Você está na página 1de 32

Faculdade

de Ciências Econômicas
UFRGS

econõmiCQ
nesta edição:

P I E R O S R A F F A : 1 8 9 8 - 1983
Nicholas Kaldor

A BUSCA DOS
FUNDAMENTOS,
SEM CHOQUES
Y e d a Rorato C r u s i u s

ESTADO E ACUMULAÇÃO
DO CAPITAL
Paulo Nakatani

ABASTECIMENTO
ALIMENTAR
BRASILEIRO
Edgar Irio S i m m

POLÍTICA
RIOGRANDENSE NA
REPÚBLICA VELHA
Céli R e g i n a J . Pinto

ano 5
R E I T O R : Prof. Francisco Ferraz
D I R E T O R D A F A C U L D A D E DE C I Ê N C I A S E C O N Ô M I C A S :
Prof. Edgar Irio S i m m
V I C E - D I R E T O R : Prof. Walter Meucci Ñique
C H E F E D O D E P A R T A M E N T O DE C I Ê N C I A S E C O N Ô M I C A S :
Prof. Ernani H i c k m a n n

CONSELHO EDITORIAL:
Prof. Pedro Cezar D u t r a Fonseca (Presidente)
Prof. A c h y l e s Barcelos da Costa
Prof. Carlos A u g u s t o Crusius
Prof. Claudio Francisco Accurso
Prof. Edgar A u g u s t o Lanzer
Prof. Ernani Hickmann
Prof. Juvir Mattuella
Prof. João Rogério Sansón
Prof? Maria I m i l d a da Costa e Silva
Prof. N a l i d e Jesus d e S o u z a
Prof. N u n o R e n a n L. d e F i g u e i r e d o P i n t o
Prof? Otilia Beatriz K r o e f f Carrion
Prof? Yeda R o r a t o Crusius
Prof. Paulo A l e x a n d r e S p h o r
Prof. R o b e r t o Camps Moraes
FUNDADOR:
P r o f . A n t o n i o C a r l o s Rosa

A N Á L I S E E C O N Ô M I C A p u b l i c a d o i s n ú m e r o s a n u a i s n o s meses
d e m a r ç o e n o v e m b r o . O p r e ç o da a s s i n a t u r a p a r a 1 9 8 7 é
C z $ 6 0 , 0 0 , a ser p a g o a t r a v é s de c h e q u e n o m i n a l p a r a " F a c u l d a d e
d e C i ê n c i a s E c o n ô m i c a s — U F R G S " . A c e i t a - s e p e r m u t a c o m revis-
tas congêneres. Aceitam-se, t a m b é m , livros para elaboração d e
resenhas o u recensões.

T o d a a c o r r e s p o n d ê n c i a , m a t e r i a l p a r a p u b l i c a ç ã o , assinaturas e
p e r m u t a s d e v e m ser d i r i g i d a s a :
Prof. P E D R O C E Z A R D U T R A F O N S E C A
Revista Análise E c o n ô m i c a
A v . J o ã o Pessoa, 5 2 — 3 ? a n d a r
9 0 . 0 0 0 - P o r t o A l e g r e ( R S ) - Brasil
ESTADO E ACUMULAÇÃO DO
CAPITAL.
DISCUSSÃO SOBRE A TEORIA
DA DERIVAÇÃO
PAULO NAKATANI*

I - INTRODUÇÃO

Dispõe-se, a t u a l m e n t e , d e i n ú m e r o s t r a b a l h o s n o s q u a i s se c r i -
t i c a a c o n c e p ç ã o d o E s t a d o c o m o a l g o e x t e r n o a o c a p i t a l o u à so-
c i e d a d e c i v i l . E s t a , o p õ e o E s t a d o à s o c i e d a d e cFvil o u o E s t a d o a o
C a p i t a l . E m seus e x t r e m o s , c o l o c a m o E s t a d o c o m o a l g o a c i m a d a
s o c i e d a d e e das classes s o c i a i s , c o m o u m " d e u s e x - m a c h i n a " ; o u
c o m o sinriples i n s t r u m e n t o d a classe d o m i n a n t e E m a m b o s os ca-
sos, o E s t a d o é c o n s i d e r a d o c o m o n e u t r o , u m a casca v a z i a , c u j a
n a t u r e z a v a r i a s e g u n d o o c o n t e ú d o q u e n e l a se i n t r o d u z a . A grosso
m o d o , estas c o n c e p ç õ e s são as d a t e o r i a b u r g u e s a p o r u m l a d o , e
das i n s t r u m e n t a l i s t a s , p o r o u t r o .
No p r i m e i r o caso, o Estado aparece o u é c o n s i d e r a d o como
i n s t i t u i ç ã o acima d o capital e da sociedade, t o d o poderoso, por-
t a n t o , com autonomia total. Esta c o n c e p ç ã o c o l o c a o E s t a d o a c i -
m a da lei d o v a l o r , a q u a l p o d e m o d i f i c a r . M o d i f i c a r n o s e n t i d o e m
q u e a i n t e r v e n ç ã o e s t a t a l seja u m i n s t r u m e n t o c a p a z d e s u p r i m i r
as c o n t r a d i ç õ e s p r ó p r i a s ao c a p i t a l i s m o , s e m e x i g i r a e l i m i n a ç ã o
do capital.
No segundo caso, o Estado é considerado i n s t r u m e n t o do
grupo, classe o u f r a ç ã o d e classe n o p o d e r . Esta t e o r i a e x p r i m e a
i d é i a , na q u a l o E s t a d o p o d e ser u t i l i z a d o s e g u n d o o s interesses
d a q u e l e s q u e d e t ê m seu p o d e r . N a s o c i e d a d e c a p i t a l i s t a c o n t e m p o -
r â n e a , o E s t a d o é c o n t r o l a d o pelas f r a ç õ e s m o n o p o l i s t a s d o c a p i -
tal. I s t o s i g n i f i c a q u e é c o m p l e t a m e n t e d o m i n a d o , s u b m i s s o a es-
t a p a r c e l a d o c a p i t a l ; p o r t a n t o , sem nenhuma autonomia. A for-
mulação principal destas t e o r i z a ç õ e s c o l o c a que o aparelho de
«
Professor do Departamento de Economia e Finanças e do IVIestrado em Economia da
Universidade Federai da Paraíba,Campus II — Campina Grande.

ANALISE ECONÔMICA ANO 5 N"8 MARÇO/87 p. 35-64


Estado é d o m i n a d o e/ou c o n t r o l a d o p o r i n d i v í d u o s pertencentes
o u e m e s t r e i t a ligação c o m a f r a ç ã o d o c a p i t a l q u e se t r a n s f o r -
m o u e m m o n o p o l i s t a . Isto p e r m i t e a este g r u p o u t i l i z a r o E s t a d o
s e g u n d o suas necessidades. E n f i m , esta c o n c e p ç ã o i m p l i c a e m q u e
o E s t a d o c o m o u m i n s t r u m e n t o , serve a o g r u p o n o p o d e r , ^ p a r a rea-
l i z a r seus o b j e t i v o s de classe; i n v e r s a m e n t e , o p r o l e t a r i a d o p o d e r i a ,
e m se a p o s s a n d o deste a p a r e l h o , d i r i g i - l o p a r a a r e a l i z a ç ã o d e seus
o b j e t i v o s d e classe
A c r í t i c a a estas c o n c e p ç õ e s leva-nos à p r o p o s i ç ã o na q u a l a
r e l a ç ã o E s t a d o / c a p i t a l d e v e ser o r g â n i c a . Isto q u e r d i z e r q u e n ã o
e x i s t e " s e p a r a ç ã o " e n t r e o E s t a d o e o c a p i t a l ; q u e as relações en-
t r e eles n ã o são s o m e n t e relações d e e x t e r i o r i d a d e .
U m a destas c o r r e n t e s e m o p o s i ç ã o às análises baseadas n o
c o n t e ú d o do Estado, fundamenta-se no estudo da FORMA
E S T A D O . Esta análise d e d u z ( d e r i v a ) a F o r m a E s t a d o das c o n t r a -
d i ç õ e s da d i n â m i c a d o c a p i t a l , na q u a l , a n a t u r e z a d e s t a r e l a ç ã o
c o n f e r e a o E s t a d o sua n a t u r e z a c a p i t a l i s t a .

II - A ESCOLA D A D E R I V A Ç Ã O : ALGUMAS
CONTRIBUIÇÕES

A t e o r i a da derivação não c o n s t i t u i , e x a t a m e n t e , u m c o n -
j u n t o t e ó r i c o a c a b a d o . A p r e s e n t a - s e s o b f o r m a de d e b a t e , n o q u a l
a p a r e c e u m a série d e c o n t r i b u i ç õ e s , d e n t r e as q u a i s e s c o l h e m o s
a l g u m a s c o m o base d e nosso e s t u d o .
H o l l o w a y & P i c c i o t t o ( 1 9 8 0 : p.36) c o n s i d e r a m q u e " . . . po-
d e m o s d i s t i n g u i r duas o r i e n t a ç õ e s gerais - o u t a l v e z três - q u e não
se c o n s t i t u e m , e n t r e t a n t o , e m p o s i ç õ e s d e f i n i t i v a s " .
A p r i m e i r a d e r i v a " . . . a necessidade d a f o r m a E s t a d o c o m o
i n s t i t u i ç ã o s e p a r a d a , a p a r t i r das relações e n t r e os c a p i t a i s i n d i v i -
d u a i s ( p . 3 6 ) " ; a s e g u n d a insiste " . . . s o b r e a necessidade d e f u n -
d a m e n t a r a análise d o E s t a d o s o b r e as f o r m a s d e a p a r i ç ã o das re-
lações c a p i t a l i s t a s na s u p e r f í c i e d a s o c i e d a d e e, não s o b r e a n a t u r e
z a essencial d o c a p i t a l ( p . 4 1 ) " ; e a t e r c e i r a , . . sustenta que a
f o r m a p a r t i c u l a r d o E s t a d o d e v e ser d e r i v a d a n ã o d a necessidade
de estabelecer o interesse geral e m u m a s o c i e d a d e a n á r q u i c a , mas
d a n a t u r e z a das relações sociais d e d o m i n a ç ã o da s o c i e d a d e c a p i -
talista ( p . 4 3 ) " .
N ã o p r e t e n d e m o s seguir e s t u d a n d o c a d a u m a destas o r i e n -
t a ç õ e s ; p r e f e r i m o s r e a l i z a r o e s t u d o d e a l g u n s t e x t o s e, t e n t a r
e x t r a i r deles o p r o c e d i m e n t o e x a t o d e d e r i v a ç ã o d o E s t a d o . A
e s c o l h a d o s t e x t o s f o i a r b i t r á r i a , e m f u n ç ã o d e sua d i s p o n i b i l i -
d a d e , mas n ã o m e n o s s i g n i f i c a t i v a . D e s t a m a n e i r a t o m a m o s c o m o
p o n t o de p a r t i d a os t e x t o s d o s s e g u i n t e s a u t o r e s : E l m a r A í t v a t e r ,
Margaret W i r t h , J o a c h i m Kirsch e Pierre Salama

