Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Ebook Autoria e Plágio em Debate PDF
Ebook Autoria e Plágio em Debate PDF
EM DEBATE
1
2
ANANIAS AGOSTINHO DA SILVA
(Organizador)
AUTORIA E PLÁGIO
EM DEBATE
3
Copyright © Autoras e autores
Todos os direitos garantidos. Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida,
transmitida ou arquivada desde que levados em conta os direitos das autoras e dos
autores.
Autoria e plágio em debate. São Carlos: Pedro & João Editores, 2020. 137p.
CDD – 410
4
SUMÁRIO
Apresentação 7
Ananias Agostinho da Silva
5
05. Marcas de autoria no gênero documentário: proposta 73
para o ensino de língua portuguesa
Valdenízia da Conceição Bezerra
Vicente de Lima-Neto
6
APRESENTAÇÃO
7
circunstâncias variadas foram objetos de análises. A compilação
desses trabalhos encontra-se neste breve livro, que apresenta oito
capítulos escritos pelos participantes daquela disciplina,
mobilizados por um espírito de engajamento, de dúvida, de
incerteza e de curiosidade. São capítulos que, a partir de variadas
perspectivas teóricas, refletem sobre os desdobramentos de certas
práticas de escrita na sociedade, visando entender as nuances da
autoria e os conflitos com a questão do plágio. Por isso, o título:
Autoria e plágio em debate.
No primeiro capítulo, Ananias Agostinho da Silva reflete sobre
a autoria em textos argumentativos produzidos por alunos
concluintes do Ensino Médio de uma escola pública do Rio Grande
do Norte. Para tanto, o autor analisa os indícios de autoria que
afloram da argumentação construída pelos alunos e comentários de
correção de professores de língua portuguesa sobre os textos os
quais realizou a análise. A ideia do autor é observar como
professores avaliam o critério de autoria nos textos produzidos
pelos alunos em fase de conclusão do Ensino Médio.
No segundo capítulo, Alison Sullivan de Sousa Alves, Danilo
Augusto de Menezes e Rubens Oliveira Dantas refletem sobre o
problema do plágio nas feiras de ciências realizadas em escolas da
Educação Básica, com destaque para o papel do professor na
orientação das pesquisas. Os autores concluem que há, nesse
espaço, de fato, uma preocupação por parte dos professores em
torno da questão do plágio, os quais têm buscado coibir tais
práticas no processo de produção das pesquisas de seus alunos. A
instrução, neste caso, se mostra como prática eficaz no tratamento
da questão, seja para evitar práticas danosas ou mesmo contribuir
com o ensino e a aprendizagem num movimento de (re)construção
do saber.
Em continuidade, o terceiro capítulo destaca as percepções de
discentes de um curso de licenciatura em matemática sobre a
autoria e o plágio. Andréa Morais de Menezes, Augusto Cesar
Tavares da silva, Rubson Gomes Martins Ramos, Marcelo Bezerra
de Morais e Márcia Maria Alves de Assis buscam responder como
8
se dá o tratamento das questões de autoria e plágio na
universidade, sobretudo num curso de ciências exatas. Como
resultado deste trabalho, os autores pretendem alertar graduandos
em fase de produção de trabalho de conclusão do curso da enorme
necessidade de respeitar tanto às regras associadas ao fazer
científico, assim como também da importância de atentar-se para
perceber pontos relevantes do conhecimento humano como, por
exemplo, a ética.
O quarto capítulo, de autoria de Dulcilene Leite de Amorim
Morais, Risalva Ferreira Nunes de Medeiros, Maria Isabel
Fernandes Costa, Silene Oliveira de Souza Patrício e Paulo Augusto
Tamanini, tem como foco a análise do conhecimento, do
entendimento e de atitudes realizadas por discentes da Educação
Profissionalizante sobre o tema plágio. Esse trabalho destaca-se por
tratar de uma modalidade de ensino focalizada muito mais no
aspecto técnico do que na formação humanística, mas ambas são
atravessadas pela ética como elemento condutor de uma formação
integral do ser humano, e, por isso, a necessidade de se evidenciar
e fortalecer ações direcionadas para essa temática em diversos
públicos escolares.
No quinto capítulo, Valdenízia da Conceição Bezerra e Vicente
de Lima-Neto discutem sobre a relevância do trabalho com
propostas de produção de documentários no Ensino Fundamental.
Os autores destacam o caráter complexo do trabalho com esse
gênero audiovisual e a sua potencialidade para o trabalho com
recursos tecnológicos e também linguísticos. Por isso, observam,
também, como a questão da autoria pode ser trabalhada em
propostas com esse gênero, tendo em vista que a produção desse
gênero exige critérios como originalidade. É interessante notar que
a autoria não compreende uma necessidade exclusiva dos textos
escritos na escola em gêneros canônicos, como a redação, por
exemplo, mas deve ser constitutiva de todo gênero.
Da tela para as cordas: o sexto capítulo problematiza acerca do
plágio e a autoria na literatura de cordel, especialmente na obra do
poeta Leandro Gomes de Barros. José Renato Pereira Brasil, Maria
9
Luiza Soares Lopes e Marielly Pereira Alves de Sousa focam a
relevância da obra de Leandro Gomes de Barros como um ícone da
literatura de cordel da sua época, sendo o cordelista que mais
produziu e publicou folhetos e, por isso, as controvérsias
envolvendo seu nome e a autoria de seus folhetos. Ao final, os
autores mencionam que a problemática atravessa a obra do autor
de várias formas, seja porque há inspiração em folhetos europeus
ou porque sofreu plágio inúmeras vezes, sendo algumas de suas
obras até hoje registradas e atribuídas a outros autores.
O sétimo capítulo possui um caráter avaliativo. Ele trata sobre
o plágio a partir das percepções dos alunos cursistas da disciplina
ofertada no curso de mestrado citado no início desta introdução.
Sabrina da Silva Neves, Maria das Dores Messias de Sousa,
Francisco Vieira da Silva e Marcelo Nunes Coelho observam como
a disciplina influenciou na formação dos cursistas, atentando para
possíveis nas concepções depois dos contatos com a disciplina no
decorrer do semestre letivo.
Finalmente, no último capítulo do livro, Alysson Leonez de
Araújo, Aristeu Antônio Oliveira de Carvalho, Jaelyca Caroline
Ferreira de Souza, Lindjanne Mannuelle Maria da Conceição
Araújo de Melo e Josélia Carvalho de Araújo analisam o plágio na
concepção de alunos do 8º ano escolar do Ensino Fundamental. Os
autores refletem acerca das origens da “cultura do plágio” no
Ensino Fundamental, frequentemente naturalizadas na prática da
“cola” em avaliações e trabalhos escolares. Assim, trata-se de uma
importante reflexão que pode apresentar contribuições
significativas para a prática de atividades de pesquisa e, com efeito,
de produção de textos na escola.
Por tudo isso, convidamos para a leitura deste livro.
10
Indícios de autoria na argumentação de alunos concluintes do
ensino médio: análise de textos e notas sobre a formação de
professores de língua portuguesa
Introdução
11
organizada, configurando autoria, em defesa de um ponto de vista.
Especialmente a partir de então, a autoria passou a ser vista como
uma exigência necessária ao texto do aluno concluinte do Ensino
Médio. Ao professor de língua portuguesa, isso trouxe pelo menos
duas preocupações: como ensinar ao aluno a produzir um texto
autoral e como ponderar quando um texto tem ou não autoria.
O linguista brasileiro Sírio Possenti tem, há algum tempo,
refletido sobre essas questões. Afastando-se, em parte, da noção
proposta por Foucault (1969), Possenti (2002) sustenta a tese de que
textos escolares podem revelar traços de autoria e o faz a partir da
análise de textos concretos e empíricos. Esses traços ou marcas são
denominados pelo linguista de indícios de autoria. Para ele, a autoria
é um efeito simultâneo de um jogo estilístico e de uma posição
enunciativa e, portanto, tem a ver com o modo como são
agenciados diversos recursos da língua a partir de certos
condicionamentos histórico-discursivos. Conforme Cavalcanti
(2014), o modo como Possenti (2002) tem entendido a autoria
parece ser o caminho mais acertado e apropriado para se
compreender como estudantes inscrevem uma posição autoral em
seus textos.
Assim sendo, neste capítulo, partimos, basicamente, dos
trabalhos de Possenti (2002, 2009, 2013) para refletirmos sobre a
autoria em textos argumentativos produzidos por alunos
concluintes do ensino médio de uma escola pública potiguar. Num
primeiro momento, tomamos os textos dos alunos para
analisarmos indícios de autoria que afloram da argumentação
construída, levando em consideração os traços apontados por
Possenti (2002) e outros inferidos dos próprios textos. Em
continuidade, analisamos comentários de correção de professores
de língua portuguesa sobre os textos os quais nos debruçamos,
tendo em vista a questão da autoria. Assim, num segundo
momento, observamos como professores avaliam o critério de
autoria em textos produzidos por alunos concluintes do Ensino
Médio.
12
Indícios de autoria
13
pode ser mais explícita ou ser efetuada de forma mais neutra. Os
verbos dicendi compreendem, nesse caso, um exemplo prototípico
desses recursos que possibilitam a avaliação do discurso do outro
(como ponderou, comentou, avaliou).
É também em relação ao discurso do outro que incide o indício
de manter a distância. Um autor se constitui enquanto tal por marcar
sua posição em relação ao que diz e em relação aos seus
interlocutores (POSSENTI, 2002). “Trata-se, a rigor, de uma
exigência do próprio discurso, decorrente do fato de que o sujeito
sempre enuncia de uma posição” (p. 114). Esse indício fica
nitidamente evidente nos casos de metaenunciações, quando se
retorna ao que foi dito para explicar, corrigir, esclarecer. Não
obstante, em tantos outros casos, na textura do texto, o autor pode
manter a distância ou mesmo assumir a responsabilidade sobre o
que está sendo dito, o que implica sempre uma tomada de posição.
O terceiro princípio apontado por Possenti (2002) tem estreita
relação com os dois antes apresentados. Trata-se de evitar a mesmice
no momento de dar voz aos outros – “uma questão de como dar
voz aos outros” (p. 117). A regra de evitar a mesmice sugere a
variação no emprego das formas de introdução do discurso do
outro na tessitura do texto, evitando, portanto, a repetição do
emprego quase sempre enfadonho de verbos prototipicamente
dicendi, como o relativamente neutro “dizer”, o que se configura
como indício de autoria. No entanto, como alerta o próprio
linguista, não se trata de variar por variar, como se se devesse
confeccionar uma lista de verbos dicendi para evitar o emprego de
um mesmo verbo mais de uma vez em cada texto. A variação só é
interessante quando obedece a tomadas de posição.
Para assumir uma dada posição em um texto, o autor carece de
levar em conta seu leitor. Nos termos de Possenti (2002), ele precisa
fazer uma aposta no conhecimento do leitor, um apelo a “memória
mínima” que seu interlocutor possui sobre determinado assunto ou
sobre certo discurso a ser retomado no texto. Isso porque certos
pontos de vista defendidos no texto só poderão, de fato, serem
compreendidos se o leitor compartilhar ou estiver engajado em
14
uma dada cultura ou formação discursiva. Decorre dessa estratégia
o princípio já bastante aceito no âmbito de uma Linguística Textual
de que todo texto é produzido visando alcançar um leitor com
traços muito específicos. E é por causa disto que esse leitor, num
processo dialógico-dialético, tem papel decisivo na produção do
texto.
Ora, portanto, saber dialogar com vozes e pontos de vista
outros, bem como assumir uma posição em relação a esses pontos
de vista, presumindo, inclusive, o possível leitor do texto são
indícios que podem configurar autoria em um texto. Mas além
destes três, Possenti (2009) ainda acrescenta outro indício de
autoria, o de controle de texto. De acordo com ele, o controle de texto
diz respeito à capacidade do autor conseguir por em cena pontos
de vista contraditórios e controlar as diversas vozes “sem ‘se
perder’”, ou seja, dar voz a mais de um discurso no texto sem
perder o controle das ações. O controle de texto é, pois, também,
um indício necessário à assunção da autoria – mesmo que mais
tímido que os demais, como assinala o próprio Possenti (2009).
Todos esses indícios, essencialmente de caráter estilístico e
discursivo, podem configurar a autoria em um texto, que, na
perspectiva aqui defendida, está diretamente relacionada às
marcas pessoais (à subjetividade) do sujeito que está por trás desse
texto. Avaliar um texto de estudante de ensino médio quanto ao
critério de autoria, como acontece, por exemplo, na redação do
ENEM, é buscar encontrar os indícios que assinalam a marca
pessoal desse estudante, ou seja, é atentar para o modo como são
agenciados certos recursos linguísticos utilizados pelo estudante
para apresentar e organizar o seu ponto de vista em relação ao tema
tratado no texto.
Convém esclarecer, no entanto, que apesar desses indícios
assinalarem uma marca pessoal, subjetiva do estudante, não devem
ser entendidos como “um saber pessoal posto a funcionar segundo
um critério de gosto”. Avaliza o linguista que, “simultaneamente,
o apelo a tais recursos só produz efeitos de autoria quando
agenciados a partir de condicionamentos históricos, pois só então
15
fazem sentido” (POSSENTI, 2002, p. 121). Noutros termos, esses
recursos só produzem sentido e instauram uma autoria porque
inscrevem um dado texto em certa formação discursiva, em
domínios de uma memória discursiva (POSSENTI, 2009). Por causa
disto, a perspectiva de autoria aqui defendida é discursiva.
16
autoria que afloram da argumentação construída nos textos.
Dispensamos, portanto, o interesse por aspectos relacionados a
equívocos ou a inadequações de ordem gramatical e ortográfica, já
que os indícios que configuram autoria são de ordem estilística e
discursiva.
As redações aqui analisadas foram produzidas pelos alunos
em sala de aula a partir de uma proposta elaborada pelo sítio
eletrônico Descomplica, cujo objetivo é ajudar estudantes brasileiros
com conteúdos do ensino médio e prova de redação na preparação
para o ENEM e outros vestibulares. A proposta solicitava que os
alunos, a partir da leitura de três textos motivadores (dois verbais,
fragmentos de reportagens do jornal O globo, e um gráfico, da
associação brasileira de agentes digitais), redigissem um texto
dissertativo-argumentativo em norma padrão da língua
portuguesa sobre o tema Geração smartphone: os efeitos dessa
tecnologia no cotidiano do jovem brasileiro, apresentando proposta de
intervenção que respeite os direitos humanos. A seguir,
apresentamos alguns fragmentos recortados das redações
coletadas para a produção deste artigo, buscando encontrar neles
indícios de autoria.
Fragmento 01:
O cotidiano dos jovens com o surgimento do smartphone teve uma mudança
bastante significativa, tendo em vista que suas ações se tornaram
sistematizadas e cada vez mais presas ao aparelho. Embates surgiram
fazendo reflexão sobre a positividade ou negatividade desses meios no
desenvolvimento educacional e vivência diária da juventude. Nas escolas,
principalmente, é bastante discutido a permissão dos alunos em utilizarem
o smartphone, na maioria das vezes sendo negados com o argumento da
defasagem no ensino aprendizagem, por serem motivos de distração no
momento da aula. (Redação 01).
