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ESTRATÉGIAS PARA O ENSINO DE ORTOGRAFIA NO ENSINO

FUNDAMENTAL

Amanda Suellen Lima de Santana1


Carlos Antônio Magalhães Guedelha2

RESUMO:
O presente artigo desenvolve reflexões sobre as dificuldades apresentadas pelos
alunos ingressantes no sexto ano do Ensino fundamental, que geralmente os acompanham
nos anos seguintes. A partir dessas reflexões, a pesquisa busca apresentar estratégias
criativas e produtivas para a superação dessa defasagem. No que se refere à escrita, para
aprendê-la, a criança necessita viver em uma sociedade letrada ou, mais especificamente
fazer parte de algum segmento da sociedade que tenha acesso ao letramento. Diante
disso, é fundamental para nós, profissionais envolvidos com o desenvolvimento infantil e
com a aprendizagem, conhecermos como a criança processa o ensino da ortografia. O
estudo conta com o apoio teórico de Perini (1997), Travaglia (2003), Silva (2009) e
Bagno (2012).

PALAVRAS-CHAVE: Ensino Fundamental, Ortografia, Estratégias, Ensino.

INTRODUÇÃO

O propósito desta pesquisa está ligado às situações difíceis encontradas por


discentes no que se refere às questões de grafia de certas palavras, principalmente aquelas
que têm sua correspondência letra/som irregulares.
Muitos professores sentem-se inseguros ao cobrarem a ortografia de seus alunos
devido à falta de conhecimento necessário para fazê-lo. Diante dessa problemática
encontrada em nossa educação, faz-se necessário um trabalho de investigação a fim de
possibilitar alternativas para que o professor tenha êxito na difícil, mas não impossível
tarefa de ensinar ortografia.
Inicialmente fazendo-os compreender que existem duas línguas: a língua real e a
língua ideal e que cada uma delas exerce uma função e cumpre um papel diferente

1
Aluna do curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Língua Portuguesa da ESBAM.
2
Doutor em Linguística pela UFSC. Orientador.
A língua como fato cultural pode também ser descrita em termos de padrões
ideais e padrões reais. O que de maneira geral, se entende por língua padrão é de fato um
padrão ideal. Pode se tratar de um padrão preferencial, um acordo social para que
determinado padrão seja de maior prestígio social. Há de se aceitar que existe uma larga
distinção entre as modalidades falada e escrita.
Nas escolas encontramos uma padronização através dos livros didáticos da língua
padrão escrita. Os docentes que ensinam a língua materna nas escolas, em sua maioria,
seguem inteiramente as prescrições da gramática normativa, munidos da certeza de que
essas normas devem ser integralmente seguidas não apenas pelos alunos, mas por
quaisquer pessoas que escrevam.
No entanto, voltando ao campo da língua real e da língua ideal, há a observância de
que no que concerne ao padrão gramatical da escrita, os alunos apresentam inúmeras
falhas quanto à ortografia em situações de cultura escrita. É preciso lembrar que o
domínio da cultura letrada tem em sua história um emaranhado de valores relacionados
ao interesse do Estado, formulários ortográficos, gramáticas e agências de comunicação.
Nesse sentido, o presente artigo busca mostrar que o padrão tem sua importância e
utilidade, uma vez que as situações formais a serem vivenciadas demandarão do discente
o domínio da escrita frente aos desafios cotidianos.