7. Elmar Aítvater

Este a u t o r p a r t e d a d i s t i n ç ã o e n t r e c a p i t a l e m geral e c a p i -
t a i s i n d i v i d u a i s ( q u e ele c h a m a d e m ú l t i p l a s u n i d a d e s d e c a p i t a l ) ;
O c a p i t a l e m geral t e m e x i s t ê n c i a real c o m o o c a p i t a l social
total Neste n í v e l , n ã o se c o n s i d e r a m as c o n d i ç õ e s c o n c r e t a s d e
sua e x i s t ê n c i a , c o m o a c o n c o r r ê n c i a e n t r e o s c a p i t a i s e o s i s t e m a
de c r é d i t o . A m a n i f e s t a ç ã o c o n c r e t a d o capital e m geral, apresen-
ta-se s o b f o r m a d e m ú l t i p l a s u n i d a d e s ; são os c a p i t a i s i n d i v i d u a i s .
Esta d i s t i n ç ã o p e r m i t e s e p a r a r a q u i l o q u e p o d e r í a m o s c h a m a r
d e " i n t e r e s s e d o c a p i t a l e m g e r a l " e " o s interesses das u n i d a d e s d e
c a p i t a l " . . A r e a l i z a ç ã o d o s interesses das u n i d a d e s d e c a p i t a l refle-
te-se p o r " s u a s i n t e r a ç õ e s , as c o n d i ç õ e s m é d i a s d e e x p l o r a ç ã o , mes-
m a t a x a de mais valia, mesma t a x a de l u c r o m é d i o ( A í t v a t e r , 1 9 7 5
p . 1 3 7 ) " ; e n t r e t a n t o , esta r e a l i z a ç ã o apresenta-se c o m o c o n t r a d i t ó -
ria à r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l e m g e r a l .
Aítvater (p.137) considera que, " n a t u r a l m e n t e é ao nível do
c o n c e i t o de c a p i t a l e m geral q u e se m a n i f e s t a a f o r m a na q u a l as
leis gerais ( c o m o t e n d ê n c i a s ) d o M o d o de P r o d u ç ã o C a p i t a l i s t a se
r e a l i z a m , f o r a e e m r e a ç ã o às o p e r a ç õ e s das u n i d a d e s d e c a p i t a l .
Esta f o r m a é a c o n c o r r ê n c i a , na q u a l se r e v e l a m as leis i m á n e n l e s
e i n e x o r á v e i s d a p r o d u ç ã o c a p i t a l i s t a . A c o n c o r r ê n c i a n ã o é, e n -
t r e t a n t o , o a s p e c t o p r i n c i p a l " . Para e l e , o p r i n c i p a l é a e x i s t ê n c i a
d e a t i v i d a d e s q u e n ã o p o d e m ser realizadas pelas u n i d a d e s d e
c a p i t a l . E x p r i m e estas idéias n o s s e g u i n t e s t e r m o s : " o u b e m a p r o -
d u ç ã o de c e r t a s c o n d i ç õ e s m a t e r i a i s d e p r o d u ç ã o n ã o p r o d u z e m
l u c r o s , o u b e m c e r t a s r e g u l a ç õ e s estão e m c o n d i ç õ e s d a d a s m u i t o
gerais p a r a q u e p o s s a m ser r e a l i z a d a s pelas u n i d a d e s d e c a p i t a l ,
l i m i t a d a s p o r seus interesses p a r t i c u l a r e s ( p . 1 3 7 ) " . .
Desta m a n e i r a , é a existência de u m t i p o de a t i v i d a d e (que
n ã o p o d e ser e x e c u t a d a p o r u m a u n i d a d e d e c a p i t a l ) q u e t o r n a o
E s t a d o necessário. A s s i m o E s t a d o é u m a instituição especial que
escapa às r e s t r i ç õ e s d e r e p r o d u ç ã o , às q u a i s estão s u b m e t i d o s os
capitais individuais.
E m o u t r o s t e r m o s , a r e a l i z a ç ã o d o s interesses d e c a d a u n i d a -
d e d e c a p i t a l , t o r n a - s e c o n t r a d i t ó r i o à realização d o interesse d o
c a p i t a l e m g e r a l . É p o r esta r a z ã o q u e os E s t a d o t o r n a - s e necessá-
r i o , p o i s " e x p r i m e interesse geral d o c a p i t a l ( p . 1 3 8 ) " . Mas i s t o n ã o
i m p l i c a na e l i m i n a ç ã o da " a n a r q u i a d o m e r c a d o (...) o E s t a d o n ã o
se s u b s t i t u i à c o n c o r r ê n c i a " ; m a s assegura " a s bases f u n d a m e n t a i s
d e e x i s t ê n c i a d a classe o p e r á r i a , e n q u a n t o o b j e t o d e e x p l o r a ç ã o ,
c r i a as c o n d i ç õ e s gerais d a p r o d u ç ã o e, i n c l u s i v e , as relações j u r í -
d i c a s . C o n t r a r i a m e n t e ao c a p i t a i q u e , p o r ele m e s m o , é i n c a p a z
d e p r o d u z i r estes f u n d a m e n t o s ( p . 1 3 9 ) " .
P o d e m o s r e s u m i r suas ideias d a s e g u i n t e m a n e i r a :
1? — a contradição entre a reprodução dos capitais indivi-
d u a i s e a r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l e m g e r a l , e x i g e a p r o d u ç ã o d e cer-
t a s c o n d i ç õ e s gerais p a r a a r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l ;
2 ? — a p r o d u ç ã o destas c o n d i ç õ e s gerais n ã o p o d e ser realiza-
d a p e l o s c a p i t a i s i n d i v i d u a i s p r e s s i o n a d o s p e l a caça ao l u c r o ;
3 ? — é necessário u m a i n s t i t u i ç ã o especial capaz d e p r o d u z i r
estas c o n d i ç õ e s gerais e q u e não esteja s u b m e t i d a às m e s m a s res-
trições;
4 ? - esta i n s t i t u i ç ã o é o E s t a d o , q u e , p a r a r e a l i z a r as c o n d i -
ç õ e s gerais, deve ser i n d e p e n d e n t e d a s o c i e d a d e b u r g u e s a e supe-
r i o r a ela.
Mais precisamente, A I t v a t e r sublinha que á sobre a " c r i a ç ã o
das c o n d i ç õ e s gerais d e p r o d u ç ã o " q u e r e p o u s a a a u t o n o m i a d o
Estado.
V e j a m o s , a g o r a , o q u e é q u e ele c o n s i d e r a c o m o c o n d i ç õ e s
gerais d e p r o d u ç ã o . Q u a n d o ele d e f i n e as f u n ç õ e s d o E s t a d o , a f i r -
m a q u e " Q s processos p r o d u t i v o s indispensáveis a s s u m i d o s o u ao
m e n o s c o n t r o l a d o s p e l o E s t a d o , d e v e m crescer c o m o c o n s e q ü ê n c i a
d a t e n d ê n c i a h i s t ó r i c a à q u e d a na t a x a d e l u c r o . Ela t e m c o m o
c o n s e q ü ê n c i a q u e , d e mais a m a i s , processos d e p r o d u ç ã o t o r n a m -
se n ã o rentáveis e serão a b a n d o n a d o s o u r e d u z i d o s p e l o s c a p i t a i s
i n d i v i d u a i s , quase d e s a p a r e c e n d o d a esfera d o c a p i t a l c o n c o r r e n -
cial ( p . 1 4 l , s u b l i n h a d o p e l o a u t o r ) " .
Na s e g u n d a seção de seu a r t i g o , d e s e n v o l v e o c o n c e i t o d e c o n -
d i ç õ e s gerais. Para ele, são as a t i v i d a d e s n ã o r e n t á v e i s p a r a os ca-
p i t a i s i n d i v i d u a i s p r i v a d o s ; m a s n ã o chega a d e m o n s t r a r p o r q u e são
necessárias à r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l e m g e r a l . Parece-nos q u e f i c a
a idéia i m p l í c i t a de q u e estas a t i v i d a d e s são necessárias p e l o f a t o
d e sua e x i s t ê n c i a c o n c r e t a *
E n t r e t a n t o , t e n t a d e m o n s t r a r q u e estas a t i v i d a d e s não são
r e n t á v e i s p a r a os c a p i t a i s p r i v a d o s , d e m o n s t r a ç ã o q u e é b a s t a n t e
c o n t e s t á v e l . C i t a , p o r e x e m p l o , a massa d e i n v e s t i m e n t o s neces-
sários e o p e r í o d o d e m a t u r a ç ã o desta c a p i t a l ; a p r o d u ç ã o , c u j o re-
sultado não apresenta o caráter de u m b e m i m e d i a t o (qualificação,
r e s u l t a d o s d e p e s q u i s a s ) ; a e s t r e i t e z a d o s m e r c a d o s , e t c . C o n t r a es-
tes a r g u m e n t o s , p o d e - s e o p o r o f a t o d e q u e as a t i v i d a d e s q u e ele
considera não rentáveis, são-no a t u a l m e n t e , mas n e m sempre o
f o r a m ; são n a d a m a i s d o q u e o r e s u l t a d o d o m o v i m e n t o h i s t ó r i -
co do capital.
P o r o u t r o l a d o , d i s t i n g u e a p r o d u ç ã o da o p e r a ç ã o d o s m e i o s
de p r o d u ç ã o . A p f o d u ç ã o p o d e ser r e n t á v e l m a s a o p e r a ç ã o n ã o .
U t i l i z a c o m o e x e m p l o a c o n s t r u ç ã o d e p o n t e s e sua o p e r a ç ã o ; o u -
t r o e x e m p l o é o da c o n s t r u ç ã o d e escolas e o e n s i n o . A c o n s t r u ç ã o
o u a p r o d u ç ã o é r e n t á v e l , mas a operação não é rentável. A cons-
t r u ç ã o é realizada pelos capitais privados; a operação pelo Estado.
Nós a c h a m o s esta análise r e s t r i t i v a e a - h i s t ó r i c a . É r e s t r i t i -
va, p o r q u e a p r o d u ç ã o não é rentável para os capitais privados
e m c e r t a s c o n d i ç õ e s ; e t u d o q u e é necessário ao c a p i t a l p o d e v i r
a ser r e n t á v e l . P o r o u t r o l a d o , a n ã o r e n t a b i l i d a d e d a o p e r a ç ã o
p o d e ser t a m b é m i l u s ó r i a . D e n t r o d o a t u a l c a m p o de a t i v i d a d e s
d o E s t a d o , p o d e - s e e n c o n t r a r a t i v i d a d e s t ã o r e n t á v e i s q u a n t o al-
gumas atividades privadas.
Ela é a - h i s t ó r i c a p o r q u e não leva e m c o n t a o m o v i m e n t o
d e t r a n s f o r m a ç ã o das a t i v i d a d e s c a p i t a l i s t a s . F u n d a m e n t a r a
necessidade d o E s t a d o s o b r e a não r e n t a b i l i d a d e a t u a l das fer-
r o v i a s , n ã o e x p l i c a o E s t a d o q u a n d o o s e t o r f e r r o v i á r i o era u m
d o s m a i s r e n t á v e i s . Isto q u e r d i z e r q u e d e n t r o d o M o d o d e P r o d u -
ç ã o Capitalista e n c o n t r a r e m o s sempre atividades rentáveis e não
r e n t á v e i s , d e f i n i d a s espacial e h i s t o r i c a m e n t e . A d e f i n i ç ã o d a
r e n t a b i l i d a d e o u n ã o é f r u t o das c o n t r a d i ç õ e s i n t e r n a s a o p r o c e s -
so de r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l .
V i s t o p u r a m e n t e s o b este a s p e c t o , o r e s u l t a d o será o m o v i -
m e n t o dos capitais e n t r e diferentes ramos e setores o u m e s m o
e n t r e d i f e r e n t e s a t i v i d a d e s . É a associção e n t r e a n ã o r e n t a b i l i -
d a d e e a necessidade p a r a o c a p i t a l s o b r e s t r i ç ã o d a i m p o s s i b i -
l i d a d e d e v i r a ser r e n t á v e l q u e f u n d a m e n t a r i a o E s t a d o . Mas
este p r o c e d i m e n t o n ã o é r e a l i z a d o p e l o a u t o r .

2. Margareth WJrth

W i r t h t o m a c o m o p o n t o de partida cuja c r í t i c a à teoria d o


C a p i t a l i s m o M o n o p o l i s t a d e E s t a d o . O p o n d o - s e a esta t e o r i a
W i r t h p r o p õ e q u e :"a c o n s t i t u i ç ã o f o r m a l d a l i b e r d a d e e i g u a l -
d a d e e n t r e t o d o s (...) é' a f o r m a estatal a d e q u a d a a o c a p i t a l i s m o
desenvolvido ( p . 1 1 4 ) " .
Fundamenta seu estudo respondendo às q u e s t õ e s seguin-
tes
1 — " p o r que a liberdade e jgualdade de t o d o s e n q u a n t o
p o s s u i d o r e s d e m e r c a d o r i a s é u m a c o n d i ç ã o p r é v i a necessária à
reprodução do capital"; 2 - p o r q u e " e s t a l i b e r d a d e e esta
i g u a l d a d e f o r m a i s d e v e m ser p r o t e g i d a s p o r u m p o d e r o r g a n i -
z a d o , e x t e r n o aos c a p i t a i s , t a n t o c o n t r a à q u e l e s q u e q u e r e m
t r a n s f o r m á - l o e m u m a l i b e r d a d e e u m a i g u a l d a d e reais q u a n t o
c o n t r a àqueles que q u e r e m destruir a igualdade e liberdade m e s m o
f o r m a i s " ; 3 — p o r q u e "a c o n t r a d i ç ã o e n t r e l i b e r d a d e e i g u a l d a d e
f o r m a i s d e t o d o s os m e m b r o s d a s o c i e d a d e , d e u m l a d o ; e a rela-
ç ã o d e classe d o c a p i t a l e d o t r a b a l h o , d e o u t r o l a d o , c o n s t i t u e m
o l i m i t e e s t r u t u r a l das p o s s i b i l i d a d e s d e i n t e r v e n ç ã o d o E s t a d o n o
processo de p r o d u ç ã o (p. 1 1 5 ) " .
A s respostas a estas q u e s t õ e s n ã o são c l a r a m e n t e apre-
sentadas. S u p o m o s , e n t ã o , q u e o d e s e n v o l v i m e n t o d a a f i r m a ç ã o
s e g u i n t e c o n s t i t u i , t a m b é m , u m a resposta às q u e s t õ e s a c i m a .
W i r t h a f i r m a que: " o Estado e n q u a n t o potência extra-econômica e
e n q u a n t o E s t a d o d e classe d e v e ser d e d u z i d o d o c a p i t a l (p. 1 1 5 ) " :
Começa observando que a q u i l o que especifica o Estado capi-
t a l i s t a n ã o é o f a t o d e ser u m E s t a d o d e classe; " o E s t a d o (...) e n -
q u a n t o i n s t r u m e n t o d e d o m i n a ç ã o d e u m a classe s o b r e o u t r a , n ã o
é e s p e c í f i c o ao c a p i t a l i s m o ( p . 1 1 5 ) " . E m s e g u i d a , a análise da
r e p r o d u ç ã o social através d a t r o c a e d a p r o d u ç ã o , p e r m i t e - l h e des-
t a c a r os a s p e c t o s s e g u i n t e s : 1 — o c a p i t a l " l i b e r a " o t r a b a l h a d o r
d o s m e i o s d e p r o d u ç ã o e o t o r n a l i v r e p a r a e s c o l h e r seu t r a b a l h o e
seus p r o d u t o s d e c o n s u m o ; 2 - esta l i b e r d a d e p o s s i b i l i t a q u e t o d o s
os m e m b r o s d a s o c i e d a d e t o r n e m - s e c o m p r a d o r e s e v e n d e d o r e s :
3 — mas, a l i b e r a ç ã o d o s t r a b a l h a d o r e s f a z c o m q u e o t r a b a l h o
(a f o r ç a d e t r a b a l h o ) v e n h a a ser u m a m e r c a d o r i a c u j o s c o m p r a -
d o r e s e v e n d e d o r e s se c o n s t i t u e m e m classes d i s t i n t a s ; 4 — a s s i m ,
" s o m e n t e a t r o c a e n t r e as classes, g a r a n t e o p r o c e s s o g l o b a l de re-
produção (p.117)".
Esta t r o c a e n t r e as classes t o m a o a s p e c t o d e t r o c a e n t r e i n -
d i v í d u o s livres e iguais c u j a p e r m u t a d e e q u i v a l e n t e s e s c o n d e
u m a t r a n s a ç ã o d e s i g u a l , q u e é a e x p l o r a ç ã o da f o r ç a d e t r a b a -
l h o . O p r i m e i r o a s p e c t o se r e f e r e à c i r c u l a ç ã o , ao m e r c a d o ; o
s e g u n d o , refere-se à p r o d u ç ã o . A s s o c i a d o ao p r i m e i r o a s p e c t o
encontramos uma liberdade f o r m a l ; ao segundo, u m a não-
l i b e r d a d e real. O d e s e n v o l v i m e n t o " n o r m a l " d e s t a c o n t r a d i ç ã o é
u m a s o l u ç ã o p o r si m e s m a , o q u e i m p l i c a , d e i m e d i a t o , na supres-
são d a r e l a ç ã o f u n d a m e n t a l d a s o c i e d a d e c a p i t a l i s t a : o c a p i t a l .
Para g a r a n t i r a r e p r o d u ç ã o desta c o n t r a d i ç ã o u m a i n s t i t u i ç ã o
especial é, e n t ã o necessária. Esta i n s t i t u i ç ã o é o E s t a d o q u e , p e l a
v i o l ê n c i a (seja c o n t r a os t r a b a l h a d o r e s , seja c o n t r a o s c a p i t a l i s t a s
i n d i v i d u a i s ) g a r a n t e esta r e p r o d u ç ã o . " O E s t a d o , e n t ã o , se t r a n s -
f o r n n a , t e n d o s i d o u m m e i o d e m a n t e r a d o m i n a ç ã o d e u m a clas-
se s o b r e a o u t r a , e m u m m e i o d e m a n t e r a d o m i n a ç ã o d o c a p i t a l
sobre a sociedade ( p . 1 1 9 ) " .
Para r e s u m i r este p o n t o d e v i s t a , p o d e m o s d i z e r q u e a o c o n -
trário de A l t v a t e r q u e d e d u z o E s t a d o d a necessidade d e p r o d u -
zir certos valores de uso não-rentáveis para o c a p i t a l , W i r t h deduz
o Estado, a p a r t i r da c o n t r a d i ç ã o entre o Capital e o T r a b a l h o .
A s s i m , 1 ° : — a c o n t r a d i ç ã o c a p i t a l / t r a b a l h o se a p r e s e n t a ao
n í v e l da c i r c u l a ç ã o c o m o i n t e r c â m b i o e q u i v a l e n t e ; 2 ? — esta
c o n t r a d i ç ã o , ao n í v e l d a p r o d u ç ã o se t r a n s f o r m a e m i n t e r c â m b i o
desigual; 3 ° : — a c o n t r a d i ç ã o entre a liberdade f o r m a l e a não
l i b e r d a d e real, f o r m u l a d a p o r W i r t h , t e n d e a se r e s o l v e r p o r si
m e s m a ; 4 ° : — p o r t a n t o , o E s t a d o é necessário p a r a g a r a n t i r a
r e p r o d u ç ã o desta c o n t r a d i ç ã o .
O q u e não é e v i d e n t e é a s o l u ç ã o d a c o n t r a d i ç ã o p o r si mes-
m a . O r a c i o c í n i o de W i r t h é a p a r e n t e m e n t e c o r r e t o . P o d e m o s
m e s m o a c e i t á - l o a o n í v e l d e a b s t r a ç ã o f o r m u l a d o , c o m o u m desen-
v o l v i m e n t o l ó g i c o das c o n t r a d i ç õ e s . O f a t o m e s m o d e q u e , na rea-
l i d a d e , t u d o se passa c o m o i n t e r c â m b i o d e e q u i v a l e n t e s , e n t r e
p a r c e i r o s livres, i n d e p e n d e n t e s e iguais, e s c o n d e o i n t e r c â m b i o de-
s i g u a l , d i s f a r ç a d o p o r t r á s destas relações a p a r e n t e s e , t o r n a d u v i -
d o s o s u p o r a s o l u ç ã o a u t o m á t i c a desta c o n t r a d i ç ã o s e m a i n t e r v e n -
ção d o Estado * •
S.Joachim Hirsch

