


• A série diverge se |x − 3| > 1, ou seja, se x ∈ (−∞, 2) ∪ (4, ∞).
• Quando |x − 3| = 1, ou seja, se x = 2 ou x = 4, o teste é inconclusivo.

Desse modo, precisamos verificar separadamente o que ocorre nesses pontos. Quando x = 2, a série

X (−1)n
torna-se , que é convergente (consulte o Exemplo 3.2.11 ou use o Teste da Série Alternada),
n=1
n

X 1
e quando x = 4 a série é , a série harmônica, que é divergente. Assim, a série converge se
n=1
n
x ∈ [2, 4) .

O exemplo anterior ilustra o seguinte Teorema:



X
Teorema 3.6.1. Dada uma série de potências cn (x − a)n , uma das possibilidades a seguir sempre ocorre:
n=0

(i) A série converge apenas quando x = a.


(ii) A série converge para todo x ∈ R.
(iii) Existe R > 0 tal que a série converge se |x − a| < R e diverge se |x − a| > R.
94 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES

O número R no Teorema acima é chamado de raio de convergência da série. Definimos R = 0 e


R = ∞ nos casos (i) e (ii), respectivamente. Como vimos nos Exemplos acima, a técnica fundamental para
determinar o raio de convergência de uma série de potências é o Teste da Razão, mas também podemos usar
o Teste da Raiz.
O caso (iii) diz que a série converge se x ∈ (a − R, a + R) e diverge se x ∈ (−∞, a − R) ∪ (a + R, ∞).
Como nada é dito sobre o que ocorre nos pontos x = a − R e x = a + R, precisamos testar a convergência
nesses valores separadamente.
O conjunto de pontos em que a série converge é chamado de intervalo de convergência.

X (−3)n xn
Exemplo 3.6.2. √ . Temos
n=0
n+1
n+1 n+1
√ r
an+1
= lim (−3) x / n + 2 n+1

lim √
(−3)n xn / n + 1 = lim 3|x| = 3|x|.
an n+2

Para que a série seja absolutamente convergente, devemos ter 3|x| < 1, logo |x| < 1/3, ou seja, o raio de
convergência é R = 1/3 .
Logo, o Teste da Razão diz que a série converge absolutamente se x ∈ (−1/3, 1/3). Agora testamos nos
∞ ∞
X (−3)n (−1/3)n X 1
extremos: se x = −1/3, a série é √ = √ , que é divergente (faça as contas!), e
n=0
n + 1 n=0
n +1
∞ ∞
X (−3)n (1/3)n X (−1)n
se x = 1/3, a série é √ = √ , que converge pelo Teste da Série Alternada. Logo, o
n=0
n+1 n=0
n+1
intervalo de convergência é (−1/3, 1/3] .

X (−1)n−1 xn
Exemplo 3.6.3. . Nesse caso,
n=1
n3

n+1
/(n + 1)3 n3

= lim |x|
an+1
lim n 3
= lim |x| = |x|,
an |x| /n (n + 1)3

logo devemos ter |x| < 1 para que a série seja absolutamente convergente, portanto o raio de convergência é
R=1.
Pelo Teste da Razão, a série converge absolutamente se x ∈ (−1, 1). Quando x = −1, a série é
∞ ∞ ∞
X (−1)n−1 (−1)n X (−1)2n−1 X 1
3
= 3
= − 3
, que é uma p-série convergente (note que 2n − 1 é ı́mpar,
n=1
n n=1
n n=1
n

X (−1)n−1
logo (−1)2n−1 = −1). Quando x = 1, a série é , que é uma série alternada convergente. Assim,
n=1
n3
o intervalo de convergência é [−1, 1] .

X xn
Exemplo 3.6.4. . Usamos o Teste da Raiz:
n=2
(ln n)n

p
n |x|
lim |an | = lim =0<1
ln n
para todo x ∈ R. Logo, o intervalo de convergência é R e o raio é infinito.