1 O ENSINO DA GRAMÁTICA NORMATIVA

A função da Gramática Normativa é o estabelecimento de regras que norteiam o


uso da língua, sendo, assim, usada nas salas de aula através de livros didáticos como
forma de padronizar a utilização da língua materna. No entanto muitos linguistas
enumeram diversos problemas relativos à aplicação da norma padrão isoladamente, sem
que esteja atrelada a um contexto de comunicação, uma vez que muitos discentes
consideram difíceis o português e suas regras.
Dessa forma, os discentes não somente apresentam incapacidade para produzir
textos, mas também a dificuldade de compreender os mais variados textos de maneira
eficaz.
A importância do estudo da gramática normativa está, então, inserida em um
conjunto de regras que vai fornecer ao estudante os critérios para elaboração de textos e
em toda a forma escrita. O papel da escola é apresentar esse conjunto de regras ao aluno,
introduzindo-o no universo do letramento.
Mas os métodos utilizados para essa transferência de regras deve ser um ponto para
reflexão, pois se a função da escola é o ensino da língua padrão, não é simplesmente pela
teoria gramatical, que se distancia da real língua executada pelos alunos, que ela
concretizará seu objetivo.
Esses contrastes trazem desinteresse ao estudante quando diante da construção de
um enunciado não consegue entendê-lo, resultando em frustrações, reprovações,
recriminações que começam pela própria escola, e o preconceito linguístico de que não
sabe “português”.
Para Perini (1997, p.20)

A gramática, segundo o que nos ensinaram na escola, é


composta de duas seções, cada qual mais repelente: na primeira
seção aprendemos (ou, mais precisamente, não aprendemos)
uma nomenclatura complicada e confusa, uma selva de sujeitos,
adjuntos, advérbios, orações subordinadas reduzidas ou não,
coordenações sindéticas e assindéticas, enfim um palavrório que
parece inventado de propósito para esconder a falta de conteúdo
da disciplina, e na segunda seção somos submetidos a uma série
de ordens e recomendações do tipo “nunca diga nem escreva
isto, porque o certo é aquilo”.

Assim, muitos docentes vêm modificando a forma de ensinar a gramática com seus
conjuntos de regras, buscando apresentá-la através de textos que são parte do cotidiano
dos discentes, textos publicados em jornais, revistas, comerciais publicitários e textos de
internet.
Para Travaglia (2003), relacionar as atividades com metas e objetivos de ensino de
língua materna, concepções de linguagem e gramática trazem uma proposta que se
integra verdadeiramente com o ensino de produção e compreensão de textos e ensino do
léxico/vocabulário, dessa forma é possível produzir um ensino pertinente para a vida das
pessoas.
Aproveitar os fatos reais que aparecem em sala de aula, como por exemplo, através
da fala dos próprios alunos, são grandes oportunidades de mostrar que a língua é capaz de
se modificar à revelia do falante, conforme o contexto em que ela se aplica.
Apresentar ao aluno novos recursos e possibilidades da língua que é sistemática e
não fica condicionada apenas àquilo que ocorre no uso que o aluno faz da língua, com a
vantagem de apresentar ao aluno novos recursos e possibilidades da língua em que os
alunos certamente precisará em várias situações de comunicação durante a vida.
2 ORIENTAÇÕES DOS PCN SOBRE O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

