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RESUMO
A temática da pesquisa relacionou-se à História e cultura indígena e foi realizada com os alunos do 6º
Ano do Colégio Estadual Douradina – EMF. Esse trabalho objetivou apresentar alguns aspectos da
história e cultura dos Xetá que viviam na região Serra dos Dourados antes da vinda dos
colonizadores, hoje município de Douradina-PR. Mesmo depois da implementação da lei 11.645/08
no âmbito escolar sobre a história e cultura indígena, os livros didáticos tendem a abordar a
participação dessas sociedades em função do colonizador, sem tratá-los como sujeitos da sua própria
história. Essa representação reforça a tendência etnocêntrica e vitimista de grande parte da
historiografia que trata os povos indígenas como seres primitivos, selvagens, inferiores e sem
autonomia. Para desmistificar alguns desses preconceitos encontrados nos relatos do século XIX
sobre os Xetá foram problematizados com os alunos os conceitos de cultura, primitivismo e
etnocentrismo a partir das representações que os alunos possuíam sobre os índios. Foram realizadas
várias atividades com destaque para a análise de fontes, documentários/vídeos, debate sobre
preconceito, visita a exposição de imagens dos índios Xetá e da formação do município na biblioteca
pública municipal, recolha de informações sobre o cotidiano das remanescentes Xetá que residem em
Douradina. Essas atividades possibilitaram aos discentes compreenderem que os Xetá fazem parte
da história local. Muitas das características culturais e sociais dos tempos coloniais sofreram
modificações em virtude da própria capacidade e/ou necessidade de readaptação dos Xetá a
sociedade nacional em formação.
ABSTRACT
The research theme was related to the History and indigenous culture and was carried out with the
students of the 6th Year of the Douradina State College - EMF. This work aimed to present some
aspects of the history and culture of the Xetá who lived in the Serra dos Dourados region before the
arrival of the colonizers, now municipality of Douradina-PR. Even after the implementation of Law
11.645 / 08 in the school context on indigenous history and culture, textbooks tend to approach the
participation of these societies in the function of the colonizer, without treating them as subjects of
their own history. This representation reinforces the ethnocentric and victimistic tendency of much of
the historiography that treats indigenous peoples as primitive, savage, inferior and non-autonomous
beings. In order to demystify some of these prejudices found in the nineteenth-century accounts of the
Xetá, the concepts of culture, primitivism and ethnocentrism were discussed with the students from the
representations that the students had about the Indians. A number of activities were carried out with
emphasis on the analysis of sources, documentaries / videos, debates on prejudice, visits to Xetá
Indians and the formation of the municipality in the municipal public library, gathering information on
1. INTRODUÇÃO
Este artigo tem como objetivo apresentar o projeto de intervenção que foi
desenvolvido durante o ano de 2016 e aplicado no primeiro semestre de 2017.
Trata-se de uma experiência que faz parte do Programa de Desenvolvimento
Educacional (PDE), como uma ação da política de formação continuada dos
professores da rede pública de ensino do Paraná, proposto pela Secretaria Estadual
de Educação em parceria com a Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e
Ensino Superior.
O trabalho foi promovido pela inclusão da história e da cultura afro-brasileira e
indígena nos currículos da Educação básica brasileira, através da promulgação das
Leis 10.639/03 e 11.645/08, de crucial importância, pois objetivam não apenas
mudar um foco etnocêntrico, mas sim ampliar o enfoque dos currículos escolares
brasileiros para a diversidade cultural, racial e social, buscando assim reparar danos,
que se repetem há cinco séculos, à sua identidade e a seus direitos.
Durante muitos anos, a cultura indígena pouco foi trabalhada nas escolas e
nos livros didáticos, há poucas gravuras e textos que poderiam auxiliar na discussão
sobre os índios, visto que, muitos autores retratam os indígenas como indivíduos
que viviam em condições de barbárie e atraso. Esta forma de abordagem da cultura
indígena contribuiu para que os alunos assumam atitudes discriminatórias em
relação aos povos indígenas.