Fragmento 02:
Durante muito tempo, acreditou-se que o homem tinha total controle sobre
as tecnologias inventadas por ele. Atualmente, observamos que o uso de
aparelhos como celulares por jovens está sendo realizado de forma cada vez
17
mais intensa, o que nos leva a ter uma análise mais cuidadosa sobre seus
efeitos. (Redação 02).
Fragmento 03:
Vivemos hoje cercados de uma parafernália eletrônica. Pensar a existência
sem aparelhos de telefonia móvel é quase impossível. As pessoas precisam
estar conectadas a todo tempo, como se o aparelho fosse, de fato, algo
essencial à sua existência. Nos últimos anos, pesquisas tem demonstrado que
o uso desses aparelhos por jovens tem se tornado ainda mais intenso, de
modo que já se pode falar de uma juventude conectada. (Redação 03).
18
do enunciado que encerra o fragmento acima. Além disso, ao
confrontar dois pontos de vista contraditórios e manter distância
em relação a um deles, o aluno consegue manter o controle do
texto, o que assegura, inclusive, a sua coerência, critério
fundamental para que um texto possa considerado como adequado
a um certo gênero e tipo textual.
Na segunda redação, as marcas pessoais do aluno são mais
frágeis. Apesar de parecer seguir à risca as recomendações
constantes em manuais que propõem como se construir um texto
que cumpra às exigências dos textos dissertativos, os quais são
requeridos em exames como o ENEM, o texto não vai muito além
do que comumente se espera. As informações contidas nos
enunciados constatam fatos que são aparentemente evidentes, de
modo que praticamente não se consegue identificar marcas de um
repertório próprio de como dizer do estudante. No entanto, apesar
disso, podemos enxergar que o aluno, no fragmento acima
reproduzido, consegue manter distância em relação a um ponto de
visto e assumir outro dele dissonante. Isso fica evidente quando
atentamos para o emprego dos verbos no impessoal (“acreditou-
se”), no primeiro enunciado, e na primeira pessoa do plural
(“observamos”), no segundo. São levantados dois pontos de vista
distintos, mas o aluno não consegue instaurar um confronto entre
eles, o que se denota pela ausência de um conector adversativo
unindo os dois períodos que constroem o parágrafo. Aqui, o aluno
parece perder o controle do texto, porque, como diz Possenti (2013),
não sabe como lidar com as diferentes vozes presentes no texto.
Ao empregar a primeira pessoa do plural no verbo
“observamos” e fazer uso da forma pronominal “nos”, o aluno
insere-se num conjunto que defende a tese de que os jovens têm
usado os aparelhos de celular de forma intensa. Porém, como se
percebe, a própria tese é frágil, não imprime um ponto de vista ou
um valor axiológico sobre a afirmação, algo que, de fato, incida
sobre a argumentação do texto. Trata-se de simples constatação
empírica, um argumento já dado. Esse é o tom de todo o texto. Esse
texto, portanto, parece ser um exemplo de que correção gramatical
19
e ortográfica – apesar do texto apresentar alguns poucos problemas
desta ordem – ou mesmo a adequação à estrutura tipológica do
texto dissertativo-argumentativo não asseguram autoria a uma
redação. A autoria, como temos defendido aqui, tem muito mais a
ver com a capacidade do estudante saber lidar com as vozes que
integram seu texto, com a marcação de uma posição em relação aos
pontos de vista defendidos por essas vozes.
Essa noção de autoria pode ser evidenciada no terceiro
fragmento de redação antes apresentado, quando encontramos
alguns indícios que configuram uma singularidade específica ao
texto. De início, é interessante atentar para a escolha lexical
mobilizada pelo autor da redação, principalmente no que diz
respeito ao emprego dos termos “parafernália eletrônica” e
“juventude conectada”. O uso desses termos revela uma tentativa
de o estudante atribuir originalidade ao texto ou mesmo uma
marca de singularização. Trata-se, pois, do indício de evitar a
mesmice, de instaurar no texto um caráter de novidade quanto à
forma, quanto ao modo de dizer, um dizer que, mesmo não sendo
original (no sentido de dizer primeiro, porque já foi dito outras
vezes, por outros locutores), é original no sentido de ser novo, de
ser uma nova forma arranjada de dizer determinado enunciado. A
autoria é, pois, também revelada pela escolha das palavras em um
texto.
Ainda naquele terceiro fragmento, é possível atentar para a
argumentação do texto tendo em vista certos indícios de autoria. O
período “pensar a existência sem aparelhos de telefonia móvel é
quase impossível”, além de reforçar a tese anteriormente
apresentada no texto, isto é, de funcionar como uma âncora
(argumento de sustentação), desafia também o leitor para uma
reflexão sobre a temática, instaurando, no texto, uma interação (um
dialogismo). Apesar de a reflexão ser argumentativamente
orientada para uma direção já apontada pelo autor (“é quase
impossível”), é o atenuador “quase” que convida o leitor ao
desafio. A conjunção comparativa de valor hipotético “como se”
funciona também como atenuante da constatação feita, permitindo
20
ao leitor, caso pretenda, construir argumentação contrária. Dessa
forma, o autor consegue dialogar com vozes que assumem pontos
de vista distintos, mas sem perder o controle do texto. Funciona
muito mais como uma estratégia argumentativa que pretende fazer
com que o leitor corrobore, a partir da observação e leitura de ideias
distintas, a tese defendida pelo autor.
Comentário 01:
Este texto apresenta autoria, pois consegue abordar o tema que foi proposto
pelo professor de forma adequada, sem fugir da proposta, utilizando
argumentos convincentes, capazes de persuadir o leitor do ponto de vista
defendido pelo aluno. Além disso, é um texto bem escrito, no qual a gente
1No caso do ENEM, por exemplo, apensas profissionais com formação na área de
Letras com habilitação específica em língua portuguesa podem atuar como
corretores das redações produzidas pelos candidatos inscritos no exame.
21
percebe a capacidade intelectual do aluno em escrever adequadamente ao
gênero que foi pedido, no caso a redação (Redação 01).
Comentário 02:
O texto escrito por esse aluno tem sim autoria, uma vez que apresenta
coerência do começo ao fim, seguindo uma linha de raciocínio proposta pelo
próprio autor, desenvolvida ao longo do texto. O texto tem marcas que são
do seu autor, tais como o modo de escrever, por exemplo (Redação 02).
Comentário 03:
Dizer se um texto como esse apresenta autoria depende do modo como se
está concebendo a noção de autoria. Do modo como penso, o texto tem
autoria, porque apresenta alguns indícios, retomando esse termo de Sírio
Possenti, de autoria. O aluno consegue atribuir ao texto algumas marcas que
são bem suas, ele consegue trazer para o texto sua singularidade, o que torna
esse texto bastante original. Desse modo, eu diria que ele tem sim autoria
(Redação 03).
22
atendimento de normas gramaticais, ora como manutenção da
progressão e da coerência do texto. Apenas no terceiro comentário
é possível encontrar uma noção de autoria que se aproxima do
modo como a temos compreendido neste texto. O professor, além
de refletir sobre a complexidade que recobre a noção de autoria,
retoma o termo indícios de autoria, de Sírio Possenti, e o relaciona
às marcas de subjetividade que um autor espalha por seu texto,
como forma de assegurar-lhe originalidade. Mesmo assim, o
professor resguarda-se de apresentar ou mesmo de citar esses
indícios no texto do aluno. Faz, pois, apenas uma referência
indireta à existência de indícios que podem marcar ou instaurar a
autoria em um texto qualquer.
De modo geral, acreditamos que a má ou a falta de uma
compreensão mais objetiva sobre o conceito de autoria por parte
dos professores aqui citados corresponde, antes, à despreocupação
da universidade, particularmente nos cursos de formação de
professores de língua portuguesa – cursos de Letras –, no que diz
respeito à questão da autoria. É possível observar um descuido
tanto teórico quanto prático. Não são raros, por exemplo, na área
de Letras, trabalhos de conclusão de curso (inclusive dissertações e
teses) ou mesmo artigos ou atividades produzidas por alunos de
uma dada disciplina nos quais se verifica a prática danosa do
plágio, ao invés de compreenderem um exercício de autoria.
Também é possível verificar que os currículos dos cursos de Letras
parecem não contemplarem de modo sistemático a questão da
autoria em suas grades curriculares, cabendo, muitas vezes, apenas
à disciplina de metodologia do trabalho científico a discussão sobre
autoria.
Nesse ponto, cabe um entendimento de que a falta de clareza
por parte dos professores no que diz respeito à noção de autoria,
bem como ao exercício de avaliação de textos quanto a essa
competência, pode estar relacionada à ausência de (ou mesmo à
limitada) discussão sobre o tema nos cursos de formação de
professores de língua portuguesa. Os licenciandos concluem os
cursos, mas parecem não receberem o preparo ou a formação
23
teórica e prática para lidar com a difícil questão da autoria em
situações didáticas do exercício da profissão. Por causa disso, nas
salas de aula de língua portuguesa, a noção de autoria, muitas
vezes, é negligenciada, principalmente nos exercícios de produção
de textual, como a escrita do gênero redação, por exemplo. Na
verdade, no que tange a esse gênero, a preocupação da escola tem
sido quase que exclusivamente com o ensino da forma (a clássica
organização: introdução, desenvolvimento e conclusão), como se
ela, por si só, fosse suficiente para a escritura de um texto.
Não estamos querendo dizer que com isso que a forma e o seu
ensino não sejam importantes. Para a questão da autoria, por
exemplo, não importa apenas o conteúdo, mas também a
combinação entre forma e conteúdo, porque é reveladora da
existência de um projeto de dizer para o texto, que compreende
desde a seleção de palavras, o modo como são arranjadas, a
estrutura do texto, a escolha das ideias a serem abordadas, o ponto
de vista defendido, dentre outros aspectos. No entanto, quando, no
ensino de produção textual, o professor limita-se ao trabalho com a
forma, desvia o foco de atenção de o que o texto diz para o como texto
diz e, portanto, muitos aspectos importantes relativos ao conteúdo
do texto são esquecidos. Quando isso acontece, a própria autoria
do texto do aluno é também comprometida.
É preciso esclarecer, no entanto, que a discussão sobre autoria
está em seu nível embrionário, como apontado no início deste
trabalho, especialmente no que se refere a textos escolares. Há
poucas referências na área dos estudos linguísticos sobre o tema e
ainda são muitas as questões a serem esclarecidas. Tem se visto,
entretanto, algumas tentativas exitosas de elucidação do tema,
principalmente em relação ao espaço escolar, mas há ainda muitas
incertezas. Esse fato é, inclusive, um complicador na formação dos
professores de língua portuguesa. Por enquanto, dizemos que a
discussão sobre autoria continua “desafiando os autores que têm a
responsabilidade social pelo que dizem e, diante do ofício,
assumem seu compromisso ético e político pelo que põem a
circular na sociedade” (COSTA & GUEDES, 2015, p. 16).
24
Referências
25
26
AS FEIRAS DE CIÊNCIAS NA EDUCAÇÃO BÁSICA E O
PROBLEMA DO PLÁGIO: O PAPEL DO PROFESSOR NA
ORIENTAÇÃO DAS PESQUISAS
Introdução
27
nos apresenta caminhos para uma formação docente capaz de gerar
no alunato essa criatividade e originalidade, pautada na ética
necessária para uma produção do saber capaz de usufruir de forma
inteligente da grande quantidade de pesquisas disponíveis na
internet.
A partir dessas noções teóricas em torno do plágio e,
principalmente, em como inibi-lo no processo de ensino e
aprendizagem na educação básica, a presente pesquisa se volta
para uma análise mais específica em torno dessa questão junto aos
professores orientadores de Feiras de Ciências desenvolvidos por
alunos do ensino fundamental II da rede municipal de ensino do
Município de Mossoró-RN. O objetivo é perceber de que modo
esses docentes lidam com a questão do plágio e de que maneira
buscam instruir os estudantes acerca do assunto.
Por fim, o nosso estudo faz uma breve explanação acerca das
feiras de ciências das escolas municipais e estaduais do Rio Grande
do Norte, vinculadas ao Programa Ciências para Todos do
Semiárido Potiguar, enquanto um projeto realizado a partir da
parceria entre a UFERSA – Universidade Federal Rural do Semi-
Árido, UERN – Universidade Estadual do Rio Grande do Norte e
SEEC – Secretaria do Estado de Educação e Cultura do Rio Grande
do Norte e que tem como objetivo despertar nos alunos da
educação básica do seminário norte-rio-grandense a curiosidade
científica com o intuito de realizar uma grande Feira de Ciências
com projetos nas mais diversas áreas do conhecimento.
28
capital e do consumo. O ativismo está cada vez mais presente na
vida das pessoas. Dentro desse universo quantitativo de fabricação
em larga escala, os pesquisadores das diversas áreas do
conhecimento são obrigados a alcançarem determinadas metas de
trabalhos a serem elaborados e, consequentemente, publicados nos
meios de divulgação de pesquisas científicas.
Nisto, o questionamento que se deve fazer é como dar conta de
todas essas exigências que a lógica capitalista e neoliberal impõe
aos profissionais e estudiosos das inúmeras áreas do saber, sem
perder a qualidade das pesquisas e produções científicas que serão
disponibilizadas nos bancos de dados acadêmicos? Como cumprir
todas as etapas do processo de investigação em torno de um objeto
de estudo sem perder a criatividade e a originalidade do trabalho?
São estes aspectos que nos chamam a atenção para a prática do
plágio, cada vez mais constante devido à imensidão de trabalhos
disponíveis gratuitamente nos meios eletrônicos de armazenagem
do campo científico existentes na rede mundial de computadores.
A sugestão que se pode indicar é, justamente, a criatividade e
a originalidade, arrogadas dentro da ética na escrita e na produção
acadêmica. Em outras palavras, sem fazer uso indevido de textos
ou ideias de outros autores, mas com o intuito de se produzir novas
pesquisas com qualidade e que venham a contribuir para o
conhecimento. Ao se buscar essas duas metas nos trabalhos, os
pesquisadores acessam o universo da ética, cuja dimensão “refere-
se à orientação da ação constituída no princípio do respeito, da
solidariedade, buscando o encontro da realização do bem da
coletividade, o que, por sua vez, envolve a competência, o fazer
bem e não pode ser dissociado da competência política (VAZ, 2006,
p. 163).
Sabe-se que o avanço da tecnologia trouxe grandes
contribuições para a ciência, mas também abriu um “leque” de
oportunidades para que o plágio seja praticado em maior número,
visto a grande e diversificada quantidade de trabalhos disponíveis
no chamado ciberespaço, tornando complexo e difícil o processo de
identificação do plágio nos textos produzidos. Desse modo...
29
É necessário re-pensar a educação, no sentido de humanizar a técnica
e dela tirar o melhor proveito. Para que isso seja possível, é necessário
fazer rupturas com o passado com o objetivo de buscar uma vida
criativa em face de um novo tempo, cujas oportunidades e
possibilidades se fazem presentes e não podem ser ignoradas (VAZ,
2006, p. 161).