A Secretaria de Educação Básica responde pela educação infantil, pelo ensino


fundamental e pelo ensino médio. A educação básica é o caminho para assegurar a todos
os brasileiros a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-
lhes os meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores. Atualmente, os
documentos que norteiam a educação básica são a Lei nº 9.394, que estabelece as
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação Básica e o Plano Nacional de Educação, aprovado pelo Congresso
Nacional em 26 de junho de 2014. Outros documentos fundamentais são a Constituição
da República Federativa do Brasil e o Estatuto da Criança e do Adolescente.
De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica: A
Educação Básica é direito universal e alicerce indispensável para a capacidade de exercer
em plenitude o direto à cidadania. É o tempo, o espaço e o contexto em que o sujeito
aprende a constituir e reconstituir a sua identidade, em meio a transformações corporais,
afetivo-emocionais, sócio emocionais, cognitivas e socioculturais, respeitando e
valorizando as diferenças. Liberdade e pluralidade tornam-se, portanto, exigências do
projeto educacional.
Acerca disso, surge ainda outro questionamento, sobre o ensino de língua
portuguesa nas escolas, pois ao professor compete o ensino da gramática normativa para
o cumprimento dos Parâmetros Curriculares Nacionais, os quais funcionam como ponto
de referência para o trabalho de todas as disciplinas nos três níveis para a formação básica
escolar dos discentes.
De acordo com os PCN (BRASIL,1997) considera-se o ensino e a aprendizagem de
Língua Portuguesa, como prática pedagógica, resultantes da articulação de três variáveis:
o aluno; os conhecimentos com os quais se opera nas práticas de linguagem, e a mediação
do professor. O primeiro elemento dessa tríade é o aluno, sujeito da ação de aprender,
aquele que age a partir e sobre o objeto de conhecimento. O segundo elemento, o objeto
de conhecimento, são os conhecimentos discursivo-textuais e linguísticos empregados
nas práticas sociais de linguagem. O terceiro elemento da tríade é a prática educacional
do professor e da escola que assumem o papel da mediação entre sujeito e objeto do
conhecimento.
Os PCN (BRASIL,1997) enumeram como sendo habilidades importantes para
serem desenvolvidas no aluno, a inferência, o reconhecimento de intenções do
enunciador, o reconhecimento de gênero, a atitude responsiva crítica, o uso de recursos
figurativos, entre tantas outras, podem ser resumidas como domínio dos gêneros, que nos
permitem interagir com o parceiro da comunicação, prevendo a forma e o conteúdo do
que provavelmente será dito.
Outro aspecto importante é que o professor formado deve vivenciar o que irá
ensinar, sob a pena de não contagiar os alunos com o que diz e faz. O gosto pela leitura, a
avidez pelo conhecimento, o respeito à diversidade linguística, a curiosidade pelo mundo
do conhecimento, devem ser requisitos indispensáveis a quem exerce a docência.
É uma responsabilidade coletiva de professores – podendo acrescentar também os
alunos – fazer da escola um espaço de crescimento, de aquisição de saberes, de respeito e
de cidadania. Como enfatizam os PCN (BRASIL,1997), p.47: “A escola deve assumir o
compromisso de procurar garantir que a sala de aula seja um espaço onde cada sujeito
tenha o direito à palavra, reconhecido como legítimo, e essa palavra encontre ressonância
no discurso do outro”.
Nessa perspectiva, a escola precisa se municiar de estratégias que alcancem a
realidade de seus discentes, evidenciando assim um sentido para os conteúdos que a eles
deverão ser apresentados ao longo do ano letivo, motivando-os a não apenas serem meros
frequentadores, mas também participantes ativos desse processo de aprendizagem.
Já no que tange ao ensino da gramática normativa voltado para adolescentes do
ensino fundamental, pode-se recorrer a textos mais elaborados, que se distanciem da
forma oral, buscando com isso, um fazer reflexivo das diferentes formas de manipular a
língua, mostrando inúmeras possibilidades de intersecção desta. Esse trabalho deve
permitir-lhes tanto o reconhecimento de sua linguagem quanto a percepção das outras
formas de organização do discurso, particularmente daquelas manifestas nos textos
escritos.
Assim, a escola deve possibilitar um conjunto de atividades que mostrem ao aluno
meios de utilizar a linguagem na escuta, produção de textos orais e na leitura e produção
de textos escritos ou ainda que possibilitem um olhar voltado para a escrita
fundamentalmente, de modo a atender a múltiplas demandas sociais, responder a
diferentes propósitos comunicativos e expressivos, e considerar as diferentes condições
de produção do discurso; utilizar a linguagem para estruturar a experiência e explicitar a
realidade, operando sobre as representações construídas em várias áreas do
conhecimento, sabendo como proceder para se expressar, compreender e fazer uso de
informações contidas nos textos e sendo capaz de operar sobre os conteúdos estudados
tornando-os participantes em seus variados discursos cotidianos.