Para tentar desfazer muitos desses preconceitos foram realizadas as
seguintes reflexões: problematização dos conceitos de cultura, de primitivismo e de
etnocentrismo com os alunos do 6º ano para contribuir na compreensão da história
dos índios Xetá e o processo de perca dos seus territórios. Verificou-se quais as
representações que apareceram nos relatos dos encontros dos Xetá com os
conquistadores. Refletiu-se sobre o conceito de cultura em conjunto com os alunos
de forma mais complexa e abrangente para que eles tenham a possibilidade de
agregar um maior domínio sobre o conceito. Foram realizadas atividades que
colaboraram na reflexão e na possibilidade de modificar visões desvirtuadas que os
alunos possuíam em relação aos indígenas. Recuperou-se parte da história do
município de Douradina e ressaltou-se a participação dos índios Xetá na construção
histórica/cultural da região. Operacionalizou-se a reflexão dos conceitos ao
correlacionar a temática indígena Xetá com as atividades didáticas e com fontes
documentais, midiáticas ou orais.
Foram colhidas algumas informações com duas índias remanescentes que
vivem no município de Douradina que enriqueceram as reflexões junto aos
discentes. Atualmente, duas índias Xetá residem em Douradina. Uma delas é Maria
Rosa do Brasil Tiguá que foi criada desde criança pelo Sr. Freitas, e vive hoje com
sua filha Indianara do Brasil Tiguá e três netos. A outra índia que vive em Douradina
é Ana Maria Tiguá, que foi criada pela filha do Sr. Freitas e mora com seu filho Paulo
Sergio Ferreira.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO
Uma grande parte dos pesquisadores afirma que os primeiros homo sapiens-
sapiens da América, tiveram suas origens no continente africano, e em algum
momento migrou para o continente americano, através do estreito de Bering, no
extremo norte do continente.
Coforme Mota (2008) as populações que viveram no Paraná entre 12.000 mil
a 3.000 anos antes do presente (AP) são denominados pela arqueologia de
caçadores e coletores pré- cerâmicos: Humaitá, Umbu, Sambaqui. Elas foram
substituídas pelas populações indígenas agricultores e ceramistas- Kaingang,
Xokleng, Guarani e Xetá, a partir da sua chegada na região por volta de 3.000 anos
AP e continuam a viver aqui até hoje.
As populações que se sucederam nesse prolongado espaço de tempo eram
culturalmente diversificadas. Utilizavam tecnologia própria, que se diferenciavam das
demais. A intensificação da colonização do território paranaense, principalmente a
partir da Emancipação Política, colocou em pauta a questão da ocupação dos
espaços destinados a cada grupo que chegava e, por outro lado, promovia o
deslocamento dos povos indígenas para áreas cada vez mais distantes, ou
chamadas vazios demográficos, forjando a invisibilização dos grupos indígenas.
2.1.1 Os Xetá
Embora o primeiro contato direto dos Xetá com os brancos tenha se dado
oficialmente em 1954, as evidências de sua presença na região já eram registradas
pelas frentes de colonização desde o final da década de quarenta. Na ocasião, em
1949, e posteriormente em 1951, a 7ª Inspetoria Regional do Serviço de Proteção
aos Índios (SPI), com sede em Curitiba, enviou funcionários ao local no intuito de
que o grupo fosse localizado. Porém, nenhum dos enviados alcançou êxito em sua
missão, apesar de haverem comprovado a presença indígena no local através de
diferentes vestígios, como por exemplo, aldeias recém abandonadas e objetos de
cultura material. Em 1952, dois meninos índios foram capturados por agrimensores
que atuavam na região e levados para Curitiba, onde foram criados pelo inspetor do
SPI (SILVA, 1999).
Em 1954, assolados pela fome, em virtude das fortes geadas terem destruído
os palmitos e outras espécies vegetais que lhes serviam de alimento, um grupo de
índios emergiu da densa floresta para tentar estabelecer o primeiro contato com
brancos que viviam na fazenda Santa Rosa (FERNANDES, 1959).
Como medida de proteção, os índios deixaram alguns dos seus companheiros
cuidando das mulheres e das crianças, enquanto outros deles, em pontos
estratégicos, observam à distância, no intuito de resguardá-los do possível ataque
daqueles homens estranhos, que vestiam roupas e tinham pelos no corpo.
Demonstrando que estavam em missão de paz, escondem seus arcos e flechas na
mata e rumam em direção a Fazenda, que pertencia ao deputado estadual Antônio
Lustosa de Oliveira, e havia sido instalada em 1952 nas imediações do córrego do
Peroba, afluente da margem direita do Indoivaí, próximo às atuais cidades de
Douradina e Ivaté, região também conhecida como Serra dos Dourados, no noroeste
do estado do Paraná. Neste local, os indígenas que mais tarde viriam a ser
denominados Xetá, estabelecem o primeiro contacto com brancos, através do
administrador da propriedade, Antônio Lustosa de Freitas, e de seus familiares
(MARANHÃO, 2012).