30
aprendizagem, no que diz respeito a possíveis práticas que coíbam
o plágio, pois dentro de sua crítica inclui o modelo de uma
educação tradicional, pautado apenas na transmissão do
conhecimento. Para o autor, a prática narrativa de professores para
seus alunos “mortos”, os quais apenas escutam e observam o
assunto, são sinais de uma educação tradicional e memorialista que
não problematiza o conteúdo para dar sentido às aulas, fazendo do
discente um ser passivo e um depósito de informações. “Desta
maneira, a educação se torna um ato de depositar, em que os
educandos são os depositários e o educador o depositante”
(FREIRE, 1987, p. 33).
Nisto consiste a concepção “bancária” da educação em Paulo
Freire. Para o referido autor (1987), os educandos recebem os
depósitos e os guardam e arquivam o que, neste caso, os próprios
homens serão os arquivados, pois, nada acrescentam em suas vidas e,
uma vez arquivados, os homens não podem “ser” porque estarão fora
da busca de ser. “Educador e educando se arquivam na medida em
que, nesta distorcida visão da educação, não há criatividade, não há
transformação, não há saber” (FREIRE, 1987, p. 33).
Para Freire (1987), este é o sentido que está por trás da ideologia
da opressão, a absolutização da ignorância, cuja educação bancária
tem o papel de alienar, manter e estimular a contradição, no que diz
respeito ao ensino. Em outras palavras, visa minimizar o poder
criativo dos educandos e os conduzem à ingenuidade e não à
criticidade, satisfazendo aos interesses dos opressores. Portanto, os
oprimidos são tidos como a parte doente da sociedade que é sadia e,
dessa forma, precisam ajustá-los para participarem desta, logo,
“dentro de uma estrutura que os transforma em ‘seres do outro’”
(FREIRE, 1987).
Dessa maneira a concepção “bancária” expõe uma contradição
na relação educador-educando, pois sugere uma dicotomia, que
pensa os homens no mundo e não com o mundo e com os outros.
O homem como um ser passivo que irá apenas receber depósitos
do mundo. Essa forma de ver o ensino impõe aos educadores a
ideia de que eles devem ser apenas reprodutores dessa lógica e o
31
seu papel será “o de disciplinar a entrada do mundo nos
educandos” (FREIRE, 1987). Assim, o ser humano é transformado
em “coisa” pela “opressão, que é um controle esmagador, é
necrófila. Nutre-se do amor à morte e não do amor à vida”
(FREIRE, 1987, p. 37). A concepção bancária, com isso, visa
“controlar o pensar e a ação, levando os homens ao ajustamento ao
mundo. É inibir o poder de criar, de atuar” (FREIRE, 1987, p. 37).
Paulo Freire (1987) nos coloca diante de duas concepções
antagônicas: uma “bancária”, que mistifica a realidade para ocultar
as razões da atuação dos homens no mundo, e outra
problematizadora, que se empenha em desmistificar essa ação,
pois, está comprometida com a libertação do homem. “A primeira
nega o diálogo, enquanto a segunda tem nele a indispensável
relação ao ato cognoscente, desvelador da realidade” (FREIRE,
1987, p. 41).
É neste sentido que se entende a afirmação de Paulo Freire
(1987) que aponta o homem como um ser inconcluso e consciente
de sua inconclusão e de seu permanente movimento de busca do
ser mais. “Daí que seja a educação um que-fazer permanente.
Permanente na razão da inconclusão dos homens e do devenir da
realidade” (FREIRE, 1987, p. 42). Percebe-se que esta proposição
propõe uma prática problematizadora dentro da lógica da
mudança, exatamente, o contrário do que pensa a concepção
“bancária” em sua lógica da não-mudança, logo, de permanência.
No entanto, o homem é sujeito de seu próprio movimento e...
Por isto mesmo é que, qualquer que seja a situação em que alguns
homens proíbam aos outros que sejam sujeitos de sua busca, se
instaura como situação violenta. Não importa os meios usados para
esta proibição. Fazê-los objetos é aliená-los de suas decisões, que são
transferidas a outro ou a outros (FREIRE, 1987, p. 43).
32
alcançar o ser mais? Não pelo isolamento ou pelo individualismo,
mas em comunhão das pessoas em seu existir. “Ninguém pode ser,
autenticamente, proibido que os outros sejam. Esta é uma exigência
radical. O ser mais que se busca no individualismo conduz ao ter
mais egoísta, forma de ser menos. Portanto, a educação
problematizadora é impraticável pelo opressor, pois, “nenhuma
‘ordem’ opressora suportaria que os oprimidos todos passassem a
dizer: ‘por quê?” (FREIRE, 1987, p. 43). A educação
problematizadora trata de uma “educação, em que os educadores
e educandos se fazem sujeitos do seu processo, superando o
intelectualismo alienante, superando o autoritarismo do educador
‘bancário’” (FREIRE, 1987, p. 43).
Toda essa narrativa nos põe diante de um modelo de educação,
o qual colocado em prática, por si mesmo, já inibe o plágio, tendo
em vista o caráter criativo e inovador de se enxergar a realidade e
o objeto de estudo que esteja sob análise. Logo, Para uma produção
científica coerente com a ética e que traz resultados significativos
para o universo do saber, é necessário que os pesquisadores evitem
o ativismo próprio da ideologia capitalista da contemporaneidade
e objetivem a qualidade de suas pesquisas. No entanto, não se pode
esquecer que existem muitas exigências por produções no mundo
acadêmico, assunto este que demandaria uma reflexão mais
profunda para melhor caracterizar o tema. Cabe, portanto, para
nosso trabalho, refletir sobre como o ativismo pode prejudicar o
ensino e a aprendizagem na educação básica. Muitos
questionamentos entram na discussão e podem revelar as
dificuldades que os docentes têm em promover uma educação que
instigue a criatividade e a originalidade dos discentes e, com isso,
iniba o plágio, na medida em que o alunato constrói seu
conhecimento ao invés de reproduzir textos ou saberes que outros
sujeitos produziram.
Para um ensino criativo e inovador, que supere a mera
transmissão do conhecimento e seja capaz de inibir a prática do
plágio, é imprescindível que se invista em uma formação de
qualidade para os professores, logo, no mundo marcado pelo
33
avanço tecnológico é exigente uma “atuação do docente no mundo
contemporâneo, voltada para uma educação que privilegie as
novas possibilidades advindas das tecnologias de informação e
comunicação que envolve o seu compromisso e investimento em
sua própria formação” (VAZ, 2006, p. 162, grifo nosso). Nisto, a
autora aponta como dimensões da ação docente a técnica enquanto
“realização de uma ação, ou mesmo determinada maneira de se
realizar algo, referente a um ofício, o que requer, por sua vez, certa
habilidade” (VAZ, 2006, p. 162); a estética que nos “remete ao
sensível, ao perceptível e à educação da sensibilidade humana”
(VAZ, 2006, p. 162); a ética que, por sua vez, orienta a “ação
constituída no princípio do respeito, da solidariedade, buscando o
encontro da realização do bem da coletividade, o que, por sua vez,
envolve a competência, o fazer bem e não pode ser dissociado da
competência política” (VAZ, 2006, p. 163). Para a autora “é no
espaço político que acontecem acordos, que se estabelecem
hierarquias e onde se assumem compromissos e é, nesse sentido,
que se verifica a articulação com a moral e a ética” (VAZ, 2006, p.
163).
A partir de uma visão mais geral acerca do plágio e de
apontamentos teóricos de como se combater tal prática, o presente
capítulo, ao apresentar a criatividade e a originalidade como
premissas para não incorrer ao mesmo, indica que o caminho da
ética e da boa formação dos professores e professoras se apresenta
como uma via segura para este fim, desde que o ativismo não
domine a prática docente no processo de ensino e aprendizagem.
Assim, para uma análise desses conceitos no cotidiano das escolas
de educação básica, este estudo se volta a observar qual a visão dos
professores em relação ao plágio nas Feiras de Ciências. Em outras
palavras, partimos de uma discussão global acerca do plágio para,
com isso, analisar o que tem sido feito na prática para inibi-lo em
um espaço específico da pesquisa e da construção do saber como
são as feiras de ciências realizadas nas escolas da rede pública de
ensino.
34
A visão dos professores em relação ao plágio em feiras de ciências
35
Nível de ensino Ensino fundamental II Ensino fundamental II e
que atua Médio
Disciplina que Ciências Ciências
leciona
Tempo que atua 3 anos 3 anos
como orientador
de projetos da
FECIRME
Fonte: Elaborado pelos autores por meio dos dados da pesquisa
36
hipóteses que possam responder ou solucionar essa problematização. Cada
hipótese é testada para saber qual é a solução mais adequada e por fim os
resultados são discutidos e publicados, neste caso, apresentados nas feiras de
ciências.” (Professor “1”)
“... Cada equipe participante deverá ser composta por até 3 (três) alunos,
cuja elaboração do projeto utilize a metodologia científica de investigação e
que tenham criatividade e relevância para a sociedade. Os trabalhos são
julgados conforme os seguintes critérios: Uso da metodologia científica;
criatividade e inovação; clareza e objetividade na exposição; Profundidade da
pesquisa; Empreendedorismo e relevância social.” (Professor “2”)
37
Dessa forma, pode-se perceber que a internet é a ferramenta de
maior suporte para os alunos, fazendo com que em alguns casos
eles acabem cometendo algum tipo de plágio, copiando e repetindo
as ideias de um projeto já desenvolvidas anteriormente. Em
paralelo ao pensamento de Cunha (2010), o autor nos fala que a
prática de copiar e colar no mundo virtual vem se tornando uma
prática cada vez mais comum, nos dias atuais, facilitada pela
enorme quantidade de trabalhos disponíveis na internet e pela
impossibilidade de controle sobre a origem de tudo o que circula
pela rede mundial de computadores. Vejamos a seguir um relato
do professor “1” a respeito desse fato:
38
orientadores nas feiras de ciências e quais as atitudes tomadas
perante a esse fato, percebe-se que as experiências entre os
entrevistados são divergentes:
“... Não... mas nós orientamos que eles não façam cópias diretas de textos,
artigos sem a citação correta das fontes bibliográficas, para que não seja
caracterizado como plágio”. (Professor “2”)
39
vivemos e de que forma podemos melhorar. Afinal, como já dizia
a campanha publicitária do Canal Futura, utilizando-se de uma
frase atribuída a Albert Einstein: “Não são as respostas que movem
o mundo, são as perguntas” (CANAL FUTURA, 2009).
Mas por que as perguntas são tão eficazes nessa busca do
desenvolvimento humano? São elas que estimulam os pensamentos,
provocam as pessoas e encontram os melhores caminhos para a
compreensão da vida e do mundo em que vivemos. É com essa
reflexão que podemos compreender melhor a essência de uma feira
de ciências escolar, as quais têm como objetivo principal despertar nos
estudantes a curiosidade, incentivando-os ao uso da metodologia
científica, estimulando-os a formular questões científicas baseadas na
realidade cotidiana vivenciadas, facilitando o processo de ensino-
aprendizagem, unindo teoria e a prática.
Neste tópico, apresentamos uma breve explicação do que
aprendemos, em nossa pesquisa, sobre as feiras de ciências das
escolas municipais e estaduais do Rio Grande do Norte, vinculadas
a um programa que tem feito a grande diferença na vida dos alunos
e professores do nosso Estado: o Programa Ciências para Todos do
Semiárido Potiguar. Esse programa é uma parceria entre a UFERSA
– Universidade Federal Rural do Semi-Árido, UERN –
Universidade Estadual do Rio Grande do Norte e SEEC – Secretaria
do Estado de Educação e Cultura do Rio Grande do Norte e tem
como objetivo despertar nos alunos da educação básica do
seminário norte-rio-grandense a curiosidade científica e realizar
uma grande Feira de Ciências com projetos nas mais diversas áreas
do conhecimento, usando o método científico.
O programa envolve etapas de capacitação de professores e
alunos sobre o método científico, por meio da Tecnologia Social de
Educação “Metodologia Científica ao Alcance de Todos”- MCAT;
oficinas de elaboração de projetos; acompanhamento das atividades
de execução dos projetos; feira de ciências nas escolas; feira de ciências
nas diretorias regionais; organização da Feira de Ciências do
Semiárido Potiguar e por fim a participação dos melhores trabalhos
em Feiras de Ciências Nacionais e Internacionais.
40
O trabalho nas escolas começa com atividades de
sensibilização, através das DIRECS - DIRETORIA REGIONAL DE
EDUCAÇÃO E CULTURA às escolas de suas jurisdições. Quando
aderem à proposta, as escolas desenvolvem um trabalho de
propagação e incentivo aos alunos e professores, com o intuito de
despertar a curiosidade e o desejo em criar projetos para se
inscreverem na feira local. Em seguida, são realizadas uma
sequência de atividades em sala de aula. Uma das atividades mais
significativas para o surgimento de uma ideia para um projeto é a
dinâmica brainstorming (Literalmente: “tempestade cerebral” em
inglês) ou tempestade de ideias, uma atividade que tem a
finalidade de explorar a potencialidade criativa dos estudantes.
Depois da “tempestade de ideias”, segue-se um trabalho para
organizar e filtrar esses questionamentos. Os alunos se dividem em
grupos de 3 componentes, elaboram um problema, possível de ser
resolvido e estruturam uma hipótese, tudo de acordo com a sua
realidade. Na sequência, os grupos escolhem um professor, como
orientador, por afinidade com a equipe e, a partir de então, os projetos
são elaborados, com os relatórios, diários de bordo e banners.
Os critérios avaliativos para cada projeto são: uso da
metodologia científica; criatividade e inovação; clareza e
objetividade na exposição, profundidade da pesquisa,
empreendedorismo e a relevância social. Nisto, os conceitos em
cada critério variam entre 0 a 5, conforme discriminação a seguir: 0
(fraco/ausente; 1 (regular); 2 (bom); 3 (ótimo); 4 (excelente) e 5
(supera as expectativas).
Se tratando das orientações aos alunos inscritos nessas feiras
de ciências, faz-se necessário que esses professores orientadores
desenvolvam um trabalho de conscientização que desperte e
alimente a curiosidade e a criatividade dos alunos, incentivando-os
a formular, planejar e realizar uma pesquisa que considere as suas
próprias ideias e faça uso da metodologia científica de forma
lúdica, mas sem perder o rigor científico. Entretanto, o que se
observa em algumas dessas feiras são apresentações de trabalhos
demonstrativos, resultados de pesquisas feitas na internet, ao invés
41
de exposições de investigações científicas idealizadas e
desenvolvidas pelos próprios alunos.