3 A IMPORTÂNCIA DA ORTOGRAFIA

No Brasil, o ensino da escrita passou por várias etapas e foi fortemente influenciado
pela pedagogia tradicional, de caráter religioso e normativo, dada a influência dos
jesuítas, nessa área. A escrita, em tempos passados, era privilégio de sacerdotes e nobres;
para nós, nos dias atuais, é necessidade e direito de todos. A escrita, que serve de
comunicação entre os homens, é usada desde a declaração de um sentimento até o
fechamento de um importante negócio. A escrita, seja ela qual for, sempre foi uma
maneira de representar a memória coletiva religiosa, mágica, científica, política, artística
e cultural de um povo.
Sendo a ortografia a parte da língua responsável pela grafia correta das palavras
faz-se necessário trabalhá-la de uma maneira intensa e ativa nos alunos, já que se percebe
grande dificuldade nesse aspecto.
Segundo Silva (2009), p. 27 "A ortografia age na parte gráfica e funcional da escrita". O
ensino da ortografia deveria acontecer desde as seres iniciais, em que os alunos aprendem
a ler, escrever e falar de uma maneira correta. No entanto, por defender a ortografia como
um meio eficaz de aprender a ler, escrever e falar corretamente, é que se faz de extrema
importância enfatizá-la de uma forma mais intensa no ensino. Nessa perspectiva, é
importante evidenciar um dos principais objetivos da educação: promover a aquisição da
escrita e da leitura. Devemos dominar com clareza o que significam ler e escrever, os
desafios que representam os conhecimentos de ordem linguística e que conhecimentos o
professor deve ter para poder realmente ensinar.
Diante dessa realidade, é necessário refletir sobre as metodologias utilizadas no
ensino da ortografia da Língua Portuguesa. Dessa forma, é necessária a investigação das
principais causas das dificuldades dos alunos em se apropriarem das regras ortográficas,
se estão na forma de ensino ou em defasagens apresentadas pelos discentes. Isso
demanda um estudo de caso, para que se detectem nessa panorâmica os reais motivos que
atrapalham os alunos na internalização das normas ortográficas.
Assim, a escola precisa provocar nos sujeitos uma reflexão sobre a língua, pois um saber
metalingüístico que relacione ortografia e significado poderá levar os sujeitos a um
melhor desempenho da escrita convenciona.
A metodologia utilizada pelos professores conjuntamente para ensinar ortografia,
ainda tem sido em sua maioria arcaica, ainda adotando características do ensino
tradicional, aplicando ditados, cópias de palavras, atividades mecânicas que não
priorizam a construção e reflexão acerca das normas ortográficas e do uso da língua. Vale
ressaltar que essas práticas são importantes também, mas não devem ser as únicas formas
adotadas. O uso exclusivo do livro didático como instrumento único de atividades de
leitura, interpretação, estudos gramaticais e atividades ortográficas limita a ação do
docente que se vê obrigado pelo sistema a usar por completo o livro didático, não tendo
tempo oportuno para o reforço de determinados conteúdos, incluindo a ortografia. Pode-
se concluir que grande parte dos professores se sentem confiantes quanto ao possível uso
de novas metodologias, mas ainda adotam única e exclusivamente posturas tradicionais
ao ensinar regras ortográficas. Apontam o sistema educacional como “culpado” por essa
prática retrógrada.
Auxiliar os alunos a internalizarem as regras ortográficas de forma eficaz é uma
tarefa difícil, requer resiliência, estudo, insistência, flexibilidade e doação. Além disso,
devem-se buscar meios que possibilitem essa aprendizagem como a utilização de jogos,
dinâmicas, músicas, entre outros recursos. Escrever corretamente pode significar abertura
de várias portas, no campo profissional ou na vida em geral, no entanto os alunos ainda
não apresentam a maturidade necessária para esse entendimento e mais uma vez é de
fundamental importância que se insira essa consciência neles.
É recorrente afirmar que o ingresso dos alunos no universo do letramento se dá
através do contato deles com as diversas formas de escrita, sejam elas através de rótulos,
campanhas publicitárias, revistas e demais impressos que circulam no âmbito familiar
dessa criança. Ao ingressar na escola, chamada educação sistemática, o discente é
apresentado a um processo novo que envolve a leitura, a oralidade e o registro escrito, a
ortografia. Assim, as associações a partir da bagagem de conhecimento trazida pelo aluno
é fundamental para que esse ingresso seja tranquilo e natural, dessa forma facilitando a
introdução das regras estabelecidas pela gramática normativa.
A ortografia de uma língua vai se constituindo ao longo do tempo sob a influência
dos diferentes modos de falar, mas principalmente por convenções sociais. Esta forma
mais estável da linguagem escrita em relação à linguagem oral possibilita a compreensão
do texto escrito independentemente de variações linguísticas.
Outro aspecto importante é saber ressaltar que as regras ortográficas são fruto de
uma convenção social, de um acordo estabelecido pelos especialistas, cujo objetivo é
padronizar a escrita, mantê-la íntegra, ou seja, se esse objetivo não se realizasse, a
linguagem escrita apareceria, dentro de um mesmo país, fragmentada pela oralidade de
cada região e pelo modo de pronunciar de cada falante. Seria uma verdadeira Torre
de Babel, pois, com o passar do tempo, ninguém se entenderia mais. Essa seria a real
necessidade de se respeitar as convenções ortográficas.

