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Brasília-DF.
Elaboração
Produção
APRESENTAÇÃO................................................................................................................................... 5
INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 9
UNIDADE I
PROCESSO CAUTELAR......................................................................................................................... 11
CAPÍTULO 1
PROCESSO E AÇÃO CAUTELAR............................................................................................... 11
UNIDADE II
PRISÃO CAUTELAR............................................................................................................................... 14
CAPÍTULO 1
GENERALIDADES.................................................................................................................... 14
CAPÍTULO 2
PRISÃO TEMPORÁRIA.............................................................................................................. 23
CAPÍTULO 3
A PRISÃO NO CRIME DE PORTE DE DROGAS........................................................................... 28
CAPÍTULO 4
PRISÃO EM FLAGRANTE. FORMAS DE FLAGRANTE.................................................................... 30
CAPÍTULO 5
PRISÃO PREVENTIVA. PRISÃO EM FACE
DE DENÚNCIA....................................................................................................................... 38
CAPÍTULO 6
PRISÃO EM FACE DE SENTENÇA DE PRONÚNCIA..................................................................... 44
CAPÍTULO 7
PRISÃO EM FACE DE SENTENÇA RECORRÍVEL.......................................................................... 46
CAPÍTULO 8
PRISÃO EM FACE DE SENTENÇA RECORRÍVEL PENDENTE DE JULGAMENTO
DE RECURSO ESPECIAL OU DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO..................................................... 48
UNIDADE III
LIBERDADE......................................................................................................................................... 51
CAPÍTULO 1
GENERALIDADES.................................................................................................................... 51
CAPÍTULO 2
A INCOERÊNCIA DA FIANÇA.................................................................................................. 53
CAPÍTULO 3
REVOGAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA..................................................................................... 56
CAPÍTULO 4
DIREITO A RECORRER SOLTO.................................................................................................. 58
REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 61
Apresentação
Caro aluno
A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem
necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela
atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade
de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD.
Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos
a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma
competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para
vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.
Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar
sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a
como instrumento para seu sucesso na carreira.
Conselho Editorial
5
Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa
Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de
forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões
para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar sua leitura mais agradável. Ao
final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para aprofundar os estudos com leituras e
pesquisas complementares.
A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos
e Pesquisa.
Provocação
Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.
Para refletir
Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.
Praticando
Atenção
6
Saiba mais
Sintetizando
Exercício de fixação
Atividades que buscam reforçar a assimilação e fixação dos períodos que o autor/
conteudista achar mais relevante em relação a aprendizagem de seu módulo (não
há registro de menção).
Avaliação Final
7
8
Introdução
Este Caderno tem vital importância para o entendimento do Direito Processual Penal como ramo
do Direito Público, com atuação nas formas de manifestação do Estado como ente ordenador e
disciplinador das relações jurídicas, com foco nas ações criminais.
Ao introduzirmos o estudo do Processo Penal Cautelar, releva notar que, para grande parte da
doutrina pátria, não existe propriamente um processo cautelar ou ações cautelares no
âmbito do processo penal, podendo ser aplicadas tão somente medidas cautelares. No
particular, Rogério Lauria Tucci destaca, in verbis:
Será feita uma breve introdução em que serão analisados aspectos básicos da processualidade
criminal pátria para dizer que, acerca das prisões e liberdade provisória, é possível vislumbrar
revogação de todos dispositivos do Código de Processo Penal sobre a matéria.
9
É lamentável que o Brasil tenha uma realidade social tão ruim, a ponto de refletir no estudo científico
do Direito; eis que não mais existem juristas e livros doutrinários dispostos a evoluir que tenham
grande aceitação no mercado. Com isso, as editoras param de publicar livros que não tenham como
escopo principal o concurso público, o que é péssimo para o Direito nacional, o qual se encontra em
verdadeiro ostracismo, mormente em matéria criminal.
Um curso de especialização objetiva ser mais profundo que a graduação e não pode ser um curso
preparatório para concurso público travestido de pós-graduação lato sensu. Destarte, neste curso,
teoria jurídica e prática dos tribunais terão que caminhar juntos, isso no sentido de que muitas
distorções serão indicadas, a fim de evitar que haja uma acomodação ao discurso repressor que
domina a cultura judicial e de grande parte da sociedade complexa brasileira.
A perspectiva garantista orientará nosso estudo, visto que se espera que a processualidade criminal
brasileira seja, acima de tudo, respeitadora de direitos humanos fundamentais, estando sempre
atenta às garantias estabelecidas na Constituição Federal. Caso isso não tenha ocorrido, mais que
um direito, é dever do sistema jurídico criticar a alopoiese consolidada.
Certos de que encontraremos alunos dispostos a refutarem as distorções consolidadas e ávidos por
novos conhecimentos é que adotamos a linha de pesquisa deste Caderno.
Sucesso!
Objetivos
»» Discutir temas controversos no âmbito do Processo Penal Cautelar.
10
PROCESSO UNIDADE I
CAUTELAR
CAPÍTULO 1
Processo e ação cautelar
Processo, como decorrente de procedere, significa marcha, um caminhar cadenciado para a frente, o
que significa dizer que não se pode errar no curso da marcha senão será punido, ou seja, serão impostas
sanções processuais à parte que não atender adequadamente ao seu múnus. Este é explicitado no
procedimento, o qual marcará o ritmo da marcha, bem como o dever de cada parte. Nesse sentido,
oportuno é o seguinte exemplo: o processo seria como uma linha férrea, enquanto o procedimento seria
o desenho desta linha, dizendo em que estações o trem deverá parar, bem como todo itinerário que
deverá percorrer.
Não pretendemos aqui discorrer sobre as teorias desenvolvidas em torno da natureza jurídica do
processo. Discutir se o processo tem a natureza de contrato, de quase contrato, de serviço público,
de instituição, de situação jurídica ou de relação jurídica é uma análise de teoria geral que nos
afastaria do objetivo de apresentar o processo cautelar.
MENDONÇA, Andrei Borges de. Reforma do Código de Processo Penal. São Paulo: Método, 2008. p. 4.
1
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Processo e hermenêutica na tutela penal dos direitos fundamentais. Belo Horizonte:
2
11
UNIDADE I │ PROCESSO CAUTELAR
ALVIM, Elementos de teoria geral do processo. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2.001.
p. 133-148;
BAUCHÉ, Eduardo German. Teoria general del derecho procesal. Buenos Aires:
Ediciones Juridicas, 2.008. p. 60-72;
Neste momento, é importante destacar apenas que a teoria predominante é a que entende ter o
processo a natureza de relação jurídica de direitos e obrigações entre as partes e o juiz. Daí ser
oportuno o exemplo desenvolvido no sentido de não se poder pretender confundir uma viagem com
o itinerário utilizado para alcançar o objetivo. A viagem em si seria o processo e o itinerário eleito
seria o procedimento3.
Classificações
Os processos, na doutrina pátria dominante, podem ser classificados em: de conhecimento; cautelar;
executório. De modo diverso, os procedimentos são classificados em: comum ordinário, sumário
e sumaríssimo.
Parte da doutrina processualista em matéria criminal diz que os dois pressupostos nupercitados
constituem o próprio mérito da ação e do processo cautelar. De qualquer modo, é oportuno concordar
com Antônio Alberto Machado, no sentido de que as medidas cautelares apresentam caracteres que
lhes são específicos, a saber: provisoriedade, facultatividade, revogabilidade, instrumentalidade e
modificalidade.4
A facultatividade faz com que a medida cautelar só tenha cabimento quando as medidas do processo
principal não forem suficientes. Outrossim, nem toda cautelar demanda processo ou procedimento
próprios, podendo ser decretada no curso do processo principal e, muitas vezes, de ofício.
O processo cautelar típico é aquele que é movido pela parte para obtenção de uma medida cautelar
que terá mérito próprio. Tal processo será autônomo e independente do principal porque tramitará
em separado e sua procedência não interferirá na sentença do processo principal, podendo ser esta
improcedente. É, portanto, mais fácil vislumbrar processo cautelar típico na processualidade cívil.
ALVIM, José Eduardo Carreira. Elementos de teoria geral do processo. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 145.
3
MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 449.
4
12
PROCESSO CAUTELAR │ UNIDADE I
Liminar
Liminar deriva do latim liminaris, de limen (porta, entrada), indicando tudo que se faz inicialmente,
no começo5. Desse modo, a liminar propriamente dita é aquela que se profere inaudita altera pars
(sem ouvir a parte contrária). É, em regra, uma medida cautelar, mas já se pode falar em sentença
de liminar de mérito.
Muitas vezes, a liminar de mérito será proferida após a oitiva do réu, sendo que, em matéria criminal,
a absolvição liminar está prevista no Código de Processo Penal da seguinte maneira:
Hipótese mais radical de liminar de mérito, em matéria criminal, é a da Lei no 8.038, de 28.5.1990,
que prevê a absolvição sumária antes do recebimento da denúncia, isso nos procedimentos dos
crimes de competência originárias dos tribunais (art. 6o).
Algumas dúvidas podem nos assolar: como fica o devido processo legal em face de sentença liminar
de mérito? Tal medida só é possível na processualidade cível? Por que só é cabível sentença liminar
de mérito nos casos de improcedência do pedido?
5
SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 493.
13
PRISÃO CAUTELAR UNIDADE II
CAPÍTULO 1
Generalidades
É comum os policiais militares dizerem que não estão prendendo pessoas que praticaram supostos
crimes, mas apenas levando-as perante a autoridade policial. Data venia, retirar a pessoa de onde
gostaria de estar, ainda que não a retire do lugar, poderá caracterizar crime de sequestro ou de
cárcere privado (Código Penal, art. 148) e, no caso de policiais, o crime poderá ser o de abuso
de autoridade (Lei no 4.898, art. 4o, alínea “a”). Como é incabível a prisão para averiguação na
atualidade, é necessário certo cuidado em admitir a prática de conduzir à delegacia sob o manto de
estar praticando simples detenção.
Reclusão e detenção são espécies de pena privativa de liberdade, ou seja, espécies de prisão. Não se olvide
que tanto a reclusão como a detenção são espécies de prisão. Nesse sentido, o Projeto de Lei no 3.473/2000,
por exemplo, não fala mais em referidas espécies de pena privativa de liberdade, mas unicamente
em prisão.6
Espécies
Podemos afirmar que, doutrinariamente, as prisões classificam-se em: a prisão criminal e prisão
civil. Esta classificação tem em vista unicamente quem é o prolator do decreto da prisão, pois se a
ordem provém de juízo criminal a prisão terá essa natureza, mas se provier de qualquer outro juízo,
O problema de se fazer modificações pontuais na legislação é o surgimento de preceitos incompatíveis entre o CP e o CPP, haja
6
vista que aquele, no que concerne à liberdade provisória, vê importância na distinção, a qual, se suprimida unicamente no CP e
na LEP, criará para a interpretação da lei processual. A Itália, recentemente, enfrentou esse problema, o que foi criticado pela
doutrina (para verificar maiores considerações a respeito, vide: GRAZIANO, Giuseppe. Il futuro del diritto penale. Roma: Seam,
1999. p. 43-65).
14
LIBERDADE │ UNIDADE II
a prisão será civil. No entanto, a classificação é insuficiente para o que se pretende, razão da nossa
opção por outra.
Em classificação que consideramos mais técnica, verificamos as seguintes espécies básicas de prisão.
Civil – tal espécie não foi consagrada em nosso Direito. Ela, acima de tudo,
representa prisão decorrente de uma sanção civil, o que é defeso em nosso
direito.
