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UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA

MATHEUS MOREIRA MASSARDI

RODRIGO MANHÃES MOTTA MASSINI

AVALIAÇÃO DE PARÂMETROS DO PRÉ-TRATAMENTO COM ÁCIDO DILUÍDO


DO BAGAÇO DE MALTE VISANDO A PRODUÇÃO DE ETANOL 2G

VIÇOSA – MINAS GERAIS

2019
MATHEUS MOREIRA MASSARDI

RODRIGO MANHÃES MOTTA MASSINI

AVALIAÇÃO DE PARÂMETROS DO PRÉ-TRATAMENTO COM ÁCIDO DILUÍDO


DO BAGAÇO DE MALTE VISANDO A PRODUÇÃO DE ETANOL 2G

Relatório final, apresentado à Universidade


Federal de Viçosa, como parte das exigências
para a obtenção do título de Bacharel em
Engenharia Química.

Orientadora: Prof.ª Deusanilde de Jesus Silva.

VIÇOSA – MINAS GERAIS

2019
MATHEUS MOREIRA MASSARDI

RODRIGO MANHÃES MOTTA MASSINI

AVALIAÇÃO DE PARÂMETROS DO PRÉ-TRATAMENTO COM ÁCIDO DILUÍDO


DO BAGAÇO DE MALTE VISANDO A PRODUÇÃO DE ETANOL 2G

Relatório final, apresentado à Universidade


Federal de Viçosa, como parte das exigências
para a obtenção do título de Bacharel em
Engenharia Química.

APROVADO EM: 29 de novembro de 2019.

___________________________________ ___________________________________
Angélica Ribeiro da Costa Fábio de Ávila Rodrigues
Departamento de Química Departamento de Química
Universidade Federal de Viçosa Universidade Federal de Viçosa
Membro da banca avaliadora Membro da banca avaliadora

___________________________________ ___________________________________
Deusanilde de Jesus Silva Rejane de Castro Santana
Departamento de Química Departamento de Química
Universidade Federal de Viçosa Universidade Federal de Viçosa
Orientadora e presidente da banca Coordenadora da disciplina ENQ 490
avaliadora

VIÇOSA – MINAS GERAIS

2019
AGRADECIMENTOS

A Deus, por iluminar nosso caminho e nossos pensamentos a todo momento;

Às nossas famílias, pelo apoio incondicional e pelo suporte durante toda a graduação;

À nossa orientadora Deusanilde Silva, pelos grandes ensinamentos, por todas as soluções
logísticas, pela paciência e por se fazer sempre presente;

Aos professores Fábio Rodrigues, Angélica Ribeiro, Carlos Roberto Bellato, José Humberto de
Queiroz e Reinaldo Teófilo, pela cessão de laboratórios, de instrumentos e de equipamentos;

Ao Rômulo Mendonça e à Wegas Bier, pelo fornecimento do material de estudo;

Aos técnicos Abelardo Mendonça, Aloirta Silva, Márcio Alvarenga, José de Oliveira Neto,
Júlio César Nunes, José Alberto Cardoso e Jean Silva, e aos estudantes de pós-graduação
Wilson Cardoso, Paula Barbosa e Maurino Magno, pela solicitude na realização de análises,
pelo empréstimo de equipamentos e de instrumentos, pelos conselhos e por abraçarem a nossa
causa;

Aos colegas do Laboratório de Processos Industriais e Materiais (LABPIM), pela manutenção


de um ambiente leve e prazeroso, além do compartilhamento de dores e sucessos.
RESUMO

O bagaço de malte, um importante resíduo da indústria cervejeira, está experimentando