4 PROPOSTAS DE INTERVENÇÃO

Durante muito tempo, a correção ortográfica foi cobrada drasticamente e de


maneira mecânica na sala de aula. Atividades como identificação de erros dos alunos nos
textos, cópia exaustivamente repetida dos erros cometidos, ditados com correção das
grafias das palavras e exercícios de preenchimento de lacunas faziam parte da rotina das
aulas de português.
Assim, para dirimir a mecanicidade, o trabalho com a normatização ortográfica
precisa estar contextualizado, basicamente, em situações em que “os alunos tenham
razões para escrever corretamente”, em que a legibilidade seja fundamental porque
existem leitores de fato para a escrita que produzem. Deve estar voltado para o
desenvolvimento de uma atitude crítica em relação à própria escrita, ou seja, de
preocupação com a adequação e correção dos textos. No entanto, diferentemente de
outros aspectos da notação escrita – como a pontuação –, “as restrições da norma
ortográfica estão definidas basicamente no nível da palavra”. Isso faz com que o ensino
da ortografia possa desenvolver-se por meio, tanto de atividades que tenham “o texto
como fonte de reflexão como de atividades que tenham palavras não necessariamente
vinculadas a um texto específico" (BRASIL, 1997, p. 36).
Nos últimos anos, as amplas discussões a respeito das práticas de ensino da língua
culminaram na redefinição dos objetivos do ensino da língua portuguesa na escola.
Agora, pensa-se não mais em “treinar” os alunos para que escrevam corretamente, mas
em constituir usuários competentes da língua materna. Por isso, o texto passou a ser o
cerne do processo de ensino e aprendizagem, visto que a leitura e a produção de textos
começaram a ser consideradas como atividades fundamentais no processo de integração
social.
Assim, a ideia é expor um repensar acerca dessa atitude mecânica e propor um
ensino que trate a ortografia como objeto de investigação e não de reprovação ou ainda de
subtração de pontos na avaliação do aluno. Nesse sentido, o trabalho com a convenção
ortográfica em sala de aula deve ser revisto por duas razões: primeiro, se a ortografia
“congela” na escrita as diferenças no modo de falar dos usuários de uma mesma língua,
esse recurso faz com que “as variações linguísticas da fala não atrapalhem a tarefa do
resgate do significado textual”, facilitando a comunicação escrita; segundo, os erros de
“português” “funcionam como uma fonte de censura e de discriminação, tanto na escola
como fora dela” (MORAIS, 2001, p.18). Nesse sentido, “ao negligenciar sua tarefa de
ensinar ortografia, a escola contribui para a manutenção das diferenças sociais, já que
ajuda a preservar a distinção entre bons e maus usuários da língua” (MORAIS, 2001, p.
24).
Para um ensino produtivo da ortografia, torna-se fundamental verificar, como ponto
de partida, que tipos de erros ortográficos os alunos cometem em seus textos, isto é, se os
desvios correspondem a uma dificuldade irregular ou regular (MORAIS, 2001).
É importante destacar o fato de alunos de 5ª série ainda não dominarem,
lamentavelmente, princípios ortográficos básicos. Mostrando que esse problema seja, em
parte, motivado pela ausência de atividade s sistemáticas de ensino e aprendizagem de
ortografia, bem como pelo uso de metodologias inadequadas, como a de solicitar a
produção de textos sem que os mesmos passem por uma correção dos erros apontados
para que o aluno possa ser estimulado a revisar o que produz e possa, dessa forma,
autocorrigir-se.
No entanto, embora necessárias, tais atividades não podem se tornar excessivas e
tampouco desinteressantes e desestimulantes ao aluno. Caso contrário, incorre-se na
destruição do discurso do aluno, como bem aponta Cagliari:

O controle das formas ortográficas é conveniente para


fazer avaliações de massa nas classes, mas um desastre
para ensinar alguém a escrever o que pensa. O excesso
de preocupação com a ortografia desvia a atenção do
aluno, destruindo o discurso linguístico, o texto, para se
concentrar no aspecto mais secundário e menos
interessante da atividade de escrita. Além disso, o
controle ortográfico destrói o estímulo que a produção
de um texto desperta numa criança (1997, p. 124)

A seguir há uma proposta de intervenção referente a erros comuns dos discentes.

Atividade 1:
Complete as palavras desta fábula usando S,SS, Ç, C.
A moça tecelã

Acordava ainda no escuro, como se ouvi___e o sol chegando atrá__ das beiradas da
noite. E logo sentava-se ao tear. Linha clara, para come__ar o dia. Delicado tra___o cor
da luz, que ela ia pa___ando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da
manhã desenhava o horizonte. Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas, a
mo___a colocava na lan____adeira gro___os fios cinzentos do algodão mais felpudo.
Mas se durante muitos dias o vento e o frio brigavam com as folhas e espantavam
os pá___aros, bastava a mo___a te__er com seus belos fios dourados, para que o sol
volta___e a acalmar a natureza. A___im, jogando a lan___adeira de um lado para outro e
batendo os grandes pentes do tear para frente e para trá___, a moça pa___ava os seus
dias. Mas te___endo e te___endo, ela própria trouxe o tempo em que se sentiu sozinha, e
pela primeira vez pens__u em como seria bom ter um marido ao lado.
Não esperou o dia seguinte. Com capricho de quem tenta uma coisa nunca
conhe___ida, come___ou a entremear no tapete as lãs e as cores que lhe dariam
companhia. E aos poucos seu desejo foi aparecendo, chapéu emplumado, rosto barbado,
corpo aprumado, sapato engraxado. Estava justamente acabando de entremear o último
fio do ponto dos sapatos, quando bateram à porta.
Nem precisou abrir. O moço meteu a mão na ma____aneta, tirou o chapéu de
pluma, e foi entrando em sua vida.
E feliz foi, durante algum tempo. Mas se o homem tinha pen__ado em filhos, logo
os esqueceu. Porque tinha descoberto o poder do tear, em nada mais pen__ou a não ser
nas coisas todas que ele poderia lhe dar.
— Uma casa melhor é nece___ária — di___e para a mulher.
Mas pronta a ca__a, já não lhe pareceu sufi___iente.
— Para que ter ca__a, se podemos ter palácio? — perguntou o homem.
Dias e dias, semanas e meses trabalhou a moça te__endo tetos e portas, e pátios e
escadas, e salas e poços.
Afinal o palácio ficou pronto. E entre tantos cômodos, o marido escolheu para ela e
seu tear o mais alto quarto da mais alta torre.
— É para que ninguém saiba do tapete — ele disse.
Sem descan__o te__ia a mulher os caprichos do marido, enchendo o palácio de
luxos.
E tecendo, ela própria trouxe o tempo em que sua tristeza lhe pare__eu maior que o
palácio com todos os seus tesouros. E pela primeira vez pensou em como seria bom estar
sozinha de novo.
Só esperou anoite__er. Levantou-se, subiu a longa escada da torre, sentou-se ao
tear. Segurou a lan__adeira ao contrário, começou a desfazer seu tecido. Desteceu os
cavalos, as carruagens, as estrebarias, os jardins. E novamente se viu na sua ca__a
pequena.
A noite acabava quando o marido estranhando a cama dura, acordou, e, espantado,
olhou em volta.
Não teve tempo de se levantar. Ela já desfazia o desenho escuro dos sapatos, e ele
viu seus pés desapare__endo, sumindo as pernas.
Então, a moça escolheu uma linha clara. E foi pa___ando-a devagar entre os fios, que a
manhã repetiu na linha do horizonte.
COLASANTI, Marina. Doze Reis e a Moça no Labirinto do Vento. Rio de Janeiro:
Global Editora, 2000. p. 18. Adaptado.