A tese que prevaleceu foi de que a norma de Direito Internacional é materialmente constitucional,
não se concebendo qualquer norma infraconstitucional que estabeleça prisão por dívida. De
7
MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Prisão e internação provisórias: natureza. Disponível em: <http://www.sidio.pro.br/
InternacoesNaturezas.doc>. Acesso em: 28.2.2009.
8
STF. Informativo n. 531. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/informativo/ verInformativo.asp?s1= depositário%
20e%20infiel&numero=531&pagina=4&base=INFO>. Acesso em: 28.2.2008.
15
UNIDADE II │ LIBERDADE
qualquer modo, ainda que fosse admitida a prisão do depositário infiel, esta seria coercitiva, não
uma sanção pelo descumprimento do dever civil.
Qualquer prisão, ainda que seu fundamento seja eventual descumprimento de norma administrativa,
dependerá de autorização judicial. Todavia, com respeito ao art. 319, inc. II, do Código de Processo
Penal, há quem sustente que a natureza continuará sendo administrativa9. Por entendermos que a
prisão administrativa é a decretada por autoridade administrativa, como sanção administrativa, a
reservamos ao caso de transgressão disciplinar militar.
O estrangeiro que está ilegalmente no Brasil pode ser preso até o término do
processo. Pergunta-se: qual é a natureza da prisão?
AQUINO, José Carlos G. Xavier de. NILINI, José Renato. Manual de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 219.
9
16
LIBERDADE │ UNIDADE II
prazo. A prisão até será possível, mas somente por ordem judicial e sendo incabível a prisão quando
possível a liberdade com ou sem fiança (CF, art. 5o, inc. LXVI), somente a sua cautelaridade poderá
justificar, ou seja, não terá a natureza de sanção a ser imposta por descumprimento de norma
administrativa.
A execução da pena será examinada sob a ótica do Direito de Execução Criminal, o qual tem sua
autonomia declarada desde 1930, cujas regras estão expostas em nosso Código de Execução Criminal
(Lei no 7.210, de 11.7.1984)10. Daí não a enfrentarmos no presente momento.
O processo cautelar é autônomo, no sentido de que sua decisão pode ser diversa da proferida no
processo principal, bem como independente, visto que anda em separado, não ficando apensado ao
principal. Não obstante isso, ele visa a um provimento a ser proferido no processo principal. É em
tal contexto que emerge a prisão provisória, a qual pode ser: temporária, preventiva, decorrente de
sentença de pronúncia ou decorrente de sentença condenatória recorrível.
MESQUITA JÚNIOR Sidio Rosa de. Execução criminal: teoria e prática. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 4-6.
10
17
UNIDADE II │ LIBERDADE
Em sendo assim, a Lei no 12.403/11 criou uma terceira via, que seria a possibilidade de se impor
uma medida cautelar diversa da prisão cautelar. Tal alteração não foi a única, mas demonstra
claramente a intenção do legislador em racionalizar a prisão, a fim de que ela venha a cumprir
o preceito constitucional de ser utilizada unicamente como medida extrema e necessária para a
prevenção e repressão do crime.
Os artigos 282 a 300 dispõem sobre os aspectos gerais da prisão cautelar e das outras medidas
cautelares. Entretanto, para compreendê-los, faz-se imprescindível analisarmos o artigo 319 do CPP
que dispõe sobre as medidas cautelares diversas da prisão. São elas, segundo o referido artigo:
»» monitoração eletrônica.
O §4o, do artigo 319 também prevê que a fiança poderá ser cumulada com outras medidas cautelares.
Por sinal, tal disposição é inútil, haja vista que o artigo 282, ao falar da aplicação das referidas
medidas afirma que estas podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente.
O artigo 282 impõe as regras para aplicação das medidas cautelares. Segundo o referido artigo, as
medidas serão aplicadas observando-se:
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LIBERDADE │ UNIDADE II
Dessa forma, não se pode exigir a proibição de manutenção de contato com alguém que nada tem a
ver com o crime ou a modalidade de crime praticada pelo indiciado/acusado. Da mesma forma, não
se pode suspender alguém do exercício da função pela prática de crime que em nada se coaduna com
seu labor. Todavia, nada impede, como já dito antes, de o Juiz aplicar diversas medidas, todas a fim
de adequá-las à gravidade do crime ou até mesmo às condições pessoais do indivíduo.
Ao se verificar o rol das medidas cautelares do artigo 319, tem-se clara a influência de leis como a
Maria da Penha e as medidas restritivas do sursis processual. Entretanto, algumas mudanças são
visíveis: não há período mínimo ou padrão de comparecimento, podendo até ser inferior a um mês.
Outra medida salutar foi a possibilidade de internação provisória de indivíduo incapaz ou semi-
incapaz, haja vista a dificuldade que antes da edição da lei havia, haja vista a falta de previsão legal.
E quem pode decretá-las? Aí se tem um problema de redação da lei. Dispõe o §2o que as medidas
cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso
da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do
Ministério Público.
Analisando o §2o, pensa-se em uma leitura rápida que o Juiz pode decretá-la de ofício em qualquer
momento. Entretanto, o parágrafo separa em dois blocos claros: a fase processual e a inquisitorial. Na
fase processual, o Juiz pode decretar de ofício ou a requerimento das partes. No curso da investigação
criminal só poderia ser por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do
Ministério Público. É o segundo diploma acerca de medidas cautelares que limitam o poder do Juiz
em, de ofício, atuar na fase inquisitorial.
O §3o prevê uma audiência preliminar, salvo nos casos de urgência ou de perigo de ineficácia da
medida, designada pelo Juiz, à qual o requerido da medida cautelar será intimado, a fim de apresentar
eventual justificativa a fim de impedir a aplicação da medida, respeitando-se, assim, o contraditório.
»» substituir a medida;
Caso não seja mais necessária, o Juiz poderá revogá-la ou substituí-la, bem como pode voltar a
decretá-la, caso sobrevenham razões que a justifiquem. Em não cabendo nenhuma medida cautelar,
em substituição à medida originária, o Juiz deverá decretar a prisão preventiva do acusado.
O artigo 283 faz uma síntese do sistema de prisão no Brasil. A prisão só pode ser decorrente de
sentença condenatória transitada em julgado, sendo aí prisão-pena, ou decorrente de flagrante
delito ou ordem judicial, sendo aí prisão de natureza processual ou cautelar.
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UNIDADE II │ LIBERDADE
Entre as hipóteses de prisão cautelar decorrentes de ordem judicial só persistem hoje duas formas:
a prisão temporária e a prisão preventiva. Tais modalidades serão tratadas especificamente
mais abaixo.
Por sinal, muito se discute sobre o conceito constitucional de dia, sendo o mais correto aquele que
entende que, em cada cidade, tem-se o horário no qual o Sol ainda está ativo. Em sendo assim,
a invasão de um domicílio, a fim de se cumprir um mandado de prisão, deverá respeitar não um
horário, mas, sim, ser verificada de acordo com a duração do dia em cada localidade.
Durante a prisão, não será permitido o emprego da força, salvo a indispensável no caso de resistência
ou de tentativa de fuga do preso, inclusive no tocante a terceiros, em que a força poderá ser utilizada,
não só para que se cumpra o ato, como para a própria defesa, devendo, nesse último caso, nos
moldes do artigo 292 do Código de Processo Penal, ser lavrado um auto subscrito também por duas
outras testemunhas.
O mandado de prisão será passado em duplicata, e o executor entregará ao preso, logo depois da
prisão, um dos exemplares, com declaração do dia, hora e lugar da diligência. O preso dará recibo
no outro exemplar. Caso recuse, não saiba ou não possa escrever, o fato será mencionado em uma
declaração, a qual será assinada por duas testemunhas.
Se a infração for inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará à prisão, e o preso, em
tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver expedido o mandado. Da mesma forma,
ninguém será recolhido à prisão, sem que seja exibido o mandado ao respectivo diretor ou carcereiro,
a quem será entregue cópia assinada pelo executor ou apresentada a guia expedida pela autoridade
competente, devendo ser passado recibo da entrega do preso, com declaração de dia e hora.
A lei no 12.403/2011 alterou também o artigo 289, inserindo o 289-A. O primeiro artigo trata da
carta precatória, segundo a qual, estando um indivíduo com mandado de prisão dentro do território
nacional, mas fora da jurisdição do juiz processante, será deprecada a sua prisão. Agora, qualquer
meio de comunicação é admitido, em caso de urgência, devendo constar sempre o motivo da
prisão, bem como o valor da fiança, devendo a autoridade a quem se fizer a requisição verificar a
autenticidade da comunicação.
Outra inovação da lei foi a exigência de remoção do preso pelo juiz processante pelo prazo máximo
de trinta dias, contados da efetivação da medida.
Já o artigo 289-A prevê que todo mandado de prisão deverá ser registrado em um banco de dados
mantido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que regulamentará a matéria. Em pleno século
XXI, é inadmissível que não haja um cadastro nacional confiável de mandados de prisão, precisando
a lei estipular tal previsão com a reforma. Em sendo assim, qualquer agente policial poderá, a partir
da edição da lei, efetuar a prisão determinada no mandado de prisão registrado no CNJ, mesmo
que fora da competência territorial do juiz que a expediu. A ideia é que em pouco tempo, com a
alimentação desse sistema, a busca por indivíduos foragidos seja bem mais eficiente.
20
LIBERDADE │ UNIDADE II
Mesmo que não haja o registro no CNJ, qualquer agente policial poderá efetuar a prisão, adotando
as precauções necessárias para averiguar a autenticidade do mandado. Nesse caso, ele precisa
comunicar ao juiz que a decretou, devendo este providenciar o referido registro.
A comunicação ao juiz não será apenas ao juiz que ordenou a prisão, mas ao juiz da localidade do
cumprimento da medida, devendo também ser comunicado à Defensoria Pública, caso o preso não
informe o nome do seu advogado, sendo o preso informado de seus direitos.
Caso o réu venha a ser perseguido e passar a um outro município, a Polícia pode efetuar a prisão
onde alcançar o indivíduo, devendo apresentá-lo imediatamente à autoridade local, que após a
lavratura da prisão em flagrante, providenciará para a remoção do preso. A perseguição do réu
ocorre quanto tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora depois o tenha perdido
de vista e quando, sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu tenha passado, há
pouco tempo, em tal ou qual direção, pelo lugar em que o procure, for no seu encalço.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal tem antigo entendimento que a não apresentação do preso
à autoridade local não gera nulidade e sim, mera irregularidade, praticamente tornando inócuo o
referido artigo11.
O CPP também prevê que, se o executor do mandado verificar, com segurança, que o réu entrou ou se
encontra em alguma casa, o morador será intimado a entregá-lo, à vista da ordem de prisão. Se não
for obedecido imediatamente, o executor convocará duas testemunhas e, sendo dia, entrará à força na
casa, arrombando as portas, se preciso; sendo noite, o executor, depois da intimação ao morador, se
não for atendido, fará guardar todas as saídas, tornando a casa incomunicável, e, logo que amanheça,
arrombará as portas e efetuará a prisão. Obviamente pode o morador responder, se for o caso, por
favorecimento pessoal.
A prisão especial vem prevista no artigo 295. Ressalte-se que ela só ocorre antes da condenação
definitiva, devendo o preso se juntar ao restante da população carcerária após o trânsito em julgado
da decisão. Tem-se aí uma medida preconceituosa, segundo a qual alguns presos provisórios têm
direito de ficar em um estabelecimento de melhor qualidade. A Lei no 10.258/2001 diminuiu essa
distinção, incluindo os §§ 1o a 5o, afirmando que a prisão especial consiste exclusivamente no
recolhimento em local distinto da prisão comum, devendo ser recolhido o preso especial em cela
distinta caso não haja estabelecimento adequado. Outra distinção é a proibição do transporte de
presos comuns e especial de forma conjunta.