X xn
Exemplo 3.6.5. . Mais uma vez, o Teste da Raiz nos dá
n=1
n3n

p
n |x| |x|
lim |an | = lim √ = ,
3nn 3
3.6. SÉRIES DE POTÊNCIAS 95

logo para que a série seja absolutamente convergente devemos ter |x|/3 < 1, portanto |x| < 3. Daı́, o raio de
convergência é R = 3 e a série converge absolutamente se x ∈ (−3, 3).
∞ ∞
X (−3)n X (−1)n
Quando x = −3, a série torna-se = , que converge, e quando x = 3, temos
n=1
n3n n=1
n
∞ ∞
X 3n X 1
n
= , que diverge. Logo, o intervalo de convergência é [−3, 3) .
n=1
n3 n=1
n

3.6.2 Representação de funções por séries de potências



X 1
No inı́cio da seção vimos que xn = 1 + x + x2 + x3 + . . . = se |x| < 1, ou seja, temos uma
n=0
1−x
função sendo representada por uma série de potências.

X
Suponha que f (x) tem representação em série de potências de (x − a) dada por cn (x − a)n , ou seja,
n=0
2 3
f (x) = c0 + c1 (x − a) + c2 (x − a) + c3 (x − a) + . . . (∆)
Vamos usar a equação (∆) acima para obter uma fórmula para os coeficientes cn da série.
• Comece fazendo x = a em (∆). Obtemos c0 = f (a).
• Derive (∆). Temos f 0 (x) = c1 + 2c2 (x − a) + 3c3 (x − a)2 + . . . Fazendo x = a obtemos c1 = f 0 (a).
• Derive mais uma vez. Obtemos f 00 (x) = 2c2 + 6c3 (x − a) + . . .. Faça x = a para obter c2 = f 00 (a)/2.
• Derivando mais uma vez e aplicando x = a, obtemos c3 = f 000 (a)/6.
• Em geral, ao derivarmos (∆) n vezes, obtemos f (n) (x) = n!cn + (potências de (x − a)). Logo, fazendo
f (n) (a)
x = a resta apenas f (n) (a) = n!cn , portanto cn = .
n!
Acabamos de demonstrar o seguinte Teorema:

X f (n) (a)
Teorema 3.6.2. Se f tem representação em série de potências cn (x − a)n , então cn = .
n=0
n!
∞ (n)
X f (a)
A série de potências (x − a)n é chamada de série de Taylor de f em torno de x = a. Quando
n=0
n!

X f (n) (0) n
a = 0, obtemos a série x , que é chamada de série de Maclaurin de f . Não confunda f (n)
n=0
n!
(uma derivada) com f n (uma potência). Adotaremos a convenção f (0) (x) = f (x).
Exemplo 3.6.6. Obtenha a série de Maclaurin da função f (x) = ex .

X xn
Solução. Temos f (n) (x) = ex para todo n, logo f (n) (0) = 1 para todo n, e a série é . Já mostramos
n=0
n!
que essa série converge para todo x ∈ R, logo

X xn
ex =
n=0
n!

para todo x ∈ R. Fazendo x = 1, obtemos a fórmula



X 1
e= .
n=0
n!
96 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES

2
Exemplo 3.6.7. Obtenha a série de Maclaurin da função f (x) = e−x .

Solução. Usamos a conta feita acima, trocando x por −x2 . Obtemos

∞ ∞
2 X (−x2 )n X (−1)n x2n
e−x = = .
n=0
n! n=0
n!

Exemplo 3.6.8. Obtenha a série de Maclaurin da função f (x) = sen(x).

Solução. Note que f (0) (x) = sen(x), f (1) (x) = cos(x), f (2) (x) = − sen(x), f (3) (x) = − cos(x) e f (4) (x) =
sen(x), logo o padrão se repetirá! Teremos f (0) = 0, f (1) (0) = 1, f (2) (0) = 0, f (3) (0) = −1, f (4) (0) = 0,
f (5) (0) = 1, f (6) (0) = 0, f (7) (0) = −1, sempre repetindo o ciclo (0, 1, 0, −1). Assim, a série é

1 1 1 1 x3 x5 x7
sen(x) = 0 + x + 0 − x3 + 0 + x5 + 0 − x7 + . . . = x − + − + ...
1! 3! 5! 7! 3! 5! 7!
Assim, podemos escrever

X (−1)n x2n+1
sen(x) =
n=0
(2n + 1)!