Atividade 2:

Leia o texto Lenda e responda às questões a seguir:

Lenda do guaraná

Em uma aldeia dos índios Maués avia um casau, com um único filho, muito bom,
alegre e saudável. Era muito querido por todos de sua audeia, o que levava a crer que no
futuro seria um grande chefe guereiro.
Isto fez com que Jurupari, o Deus do mal, sentise muita inveja do menino. Por isso
resolveu matá-lo. Então Jurupari transformou-se numa enorme serpente e, enquanto o
indiozinho estava distraído, colhendo frutinhas na floresta, ela atacou e matou a pobre
crianssa.
Seus pais, que de nada desconfiavam, esperaram em vão pela volta do indiosinho, até
que o Sol foi embora. Veio a noite e a Lua começou a brilhar no céu iluminando toda a
floresta. Seus pais já estavam dezesperados com a demora do menino. Então toda a tribo
se reuniu para procurá-lo.
Quando o encontraram morto na floresta, uma grande tristesa tomou conta da tribo.
Ninguém conseguia conter as lágrimas. Neste ezato momento uma grande tempestade
caiu sobre a floresta e um raio veio atingir bem de perto do corpo do menino.
Todos ficaram muito açustados. A índia-mãe dice: “- É Tupã que se compadece de
nós. Quer que enterremos os olhos de meu filho, para que nasça uma fruteira, que será
nossa felicidade”.
Assim foi feito. Os índios plantaram os olhinhos da criança imediatamente, conforme
o desejo de Tupã, o rei do trovão.
Alguns dias se paçaram e no local nasceu uma plantinha que os índios ainda não
conheciam. Era o guaranazeiro. É por isso que os frutos do guaraná são sementes negras
rodeadas por uma película branca, muito semelhante a um olho humano. Agora, diz aí,
quem não gosta de guaraná?
(Lendas Amazônicas)

Os exercícios propostos na atividade 1 busca corrigir uma dificuldade referente a