Este a u t o r p r o p õ e q u e o E s t a d o " d e v e ser d e d u z i d o e m sua


f o r m a e seu m o d o d e f u n c i o n a m e n t o , a p a r t i r da análise d o p r o c e s -
so d e r e p r o d u ç ã o social e d e suas leis ( p . 3 1 ) " -Assim, p r o c e d e a
u m a análise d o p r o c e s s o d e r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l e d e suas leis,
f u n d a m e n t o da sociedade capitalista.
Seu p o n t o d e p a r t i d a é a l i b e r d a d e d o t r a b a l h a d o r e d o c a p i -
talista c o m o p r é - c o n d i ç ã o ao i n t e r c â m b i o , que, sob a aparência de
i g u a l d a d e , e s c o n d e a d e s i g u a l d a d e , a e x p l o r a ç ã o da f o r ç a d e t r a -
b a l h o . P o r o u t r o l a d o , a r e p r o d u ç ã o social s o b esta base, " r e g u l a d a
p e l a lei d o v a l o r (...) p r o d u z e r e p r o d u z c o n t i n u a m e n t e suas p r ó -
p r i a s c o n d i ç õ e s s o c i a i s , s e m q u e e x i s t a necessidade d e i n t e r v e n ç ã o
e x t e r n a ( p . 3 7 ) " . E n t r e t a n t o , o processo de a c u m u l a ç ã o não deve
ser e n t e n d i d o c o m o p r o c e s s o " e q u i l i b r a d o " , mas c o n t r a d i t ó r i o ,
" c u j a s c o n s e q ü ê n c i a s c u l m i n a m na q u e d a t e n d e n c i a l d a t a x a d e
lucro ( p . 3 8 ) " .
A análise d o f u n c i o n a m e n t o desta l e i , leva-o a a f i r m a r q u e :
" a v e r d a d e i r a b a r r e i r a à p r o d u ç ã o c a p i t a l i s t a , é o c a p i t a l e m si
m e s m o ( M a r x , c i t a d o p o r H i r s c h ) " e, " a p ó s h a v e r r e a l i z a d o esta
d e d u ç ã o da t e n d ê n c i a às crises e ao d e s m o r o n a m e n t o d o s i s t e m a
c a p i t a l i s t a c o m o r e s u l t a n t e das i m p l i c a ç õ e s d a lei d o v a l o r e m si
m e s m a , resta e x a m i n a r , e m p a r t i c u l a r , a q u e s t ã o d e saber p o r q u e
este d e s i t i o r o n a n n e n t o n ã o a c o n t e c e u a t é h o j e ( p . 4 3 ) " .
A r e s p o s t a a esta q u e s t ã o leva-nos p r i m e i r o às r e f e r ê n c i a s so-
b r e as c o n t r a - t e n d ê n c i a s à t e n d ê n c i a à q u e d a na t a x a d e l u c r o . Para
H i r s c h , n ã o é s u f i c i e n t e referir-se às c o n t r a - t e n d ê n c i a s , mas é
ncessário e x a m i n a r o " d e s e n r o l a r c o n c r e t o d o p r o c e s s o de a c u m u -
l a ç ã o , d a c o n c o r r ê n c i a e n t r e os c a p i t a i s i n d i v i d u a i s e d a c r i s e , a t r a -
vés das q u a i s , as leis q u e i n d i c a m o s da t e o r i a d o v a l o r se m a n i -
f e s t a m e f e t i v a m e n t e s o b sua f o r m a c o n t r a d i t ó r i a ( p . 4 6 ) " A p a r t i r
d a í , analisa a c r i s e e a f u n ç ã o d a c r i s e . Esta " n ã o c o n s i s t e s o m e n t e
e m e l i m i n a r as d e s p r o p o r c i o n a l i d a d e s e x i s t e n t e s n o a p a r e l h o d e
p r o d u ç ã o ; é, a o m e s m o t e m p o , e s o b r e t u d o , u m m e i o através d o
q u a l as c o n t r a - t e n d ê n c i a s à q u e d a na t a x a d e l u c r o são e f e t i v a m e n -
t e mobilizadas ( p . 4 8 ) " . E m o u t r o s t e r m o s , a crise joga u m papel de
r e o r g a n i z a d o r das c o n d i ç õ e s gerais d e p r o d u ç ã o . " O c u r s o real
d o p r o c e s s o d e d e s e n v o l v i m e n t o e d a a c u m u l a ç ã o na s o c i e d a d e ca-
p i t a l i s t a , n e c e s s a r i a m e n t e c a r r e g a d o d e crises, d e p e n d e , a s s i m , de
f o r m a decisiva d o sucesso da r e o r g a n i z a ç ã o necessária das c o n d i -
ções de p r o d u ç ã o e das relações d e e x p l o r a ç ã o , e, p e l a m a n e i r a
c o m o se processa o sucesso desta o r g a n i z a ç ã o ( p . 4 9 ) " . E n f i m ,
apresenta u m a r e i n t e r p r e t a ç ã o d e c o m o f u n c i o n a a lei d a
t e n d ê n c i a à q u e d a na t a x a de l u c r o , q u e só a p a r e c e , e m p r i n c í -
p i o , através das c o n t r a - t e n d ê n c i a s . Esta l e i , " d e s c r e v e os f u n d a -
m e n t o s o b j e t i v o s das l u t a s e f e t i v a s d e classes. ( , . ) D o s r e s u l t a d o s
destas estratégias (as ações das classes e m l u t a ) e das saídas destas
l u t a s , d e p e n d e o f a t o q u e a lei d a t e n d ê n c i a à q u e d a na t a x a d e l u -
c r o , seja e m p i r i c a m e n t e v i s í v e l o u n ã o . (...) A lei da t e n d ê n c i a à
q u e d a na t a x a d e l u c r o f o r m u l a a c o e r ê n c i a das relações o b j e t i v a s
d o d e s e n r o l a r h i s t ó r i c o d o s a f r o n t a m e n t o s d e classes; os f a t o r e s
q u e a t u a m e m s e n t i d o i n v e r s o d e s c r e v e m os r e s u l t a d o s e as c o n -
d i ç õ e s q u e t o m a m a f o r m a d e relações sociais c o m p l e x a s ( p . 5 0 ) ":

A s s i m , a e v o l u ç ã o d a s o c i e d a d e c a p i t a l i s t a e a necessidade d o
E s t a d o , n ã o p o d e m ser a p r e e n d i d a s , senão p e l a análise d o desen-
r o l a r h i s t ó r i c o das leis f u n d a m e n t a i s q u e regem o f u n c i o n a m e n t o
d a s o c i e d a d e c a p i t a l i s t a . Este d e s e n r o l a r c o n t r a d i t ó r i o , s e m e a d o d e
crises, n ã o p o d e e x i s t i r sem c o n t í n u a " r e o r g a n i z a ç ã o das c o n d i -
ções gerais d e p r o d u ç ã o " . H i r s c h analisa estas c o n d i ç õ e s , o u t e n t a
precisá-las, s o b t r ê s f o r m a s as m o d i f i c a ç õ e s de f o r m a d o c a p i t a l :
a expansão d o capital sobre o mercado m u n d i a l ; e a aceleração d o
p r o g r e s s o t é c n i c o e c i e n t í f i c o . P a r a d o x a l m e n t e , estas c o n d i ç õ e s
gerais d e r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l , f a z e m c o m q u e os l i m i t e s à a c u -
m u l a ç ã o t o r n e m - s e c a d a vez m a i s p r ó x i m o s . E x a m i n e m o s estes as-
p e c t o s mais d e p e r t o .
As m o d i f i c a ç õ e s de f o r m a d o capital consistem na m o n o p o -
l i z a ç ã o , na m o d i f i c a ç ã o das relações d e p r o p r i e d a d e e de d i r e ç ã o ,
e na e d i f i c a ç ã o d o s i s t e m a de c r é d i t o . Os d o i s ú l t i m o s se c o n s t i -
t u e m m u i t o mais e m alavanca à centralização dos capitais sob a
f o r m a m o n o p o l i s t a , p o i s " p e r m i t e m o d e s e n v o l v i m e n t o das f o r -
ças p r o d u t i v a s , a l é m d o s l i m i t e s q u e são c o l o c a d o s p e l a p r o p r i e -
dade privada imediata dos meios de produção ( p . 5 2 ) " . A m ono-
p o l i z a ç ã o f u n c i o n a c o m o " m e c a n i s m o d e r e o r g a n i z a ç ã o da e s t r u t u -
ra d o c a p i t a l " , q u e p e r m i t e u m d e s e n v o l v i m e n t o das f o r ç a s p r o d u -
tivas a l é m da p o s s i b i l i d a d e das u n i d a d e s d e c a p i t a i n ã o m o n o p o l i s -
tas, p e r m i t i n d o , t a m b é m , aos m o n o p ó l i o s o b t e r e m u m a t a x a d e
l u c r o m a i s e l e v a d a . E n t r e t a n t o , estas v a n t a g e n s são c o n t r a d i t ó r i a s
nelas m e s m a s , p o i s " a g r a v a m as " c o n t r a d i ç õ e s " q u e se m a n i f e s t a m
na p e r t u r b a ç ã o d o p r o c e s s o d e r e p r o d u ç ã o e q u i l i b r a d a d o s i s t e m a
e m seu c o n j u n t o ( p . 5 3 ) " .
D o m e s m o m o d o , as v a n t a g e n s d a e x p a n s ã o m u n d i a l são c o n -
t r a b a l a n ç a d a s pelas d e s v a n t a g e n s o u p e l o a g u ç a m e n t o das c o n t r a -
dições. " A capitalização progressiva d o m u n d o e a c o n s t i t u i ç ã o d o
m e r c a d o m u n d i a l (...) s i g n i f i c a m a o m e s m o t e m p o , g e n e r a l i z a ç ã o
das crises e a g r e s s i v i d a d e c r e s c e n t e d o s países c a p i t a l i s t a s avança-
d o s , na l u t a p e l o c o n t r o l e das m a t é r i a s - p r i m a s , d o s m e r c a d o s e das
d i f e r e n t e s esferas de i n v e s t i m e n t o s ( p . 5 5 ) " :
E n f i m , " c o m o p r o g r e s s o d a c i ê n c i a e da t e c n o l o g i a , a g r a v a m -
se (...) as c o n t r a d i ç õ e s i m a n e n t e s ao d e s e n v o l v i m e n t o c a p i t a l i s t a
das f o r ç a s p r o d u t i v a s ( p . 5 8 ) " . E, a " e x t e n s ã o d a c i ê n c i a à p r o d u -
ç ã o , que torna-se h i s t o r i c a m e n t e d e t e r m i n a n t e c o m a progressão
d o p r o c e s s o c a p i t a l i s t a d e a c u m u l a ç ã o e pelas crises, é u m a f o r m a
na q u a l se r e a l i z a m as reações à q u e d a na t a x a d e l u c r o , e a t i v a ,
a o m e s m o t e m p o , as c o n t r a d i ç õ e s i n t e r n a s d e s t e m o d o d e p r o -
dução, engendrando, progressivamente, seu l i m i t e absoluto
(p.59)"..
T o d a a análise d a r e p r o d u ç ã o s o c i a l , f e i t a p o r H i r s c h c o m o o
e s t u d o do m o v i m e n t o da c o n t r a d i ç ã o c a p i t a l / t r a b a l h o e da c o n t r a -
d i ç ã o e n t r e os c a p i t a i s i n d i v i d u a i s — seja a u m n í v e l t e ó r i c o a b s t r a -
t o o u a u m nível mais c o n c r e t o — c o n d u z a urna ú n i c a c o n c l u s ã o :
a t e n d ê n c i a ao d e s m o r o n a m e n t o d o c a p i t a l .
Destes a s p e c t o s d e d u z as f u n ç õ e s d o E s t a d o , f u n ç õ e s q u e de-
finenri o E s t a d o e i m p e d e m a c a t á s t r o f e p a r a o c a p i t a l . " A f u n ç ã o
f u n d a m e n t a l d o E s t a d o é a g a r a n t i a das c o n d i ç õ e s gerais e e x t e r -
nas ao p r o c e s s o d e r e p r o d u ç ã o e das relações c a p i t a l i s t a s , e n q u a n -
t o e s t r u t u r a c o m p l e x a , e, i n c l u s i v e , das c o n d i ç õ e s gerais d e p r o d u -
ç ã o q u e não p o d e m , f u n d a m e n t a l m e n t e , ser p r o d u z i d a s p e l o s c a p i -
tais individuais ( p . 6 2 ) " :
E n t r e t a n t o , ele p r e c i s a q u e , " m e s m o s u p o n d o u m d e s e n r o -
lar d o c a p i t a l s e m e n t r a v e s , s u b s i s t e , a i n d a , a necessidade de garan-
t i r s o c i a l m e n t e as c o n d i ç õ e s f u n d a m e n t a i s d e sua a u t o - r e p r o d u ç ã o
(...) '-.O q u e s i g n i f i c a , a n t e s d e t u d o , a s a l v a g u a r d a d a p r o p r i e d a d e
p r i v a d a e a o b s e r v â n c i a das regras d a t r o c a , d i f u s ã o das regras f o r -
mais homogêneas da c o n c o r r ê n c i a , p r o t e ç ã o e segurança do capi-
t a l n o e x t e r i o r , g a r a n t i a d a d i s p o n i b i l i d a d e d o t r a b a l h o assalaria-
d o l i v r e e m c o n d i ç õ e s l u c r a t i v a s p a r a o c a p i t a l , assim c o m o a c r i a -
ç ã o das c o n d i ç õ e s i n f r a - e s t r u t u r a i s p a r a a p r o d u ç ã o (...) i s t o , na
m e d i d a e m q u e os c a p i t a i s i n d i v i d u a i s n ã o p o s s a m p r o d u z i - l o s p o r
si m e s m o s ( p . 6 4 ) " :
Da d e d u ç ã o das f u n ç õ e s d o E s t a d o ele d e d u z a f o r m a E s t a d o
q u e se s i t u a " c o m o u m a p a r e l h o e x t e r n o d e d o m i n a ç ã o e a d m i n i s -
t r a ç ã o , d a m e s m a m a n e i r a f a c e aos c a p i t a l i s t a s i n d i v i d u a i s o u f a c e
a o p r o l e t a r i a d o ( p . 6 4 ) " . E, " o E s t a d o n ã o p o d e apresentar-se a
p r i o r i c o m o d e f e n s o r d o s interesses dos c a p i t a i s i n d i v i d u a i s , mas,
ao c o n t r á r i o , deve assegurar a m a n u t e n ç ã o d o p r o c e s s o d e r e p r o -
d u ç ã o c a p i t a l i s t a e m seu c o n j u n t o , assim c o m o a s a l v a g u a r d a d e t o -
d a a f o r m a ç ã o social c o m o u m s i s t e m a s ò c i o - e c o n ô m i c o c o m p l e x o .
N e s t e s e n t i d o e s p e c í f i c o , é uma máquina essencialmente capitalis-
ta, o Estado dos capitalistas, o capitalista coletivo em idéia ( p . 6 5 ,
grifado pelo a u t o r ) " :
E m r e s u m o , o p r o c e d i m e n t o d e H i r s c h segue os s e g u i n t e s
pontos:
1 ° : — a análise da r e p r o d u ç ã o social baseada na p r o d u ç ã o c a -
p i t a l i s t a , na q u a l a lei d a t e n d ê n c i a à q u e d a na t a x a d e l u c r o e x -
p r i m e o a s p e c t o f u n d a m e n t a l da d i n â m i c a das c o n t r a d i ç õ e s s o c i a i s ;
2 ° : — os e s t u d o d e s t a lei leva-o à c o n c l u s ã o na q u a l a d i n â m i c a i m -
posta pela mesma e m p u r r a o c a p i t a l i s m o à catástrofe;
3? — a análise das c o n t r a - t e n d ê n c i a s , p e l o "desdobramento
c o n c r e t o d o p r o c e s s o d e a c u m u l a ç ã o , o u seja, as b a r r e i r a s e
p o s s i b i l i d a d e atuais f a c e às quais se e n c o n t r a o c a p i t a l n ã o são
suficientes para responder p o r q u e "esta catástrofe não ocorreu até
h o j e " :Estas c o n t r a - t e n d ê n c i a s , p o r seu c a r á t e r c o n t r a d i t ó r i o , n ã o
e x p l i c a m a m a n u t e n ç ã o da reprodução do c a p i t a l ;
4 ? — das c o n t r a d i ç õ e s às q u a i s se c l i o c a m o c a p i t a l , H i r s c h d e d u z
as f u n ç õ e s d o E s t a d o ;
5 ? — estas d e f i n e m a f o r m a E s t a d o c o m o o " c a p i t a l i s t a c o l e t i v o
em i d é i a " ;
6 ° : — e l e n o t a , r a p i d a m e n t e , q u e n ã o é necessário u t i l i z a r a tese
catastrofista para a dedução d o Estado.