A partir de 1955, o departamento de pesquisa da Universidade Federal do
Paraná, juntamente com o SPI, organizou várias expedições na região, tomando
como ponto de referência a Fazenda Santa Rosa, coordenada pelo professor e
antropólogo José Loureiro Fernandes, que contou com a ajuda do Sr. Antônio
Lustosa de Freitas, para tentar manter contato com os Xetá e descobrir como eram
os costumes e como vivia esse grupo indígena. O cineasta tcheco Vladimir Kozák
efetuou registros destes índios através de filmes, fotografias e desenhos, os quais
constituem acervo do Museu Paranaense (MARANHÃO, 2012).
Os funcionários do SPI, alguns professores da Universidade Federal do
Paraná e outros defensores dos índios, acreditavam que a única solução para a
preservação da etnia Xetá seria a criação da Reserva Florestal da Serra dos
Dourados. Ainda em 1955, o deputado Antônio Lustosa de Oliveira, também
proprietário da Fazenda Santa Rosa, propôs a criação de uma reserva florestal
estadual com um local reservado aos Xetá. A área então indicada para reserva
abrangeria uma parte do território tradicional Xetá. A proposta, mesmo aprovada
pela Assembléia Legislativa, foi vetada pelo Governador do Estado do Paraná,
Moysés Lupion, sob a justificativa de que o estado não dispunha de terras (SILVA,
1999).
Mais tarde em 30 de maio de 1961, foi instituído o Decreto Presidencial n.°
50665 que criou na região de Guaíra, o Parque Nacional de Sete Quedas, para onde
seriam agrupadas tribos indígenas de etnias diferentes. Por ser uma região distante
da origem dos índios Xetá, a tribo permaneceu na Serra dos Dourados, que passou
a pertencer aos cafeeiros (SILVA, 1999).
Aos poucos, os Xetá foram contaminados por doenças transmitidas pelos
colonizadores, as mortes foram provocadas por intoxicação alimentar,
envenenamentos, doenças infectocontagiosas como gripe, sarampo e pneumonia,
extermínio com armas de fogo e queimas de aldeias, rapto de crianças, entre outras
ações dos invasores de seu território de origem (SILVA, 1999).
Daqueles Xetá que evitaram a aproximação com os brancos não se teve mais
notícias a partir de 1961. Apesar da luta dos indigenistas Deocleciano de Souza
Nenê, Dival José de Souza e Durval Antunes Machado, do professor Loureiro
Fernandes, dos sertanejos Antonio de Freitas e Pedro Nunes, do deputado Antônio
Lustosa de Oliveira, o grupo de cerca de 250 índios foi praticamente dizimado.
(SILVA, 1999).
Conforme Silva (1999) os trágicos efeitos da política colonizadora do governo
do estado do Paraná na região da Serra dos Dourados somada à omissão e
negligência do SPI, no que tange à sua competência enquanto órgão de assistência
e proteção aos povos indígenas resultou na perda do território tradicional Xetá e na
extinção da sociedade, da qual sobreviveram apenas alguns indivíduos. Sua
organização sociocultural foi quase que totalmente destruída, e seus sobreviventes
vivem hoje dispersos em meio às outras etnias, desterritorializados e distantes do
convívio cotidiano de sua etnia.
Maranhão (2012), antropóloga do Museu Paranaense relata que a os Xetá
são vítimas do extermínio gerado pela expansão cafeeira e desaparecem do cenário
paranaense. Sobreviveram alguns indivíduos (crianças e jovens), transferidos do seu
território, retirados do convívio de seus familiares e de seu referencial cultural,
criados por famílias brancas que habitavam diferentes pontos do estado do Paraná,
e encaminhados a alguns a postos indígenas. Os últimos seis remanescentes Xetá,
e seus descendentes, únicos considerados genuinamente paranaenses, anseiam
por reunirem-se novamente em território próprio. De acordo com a Fundação
Nacional do Índio, a Terra Indígena Xetá encontra-se atualmente em processo de
demarcação pelo Governo Federal.
Mota (2013) escreve em seus relatos que os Xetá falavam uma língua
semelhante a Guarani, e suas principais características era a utilização do tembetá,
(um adorno lábia)l inserido nos meninos, e, pelos brincos de penas de pássaro
utilizadas como enfeites. Usavam cabelos compridos, suas vestimentas eram tecidas
com fibras de ortiga brava, costumavam dormir ao relento, sobre esteiras
posicionadas em torno de uma fogueira central, e viviam somente da caça e coleta
de frutas, raízes e vegetais. Faziam parte da dieta Xetá algumas espécies de
insetos, como besouros, pirilampos e larvas, obtidos de troncos apodrecidos de
palmeiras. Estas iguarias eram consumidas após serem tostadas sobre a brasa.