Exemplo 3.6.9. Obtenha a série de Maclaurin da função f (x) = x sen(x).

Solução. Novamente aproveitamos as contas já feitas. Temos

∞ ∞
X (−1)n x2n+1 X (−1)n x2n+2
f (x) = x sen(x) = x =
n=0
(2n + 1)! n=0
(2n + 1)!

1
Exemplo 3.6.10. Represente a função f (x) = como série de potências.
x+2

1 X
Solução. Usamos a série geométrica: = xn se |x| < 1. Assim,
1 − x n=0

∞ ∞ ∞
1 1 1 1 1 1X 1 X (−1)n xn X (−1)n xn
= = = (−x/2)n = = .
x+2 2 1 + x/2 2 1 − (−x/2) 2 n=0 2 n=0 2n n=0
2n+1

A série geométrica converge se o módulo de sua razão, que é −x/2, for menor que 1:

| − x/2| < 1 ⇒ |x| < 2,

portanto o raio de convergência é R = 2 e o intervalo de convergência é (−2, 2). Esse é o conjunto de pontos
em que a igualdade acima é verdadeira (já sabemos que uma série geométrica não converge nos extremos de
seu intervalo de converge ncia).

x3
Exemplo 3.6.11. Represente a função f (x) = . como série de potências.
x+2
3.6. SÉRIES DE POTÊNCIAS 97

1
Solução. Escrevemos f (x) = x3 e usamos a série do item anterior:
x+2
∞ ∞
X (−1)n xn X (−1)n xn+3
f (x) = x3 =
n=0
2n+1 n=0
2n+1

1
Exemplo 3.6.12. Represente a função f (x) = como série de potências.
1 + x2
Solução. Novamente fazemos
∞ ∞
1 1 X
2 n
X
= = (−x ) = (−1)n x2n
1 + x2 1 − (−x2 ) n=0 n=0

3.6.3 Derivação e integração de séries de potências


X
Teorema 3.6.3. Se f (x) = c0 + c1 (x − a) + c2 (x − a)2 + c3 (x − a)3 + . . . = cn (x − a)n , com raio de con-
n=0
vergência R, então

X
(i) f 0 (x) = c1 + 2c2 (x − a) + 3c3 (x − a)2 + . . . = ncn (x − a)n−1
n=1
2 ∞
(x − a) (x − a)3 cn (x − a)n+1
Z X
(ii) f (x)dx = C + c0 (x − a) + c1 + c2 + ... = C +
2 3 n=0
n+1
Além disso, as duas séries de potência acima também têm seus raios de convergência iguais a R
Note que o Teorema acima garante o mesmo raio, mas não o mesmo intervalo de convergência!
Nos exemplos abaixo, vamos obter uma representação em série de potências para a função dada e calcular
o raio e o intervalo de convergência.
Exemplo 3.6.13. f (x) = arctan(x).
Solução. Já vimos que

1 X
= (−1)n x2n .
1 + x2 n=0

Como (arctan(x))0 = 1/(1 + x2 ), por integração obtemos



X (−1)n x2n+1
arctan(x) = C + .
n=0
2n + 1

Para determinar a constante, faça x = 0 para obter

0 = arctan(0) = C + 0 ⇒ C = 0.

Daı́, encontramos

X (−1)n x2n+1
arctan(x) =
n=0
2n + 1

Como a série para 1/(1+x2 ) tinha raio de convergência R = 1, então esse também é o raio de convergência
para arctan(x), que portanto converge se x ∈ (−1, 1). Precisamos testar os extremos do intervalo:
98 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES


X (−1)n
• x = −1 A série é − , que é convergente (por que?).
n=0
2n + 1

X (−1)n
• x = 1 A série é , que é convergente.
n=0
2n + 1
Assim, o intervalo de convergência é [−1, 1], apesar de o da série original ser (−1, 1).

Exemplo 3.6.14. f (x) = cos(x)


Solução. Já vimos, no Exemplo 3.6.8, que

X (−1)n x2n+1 x3 x5 x7
sen(x) = =x− + − + ...
n=0
(2n + 1)! 3! 5! 7!