Considerações finais
Referências
42
"O professor e a leitura do jornal", Vol. 1, pp. 1-3, Campinas, SP,
Brasil, 2010;
BOGDAN, R.C.; BIKLEN, S. K. Investigação qualitativa em
educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto
Editora, 2010;
DUARTE VAZ, Telma Romilda. O avesso da ética: a questão do
plágio e da cópia no ciberespaço. Cadernos de Pós-Graduação –
Educação, São Paulo, v. 5, n. 1, p. 159-172, 2006;
FREIRE, Paulo. Justificativa da Pedagogia do Oprimido. In.:
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1987, p. 16-32;
_______. A concepção “bancária” da educação como instrumento
da opressão: seus pressupostos, sua crítica. In.: FREIRE, Paulo.
Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987,
p. 33-43;
LIMA, M. E. C. Feiras de ciências: o prazer de produzir e
comunicar. In: PAVÃO, A. C.; FREITAS, D. Quanta ciência há no
ensino de ciências. São Carlos: EduFSCar, 2008.
MANZINI, E. J. Considerações sobre a elaboração de roteiro para
entrevista semiestruturada. In: MARQUEZINE, M. C.; ALMEIDA,
M. A.; OMOTE, S. (Org.). Colóquios sobre pesquisa em Educação
Especial. Londrina: Eduel, 2003, p. 12-23;
RICHARDSON, J. R. Pesquisa Social: métodos e técnicas. 3. ed.
ver. e ampliada. São Paulo: Atlas, 2011.
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO;
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE;
SECRETARIA DO ESTADO DE EDUCAÇÃO E CULTURA DO
RIO GRANDE DO NORTE. Ciência para todos no semiárido
potiguar. Disponível em: <https://www.cienciaparatodos.com.br>
Acesso em: 02 jul. 2019.
43
44
PERCEPÇÕES SOBRE AUTORIA E PLÁGIO ACADÊMICO
DOS DISCENTES DO CURSO DE LICENCIATURA EM
MATEMÁTICA EM UMA INSTITUIÇAO SUPERIOR
Introdução
45
aluno e não cópia de produções sem que ocorra uma reflexão e
crítica ao que está sendo produzido. Não se trata necessariamente
de produzir o ineditismo nas construções acadêmicas, mas, sim, a
originalidade.
A originalidade na produção acadêmica provoca conflitos nos
discentes, que se chocam diante das dificuldades de compreensão
e de discussões de aportes teórico e metodológicos responsáveis
pela fundamentação de seus trabalhos acadêmicos. Escrever
cientificamente é bastante complexo, requer esforço e um olhar
crítico de modo a argumentar e procurar soluções para as questões
levantadas, levando em consideração a técnica e as normas de
escrita acadêmica (KOLLER; COUTO; HOHENDORFF, 2014). Por
essa complexidade, a academia tem a responsabilidade de preparar
os alunos, dando-lhes condições de investir em pesquisa, ensino e
extensão.
As dificuldades da escrita acadêmica levam os alunos, muitas
vezes, a copiarem trabalhos de terceiros, realizar o conhecido
plágio, sendo que isso pode ocorrer de forma intencional ou até
mesmo não-intencional.
Nota-se que a internet, nos dias atuais, tornou-se ferramenta de
pesquisas e gerenciamento de conhecimento para aqueles que
conseguem realizar diversas tarefas em uma tela, como também
pela facilidade de acesso a diversos conteúdos, possibilitando
realizar downloads e compartilhar informações diversas com outros
usuários. Devido a isso, surgem frequentemente questões
envolvendo casos de plágio no âmbito da universidade, na cópia
de trabalhos e ideias já desenvolvidos por terceiros, e passíveis de
serem acessados, sem que ocorra a devida menção e crédito ao
autor.
Pensando as questões do plágio no contexto atual, podemos
perceber os desafios da universidade e dos professores do ensino
superior em apresentar ferramentas de produções acadêmicas que
trabalhem essas questões com os alunos, possibilitando a formação
de sujeitos que cooperam com o crescimento da ciência, por
46
intermédio da produção de pesquisas e projetos construídos de
forma coletiva e ética.
Dessa maneira, cabe-nos refletir: como estão sendo discutidas
as questões envolvendo autoria e plágio na universidade? Diante
dessa reflexão, este capítulo tem por objetivo identificar as
percepções sobre autoria e plágio dos alunos de um curso de
licenciatura em matemática de uma instituição de ensino superior
de Mossoró/RN.
A importância de realizar um artigo que relacione plágio e
autoria consiste no fato de alertar o graduando que está em fase de
criação do seu trabalho de conclusão do curso da enorme
necessidade de respeitar tanto às regras associadas ao fazer
científico como também atentar para pontos relevantes na postura
de quem produz conhecimento humano, como, por exemplo, a
ética. É obvio que tal iniciativa não tem pretensão de completude,
buscando dirimir todas as possíveis inquietações sobre o tema, bem
como, tampouco, arvora-se no direito de se sentir capaz de
preencher todas as lacunas que o tema sugere. Ao contrário, a
proposta aqui é deixar alguma contribuição, apontando para a
possibilidade de evitar ou diminuir a ocorrência e a recorrência
dessa prática equivocada.
47
As questões de linguagem e de discurso criam, muitas vezes, a
necessidade de uma “transposição didática” dos textos originais por
escritores - educadores, cientistas ou jornalistas - que escrevem sobre
o tema, o autor ou sua obra e raramente sobre os debates. Apesar de
necessário, esta transposição didática – de ideias, de linguagem, de
ilustração – tende a organizar o texto e a esconder os espantos, as
dúvidas e as incertezas contidas em documentos originais
(COLONESE, 2009, p. 4).
48
com textos sem autoria” (POSSENTI, 2002, p. 6), haja vista que só
existe plágio se houver autor para reclamar autoria.
Por outro lado, e considerando o argumento de Possenti (2002,
p. 12), ao comentar Bakhtin, quando diz que metade do que se fala
em um dia, por exemplo, é produção de outro interlocutor, é
razoável perguntar: E quando se escreve? Será que um escritor
escreve pelo menos dez por cento de um texto sem copiar de outro?
Sendo assim, porque tratar de documento oficial ou fonte original,
além do mais, quando se desconfia de que “as verdadeiras marcas
de autoria são da ordem do discurso, lido do texto ou da
gramatica”? (POSSENTI, 2002, p. 8).
E se tal conclusão de Possenti (2002) é realmente algo de que
se deve considerar, ou seja, se o que dá real sentido ao texto é a
propriedade do discurso, não há um mínimo sentido em falar de
originalidade textual tampouco de autoria ou coisa que o valha,
primordialmente, quando se adere à hipótese de que é o leitor o
verdadeiro autor do discurso, posto que é ele que atribui os
sentidos a aquilo que está escrito (FOUCAULT, 2001).
Nesse rastro, poder-se-ia apontar que, assim como a educação
requer um olhar interdisciplinar entre as áreas de ensino, e a prática
didática pede uma atitude não verticalizada na relação professor e
aluno, a escrita acadêmica não deveria se curvar ao autoritarismo
do autor ou autores, como também não é linearmente objetiva
como propagam os teóricos da física clássica (POSSENTI, 2002).
Contudo, por acreditarmos que o plágio é tão nocivo para a
pesquisa quanto é para a construção do discurso que se deseja
promover, aponta-se uma ponderação de Foucault que deveria ter
sido indicada ainda ao início desse texto:
49
já se recolocaram em questão o caráter absoluto e o papel fundador
do sujeito. (FOUCAULT, 2001, p. 28).
50
eticamente, ao sempre referencias as ideias ou textos pertencentes
a outrem, e seguindo as normas para esse fim (PRATI, 2014).
Considera-se importante falar sobre plágio, não apenas para
saber sobre suas consequências, mas, sim, e principalmente, para
“trabalhar a relevância de comprometer-se com a construção de novos
conhecimentos e, consequentemente, com a responsabilidade de ser
autor” (PRATI, 2014, p. 122). Essa perspectiva é o que embasa nosso
empenho com esse estudo.
Metodologia
51
a sala de aula. Deixou-se espaço para os alunos fazerem
apontamentos sobre a disciplina de metodologia, quando foi
possível avaliar se essa disciplina trouxe suporte necessário para o
aluno compreender que precisa desenvolver interpretação crítica
das leituras e obter conhecimento técnico de escrita acadêmica.
Esse questionário foi aplicado a 22 alunos, que poderiam optar por
responder totalmente ou parcialmente as perguntas.
Após a recolha das respostas dos pesquisados, realizou-se
uma rápida discussão para tratarmos da importância do
desenvolvimento crítico, enfatizando que este ocorre também pela
prática de leitura e escrita, apresentando também algumas
orientações da ABNT em relação à citações diretas e indiretas, e
referências, grandes responsáveis pela identificação de plágio nos
softwares antiplágios, que, em muitos casos, apesar de se
configurar como plágio, ocorre devido à falta de conhecimento
técnico do aluno, dito de outro modo, o aluno não teve a intenção
de usurpar a ideia de outro autor ou deixar de referenciá-lo, porém,
por não saber citar de maneira padronizada, o software identifica
como plágio.
Para finalizar as discussões, sugerimos alguns autores que
trabalham com metodologia, a fim de auxiliá-los na escrita de seu
trabalho de conclusão de curso, por se tratar de uma turma de final
de curso e de ter esse quesito obrigatório para obtenção de título de
licenciatura.
Resultados
52
O que você entende por autoria e plágio acadêmico?
Quais considerações você tem sobre a importância de discutir
autoria e plágio no meio acadêmico?
Como a disciplina de metodologia se apresentou diante a essa
temática?
Segundo a sua compreensão o curso te ofereceu embasamento
teórico capaz de orientá-lo acerca da autoria a fim de evitá-lo a
cometer o plágio?
53
apresentaram muitas queixas sobre o ensino dessa disciplina que,
em suas visões, não lhes trouxeram o embasamento teórico-
metodológico necessário para lhes prepararem para o
desenvolvimento do trabalho de conclusão de curso. Na discussão
realizada em sala após o questionário, falaram que seria importante
que essa disciplina, atualmente lecionada no segundo semestre do
curso, fosse ofertada também após a metade do curso, que é o
período no qual ela realmente será valorizada pelos discentes.
Diante da última pergunta do questionário, a maioria dos
alunos afirmou que o curso não lhe trouxe compreensão suficiente
sobre a temática, foi um tema pouco explorado e, por isso, estão
tendo bastante dificuldades para produzir textos. Vale registrar
que uma parte dos alunos optou por não responder a essa
pergunta.
Após o questionário tivemos uma discussão para
esclarecermos algumas dúvidas dos alunos e entendermos
algumas de suas inquietações. No entanto, uma parte deles nos
deixam claro que estão preocupados com a escrita pela necessidade
de se escrever um trabalho de conclusão de curso, ou seja, esse
trabalho acadêmico acaba sendo incentivo para que muitos alunos
procurem melhorar um pouco a sua escrita acadêmica.
Percebemos, também, que muitos deles pretendem investir na
continuidade de sua formação, por intermédio de uma pós-
graduação.
Considerações finais
54
Por outro lado, esse avanço tecnológico também possibilita
que as práticas de plágio sejam mais facilmente identificadas
através de certos softwares rastreadores. Cabe aos docentes
responsáveis pelas turmas acompanharem e orientarem seus
alunos acerca do que venha a ser um documento verídico, e de
como agir eticamente, referenciando corretamente os autores nos
quais se apoiam para a sua escrita.
A partir desse estudo, pode-se apontar que os discentes
encontram duas grandes barreiras que dificultam sua escrita: a
primeira, não possuem leitura acerca da temática selecionada e isso
acarreta à falta de ideias para a escrita de seus trabalhos, no
bloqueio ao apresentar sua criticidade acerca do que escreveu. A
outra grande dificuldade do aluno reside na falta de conhecimento
das normas técnicas de escrita acadêmica, o que pode gerar o plágio
“não intencional” ao fazer as citações de maneira indevida.
Diante dessas constatações, os professores e orientadores das
academias têm papel fundamental na formação acadêmica dos
discentes para a produção científica. Ora, produzir ciência é algo
que, apesar de ser prazeroso, requer bastante empenho e
comprometimento, pois não se produz conhecimento científico de
qualquer forma: é preciso ter conhecimento técnico e criticidade
para realizar um bom trabalho.
REFERÊNCIAS
55
CHRISTOFE, L. Intertextualidade e plágio: questões de linguagem
e autoria. 1996, 193f. Tese (Doutorado). Universidade Estadual de
Campinas, Campinas, 1996.
COLONESE, P. H. História da Ciência a partir de fontes originais,
textos teatrais e iconografias: os casos das estrelas esquisitas de
Júpiter, do escriba egípcio Ahmés e do curioso Leeuwenhoeck.
Encontro Nacional de pesquisa em Educação em Ciências.
Florianópolis v.7, Dez. 2009.
FOUCAULT, M. Ditos e Escritos: Estética – literatura e pintura,
música e cinema (vol. III). Tradução de Inês Autran Dourado. Rio
de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 264-298
GERHARDT, T. E.; SILVEIRA, D, T. Métodos de Pesquisa, Porto
Alegre: Editora da UFRGS, 2009. Disponível em: http://www.
ufrgs.br/cursopgdr/downloadsSerie/derad005.pdf Acesso em: 26
de mai. 2019.
GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4 ed. São Paulo:
Atlas, 2002.
KOLLER, S. H.; COUTO, M. C. P. P.; HOHENDORFF, J. V. (Orgs.).
Manual de produção científica. Porto Alegre: Penso, 2014.
POSSENTI, S. Indícios de autoria. Perspectiva, Florianópolis, 1-.20,
n.01, p. 105-124, jan. 2002. Disponível em https://periodicos.
ufsc.br/index.php/perspectiva/article/viewFile/10411/9677 acesso
em 26 de mai. 2019.
PRATI, L. E. Plágio acadêmico. In: KOLLER, S. H.; COUTO, M. C.
P. P.; HOHENDORFF, J. V. (Orgs.). Manual de produção
científica. Porto Alegre: Penso, 2014. (p. 109 – 124)
56
“CTRL C” + “CTRL V”: O QUE PENSAM OS DISCENTES DO
ENSINO PROFISSIONALIZANTE ACERCA DO PLÁGIO
Introdução
57
A pesquisa realizada adotou uma abordagem qualitativa com
o objetivo de analisar o conhecimento de alunos do ensino
profissionalizante de uma instituição privada do município de
Mossoró-RN sobre o plágio. Os questionamentos realizados
buscam fazer o aluno refletir sua trajetória escolar e identificar se
em algum momento já se deparou com o tema plágio, se entende
as consequências geradas por ações mal direcionadas, e também
traz para a discussão a necessidade da utilização de boas práticas
na produção de pesquisas e textos.
O texto se estrutura da seguinte forma: no primeiro momento
são relatados conceitos sobre autor, ética e plágio, permitindo uma
revisão dos conceitos e entendimento dos mesmos; no segundo
momento, aborda a educação profissional, reforçando sua
importância e situando o leitor no universo pesquisado; em
seguida, apresenta a análise das respostas da pesquisa realizada
com os discentes, observando o nível de conhecimento dos
pesquisados e a ocorrência ou inexistência de plágio em algum
momento de sua vida estudantil.
Autor e Ética
Desde cedo, temos contato com textos, livros, poesias, que nos
ajudam a aprender novas coisas, que nos divertem e encantam.
