Você está na página 1de 4

A modernidade, a pós-modernidade, e

a escola.
Adonai César Mendonça
Doutor em Educação USP/SP

Com a Segunda Revolução Industrial, na segunda metade do século


XIX, surge uma indústria mais baseada na ciência e na precisão do que no
empirismo, onde as oportunidades não eram oferecidas aos trabalhadores
analfabetos. Chamando de modernidade a este período, Hargreaves
(1995) o define “como uma condição social impulsionada e sustentada por
uma fé no progresso científico racional, no triunfo da tecnologia sobre a
natureza e na capacidade de controlar e melhorar a condição humana
mediante a aplicação de todo este conhecimento e domínio científico e
tecnológico nas reformas sociais”.

Na modernidade, a principal característica política é manter o


controle centralizado das decisões, o bem estar social e a educação; a
organização se explicita através de pesadas e complexas hierarquias
segmentadas por especialidades. Seus membros, os especialistas, têm
suas carreiras profissionais guiadas por lógicas de categorias e
antiguidades. Há, em certo sentido, uma identidade coletiva; porém, a
racionalidade pode levar à alienação e à falta de sentido nas vidas
individuais.

Na economia, a modernidade determina os sistemas de produção


em massa. São frutos deste contexto o fordismo e o taylorismo que
tiveram como papel principal simplificar o trabalho nas indústrias que,
entre outras coisas, fizeram com que a organização industrial não
dependesse de conhecimentos e habilidades do trabalhador; este
conhecimento teria de ser monopólio de uma pequena parcela dos que
tinham a função de gerência. Há classes de trabalhadores: uma pequena
parcela dos trabalhadores qualificados em suas funções, os gestores em
pequena parcela, os operários semiqualificados, em grande maioria dos

1
quais não lhes é exigido grandes conhecimentos, mas apenas que
executem tarefas rotineiras. Fica evidenciado o caráter especialista da
formação profissional. Influenciados pela idéia determinística de que o
mundo é uma máquina que funciona em consonância com as leis
matemáticas e físicas e que é preciso fragmentar e dividir em partes o
conhecimento e entregar aos especialistas para que o gerencie, o
taylorismo e também o fordismo parcelam as tarefas nas oficinas e
entregam a vários trabalhadores para que dêem conta das parcelas que
lhes tocaram. Cabe à gerência a tarefa de ter o conhecimento do
funcionamento destas parcelas para que possa orientar e “treinar” cada
trabalhador em sua tarefa especificada.

O mundo pós-moderno, depois do declínio da sociedade fabril, se


estrutura em torno da produção, dos serviços e das informações. O
progresso é vertiginoso. Há transformações em todos os setores da
sociedade, são transformações rápidas e complexas, em especial nos
setores da comunicação, da produção de informações e da produção.

A expansão mundial do sistema capitalista acelerada por um intenso


fluxo de capitais, produtos e informações, desembocou no fenômeno da
globalização. Qualquer produtor ou consumidor pode comprar mercadoria
em qualquer parte do mundo; qualquer produtor pode realizar qualquer
fase de fabricação de seu produto em qualquer parte do mundo. As
empresas se esmeram em diminuir custos e acelerar a produtividade e,
para tanto, lançam mão da automação e, com isto, dizimam postos de
trabalhos, trazendo para a crise da transição o desemprego. O que vale é
a eficácia das empresas na busca de soluções, do emprego de menores
capitais, estoques também menores, menores tempos de fabricação e a
flexibilização que permite a ela o atendimento dos diversos tipos de
mercados. Um produto sujeito às constantes mudanças juntamente com a
capacidade da tecnologia de descobrir novos caminhos de produção
reduzem drasticamente a necessidade de estoques.

O trabalhador no mundo pós-moderno deve saber lidar com


imprevistos. Sua criatividade e flexibilidade devem estar sempre

2
disponíveis para a resolução de problemas e dificuldades que se
apresentam. Deve saber aprender sozinho e rapidamente. Sua formação
geral deve ser sólida e que o habilite a lidar com as especificidades. Não
há mais lugar para quem decora, memoriza, copia e não sabe lidar com as
informações, pois elas percorrem caminhos digitais numa verdadeira rede
fazendo com que as decisões econômicas e sociais viagem através de
espaços mais amplos e em tempos menores. A necessidade de respostas
rápidas e de flexibilidade determina uma capacidade de descentralização
nas estruturas que tomam decisões tornando o processo menos
hierarquizado.

Com o avanço tecnológico, as relações entre o trabalho e o


conhecimento tiveram novos significados uma vez que o conhecimento
agora é entendido pelos meios de produção como um dos principais
fatores de produção. Uma das habilidades mais necessárias ao mundo do
trabalho é a de analisar fatos sem se preocupar com teorias pré-
concebidas. A procura de novos conhecimentos, sem se ater às
interpretações existentes na cultura, pode levar às descobertas
interessantes ao mundo da produção e, para isto, o trabalhador deve
aprender a aprender, isto é, aplicar o conhecimento para ter novos
conhecimentos. Manter-se atualizado e em constante aprendizagem é a
ordem. A aprendizagem permanente dá ao trabalhador a oportunidade de
acompanhar as transformações do mercado e de algumas profissões.

E nossas escolas, como estão inseridas neste contexto de transição


da modernidade para a pós-modernidade? A escola neste cenário também
é atingida na turbulência da enxurrada de informações e de sua própria
obsolescência. O mundo pós-moderno pode privilegiar os aspectos
pessoais, mas pode também provocar crises nas relações interpessoais,
uma vez que estas relações precisam estar ancoradas nas tradições ou
obrigações que garantam sua segurança e continuidade. Há uma
perplexidade com o colapso das certezas morais, e as antigas missões e
metas começam a cair. Os métodos e estratégias que utilizam os
professores junto com os conhecimentos básicos que os justificam estão

3
submetidos a uma crítica constante à medida que as certezas científicas
perdem credibilidade.

Seus alunos são estimulados a todo instante, nas ruas, em casa,


aguçando o seu sensorial, propiciando o desenvolvimento das Múltiplas
Inteligências e colocando em xeque procedimentos racionais comuns às
escolas de hoje. Os videogames, tridimensionais, ensejam dificuldades
que devem ser transpostas e que exigem raciocínio especial e diferente do
usual. Convivem com uma facilidade na obtenção de informações das
mais variadas, num campo caótico: a Internet. Os educadores continuam a
pensar a educação como pensavam seus professores. Oferece a esta nova
geração aulas lineares, mais próprias à reprodução.

O sistema escolar tenta opor-se às pressões sociais e às mudanças


da pós-modernidade, mas seu aparato administrativo enorme e pesado
não tem dado conta disto. Este sistema amiúde procede a mudanças que,
a título de acompanhar as transformações sociais pós-moderna, traz no
seu bojo um aparato para a preservação das ideologias dominantes que
ficam a serviço dos interesses econômicos globais. Os professores, com
uma formação inicial realizada em um sistema fortemente tecnicista, ao
final dela, são entregues à própria sorte em uma sala de aula, o que pode
propiciar, nesta solidão profissional, uma construção de uma prática muito
mais alicerçada em antigos professores e na troca de experiência com
seus colegas do que em reflexões ancoradas em teorias pedagógicas.
Nesta construção estão em jogo a influência de sua origem social e sua
história de vida profissional, e também suas aspirações, sonhos,
frustrações e obstáculos que determinam seu entusiasmo e sua moral.

Você também pode gostar