4. Pierre Sa/ama

O ú l t i m o . t e x t o e x a m i n a d o é o d e S a l a m a -.Sua d e d u ç ã o
c o m p r e e n d e dois p o n t o s : o fetichismo da mercadoria e a dedução,
p r o p r i a m e n t e d i t a , d o Estado d o c a p i t a l . A l é m disso, p r o p õ e u m a
d i s t i n ç ã o m e t o d o l ó g i c a e n t r e o E s t a d o e o r e g i m e p o l í t i c o ; este
aqui c o m o sendo a f o r m a fenomenal d o Estado.
A g e n e r a l i z a ç ã o das t r o c a s m e r c a n t i s i m p l i c a na g e n e r a l i z a -
ç ã o das m e r c a d o r i a s e u m f e t i c h i s m o c o r r e s p o n d e n t e nas relações
s o c i a i s . " A s r e l a ç õ e s e n t r e os h o m e n s na p r o d u ç ã o se r e v e s t e m
a s s i m , n u m c e r t o estágio de d e s e n v o l v i m e n t o , d e f o r m a d u p l a -
m e n t e e n i g m á t i c a . Elas a p a r e c e m p o r u m l a d o c o m o relações e n t r e
coisas ( m e r c a d o r i a s ) e p o r o u t r o l a d o c o m o relações d e v o n t a d e
e n t r e u n i d a d e s i n d e p e n d e n t e s u m a s e m r e l a ç ã o às o u t r a s , iguais
e n t r e s i : c o m o relações e n t r e s u j e i t o s j u r í d i c o s ( P a s u k a n i s , c i t a d o
p o r Salama, p . 1 2 3 ) " : E , " o resultado principal da teoria do feti-
c h i s m o não é ( p o r t a n t o ) o de que a E c o n o m i a P o l í t i c a dissimu-
la p o r t r á s das c a t e g o r i a s m a t e r i a i s relações d e p r o d u ç ã o q u e se es-
t a b e l e c e m e n t r e os h o m e n s , é o d e q u e n u m a e c o n o m i a m e r c a n -
t i l c a p i t a l i s t a essas relações d e p r o d u ç ã o a d q u i r e m n e c e s s a r i a m e n t e
u m a f o r m a m a t e r i a l e só p o d e m e x i s t i r nesta f o r m a ( R u b i n , c i t .
p o r S a l a m a , p . 1 2 3 ) " : E n f i m , c i t a M a n d e i a f i r m a n d o q u e : " a per-
m a n ê n c i a e a a c e i t a ç ã o das relações m e r c a n t i s é i n t e r i o r i z a d a na
i m e n s a m a i o r i a d o s " c i d a d ã o s l i v r e s " (...) É a força s u p e r e s t r u t u r a l
p r i n c i p a l d o p o d e r p o l í t i c o d a b u r g u e s i a (...) A i n t e r i o r i z a ç ã o das
relações m e r c a n t i s c o r r e s p o n d e p o r t a n t o u m a i n t e r i o r i z a ç ã o d a
d e m o c r a c i a p u r a m e n t e f o r m a l (cit. p o r Salama, p . 1 2 3 ) " :

A s s i m , a análise ao n í v e l das t r o c a s n ã o p e r m i t e a d e d u ç ã o
da "necessidade t a n t o lógica c o m o histórica d o Estado ( p . 1 2 3 ) "
" E m o u t r o s t e r m o s , p o d e - s e c o m p r e e n d e r o E s t a d o c o m o algO
q u e está ao l a d o e n o e x t e r i o r d a s o c i e d a d e , mas n ã o se v ê , f u n d a -
m e n t a l m e n t e , a sua razão d e ser ( p . 1 2 4 ) " .
O segundo p o n t o , a dedução do Estado do capital, c o m p r e e n -
de a análise das r e l a ç õ e s q u e se e s t a b e l e c e m e n t r e o E s t a d o e o c a -
p i t a l . Estas n ã o são relações d e e x t e r i o r i d a d e ; são relações o r g â n i -
cas. C o n s i d e r a r a relação E s t a d o / c a p i t a l c o m o r e l a ç ã o de e x t e r i o -
r i d a d e s i g n i f i c a c o n s i d e r a r q u e o E s t a d o se s i t u a a c i m a da lei
d o v a l o r ; " d a i d e c o r r e u m a c o n c e p ç ã o tecnicista e instrumental
(p 1 2 6 ) " , . È necessário " c o n s i d e r a r q u e o q u e c o n c e r n e ao E s t a d o
f a z p a r t e das relações sociais de p r o d u ç ã o (...) q u e essas mesmas
r e l a ç õ e s e x p r i m e m laços o r g â n i c o s e n t r e o E s t a d o e o c a p i t a l
(p.127)".
S a l a m a p r o c e d e à d e d u ç ã o s e g u n d o d o i s p o n t o s : a) o E s t a d o
é u m " e l e m e n t o necessário à r e p r o d u ç ã o da r e l a ç ã o d e e x p l o -
r a ç ã o " ; b) o E s t a d o é u m " e l e m e n t o r e g e n e r a d o r d o s c a p i t a i s i n d i -
v i d u a i s " . . O p o n t o de p a r t i d a desta d i s t i n ç ã o é a r e t o m a d a p o r
R o s d o i s k i d o s c o n c e i t o s d e c a p i t a l e m geral e c a p i t a i s i n d i v i d u a i s
o u c a p i t a i s m ú l t i p l o s . Estes c o n c e i t o s se s i t u a m a n í v e i s d i f e r e n -
tes d e a b s t r a ç ã o e p e r m i t e m a Salama " c o n s i d e r a r c o m o p o n t o
d e p a r t i d a a c o n t r a d i ç ã o e n t r e o c a p i t a l e o t r a b a l h o , e, e m segui-
d a , as c o n t r a d i ç õ e s d o s c a p i t a i s m ú l t i p l o s e n t r e si na sua relação
com o trabalho (p.127)" :
A r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l c o m o r e l a ç ã o social i m p l i c a n ã o so-
m e n t e na r e p r o d u ç ã o da b u r g u e s i a e d o p r o l e t a r i a d o , mas, t a m b é m
n o i n t e r c â m b i o e n t r e estas classes: u m a p o s s u i d o r a d a m e r c a d o r i a
f o r ç a - d e - t r a b a l h o e a o u t r a , c o m p r a d o r a desta m e r c a d o r i a , Ê s o b r e
esta t r o c a q u e se f u n d a m e n t a a r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l . Mais a i n d a ;
a r e p r o d u ç ã o social neste p r o c e s s o a p r e s e n t a duas faces: u m a , apa-
r e n t e , c l a r a , a t r o c a de e q u i v a l e n t e s ; e a o u t r a , e s c o n d i d a p o r esta
a p a r ê n c i a , a t r o c a d e s i g u a l , a e x p l o r a ç ã o . Este p r o c e s s o é apresen-
t a d o p o r Salama ( a q u i ele r e t o m a W i r t h ) c o m o a " c o n t r a d i ç ã o
e n t r e a l i b e r d a d e f o r m a l d o t r a b a l h a d o r e n q u a n t o p r o p r i e t á r i o de
m e r c a d o r i a e a sua n ã o - l i b e r d a d e e n q u a n t o p r o d u t o r de mais-valia
( W i r t h , c i t . p o r S a l a m a , p . 1 2 8 ) " : E s t a c o n t r a d i ç ã o " t e n d e a se
r e s o l v e r p o r si m e s m a " : seja p e l a supressão da relação c a p i t a l i s t a ;
seja p e l a s u j e i ç ã o t o t a l d e u m a p a r t e d o s t r a b a l h a d o r e s . A r e p r o d u -
ç ã o desta c o n t r a d i ç ã o n ã o é p o s s í v e l s e m o c o n c u r s o d o E s t a d o .
A s s i m "o Estado garante esta troca de equivalentes que, sem ele,
não poderia perdurar. Garantindo o respeito das regras da troca,
ele passa a ser quem garante a troca desigual (p.128, grifado pelo
autor)" :
E n t r e t a n t o , este p r o c e s s o aparece na r e a l i d a d e p o r seu l a d o
f e t i c h i z a d o , a t r o c a d e e q u i v a l e n t e s ; e a s o l u ç ã o da c o n t r a d i ç ã o ,
c o m o f o i e n u n c i a d a a c i m a , não é p o s s í v e l se seu l a d o e s c o n d i d o
n ã o emerge ao n í v e l das a p a r ê n c i a s , m o s t r a n d o a e x p l o r a ç ã o . Se
p a r a W i r t h a s o l u ç ã o da c o n t r a d i ç ã o é quase a u t o m á t i c a , sem o
E s t a d o , S a l a m a a c o n t e s t a d e m o n s t r a n d o q u e p e l o f e t i c h i s m o da
m e r c a d o r i a a relação de exploração e n c o n t r a - s e e s c o n d i d a e só
se d e s v e n d a e m m o m e n t o d e c r i s e .
Assim, i n t r o d u z u m n o v o d a d o para d e m o n s t r a r a d e s f e t i c h i -
z a ç ã o d a t r o c a d e e q u i v a l e n t e s . Este n o v o d a d o é a c r i s e q u e
" p o r u m l a d o é necessária à r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l , e p o r o u t r o
(...) r e f o r ç a a c o n t e s t a ç ã o d a r e l a ç ã o d e e x p l o r a ç ã o pelas f o r ç a s
d e o p o s i ç ã o q u e ela segrega e n u t r e . Nesse s e n t i d o , ela a t u a c o m o
u m desfetichizador o b j e t i v o ( p . 1 2 9 , g r i f a d o p e l o a u t o r ) " -.Mas, se
a crise " r e v e l a a u m a p a r t e mais o u m e n o s i m p o r t a n t e dos tra-
b a l h a d o r e s o s e g r e d o da m a i s - v a l i a (...) a c o n s c i e n t i z a ç ã o m a i s o u
m e n o s e l e v a d a d a r e l a ç ã o de e x p l o r a ç ã o q u e p e r m i t e a crise e
seu g r a u o u i n t e n s i d a d e n ã o i m p l i c a , o u i m p l i c a p o u c o , q u e se re-
v e l e a n a t u r e z a real d o E s t a d o ( p . 1 2 9 ) " .
E n t r e t a n t o , c o m o c o n t r a d i ç ã o , dever-se-ia, t a m b é m , c o n s i d e -
rar a s o l u ç ã o p o r o u t r a a l t e r n a t i v a . E s t a , a s u j e i ç ã o d o s t r a b a -
lhadores pela burguesia, não é discutida nem p o r Salama, n e m p o r
W i r t h . H i p o t e t i c a m e n t e , poder-se-ia supor u m a solução teórica à
q u e s t ã o , p o i s esta a l t e r n a t i v a r e p r e s e n t a r i a u m r e t r o c e s s o h i s t ó r i -
co. Explicando melhor: a não-liberdade formal e real d o t r a -
b a l h a d o r , e x p r i m e a supressão d a relação s a l a r i a l . Esta supressão
c o n s i d e r a d a c o m o s u b m i s s ã o t o t a l d o t r a b a l h a d o r , p o d e r i a ser
r e p r e s e n t a d a p e l a r e l a ç ã o servil o u escravista, f o r m a s sociais his-
t o r i c a m e n t e u l t r a p a s s a d a s p e l o t r a b a l h o assalariado. N o l i m i t e , esta
a l t e r n a t i v a p o d e r i a r e p r e s e n t a r , t a m b é m , o f i m d o c a p i t a l i s m o sem
q u e p o s s a m o s d i z e r " a p r i o r i " q u a l seria a n o v a f o r m a d e o r g a n i -
zação social q u e o s u b s t i t u i r i a .
O s e g u n d o p o n t o d a d e d u ç ã o c o n s t i t u i a análise d a r e p r o d u -
ção a n í v e l d o s c a p i t a i s m ú l t i p l o s . O a s p e c t o essencial d e d i f e r e n -
c i a ç ã o e n t r e o c a p i t a l e m geral e o s c a p i t a i s m ú l t i p l o s é a c o n c o r -
r ê n c i a . ÍNJo q u e d i z r e s p e i t o à d i n â m i c a d o c a p i t a l , a c o n c o r r ê n c i a
atua n o sentido de estabelecer u m a tendência à perequação da t a x a
d e l u c r o . S a l a m a d i s t i n g u e d o i s n í v e i s p a r a a c o m p r e e n s ã o desta
t e n d ê n c i a : u m n í v e l a b s t r a t o , n o q u a l " a p e r e q u a ç ã o das t a x a s d e
lucro e x p r i m e a m e t a m o r f o s e dos valores e m p r e ç o de p r o d u ç ã o e
traduz transferências de mais-valia"; e u m nível c o n c r e t o , no qual
" o m o v i m e n t o d o c a p i t a l (...) necessita u m d i f e r e n c i a l das t a x a s
d e d e l u c r o (p 1 3 1 ) " . M a s é necessário s u b l i n h a r q u e "a p e r e q u a -
ç ã o das t a x a s d e l u c r o n ã o é u m d a d o . É u m r e s u l t a d o c o n s t a n t e -
m e n t e q u e s t i o n a d o ( p . 1 3 1 ) " : A l é m disso é necessário c o m p r e e n -
der, em p r i m e i r o lugar, que a perequação f u n c i o n a c o m o u m a
sanção s o c i a l ; c o m o m e i o , a t r a v é s d o q u a l , o m e r c a d o " o r i e n t a "
a produção e o m o v i m e n t o dos capitais. Em segundo, a tendên-
cia c o n c r e t a d o m o v i m e n t o dos c a p i t a i s , d o s r a m o s c o m b a i x a
c o m p o s i ç ã o o r g â n i c a d o c a p i t a i p a r a os r a m o s de c o m p o s i ç ã o
mais elevada.
Se, n u m s e n t i d o mais geral ( a b s t r a t o ) , , a p e r e q u a ç ã o da t a x a
d e l u c r o r e p r e s e n t a sanção s o c i a l , n u m s e n t i d o mais c o n c r e t o , a
i n t e r v e n ç ã o d o E s t a d o f u n c i o n a n o s e n t i d o de a c e n t u a r as t r a n s -
f e r ê n c i a s de m a i s - v a l i a d o s " s e t o r e s r e t a r d a t á r i o s p a r a os setores d e
i / a n g u a r d a " . Isto e x p l i c a p o r q u e a d i n â m i c a d a a c u m u l a ç ã o se c a -
r a c t e r i z a p e l o f l u x o d e c a p i t a i s e m d i r e ç ã o aos r a m o s e setores c o m
c o m p o s i ç ã o orgânica crescente. O e f e i t o o b t i d o pela intervenção
estatal p o r m e i o da t r a n s f e r ê n c i a d e mais-valia "pode ser compara-
do com o que se obtém através da crise. Eia d e p r e c i a c e r t a s f r a -
ções d e , c a p i t a l e m b e n e f í c i o de o u t r a s ; p o r e x e m p l o , desvia a c o n -
c o r r ê n c i a e m b e n e f í c i o de c e r t o s c a p i t a i s . A c e n t u a n d o a t r a n s f e -
r ê n c i a da mais-valia s o c i a l , f o r n e c e o m e i o p e l o q u a l a r e p r o d u ç ã o
d o c a p i t a l p o d e se e f e t u a r da m e l h o r m a n e i r a p o s s í v e l . Pode-se
p o r t a n t o c o n s i d e r a r q u e a intervenção do Estado pode desem-
penhar o papel provisório de crise (p 1:32, g r i f a d o p e l o a u t o r ) "
A l é m d e ser o m o d o n o r m a l d e v i d a d o c a p i t a l , a crise "assi-
nala o e s g o t a m e n t o das f o r ç a s — c o n s i d e r a d a s e m c o n j u n t o — q u e
c o n t r a r i a m a b a i x a t e n d e n c i a l d a t a x a de l u c r o ( p . 1 3 3 ) " . A s s i m ,
S a l a m a c o n s i d e r a q u e " a crise é necessária p a r a o c a p i t a l . Ela é o
m e i o p e l o q u a l o c a p i t a l m o d i f i c a as c o n d i ç õ e s de e x p l o r a ç ã o " A
crise p e r m i t e " a o c a p i t a l q u e se regenere ( p . 1 3 3 ) " :Sem levar esta
análise, d a c r i s e e seus e f e i t o s s o b r e a r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l , a seu
l i m i t e , S a l a m a d e i x a i m p l í c i t a a idéia d e H i r s c h , na q u a l a d i n â -
m i c a d o c a p i t a l e m si m e s m a , t e n d e à d e r r o c a d a . A n t e s d e a t i n g i r
este p o n t o , a f i r m a q u e " a b a n d o n a d o a si m e s m o , o c a p i t a l não p o -
d e r i a se r e p r o d u z i r . O E s t a d o é necessário; d a m e s m a f o r m a é ne-
cessário q u e o a p a r e l h o de d o m i n a ç ã o estatal n ã o se c o n s t i t u a
c o m o a p a r e l h o p r i v a d o da classe d o m i n a n t e . Esta i n t e r v e n ç ã o d o
E s t a d o é necessária p a r a pensar a c r i s e . O E s t a d o deve i n t e r v i r na
c r i s e , a f i m d e l i m i t a r os e f e i t o s d e s t r u i d o r e s p a r a c e r t a s f r a ç õ e s d o
c a p i t a l e, s o b r e t u d o , i n v e r s a m e n t e os e f e i t o s de r e c u p e r a ç ã o p a r a
essas m e s m a s f r a ç õ e s ( p . 1 3 4 ) " .
A a ç ã o d o E s t a d o e m relação à d i n â m i c a d o c a p i t a l , situa-se,
s e g u n d o S a l a m a , s o b r e o m o v i m e n t o da t a x a de l u c r o : m o d i f i c a n -
d o a t e n d ê n c i a à p e r e q u a ç ã o ; e, s o b r e t u d o , a t e n d ê n c i a à q u e d a na
t a x a de l u c r o . A p r i m e i r a m o d a l i d a d e d e i n t e r v e n ç ã o r e d i s t r i b u i a
mais-valia s o c i a l , e s t r u t u r a n d o e h i e r a r q u i z a n d o a t a x a de l u c r o
e m b e n e f í c i o dos setores de v a n g u a r d a , A s e g u n d a m o d a l i d a d e
j o g a o p a p e l d a c r i s e , p e r m i t i n d o u m a regeneração d o c a p i t a l .
Resumindo o p r o c e d i m e n t o de Salama, p o d e m o s dizer que
sua d e d u ç ã o refere-se a d o i s p o n t o s : í 9 ~ a r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l
em geral; 2 ° : — a r e p r o d u ç ã o dos capitais m ú l t i p l o s .
A r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l e m g e r a l , i m p l i c a na r e p r o d u ç ã o d o
c a p i t a l e d o t r a b a l h o e , e x i g e a t r o c a e n t r e os p r o p r i e t á r i o s destes
m e i o s de p r o d u ç ã o . Esta t r o c a gera u m a c o n t r a d i ç ã o e n t r e a l i b e r -
d a d e f o r m a l e a n ã o - l i b e r d a d e real d o t r a b a l h a d o r . C o n t r a d i ç ã o
q u e t e n d e a se resolver p o r si m e s m a . A s o l u ç ã o desta c o n t r a d i ç ã o
i m p l i c a na supressão d a r e l a ç ã o c a p i t a l / t r a b a l h o ; p o r t a n t o , esta
r e l a ç ã o só subsiste a t r a v é s d a i n t e r v e n ç ã o d o E s t a d o .
O segundo p o n t o é analisado de m o d o menos preciso e dei-
x a i m p l í c i t a s suas c o n c l u s õ e s . A t e n d ê n c i a à p e r e q u a ç ã o d a t a x a
de l u c r o não é u m d a d o , mas u m " r e s u l t a d o c o n s t a n t e m e n t e
q u e s t i o n a d o " ; n ã o e x i g e e m si m e s m a , a i n t e r v e n ç ã o d o E s t a d o .
A análise l ó g i c a e t e ó r i c a desta l e i , i n d e p e n d e n t e m e n t e d a a ç ã o
d o Estado, apresenta resultados p o u c o coerentes c o m a realidade,
A o b s e r v a ç ã o h i s t ó r i c a , c o n c r e t a , d a a ç ã o desta lei p e r m i t e q u e a
t e n d ê n c i a a t u a l n ã o é a h o m o g e n e i z a ç ã o da t a x a d e l u c r o , mas u m a
hierarquização de taxas. Mais a i n d a , não p e r m i t e explicar o m o v i -
m e n t o dos capitais dos ramos de baixa c o m p o s i ç ã o para aqueles
de c o m p o s i ç ã o m a i s e l e v a d a s ' ^ ' . A s s i m , o q u e v a i e x i g i r a i n t e r -
venção d o Estado é a explicação d o m o v i m e n t o concreto da acu-
m u l a ç ã o que apresenta h i s t o r i c a m e n t e e " e x - p o s t " u m a hierarquia
nas t a x a s de l u c r o . S a l a m a c o n s i d e r a q u e a e x p l i c a ç ã o d e M a t t i c k é
i n s u f i c i e n t e . Este e x p l i c a a h i e r a r q u i z a ç ã o p e l o m o v i m e n t o d o
m e r c a d o , q u e r d i z e r , p e l a o f e r t a e d e m a n d a . Para S a l a m a , o m o v i -
m e n t o da t a x a de l u c r o n ã o p o d e ser e x p l i c a d o sem c o n s i d e r a r a
ação d o Estado.