Esse mundo literário se faz necessário para nos guiar no caminho
do conhecimento em seus diversos níveis, pois, junto com outras
ferramentas, possibilitam aos aprendizes terem contato com
informações relevantes ao processo de aprendizagem.
Esses textos estão disponíveis em livros, internet, impressos
diversos, em algum dispositivo eletrônico, em diversos tantos
suportes físicos e virtuais, ou até mesmo como ideia, ou seja, só na
mente de alguém. Independentemente de onde ele se apresente, ele
foi pensado e estruturado por alguém. Esse alguém pode ser
considerado como o autor.
Na procura do entendimento do conceito de autoria,
encontramos nomes importantes para essa discussão em diversas
58
áreas do conhecimento, sobretudo na filosofia, como Roland
Barthes, Michel Foucault e Mikhail Bakhtin, que em suas obras
discutiram amplamente sobre o tema.
Para Foucault (1992):
59
leitor, acontece a morte do autor. O leitor desse momento em diante
passará a construir um novo pensamento baseado nas ideias do
autor, criando o seu próprio contexto, apossando-se das ideais, mas
não da forma escrita. A marca do autor-criador revela-se no que o
sujeito produz e na forma como ele organiza sua fala e escrita num
dado contexto. Seu texto vai sempre se constituir da tensão com
outras vozes sociais.
De acordo com Orlandi (2001):
Para que o sujeito se coloque como autor, ele tem de estabelecer uma
relação com a exterioridade, ao mesmo tempo que se remete à sua
própria interioridade: ele constrói assim sua identidade como autor.
Isto é, ele aprende a assumir o papel de autor e aquilo que ele implica
(ORLANDI, 2001, p. 78-79).
60
O autor não é o agente da vivência espiritual, e sua reação não é um
sentimento passivo nem uma percepção receptiva; ele é a única
energia ativa e formadora, dada não na consciência psicologicamente
agregativa mas em um produto cultural de significação estável, e sua
reação ativa é dada na estrutura – que ela mesma condiciona – da
visão ativa da personagem como um todo, na estrutura da sua
imagem, no ritmo do aparecimento, na estrutura da entoação e na
escolha dos elementos semânticos (BAKHTIN, 2011, p. 6).
61
ontológica, a do ser mais e não de uma ética estreita e malvada,
como a do lucro, a do mercado”.
Sendo muitas vezes o ambiente escolar um ensaio para as
ações a serem praticadas no mercado de trabalho e na vida em
sociedade, é necessário que sejam mencionados e esclarecidos o
conceito de ética e que nas atividades lá realizadas sejam cobradas
as posturas éticas. Em especial na educação profissional, pois
entende-se que o aluno cidadão vai espelhar-se nas rotinas
existentes no momento do aprendizado escolar e reproduzi-las em
momentos seguintes. Comenta Vázquez (2003):
62
Quando se copia, se reproduz um texto completo ou em partes
e não se cita a fonte, ou seja, não se relata de onde veio a
informação, diz-se que está cometido o plágio.
Entendemos que ao copiar um texto de outra sem pessoa sem
nenhuma referência à sua autoria, juridicamente é tratado como
crime. Não é errado mencionar frases, conceitos ou ideias, se essas
são importantes para a sua produção literária, só irá enriquecer a
informação a ser apresentada, desde uma imagem a dados
numéricos, o importante é dar os créditos a quem produziu essa
informação, e, portanto, é o autor.
Quando mencionamos uma informação que não foi um
pensamento, uma conclusão, um questionamento nosso, se ele foi
retirado de um texto, mesmo que esse não declare o autor, não
podemos nos apropriar sem mencionar de onde trouxemos, como
se tivesse sido feito por nós, pois é como se estivéssemos
“roubando” o pensamento de outrem.
63
apenas realiza uma transcrição idêntica, que podem aparecer,
inclusive, com erros que já estavam no texto original.
64
por outras pessoas e que é utilizado por um terceiro como se ele
tivesse consultado o documento original (KROKOSCZ, 2012, p. 43).
65
A expansão do ensino profissionalizante surgiu, então, como
alternativa de qualificação profissional da mão de obra, e de
controle do movimento operário crescente pelas lutas em torno de
suas causas. Segundo Freitas (1979, apud MERCADANTE, 2004, p.
2), com a Constituição de 1937, o governo assumiu, pela primeira
vez, responsabilidades sobre a educação profissional, criando
escolas técnicas profissionalizantes destinadas às classes “menos
favorecidas”, constituídas pela população vinda de classe operária.
Diante deste quadro, a educação profissional recebeu
influências em sua forma de ser; antes era assistencialista,
tecnicista, destinada a classes menos favorecidas. Mesmo assim,
diferentes concepções sobre a Educação Profissional existiam na
época. Entretanto, prevalecia a ideia de que o ensino
profissionalizante (elementar e médio) destinava-se às camadas
menos favorecidas, sustentadas por uma visão preconceituosa e
por uma prática alienante e excludente, (RIBEIRO, 2001). Com o
passar dos anos, foi se modificando e, sobretudo, com o advento da
tecnologia e expansão da internet, que trouxeram novas formas de
gestão do trabalho e de educação profissional no Brasil. Assim,
passaram a exigir do profissional competências diversificadas,
deixando de lado uma formação tecnicista e adotando uma nova
postura, onde exigem do profissional um leque de competências
emocionais e técnicas no desempenho de suas funções.
No Brasil, a Educação Profissional é regulamentada
atualmente pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(Lei 9394 de 20 de dezembro de 1996) e pelo Decreto 5.154, de 23 de
julho de 2004, objetiva a oferta de cursos dirigidos aos estudantes e
profissionais que desejam se qualificar para o mundo do trabalho,
desenvolvendo competências técnicas e comportamentais para
atuarem de forma satisfatório no mundo corporativo, que é
competitivo, seletivo e está em constante transformação.
Portanto, no Brasil, a Educação Profissional, hoje, está sob
responsabilidade dos setores públicos, privados e das instituições
do Sistema S., ofertando uma diversidade de cursos, formando
turmas de profissionais habilitados em diversas profissões.
66
Durante toda a trajetória educativa, o plágio deveria ser
apresentado e discutido nos diversos níveis de ensino, buscando o
entendimento do que é certo e o que não deve ser feito em relação
a produção textual, pois, o processo educativo contribui fortemente
para a consciência ética e moral do indivíduo em toda sua
amplitude.
67
falta de informações e de formação escolar por parte dos docentes,
que, muitas vezes, pode não ter recebido essa formação.
No segundo ponto foi questionado como acontece a
produção textual dos discentes: quarenta e três por cento (43%)
informaram que não utiliza nenhuma fonte de pesquisa para
elaboração de um texto, que escreve de formas variadas, de
acordo com seus pensamentos, ideias e conhecimentos prévios.
Segundo o aluno FK3, “se tiver algum tema eu me baseio nele caso
não tenha eu escrevo de cabeça”. Enquanto isso, cinquenta e sete
por cento (57%) utilizam uma parte de pesquisa na internet para
se fundamentar, como comentam os discentes KV e JL. “copiando
texto de alguém de internet, livros etc.”.
Ainda sobre a produção textual, foi indagado aos discentes
se acham correto copiar textos de outras fontes na íntegra, seis por
cento (6%) consideram correto utilizar textos integralmente de
outras pessoas e noventa e quatro por cento (94%) apresentaram
resposta negativa ao questionamento.
Sobre autoria de um texto, todos os discentes que
responderam o questionário demonstram que tem conhecimento
basilar sobre autoria, mesmo que colocado de forma elementar,
como cita C.L “quando se tem criado o texto, você é o dono. Como
por exemplo: uma criação de gado tem “dono”, então você o tem
e só pode ser usado com uma permissão” e “R.E “... entendo que
é quando uma pessoa produz algo, uma música por exemplo, em
que essa música é de autoria de uma determinada pessoa”.
Foi questionado sobre facilitadores e obstáculos para a sua
produção textual, em que a grande maioria dos entrevistados
colocaram como facilitador fonte de internet, pesquisas e outras
fontes. Os obstáculos que eles encontraram correspondem a não
ter o conhecimento sobre o assunto e apenas uma pessoa do
universo pesquisado apresentou uma resposta de forma
articulada, coerente e que demonstra alguma segurança e
3As siglas FK, KV, JL, CL, RE e AK, são as identificações dos discentes que
participaram do questionário da pesquisa.
68
conhecimento prévio sobre o assunto, conforme cita A.K: “O
mapa mental me ajuda bastante, vídeos e pesquisas explicativas
na internet também. No entanto, as vezes deixo a desejar no
português e isso é sempre um obstáculo.”.
Quanto ao questionamento se os entrevistados tinham
conhecimento de que o plágio é juridicamente crime e ainda se
concordam a judicialidade dessa prática. Quarenta e nove por
cento (49%) informaram que, em algum momento, por algum
professor, já haviam sidos informados sobre a questão do plágio
ser juridicamente crime e outros cinquenta e um por cento (51%)
disseram nunca ter escutado falar ou não ter tido esse
conhecimento através de algum professor sobre a criminalização
do plágio.
Ao serem questionados de que forma eram orientados pelos
professores a realizar um trabalho de pesquisa, grande parte
discorreu que foi orientado de forma satisfatória pelos
professores de como realizar um trabalho de pesquisa, em que os
professores orientaram a realizar pesquisas em grandes sites, mas
não utilizando-se do copiar e colar4, como cita A.K.: “Estudar o
tema, analisar diferentes perspectivas e opiniões, estudar técnicas
importantes e montar minhas próprias concepções”.
Concluindo os questionamentos, foram indagados se já
haviam sido penalizados por ter utilizado fontes de forma
inadequada: 22,85% discentes do universo pesquisado
responderam que sim, e 77,15% disse que não foi penalizado pela
utilização inadequada de outras fontes.
Percebemos que existe muita dificuldade por parte dos
discentes na produção textual, principalmente quanto à utilização
de fontes e citações de forma adequada. Uma grande parte dos
nossos jovens chega ao ensino profissionalizante com
69
dificuldades de compreensão e na produção de textos. A escola
regular, por sua vez, tem uma parcela nessa deficiência.
Os alunos do ensino profissionalizante buscam além de uma
educação formal, desenvolverem habilidades para imersão no
mundo corporativo. Na sua maioria, são alunos que demonstram
ter baixa renda financeira, e necessidade de ingressar no mundo
do trabalho por vários fatores.
Considerações Finais
70
como também é conforme identificado em pesquisas nacionais e
internacionais apontando dados de retratos de leitura bastante
falho e precário em nossa região, fator este que de alguma forma
afeta na escrita e compreensão de como a mesma deve ser
efetivamente realizada e suas normas. Um outro ponto observado,
mas não menos importante, é que o uso indiscriminado de plágio
seja ocasionado também na deficiência da educação continuada por
parte dos docentes.
E, por fim, com base na pesquisa realizada, é possível perceber
que, no nosso ordenamento educacional, o plágio é constantemente
utilizado de forma indiscriminado. Portanto, buscamos mostrar
um grande problema que, aos poucos, consegue ser notado e
estudado com maior frequência. É importante pensar e refletir nas
graves questões e consequências envolvendo o uso indiscriminado
do plágio, que afeta definitivamente os estudantes que não têm o
conhecimento mínimo do que o seja, ou que tenha o entendimento
e não se abstém de utilizá-lo, tendo assim retorno positivo em sua
educação.
Durante toda a trajetória escolar, esse tema deveria ser
apresentado e discutido, buscando o entendimento do que é certo
e do que não deve ser feito em relação ao plágio, e na educação
profissional não é diferente, pois o processo educativo contribui
fortemente para a consciência ética e moral do indivíduo em toda
sua amplitude.
REFERÊNCIAS
71
acadêmicos. São Paulo, dez. 2013- SIBiUSP e Pró-Reitoria de Pós-
Graduação – dtsibi@usp. br
FOUCAULT, Michel. O que é um autor? Lisboa: Vega, 1992.
FREIRE, Paulo. A educação na cidade. 4. ed. São Paulo: Cortez,
2000.
FREITAS, Maria Teresa A. Nos textos de Bakhtin e Vygotsky: um
encontro possível. In: BRAIT, Beth (Org.). Bakhtin, dialogismo e
construção do sentido. Campinas: Editora da UNICAMP, 1997. p.
311-327.
GRINSPUN, Mirian Paura Sabrosa Zippin (Org.). Educação
tecnológica: desafios e perspectiva. 3. ed. rev. ampl. São Paulo:
Cortez, 2009. 293 p.
LEI Nº 9.610/98 Lei do Direito Autoral. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/civil. Acesso em: 30 de junho 2019.N
ORLANDI, Eni P. Discurso e leitura. Campinas: Editora da
UNICAMP, 2001.
_______. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho
simbólico. Campinas: Pontes, 2004.
SILVA, Obdália Santana Ferraz. Entre o plágio e a autoria: qual o
papel da universidade? In Revista Brasileira de Educação v. 13 n.
38. São Paulo: Anpel, maio/ago. 2008.
VAZ, Telma R. Duarte. O avesso da ética: a questão do plágio e
da cópia no ciberespaço. Cadernos de Pós-Graduação – São Paulo,
v.5, n.1, p. 159 – 172, 2006.
VÁZQUEZ, Adolfo Sanchez. Ética. 24. Ed. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2003.
72
MARCAS DE AUTORIA NO GÊNERO DOCUMENTÁRIO:
PROPOSTA PARA O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA
Considerações iniciais
73
circulam em diferentes mídias, esferas e campos de atividades
humana.
Dentro de uma vasta gama de gêneros textuais possíveis,
escolhemos para desenvolver o nosso estudo o gênero
documentário, pois se trata de um gênero com grande
potencialidade para o trabalho com a multiplicidade de linguagens,
o uso de recurso tecnológicos e as dimensões éticas decorrentes
desse uso. Segundo Nilchols6 (2005), o documentário, como
qualquer outro gênero, não é estático, ele reúne diversas formas de
representar o real e é fortemente marcado pela subjetividade do
autor. Seu produtor pode opinar, tomar partido e expor-se,
deixando claro o seu ponto de vista, o que ocorre através da sua
linguagem audiovisual fruto não apenas do desenvolvimento
tecnológico dos equipamentos de captação e edição de imagens,
mas do uso que se faz dos recursos existentes. Produzir um
documentário consiste numa atividade complexa, que proporciona
ao aluno atuação de forma protagonista, reflexiva e crítica. Desde a
escolha do tema, o modo de filmagem até a edição, o aluno está em
constante exercício de produção de significado e construção
argumentativa.
Nossa pesquisa busca discutir a relevância do trabalho com
propostas de produção de documentários no ensino fundamental.