A questão é: quem tem direito a prisão especial? O CPP aponta as respectivas pessoas:
»» Ministros de Estado;
21
UNIDADE II │ LIBERDADE
»» Oficiais das Forças Armadas e os militares dos Estados, do Distrito Federal e dos
Territórios;
»» Magistrados;
Vale lembrar que não se pode misturar preso provisório com preso com condenação definitiva (art.
300), devendo os militares serem recolhidos a quartel da instituição a que pertencerem.
Dessa forma, essas regras comuns às modalidades de prisão são complementadas pelas normas
específicas de cada uma destas.
22
CAPÍTULO 2
Prisão temporária
Conceito
Prisão temporária é a prisão a ser concedida na fase do inquérito policial, com prazo determinado,
para facilitar a investigação do fato criminoso. Sua natureza cautelar é extremamente discutível, em
face dos elásticos e vagos requisitos insertos em lei. Assim, é uma espécie de prisão que precisa ser
pensada com certo cuidado.
O instituto da prisão temporária foi introduzido, no direito brasileiro, pela Lei no 7.960, de 21.12.1989,
mediante conversão da Medida Provisória no 11, de 24.11.1989, seguindo uma tendência político-
criminal conhecida como “lei e ordem”, de endurecimento de tratamento processual criminal e
aumento de pena de diversas figuras delituosas.
Atendeu-se aos reclames de uma esfera da sociedade que então vinha sendo vítima de vários
delitos contra o patrimônio e contra a vida. Pouco mais de seis meses depois, foi editada a lei
dos crimes hediondos (Lei no 8.072, de 25.7.1990). Não se trata, porém, de medida exclusiva
da legislação brasileira, pois a adotam entre outros países, como Portugal, Espanha, França,
Itália, Estados Unidos etc. Trata-se, então, de medida acauteladora de restrição da liberdade de
locomoção por tempo determinado, destinada a possibilitar as investigações a respeito de crimes
graves durante o inquérito policial.12
Os movimentos de lei e ordem são criticados pela doutrina pátria e estrangeira, não obstante terem
servido de palanques eleitorais para políticos inescrupulosos, sendo notória a campanha de Jorge
Walker Bush, em nome do combate ao terrorismo e de um certo prefeito que sustentou “tolerância
zero ao crime”. Não é isso que o cientista do Direito deve pretender. Uma análise científica do Direito
nos leva à seguinte conclusão: “...o açodamento do legislador, diante dos emergentes reclamos sociais
então existentes, redundou numa lei que, no mínimo, peca pela ausência de técnica processual”.13
É importante salientar que assiste razão à corrente doutrinária que sustenta ser a lei inconstitucional
por vício de origem14, o qual não pode ser sanado pela simples conversão da medida provisória em
lei, pois a Constituição Federal, ao vedar a instituição de norma processual por medida provisória
(art. 62, § 1o, alínea “b”), tinha em vista um procedimento legislativo mais seguro, mediante discussão
bicameral, o que não ocorreu em relação a referida lei. Entretanto, em sentido contrário, o STF decidiu:
12
FABBRINI, Renato Nalini; MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 424.
13
DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALUF, Jorge Assaf. Curso de Processo Penal. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 187.
14
Nesse sentido: RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 616.
23
UNIDADE II │ LIBERDADE
O STF tem o dever de decidir juridicamente, reservando sua decisão política aos casos que houver
efetivo interesse público, sendo que a instituição policialesca não pode interessar a toda população,
senão àqueles afetados pelos crimes inseridos no rol do inc. III, do art. 1o, da Lei no 7.960/1989.
Outrossim, o gravame pela possibilidade de prisão temporária sequer foi mencionado pelo relator.
A prisão temporária surgiu como uma resposta à proibição constitucional de prisão para averiguação.
Trata-se de uma prisão que SÓ PODERÁ SER DECRETADA NA FASE DE INQUÉRITO. Seu
tratamento vem na lei no 7.960/89.
As hipóteses de cabimento vêm em seu artigo 1o. A redação desse artigo é, sem dúvida, uma das
piores da legislação brasileira. Dispõe o artigo 1o que:
III – quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida
na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes:
“STF. Pleno. ADI-MC 162/DF. Min. Moreira Alves. Julgamento: 14.12.1989. DJ, Seção 1, de 19.9.1997. p. 4525.
15
24
LIBERDADE │ UNIDADE II
f) estupro (art. 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo
único);
g) atentado violento ao pudor (art. 214, caput, e sua combinação com o art.
223, caput, e parágrafo único);
h) rapto violento (art. 219, e sua combinação com o art. 223 caput, e parágrafo
único);
É necessário atender aos três incisos do art. 1o da Lei no 7.960/1989 para a prisão
temporária, ou basta o atendimento a um deles?
Caberia, por exemplo, uma prisão temporária pelo simples fato de o indivíduo
praticar um delito grave? Ou imagine qualquer indivíduo não precisar mais ser preso
pelo simples fato de fornecer sua identidade e ter residência fixa?
É prisão processual e, portanto, não pode prescindir dos pressupostos básicos de toda cautelar, a
saber, fumaça do bom direito e perigo da demora do provimento judicial. É, portanto, necessário
analisar com prudência a lei. Com efeito, a péssima redação do art. 1o, inc. I, levaria a uma “norma
legal odiosa e contrária à tradição do processo penal brasileiro”16; eis que sua interpretação literal
levaria à possibilidade de pessoas que, sabendo do crime, não tivessem parte no mesmo.
FABBRINI, Renato Nalini; MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 425.
16
25
UNIDADE II │ LIBERDADE
Não se pode pretender estabelecer uma prisão calcada apenas na ideia da sua utilidade para
esclarecimento do fato. Nesse sentido, importante é a posição de Mesquita Júnior, no sentido de
que Niccolò Machiavelli afirmou que “toda ação é designada em termos do fim que procura atingir”,
não corresponde à máxima “os fins justificam os meios”17. Com efeito, a análise deve ser outra,
sendo oportuno expor:
A razão para Maquiavel não dizer isso se torna muito clara. Ele não está de
forma alguma interessado na justificação dos meios, pois considera-os como os
racionalmente destinados a chegar a um fim. A justificativa não é necessária,
e tal problema só surge quando precisamos comparar essa racionalidade em
termos da necessidade da situação com alguma convicção moral, religiosa ou
ética. Foi esse precisamente o problema que Maquiavel eliminou quando disse
que a própria organização, ou seja, o Estado, é o valor mais alto além do qual
não existe um limite.18
A fumaça do bom direito, essencial à prisão cautelar, é o fumus comissi delicti, o qual significa
plausividade de que a pessoa tenha cometido o delito, sendo imperiosos os indícios de autoria e a
prova da materialidade do crime, não bastando os elementos objetivos do fato, pois crime é algo
mais que fato típico.
Procedimento
O procedimento, de acordo com o art. 2o da Lei no 7.960/1989, é de que a prisão temporária pode
ser decretada “em face da representação da autoridade policial ou de requerimento do Ministério
Público”. Não se prevê, portanto, a possibilidade de decretação de ofício pelo juiz, mesmo porque
a medida só se justifica durante o inquérito policial. Mesmo que o inquérito inconcluso chegue
às mãos do juiz, por exemplo, com pedido de prazo para ultimação etc., não pode o magistrado
determinar, sem pedido, a custódia, que é sempre condicionada à iniciativa de autoridade policial
ou do Ministério Público.
O juiz tem o prazo de 24 (vinte e quatro) horas, contado a partir do recebimento de representação
ou do requerimento, para decidir sobre a prisão, em despacho fundamentado, sob pena de nulidade.
Como a medida cautelar se justifica pela urgência no esclarecimento dos fatos, dispõe a lei que, em
todas as comarcas e seções judiciárias, deverá haver um plantão permanente de vinte e quatro horas
no Poder Judiciário e no Ministério Público para apreciação da prisão temporária.
17
MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Mudanças são necessárias: o Brasil precisa mudar sua Constituição Federal, seus
representantes e, talvez, seu povo. Considerações sobre o reajuste dos subsídios dos parlamentares. Teresina: Jus Navigandi,
ano 11, n. 1271, 24.12.2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9322>. Acesso em: 4.4.2009.
18
FHIEDRICH, Cel. J. Uma introdução à teoria política. In MOREIRA, Marcílio Marques. Maquiavel: vida e pensamentos. São
Paulo: Martin Claret, 1997. p. 85.
26
LIBERDADE │ UNIDADE II
Terminado o prazo legal (ou realizada a diligência), não sendo o caso de prorrogação, o preso
deve ser posto em liberdade, salvo se já tiver sido decretada sua prisão preventiva, sob pena de
responsabilização por crime de abuso de autoridade (Lei no 4.898/1965, art. 4o, inciso I).
O prazo de duração da prisão temporária é de 5 (cinco) dias, prorrogável por igual período, em
caso de extrema e comprovada necessidade. A Lei no 8.072/90 em seu artigo 2o, §4o, dispôs que na
hipótese de crime hediondo, a prisão será de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período.
Vale lembrar que o tempo de prisão temporária conta para fins de detração da pena. Todavia, a
prisão temporária é absolutamente independente dos prazos previstos no CPP acerca da tramitação
do inquérito. Em outras palavras, nada impede que uma prisão em flagrante seja convertida em
preventiva e, antes do encerramento do prazo da autoridade policial ou durante o prazo para
oferecimento de denúncia pelo Ministério Público, seja decretada a prisão temporária, cujo efeito
será o de uma verdadeira suspensão do prazo.
27
CAPÍTULO 3
A Prisão no crime de porte de drogas
Consoante a nova lei, através do art. 28, as penas previstas para o usuário de drogas consistem em:
advertência sobre os efeitos das drogas; prestação de serviços à comunidade; e medida educativa de
comparecimento a programa ou curso educativo.
Além de retirar a pena de detenção e a de multa do usuário condenado, ainda prevê a lei atual
uma desconcertante e desafortunada advertência sobre os efeitos das drogas. Para prever tal
reprimenda, partiu o legislador da premissa que o usuário desconhece os consectários do uso de
drogas? Caso afirmativo, é de se lamuriar estar o legislador desprovido de informações sobre a
hodierna sociedade, pois os usuários são, geralmente, aqueles que mais conhecem os efeitos das
drogas, sendo os malefícios, por mais que isso possa incomodar a inteligência de quem redigiu a lei,
um dos atrativos do uso.
Luiz Flávio Gomes et al. afirmam que, legalmente, no Brasil, “crime” é a infração penal punida com
reclusão ou detenção (quer isolada ou cumulativa ou alternativamente com multa); não há dúvida de
que a posse de droga para consumo pessoal (com a nova lei) deixou de ser “crime”, porque as sanções
impostas para essa conduta (advertência, prestação de serviços à comunidade e comparecimento a
programas educativos – art. 28) não conduzem a nenhum tipo de prisão19.
Afirma o autor que justamente por isso, tampouco essa conduta passou a ser contravenção penal
(que se caracteriza pela imposição de prisão simples ou multa). Em outras palavras: a nova lei de
tóxicos, no art. 28, descriminalizou a conduta da posse de droga para consumo pessoal. Retirou-
lhe a etiqueta de “infração penal”, porque de modo algum permite a pena de prisão. E, sem pena
de prisão, não se pode admitir a existência de infração “penal” no nosso país. Infração sui generis:
diante de tudo quanto foi exposto, conclui-se que a posse de droga para consumo pessoal passou a
configurar uma infração sui generis. Não se trata de “crime” nem de “contravenção penal”, porque
somente foram cominadas penas alternativas, abandonando-se a pena de prisão. De qualquer
maneira, o fato não perdeu o caráter de ilícito (recorde-se: a posse de droga não foi legalizada).