N o q u e d i z r e s p e i t o à lei d a t e n d ê n c i a à q u e d a na t a x a d e l u -
c r o , ela p o d e ser c o n s i d e r a d a c o m o u m a lei q u e regula a d i n â m i -
ca d o c a p i t a l , c u j o s p o n t o s c r í t i c o s p r o v o c a m a c r i s e . Esta c r i s e ,
g e r i d a p e l o E s t a d o , v a i p e r m i t i r a r e g e n e r a ç ã o d o c a p i t a l . Fica
i m p i í c i t o q u e , sem a a ç ã o d o E s t a d o , a r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l t o r -
na-se i m p o s s í v e l .

Ill - ALGUMAS OBSERVAÇÕES CRITICAS

O e s t u d o destes a u t o r e s p e r m i t e , , a g o r a , r e s u m i r o p r o c e d i -
m e n t o geral da d e r i v a ç ã o . Para t a n t o , c o n c e n t r a m o - n o s s o b r e o
p r o c e d i m e n t o t e ó r i c o da derivação (dedução) do Estado d o capi-
t a l e d e i x a m o s d e l a d o as i m p l i c a ç õ e s e os r e s u l t a d o s desta d e r i v a -
ç ã o . C h a m a m o s a t e n ç ã o p a r a o f a t o d e q u e , c o m este p r o c e d i -
m e n t ó , perde-se m u i t o das n u a n c e s e d a s d i f e r e n t e s c o n t r i b u i ç õ e s
d e c a d a t r a b a l h o na m e d i d a e m q u e são r e d u z i d o s a u m d e n o m i -
nador c o m u m .
E m t o d o s os t e x t o s e s t u d a d o s , p o d e m o s a f i r m a r : a análise
baseia-se n o e s t u d o das c o n t r a d i ç õ e s d o c a p i t a l c o n s i d e r a d o e m si
m e s m o , i n d e p e n d e n t e m e n t e d o E s t a d o . A análise destas c o n t r a d i -
ções leva a c a d a u m d o s a u t o r e s a c o n c l u i r , i m p l í c i t a o u e x p l i c i -
t a m e n t e , q u e o E s t a d o é necessário ao c a p i t a l . E i s t o v a i d e u m
e x t r e m o - a tese c a t a s t r o f i s t a e m H i r s c h - a o u t r o . O E s t a d o c o m o
g a r a n t i a d a r e p r o d u ç ã o d a r e l a ç i o c a p i t a l / t r a b a l h o , a t r a v é s das re-
lações j u r í d i c a s , e m W i r t h .
A análise m a i s a p r o f u n d a d a destas c o n t r a d i ç õ e s e x i g e q u e o
E s t a d o seja u m a p a r e l h o s e p a r a d o d o c a p i t a l ; q u e t o m e forma
impessoal ao lado e acima da sociedade. S o m e n t e s o b esta f o r m a ,
o E s t a d o p o d e p r e e n c h e r as f u n ç õ e s e x i g i d a s p a r a a r e p r o d u ç ã o
do capital.
E n f i m , a d e f i n i ç ã o destas f u n ç õ e s e m relação à r e p r o d u ç ã o
d o c a p i t a l , p e r m i t e a qualificação d o Estado. O Estado c o m o
"capitalista coletivo em i d é i a " , é capitalista porque preenche fun-
ções v i s a n d o à r e p r o d u ç ã o d o c a p i í a l . O E s t a d o " c o m o i n s t r u m e n -
t o d e d o m i n a ç ã o d e u m a classe s o b r e a o u t r a , n ã o é e s p e c í f i c o ao
c a p i t a l i s m o " ' ^ ° ' a f i r m a W i r t h ( p . 1 1 5 ) : 0 E s t a d o e s p e c í f i c o a o ca
p i t a l i s m o é a q u i e q u e set've d e " m e i o p a r a m a n t e r a d o m i n a ç ã o d o
c a p i t a l s o b r e a s o c i e d a d e ( W i r t h s , p . 1 1 9 ) " -A d o m i n a ç ã o d o c a p i t a l
s o b r e a s o c i e d a d e só é p o s s í v e l p o r sua r e p r o d u ç ã o a m p l i a d a ,
a p o i a d a p e l o E s t a d o q u e p r e e n c h e d e t e r m i n a d a s c o n d i ç õ e s neces-
sárias, s e m as q u a i s esta r e p r o d u ç ã o t o r n a - s e i m p o s s í v e l .

V i s t o desta m a n e i r a , a d e d u ç ã o d o E s t a d o d o c a p i t a l c o l o c a
c e r t o s p r o b l e m a s : p r i m e i r o , a relação Estado/capital é p r o p o s t a
c o m o r e l a ç ã o o r g â n i c a , desde seu p o n t o d e p a r t i d a . Esta r e l a ç ã o
n ã o s e n d o d e m o n s t r a d a e m n e n h u m t r a b a l h o , t e r m i n a p o r se a p r e -
sentar c o m o p o s t u l a d o de que p o d e m o s m e s m o prescindir. Isto
nos leva a u m a r e l a ç ã o de e x t e r i o r i d a d e , o q u e n ã o parece ser a
i n t e n ç ã o d o s a u t o r e s . O s e g u n d o p o n t o diz r e s p e i t o à d e d u ç ã o p r o -
p r i a m e n t e d i t a . Ela n ã o é c l a r a m e n t e e x p l i c i t a d a e m n e n h u m d o s
t r a b a l h o ? . D e s t a m a n e i r a , acaba-se por confundir a dedução do Es-
tado com a dedução da necessidade da intervenção do Estado. O
ú l t i m o p o n t o refere-se á forma Estado. Esta é m u i t o p o u c o t r a -
b a l h a d a e n ã o p e r m i t e f o r m a r u m a idéia precisa d o q u e é q u e c o n s -
t i t u i esta f o r m a e, q u a i s são as relações c o m seu c o n t e ú d o . V a m o s
e x a m i n a r , e m s e g u i d a , cada u m destes p o n t o s .
7. A relação orgânica Estado/capital

T o d o s os t e x t o s e s t u d a d o s p r o p õ e m q u e a r e l a ç ã o E s t a d o / c a -
pital não é u m a relação de e x t e r i o r i d a d e , mas u m a relação orgâni-
ca. Mas, n e n h u m dos trabalhos explicita claramente a organicida-
d e d e s t a r e l a ç ã o . P o d e r í a m o s , e n t ã o , s u p o r q u e a d e m o n s t r a ç ã o da
necessidade d o E s t a d o , o d e s d o b r a m e n t o d e suas f u n ç õ e s f a c e ao
c a p i t a l c o n s t i t u i r i a m , a o m e s m o t e m p o , a d e m o n s t r a ç ã o da o r g a -
n i c i d a d e d a q u e l a r e l a ç ã o . N ó s c o n s i d e r a m o s , e n t r e t a n t o , q u e esta
s u p o s i ç ã o é f a l s a . Se a r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l e x i g e a e x i s t ê n c i a de
u m a i n s t i t u i ç ã o f o r m a l m e n t e ao l a d o e a c i m a d o c a p i t a l , i s t o n ã o
i m p l i c a , n e c e s s a r i a m e n t e , q u e esta i n s t i t u i ç ã o seja r e a l m e n t e liga-
da o r g a n i c a m e n t e a o c a p i t a l . A l é m d i s s o , s e g u i n d o passo a passo
c a d a u m a das d i f e r e n t e s d e m o n s t r a ç õ e s , a r e l a ç ã o E s t a d o / c a p i t a l
se e s t a b e l e c e a p a r t i r das f u n ç õ e s p r e e n c h i d a s p e l o E s t a d o f a c e a o
c a p i t a l . Se c o n s i d e r a m o s q u e essa r e l a ç ã o é o r g â n i c a , as f u n ç õ e s de-
v e r i a m r e s u l t a r dessa relação e, n ã o , o c o n t r á r i o . E n f i m , a d e f i n i -
ç ã o de E s t a d o , a p ó s a d e m o n s t r a ç ã o d e sua n e c e s s i d a d e , a p a r t i r de
suas f u n ç õ e s , p e r m i t e t o d a s o r t e de a m b i g ü i d a d e s e m a l e n t e n d i -
d o s . P o r e x e m p l o : u m a c r í t i c a d e q u e esta análise seja f u n c i o n a l i s -
ta'i\'.
É p r e c i s o , p o r t a n t o , c o l o c a r " a p r i o r i " o u d e m o n s t r a r a ques-
t ã o da r e l a ç ã o o r g â n i c a E s t a d o / c a p i t a l ; e m s e g u i d a , d e f i n i r , p r e c i s a -
m e n t e , a noção de F O R M A E S T A D O ; e n f i m , considerar q u e o
q u e se d e d u z n ã o é m a i s o E s t a d o , m a s , a necessidade d e sua i n t e r -
venção.
Os d o i s p r i m e i r o s p o n t o s n ã o são e x a t a m e n t e s e p a r a d o s . A
d e f i n i ç ã o " a p r i o r i " d o E s t a d o , i m p l i c a d i r e t a m e n t e e m sua r e l a ç ã o
c o m o c a p i t a l . V á r i a s d e f i n i ç õ e s são p o s s í v e i s ( o u n ã o p r o p o s t a s )
m a s n ó s n ã o as d i s c u t i r e m o s a q u i '^2) T o m a m o s c o m o p o n t o de
p a r t i d a a n o ç ã o avançada p o r Salama de Estado c o m o abstração.
Esta n o ç ã o a b s t r a t a está c o m p r e e n d i d a , é i m a n e n t e â n o ç ã o a b s t r a -
ta de capital c o m o relação social. Isto fica c l a r a m e n t e c o l o c a d o
p o r L e f e b v r e q u a n d o d i z q u e " . . . c a d a vez q u e u m " a g e n t e " o u
" a t o r " t e m qualquer relação, normal ou c o n f l i t i v a , c o m o u t r o
" a g e n t e " , i n d i v í d u o o u g r u p o , o E s t a d o está l á , t e r c e i r o i n c l u í d o .
M a i s q u e t e s t e m u n h a : ele m e s m o u m a g e n t e . Já está p r e s e n t e c o m o
c o n s e r v a d o r e f i a d o r d o s c o n t r a t o s . A espada d e D â m o c l e s e s t a t a l ,
c o m o d i z a f i g u r a clássica da l i n g u a g e m , suspensa s o b r e t o d o a t o
s o c i a l c o m o u m a a m e a ç a d e sanção ( D e L ' E t a t , t . 3 : p . 2 0 1 ) " . E s t a
m e s m a p r o p o s i ç ã o a p a r e c e e m P a s u k a n i s e m sua análise d a gênese
histórica do Estado capitalista. " T o d o aperfeiçoamento posterior
d o E s t a d o b u r g u ê s (. . .) p o d e ser r e c o n d u z i d o ao p r i n c i p i o segun-
d o o q u a l n e n h u m d o s d o i s agentes n o m e r c a d o , p o d e r e g u l a m e n -
t a r a r e l a ç ã o d e t r o c a p o r sua p r ó p r i a a u t o r i d a d e ; esta a q u i e x i g e ,
ao c o n t r á r i o , t e r c e i r a p a r t e q u e e n c a r n e a g a r a n t i a r e c i p r o c a q u e os
p o s s u i d o r e s de m e r c a d o r i a s se c o n c e d e m m u t u a m e n t e e m sua q u a -
lidade de possuidores de mercadorias. . . ( p . 1 3 6 ) " .
N e s t e a s p e c t o , considera-se o E s t a d o e o c a p i t a l a o m e s m o
nível de abstração. Não p o d e m o s "separá-los" u m do o u t r o ; o ca-
p i t a l c o m o r e l a ç ã o social n ã o e x i s t e , e n ã o p o d e e x i s t i r sem o Es-
t a d o . L o g i c a m e n t e n ã o se p o d e c o n c e b e r o c a p i t a l c o m o r e l a ç ã o
s o c i a l d e e x p l o r a ç ã o q u e se estabelece e n t r e i n d i v í d u o s " l i v r e s e
i g u a i s " , se n ã o se c o n s i d e r a a relação d e d o m i n a ç ã o i m p l í c i t a a esta
r e l a ç ã o . H i s t o r i c a m e n t e , a c o n s t i t u i ç ã o desta r e l a ç ã o , sua gênese
e c o n s o l i d a ç ã o , n ã o p o d e ser c o n c e b i d a sem o c o n c u r s o de u m a
i n s t i t u i ç ã o q u e g a r a n t a esta r e l a ç ã o .
É a este n í v e l q u e a relação E s t a d o / c a p i t a l é o r g â n i c a . N e s t e
m e s m o n í v e l a relação C a p i t a l / t r a b a l h o ( o u b u r g u e s i a / p r o l e t a r i a -
d o é o r g â n i c a . A passagem a u m n í v e l m a i s c o n c r e t o i m p l i c a na
" s e p a r a ç ã o " e n t r e o E s t a d o e o c a p i t a l ; i m p l i c a , t a m b é m , na se-
p a r a ç ã o e n t r e c a p i t a l e t r a b a l h o . Estes se m a t e r i a l i z a m nas classes
f u n d a m e n t a i s d a s o c i e d a d e c a p i t a l i s t a ; o E s t a d o se m a t e r i a l i z a n u m
aparelho estatal.

2. A dedução do Estado ou a necessidade da intervenção


estatal?