um aumento constante em sua geração no Brasil, devido ao desenvolvimento deste mercado,
que chegou a mil cervejarias em 2019. Dessa forma, surge a necessidade de buscar alternativas
para o reaproveitamento desse subproduto que hoje é utilizado, na maioria dos casos, em
alimentação animal devido ao seu conteúdo proteico. Contudo, este material também apresenta
elevado teor de fibras lignocelulósicas, tornando-o uma matéria-prima em potencial para
produção de etanol de segunda geração. Dessa forma, a realização de pré-tratamento adequado,
visando liberar os constituintes da matriz lignocelulósica para a posterior conversão em
açúcares fermentescíveis, seria uma etapa importante de uma pesquisa. Considerando estes
aspectos, os objetivos principais deste trabalho foram a caracterização da biomassa trabalhada
e a identificação de condições mais favoráveis para a etapa de pré-tratamento hidrotérmico
catalisada por ácido diluído, buscando a relação adequada entre a liberação de açúcares e a
produção de inibidores de fermentação (5-hidroximetilfurfural e furfural) visando a produção
de etanol de segunda geração. Para isso, com auxílio do Delineamento Composto Central
Rotacional (DCCR), foram avaliados os efeitos do diâmetro médio de partícula, da razão
massa/volume de alimentação e do tempo de reação. Para a caracterização, foi obtida a
composição, em base seca: 29,92% de hemiceluloses, 21,16% de proteínas, 20,80% de lignina
total, 15,99% de celulose, 8,33% de extrativos e 3,76% de cinzas. A avaliação desses
parâmetros do pré-tratamento ácido com DCCR proporcionou a criação de superfícies de
resposta para análise do efeito das variáveis e predição das condições mais adequadas. Foram
encontradas concentrações muito baixas para a produção de 5-hidroximetilfurfural (HMF) e de
furfural, consideradas desprezíveis em termos de inibição da fermentação. Assim, o modelo foi
maximizado para a liberação de açúcares, encontrando os valores de 524 µm, 11,59% e 38,4
minutos, para diâmetro médio de partícula, razão massa/volume e tempo reacional,
respectivamente. O teor de açúcares extraídos nestas condições seria de, aproximadamente,
203,3 mg de açúcares por grama de resíduo seco, significando eficiência de extração de 39,27%
dos carboidratos de partida no pré-tratamento, o que representa um resultado potencial para a
produção de etanol de segunda geração.

Palavras-chave: Biomassa lignocelulósica; HMF; Furfural; Segunda geração; DCCR.


ABSTRACT

Brewer’s spent grains, an important residue from the beer industry, has experienced
constant growth on its generation in Brazil in recent years, due to this market development,
which has reached a thousand breweries in 2019. Thus, it is necessary to look for alternatives
for reusing this by-product, which is currently used for animal feeding due to its protein content.
However, this material also contains high amounts of lignocellulosic fibers, giving to it the
potential to be a feedstock for second-generation ethanol production. For this purpose,
conducting adequate pretreatment to release lignocellulosic matrix constituents for later
conversion into fermentable sugars would be an important approach of a research. By
considering these aspects, the major aims of this work were the characterization of the studied
biomass and the identification of optimal conditions for the dilute acid catalyzed hydrothermal
pretreatment step, seeking proper ratio between the sugar release and the fermentation inhibitors
generated (5-hydroxymethylfurfural and furfural) aiming second generation ethanol
production. A Central Rotatable Composite Design (CRCD) was used to evaluate the effects of
average particle diameter, mass/volume feed ratio and reaction time. For the characterization,
the composition was, on dry basis: 29,92% hemicellulose, 21,16% protein, 20,80% total lignin,
15,99% cellulose, 8,33% extractives and 3,76% ash. The evaluation of these parameters of acid
pretreatment with CRCD provided response surfaces for analysis of the variables effect and
prediction of best conditions. Very low concentrations were found for HMF and furfural
production, being negligible in terms of fermentation inhibition. Thus, the model was
maximized only to sugar release, obtaining 524 µm, 11,59% and 38,4 minutes for average
particle diameter, mass/volume ratio and reaction time, respectively. In this case, total sugar
release would be around 203,3 mg per gram of dry residue, meaning extraction efficiency of
39,27% in the pretreatment, which represents a potential result for second generation ethanol
production.

Keywords: Lignocellulosic biomass; HMF; Furfural; Second generation; CRCD.


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 9

2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .............................................................................................. 11

2.1 Geração de bagaço de malte em cervejarias ....................................................................... 11

2.2 Biomassa lignocelulósica ................................................................................................... 13

2.2.1 Celulose ........................................................................................................................... 13

2.2.2 Hemiceluloses .................................................................................................................. 14

2.2.3 Lignina ............................................................................................................................. 15

2.2.4 Extrativos ......................................................................................................................... 16

2.2.5 Cinzas .............................................................................................................................. 17

2.2.6 Proteínas .......................................................................................................................... 17

2.3 Etanol de segunda geração ................................................................................................. 17

2.3.1 Pré-tratamento da biomassa ............................................................................................. 18

2.3.2 Hidrólise .......................................................................................................................... 19

2.3.3 Geração de inibidores de fermentação............................................................................. 20

2.3.4 Fermentação..................................................................................................................... 20

2.3.5 Etanol de segunda geração a partir de bagaço de malte .................................................. 21

2.4 Metodologia de superfícies de resposta .............................................................................. 22