Constitui um fato ilícito, porém não penal, mas, sim, sui generis.20
19
GOMES, Luiz Flávio. Dos crimes e das penas. GOMES, Luiz Flávio (Coord.). Nova lei de drogas: Lei no 11.343, de 23.8.2006.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 118-119.
20
Ibidem.
28
LIBERDADE │ UNIDADE II
Não se pode, de outro lado, afirmar que se trata de um ilícito administrativo, porque as sanções
cominadas devem ser aplicadas não por uma autoridade administrativa, mas, sim, por um juiz (juiz
dos juizados ou da vara especializada). Em conclusão: nem é ilícito “penal” nem “administrativo”: é
um ilícito sui generis.
Poder-se-ia afirmar que se a posse de droga para consumo pessoal passou a ser infração sui generis
(não se trata mais nem de “crime” nem de “contravenção penal”), parece ser coerente afirmar que
esse fato tampouco pertence ao Direito “penal”. O tratamento conferido ao usuário, na nova lei de
tóxicos, constitui, então, sem sombra de dúvida, exemplo de Direito judicial sancionador.
Em sentido contrário ao exposto, Alexandre Bizzotto e Andreia Rodrigues sustentam que houve
despenalização da conduta21. Diversamente, Mesquita Júnior informa haver crime e pena no art.
38 da Lei no 11.343/200622. Criminalização, despenalização e descriminalização: antes da Lei no
9.099/95 (lei dos juizados criminais), o art. 16 da Lei no 6.368/1976 contemplava a posse de droga
para consumo pessoal como criminosa, cominando-lhe pena de seis meses a dois anos de detenção.
A conduta que acaba de ser descrita era “problema de polícia” e levava muita gente para a cadeia.
.
Essa discussão sobre o art. 28 da Lei no 11.343/2006 foi levada ao STF. Você está
apto a dizer quais são as consequências processuais da posição adotada por
aquele tribunal?
Adotava-se a política da criminalização. Porém, a partir da Lei no 9.099/1995, permitiu-se (art. 89) a
suspensão condicional do processo e, desse modo, abriu-se a primeira perspectiva despenalizadora
em relação à posse de droga para consumo pessoal. Afastou-se a resposta penal dura precedente,
sem retirar o caráter criminoso do fato.
21
BIZZOTTO, Alexandre; RODRIGUES, Andreia de Brito. Nova lei de drogas: comentários à Lei no 11.343, de 23 de agosto de
2.006. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 39-40.
22
MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Comentários à lei antidrogas: Lei no 11.343, de 23.8.2006. São Paulo: Atlas, 2007. p. 34.
29
CAPÍTULO 4
Prisão em flagrante. Formas de flagrante
A prisão em flagrante tem a natureza de medida cautelar que visa a resguardar a ordem social,
servindo de meio preventivo para inibir a prática de outros delitos. Também constitui um
expediente facilitador das evidências do fato-crime e um relevante elemento de prova, no que toca à
culpabilidade. Flagrante é uma qualidade do delito, é o delito que está sendo cometido, praticado, é
o ilícito patente, irrecusável, que permite a prisão do seu autor, sem mandado por ser considerado
a “certeza visual do crime”.
Em regra, qualquer pessoa pode ser presa em flagrante. Todavia há exceções, pois não podem ser
presos em flagrante delito: os diplomatas estrangeiros a serviço de seu país; o Presidente a República
(art. 86, § 3o, CF). No entanto, os membros do Congresso Nacional e deputados estaduais só podem
ser presos em flagrante nos crimes inafiançáveis (art. 53, § 2o c/c art. 27, §1o, CF), bem como os
magistrados (art. 33, II da Lei Complementar no 35/79) e membros do Ministério Público (art. 40,
III da Lei no 8.625/93).
30
LIBERDADE │ UNIDADE II
616/400; 584/447. Em qualquer caso de prisão em flagrante, a autoridade ou seus agentes digam
ou se registre no auto a expressão “voz de prisão”, mencionada no art. 307.
Julgamento: 24/04/2007
Publicação: DJ 22.6.2007. p. 40
Ementa
Decisão
Deve-se observar que a regra da manutenção da prisão por ser resultante de crime hediondo era
inconstitucional. Daí a Lei no 11.764, de 28.3.2007, ter alterado o art. 2o, inc. II, da Lei no 8.072,
de 11.12.1990. Com isso, prevalece a regra constitucional de que ninguém deve ser mantido preso
quando couber liberdade provisória (com ou sem fiança).
O artigo 301 do CPP prevê que qualquer um do povo pode efetuar uma prisão em flagrante,
enquanto as autoridades policiais devem. Trata-se, na primeira hipótese de um exercício regular
de direito e de um estrito cumprimento do dever legal no segundo caso. Entretanto o que configura
a prisão em flagrante?
Espécies
O art. 302 do Código de Processo Penal, que considera flagrante de delito quem “está cometendo
a infração penal” (inciso I) e quem acaba de cometê-la (inciso II), estabelece o que se denomina de
flagrante próprio, real ou flagrante propriamente dito. A lei igualou duas situações diversas, mas
em dispositivos diversos: a de quem foi surpreendido no ato da execução do crime e a de quem já
31
UNIDADE II │ LIBERDADE
esgotou os atos de execução, causando o resultado jurídico de dano ou de perigo (morte, lesões,
dano material etc.), encontrando-se, ainda, no local do fato ou nas suas proximidades, em situação
indicativa de que cometeu o ilícito.
A título de curiosidade, o Superior Tribunal de Justiça já aceitou como legal o flagrante ocorrido 3
horas após a prática do crime, na hipótese do inciso III23.
O nome flagrante presumido decorre do fato de não ser sequer quase flagrante, o flagrante decorre
de indícios da ocorrência de crime com base em objetos e instrumentos de crime noticiado, mas sem
outros elementos que vincule a pessoa ao fato. É o caso da prisão do que é encontrado, logo depois
da infração, como instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele o autor da
infração (art. 302, IV). É o caso em que a pessoa é encontrada e não perseguida. Nessa hipótese,
nada mais é exigido além de estar o autor na posse de coisas que o indigitem como agente do delito
acabado de cometer. Não permite a lei que, fora dessa situação, se prenda o agente meramente por
ter confessado a prática do ilícito. É necessário, para a caracterização do flagrante presumido, que a
prisão ocorra “logo depois” do crime.
Há decisões do STJ admitindo um intervalo grande, que ultrapassa 10 horas24. Todavia, tal prazo
não pode ser tão elástico, a ponto de se imaginar que outra conduta fora praticada, como é no caso
23 HC. PROCESSO PENAL. HOMICÍDIO DOLOSO PROVOCADO POR VEÍCULO QUE, PROPOSITADAMENTE, FOI
ARREMESSADO CONTRA MOTOCICLISTA. FLAGRANTE IMPRÓPRIO.
Improcede a alegação de que não foram encontrados com o paciente instrumentos, armas ou objetos que indicassem a autoria.
É que o instrumento fatal que provocou o decesso da vítima foi o próprio veículo automotor conduzido pelo paciente. Ademais,
subsiste nos autos o reconhecimento da autoria e da materialidade do delito, haja vista que o condutor do veículo foi localizado e
preso ao socorrer uma das vítimas e em momento algum negou ter sido ele o causador do evento. Prisão efetuada 3 horas após a
ocorrência do fato delituoso em circunstâncias que configuram a chamada quase flagrância prevista no art. 302, inc. III, do CPP.
Precedentes.
Ordem denegada.
(HC 8.303/SP, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 8/6/1999, DJ 16/8/1999, p. 78)
24 HABEAS CORPUS. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PRISÃO EM FLAGRANTE. FLAGRANTE PRESUMIDO
(ART. 302, INCISO IV, DO CPP). HIPÓTESE CONFIGURADA. EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA. INSTRUÇÃO
CRIMINAL CONCLUÍDA. SÚMULA Nº 52/STJ.
Não há que se falar em nulidade da prisão em flagrante se a mesma encontra fundamento no art. 302, inciso IV, do CPP
(flagrante presumido).
“A expressão ‘logo após’ permite interpretação elástica, havendo maior margem na apreciação do elemento cronológico, quando
o agente é encontrado em circunstâncias suspeitas, aptas, diante de indícios, a autorizar a presunção de ser ele o autor do delito,
estendendo o prazo a várias horas, inclusive ao repouso noturno até o dia seguinte, se for o caso.” (HC nº 7622/MG, Rel. Min.
Fernando Gonçalves, DJ de 08/9/1998).
Concluída a instrução criminal e estando o feito pronto para a prolação de sentença, incide a Súmula nº 52/STJ, afastando a
alegação de excesso de prazo da prisão processual.
Ordem denegada.
(HC 21.111/RN, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 11/06/2002, DJ 1/7/2002, p. 367)
32
LIBERDADE │ UNIDADE II
de um roubo, em que o bem já poderia ter sido repassado e, com isso, ter-se-ia, no máximo, uma
receptação dolosa por parte do agente.
Há o flagrante em crime permanente e crime habitual, previsto pelo art. 303, nas infrações permanentes,
que é o caso do agente em flagrante de delito enquanto não cessar a permanência do mesmo. Nessa
espécie de ilícito, a consumação se prolonga no tempo, dependendo da vontade do agente, como
ocorre nos crimes de sequestro (art. 148, do CP), de extorsão mediante sequestro (art. 159, do CP) etc.
Nesses casos, o crime está sendo cometido durante o tempo, a consumação, havendo, pois, caso típico
de flagrância.
O flagrante em crime de ação de iniciativa privada, o art. 301 não distingue, referindo-se
genericamente a todos que se encontram em “flagrante delito”. Assim, nada impede que a captura
ocorra nos crimes que se apuram mediante ação penal pública dependente de representação ou de
ação privada.
Evidentemente, como nas hipóteses, a denúncia ou a queixa deverão ser oferecidas no prazo de 5 dias
da vista ao Ministério Público, no primeiro caso, ou de distribuição dos autos ao juízo competente,
no segundo, sob pena de relaxamento da prisão. Na segunda hipótese, de ação privada, aplica-se
o art. 46, por analogia. O relaxamento da prisão não impedirá, entretanto, a denúncia ou a queixa,
respeitado o prazo de decadência (art.38).
Flagrante preparado é o caso da súmula no 145 do STF, “não há crime quando a preparação do
flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação”. A jurisprudência, com fundamento nesse
enunciado, tem afirmado que não pode ser autuado em flagrante o agente de crime provocado,
ou seja, quando o agente é induzido à prática de um crime pela “pseudovítima”, por terceiro ou
pela polícia, no caso, chamado de agente provocador. Não há crime nesse caso. Tal situação não se
confunde, segundo se tem decidido, com o flagrante esperado, em que a atividade policial é apenas
de alerta, sem instigar o mecanismo causal da infração, em que procura colher a pessoa ao executar
a infração, frustrando a sua consumação, quer porque recebeu informações a respeito do provável
cometimento do crime, quer porque exercia vigilância sobre o delinquente.