Se c o n c e b e m o s a relação o r g â n i c a e n t r e E s t a d o e c a p i t a l , c o -
m o v i m o s a c i m a , p o d e m o s a f i r m a r q u e a q u i l o q u e os a u t o r e s d o s
trabalhos examinados deduzem não é precisamente o Estado, pois
c o m o n o ç ã o a b s t r a t a , ele é i m á n e n t e ao c a p i t a l . O q u e é d e d u z i d o
é m u i t o m a i s a a ç ã o d o E s t a d o , m a t e r i a l i z a d a n u m a p a r e l h o esta-
t a l ; é a i n t e r v e n ç ã o d o E s t a d o f a c e às c o n t r a d i ç õ e s da r e p r o d u ç ã o
d o c a p i t a l . V e j a m o s c o m mais d e t a l h e s .
C o m o já o b s e r v a m o s , e m t o d o s os t r a b a l h o s e x a m i n a d o s ,
não existe, e x p l i c i t a m e n t e , f u n d a m e n t a ç ã o sobre a relação o r g â n i -
ca E s t a d o / c a p i t a l . T o d a análise g i r a e m t o r n o d o c o n c e i t o de
necessidade. Este c o n c e i t o e x i g e , d o p o n t o d e v i s t a p u r a m e n t e l ó -
g i c o , q u e a j u s t i f i c a ç ã o da e x i s t ê n c i a e da ação d o E s t a d o f u n d a -
m e n t e - s e na r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l . A análise d e s t a , a t r a v é s d e suas
leis, j u s t i f i c a , a s s i m , o E s t a d o . M a s , esta j u s t i f i c a t i v a é p o s s í v e l , se,
e s o m e n t e se, a análise d o f u n c i o n a m e n t o d o c a p i t a l levar à c o n c l u -
são da i m p o s s i b i l i d a d e d e e x i s t ê n c i a d e l e sem o c o n c u r s o d o E s t a -
d o . E m o u t r o s t e r m o s , corno e x p r i m e claramente Hirsch, o Estado
é necessa'rio p a r a e v i t a r a d e r r o c a d a d o c a p i t a l . E n c o n t r a m o s a q u i
os t r a e o s d o e c o n o m i c i s m o e u m d e t e r m i n i s m o u m t a n t o o u q u a n -
t o e x a g e r a d o s . A b u s c a de u m a j u s t i f i c a t i v a p a r a a e x i s t e n c i a d o
E s t a d o , leva, p r i n c i p a l m e n t e H i r s c h , a exagerar certas c o n t r a d i -
ç õ e s . Se O E s t a d o e o c a p i t a l m a n t ê m e n t r e si r e l a ç õ e s o r g â n i c a s ,
não é necessário demonstrar sua necessidade. Este p r o c e d i m e n t o
t r a z , e m s i , o r i s c o de c o n s i d e r a r a d i n â m i c a d o c a p i t a l e m si m e s -
m a , i n d e p e n d e n t e m e n t e d o E s t a d o , e i n t r o d u z - s e o E s t a d o so-
m e n t e c o m o r e c u r s o ao c a p i t a l . A s s i m , E s t a d o a c a p i t a l a c a b a m
p o r se a p r e s e n t a r e m c o m o relações d e e x t e r i o r i d a d e .
Este t i p o de análise r e t o m a , d e c e r t o m o d o , a p r o x i m a d a m e n -
t e , a m e s m a a r g u m e n t a ç ã o das t e o r i a s c a t a s t r o f i s t a s d e v i d a s , a o
m e n o s e m p a r t e , ás análises de Rosa L u x e m b u r g o . S u b s t i t u i - s e ,
neste c a s o , o " a m b i e n t e social n ã o c a p i t a l i s t a " p e l o E s t a d o , se b e m
q u e cada u m j o g a p a p e l d i f e r e n t e e m c a d a t e o r i a .
P o d e m o s s u p o r , e n t r e t a n t o , q u e os e s t u d o s e x a m i n a d o s c o -
l o c a m a necessidade da intervenção do Estado e n ã o a necessidade
do Estado, t o m a n d o c o m o dada a r e l a ç ã o o r g â n i c a E s t a d o / c a p i t a l
(o q u e n ã o é c l a r a m e n t e e x p l i c i t a d o ) . N e s t e c a s o , d e s c a r t a m o s
as teses c a t a s t r o f i s t a s , mas e l i m i n a m o s a d e d u ç ã o d o E s t a d o e m
b e n e f í c i o da d e d u ç ã o da intervenção d o Estado.

A d e m o n s t r a ç ã o da r e l a ç ã o o r g â n i c a entr-e E s t a d o e c a p i t a l
d e v e r i a c o n s t i t u i r a base da d e d u ç ã o e p e r m i t i r a d e f i n i ç ã o das f u n -
ç õ e s gerais d o E s t a d o c a p i t a l i s t a . E m s e g u i d a , a análise l ó g i c a e his-
t ó r i c a d a r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l , a c o n s t a t a ç ã o e a d e f i n i ç ã o das
r e s t r i ç õ e s e c o n t r a d a s p o r esta r e p r o d u ç ã o , d e v e r i a m p e r m i t i r a d e -
d u ç ã o das t a r e f a s h i s t o r i c a m e n t e d e f i n i d a s d o E s t a d o .

N ã o p o d e m o s s u p o r , a p a r t i r da análise das leis gerais q u e re-


g u l a m a d i n â m i c a da r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l , q u e este seja d é b i l ,
q u e t e n d e à e s t a g n a ç ã o , c o r n o o f a z c r e r H i r s c h várias vezes. P o d e -
mos, no e n t a n t o , a firmar que a reprodução d o capital é contradi-
t ó r i a ; q u e e n c o r i t r a h i s t o r i c a m e n t e várias b a r r e i r a s . Mas estas t ê m
s i d o s u p e r a d a s ao l o n g o d a h i s t ó r i a c o m o u sem a i n t e r v e n ç ã o d o
E s t a d o , c o n f o r m e as c o n d i ç õ e s e s p e c í f i c a s de cada c a s o . P o d e m o s ,
i g u a l m e n t e , a f i r m a r q u e na fase c o n t e m p o r â n e a d o c a p i t a l i s m o , as
b a r r e i r a s e n c o n t r a d a s pela r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l n ã o p o d e m ser
s u p e r a d a s s e m o a u x í l i o d o E s t a d o . M a s , isto n ã o s i g n i f i c a , d e f o r -
m a a l g u m a , f r a q u e z a d o capital ou qualquer t e n d ê n c i a á estagna-
ção.
3. A forma Estado.

A t e o r i a da d e r i v a ç ã o c o n s t i t u i reação aos excessos da t e o r i a


d o E s t a d o f u n d a d a s e m seu c o n t e ú d o d e classe. Esta reação d e v e -
ria a p r e s e n t a r u m a t e o r i a d o E s t a d o , a p a r t i r d a c a t e g o r i a forma.
N o e n t a n t o , a f o r m a Estado " e m realidade é m u i t o ligeiramente
abordada m a i o r p a r t e d o s t r a b a l h o s , esta q u e s t ã o é ape-
nas e s b o ç a d a o u f i c a m u i t o m a i s i m p l í c i t a d o q u e e x p l í c i t a , sem
u m a t e o r i z a ç ã o m a i s p r e c i s a . P o r o u t r o l a d o , a q u e s t ã o da n a t u r e z a
d o E s t a d o e sua relação à f o r m a n ã o é i g u a l m e n t e c o n t e m p l a d a
nestes t e x t o s .
E s t e ú l t i m o a s p e c t o p o d e levar a d u a s p o s i ç õ e s e x t r e m a s ,
igualmente insatisfatórias, segundo acreditamos. A primeira po-
sição s u b o r d i n a a f o r m a E s t a d o à f o r m a c a p i t a l ; esta a q u i s e n d o
o s u j e i t o e a q u e l a lá o o b j e t o c u j o m o v i m e n t o seguiria c o m o
s o m b r a o m o v i m e n t o d o c a p i t a l ; a s e g u n d a , seria a a u t o n o m i a d a
f o r m a E s t a d o ; este c o n s t i t u i r i a , t a m b é m , u m s u j e i t o e q u i v a l e n t e
a o c a p i t a l , c o m seu p r ó p r i o m o v i m e n t o .
N o l i m i t e , a p r i m e i r a c o n c e p ç ã o p e r m i t e : seja a r e t o m a d a
da tese i n s t r u m e n t a l i s t a (o E s t a d o c o m o i n s t r u m e n t o d o c a p i t a l
e n ã o d e u m a classe); seja, u m a r e d u ç ã o d o E s t a d o ao c a p i t a l . A
este r e s p e i t o , c i t a m o s S a n c h e z q u e escreve: " . . . apesar da o p o s i -
ç ã o e n t r e a t e o r i a d e N e g r i e de A í t v a t e r , eles t ê m u m p o n t o f u n -
damental em c o m u m : t a n t o em u m q u a n t o em o u t r o , o capital é
sempre o verdadeiro e ú n i c o sujeito do processo. E m Negri, o
Estado torna-se o c a p i t a l , em A í t v a t e r o Estado não existe, a não
ser e m f u n ç ã o d o c a p i t a l . A e s p e c i f i c i d a d e e a r e a l i d a d e d o E s t a d o
dissolvem-se n o c a p i t a l
S e g u n d o s a b e m o s , é o p r ó p r i o S a n c h e z q u e leva a o l i m i t e
a o u t r a o p ç ã o . Ele a f i n n a q u e " A t e n s ã o M a r x - H e g e l i m p l i c a em
c o n c e b e r o E s t a d o c o m o u m a f o r m a q u e t e r á seu e s t a t u t o p r ó -
p r i o , e n q u a n t o f o r m a e m m o v i m e n t o , s i m i l a r ao c o n c e i t o d e
c a p i t a l ; i s t o i m p l i c a q u e a s o c i e d a d e m o d e r n a é d o m i n a d a p o r duas
potências: o Estado e o capital ' ^ 5 ' " .
Estas d u a s a b o r d a g e n s a p r e s e n t a m c o m o inconveniente
p r i n c i p a l a i m p o s s i b i l i d a d e de i n c o r p o r a r a l u t a de classes na
análise d a f o m n a E s t a d o .
U m a tentativa intermediária é apresentada p o r Salama. A
p a r t i r d e u m c o r t e c o n c e i t u a i e n t r e forma do Estado e forma Esta-
do e d a d i s t i n ç ã o m e t o d o l ó g i c a e n t r e abstração real e manifestação
concreta, p r o p õ e a " s e p a r a ç ã o " e n t r e E s t a d o e r e g i m e p o l í t i c o ' ^ ^*
A f o r m a E s t a d o é d e d u z i d a d o c i c l o d o c a p i t a l ; a sucessão d e c a -
tegoria M — V — D — C (Mercadoria — Valor — Dinheiro — Capi-
t a l ) i m p l i c a o E s t a d o . E s t e , c o m o u m a a b s t r a ç ã o r e a l , situa-se c o -
m o f o r m a " a o l a d o e a c i m a d o c a p i t a l " . E s t a f o r m a " . . . se e f e t i -
va na r e a l i d a d e d a l u t a d e classes s o b a forma do regime político
( S a l a m a , 1 9 8 0 : p . 1 3 5 ) " . E s t a é a forma do Estado.
E m b o r a esta a b o r d a g e m n o s p e r m i t a a v a n ç a r n o e s t u d o d a
f o r m a E s t a d o , n ã o n o s p e r m i t e , a i n d a , a v a n ç a r na q u e s t ã o d a r e l a -
ção f o r m a / c o n t e ú d o d o E s t a d o capitalista. Este é u m p o n t o ainda
n ã o s u f i c i e n t e m e n t e d e s e n v o l v i d o na t e o r i a d o E s t a d o .

IV - AS FUNÇÕES DO E S T A D O : Intervenção Estatal e


Intervenção Pública.

A t e o r i a da d e r i v a ç ã o , c o l o c a n d o e m e v i d ê n c i a a q u e s t ã o da
f o r m a E s t a d o , p e r m i t i u o a v a n ç o b a s t a n t e r á p i d o n a análise d o s
p r o b l e m a s r e l a c i o n a d o s ás r e l a ç õ e s E s t a d o / c a p i t a l . A o m e s m o
t e m p o p e r m i t i u o e s t u d o m a i s s i s t e m á t i c o das f u n ç õ e s q u e o
Estado c u m p r e face ao c a p i t a l .
N e s t a seção d e n o s s o t r a b a l h o , t e n t a r e m o s e x p l i c i t a r m e l h o r
c e r t o s c o n c e i t o s q u e n o s p e r m i t i r ã o p a r t i r d a análise a b s t r a t a e ,
c h e g a r a o e s t u d o c o n c r e t o da a ç ã o e s t a t a l .
N e s t e s e n t i d o d i s c u t i r e m o s s u c e s s i v a m e n t e os s e g u i n t e s
p o n t o s : as relações E s t a d o / C a p i t a l o u as f u n ç õ e s d o E s t a d o ; a
i n t e r v e n ç ã o estatal e a i n t e r v e n ç ã o p ú b l i c a .

/. As funções do Estado

N o s s o p o n t o d e p a r t i d a c o n s i s t e na c o n s i d e r a ç ã o d e q u e a
r e l a ç ã o E s t a d o / c a p i t a l é o r g â n i c a . I s t o ao n í v e l m a i s geral e a b s t r a -
t o ; c o n t u d o n ã o m e n o s r e a l . A passagem d o a b s t r a t o a o c o n c r e t o
c o r r e s p o n d e à i n t r o d u ç ã o d e n o v a s d e t e r m i n a ç õ e s aos c o n c e i t o s j á
e x a m i n a d o s . P o r u m l a d o , já e x a m i n a m o s as relações e n t r e o s c o n -
ceitos de Estado e o de regime p o l í t i c o ; p o r o u t r o , v a m o s e x a m i -
n a r e r e l a c i o n a r a passagem d o c o n c e i t o d e c a p i t a l a o d e s o c i e d a d e .
M a i s e s p e c i f i c a m e n t e , da r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l à r e p r o d u ç ã o d a
sociedade.
A sociedade capitalista m o d e r n a — isto é, aquela d o m i n a d a
pelo m o d o de p r o d u ç ã o capitalista — não é h o m o g ê n e a . Cada
s o c i e d a d e está p r o f u n d a m e n t e m a r c a d a p o r sua h e r a n ç a h i s t ó r i c a
e pelas r e l a ç õ e s d e f o r ç a q u e se e s t a b e l e c e m d i n a m i c a m e n t e e m seu
i n t e r i o r e e x t e r i o r . A s s i m , os c o n c e i t o s d e r e g i m e p o l í t i c o , i n t e r -
venção estatal, intervenção pública, etc, t o m a m diferentes formas
s e g u n d o a r e a l i d a d e c o n c r e t a q u e se leve e m c o n t a .

A análise d a r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l ao n í v e l a b s t r a t o , c o n s i d e -
ra f u n d a m e n t a l m e n t e as c o n t r a d i ç õ e s i n e r e n t e s a o m o d o d e p r o d u -
ç ã o c a p i t a l i s t a . M a s estas e s t ã o imersas n o q u a d r o c o m p l e x o d e
u m a s o c i e d a d e h i s t o r i c a m e n t e d e t e r m i n a d a . S e m a p r e t e n s ã o de
d e s e n v o l v e r u m e s t u d o h i s t ó r i c o ( p o i s este n ã o é o o b j e t o d e s t e
t r a b a l h o ) q u e r e m o s esboçar os t r a ç o s p r i n c i p a i s q u e n o s p e r m i t a m
a v a n ç a r nesta d i r e ç ã o .

E m p r i n c í p i o , q u e r e m o s realçar a d i s t i n ç ã o e n t r e relações
sociais e r e l a ç õ e s sociais de p r o d u ç ã o . C o n s i d e r a m o s q u e e m se t r a -
t a n d o d o m o d o d e p r o d u ç ã o , estes d o i s c o n c e i t o s d e v e m se c o n -
f u n d i r ; m a s , a n í v e l m a i s c o n c r e t o , o c o n j u n t o de relações sociais
q u e r e g u l a m a r e p r o d u ç ã o d a s o c i e d a d e é m a i s a m p l o d o q u e o das
r e l a ç õ e s sociais de p r o d u ç ã o , c o n q u a n t o e s t e j a m e s t r e i t a m e n t e
v i n c u l a d o s u m a o o u t r o . P o r e x e m p l o : a r e p r o d u ç ã o da f a m í -
l i a ' ' " apesar d e d e t e r m i n a d a pelas r e l a ç õ e s c a p i t a l i s t a s de p r o d u -
ç ã o , o c o r r e s o b relações e s p e c í f i c a s " f o r a " das relações d e p r o d u -
ç ã o . A r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l i m p l i c a na r e p r o d u ç ã o da s o c i e d a d e e
vice-versa. A ação d o E s t a d o , visando à r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l ,
r e q u e r a i n t e r v e n ç ã o s o b r e o c o n j u n t o d a s o c i e d a d e . É desnecessá-
r i o d i z e r q u e a r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l e da s o c i e d a d e r e p r o d u z
automaticamente, o Estado.