Trata-se de um gênero audiovisual para o qual é indispensável o
uso de recursos tecnológicos em sua produção e envolve processos
complexos como a escolha de recursos, movimento da câmara,
enquadramento da imagem, combinação do ponto de vista da
imagem e do som, além de outros recursos possíveis a esse contexto
de produção e que influenciam diretamente no sentido do texto
produzido (ITAU, 2019, p. 47-112). Assim o aluno, através de
contato efetivo com as etapas de produção desse gênero, terá
oportunidade de mobilizar letramentos pertinentes ao uso
adequado de variadas ferramentas tecnológicas. Este capítulo é
74
composto por cinco seções: na primeira tratamos sobre a
tecnologias e educação, trazendo as contribuições de Silva (2005);
na segunda, para discutir acerca das concepções da Pedagogia dos
Multiletramento, nos fundamentamos em Rojo (2012, 2013) e
Kalantzis e Cope (2006, 2009); na terceira e quarta seções,
amparados em Nichols (2005), discorremos sobre o gênero
documentário, abordamos seu conceito, modos de significação e
potencialidades nas práticas de ensino, além da noção de marcas
de autoria. Na última seção, trazemos nossas considerações finais
acerca de nosso estudo.
Tecnologias e educação
75
tarefas corriqueiras mais ágeis e práticas, como pagar contas com
um clique, sem que precise sair de casa, muito utilizada por jovens
e crianças. A internet também propicia atividades de descontração
e entretenimento. Segundo a pesquisa TIC Domicílios realizada
pelo Centro de estudos para o desenvolvimento da sociedade da
informação (Cetic.br) e publicada no portal de notícias G1, 70% dos
brasileiros usaram internet em 2018, e pela primeira vez metade da
Zona Rural está conectada, assim como as classes E e D que
correspondem a camada mais pobre do nosso país. Esses dados
demonstram ascensão no que se refere ao número de usuários de
internet quando comparado com anos anteriores. No gráfico a
seguir é perceptível esse aumento.
76
correspondem a indivíduos com idade escolar do ensino fundamental
e ensino médio.
Diariamente conectados, são simultaneamente consumidores
e produtores de conteúdo, assim esse novo perfil de aluno exige
novos olhares sobre a prática docente, que deve se preocupar em
desenvolver a capacidade de ensinar e propiciar o aprender com o
uso das tecnologias, através de métodos que se interliguem ao
cotidiano desse aluno, desenvolvendo seu senso crítico e
participativo. A reflexão acerca do uso tecnológico é importante
para que a tecnologia não adentre a sala de aula apenas como uma
ferramenta de reprodução das antigas práticas, mas sim como
determinante no processo de inclusão do aluno nesse universo da
cibercultura7, o que não se configura apenas em introduzir na aula
o acesso a sites, ou realizar uma “aula diferente” por meio da
utilização de jogos online, dito educativos. Segundo Silva (2005, p.
64), o professor terá que buscar um aprendizado prévio que lhe
permita compreender a interatividade como modalidade
comunicacional central da cibercultura, rompendo com preceitos
de um educar voltado ao mestre, dando lugar a uma educação onde
o aluno se torna colaborador ativo na construção de seu
conhecimento e o professor se posiciona como facilitador.
Apesar do constante acesso aos meios digitais e da facilidade
de produzir conteúdo em suas redes sociais, nos questionamos se
esse aluno consegue fazer uso eficaz desses meios para produção
de conhecimento formal. Tal inquietação reforça a necessidade de
a escola promover atividades que oportunizem a consolidação
desses conhecimentos.
77
Assim consideramos relevante discutir sobre a potencialidade
do trabalho em sala de aula com produção do gênero
documentário, pois partimos do pressuposto de que tal atividade
exige do aluno a mobilização de letramentos pertinentes ao uso
adequado de variadas ferramentas tecnológicas, além de
autonomia nas escolhas em todas as etapas de produção,
promovendo uma aprendizagem significativa que contempla o
protagonismo estudantil.
78
recombinação e modificação de conteúdo originário de qualquer
mídia e as formas textuais que circulam nesses suportes digitais,
abrangem inúmeras possibilidades de misturas de linguagens e
conseguem mesclar escrita, som, imagem além de muitas outras
que juntas se relacionam e constroem significado. Diante desse
contexto de diversidade de produção e leitura, a Pedagogia dos
Multiletramentos ressalta a importância do ensino voltado ao
aprendizado de leituras críticas e escrita de textos multimodais.
79
para alinhar os recursos escolhidos a proposta do projeto de forma
que combinem entre eles, transitaram por diversas modalidades de
representação e é necessário que compreendam que as
modalidades escolhidas não devem se apresentar de forma
paralela, sua relação é de complementação de uma a outra, o que
Cope e Kalantzis (2009) conceituam como sinestesia, uma das
características do multiletramentos.
Dessa maneira, destacamos a importância da multiplicação de
sentidos promovida pela multimodalidade para o ensino, pois
propicia a ampliação dos sentidos através da mobilização de
diferentes linguagens, mídias e ferramentas digitais, viabilizando
ao aluno diferentes formas e modos de aprendizagem.
Constatada a importância de uma Pedagogia dos
Multiletramentos, levantou-se a necessidade de reflexões acerca do
“como” poderia se implantar essa nova proposta pedagógica. Por
uma década, percepções e ideias consideradas relevantes para o
desenvolvimento da proposta do GNL foram sendo manifestadas,
conforme Santos (2018, p. 47). Em um primeiro momento, foram
destacados quatro elementos importantes, como mostra o quadro a
seguir adaptado pela autora:
80
aprendizado colaborativo, nas quais o professor se posiciona como
mediador, que introduz novos conhecimentos e instiga em seu
aluno a ressignificação de conhecimentos através do
desenvolvimento de sua criticidade.
Em 2003, na Austrália, surgiu o projeto ‘Learning by design’,
liderado por Kalantzis e Cope (2015), que envolvia teóricos e
professores. Através da revisão dessa proposta, esses componentes
receberam nova nomenclatura e foram designados como ‘processos
de conhecimento’, divididos em: experimentar, conceituar, analisar
e aplicar, conforme Santos (2018, p. 47) detalha no esquema abaixo:
Fonte: Adaptado por Santos de Cope e Kalantzis (2015) e Kalantzis e Cope (2010)
81
um determinado assunto. Por último, o elemento ‘aplicar’,
anteriormente denominado como ‘prática transformada’ o qual
consiste em o sujeito utilizar os conhecimentos adquiridos,
selecionando-os conforme os contextos de aplicação apropriada,
bem como suas possíveis e diferentes formas. No caso da produção
do documentário, é exigida do aluno essa relação teoria versus
prática. Tais elementos não se apresentam em hierarquia, ambos se
relacionam entre si e ocorrem simultaneamente.
82
características dominantes e não exclusivas. Esse propicia uma
abordagem singular do real através de variadas expressões. Tal
pluralidade exige letramentos múltiplos. Devido à sua abrangência
social e cultural, o gênero documentário permite o ensino de
saberes diversos integrados as múltiplas semioses, argumentação,
progressão temática, coesão e coerência textual, o que
demostraremos através do esquema a seguir, que mostra os
elementos contemplados em seu processo de produção:
Captação dos
Enquadramento Músicas
ruídos ambientes
Composição da
cena
83
ser demonstrada com o uso de determinados elementos
multissemióticos e multimodais. Vejamos um exemplo:
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=nTC6GnuxrDo.
Acesso em: 29 mai. 2020.
8 Cf. https://www.youtube.com/user/conhecimentoepoder1
84
brasileiro, cujo caixão foi carregado por outros pilotos. Neste ponto,
veja como se configuram as marcas de autoria: a foto é sobreposta
por um texto verbal: “Percebam o rosto de culpa de Prost no velório de
Senna”9. Essa edição na imagem, que é uma montagem, e a
fotografia escolhida serve bem aos propósitos de defender a ideia
de que Senna não morreu por um acidente, mas assassinado, e
Alain Prost, que, em cuja foto escolhida olha para baixo, em sinal
de tristeza, na verdade, estaria fingindo, uma vez que teria sido um
dos responsáveis pela morte. É evidente que se trata de uma teoria
da conspiração, mas o exemplo demonstra como determinadas
escolhas, como a de uma foto de um ângulo específico ou mesmo a
edição e manipulação de imagem, mostra um traço autoral. Mas
como isso reverbera na educação?
85
saber. Não se é possível tal produção sem reflexão social e domínio
argumentativo, além de um mínimo conhecimento sobre a
construção de significado através das relações entre as linguagens
audiovisuais e uso de tecnologias, uma aprendizagem que envolve
a mobilização de muitos letramentos.
Propõe-se aqui uma atividade para os alunos, cujo objetivo é
compreender a constituição das marcas de autoria num documentário.
Neste ponto, deve ser convocada a Pedagogia dos
Multiletramentos e categorias de trabalho, como o experimentar,
conceituar, aplicar e analisar:
a) Experimentar: para Nichols (2010, p. 20), todo filme é um
documentário pois “mesmo a mais extravagante das ficções
evidencia a cultura que a produziu e reproduziu”, porém o
autor classifica esses filmes em dois grupos, documentário de
satisfação e desejo, normalmente chamados de ficção e os
documentários de representação social, que interpretam
“histórias verdadeiras”, essas entre aspas, pois como já
mencionamos, através de uma contribuição de Melo, o
documentário é uma obra pessoal, assim traz em seu conteúdo
marcas autorais que demonstram a singularidade desse tipo de
produção, pois ainda que pessoas distintas produzam um
documentário sobre o mesmo tema, ambos terão
representações próprias do real, o que pode ser notado em sua
produção devido a individualidade nas escolhas do seu
produtor, o conjunto dessas escolhas é o que compõem sua
voz. O aluno deve ser instruído a ver o que está disponível no
mundo (design) e estudar o funcionamento desses diferentes
tipos de documentário.
b) Conceituar: é neste momento que interessa ao professor
discorrer sobre como a ciência enxerga esses dois grupos de
documentário, por exemplo. Um exercício interessante seria
trazer dois tipos diferentes de documentário e pedir para que
os alunos busquem estabelecer as diferenças entre eles. Essas
diferenças podem ser desenhadas no quadro, para apontar,
86
mais à frente, o que pode mostrar as marcas de autoria em cada
um deles.
c) Aplicar: a voz do documentário não é somente o que é dito
verbalmente, a voz do documentário se expressa através de
todos os meios disponíveis do seu criador, Nichols (2010, p.
76), como enquadramento, movimento da câmara, montagem,
efeitos sonoros, modo de representação e outros meios que
possam lhe estar disponíveis. É a hora de esses conceitos serem
aplicados. Um exercício simples pode ser a realização de uma
atividade para a produção de um minidocumentário, com o
próprio smartphone, sobre uma temática que está em evidência.
Pode-se pedir que eles se utilizem de todas as marcas trazidas
por Nichols (2010), por exemplo, como o movimento da
câmera, montagem e efeitos sonoros, de maneira que eles
entendam o porquê estão se utilizando de cada um desses
recursos. Essas escolhas compõem a representação do real
pelos olhos daquele que o produz, manifesta um ponto de vista
e revela a intenção do produtor no documentário. É, portanto,
uma marca de autoria.
d) Analisar: é hora de ver como ficaram os resultados. Uma
atividade sugerida seria assistir a cada um dos documentários
produzidos e pedir para que os alunos avaliem os trabalhos
dos outros colegas, buscando entender a função de
determinados recursos utilizados. Isso lhes dará certa
bagagem para desenvolver a crítica e entender a função social
de cada um desses elementos.
Essa característica do gênero é o que o torna instigante e
desafiador para sua produção em sala de aula, pois em tal contexto
é o aluno que tomará o papel de produtor de significado,
responsável por construir sua voz dentro do documentário,
atendendo a um processo constante de reflexão sobre o tema
escolhido, pois a produção do documentário não consiste somente
na descrição de algo real, mas consiste sobretudo na representação
daquele fato real de modo subjetivo e são exatamente as marcas
87
dessa subjetividade percebidas através da narração que fazem da
produção um documentário.
Considerações finais
88
REFERÊNCIAS
89
ROJO, R.; BARBOSA, J. P. Hipermodernidade, multiletramentos e
gêneros discursivos. São Paulo, SP: Parábola Editorial, 2015.
ROJO, R. H. R.; MOURA, E. (org.). Letramentos, mídias,
linguagens 1ed. São Paulo, SP: Parábola Editorial, 2019.
SANTOS, Claudenise de Paula Santos. Multiletramentos nas aulas
de língua inglesa: integrando fotografia, rede social e escrita. 2018.
97 f. Dissertação (Mestrado em Estudos de Linguagens) –
Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Curitiba, 2018.
SILVA, M. Internet na escola e inclusão. In: ALMEIDA, M, E. B.;
MORAN, J. M. (Ed). Integração das Tecnologias na educação.
Brasília: Ministério da educação, Secretaria da Educação a
Distância – SEED, 2005. Disponível em: http://portal.mec.gov.
br/seed/arquivos/pdf/2sf.pdf. Acesso em 20 de mai de 2020.
Usuários de internet por frequência de uso. Cetic.br, 2018.
Disponível em https://cetic.br/tics/domicilios/2018/individuos/C3/.
Acesso em 20 de mai de 2020.
YIN, R. K. Pesquisa qualitativa: do início ao fim. Porto Alegre:
Penso, 2016.
90
PLÁGIO E AUTORIA NA LITERATURA DE CORDEL:
UM OLHAR SOBRE A OBRA DO POETA
LEANDRO GOMES DE BARROS
Introdução
91
de Leandro Gomes de Barros, que, de acordo com Câmara Cascudo
(1984), foi um ícone da literatura de cordel da sua época, sendo o
cordelista que mais produziu e publicou folhetos. Devido a esse
fato, surgiram muitas discussões envolvendo seu nome. Alguns
afirmam que ele sofreu com a reprodução de suas obras e outros
dizem que há indícios de que ele possa ter reproduzido ou se
inspirado em obras europeias. Desse modo, procuramos realizar
uma breve análise acerca do plágio e da autoria tendo como ponto
de partida os seus principais escritos.
92
considerado por Câmara Cascudo (1984) como um dos maiores
cordelistas da sua época, que fazia a impressão dos seus cordéis e
vendia nas principais feiras livres do Nordeste. Sales (2018) diz que
o folheto de cordel geralmente é impresso em um papel pardo no
tamanho de um livreto de bolso, no qual suas capas são ilustradas
por xilogravuras. A xilogravura por sua vez é a técnica de gravar
em madeira e transferir para o papel, são as ilustrações contidas
nos folhetos, também considerada como uma forma de arte.
A partir da impressão dos folhetos, o cordel expande-se por
todo o território nacional, como destaca Haurélio (2016):
93
variados do cotidiano da população sertaneja com: cangaço,
migração, religiosidade, situações políticas, entre outros.
Assim, podemos considerar a literatura de cordel como sendo
uma manifestação da cultura popular, afirmação corroborada por
Grangeiro (2002):
94
As xilogravuras começaram a ficarem conhecidas e cobiçadas no
Brasil a partir da exposição que houve em Paris, no ano de 1965, o
que confirma o ditado popular ‘santo de casa não faz milagre’, tendo
em vista que no país essa arte não era muito valorizada, ficando
restrita apenas ao mundo do cordel (LUYTIEN, 2007, p. 57).