Crime é fato típico ilícito culpável, sendo que para o estudo do crime impossível é mais importante
a análise do fato típico. Este é a conduta humana que se adequa ao tipo, produzindo um resultado
(normativo ou naturalístico) proibido pela lei penal. Dessa forma, são elementos do fato típico:
conduta; resultado; relação de causalidade; e tipicidade. Seu estudo passou por diversas
transformações, na medida em que evoluimos do causalismo para o finalismo, deste para a doutrina
social e, finalmente, para a imputação objetiva.
Interessa para o estudo do crime impossível a análise da tipicidade, visto que ele é aquele “crime”
que, na verdade, não existiu, seja por absoluta impropriedade do objeto ou ineficácia do instrumento.
33
UNIDADE II │ LIBERDADE
Mas não é somente a tipicidade que nos interessa. Aqui, são importantes os conceitos de conduta e
de resultado, visto que eles estão intimamente ligados ao art. 17 do Código Penal.
Preceitua o art. 17 do CP: “Art. 17 – Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio
ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime”.
A impropriedade, nos termos da lei, deve ser absoluta, para ser capaz de gerar o crime impossível.
Acerca de tal espécie de delito, ensina João José Leal:
Não gera, portanto, crime impossível a impropriedade relativa do objeto ou do meio. Assim, se uma
pessoa tentar subtrair dinheiro do bolso esquerdo da calça de outra e ali não houver dinheiro algum,
mas este estiver no bolso direito, entende-se que a impropriedade é relativa. Destarte, deve o agente
ser punido por furto tentado.
Embora estando previsto na lei brasileira, o crime impossível não é admitido em alguns países. No
Código Penal Alemão, por exemplo, consta a possibilidade de se punir a tentativa inidônea.27
Cezar Roberto Bitencourt defende a teoria esposada pelo Código Penal, que é a objetiva, pela qual
a tentativa inidônea é impossível porque jamais se completaria o delito, em face da ausência de
seus elementos.28 Não obstante, somos partidários da teoria subjetiva, visto que o que é decisivo é
a intenção do agente. Mais, há outra teoria, a sintomática, que não deve ser desprezada, tendo em
vista que o agente que tem coragem de tentar um delito impossível tem periculosidade, ou seja,
apresenta sintomas relevantes ao DCrim, merecendo censura.
25
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da Língua Portuguesa. 1. ed. 4. tir. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1975, p. 754.
26
LEAL, João José. Direito Penal |Geral. São Paulo: Atlas, 1998, p. 240.
27
Cf. LEAL, João José. Direito Penal |Geral. São Paulo: Atlas, 1998. p. 242.
28
BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. vol. 1, p. 369.
34
LIBERDADE │ UNIDADE II
Na verdade, ficamos em relativo conflito porque existe a máxima nullun crimen sine iniuria, pela
qual não há crime se não há ofensa ou risco concreto ao objeto jurídico tutelado.29 Outrossim, não se
pode olvidar da subsidiariedade do DCrim, bem como de seu aspecto garantista, o que se concretiza
pelo princípio da intervenção mínima. Desse modo, conforme ensina Cezar Roberto Bitencourt, a
teoria objetiva está em melhor consonância com a nova defesa social.30 Porém, conforme ensina
Welzel, o DCrim deve estar fundamentado em estruturas ontológico-objetivas, que só pode ser
concretizado se apreciados os elementos subjetivos do autor.31
Por oportuno, recorde-se que o próprio código penal, em vários momentos, considera crime a simples
ameaça aos objetos jurídicos tutelados. No crime impossível, poderia se dizer, não houve perigo
(ameaça) ao objeto jurídico, portanto, a pena seria aplicada segundo os sintomas de periculosidade do
autor. Porém, não se trata de se resgatar um DCrim de autor (baseado unicamente na periculosidade
do agente), mas na própria censura do fato, verbi gratia, quem aperta o gatilho de arma desmuniciada
tentando matar pratica fato censurável e sua conduta é potencialmente perigosa.
Ademais, as novas tendências do DCrim migram para a imputação objetiva do resultado e esta se dá
segundo os elementos subjetivos do autor. Desse modo, continua sendo mais importante a intenção
do agente, que o resultado propriamente dito. Com efeito, uma tentativa de homicídio, em que o
agente tenha errado todos os disparos, descarregando sua arma, sem atingir a vítima, restando ela,
portanto, ilesa, deve ser visto como mais grave que a lesão negligente que causa deficiência física ou
mental permanente. Nesse sentido, nosso Código Penal, admite o perdão judicial no homicídio e na
lesão corporal negligentes (arts. 121, § 5o e 129, § 8o). Porém, mesmo que não haja qualquer lesão, o
homicídio tentado deve ser apenado, não sendo possível o perdão judicial.
Finalmente, cumpre lembrar que tanto pela ineficácia do meio, quanto pela impropriedade do
objeto, a não obtenção do resultado, no crime impossível, só não se dá por circunstância alheia
à vontade do agente. Desse modo, se suprimido o art. 17 do Código Penal, subsistirá a tentativa
prevista no art. 14, inciso II, do mesmo diploma legal, com as penas do parágrafo único de tal artigo.
O flagrante forjado ocorre quando policiais ou terceiros criam provas de um crime inexistente,
colocando, por exemplo, substância entorpecente no bolso de um cidadão. Desta maneira, o flagrante
forjado ocorre quando se criam provas de um delito que não existiu com a intenção de se prender
alguém em flagrante delito. Nesta hipótese não há crime consumado ou tentado do preso, mas sim
uma mera situação de abuso de autoridade, infelizmente comum na atualidade. Diferencia-se do
flagrante preparado, pois neste a atividade policial consiste em um induzimento à pratica do crime
de um cidadão já propenso a tal ato, ou seja, mais dia menos dia esse indivíduo cometerá novamente
determinado delito, que até então não pode ser interceptado pela atividade policial, pois este ato foi
provocado pela própria polícia ou terceiro. Já no flagrante forjado o indivíduo não cometeu e não
cometeria crime algum, é pois um flagrante nulo, não houve provocação ou instigação da polícia e
sim, simplesmente, um abuso de autoridade pelas pessoas que efetuaram a prisão. Ora, se o conteúdo
material do flagrante é o crime que o enseja, o flagrante forjado, por estar despido do conteúdo material
capaz de possibilitar a intervenção pública, deve ser rejeitado e abolido de nosso País.
29
GOMES, Luiz Flávio. Princípio da ofensividade no Direito Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. passim.
30
BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit.. p. 369.
31
WELZEL, Hans. O novo sistema jurídico-penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. passim.
35
UNIDADE II │ LIBERDADE
O flagrante retardado está previsto no art. 20, inciso II, da Lei no 9.034/1995, denominada de Lei
do Crime Organizado e consiste em retardar a interdição policial do que se supõe ação praticada por
organizações criminosas ou a ela vinculada, desde que mantida sob observação e acompanhamento
para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz do ponto de vista da formação de
provas e fornecimento de informações.
Neste caso, o agente policial percebe que alguém está em estado de flagrância, e deveria, deste
modo, dar-lhe voz de prisão. No entanto a lei confere ao policial certa discricionariedade para deixar
de efetuar a prisão em flagrante no momento em que se presencia a prática da infração penal e
aguarde o momento em que julgar conveniente, não agindo precipitadamente, e sim, no momento
mais oportuno para a instrução da investigação criminal ou da colheita de provas.
Esse tipo de ação só será permitida, nos termos da lei, no caso de organização criminosa, ou seja,
somente em ações praticadas por organizações criminosas a elas vinculadas. Segundo o professor
Fernando Capez: “exclusivamente no crime organizado é possível tal estratégia interventiva. Fora
da organização criminosa é impossível tal medida”.32 Destarte o flagrante prorrogado ou retardado,
difere-se do esperado, pois neste o agente não pode aguardar o melhor momento, ou seja, não lhe
é arbitrada a discricionariedade para efetuar a prisão, devendo esta ser executada no primeiro
instante em que ocorrer o crime.
Quando se tratar de infração permanente, entende-se que o agente estará em flagrante delito
enquanto não cessar a permanência.
O procedimento da lavratura do auto de prisão está disposto nos artigos 304 a 306 do CPP. Sendo
o preso apresentado à autoridade competente, esta ouvirá o condutor e colherá, desde logo, sua
assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso, prosseguindo, em seguida,
à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que
lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal,
o auto. De acordo com as respostas, a autoridade policial é quem fará o juízo sobre o cabimento
da prisão. Vale lembrar que não há prisão em flagrante na hipótese de crime de menor potencial
ofensivo, onde, ao invés de se lavrar o auto de prisão, tem-se a lavratura do Termo Circunstanciado.
Caso a autoridade policial não tenha atribuição, deverá enviar o feito para a autoridade que a seja,
nada impedindo que lavre o auto de prisão em flagrante.
»» Ao Juiz competente
»» Ao Ministério Público
CAPEZ, Fernando. Processo Penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p.222.
32
36
LIBERDADE │ UNIDADE II
Nota-se que não há prazo de 24 horas para a prisão. Essa figura lendária nada mais é do que uma
confusão com o prazo para entrega da Nota de Culpa.
A grande alteração da lei no12.403/2011 está no artigo 310. A partir de agora, de forma expressa, o
Juiz, ao receber o auto de prisão em flagrante, deverá de forma fundamentada:
Portanto, a partir de agora, a prisão em flagrante nada mais é do que um prisão de natureza
extremamente curta, a qual ou o juiz converterá em prisão preventiva ou soltará o preso para que
responda o processo em liberdade. Tem-se uma clara medida com o intuito de reduzir o número
de presos provisórios que cumprem, muitas das vezes, suas penas antes da sentença condenatória.
37
CAPÍTULO 5
Prisão preventiva. Prisão em face
de denúncia
A expressão prisão preventiva tem uma acepção ampla para designar a custódia verificada antes
do trânsito em julgado da sentença. É a prisão processual, cautelar, chamada de “provisória” no
Código Penal (art. 42) e que inclui a prisão em flagrante, a prisão decorrente de pronúncia, a prisão
resultante de sentença condenatória, a prisão temporária e a prisão preventiva em sentido estrito.
Nesse sentido restrito, é uma medida cautelar, constituída da privação de liberdade do indigitado
autor do crime e decretada pelo juiz durante o inquérito ou instrução criminal em face da existência
de pressupostos legais, para resguardar os interesses sociais de segurança.
A prisão preventiva pode ser decretada quando houver indícios suficientes de autoria do crime (art.
302, in fine). A primeira exigência refere-se à materialidade do crime, ou seja, à existência do corpo
de delito que prova a ocorrência do fato criminoso (laudos de exame de corpo de delito; documentos;
prova testemunhal etc.).
Em verdade, a prisão preventiva é a principal forma de prisão cautelar existente no nosso sistema
jurídico. Regulada nos artigos 311 a 350, tem, no seu artigo 312 os requisitos de seu cabimento que são:
Os requisitos mencionados em lei são de aplicação bastante complexa. Conceituar ordem pública é um
desafio dos mais difíceis, haja vista que diversos são os entendimentos sobre o assunto. O Supremo,
por exemplo, não admite o clamor público como motivo para decretação da prisão preventiva, de
forma isolada33. Há decisões, no sentido de que o clamor público não isolado mas cumulado com a
credibilidade do Poder Judiciário34, seria fundamento suficiente para a referida decretação.