A r e p r e s e n t a ç ã o da ação d o E s t a d o ( d e - m a n e i r a m a i s s i s t e m á -
t i c a ) e a p r e s e n t a d a através das " f u n ç õ e s " de a c u m u l a ç ã o e l e g i t i -
mação Elas n ã o são e x c l u s i v a s n e m , n e c e s s a r i a m e n t e , c o n t r a -
ditórias.

M e s m o q u e se possa q u a n t i f i c á - l a s , a m a t e m a t i z a ç ã o destas
f u n ç õ e s s i g n i f i c a u m a r e d u ç ã o q u e p o d e levar a i n t e r p r e t a ç ã o i n -
c o r r e t a s d a r e a l i d a d e . I s t o , p o r q u e , se i n t e r p e n e t r a m e, a m e s m a
a ç ã o d o E s t a d o , p o d e a p r e s e n t a r as d u a s f u n ç õ e s ao m e s m o t e m -
p o . Mas p o d e - s e a f i r m a r , " a p r i o r i " q u e a f u n ç ã o / a c u m u l a ç ã o é
d e t e r m i n a d a f u n d a m e n t a l m e n t e , pelas r e s t r i ç õ e s á a c u m u l a ç ã o ,
e n q u a n t o a f u n ç ã o / l e g i t i m a ç ã o o é pela r e p r o d u ç ã o s o c i a l . A f o r
m u l a ç ã o d e S a l a m a , s o b r e este p o n t o , é b a s t a n t e p r e c i s a : a f u n ç ã o /
a c u m u l a ç ã o c o n c e r n e ao E s t a d o e a f u n ç ã o / l e g i t i m a ç ã o , a o r e g i m e
político A ligação e n t r e estas f u n ç õ e s , s i t u a d a s e m n í v e i s d i -
f e r e n t e s de a b s t r a ç ã o , r e p r e s e n t a a " m e t a m o r f o s e " d o a b s t r a t o
ao concreto.
2. A Intervenção Estatal e a Intervenção Pública

A expressão " i n t e r v e n ç ã o " (ou i n t e r v e n c i o n i s m o ) e x p r i m e a


i d é i a d e separação e n t r e " a s o c i e d a d e , sua e s t r u t u r a e c o n ô m i c a e o
E s t a d o " , observa A l t v a t e r Este c o n c e i t o r e m e t e - n o s , p o r u m
l a d o , a c o n c e p ç ã o de e s t a d o ao e x t e r i o r d o c a p i t a l ; p o r o u t r o , a
c o n c r e t i z a ç ã o destas c a t e g o r i a s , c o r r e s p o n d e a separação e n t r e o
Estado e o C a p i t a l . E m o u t r o s t e r m o s , existe u m processo de " a u -
t o n o m i z a ç ã o " d o E s t a d o *^ ^ É p r e c i s a m e n t e esta a u t o n o m i z a ç ã o
q u e p e r m i t e a u t i l i z a ç ã o deste c o n c e i t o , e s p e c i f i c a n d o - o e, p r e e n -
n h e n d o - o de determinações concretas.
A r e l a ç ã o o r g â n i c a E s t a d o / C a p i t a l , d e f i n i d a a o p l a n o abs-
t r a t o , transforma-se em separação; é rearticulada através d o c o n -
c e i t o d e intervenção. O i n t e r v e n c i o n i s m o estatal c o r r e s p o n d e ,
e n t ã o , às r e a l i z a ç õ e s das p o s s i b i l i d a d e s d e f i n i d a s pelas f u n ç õ e s .
Estas e x p r i m e m o c o n j u n t o de p o s s i b i l i d a d e s e necessidades d e
a m b a s as p a r t e s ; i s t o é , d o E s t a d o e d o c a p i t a l . A i n t e r v e n ç ã o e x -
p r i m e , p o r t a n t o , suas r e a l i z a ç õ e s p a r c i a i s o u i n t e g r a i s . S o b este
aspecto, p o d e m o s d i s t i n g u i r , t a m b é m , dois níveis de intervenção:
a e s t a t a l e a p ú b l i c a ' ^ ^ ' . A p r i m e i r a , situa-se n u m p l a n o d e d e t e r -
m i n a ç ã o mais geral, abstrato; a segunda, a nível mais c o m p l e x o
das d e t e r m i n a ç õ e s c o n c r e t a s . S o b este p o n t o d e v i s t a , e x i s t e
c o r r e s p o n d ê n c i a e n t r e as f u n ç õ e s e a i n t e r v e n ç ã o d o E s t a d o .
Esta d i s t i n ç ã o p e r m i t e S a l a m a d e f i n i r c e r t o s l i m i t e s à i n -
t e r v e n ç ã o d o E s t a d o . Estes, são d e t e r m i n a d o s n o p l a n o a b s t r a t o
pelas r e s t r i ç õ e s e necessidades da a c u m u l a ç ã o d o c a p i t a l , c u j a d i n â -
m i c a d e p e n d e f u n d a m e n t a l m e n t e de t r ê s f a t o r e s : — o d i f e r e n c i a l
das t a x a s de l u c r o ; — a lei da b a i x a t e n d e n c i a l da t a x a d e l u c r o ; —
e o n í v e l a t i n g i d o pelas f o r ç a s p r o d u t i v a s ' ^ - ^ ^ Estes p o n t o s d e f i -
nem u m e i x o em t o r n o d o qual varia a i n t e r v e n ç ã o p ú b l i c a , " f o r -
m a de existência da intervenção e s t a t a l " .
P o r seu l a d o , a i n t e r v e n ç ã o p ú b l i c a d e p e n d e — ela t a m b é m
— " d e três fatores: o regime d e a c u m u l a ç ã o d o m i n a n t e ; o estado e
a e v o l u ç ã o p r e v i s t a da l u t a de classes e d e suas f r a ç õ e s ; e x p r e s s ã o
dessas l u t a s a n í v e l p o l í t i c o ' ^ " * ' " .
O c o n c e i t o de i n t e r v e n ç ã o p ú b l i c a deverá p e r m i t i r - n o s a
passagem do estudo teórico á interpretação da realidade
c o n c r e t a * ^ ^ ' . M a s , é necessário e n r i q u e c ê - l o u m p o u c o m a i s . D a
m a n e i r a c o m o o e s t u d a m o s p a r e c e - n o s r e s t r i t i v o . Os f a t o r e s
a c i m a c i t a d o s , — d e t e r m i n a n t e s da intervenção p ú b l i c a — p o d e m
ser e n t e n d i d o s c o m o o n ú c l e o d o m i n a n t e d a s o c i e d a d e c a p i -
talista.
o r e g i m e d e a c u m u l a ç ã o e x p r i m e a d i n â m i c a c o n c r e t a da rede
c o m p l e x a de circulação d o c a p i t a l , e s t r u t u r a d a , hierarquizada e
h i s t o r i c a m e n t e d e f i n i d a . Os d o i s o u t r o s f a t o r e s r e p r e s e n t a m os
aspectos o b j e t i v o s e subjetivos da estruturação social em t o r n o do
capital.
A s s o c i e d a d e s c o n s t i t u e m - s e ( a l é m deste n ú c l e o c e n t r a l ) d e o u -
t r o s e l e m e n t o s c o m o : o da f a m í l i a , o c h a m a d o s e t o r i n f o r m a l , o
c a m p e s i n a t o e t c . Estes e l e m e n t o s a r t i c u l a m - s e a t r a v é s d e u m a r e d e
d e r e l a ç õ e s sociais e m t o r n o das relações d e p r o d u ç ã o c a p i t a l i s t a .
A s s i m , " o e s t a d o e a e v o l u ç ã o p r e v i s t a d a l u t a d e c l a s s e s " n ã o se
e x p r i m e d e f o r m a l i n e a r e a u t o m á t i c a a n í v e l das r e l a ç õ e s p o l í t i -
cas. P o r o u t r o l a d o , a pressão das f o r ç a s sociais, a t r a v é s das r e l a -
ç õ e s p o l í t i c a s n ã o se t r a n s f o r m a , a u t o m a t i c a m e n t e , e m m e d i d a d e
política econômica.
A l é m d i s s o , a passagem d a l u t a d e classes p a r a sua e x p r e s s ã o
n o p o l í t i c o , d e p e n d e das i n s t i t u i ç õ e s e x i s t e n t e s , q u e n e m s e m p r e
p e r m i t e m a e x p r e s s ã o d o s interesses d o c o n j u n t o das classes so-
ciais . E m r e g i m e s d e t i p o a u t o r i t á r i o , apenas as classes o u f r a ç õ e s
das classes d o m i n a n t e s p o d e m se e x p r i m i r , e n q u a n t o q u e as d e m a i s
são d u r a m e n t e r e p r i m i d a s . N o s r e g i m e s l i b e r a i s , a r e a l i d a d e de-
m o n s t r a q u e o q u e o c o r r e c o r r e t a m e n t e é a e x p r e s s ã o das c o a l i s õ e s
e das a l i a n ç a s q u e a p a r e c e m a este n í v e l .
E n f i m , a passagem da r e l a ç ã o e n t r e as f o r ç a s p o l í t i c a s e a i n t e r -
v e n ç ã o p ú b l i c a e f e t i v a , deverá atravessar a e s t r u t u r a p o l í t i c a , t é c -
n i c a e a d m i n i s t r a t i v o - b u r o c r á t i c a q u e f i l t r a as a s p i r a ç õ e s expressas
8 as d e v o l v e m s o b f o r m a de p o l í t i c a s e c o n ô m i c a s . M a i s a i n d a ;
e s t a ú l t i m a f o r m a apresenta-se c o m o d i s c u r s o t é c n i c o , a t r á s d o
q u a l se e s c o n d e m os d e t e r m i n a n t e s f u n d a m e n t a i s da i n t e r v e n ç ã o
p ú b l i c a , a l é m d e d i v u l g a r e m a i d e o l o g i a d o interesse n a c i o n a l .
F i n a l m e n t e , é preciso observar que não c o n s i d e r a m o s , n o c o n -
c e i t o d e i n t e r v e n ç ã o p ú b l i c a , as r e g u l a m e n t a ç õ e s e a r b i t r a g e n s
r e a l i z a d a s p e l o E s t a d o , v i s a n d o à r e p r o d u ç ã o da t o t a l i d a d e s o c i a l .

V - CONCLUSÃO

N ó s e s t u d a m o s neste t r a b a l h o a t e o r i a d o E s t a d o s e g u n d o a
e s c o l a da d e r i v a ç ã o . A s s i m , d i s c u t i m o s , s u c e s s i v a m e n t e , o p r o c e -
d i m e n t o d e d e r i v a ç ã o , a relação E s t a d o / c a p i t a l , a f o r m a E s t a d o ,
o s n í v e i s d e a b s t r a ç ã o e a passagem d o E s t a d o ao r e g i m e p o l í t i c o .
D i s c u t i m o s , i g u a l m e n t e , a s i s t e m a t i z a ç ã o das f u n ç õ e s d o E s t a d o ,
sua t r a n s f o r m a ç ã o e m i n t e r v e n ç ã o estatal e p ú b l i c a . F i n a l m e n t e ,
t r a b a l h a m o s o c o n c e i t o de i n t e r v e n ç ã o p ú b l i c a de f o r m a a t o r n á -
lo c a p a z d e a p r e e n d e r a r e a l i d a d e c o n c r e t a .

A t í t u l o d e c o n c l u s ã o , f a r e m o s a l g u m a s o b s e r v a ç õ e s s o b r e es-
t a t e o r i a e sua a p l i c a ç ã o c o m o m e i o d e a n á l i s e e i n t e r p r e t a ç ã o da
realidade.
A t e o r i a de d e r i v a ç ã o f o i d e s e n v o l v i d a , v i s a n d o e s c l a r e c e r às
r e l a ç õ e s E s t a d o / c a p i t a l nas sociedades c a p i t a l i s t a s d e s e n v o l v i d a s .
A s s i m , sua u t i l i z a ç ã o p a r a o e s t u d o d e p a í s e s s u b d e s e n v o l v i d o s ,
p o d e aparecer u m p o u c o duvidosa.
Salama a f i r m a q u e n ã o p o d e m o s " d e d u z i r o E s t a d o e sua
n a t u r e z a n o s países " s u b d e s e n v o l v i d o s " u t i l i z a n d o os a v a n ç o s da
escola da d e r i v a ç ã o " . I s t o , pelas s e g u i n t e s r a z õ e s : a) " o m o d o de
p r o d u ç ã o c a p i t a l i s t a n ã o é o p r o d u t o das c o n t r a d i ç õ e s i n t e r n a s a
estas s o c i e d a d e s ( p . 2 9 ) ; b) " a d i f u s ã o das r e l a ç õ e s m e r c a n t i s é
i n c o m p l e t a e e s p e c í f i c a ( p . 3 0 ) " . Desta f o r m a , p r o p õ e q u e " a n a -
t u r e z a d o s E s t a d o s da p e r i f e r i a é c o n f e r i d a pelas r e l a ç õ e s q u e estes
ú l t i m o s d e v e m e s t a b e l e c e r c o m os E s t a d o s - N a c õ e s d o C e n t r o
(p.40)".
A d e d u ç ã o l ó g i c a d a f o r m a E s t a d o é r e a l i z a d a a n í v e l geral e a b s -
t r a t o . N ã o é ligada a q u a l q u e r f o r m a ç ã o social e m p a r t i c u l a r .
E n q u a n t o t e o r i a , refere-se a o m o d o d e p r o d u ç ã o c a p i t a l i s t a . A
gênese h i s t ó r i c a e espacial deste m o d o d e p r o d u ç ã o a r t i c u l a - s e e m
t o r n o da f o r m a ç ã o dos Estados-Nações, p r o f u n d a m e n t e diferencia-
d o s e n t r e s i . A s s i m , m e s m o p a r a os p a í s e s d o " C e n t r o " , a u t i l i z a -
ç ã o da t e o r i a da d e r i v a ç ã o e x i g e q u e se leve e m c o n t a a e v o l u ç ã o
d o m o d o d e p r o d u ç ã o c a p i t a l i s t a até a sua d o m i n a ç ã o c o m p l e t a e
o r i t m o da d i f u s ã o das relações m e r c a n t i s e m c a d a r e a l i d a d e es-
p e c í f i c a . O p r o c e s s o h i s t ó r i c o deverá p r e e n c h e r d e d e t e r m i n a ç õ e s
c o n c r e t a s os c o n c e i t o s d e r e g i m e p o l í t i c o , f u n ç õ e s d o E s t a d o e
i n t e r v e n ç ã o estatal e p ú b l i c a .
N o caso da " P e r i f e r i a " o u d o s países " s u b d e s e n v o l v i d o s " , d e v e -
m o s t e r em c o n t a o f a t o de que " o m o d o de p r o d u ç ã o capitalista
n ã o é o p r o d u t o das c o n t r a d i ç õ e s i n t e r n a s a estas s o c i e d a d e " , q u e
cai d e " p á r a - q u e d a s d o e x t e r i o r " , na e x p r e s s ã o d e S a l a m a . Q u e a
d i f u s ã o das r e l a ç õ e s m e r c a n t i s o c o r r e m u i t o m a i s t a r d e , m a s n u m
ritmo m u i t o m a i s a c e l e r a d o .
A s s i m , o E s t a d o n o s países s u b d e s e n v o l v i d o s é c a p i t a l i s t a , c u j a
f o r m a é a d e u m " c a p i t a l i s t a c o l e t i v o e m i d é i a " ; sua n a t u r e z a n ã o
é c o n f e r i d a d i r e t a m e n t e p e l o c a p i t a l , mas m e d i a d a p e l o sistema
mundial S u a f o r m a f e n o m e n a l n e m s e m p r e é a q u e l a das d e -
m o c r a c i a s b u r g u e s a s , p o r é m de d i t a d u r a s o u d e c e r t a s f o r m a s
de democracias m u i t o mais restritivas.
NOTAS