2.5 Delineamento Composto Central Rotacional ..................................................................... 23

3 OBJETIVOS .......................................................................................................................... 24

3.1 Objetivo geral ..................................................................................................................... 24

3.2 Objetivos específicos .......................................................................................................... 24

4 MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................................... 25

4.1 Preparo do material ............................................................................................................. 25

4.2 Caracterização química do bagaço de malte....................................................................... 25

4.2.1 Determinação do teor de umidade ................................................................................... 26


4.2.2 Determinação do teor de proteínas .................................................................................. 26

4.2.3 Determinação do teor de cinzas ....................................................................................... 27

4.2.4 Determinação do teor de extrativos ................................................................................. 28

4.2.5 Determinação do teor de lignina insolúvel ...................................................................... 29

4.2.6 Determinação do teor de lignina solúvel ......................................................................... 30

4.2.7 Determinação dos teores de celulose e de hemiceluloses................................................ 30

4.3 Delineamento experimental ................................................................................................ 31

4.4 Pré-tratamento ácido da biomassa ...................................................................................... 32

4.5 Determinação de açúcares e de inibidores de fermentação ................................................ 33

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO .......................................................................................... 34

5.1 Caracterização química do bagaço de malte....................................................................... 34

5.2 Avaliação quantitativa dos ensaios do pré-tratamento com ácido diluído ......................... 35

5.3 Análise estatística de parâmetros do pré-tratamento ácido ................................................ 36

5.4 Determinação de condições favoráveis para o pré-tratamento com ácido diluído ............. 43

6 CONCLUSÃO ....................................................................................................................... 46

7 SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS................................................................. 47

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................... 48

APÊNDICE A – Tabelas de análise de variância (ANOVA) ................................................... 53


9

1 INTRODUÇÃO

A cerveja é uma bebida fermentada de baixo teor alcoólico e é uma das bebidas mais
produzidas e consumidas no mundo. Seu principal ingrediente é o malte de cevada, material
rico em amido que fornece os açúcares redutíveis que são substratos para as leveduras
produzirem etanol. Segundo a Lei da Pureza Alemã Reinheitsgebot (1512), a cerveja pura deve
ser composta somente de água, malte, lúpulo e fermento (leveduras), porém é comum a
utilização de outros tipos de cereais adicionados ao malte para sua fabricação, como milho e
arroz.

Considerando os últimos dados, compilados e disponíveis, da Associação Brasileira da


Indústria da Cerveja, o Brasil produziu 14,1 bilhões de litros desta bebida em 2016,
contribuindo com 1,6% do PIB do ano no país, empregando mais de 2,7 milhões de
trabalhadores e gerando 21 bilhões de reais em impostos, o que demonstra o tamanho e a força
desse ramo no cenário industrial nacional (CERVBRASIL, 2017). O Brasil atuou como o
terceiro maior produtor mundial da bebida no ano, atrás somente da China (41,4 bilhões de
litros) e dos Estados Unidos (22,1 bilhões de litros) (KIRIN HOLDINGS COMPANY, 2017).
O mercado cervejeiro no país vem evoluindo de forma exponencial nos últimos anos, fato
devido, principalmente, ao grande movimento de criação de micro cervejarias: em 2013 havia,
aproximadamente, 200 fábricas registradas, enquanto em 2018 esse número chegou a 889
(MARCUSSO; MÜLLER, 2019).

Um revés à alta produção é a grande quantidade de resíduos sólidos e líquidos gerados


nas indústrias. O principal e mais abundante é o bagaço do malte ou BSG (sigla do inglês
“brewer’s spent grain”) utilizado na etapa de brassagem, correspondendo a 85% de todos os
resíduos gerados (REINOLD, 1997). Como ilustração, na fabricação de 100 litros de cerveja
são gerados 20 kg do bagaço com 70% a 80% de umidade (KUNZE, 2014), isso equivale a uma
produção média de 2,82 milhões de toneladas do material por ano no Brasil, ou, em média, 0,71
milhões de toneladas do resíduo seco, considerando-se a produção total de cerveja em 2016. A
maior parte deste montante foi destinada à alimentação animal (bovinos, suínos, aves e
caprinos), e há pesquisas que avaliaram o potencial dessa adição à dieta dos mesmos (ALIYU;
BALA, 2011; GONÇALVES et al., 2009; MUSSATTO et al., 2006; PARPINELLI, 2016).
Porém, apesar das vantagens nutricionais, este uso tem apresentado problemas para os
produtores rurais, relacionados à dificuldade de armazenamento correto e ao alto teor de
umidade. A contaminação deste material por microrganismos, acentuada pelos fatores citados,
10

tem ocasionado enfermidades em bovinos, como intoxicação por fungos e micotoxinas, acidose
ruminal e botulismo (BRUST et al., 2015). Aliado à dificuldade de transporte e à possibilidade
de transformar o bagaço em produtos de maior valor agregado, a tendência é de redução dessa
aplicação e de estudo de novas formas de reaproveitamento.