33 Habeas corpus. 2. Tráfico de drogas e associação para o tráfico. 3. Prisão preventiva. Decreto que, a título de garantir a ordem
pública e a conveniência da instrução criminal e de assegurar a aplicação da lei penal, baseia-se no clamor público causado pela
gravidade do fato. Inadmissibilidade. 4. A prisão preventiva, pela excepcionalidade que a caracteriza, pressupõe decisão judicial
devidamente fundamentada, amparada em elementos concretos que justifiquem a sua necessidade, não bastando aludir-se a
qualquer das hipóteses do art. 312 do Código de Processo Penal. 5. Constrangimento ilegal configurado. 6. Ordem concedida
para tornar definitiva a liminar.(HC 95358, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 8/6/2010, DJe-
145 DIVULG 5-8-2010 PUBLIC 6-8-2010 EMENT VOL-02409-03 PP-00680)
34 EMENTA: HABEAS CORPUS. CRIME HEDIONDO. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E
DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. CREDIBILIDADE DA JUSTIÇA E CLAMOR PÚBLICO. TENTATIVAS CONCRETAS DE
INFLUENCIAR NA COLETA DA PROVA TESTEMUNHAL. ORDEM DENEGADA. 1. O conceito jurídico de ordem pública
não se confunde com incolumidade das pessoas e do patrimônio (art. 144 da CF/88). Sem embargo, ordem pública se constitui
em bem jurídico que pode resultar mais ou menos fragilizado pelo modo personalizado com que se dá a concreta violação da
integridade das pessoas ou do patrimônio de terceiros, tanto quanto da saúde pública (nas hipóteses de tráfico de entorpecentes
e drogas afins). Daí sua categorização jurídico-positiva, não como descrição do delito nem cominação de pena, porém como
pressuposto de prisão cautelar; ou seja, como imperiosa necessidade de acautelar o meio social contra fatores de perturbação
ou de insegurança que já se localizam na gravidade incomum da execução de certos crimes. Não da incomum gravidade abstrata
desse ou daquele crime, mas da incomum gravidade na perpetração em si do crime, levando à consistente ilação de que, solto,
o agente reincidirá no delito ou, de qualquer forma, representará agravo incomum a uma objetiva noção de segurança pública.
Donde o vínculo operacional entre necessidade de preservação da ordem pública e acautelamento do meio social. Logo, conceito
de ordem pública que se desvincula do conceito de incolumidade das pessoas e do patrimônio alheio (assim como da violação
à saúde pública), mas que se enlaça umbilicalmente à noção de acautelamento do meio social. 2. É certo que, para condenar
38
LIBERDADE │ UNIDADE II
É pacífico o entendimento de que a gravidade do crime deve ser analisada de forma concreta e
não apenas no plano abstrato. Não basta a hediondez, por exemplo, do crime, devendo ser
demonstrado pelo Juiz o perigo causado pela ofensa à garantia da ordem pública35. Por outro lado,
réus que reiteradamente praticam condutas delituosas, bem como demonstram a possibilidade de
eventualmente praticar tais atos, são passíveis de terem contra si um decreto prisional com esse
fundamento legal.
A custódia será decretada ainda como garantia de ordem econômica, quando a conduta tendo
por objeto possa limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre
iniciativa; dominar mercado relevante de bens ou serviços; aumentar arbitrariamente os lucros; e
exercer de forma abusiva posição dominante.
A garantia da ordem econômica, por sua vez, afeta os crimes da lei no 8.884/94, como, por exemplo,
a prática de cartel.
A prisão preventiva por conveniência da instrução criminal pode se dar na hipótese de ameaça ou
compra de testemunhas, destruição de provas ou situações que venham a tumultuar o processo. A
prisão para aplicação da lei penal se aplica no caso do concreto risco do indivíduo vir a fugir ou na
hipótese de ele já estar revel ou sequer tenha sido citado pessoalmente, já que não teria como ele
responder pelos eventuais atos praticados.
Não basta, todavia, a decretação da prisão preventiva e existência do fumus comissi delicti e o
periculum libertatis, sendo indispensável a presença das chamadas condições de admissibilidade
(art. 313 do CPP). Em primeiro lugar, a cautelar só pode ser decretada em casos de crimes dolosos,
sendo incabível nos crimes culposos e nas contravenções penais. Além disso, em regra, exige-se que
o delito seja apenado com reclusão.
penalmente alguém, o órgão julgador tem de olhar para trás e ver em que medida os fatos delituosos e suas coordenadas dão
conta da culpabilidade do acusado. Já no tocante à decretação da prisão preventiva, se também é certo que o juiz valora esses
mesmos fatos e vetores, ele o faz na perspectiva da aferição da periculosidade do agente. Não propriamente da culpabilidade.
Pelo que o quantum da pena está para a culpabilidade do agente assim como o decreto de prisão preventiva está para a
periculosidade, pois é tal periculosidade que pode colocar em risco o meio social alusivo à possibilidade de reiteração delitiva
(cuidando-se, claro, de prisão preventiva com fundamento na garantia da ordem pública). 3. Não se acha devidamente motivado
o decreto de prisão que, quanto à ordem pública, sustenta risco à credibilidade da justiça e faz do clamor público fundamento da
custódia preventiva. É que tais fundamentos não se amoldam ao balizamento constitucional da matéria. 4. Na concreta situação
dos autos, esse ponto de fragilidade não se estende, porém, ao segundo fundamento do decreto de prisão preventiva. É falar:
a segregação cautelar para o resguardo da instrução criminal não é de ser afastada pela carência de fundamentação idônea.
Isso porque, no ponto, o decreto de prisão preventiva está assentado em manobras operadas pelo paciente para tentar alterar
depoimentos de testemunhas. O que é suficiente para preencher a finalidade do art. 312 do Código de Processo Penal, no ponto
em que autoriza a prisão preventiva para a preservação da instrução criminal, mormente nos casos de crimes dolosos contra
a vida. Crimes cujo julgamento é timbrado pela previsão de atos instrutórios também em Plenário do Júri (arts. 473 a 475 do
CPP). 5. Ordem denegada.
(HC 102065, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Segunda Turma, julgado em 23/11/2010, DJe-030 DIVULG 14-2-2011 PUBLIC
15-2-2011 EMENT VOL-02464-02 PP-00366)
35 EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS INDEFERIDO LIMINARMENTE NO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CAUTELAR IDÔNEA PARA A PRISÃO PREVENTIVA:
OCORRÊNCIA. PRECEDENTES. ORDEM CONCEDIDA. EXTENSÃO AOS CORRÉUS. 1. O temperamento da Súmula n.
691 somente pode ocorrer em situações excepcionalíssimas, quando patente a transgressão às normas vigentes pela decisão
questionada, sujeitando a pessoa a constrangimento não fundamentado no sistema jurídico, o que, à evidência, não é o caso
dos autos. Precedentes. 2. A jurisprudência predominante deste Supremo Tribunal afasta a prisão preventiva que se funda
na gravidade abstrata ou concreta do delito imputado, definido ou não como hediondo. 3. Concessão da ordem para deferir a
liberdade provisória ao Paciente e aos corréus.
(HC 104128, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 16/08/2011, DJe-179 DIVULG 16-9-2011 PUBLIC
19-9-2011 EMENT VOL-02589-01 PP-00041)
39
UNIDADE II │ LIBERDADE
Não se decreta prisão preventiva em infrações apenadas somente por multa. Quando os crimes são
apenados com detenção, a medida somente será aceita de apurar que o agente é vadio ou, havendo
dúvida sobre sua identidade, não fornecer ou indicar elementos para esclarecê-la.
Publicação: DJ 10.11.2006. p. 65
E quem pode decretar a prisão preventiva? A lei no 12.403/2011 alterou o artigo 311 dispondo que
caberá a prisão preventiva de ofício pelo Juiz APENAS na fase processual, cabendo o requerimento
do Ministério Público, do querelante, do assistente ou a representação da autoridade policial tanto
na fase inquisitorial como na fase processual.
O artigo 313 prevê as hipóteses de cabimento para a prisão preventiva. Dessa forma, só se poderá
decretar a prisão preventiva quando se tiver um dos requisitos do artigo 312 cumulado com uma das
hipóteses do artigo 313. São elas:
»» nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4
(quatro) anos;
»» se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado,
ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7
de dezembro de 1940 – Código Penal;
40
LIBERDADE │ UNIDADE II
Verifica-se que é plenamente possível se prender preventivamente alguém pelo crime de ameaça,
por exemplo, no caso de se tratar de violência doméstica, para garantir a execução das medidas
protetivas de urgência, não havendo uma relação direta entre a gravidade do crime e o cabimento
da prisão.
Já o parágrafo único do artigo 313 prevê que também caberá a prisão preventiva quando houver
dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para
esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo
se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.
O artigo 314 faz a ressalva de que não caberá prisão preventiva se tiver presente nos autos a hipótese
de excludente de ilicitude. O 315 afirma que a decisão será sempre motivada, respeitando o artigo 93,
IX da Constituição Federal, enquanto que o 316 dispõe que o juiz poderá revogar a prisão preventiva
se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-
la, se sobrevierem razões que a justifiquem
Os artigos 317 e 318 regularam a prisão domiciliar, substituindo os artigos que versavam sobre a
apresentação espontânea do acusado, o que deu azo a muitas críticas, já que o texto anterior dava
uma garantia ao indivíduo de não ser preso em flagrante na hipótese de apresentação espontânea.
Todavia, apesar de revogado, o espírito do texto ainda se faz presente na redação atual do Código
Penal, não cabendo, na verdade, prisão em flagrante, nada impedindo que o indivíduo seja preso
preventivamente.
Segundo a redação do CPP trazida pela Lei no 12.403/2011, a prisão domiciliar consiste no
recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com
autorização judicial, tendo como hipóteses de cabimento quando o agente for:
A lei no 12.403/2011 deu nova força a um instituto que estava bastante fragilizado no processo penal
brasileiro. Como na lei anterior, tanto a Autoridade Policial como o Juiz podem conceder fiança.
Entretanto, nas penas privativas de liberdade até quatro anos, inclusive, a Autoridade Policial tem
legitimidade para arbitrá-la, podendo o Juiz, nos demais casos, a requerimento da parte, decidir seu
cabimento e valor em 48 horas.
41
UNIDADE II │ LIBERDADE
»» nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem
constitucional e o Estado Democrático
O valor a ser fixado para a fiança deverá levar em consideração a natureza da infração, as condições
pessoais sociais da pessoa e sua vida pregressa, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade,
bem como a importância provável para as custas do processo, podendo ser de 1 a 100 salários
mínimos, quando a infração for até 4 anos e de 10 a 200 salários mínimos nas penas superiores a tal
quantum, podendo o Juiz dispensá-la, reduzi-la até o máximo de 2/3 ou aumentá-la em 1000 vezes,
de acordo com a situação econômica do preso.
Com a fiança reduzida a termo, o afiançado deverá comparecer perante a autoridade sempre que
intimidado, considerada quebrada a fiança quando não comparecer. Outra hipótese de quebramento
é a mudança de residência sem prévia permissão da autoridade ou a ausência por mais de 8 dias de
sua residência sem comunicar a autoridade o lugar onde possa ser encontrado.
A fiança consistirá em depósito de dinheiro, pedras, objetos ou metais preciosos, títulos da dívida
pública, federal, estadual ou municipal, ou em hipoteca inscrita em primeiro lugar, sendo feita a
avaliação, se necessária, por perito nomeado pela autoridade. Na hipótese de títulos públicos o valor
será determinado pela sua cotação em Bolsa e exigir-se-á prova de que se achem livre de ônus.
A fiança será concedida independentemente de audiência do Ministério Público, que só terá vista
do processo após sua concessão, requerendo o que entender conveniente. A fiança servirá para o
pagamento das custas, da indenização do dano, da prestação pecuniária e da multa, caso o réu
venha a ser condenado. Caso haja prescrição em abstrato, a fiança também terá essa destinação.