( 1 ) P u l a n t z a s ( 1 9 8 1 : p . 1 4 ) , a p r e s e n t a u m a c r í t i c a a estas idéias n o s
s e g u i n t e s t e r m o s : " C h i a m e m o s as coisas p e l o seu n o m e : n ã o se d e -
v e r i a f a l a r de n a t u r e z a d e classe, mas de u t i l i z a ç ã o d e classe d o Es-
t a d o . E u r e l e m b r a v a a expressão " d u p l a n a t u r e z a d o E s t a d o " , m a s
ela n ã o e x p r i m e a r e a l i d a d e destas análises: a v e r d a d e i r a n a t u r e z a
d o E s t a d o , é o p r i m e i r o E s t a d o ; a o u t r a , é u m h á b i t o . C o m o na
teoria p o l í t i c a secular, aquela d o Estado m e i o - h o m e m , m e i o a n i -
m a l : o v e r d a d e i r o E s t a d o - p o d e r , p a r a ela t a m b é m , n ã o é a m e t a d e
q u e está n o l a d o d o q u i n t a l ( n o l a d o das classes) mas o o u t r o , q u e
está d o l a d o d o j a r d i m . "
(2) U m a resenha e x c e l e n t e destes t r a b a l h o s e n c o n t r a - s e e m
H o l i o w a y 8 ( P i c c i o t t o ( 1 9 8 0 : p. 2 9 - 5 2 ) .
(3) A hnaior p a r t e d o d e b a t e f o i r e a l i z a d o e m l í n g u a a l e m ã , p o r t a n -
t o a d i s p o n i b i l i d a d e destes t e x t o s e m o u t r a s l í n g u a s é u m p o u c o l i -
m i t a d a . E n c o n t r a m o s em francês u m a coletânea organizada p o r
Jean Marie V i n c e n t ( 1 9 7 5 ) e i n t i t u l a d a de " L ' E t a t c o n t e m p o r a i n
et le m a r x i s m e " ; e m i n g l ê s , o r g a n i z a d a p o r H o l i o w a y & P i c c i o t t o
(1978) c o m o t í t u l o " S t a t e and C a p i t a l " ; em espanhol, organizada
por Heinz R u d o l f Sonntag e Héctor Valecillos (1982) c o m o t í t u l o
d e " E l E s t a d o e n el c a p i t a l i s m o c o n t e m p o r â n e o " ; e m p o r t u g u ê s
p u b l i c o u - s e o u t r a coletânea, mais restrita, sob o t í t u l o " E s t a d o e
C a p i t a l i s m o " de Claus O f f e , W i n f r i e d V o g t e Jürgen Frank.
( 4 ) Os t r a b a l h o s dos t r ê s p r i m e i r o s a u t o r e s f o r a m e s t u d a d o s na
c o l e t â n e a o r g a n i z a d a p o r J e a n - M a r i e V i n c e n t ( 1 9 7 5 ) e, o ú l t i m o ,
e m sua versão b r a s i l e i r a p u b l i c a d a n o n ? 2 6 dos E s t u d o s C e b r a p
(1980).
(5) R o m a m R o s d o i s k y ( 1 9 7 6 : p . 7 3 - 8 4 ) c h a m a a a t e n ç ã o s o b r e a
i m p o r t â n c i a desta c o n c e p ç ã o e m M a r x e p a r a a d i s t i n ç ã o e n t r e o
c a p i t a l e m geral e os c a p i t a i s m ú l t i p l o s .
( 6 ) Estas a t i v i d a d e s n ã o r e n t á v e i s p a r a os c a p i t a i s i n d i v i d u a i s
p o d e m ser i n t e r p r e t a d a s de o u t r o m o d o . O risco da a b o r d a g e m
r e a l i z a d a p o r A í t v a t e r é d e c o n f u n d i r sua i n t e r p r e t a ç ã o c o m a q u e -
la r e a l i z a d a pela e c o n o m i a b u r g u e s a . A necessidade d o E s t a d o
s e g u n d o os a u t o r e s neoclássicos aparece c o m a d i s t i n ç ã o e n t r e
bens p ú b l i c o s e b e n s p r i v a d o s . A m e r c a d o r i a e s t u d a d a s e g u n d o seu
v a l o r de u s o é q u e p e r m i t e esta d i s t i n ç ã o . Para A í t v a t e r e x i s t e m
bens o u serviços necessários à r e p r o d u ç ã o d o c a p i t a l e m g e r a l , c u j a
p r o d u ç ã o não é r e n t á v e l p a r a os c a p i t a i s p r i v a d o s . A s s i m , este
â n g u l o p r i v i l e g i a o a s p e c t o útil da p r o d u ç ã o p ú b l i c a .
(7) A l i á s , s e g u n d o S a l a m a , esta c o n t r a d i ç ã o n ã o se s o l u c i o n a . C o n -
s i d e r a j u s t a m e n t e q u e a o n í v e l das t r o c a s , o p r o c e s s o d e f e t i c h i z a -
ç ã o das m e r c a d o r i a s i m p e d e a s o l u ç ã o d e s t a c o n t r a d i ç ã o . É s o m e n -
t e nos m o m e n t o s d e c r i s e q u e surge c o m o p o s s i b i l i d a d e , a s o l u ç ã o
desta c o n t r a d i ç ã o .
(8) D e s e n v o l v e u - s e u m i m p o r t a n t e d e b a t e e m t o r n o desta l e i . N ã o
f a r e m o s u m a e x p o s i ç ã o d e s t e d e b a t e , os i n t e r e s s a d o s p o d e m r e c o r -
r e r ao e x c e l e n t e a r t i g o de G u i d o M a n t e g a ( 1 9 7 6 ) ; aos a r t i g o s d e
C o g o y , S w e e z y e M a t i c k r e u n i d o s n o l i v r o Teoria da acumulação
capitalista ( 1 9 7 7 ) ; a David Y a f f e ( 1 9 7 5 ) ; a Joseph G i l i m a n (1980)
e a Maurice A n d r e u (1980).
(9) Se c o n s i d e r a m o s q u e a a n á l i s e t e ó r i c a n ã o p r e s s u p õ e , necessari-
a m e n t e , a d i f e r e n c i a ç ã o e h i e r a r q u i z a ç ã o na t a x a d e l u c r o .
( 1 0 ) Deve-se n o t a r q u e , n ã o é, t a m b é m , u m E s t a d o C a p i t a l i s t a . Es-
t a passagem e x p r i m e u m a c o m p a r a ç ã o q u e n ã o é , n e c e s s a r i a m e n t e ,
justa.
(11) V e r , por exemplo, o artigo de José Luiz Soliz-Gonzales
(1980).
( 1 2 ) É necessário s u b l i n h a r q u e nós nos r e f e r i m o s n ã o s o m e n t e à
f o r m a E s t a d o m a s , t a m b é m , a o seu c o n t e ú d o e à d i n â m i c a das r e -
lações f o r m a x c o n t e ú d o .
(13) Jaime Sanchez-Susarrey ( 1 9 8 2 : p.13).
(14) i d e m , p.13
( 1 5 ) i d e m , p . 0 3 . V e r t a m b é m p . 7 7 o n d e a f i r m a : " A l u t a d e clas-
ses, p a r a n ó s , n ã o p o d e c o n s t i t u i r n e m o p o n t o d e p a r t i d a d a a n á -
lise da f o r m a E s t a d o n e m d a análise d o r e g i m e p o l í t i c o p e l o f a t o
d e q u e ela n ã o c o n s t i t u i u m d a d o i m e d i a t o e n ã o p r o b l e m á t i c o da
sociedade m o d e r n a " .
(16) i d e m , p.80. Ele p r o p õ e , ainda, o u t r o n í v e l : o governo. Diz
q u e " e x i s t e , e n t ã o , u m a d i s t i n ç ã o a ser f e i t a e n t r e a forma Estado,
o regime político e o governo: u m regime p o l í t i c o é, s o m e n t e , o
q u a d r o através d o q u a l a f o r m a E s t a d o a d q u i r e sua m a t e r i a l i z a ç ã o
no governo, o Estado, abstração concreta, existe c o m o Universal-
Singular no G o v e r n o " .
(17) V e r A n n i e L . C o t e B r u n o L a u t i e r ( 1 9 8 1 ) . Podemos, igual-
m e n t e , pensar a o m e n o s p a r c i a l m e n t e , nas a t i v i d a d e s q u e R o s a n -
v a l l o n ( 1 9 8 0 ) c h a m a d e e c o n o m i a s u b t e r r â n e a . Estas a t i v i d a d e s
p e r m i t e m a d e f i n i ç ã o daquelas que não seriam i m e d i a t a m e n t e
m e r c a n t i s , as q u a i s , s u b o r d i n a d a s e a r t i c u l a d a s âs relações c a p i t a -
listas c o n s t i t u e m u m a p a r c e l a da t o t a l i d a d e s o c i a l .
( 1 8 ) A q u e s t ã o s o b r e as f u n ç õ e s d o E s t a d o p o d e ser r e v i s t a n o s d i -
versos a r t i g o s c i t a d o s neste t r a b a l h o . E l a n o s leva à u m a l i s t a d e
f u n ç õ e s q u e p o d e m ser r e u n i d a s m u i t o b e m nestas duas f u n ç õ e s .
O p r i m e i r o a s i s t e m a t i z á - l a s f o i J a m e s O ' C o n n o r ( 1 9 7 7 ) . Para e l e ,
estas d u a s f u n ç õ e s s i t u a m - s e ao m e s m o niVel e se e x c l u e m
c o n t r a d i t o r i a m e n t e . Para S a l a m a , elas s i t u a m - s e a n í v e i s d i f e r e n t e s
d e a b s t r a ç ã o e n ã o são n e c e s s a r i a m e n t e c o n t r a d i t ó r i a s .
( 1 9 ) Pierre S a l a m a ( 1 9 8 0 : p . 1 3 8 e seguintes)
(20) Elmar Altvater (1975: p.135)
( 2 1 ) S o b r e este p o n t o , v e j a p o r e x e m p l o : N i c o s P o u l a n t z a s ( 1 9 7 5 )
e Jean-Marie V i n c e n t ( 1 9 7 9 ) .
( 2 2 ) Pierre S a l a m a ( 1 9 8 0 : p . 1 3 5 )
(23) I d e m , ( 1 9 8 3 : p.51)
(24) I d e m , ( 1 9 8 3 : p.74)
( 2 5 ) I d e m , ( 1 9 8 3 : p. 51 e s e g u i n t e s ) . E l e d e s e n v o l v e este p o n t o
considerando a intervenção no ciclo do capital e fora do ciclo. No
c i c l o , a intervenção c o n s t i t u e a " f u n ç ã o de regeneração ao c a p i t a l ' ;
f o r a d o c i c l o , ela c o n s t i t u e a " f u n ç ã o de gestão estatal da f o r ç a
de t r a b a l h o " .
(26) i d e m , ( 1 9 8 3 : p.28)
(27) I d e m , ( 1 9 8 3 : p.42)

BIBLIOGRAFIA

A L T V A T E R , E l m a r . " R e m a r q u e s sur q u e l q u e s p r o b l è m e s posés


par r interventionnisme é t a t i q u e " . In: V I N C E N T , Jean-Marie.
L'Etat contemporain et le marxisme. Paris, C E . P . /
MASPERO, 1975.
A N D R E U , M a u r i c e . " J o s e p h G i l m a n n et l ' a t t r a c t i o n K e y n é s i e n n e
dans la crise d u m a r x i s m e c o n t e m p o r a i n " . I n : G I L M A N N ,
J o s e p h M . Labaisse du taux de profit. Paris, E . D . I . 1 9 8 0 .
C O G O Y , M á r i o ; S W E E Z Y , Paul e M A T I C K , P a u l . Teoria da acu-
mulação capitalista. Porto, P U B L I C A Ç Õ E S ESCORPIÃO,
1977.
G I L L M A N , J o s e p h M . La baisse du taux de profit. Paris, E . D . I .
1980.
H I R S C H , J o a q u i m . " E l é m e n t s p o u r u n e t h é o r i e m a t é r i a l i s t e de
L ' E t a t " . I n : V I C E N T , J e a n - M a r i e . L' Etat contemporain et
le marxisme. Paris C E . P . / M A S P E R O , 1 9 7 5 .
H O L L O W A Y , J o n h e P I C C I O T T O , S o l . " E t a t et c a p i t a l : le d é b a t
a l l e m a n d sur la ' d é r i v a t i o n ' de l ' E t a t " . P a r i s , C . E . P . / M Á S -
P E R O 1 9 8 0 . Critiques de L' économei politique, nouvelle
série, janvier-mars.
L . C O T , A n n i e e L A U T I E R , B r u n o . " L a f r o n t i è r e du c a p i t a l .
L ' u s i n e e t la f a m i l l e a u - d e l à d u m i r o i r de la c r i e " . NON!
Repères pour le Socialisme, n? 9, septembre-octobre 1 9 8 1 .
L E F E B V R E , H e n r i . De L'Etat. Paris, U . G . E . / 1 0 - 1 8 , 1 9 7 4 .
4 vol.
M A N T E G A , G u i d o . " A lei da t a x a de l u c r o : A t e n d e n c i a da q u e d í
o l j a q u e d a da t e n d e n c i a ? " . I n : Estudos CEBRAP, Editora
Brasileira de Ciências L t d a . São P a u l o , Abril-ÍVlaio-Junho
1976.
O ' C O N N O R , J a m e s . USA: A crise do Estado Capitalista. R i o de
Janeiro, P A Z e T E R R A , 1977.
P A S U K A N I S , E u g e n e . La théorie générale du droit et le marxisme.
Paris, E . D . I . , 1 9 7 6 .
P O U L A N T Z A S , N i c o s . Hegemonia y domination en el Estado
moderno. C o r d o b a , S I G L O X X I , C u a d e r n o s d e Pasado y Pre-
sente, 1 9 7 5 . 3 e d .
P O U L A N T Z A S , N i c o s . L'Etat, le pouvoir le socialisme. Paris,
PUF/Quadrige, 1 9 8 1 . 2ed.
R O S A N V A L L O N , P i e r r e . " L e d é v e l o p p e m e n t de I' é c o n o m i e
s o u t e r r a i n e e t l ' a v e n i r des sociétés i n d u s t r i e l l e s " . Paris, L A
DOCUMENTATION F R A N Ç A I S E , 1 9 8 0 . Problèmes éco-
nomiques n° 1682. Paris, 1 6 j u i l l e t 1 9 8 0 .
R O S D O L S K Y , R o m a n . La genèse du "Capital" chez Karl Marx.
Paris, C . E . P . / M A S P E R O , 1 9 7 6 . t . l .
S A L A M A , Pierre. " E s t a d o e Capital. O Estado capitalista c o m o
a b s t r a ç ã o r e a ! " . Estudos CEBRAP n° 26. São Paulo, 1980.
SALAMA, P
S A L A M A , P i e r r e e M A T Í A S , G i l b e r t o . O Estado superdesenvol-
vido. São Paulo, B R A S I L Í E N S E , 1 9 8 3 .
S A N C H E Z - S U S A R R E Y , J a i m e . La forme Etat et la forme Mar-
chandise, (essai critique sur la théorie de la dérivation) Tese
3 ? c i c l o , Paris, I . E . D . E . S . Paris I, 1 9 8 2 .
S O L i Z - G O N Z A L E Z , José L u i z " L a q u e s t i o n d e L ' E t a t d a n s les
pays capitaliestes 'sous-developpés": quelques problèmes de
m é t h o d e " . P a r i s , C . E . P . / M A S P E R O , 1 9 8 0 . Critiques de l'éco-
nomie politique n? 13, n o u v e l l e s é r i e , o c t o b r e - d é c e m b r e
1980.
S O N N T A G , H e i n z R u d o l f e V A L E C I L L O S , H e c t o r . El Estado en
el capitalismo contemporáneo. México, S I G L O X X I , 1982
V I N C E N T , J e a n - M a r i e . L'Etat contemporain et le marxisme.Paús,
C.E.P./MASPERO, 1975.
V I N C E N T , J e a n - M a r i e . Les mensonges de L'Etat. Paris, L E S Y -
C O M O R E , 1979.
V O G T , W i n f r e i d ; F R A N K , J ü r g e n e O F F E , C l a u s . Estado e Ca-
pitalismo. Rio,de Janeiro, T E M P O B R A S I L E I R O , 1980.
W I R T H , M a r g a r e t h . " C o n t r i b u t i o n à la c r i t i q u e d e la t h é o r i e d u
capitalisme rnonopoliste d ' E t a t . " In: V I C E N T , Jean-Marie.
L' Etat contemporain et le marxisme. Paris, C E . P . / M A S -
PERO, 1975.
Y A F F E , D a v i d S. " L a t h é o r i e m a r x i s t e de la c r i s e , d u c a p i t a l e t de
l ' E t a t . " I n : V I N C E N T , J e a n - M a r i e . L'Etat contemporain et
le marxisme. Paris, C . E . P . / M A S P E R O , 1 9 7 5 .

Você também pode gostar