Por derivação, vamos obter



x2 x4 x6 X (−1)n x2n
cos(x) = 1 − + − + ... =
2! 4! 6! n=0
(2n)!

Para determinar o raio de convergência dessas séries, usamos o Teste da Razão:


|x|2n+3
an+1 (2n+3)! (2n + 1)! 1
lim
= lim
|x|2n+1
= lim |x|2 = |x|2 lim =0<1
an (2n + 3)! (2n + 3)(2n + 2)
(2n+1)!

para todo x ∈ R. Logo, as duas séries convergem para todo x ∈ R e possuem raio de convergência infinito.

Exemplo 3.6.15. f (x) = ln(1 − x).



1 X
Solução. Sabemos que = xn . Por integração, obtemos
1 − x n=0

X xn+1
− ln(1 − x) = C + .
n=0
n+1

Para determinar a constante, faça x = 0 para obter C = 0. Daı́, temos que



X xn+1
ln(1 − x) = −
n=0
n+1

com raio de convergência R = 1, o mesmo da série original. Temos garantia de convergência para x ∈ (−1, 1).
Nos extremos, temos:

X (−1)n+1
• x = −1 A série é − , que é convergente (por que?).
n=0
n+1

X 1
• x = 1 A série é − , que é divergente (por que?).
n=0
n + 1

Assim, o intervalo de convergência é [−1, 1) .

x2
Exemplo 3.6.16. f (x) = .
(1 − 2x)2
3.6. SÉRIES DE POTÊNCIAS 99

1 1 1
Solução. Vamos escrever f (x) = x2 e analisar . Se conseguirmos representar
(1 − 2x)2 (1 − 2x)2 (1 − x)2
1
como série de potências, podemos obter a representação de trocando x por 2x.
(1 − 2x)2
 0
1 1
Observe que = . Logo,
1−x (1 − x)2

1 X
= nxn−1 .
(1 − x)2 n=1

Daı́, temos
∞ ∞
1 X
n−1
X
= n(2x) = n2n−1 xn−1 .
(1 − 2x)2 n=1 n=1

Finalmente,

x2 X
= n2n−1 xn+1
(1 − 2x)2 n=1

Note que também poderı́amos escrever


x2 X
= (n + 1)2n xn+2
(1 − 2x)2 n=0


X ∞
X
Como xn converge se |x| < 1, sua derivada nxn−1 herda o raio de convergência R = 1. Assim,
n=0 n=1

X ∞
X
n(2x)n−1 converge se |2x| < 1 ⇒ |x| < 1/2. O mesmo vale para n2n−1 xn+1 . Falta testar os extremos:
n=1 n=1
∞ ∞
X X (−1)n+1 n
• x = −1/2 A série é n2n−1 (−1/2)n+1 = , que diverge (Por que?).
n=1 n=1
4

X n
• x = 1/2 A série é , que também diverge (Por que?).
n=1
4

Assim, o raio de convergência é R = 1/2 e o intervalo de convergência é (−1/2, 1/2) .

3.6.4 Série Binomial

 Sejam
 k e n inteiros não-negativos. Chamamos de número binomial de k sobre n, que denotamos por
k
o número de maneiras de se colocar k objetos em n lugares, sem levar em conta a ordem, ou seja, o
n
número de combinações sem repetição de k objetos em n lugares. Do Ensino Médio, sabemos que
 
k k!
= .
n (k − n)!n!

Equivalentemente, podemos escrever


 
k k(k − 1) · · · (k − (n − 1))(k − n)! k(k − 1) · · · (k − (n − 1))
= = .
n (k − n)!n! n!
100 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES
     
k k! k k! k(k − 1)! k
Exemplo 3.6.17. Temos = = 1, = = = k, =
  0 (k − 0)!0! 1 (k − 1)!1! (k − 1)! k
k! 5 5·4·3
= 1, = = 10.
(k − k)!k! 3 3·2·1

Uma das maiores aplicações dos números binomiais ocorre no Teorema Binomial. Por exemplo,

(1 + x)2 = 1 + 2x + x2 .
     