Todavia, caso o réu seja absolvido ou seja declarada extinta a ação penal, o valor da fiança será
restituído, sem qualquer desconto, atualizado. Dessa forma, caso haja suspensão condicional do
processo, por exemplo, o indivíduo, cumprindo todas as medidas, receberá de volta, corrigido, o valor
integral depositado.
A fiança concedida em delito inafiançável ou em hipótese vedada de cabimento será cassada, sendo
exigido o reforço da fiança quando a autoridade tomar, por engano, fiança insuficiente, quando
houver depreciação material ou perecimento dos bens hipotecados ou caucionados, ou depreciação
42
LIBERDADE │ UNIDADE II
dos metais ou pedras preciosas ou quando for inovada a classificação do delito. Caso o réu não a
reforce, deverá ele ser recolhido à prisão.
»» regularmente intimado para ato do processo, deixar de comparecer, sem motivo justo;
Com o quebramento, a fiança resultará na perda da metade de seu valor, devendo o juiz decidir
sobre a imposição de outras medidas cautelares e a decretação da prisão preventiva. Caso o acusado
venha a ser condenado e não se apresentar para o início do cumprimento da pena, será perdida a
fiança na totalidade, sendo, nesse caso, o valor recolhido ao fundo penitenciário.
Caso haja saldo positivo após todas as deduções legais, inclusive os encargos relativos ao cumprimento
de sua pena, o valor será restituído.
Dessa forma, a fiança ganhou uma nova força, haja vista sua maior aplicabilidade, já que a antiga
redação do artigo 310, § único, antes da Lei no 12.403/2011, praticamente tornava-a inócua, salvo na
hipótese de crime de detenção.
43
CAPÍTULO 6
Prisão em face de sentença de pronúncia
Alertamos que, embora seja incoerente, o latrocínio (roubo com resultado morte, previsto no art.
157, § 3o, in fine, do Código Penal) e o genocídio próprio (aquele em que se mata para extinguir um
grupo, no todo ou em parte, em função da raça, da etnia, da cultura ou da religião) são crimes da
competência do juiz singular.
O crime que será julgado perante o júri terá procedimento que consagrará duas fases. A primeira
é denominada juízo de acusação (iudicium acusationis) porque o Juiz verificará a plausividade de
mandar os fatos ao juízo da causa (iudicium causae).
Ao final da primeira fase, o juiz poderá decidir se pronunciará o réu, mandando-o à segunda fase
(iudicium causae) ou se extingue o processo por meio de sentença de mérito (absolvição sumária).
Além dessas duas decisões (pronúncia e absolvição sumária), o juiz poderá impronunciar o réu
ou desclassificar o crime (para crime de competência diversa do tribunal do júri ou mantendo a
competência dele).
Na decisão de pronúncia (que não é propriamente sentença), o Juiz decidirá motivadamente sobre
a liberdade do pronunciado (Código de Processo Penal, art. 413, §§ 2o e 3o). Assim, a prisão em
flagrante será mantida até a pronúncia, depois terá sua espécie modificada para prisão decorrente
de pronúncia.
Em uma hipótese, caso o juiz verifique que a prisão em flagrante é ilegal, poderá determinar seu
relaxamento. Não obstante isso, poderá determinar a prisão temporária no curso do inquérito
e, ao receber a denúncia, poderá converter a prisão temporária em prisão preventiva. Na fase da
pronúncia, novamente a espécie de prisão provisória será modificada para prisão decorrente de
decisão de pronúncia.
36
LOBÃO, Célio J. Direito Penal Militar. Brasília: Brasília Jurídica, 1999. p. 112.
37
MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Prescrição penal. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 154.
44
LIBERDADE │ UNIDADE II
A prisão provisória é gênero de várias espécies de prisão cautelar. Todas elas exigem os pressupostos
básicos de todas as cautelares, ou seja, a prisão só poderá ser decretada se presentes a fumaça
do bom direito e perigo da demora. Destarte, não estará demonstrada a necessidade da prisão na
fase da pronúncia se, até ser proferida, o réu estiver solto e não houver qualquer inovação que a
justifique. No mínimo um dos fundamentos do art. 312 do Código de Processo Penal deverá estar
devidamente provado nos autos.
.
O Juiz poderá decretar prisão na sentença de pronúncia se ela não for requerida pela
acusação?
45
CAPÍTULO 7
Prisão em face de sentença recorrível
Trata-se de medidas cautelares pessoais. Em ambos os casos, há que se distinguir se o réu se encontra
preso ou solto. Com efeito, estando o acusado preso durante o processo, permite-se que o juiz, ao
condená-lo, e na própria sentença, recomende-o na prisão, ratificando os motivos que autorizam a
custódia cautelar anteriormente decretada. Por outro lado, se o réu permaneceu solto durante a lide,
o juiz, proferindo veredito condenatório, deverá justificar, fundamentalmente, na própria sentença,
se assegura ao acusado o direito de recorrer em liberdade ou, se presentes o fumus comissi delicti e
o periculum libertatis (que, na verdade, são os mesmos motivos da prisão preventiva), decretar-lhe
a prisão cautelar, a qual, no caso, decorrerá de sentença condenatória recorrível.
É pacifico que a sentença condenatória recorrível, por si só, não autoriza a medida cautelar restritiva
de liberdade. A prisão não decorre pela só prolação da decisão, sob pena de ofensa ao constitucional
estado de inocência, assegurado até o trânsito em julgado da condenação, razão de remeter-se às
observações relativas à prisão preventiva.
Em caso de impronúncia ou absolvição, não há de se falar em prisão cautelar, devendo o acusado ser
colocado imediatamente em liberdade, se por outro motivo não estiver preso, isso porque a decisão
constituirá presunção de descabimento da acusação, opondo-se ao fumus comissi delicti e ao
periculum libertatis.
Imagine-se que o preso em flagrante assim esteja até a prolação da sentença condenatória recorrível.
Na sentença, caso o Juiz recomende o réu na prisão que se encontra, a natureza da prisão continuará
sendo cautelar, como toda prisão provisória, mas a espécie se modificará, em face do seu decreto.
A Lei no 8.072/1990 prevê que, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente
se o sentenciado poderá apelar em liberdade (art. 2o, § 3o). Daí os tribunais estarem dizendo que o
Juiz não precisa motivar a recomendação na prisão. A fundamentação para manutenção da prisão
é, na visão dos tribunais, op legis. Destarte, o direito de apelar em liberdade é aquele que precisa
ser motivado.
Em primeiro lugar, a fundamentação precisa estar adstrita ao fato e o art. 93, inc. IX da Constituição
Federal não excepciona, razão de todas as decisões judiciais necessitarem de motivação, salvo quando
fundamentadas na própria Constituição Federal. Assim, o direito de permanecer em liberdade
durante o processo, como garantia constitucional que constitui, não poderá estar condicionado à
motivação.
O art. 93, inc. IX, da Constituição Federal classifica-se entre os de eficácia plena. Destarte, ela
não pode estar condicionada à regulação infraconstitucional, ainda que data por interpretação de
julgadores. Não se pode pretender dar maior vigor à legislação infraconstitucional ou à decisão
judicial que contraria a literalidade da Constituição Federal. Daí constituir grande avanço a previsão
do art. 741, parágrafo único do Código de Processo Civil, o qual autoriza, inclusive considerar ineficaz
o título fundamentado em sentença ou qualquer outro ato normativo inconstitucional.
46
LIBERDADE │ UNIDADE II
A existência de sentença recorrível não induz à presunção de culpabilidade, sendo pífia a interpretação
judicial do art. 2o, § 3o, da Lei no 8.072/1990, que entende haver fundamentação em tese (fundamentada
em uma previsão legal genérica) capaz de justificar a proibição de apelar em liberdade em todos casos
de condenação recorrível.
47
CAPÍTULO 8
Prisão em face de sentença recorrível
pendente de julgamento de recurso
especial ou de recurso extraordinário
Mesquita Júnior criticou duramente a posição do Supremo Tribunal Federal, construída no sentido
de que a prisão decorrente de sentença condenatória recorrível, mas pendente de julgamento de
recurso extraordinário ou especial, constitui execução provisória da sentença. Aduz o autor que a
posição da jurisprudência viola o art. 5o, inciso LVII, da Constituição Federal.38
MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução criminal: teoria e prática. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 214-216.
38
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 464-465.
39
48
LIBERDADE │ UNIDADE II
49
UNIDADE II │ LIBERDADE
50
LIBERDADE UNIDADE III
CAPÍTULO 1
Generalidades
Sabe-se que é um mal a prisão do acusado antes do trânsito em julgado de uma sentença condenatória.
O direito objetivo tem procurado estabelecer institutos e medidas que assegurem o desenvolvimento
regular do processo com a presença do imputado sem o sacrifício da custódia, que só deve ocorrer
em casos de absoluta necessidade.
A liberdade é a regra. Assim, a exigência de uma garantia para sua manutenção seria contrassenso,
só se podendo imaginar tal ocorrência em casos extremos em que a prisão cautelar seja necessária.
Nesse ponto, oportuna é a lição de Eugênio Pacelli:
Uma leitura apressada da afirmação transcrita leva a crer que a liberdade provisória constitui
cautelar que, para ser concedida, exigiria requisitos específicos. Entretanto, melhor analisando a
posição do autor, é possível concluir que é inaceitável conceder liberdade provisória com diversas
exigências, em contraposição ao seu estado de inocente.
Perante o direito pátrio vigente, esse instituto é a liberdade provisória, que substitui a custódia
provisória, atual ou iminente, com ou sem fiança, nas hipóteses de flagrante (arts. 301 a 310), em
decorrência da pronúncia (art. 408, § 1o) e da sentença condenatória recorrível.
Por esse instituto, o acusado não é recolhido à prisão ou é posto em liberdade quando preso,
vinculado ou não a certas obrigações que o prendem ao processo e ao juízo, com o fim de assegurar
a sua presença ao processo sem o sacrifício da prisão provisória. É, pois, um estado de liberdade
que pode estar gravado nas condições e reservas que tornam precário e limitado o seu gozo. Tem a
denominação de liberdade “provisória”, porque pode ser revogada a qualquer tempo, salvo no caso
de não ser vinculada, e quando vigora apenas até o trânsito em julgado da sentença final que, se
condenatória, transforma a liberdade em definitiva.
Por sua vez, a liberdade provisória é vedada, quando couber a prisão preventiva ou quando a CF ou
a lei expressamente a proibir. Nesse contexto, a CF dispõe serem inafiançáveis a prática de racismo
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 427.
41
51
UNIDADE II │ LIBERDADE
(art. 5o, XLII), os crimes hediondos e os a eles equiparados (XLIII) e a ação de grupos armados, civis
ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. A seu turno, o art. 2o, inc. II,
da Lei no 8.072/1990 dispunha que eram insuscetíveis de fiança e liberdade provisória os crimes
hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo. Hoje,
o dispositivo só proibe a liberdade provisória com fiança.
52
CAPÍTULO 2
A incoerência da fiança
A liberdade provisória com fiança é uma garantia real do cumprimento das obrigações processuais
do réu, segundo ensina Mirabete. Trata-se de direito público subjetivo do acusado, pois, estando
previstos os requisitos, o juiz está obrigado a concedê-la (STF – RTJ 116/139).
Está evidente que aquilo que o CPP denomina de fiança significa propriamente caução, pois
deve ser prestada pela pessoa em seu próprio favor, a fim de que pagará as custas decorrentes
do processo criminal, no caso de eventual condenação. Caso a pessoa presa não possa suportar
qualquer valor para sua liberdade provisória, a fiança (melhor falando, caução) o dever de prestá-la
deverá ser desconsiderado, soltando-se a pessoa sem o arbitramento de fiança. Nesse caso, bastará
o compromisso do preso, feito no sentido de que cumprirá as condições da liberdade provisória e, se
condenado, se submeterá à pena.