O cordel no Nordeste
95
Nordeste [...], por considerações sociais e culturais peculiares, foi
possível o surgimento da literatura de cordel, de maneira como se
tornou hoje em dia característica da própria fisionomia cultural da
região.” (DIÉGUES JÚNIOR, 1986, p. 41).
Os poemas e desafios eram representados no Nordeste em
formato oral, chamados de cantorias, que eram as apresentações das
histórias contadas em versos acompanhadas de viola e rabeca10. Nas
cantorias também eram contadas novelas e várias outras estórias,
sendo o cordel considerado um meio de comunicação, já que a energia
elétrica não havia chegado em muitos locais da região.
Os temas abordados nos versos são dos mais variados
assuntos: biográficos, políticos, sociais etc. Há os que contam
histórias de romances, os que criticam fatos ou pessoas, e ainda os
que contém aventuras. Megale (1999) destaca que o:
96
noticiários veiculadas nos jornais, em forma de versos. O cordelista
lia a informação e a reescrevia à sua maneira ou da maneira que ele
acreditava que seria entendida e melhor aceita pela população, o
que funcionava como um tradutor dos acontecimentos. O poeta
procura a sua versão, a partir do noticiado ou ocorrido, e nessa
decodificação é que ele encontra utilidade de executar
conscientemente o seu papel de decodificador popular. É a sua
versão que vai importar, em última instância, para o leitor
específico de seus folhetos (LUYTEN, 2007).
Assim sendo, destacamos a importância que a literatura de
cordel teve e tem para a população nordestina, ora atuando como
texto informativo, ora como texto humorístico e de lazer. Dentre os
maiores cordelistas do Nordeste e do Brasil, encontramos a figura
de Leandro Gomes de Barros, cuja obra constitui objeto de análise
do presente trabalho.
97
e Olavo Bilac, sendo que descreve Leandro da seguinte forma "Não
foi príncipe dos poetas do asfalto, mas foi, no julgamento do povo,
rei da poesia do sertão, e do Brasil em estado puro" (DRUMMOND,
1976, n.p. ). E diz mais:
98
Questões de plágio e autoria na literatura de cordel
99
por buscar um melhor entendimento sobre o assunto, sobre a
“história, ascensão, declínio, formas de representação, preservação da
memória e, também, a proteção aos direitos autorais” (GAUDÊNCIO;
DIAS; ALBUQUERQUE, 2015, p. 97).
100
Se antes da impressão dos folhetos, as cantorias orais já se
disseminavam e os cantadores reproduziam por onde andavam
versos da própria autoria ou de outros poetas, fazendo com que
surgissem novas versões, imagina-se o que não houve com o aumento
da reprodução dos folhetos, além do grande número de obras
disponibilizadas a cada ano na internet. Com tudo isso, aumentou a
facilidade da reprodução do cordel sem que os seus verdadeiros
autores recebessem os créditos, o que tem dificultado ainda mais a
atribuir com veracidade uma obra a determinado autor.
101
e/ou ‘desdobramentos’, resultado da fusão entre a literatura popular
ibérica e os poetas improvisadores.” (SALES, 2018, p. 22).
Tendo em vista que se trata de uma literatura extremamente
popular e que suas inspirações partem de histórias reais e
contos/causos criados e reproduzidos oralmente por gerações, é
natural que se percebam relações de semelhança com outros textos
escritos a partir das mesmas inspirações, uma vez que em uma obra
artística literária há espaço para adaptações e releituras. Contudo,
também existiam as práticas de reprodução com fins apenas
lucrativos que tiravam dos poetas a propriedade de seus versos,
que geralmente por falta de recursos financeiros para publicar seus
poemas os vendiam para os donos de tipografias que, ao
comprarem, se apropriavam não apenas dos lucros, mas também
da autoria, ou seja, os folhetos saiam com seus nomes.
Assim, uma maneira muito usada pelos poetas para driblar o
plágio é o uso do acróstico para que nenhum outro se apropriasse
da sua história e assinasse como sendo sua. Dessa forma, era
provada a autoria dos versos. Ao citar Tavares (2008), Gaudêncio,
Dias e Albuquerque (2015) definem a técnica do acróstico como a
mudança de posição de algumas letras que devem ser lidas em
sequência, em que são formadas uma ou mais palavras.
Geralmente, é usado na primeira letra da primeira palavra do
verso, na posição vertical sendo a letra destacada em negrito ou
itálico. Os acrósticos são utilizados na literatura de cordel como
assinatura disfarçada.
Podemos observar na estrofe do folheto História de João da Cruz,
que o poeta Leandro Gomes de Barros também usou dessa
estratégia para evitar ser plagiado:
102
O seu grande defensor.
(Leandro Gomes de Barros, 1917)
103
folhetos atribuindo a autoria original. No entanto, com o passar do
tempo, atribuiu a si mesmo a autoria, alterando inclusive os
acrósticos que davam conta de sua apropriação indevida das obras.
Já em 1945, o próprio Athayde vendeu ao dono da Tipografia São
Francisco, José Bernardo da Silva, poeta alagoano radicado em
Juazeiro do Norte (Ceará) todos os direitos de suas obras, incluindo
as de Leandro Gomes de Barros por ele adquiridas. Tal fato
permitiu ainda maiores modificações na obra do poeta paraibano,
o que tem dificultado a identificação e levantamento de toda a obra
do autor.
Atualmente, o Projeto de Pesquisa “Folhetos de Papel:
Memória do Cordel”, da Fundação Casa Rui Barbosa, tem
resgatado, organizado e disponibilizado a obra do autor, buscando
atribuir a autoria a quem é de direito e permitindo que se conheça
a obra do grande cordelista brasileiro Leandro Gomes de Barros.
Conclusão
104
assim como teve parte de sua obra inspirada em folhetos europeus,
sofreu plágio inúmeras vezes, sendo algumas de suas obras até hoje
registradas e atribuídas a outros autores.
Por fim, vale salientar que, do ponto de vista acadêmico e de
estudiosos que se debruçam sobre a temática plágio e autoria, seja
na academia ou na arte, essa prática é frequentemente entendida
como inaceitável e uma violação dos direitos autorais e intelectuais
de quem se dedica de maneira árdua para produzir seus escritos.
REFERÊNCIAS
105
GRANGEIRO, Claudia Rejane Pinheiro. O discurso religioso na
literatura de cordel de Juazeiro do Norte. Juazeiro do Norte:
Edeuce, 2002.
HAURÉLIO, Marco. Breve História da Literatura de Cordel. São
Paulo: Claridade, 2016
LUYTEN, Joseph Maria. O que é Literatura de Cordel. São Paulo:
Brasiliense, coleção primeiros passos, 2007.
MARUPUNGA, José. Conhecendo o cordel. Fortaleza: SESC
Ceará, 2005.
MEDERIOS, Irani. No reino da poesia sertaneja: antologia de
Leandro Gomes de Barros. João Pessoa: Ideia, 2002.
MEGALE, Nilza. Folclore Brasileiro. Petrópolis, Vozes, 1999.
MEMÓRIAS DO CORDEL. A Questão dos Direitos Autorais no
Cordel. Disponível em: <http://memoriasdocordel.blogspot.com.
br/2013/12/a-questao-dos-direitos-autorais-no.html>. Acesso em:
04 de julho de 2019
Rabeca.org: Um mapa e banco de dados da rabeca brasileira,
portuguesa e o ravé (ou rawé) guarani. Disponível em: <https://
rabeca.org/?ip=rabeca> Acesso em: 02 de jun. de 2020.
SALES, Luciano Inácio da Silva. Quanto mais regional, mais
universal eu sou: o cordel de Antônio Francisco como matriz
criativa para a construção da cena. 2018.103 f. Dissertação
(mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro
de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Pós-Graduação
em Artes Cênicas, Natal, 2018.
SILVA, Obdália Santana Ferraz. Entre o plágio e a autoria: qual o
papel da universidade? Rev. Bras. Educ. [online]. vol.13, n.38, p.
357-368, 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.
php?pid=S141324782008000200012&script=sci_abstract&tlng=pt>
Acesso em: 21 de junho de 2019.
106
O PLÁGIO NA PÓS GRADUAÇÃO: PERCEPÇÕES DE
DISCENTES EM UMA DISCIPLINA DO POSENSINO
Introdução
107
acadêmica utilizando mecanismos eficazes frente ao combate do
plágio.
Considerando a relevância de discussões que busquem
solucionar as práticas de plágio no âmbito acadêmico é possível
destacar a importância da existência de disciplinas nos cursos de
graduação e pós-graduação que contemplem a temática. Seguindo
este pensamento, destacamos uma disciplina presente no
Programa de Pós-Graduação em Ensino – POSENSINO (fruto da
parceria entre Universidade do Estado do Rio Grande do Norte -
UERN, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio
Grande do Norte - IFRN e Universidade Federal Rural do Semi-
Árido - UFERSA) mestrado acadêmico que propõe desenvolver
pesquisas de cunho teórico-prático abrangendo a área de ensino.
Com isso, mediante as pesquisas que permeiam a escrita
acadêmica, sobretudo, evidenciando a existência do plágio e sua
frequência no âmbito acadêmico, existem questões que surgem como
norteadoras a esta pesquisa: quais as percepções dos pós-graduandos e
pós-graduandas quanto ao conteúdo plágio? De que modo a disciplina
Tópicos Especiais I – Escrita acadêmica: gêneros, autoria e
normatização, ofertada no semestre 2019.1 no POSENSINO, contribuiu
para as (re)construções do conceito de plágio? Assim, nosso interesse
nesta pesquisa teve como foco investigar se houve alguma alteração nas
concepções frente a esta realidade acadêmica antes e depois dos
contatos com a disciplina no decorrer do semestre letivo.
Metodologia
108
Especiais I – Escrita acadêmica: gêneros, autoria e normatização,
ofertada no semestre 2019.1.
Como instrumento, foi utilizado um questionário composto
por 12 (doze) questões abertas e fechadas que versavam sobre as
percepções tidas e construídas com o curso da disciplina sobre o
plágio acadêmico e, para facilitar o compartilhamento desta, foi
utilizado um formulário online preenchido por cada discente de
forma anônima.
Resultados e discussão
CATEGORIZAÇÃO DA TURMA
13
8
109
Se apropriar de forma indevida, sem referenciar o autor de um
determinado texto. Utilizando ideias e conceitos de outra pessoa
como se fossem seus (DISCENTE1512).
110
Além de ser crime é um desrespeito com aquele que produziu
determinada obra, como também o plágio não colabora com a
produção do conhecimento pois o torna repetitivo (DISCENTE13).
111
Gráfico 2. Contribuição da disciplina na (re)construção do conceito de
plágio
1 20
NÃO SIM
112
Não contribuiu, porque eu já conhecia os conceitos que foram
trabalhados na disciplina (DISCENTE15).
18
3
NÃO SIM
Acredito que não precisamos de tanto terror com essa coisa de plágio
na pós-graduação. Todos já têm que saber. (DISCENTE15).
113
O autoplágio não deveria ser considerado plágio. As vezes, a pessoa
pode repetir suas palavras sem perceber. (DISCENTE21)
114
Gráfico 4. O impacto da utilização do plágio
12
6
3
8 8
5
115
sobre estas. Com isso, destacamos ainda mais a importância do
trato com o conteúdo plágio, uma vez que, num montante de 21
(vinte e um) discentes de pós-graduação, apenas 23% (vinte e três
por cento) afirmaram conhecer realmente as leis de autoria.
Após perceber, com as respostas anteriores, a importância de
se discutir sobre o plágio na pós-graduação, através da proposição
“descreva algum conhecimento acerca do plágio adquirido após o
curso da disciplina” percebemos que as respostas se divergiram.
116
Para encerrar os questionamentos, incluímos a questão
apresentada no quadro 6, abaixo, que revela a importância da
disciplina na concepção dos discentes.
20
NÃO SIM
Considerações finais
117
semelhantes acerca do plágio, já que consideram a prática indevida
no cenário acadêmico e responderam com clareza as perguntas
expostas acima realizadas por um questionário virtual. A disciplina
foi ofertada no semestre 2019.1 dentro do Programa de Pós-
Graduação em Ensino – POSENSINO, composto por discentes de
caráter regular e especial, sendo notório, diante das respostas, que
a disciplina contribuiu para a exploração dessa temática.
Reconhecemos as limitações inerentes a pesquisa, quanto
outras questões que poderiam ser esclarecedoras, além da
possibilidade do alcance de todos discentes do programa
investigado, não apenas em uma única disciplina. Porém,
acreditamos que investigações como está surgem em meio a
inquietações e podem instigar novas, além de evidenciar a
importância de diferentes discussões no âmbito acadêmico.
Percebemos que o grupo investigado reconhece as
contribuições da disciplina e sua relevância na construção do
conhecimento inerente aos conceitos que permeiam a prática do
plágio. Entretanto, um dos discentes afirmou que não reconheceu
uma relevância significativa após curso, uma vez que afirmou já
saber todas as informações discutidas no semestre, considerando
assim, a exploração do tema – plágio – irrisória.
Mediante a relevância da temática em questão, reconhecemos
o quanto a abordagem do plágio dentro da disciplina foi
significativa, consideramos que está exploração deveria ser feita em
todos os cursos de pós-graduação de forma evidente, visando o
combate às práticas indevidas e principalmente com foco na
ampliação do conhecimento discente. Além disso, esperamos que
nossos resultados possam subsidiar docentes que busquem influir
na conscientização quanto à prática do plágio, esclarecendo o
necessário para evitá-lo.
118
REFERÊNCIAS
119
120
QUEM NÃO COLA NÃO SAI DA ESCOLA...:
O PLÁGIO NA CONCEPÇÃO DOS ALUNOS
DO 8º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL II
Introdução
“Quem não cola não sai da escola! Mas quem não cola?” Este
refrão de um rap que fez muito sucesso nos anos 1990 de autoria de
Mr. Halgus e ilustra satisfatoriamente a mentalidade dos alunos do
Ensino Fundamental II. Eles naturalizam o procedimento da “cola”
dentro do seu processo de aprendizado. Não há como negar que “a
cola” faz parte da rotina de todas as escolas, independentemente
de ser pública ou privada, do ensino básico ou superior. Mas os
prejuízos para o processo de ensino e prendizagem, assim como
para a formação ética do aluno, são ainda pouco mensurados.
Dentro do contexto da cultura escolar, “colar” é sinal de
esperteza e inteligência, uma forma de apropriação da propriedade
intelectual de outrem. É um furto que, como qualquer outro, traz
prejuízos sociais, financeiros e éticos, e neste caso específico, a
quem prática o ato pois o seu aprendizado é prejudicado.
Desde a antiguidade que o plágio tem sido uma prática
comum no meio intelectual, mas passou a ser crime, inicialmente,
na Europa, a partir do Século XVIII, especificamente no movimento
Iluminista, quando surgiram as primeiras leis que o previam como
crime (KROKOSCZ, 2011). Atualmente, no Brasil, com o
surgimento da lei n°10.695/03 sobre direitos autorais, foi possível
121
regularizar penas e multas para quem faz uso indevido da
propriedade intelectual de outro.