2 2 2
Os coeficientes dessa expansão são exatamente = 1, =2e = 1. Analogamente,
0 1 2

(1 + x)3 = 1 + 3x + 3x2 + x3 ,
       
3 3 3 k
cujos coeficientes são = 1, = 3, =3e = 1. Em geral, temos o
0 1 2 n

Teorema 3.6.4 (Teorema Binomial). Seja k um inteiro não negativo. Então

k  
X k
(1 + x)k = xn .
n
n=0

A série binomial aparece quando generalizamos o Teorema Binomial para qualquer expoente racional,
incluindo negativos e frações. Para isso, seja k ∈ Q. Vamos determinar a série de Maclaurin da função
f (x) = (1 + x)k . Temos

n f (n) x f (n) (0)


0 (1 + x)k 1
1 k(1 + x)k−1 k
2 k(k − 1)(1 + x)k−2 k(k − 1)
3 k(k − 1)(k − 2)(1 + x)k−3 k(k − 1)(k − 2)
.. .. ..
. . .
n k(k − 1)(k − 2) · · · (k − (n − 1))(1 + x)k−n k(k − 1)(k − 2) · · · (k − (n − 1))

Assim, a série de Maclaurin de f (x) é



X k(k − 1)(k − 2) · · · (k − (n − 1)) n
(1 + x)k = x .
n=0
n!

Note que os coeficientes da série possuem a mesma fórmula dos números binomiais, a diferença é que agora
k não precisa ser um inteiro não-negativo. Assim, vamos denotar esses coeficientes também como números
binomiais e escrever a série binomial
∞  
k
X k
(1 + x) = xn . (3.6.1)
n
n=0

Exemplo 3.6.18. Continuamos calculando os binomiais como antes. Por exemplo,


 
−2 (−2)(−3)(−4)
= = −4
3 3·2·1
e  
1/2 (1/2)(1/2 − 1) 1
= =− .
2 2·1 8
3.6. SÉRIES DE POTÊNCIAS 101

Vamos determinar o raio de convergência desta série por meio do Teste da Razão, como de costume.
Temos
|k(k−1)(k−2)···(k−(n−1))(k−n)|
|x|n+1

an+1 (n+1)!
lim = lim |k(k−1)(k−2)···(k−(n−1))|
n→∞ an n→∞ |x|n
n!
  
|k(k − 1)(k − 2) · · · (k − (n − 1))(k − n)| n!
= |x| lim
n→∞ |k(k − 1)(k − 2) · · · (k − (n − 1))| (n + 1)!
|k − n|
= |x| lim
n→∞ n + 1

= |x|,
pois como n → ∞, k − n < 0 para todo n > k, logo |k − n| = n − k e limn→∞ n−k n+1 = 1. Daı́, a série converge
absolutamente se |x| < 1 e diverge se |x| > 1, ou seja, o raio de convergência de toda série binomial é igual
a 1.
1
Exemplo 3.6.19. Obtenha a série de Maclaurin de f (x) = .
(1 + x)2
Solução. Podemos determinar essa série a partir da série geométrica por derivação e substituição, semelhante
ao que fizemos no Exemplo 3.6.16. Desta vez, vamos escrever a função como f (x) = (1 + x)−2 , logo podemos
usar a série binomial com k = −2. Assim,
∞  
1 X −2
= xn .
(1 + x)2 n
n=0

Para finalizar, precisamos detectar o padrão nos coeficientes binomiais para substituı́-los na fórmula acima.
Temos:

Número
 Binomial
 Resultado
−2
1
 0 
−2
−2
 1 
−2 (−2)(−3)
2·1 =3
 2 
−2 (−2)(−3)(−4)
3·2·1 = −4
 3 
−2 (−2)(−3)(−4)(−5)
4·3·2·1 =5
4
.. ..
 .  .
−2
(−1)n (n + 1)
n
Com isso, concluı́mos que