O Código de Processo Penal não disse quais crimes são afiançáveis. Preferiu apontar os casos de
inafiançabilidade. Com efeito, a fiança não será concedida nos seguintes casos (arts. 323 e 324 do
CPP): crimes punidos com pena mínima de reclusão superior a 2 anos; contravenções de ociosidade
e mendicância; crimes punidos com pena privativa de liberdade, se já tiver sido definitivamente
condenado por outro crime doloso; réu for vadio; crimes punidos com reclusão que provoquem
clamor público ou que tenham sido cometidos mediante violência ou grave ameaça à pessoa; aos
que tiveram quebrado, no mesmo processo, a fiança; motivos que autorizam a prisão preventiva;
aos que estiverem em gozo de sursis ou livramento condicional, salvo se tratar de crime culposo ou
contravenção afiançáveis.
Em regra, a fiança dever ser concedida pelo juiz. Entretanto, a autoridade policial poderá concedê-la
nos casos de infração punida com detenção ou prisão simples, salvo nos crimes de sonegação fiscal
e contra a economia popular, quando só pode ser concedida pelo juiz, nos termos do § 2o do art. 325
De Plácido e Silva. Vocabulário jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 160.
42
Ibidem. p. 354.
43
53
UNIDADE II │ LIBERDADE
do CPP. Concedida a fiança, o acusado ficará obrigado a comparecer perante a autoridade, toda vez
que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para o julgamento, sob pena de
quebramento da fiança.
Sendo inafiançável a infração, cabe ao réu pleitear a liberdade provisória sem fiança, pois, como
visto, estas não se confundem. Existem casos, porém, em que o réu se livra solto independentemente
de fiança. Neste último caso, a liberdade provisória é concedida sem vinculação nos casos em que é
obrigatória, quais sejam, de infração e que não for cominada, isolada, cumulativa ou alternativamente
cominada, não excede a 3 meses, desde que o réu não tenha sido condenado por outro crime doloso,
em sentença transitada em julgado, e não seja vadio (art. 321 do CPP). Aqui, o réu livra-se solto, sem
nenhum ônus de comparecimento aos atos do processo.
Por outro lado, não sendo o caso de o réu se livrar solto (sem vinculação), a liberdade concedida, se
concedida, é dita com vinculação, ficando o acusado obrigado a comparecer perante a autoridade,
toda vez que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para julgamento, sob pena
de quebramento da fiança. Do mesmo modo, o réu não poderá mudar de residência, sem prévia
permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de 8 dias de sua residência, sem
comunicar àquela autoridade o lugar onde será encontrado.
Diz a jurisprudência:
Julgamento: 10.4.2007
Publicação: DJ 8.6.2007. p. 46
Decisão
54
LIBERDADE │ UNIDADE II
Considerar-se-á abusiva toda prisão que for decretada ou mantida se for cabível a liberdade provisória
com ou sem fiança, sendo que os crimes cuja a pena máxima cominada seja de 2 anos, como regra,
cabível será a liberdade provisória sem fiança, bastando a lavratura de termo circunstanciado (Lei
no 9.099, art. 69).
De forma até patética, a legislação pátria pretende resolver o problema da criminalidade por meio
de leis severas, estabelecendo que certos crimes não admitem fiança ou estarão excluidos do âmbito
do Juizado Especial Criminal.
No caso de violência doméstica, a Lei no 11.455, de 13.5.2002, como presente às mães (em
homenagem ao dia das mães) estabeleceu que o Juiz Criminal pode cumular competência cível,
própria dos juízos de família, estabelecendo a separação cautelar de corpos (Lei no 9.099/1995,
art. 69, parágrafo único). Embora a Lei no 11.340/2006 tenha sido técnica em seu art. 24, inc.
IV, ela tem em vista a partilha de bens, ou seja, reservou sua técnica ao âmbito civil.
Maria da Penha Maia Fernandes, em 29.5.1983, foi atingida pelo então marido,
Marco Antônio Heredia Viveiros, um economista colombiano nato e naturalizado
brasileiro. Ele foi denunciado no dia 28.9.1984 e pronunciado no dia 31.10.1986.
O júri o condenou no dia 4.5.1991, sendo que, por força de decisão proferida em
apelação da defesa, em 15.3.1996, foi submetido a novo júri e condenado a 10 anos e
9 meses de reclusão. Novos recursos foram interpostos e, em set. 2002, o condenado
foi preso. Em 20.8.1998, a própria Maria da Penha e organismos não governamentais
protocolaram representações junto à Comissão Interamericana de Direitos
Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), sendo que esta publicou,
em 16.4.2001, seu Relatório no 54 daquele ano, o qual apontou inúmeras falhas do
sistema jurídico brasileiro e levou o Brasil a aderir à Convenção de Belém do Pará
(ratificada pelo Brasil, em 27.11.2005). A respeito, vide: CUNHA, Rogério Sanches;
PINTO, Ronaldo Batista. Violência doméstica: Lei Maria da Penha. Comentada artigo
por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 11-15).
Diante da nova lei, crime apenado com detenção pode ser objeto de decreto de prisão preventiva,
prevalecendo a regra da prisão preventiva e da liberdade provisória mediante caução (indevidamente
denominada fiança na processualidade criminal pátria) a ser arbitrada pela autoridade judicial.
Deve-se concordar com Sérgio Romcy, no sentido de que a autoridade policial não poderá arbitrar
a fiança, ainda que o crime seja apenado com detenção, isso se a apresentação dos fatos ao juiz para
decidir imediatamente sobre serem cabíveis medidas de urgência.44
AUAD FILHO, Jorge Romcy. A liberdade provisória na Lei Maria da Penha. Teresina: Jus Navigandi, ano 12, n. 1585, 3
44
55
CAPÍTULO 3
Revogação de prisão preventiva
A prisão preventiva apresenta o caráter rebus sic stantibus, podendo ser revogada conforme o estado
da causa. Dispõe o art. 316 que o juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no decorrer do processo,
verificar a falta de motivo para que subsista. Não mais presentes os fatores que recomendam a
custódia preventiva, não deve ser ela mantida só porque a autoria está suficientemente provada e
a materialidade da infração demonstrada. Assim, se foi decretada apenas para garantir a instrução
criminal, finda esta, não é mais necessária, impondo-se a revogação da medida.
Deve-se assinalar que não se restabelece a prisão em caso de absolvição pelo júri. Entretanto,
anulado o julgamento condenatório do júri, por força de apelo da acusação, é ela restabelecida.
A prisão preventiva, dado seu caráter provisório, é extremamente tangível, podendo ser revista a
qualquer momento pelo juiz. Pode, assim, ser revogada no decorrer do processo, se o juiz verificar a
falta de motivo para que subsista, bem como ser decretada novamente, se sobrevierem razões que a
justifiquem (art. 316 do CPP) Observe-se a jurisprudência:
Julgamento: 20.3.2007
Decisão
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LIBERDADE │ UNIDADE II
A transcrição da ementa visa a demonstrar que o andamento da ação principal não pode estar
vinculado ao decreto da prisão provisória ou da concessão de liberdade provisória. Isso evidencia o
que já foi exposto, no tocante à autonomia da ação cautelar.
57
CAPÍTULO 4
Direito a recorrer solto
Atualmente, o STF (Primeira Turma, por unanimidade) acabou incorporando ao seu repertório
jurisprudencial garantista a tese referida: “Condenado a seis anos de prisão por crimes contra a
ordem tributária, C.D.C. Jr. teve Habeas Corpus (HC 88420) concedido pela Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal (STF). Com a decisão, o réu poderá apelar da sentença mesmo
não estando preso. Consta nos autos que C.D. estaria foragido desde a decretação de sua prisão
preventiva, antes mesmo de ser condenado definitivamente. Os advogados de defesa alegaram
que a decisão da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba (PR), bem como do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), que negou seguimento a habeas corpus idêntico impetrado naquela corte, teriam
ferido o disposto no art. 5o, LIV, LV e LVII, da Constituição Federal.
Neste habeas corpus, a defesa pedia ao STF que determinasse ao Juízo da 2ª Vara Criminal
Federal de Curitiba novo exame de admissibilidade do recurso de apelação, garantindo assim o
direito ao duplo grau de jurisdição. Voto do relator.
Para Ricardo Lewandowski, a ação trata do confronto de dois preceitos legais. Por um lado, o duplo
grau de jurisdição (conforme art. 8o, II, “h”, do Pacto de São José da Costa Rica – incorporado ao
ordenamento jurídico brasileiro por força do art. 5o, parágrafo 2o, da Constituição Federal). De outro
lado, a exigência de recolher-se o réu condenado à prisão para que sua apelação seja processada (de
acordo com art. 594 do Código de Processo Penal (CPP)). O que a defesa pretende é interpor em
favor do réu, condenado em 1o grau, recurso de apelação, independentemente de seu recolhimento
ao cárcere.
Lewandowski afirmou considerar que o direito ao duplo grau de jurisdição tem “estatura
constitucional, ainda que a Carta Magna a ele não faça menção direta”. Isso porque, prossegue o
ministro, o “due process of law”, constante do art. 5o, LXVI, contempla a possibilidade de revisão
por tribunal superior de sentença proferida por juízo monocrático.
Para ele, o “duplo grau” deve prevalecer sobre o art. 594 do CPP. “Tal direito integra o sistema pátrio
de direitos e garantias fundamentais, conforme decidido pelo Supremo na ADI 1675”, confirmou.
O relator ponderou que a incorporação desse direito foi posterior à edição do CPP (Decreto-Lei no
689/41). Isso porque a ratificação pelo Brasil da Convenção Interamericana de Direitos Humanos
(o Pacto de São José) foi em 1992. “Assim, qualquer disposição em contrário da lei processual
encontra-se, senão revogada, ao menos substancialmente mitigada”.
Assim, a Primeira Turma concedeu a ordem de habeas corpus, por unanimidade, seguindo o voto
do relator, para que seja recebida a apelação do condenado, interposta perante a 2ª Vara Criminal
58
LIBERDADE │ UNIDADE II
de Curitiba nos autos da ação penal, sem prejuízo do cumprimento da prisão preventiva contra ele
decretada, caso persistam os motivos que a determinaram.
Dois foram os fundamentos invocados pelo Relator para admitir a tese separatista (direito de apelar
versus prisão preventiva): o duplo grau de jurisdição no crime tem “estatura constitucional”; a
incorporação da Convenção Americana de Direitos Humanos ao direito brasileiro (1992) é posterior
ao art. 594 do CPP. Ou seja: norma superior prepondera sobre norma inferior ou lei posterior
derroga lei anterior. O primeiro fundamento é muito mais sólido e adequado.
59
Para (não) finalizar
A Lei no 11.343, de 23.8.2006, proíbe a concessão de liberdade, com ou sem fiança, se for preso em
flagrante por crimes dos seus arts. 33 a 37, sem que constituam propriamente crimes de tráfico ilícito
de drogas. Emerge, então a necessidade de questionar sobre a constitucionalidade de tal proibição,
uma vez que a Constituição Federal, em seu art. 5o, inc. XLIII, só proibiu a liberdade provisória
com fiança. Mais ainda, a Constituição Federal só se referiu ao “tráfico ilícito de drogas afins”, aos
hediondos e outros equiparados a este, sendo necessário indagar sobre a possibilidade de ampliar
as hipóteses de crimes assemelhados aos hediondos por norma infraconstitucional.
60
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