Como alternativa, o bagaço de malte pode ser utilizado para produção de etanol de
segunda geração por conta de seu elevado teor de fibras lignocelulósicas que podem ser
convertidas em açúcares fermentescíveis. Assim como em outras fontes de biomassa, devem
ser realizados pré-tratamento e hidrólise para viabilizar a fermentação, processos em crescente
consolidação que podem ter diferentes formas de condução (MUSSATTO, 2014).
11

2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1 Geração de bagaço de malte em cervejarias

Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (2014), define-se


cerveja como “a bebida resultante da fermentação, mediante levedura cervejeira, do mosto de
cevada malteada em conjunto ou não com o extrato de malte, submetido previamente a um
processo de cocção adicionado de lúpulo”. Por sua vez, cevada malteada, também chamada de
malte, é o produto da germinação parcial da cevada sob condições controladas, com posterior
desidratação e/ou tostagem. (BRASIL, 2014)

Para começar o processo de fabricação da cerveja, o malte passa por duas etapas de
moagem, com diferentes ajustes, para proporcionar a exposição correta do grão e uma
distribuição granulométrica que atue de forma eficiente como camada filtrante posteriormente.
Se moído em partículas muito pequenas, a extração pode alcançar resultados melhores, porém
há riscos de entupimento na filtração. Por outro lado, malte pouco moído prejudica a extração
por não expor totalmente o interior do grão (LEWIS; YOUNG, 1995; VENTURINI FILHO,
2010). Os valores de granulometria comumente utilizados na indústria são apresentados na
Tabela 1.

Tabela 1 – Distribuição granulométrica do malte na indústria.

Componentes da moagem Malha (mm) Porcentagem em massa


Cascas 1,270 18-30
Sêmola grossa 1,010 8-11
Sêmola fina I 0,647 35
Sêmola fina II 0,253 17-21
Farinha 0,152 3-10
Pó de farinha Fundo 11-15
Fonte: TSCHOPE, 2001.

Em seguida, é realizada a mosturação, etapa na qual os grãos moídos entram em contato


com água em temperatura controlada, seguido de aquecimento em rampas de temperaturas
definidas, com objetivo de extrair os açúcares fermentescíveis e de favorecer a ação de
determinadas enzimas, formando assim o mosto cervejeiro. Entre as enzimas atuantes, podem
ser destacadas as peptidases e as amilases, as quais têm como substratos as proteínas e o amido,
respectivamente (VENTURINI FILHO, 2010). O grão de malte apresenta cerca de 50% a 55%
12

de amido, a principal fonte de açúcares para a cerveja, portanto, a mosturação é direcionada à


ação da α-amilase e β-amilase com, aproximadamente, 50% do tempo dedicado a estas. Ao
final do processo, é confirmada a hidrólise total do amido por teste do iodo e o mosto é aquecido
a 76 ºC para inativação das enzimas presentes (CEREDA, 1983; TSCHOPE, 2001;
VENTURINI FILHO, 2010).

Após a mosturação, o mosto é filtrado utilizando o próprio sólido presente como meio
filtrante, seguindo para a fervura e etapas posteriores. A camada filtrante é lavada com água a
75 ºC, prevista no volume desejado de mosto, para aumentar a extração de açúcar e melhorar o
rendimento do processo (VENTURINI FILHO, 2010). O resíduo sólido desta etapa é chamado
de bagaço de malte, um material constituído basicamente da casca que revestia os grãos e parte
do pericarpo. Além de alto teor proteico, há também elevadas quantidades de fibras, contendo
celulose, hemiceluloses e lignina. Um comparativo entre as composições encontradas para o
bagaço de malte em estudos anteriores é apresentado na Tabela 2.

Tabela 2 – Comparação entre diferentes caracterizações de bagaço de malte encontradas na


literatura.