1 X
= (−1)n (n + 1)xn .
(1 + x)2 n=0

1
Exemplo 3.6.20. Determine a série de Maclaurin de f (x) = .
(1 − x)4
1
Solução. Vamos determinar a série de Maclaurin de f (x) = = (1 + x)−4 , o que pode ser feito pela
(1 + x)4
série binomial com k = −4, e depois substituir x por −x. Assim,
1 X  −4 
= ∞ xn .
(1 + x)4 n
n=0
102 CAPÍTULO 3. SEQUÊNCIAS E SÉRIES

Para os coeficientes, temos:

Número
 Binomial
 Resultado
−4
1
 0 
−4
−4
 1 
−4 (−4)(−5)
2·1 = 10
 2 
−4 (−4)(−5)(−6)
3·2·1 = −20
 3 
−4 (−4)(−5)(−6)(−7)

 4  4·3·2·1

−4 (−4)(−
 5)(−6)(−7)(−8)

 5  5·
 4·3·2·1

−4 (−4)(−
 5)(−
 6)(−7)(−8)(−9)

6 6·
 5·
 4·3·2·1

.. ..
 .  .
−4 (−1)n (n+1)(n+2)(n+3)
n 6

Daı́,

1 X (−1)n (n + 1)(n + 2)(n + 3) n
4
= x ,
(1 + x) n=0
6
e portanto
∞ ∞
1 X (−1)n (n + 1)(n + 2)(n + 3) n
X (n + 1)(n + 2)(n + 3) n
= (−x) = x .
(1 − x)4 n=0
6 n=0
6

3.7 Exercı́cios
Exercı́cio 3.1. Determine se as seguintes sequências convergem ou divergem. Quando convergirem, calcule
o limite.

3 + 5n2 (d) an = n sen(1/n). n!


(a) an = . (g) an = .
n√+ n2 2n
n (e) an = ln(n + 1) − ln(n).
(b) an = √ . (−3)n
1+ n (h) an = .
n!
ln(n) (−1)n−1 n
(c) an = . (f) an = . (i) an = (0, 1, 0, 0, 1, 0, 0, 0, 1, . . .)
ln(2n) n2 + 1
 n
a
Exercı́cio 3.2. Calcule o limite da sequência an = 1 + , onde a ∈ R.
n
Exercı́cio 3.3. Seja (an ) uma sequência convergente.
(a) Mostre que lim an+1 = lim an .
1
(b) Uma sequência é definida recursivamente por a1 = 1 e an+1 = para n ≥ 1. Assumindo que (an )
1 + an
é convergente, calcule seu limite.
Exercı́cio 3.4. Determine se a sequência é crescente ou decrescente e se é limitada.
3.7. EXERCÍCIOS 103

1 2n − 3
(a) an = . (c) an = .
5n 3n + 4
1
(b) an = . (d) an = ne−n .
2n + 3

Exercı́cio 3.5. (a) Fibonacci colocou o seguinte problema: suponha que coelhos vivam para sempre e
que a cada mês cada par produza um novo par, que se torna reprodutivo com dois meses de idade.
Se começarmos com um par recém nascido, quantos coelhos teremos no n-ésimo mês? Mostre que a
resposta é (fn ), a sequência de Fibonacci.
fn+1 1
(b) Seja an = e mostre que an−1 = 1 + . Assumindo que (an ) é convergente, calcule o seu limite.
fn an−2
O valor desse limite é conhecido como “razão áurea” e tem importância em várias áreas do conhecimento
humano como a Biologia, a Arquitetura e a Pintura.
√ √
Exercı́cio 3.6. Mostre que a sequência (an ) dada pela fórmula de recorrência a1 = 2 e an+1 = 2 + an
é convergente e calcule o seu limite. (Dica: Pesquise sobre indução matemática.)
Exercı́cio 3.7. Determine se as seguintes séries convergem. Em caso positivo, calcule suas somas.
∞ ∞
X 1 X 1
(a) 2 + 3n + 2
(e) 2−4
.
n=1
n n=1
n
∞   ∞
X n X cos(nπ)
(b) ln . (f) √ .
n=1
2n + 1 n=1
n
e
∞ ∞  n
X √
n
X 10 − n
(c) 2. (g) .
n=1 n=1
n
∞ ∞ 
32n

X X 1 1
(d) . (h) − .
n=1
43n+2 n=1
ln(n + 2) ln(n + 1)

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