Os pequenos abrigos denominados tapuy (casa) que comportavam de quatro
a seis pessoas, eram utilizados somente como proteção para o sol, a chuva ou o
frio.
Na obra de Mota (2013) encontra-se descritos vários costumes, quando do
encontro dos colonizadores com os Xetá, estudados com os alunos para posterior
comparativo com as práticas cotidianas atuais das remanescentes Xetá.
3. DISCUSSÕES SOBRE A IMPLEMENTAÇÃO DO PROJETO
Índia Xetá Maria Rosa do Brasil Tiguá em sua residência em Douradina. Fonte: Arquivo Pessoal
Índias Xetá: Ana Maria e Maria Rosa Brasil Tiguá. Fonte: Arquivo pessoal.
Depois dessa conversa foi feito um comparativo com a história dos Xetá nos
tempos coloniais, as mudanças que ocorreram por conta desse contato e da sua
capacidade de readaptação social e cultural.
Como elas já têm mais de 60 anos e saíram da aldeia ainda crianças e foram
criadas por famílias não indígenas, pouco podiam relatar da cultura Xetá. Elas
recordam de sua infância na aldeia que se comiam frutas como jabuticaba, gabirova
e ingá. Comiam carne de animais que os homens caçavam no mato e usavam os
remédios produzidos com plantas colhidas da mata. Relataram que quando o
alimento acabava eles caminhavam em busca de outro lugar para suprir suas
necessidades.
Segundo as Xetá, por viverem no meio da mata, os índios tinham
conhecimento sobre qual era a madeira ideal para fazer seu arco e flecha, lembram
que a madeira tinha que ser flexível, mas elas não sabem o nome desta madeira. A
banana e a mandioca que se pensava que eles plantavam, elas disseram que não
conheciam, vieram a conhecer com as famílias que as adotaram.
Os trabalhos artesanais delas se resumem a fazer crochê já que não
aprenderam a fazer nada do artesanato indígena. Elas possuem moradias como
qualquer outro munícipe de Douradina. Não contaram a ninguém que eram
descendentes dos Xetá, por isso ninguém as reconhece como descendentes de
índios. Como foram criadas pelos brancos não há traços dos costumes da aldeia na
sua vida cotidiana.
Foi bem positivo quando elas disseram que não gostam que afirmem que só
há seis remanescentes dos índios Xetá na região. Elas querem que seus netos
sejam reconhecidos como Xetá. Para elas também é importante que se comente da
existência de aproximadamente mais de sessenta descendentes de Xetá em
Laranjeiras do Sul. Foi perguntado o que elas acham da afirmação de que os índios
estão em extinção. Elas comentaram que não gostam de ouvir isso porque o índio
não é animal para estar em extinção.
Essas afirmações vieram a colaborar com os comentários dos participantes
do GTR que afirmaram que o projeto levaria o aluno a perceber que o índio não é só
aquele apresentado pela mídia e reconhecerem que antes dos colonizadores
europeus havia outros povos habitando essas terras.
A participação do pessoal no GTR foi muito boa, com atividades que
abordavam a temática e contribuiu no auxilio do conhecimento em relação à história
da localidade. Ampliou o conhecimento dos alunos, fazendo-os compreenderem
como ocorreu o processo de desterritorialização feito pelas colonizadoras que
dizimaram toda uma cultura e um povo chamado Xetá.
4. CONCLUSÃO
extraclasse. Um dos principais objetivos era fazer com que o aluno compreendesse
como ocorreu o processo de desterritorialização dos Xetá. Além disso, perceber que
5. REFERÊNCIAS
CUNHA, M. C. da. História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das
Letras: Secretaria Municipal da Cultura: FAPESP, 1992.
FERNANDES, J. L. Os índios da Serra dos Dourados: os Xetá. In: REUNIÃO
BRASILEIRA DE ANTROPOLOGIA (3a., 1959, Recife-PE). Anais. s.l. : s.ed., 1959,
p. 27-46.
LARAIA, R. B. de. Cultura: um conceito antropológico. 18ª ed. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Ed., 2005.
_________. Os Xetá no vale do Rio Ivaí 1840- 1920 – Maringá: Eduem, 2013.