uma propriedade regular direta: o uso do fonema /s/. Embora nessa propriedade haja uma
regularidade entre som e letra, o aluno pode realizar uma troca porque tem alguma
dificuldade em reconhecer os termos a serem preenchidos.
No que se refere à atividade 2, o aluno tem a possibilidade de perceber que a troca
de uma letra por outra gera uma palavra com um erro ortográfico. Ressalta-se, entretanto,
que a atividade só poderá render bons resultados se duas condições forem atendidas:
primeiro, a questão ortográfica precisa tornar-se objeto de reflexão, ou seja, o professor
precisa refletir com o aluno sobre o que acontece quando as trocas são realizadas, pois do
contrário, o exercício continuará sendo numa prática mecânica que em nada renderá ao
aluno.
Os exercícios propostos para o aluno procuram dar conta de dois casos
diferenciados de dificuldades ortográficas: a primeira atividade se refere a uma
dificuldade regular contextual e a segunda a um a dificuldade irregular. Embora sejam
casos bem diferentes,
Propôs-se ao aluno um mesmo tipo de atividade: o preenchimento de lacunas.
Primeiramente, solicitaríamos aos alunos que efetuem a leitura silenciosa da lenda;
em seguida, o professor poderia solicitar e explorar a leitura em voz alta. Com isso, os
alunos teriam a oportunidade de identificar na primeira leitura as mudanças nas palavras
do texto e verificando o porquê da estranheza de algumas delas, principalmente em uma
leitura rápida. Além de aperfeiçoar e dinamizar o estudo com o grupo em questão pode-se
solicitar ainda que, a partir de um determinado texto, o aluno realize a troca de uma letra
por outra e reflita se a troca resultou em alguma diferença, se a partir da troca a palavra se
parece com o vocábulo que ele costumava ter contato, podendo ainda ter o auxílio de um
dicionário para tirar as dúvidas que ainda persistam.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

A língua portuguesa precisa ser vista e ampliada de uma forma mais plena no
processo de ensino dos alunos, ensinando-lhes não a obrigatoriedade de aprender, mas a
consciência de saber escrever, falar e a ler corretamente, fazendo desse ato uma
constituição cidadã de si próprio, adquirindo o saber por valor e consciência.
Conforme se discutiu ao longo do presente artigo, uma das tarefas da escola é criar
condições para que o aluno construa seu conhecimento de forma investigativa e crítica.
Em relação ao trabalho com a ortografia, cabe à escola favorecer a explicitação dos
conhecimentos dos alunos sobre as restrições da norma ortográfica. Além disso, a escola
precisa propiciar atividades diversas e criativas nas quais os alunos não respondam as
atividades de modo automático ou mecânico.
Para tanto, o aluno precisa ser estimulado a inferir sobre o porquê das notações
corretas. Assim, cabe à instituição escolar assumir a responsabilidade de promover uma
aprendizagem adequada e explícita dos aspectos inerentes à notação escrita do português,
aspectos esses que o indivíduo precisa conhecer para ter êxito em ortografia (MORAIS,
2005).
Por fim, há necessidade de que se tenha a presença constante, na escola, de
atividades sistemáticas de ensino e aprendizagem de ortografia, bem como o uso de
metodologias adequadas, como a de solicitar a produção de textos espontâneos aos alunos
e que tais textos passem por uma correção e respectiva relação dos problemas levantados.
Dessa forma, o aluno passa a ser estimulado a revisar constantemente o que produz,
a refletir acerca das convenções ortográficas e, assim, passa a ter consciência da
importância de se autocorrigir e, principalmente, de se colocar no papel de “leitor” de seu
próprio texto.
REFERÊNCIAS

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: língua


portuguesa /Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília, 1997.
BATISTA, A. A. G. Aula de Português – Discurso e saberes escolares. São Paulo,
Martins Fontes, Cap. 2, 1997.
BAGNO, Marcos. Linguística da Norma. São Paulo: Edições Loyola, 2012.
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização & Linguística. São Paulo: Scipione, 1997.
MORAIS, Artur Gomes de. Ortografia: ensinar e aprender. São Paulo: Ática, 2001.
PERINI, M. A. Sofrendo a gramática: ensaios sobre a linguagem. São Paulo: Ática,
1997.
SILVA, Maurício (org). Ortografia da língua portuguesa: história, discurso e
representações. São Paulo: Contexto, 2009
TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática - Ensino Plural. São Paulo: Ed. Cortez, 2003.
.

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