Levando em consideração os aspectos discursados,
resumidamente, este estudo se propõe a refletir sobre as origens da
“cultura do plágio” no Ensino Fundamental II, naturalizadas na
prática da “cola” em avaliações e trabalhos escolares. O objetivo
geral é analisar como esses alunos percebem ou concebem a noção
de cola e tendo como objetivos específicos: buscamos identificar se
os alunos da Escola Municipal Professor Manuel Assis cometem
plágio no momento da pesquisa e, por último, refletir sobre a
dimensão ética nas produções textuais.
A pesquisa se deu como base a investigação bibliográfica e a
aplicação de um questionário com perguntas abertas e fechadas,
respondidas pelos alunos do 8º ano do Ensino Fundamental II da
Escola Municipal Professor Manoel Assis, na cidade de
Mossoró/RN. Esta pesquisa tem caráter descritivo e busca analisar
a percepção dos alunos acerca da prática da “cola” nas atividades
escolares.
Estruturalmente, este estudo é composto das seguintes partes:
a primeira trata sobre a relação entre o plágio e a “cola” escolar,
quando buscamos caracterizar o plágio e a sua ligação com diversas
formas de fraudar as avaliações escolares no ensino básico,
sobretudo no Ensino Fundamental II. Em um segundo momento,
detemos a refletir especificamente sobre a “cola” escolar, suas
definições, abrangências e consequências no processo de ensino-
aprendizagem. Em seguida, expomos a metodologia empregada na
pesquisa empírica e por fim, analisamos os dados coletados no
questionário aplicado aos alunos.
Este texto se faz necessário por acreditarmos que o combate ao
plágio nas escolas pode diminuir os reflexos desse uso nas
academias brasileiras, ou seja, se defrontarmos a utilização da cola
nas escolas, provavelmente as universidades não sofreram com
métodos de plágios em seus trabalhos.
122
A relação entre o plágio e a “cola” escolar
123
Outra prática bem comum de plágio, é a famosa colcha de
retalhos, que acontece quando os alunos recortam diversas fontes e
tentam organizar as partes, montando um texto através de jogos de
palavras, na tentativa de disfarçar os recortes, fazendo, por vezes,
parecer um texto real, mas, na realidade, é um recorte produzido
por terceiros.
É comum dentro das universidades brasileiras ouvirmos
histórias de casos que apontam o plágio como uma prática terrível,
quase monstruosa. Os alunos sempre relatam situações que
presenciaram com colegas ou sobre certas dinâmicas que as
instituições usam como forma motivacional na tentativa de escapar
das armadilhas da escrita.
Pode-se dizer que o plágio na escola existe antes mesmo da
utilização da internet como mecanismo de pesquisa, alunos
habituados a construírem seus trabalhos escolares tendo como
fontes livros físicos, acompanhados de muitas idas para as
bibliotecas. Além disso, não estavam familiarizados a referenciar
seus trabalhos, como em resenhas e demais gêneros textuais,
produzidos quando solicitados pelo professor.
A chegada das tecnologias não só influenciou a forma de
pesquisar, como também a de escrever. Se no passado as cópias já
existiam, com a chegada da mídias na educação, essa atitude de
copiar fez florecer dentro das escolas uma forma precipitada de
pesquisa. Os alunos realizam o dowload de algo que tenha sintonia
com a temática, muitas vezes sem ler todo o conteúdo e entregam
aos professores como sendo deles, assinados.
No entanto, não podemos conceber a internet como uma
“vilã”, já que suas ferramentas de busca servem como auxílio para
quem faz um uso produtivo e ético. MORAN (2003, p. 1) diz que
“A internet nos ajuda, mas ela sozinha não dá conta da
complexidade do aprender ”. Na verdade, é preciso trabalhar com
os alunos o conceito de plágio e a implacabilidade que tal ato pode
ter na formação dos sujeitos em processo de aprendizagem. A
escola também é responsável pela formação ética dos alunos, por
124
isso, deve coibir a cópia de textos como procedimento única de
escrita e estimular a capacidade de ser autor do seu próprio texto.
Além disso, deve-se ter um cuidado muito expressivo com as
atividades de pesquisa. O exercício de pesquisar não pode ficar
restrito ao primeiro site encontrado, mas sim buscar a veracidade
dos fatos através de informações e dados diversificados, já que
muitos sites na internet sofrem alterações e correções de usuários e
que podem deter conhecimentos sobre o que se busca ou
simplesmente alterações de informações importantes.
O mundo virtual trouxe o imediatismo, a velocidade que as
mídias impõem. Para o aluno, é bem mais fácil se apropriar do que
encontra pronto na rede do que produzir a partir de suas próprias
questões. O professor pode orientar sobre a importância de se
registrar a fonte, de anotar o site da pesquisa e, principalmente,
incentivar a leitura de tais fontes, para que possam dar base para o
texto que será produzido.
SALVADOR (1994, p. 157) chama a atenção para o emprego da
internet como fonte de pesquisa ao sublinhar “[…] que mesmo
sendo a fonte mais ágil para a aprendizagem e composição de
textos, faz-se necessário uma orientação adequada […]”, ou seja,
nela encontramos muitos dados, mas a produção do texto é de
responsabilidade do aluno a partir das orientações do professor.
Quando o adolescente ingressa no Ensino Fundamental maior
pode ser apresentado a conceitos sobre plágio e autoria para que
este adquira conhecimento para sua vida estudantil desde o início
de sua trajetória escolar. BELO (2012) observa que:
125
atividade é construir uma tabela comparativa com os dados
necessários para a correta referência em cada tipo de fonte. Além de
evitar o plágio, esta atividade ilustra para as/os alunas/os que há
outros dados, além do nome, igualmente relevantes em uma obra
(BELO, 2012)
126
desempenho são alguns dos motivos principais para recorrer à
cola”.
Presente nas instituições de ensino, a cola é um problema e a
discussão recai sobre a forma de avaliação que os professores
praticam, sobre a metodologia de aplicação de uma prova no final
de um bimestre, ou semestre, para medir o grau de aprendizagem
do aluno. Conforme ABREU e LIMA (2018),
127
de eficiência do sistema de avaliação da escola que prioriza
“decorar fórmulas e a aplicação apenas de provas como forma de
verificar o avanço da turma”.
Pensar na cola escolar e reprimir a prática de colar não seria
objetivar o fim do problema. “A cola contesta justamente o sistema
de avaliação de provas”, afirma SANTOS (2016) ao questionar a
cobrança que o aluno sofre ao passar duas horas preso a uma
cadeira desconfortável e “sob a vigilância de alguém pronto a
suspeitar de seus menores movimentos”.
Dessa forma, o autor parece atribuir o ato de colar também às
condições do ambiente em que o aluno está inserido. Mas, se fosse
assim, a cola não ocorreria em outras formas de avaliação, como,
por exemplo, trabalhos escolares de pesquisa, confecção de
maquetes ou resumo de capítulos. Não se trata de uma questão de
ambiente.
Será mesmo que a cola escolar é um problema do método de
avaliação pedagógica? Para MADEIRA, (2018) cola é “um meio de
burlar as regras sendo dessa maneira algo ilícito e prejudicial a
educação” que nos remete a questionar a conduta do aluno, diante
do ato de colar. Para os autores, a cola não é um ato de falta de ética
do aluno, mas reflete o aspecto cultural, ilícito e “rotineiro entre os
alunos” e apontam para necessidade de conhecer os motivos
considerando os aspectos “sociais e suas subjetividades”.
RIBEIRO (2004) verificou que as variações das estratégias de
colar defendem a repressão, mas aponta buscar diversificar as
formas de avaliação, pois a “exigência de decorar fórmulas e a
aplicação apenas de provas como forma de verificar o avanço da
turma” pode ser a motivação para a prática da cola. Essas
considerações apontam para a insegurança dos alunos diante de
certas formas de avaliação. Os alunos se recusam a estudar
assuntos que não têm interesse e, por isso, usam “pedacinhos de
papel”, “textos minúsculos”, lembretes na carteira e outras táticas
para obter boas notas sem precisar dedicar tempo para estudo.
No entendimento de ABREU e LIMA (2018), a prova causa
“desconforto, um nervosismo talvez por medo da reprovação, pela
128
cobrança por notas pelos pais”, motivando alunos a colarem. Ora,
isso acontece porque a avaliação procura medir o nível de
aprendizado do conteúdo estudado de forma prioritariamente
quantitativa. Este autor parece concordar com RIBERIO (2004), que
aponta entre os motivos para a cola:
Métodos e Técnicas
129
percepções sobre as noções de pesquisa, do ato de pesquisar,
levando em consideração a sua dimensão ética.
Realizamos inicialmente um levantamento teórico acerca da
questão do plágio na atualidade, através de diversas bibliografias,
a fim de nos apropriarmos desse conhecimento, para que, em
seguida, pudéssemos realizar a coleta de dados a serem
examinados. O questionário foi usado como ferramenta de
conhecimento da vivência desses atores sociais. A criação do
roteiro foi o primeiro momento deste trabalho, acompanhado pela
coleta de dados na escola e pelo processo de estudo e análise.
Optamos por uma escola municipal da cidade de Mossoró
pelo interesse em pesquisar a temática em escolas públicas. Os
questionários com três perguntas abertas e uma fechada foram
aplicados com 33 alunos de uma turma de 8º ano. A classe possuía
alunos numa faixa etária entre 12 a 14 anos. Não foram recolhidas
as identidades desses alunos menores de idade.
Na tentativa de atingir o nosso objetivo geral, buscamos
caracterizar a percepção que os alunos tinham sobre a cola escolar
em relação ao que alguns teóricos, como FONSECA (2008), por
exemplo, conceituam a respeito da cola e plágio, afim de identificar
semelhanças entre as concepções dos alunos e as noções concebidas
pelas teorias.
Análise de dados
130
Figura 1: Gráfico referente a questão número um do questionário
realizado com os alunos do 8º ano.
131
professores de forma geral costumam orientar, quando pegam seus
alunos colando.
Na maioria dos questionários os alunos, afirmaram que
entendem a cola como o ato de copiar uma atividade que você não
produziu ou realizou, alguns disseram que colar era algo feito por
quem não compreendia o conteúdo, outros associam a cola a
resumos que eles produzem quando estão estudando para
avaliações e por não se sentir confiante terminam levando na bolsa
para tentar ler durante a avaliação.
Na segunda questão, perguntamos aos alunos sobre como eles
pesquisam na internet, perguntando se eles escolhem o conteúdo só
pelo tema, sem ler e entregar ao professor, se leem parcialmente ou
se usam as fontes para construir o texto; por último, apresentamos
a opção em que eles copiavam sem alterar em nada o texto de
outros. Como podemos observar no gráfico 2:
132
pauta. Mesmo sem absorver os conteúdos, estes entregam
trabalhos e pesquisas sem alterar ou mesmo ler por completo sem
fazer alterações e alegam que a falta de tempo é o motivo de não
terem zelo no momento de pesquisas alunos.
Na questão três procuramos extrair o que eles pensam a
respeito sobre ética, perguntando se colar era uma falta de ética.
Vinte e três alunos dos questionados recorreram a dimensão de o
que era certo e o que errado, caracterizando o ato de colar como
uma falta de ética. Outros sete conceberam a cola como algo que
não é certo, como uma violação para com o outro e como um ato de
sabotagem para seu aprendizado. Apenas três dos entrevistados
não consideraram a cola como um ato antiético.
133
A questão quatro tentou identificar as motivações que levam
esses estudantes a colar na escolar. Vinte e sete alunos responderam
que o motivo da cola seria a falta de interesse e os outros seis alunos
relataram que colar era um ato de pessoas preguiçosas.
Os dados da questão quatro possuem relação direta com o que
vem sendo discutido por autores como RIBEIRO (2004) e ABREU e
LIMA (2018) em relação ao discurso reproduzido na escola a
respeito do fracasso escolar, atribuindo os fracassos sempre à falta
de interesse dos alunos para com os objetos do conhecimento.
Isso nos faz questionar até que ponto as falas desses alunos são
deles e que relações de poder exercem influências sobre elas. Além
de nos fazer refletir em relação ao porquê desses alunos estarem
tão desinteressados, pois o aluno pode não ter interesse em
determinados objetos de conhecimento apresentados pelo
professor, mas a maioria dos questionados tem o interesse em ser
aprovado no sistema educacional.
Autores como SOUZA, CORREA e OLIVEIRA (2016) afirma
que é necessário olhar para as motivações sociais e subjetivas. Será
que esses alunos trabalham ou ajudam os pais ou até de que
realidade social essas crianças e adolescentes são oriundas. Essas
perguntas nos levam a refletir sobre qual o grau de importância que
esses estudantes atribuem para a escola.
Considerações finais
134
gerais ou um ato ético. Em relação à pesquisa na internet, a grande
maioria admitiu fazer cópias e entregar aos professores para
obtenção de notas.
Está claro que essa é uma discussão que está longe de ser
encerrada, devido aos aspectos históricos e sociais que a
atravessam, Sugerimos uma evolução dessa temática para
trabalhos futuros, até de outros pesquisadores, assim como a
possibilidade de realizar um levantamento de dados mais
aprofundados, seja por meio de entrevistas abertas, observação ou
trabalho de campo que possibilitem uma análise que vise buscar as
relações de poder e saber que atravessam esses discursos.
REFERÊNCIAS
135
em: < /http://www.eca.usp. br/prof/moran/site/textos/tecnologias_
eduacacao/>. Acesso em: 19 jun. 2019.
MUNIZ, A. Ato de “colar” é cultural e mostra falência do sistema
educacional. 2018. Disponível em: < https://www.gazetadopovo.
com.br/educacao/ato-decolar-e-cultural-e-mostra-falencia-do-
sistema-educacional-e6rp4iz6i1zhne68ita0wzg04/>. Acesso em: 13
jun. 2019.
PESQUISA: 87% dos alunos chegam à universidade sem saber o
que é plágio. 2018. Disponível em: <//veja.abril.com.br/ educacao/
pesquisa-87-dos-alunos-chegam-a-universidade-sem-saber-o-que-
e-plágio/.>. Acesso em: 19 jun. 2019.
RIBEIRO, R. O aluno colou? É hora de discutir avaliação. E regras.
2004. Disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/1363/o-
aluno-colou-e-hora-de-discutir-avaliacao-e-regras>. Acesso em: 19
jun. 2019.
SALVADOR, C. C. Aprendizagem escolar e construção do
conhecimento. Tradução Emília de Oliveira Dihel. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1994.
SANTOS, André Luiz. Reflexões sobre a cola. V. 1, p. 14, 2016.
Disponível em: <http://www.hottopos.com>. Acesso em: 13 jun.
2019.
SOUSA, C. M.; CORRÊA, A. O.; OLIVEIRA, S. N. O ato de “colar”
como aspecto da educação básica ao ensino superior, 2016.
Disponível em: < http://www.editorarealize.com.br/revistas/
conedu/trabalhos/TRABALHO_EV056_MD1_SA2_ID4107_140820
16140045.pdf >. Acesso em: 13 jun. 2019.
136
APÊNDICE A - QUESTIONARIO DE PESQUISA
Trabalho de Pesquisa
137