Componente MUSSATTO; WILKINSON et PINHEIRO et


QIN et al., 2018
(% base seca) ROBERTO, 2006 al., 2014 al., 2019
Celulose 16,78 19,2 26,5 – 32,1 20,56
Hemicelulose 28,42 18,4 9,6 – 17,8 25,97
Lignina 27,78 9,9 8,9 – 14,5 19,57
Proteínas 15,25 26,6 14,3 – 20,2 22,44
Extrativos 5,82 5,2 12,9 – 29,8 5,30
Cinzas 4,60 2,7 1,93 – 3,73 3,54
Fonte: Elaborada pelos autores.

Como demonstrado na Tabela 2, o bagaço de malte é um material de composição


variada. Isso se deve, possivelmente, à grande diversidade de maltes e de receitas na indústria
cervejeira e aos diferentes métodos utilizados em sua caracterização. Desde o processo de
produção de malte até sua utilização na cervejaria, muitos fatores interferem nas características
do resíduo. Apesar das diferenças, os teores de celulose e de hemiceluloses do material são
elevados, portanto este pode ser considerado como matéria-prima lignocelulósica de baixo
custo (subproduto), com potencial para hidrólise em açúcares fermentescíveis com posterior
transformação em etanol (MUSSATTO, 2014; PINHEIRO et al., 2019).
13

2.2 Biomassa lignocelulósica

A biomassa é conceituada como toda matéria orgânica de origem renovável (animal ou


vegetal) que pode ser utilizada na produção de energia (ANEEL, 2005), como é o caso dos
biocombustíveis. Tratando-se da biomassa lignocelulósica, há um foco nas matérias-primas de
origem vegetal que são detentoras dessa matriz. Os resíduos da agricultura e os subprodutos do
processamento industrial de grãos e de outros vegetais são as principais fontes de biomassa
residual (BLASCHEK et al., 2010; CORTEZ et al., 2008; DRAPCHO et al., 2008; PANDEY,
2009), sendo a geração de energia uma aplicação sustentável e rentável.

Os principais componentes da biomassa lignocelulósica são a celulose, as hemiceluloses


e a lignina (elementos estruturais), ainda havendo presença de extrativos e de cinzas
(DRAPCHO et al., 2008). A partir de reações de separação, é possível obter esses constituintes
para aplicações gerais, agregando valor à matéria-prima. Uma de suas principais aplicações é a
produção de etanol de segunda geração, visto que os açúcares mais complexos existentes na
matriz de fibras podem ser convertidos em açúcares fermentescíveis, passíveis da ação do
metabolismo de microrganismos (ALIYU; BALA, 2011; DRAPCHO et al., 2008; MUSSATTO
et al., 2006; PANDEY, 2009).

2.2.1 Celulose

A ligação glicosídica do tipo β-(1→4) entre duas moléculas de D-glicopiranoses


(glicoses) forma um dímero conhecido como celobiose. A celulose é um polímero constituído
por celobioses conectadas entre si em cadeia linear (ROWELL, 2005). A configuração β da
ligação promove uma rotação de 180° em unidades alternadas de glicose, o que promove a
formação de cadeias lineares bastante rígidas (Figura 1), ao contrário do que acontece no amido,
que é outro polímero derivado da glicose mas apresenta ramificações e menor rigidez (LEWIN;
GOLDSTEIN, 1991). Seu grau de polimerização (DP) pode chegar a mais de 15.000 moléculas
de glicose, o que a torna um dos mais longos polissacarídeos conhecidos (EK et al., 2009).

A celulose é a macromolécula orgânica mais abundante no planeta Terra (ROWELL,


2005), e sua principal função na natureza é como componente estrutural em plantas,
apresentando-se, geralmente, entrelaçada a uma variedade de matrizes de polissacarídeos e
14

lignina (LEWIN; GOLDSTEIN, 1991). Essa macromolécula ainda pode ser encontrada em
outros organismos vivos, como algas, bactérias e fungos (EK et al., 2009).

Figura 1 – Estrutura da macromolécula de celulose.


Fonte: adaptado de KONTTURI et al., 2006.

A utilização da celulose na indústria envolve, majoritariamente, seu isolamento da


matriz lignocelulósica da biomassa e diminuição do seu grau de polimerização para utilização
como polímero fibroso ou estrutural, como é recorrente na fabricação de papel. Porém, há
também o aproveitamento da celulose advinda de resíduos orgânicos, como uma forma de
reduzir os impactos gerados pela disposição incorreta destes. Essas indústrias focam na
conversão da macromolécula em açúcares mais simples (como a glicose), podendo estes ser
utilizados como fonte de alimentos, na geração de etanol e na geração de produtos químicos
(LEWIN; GOLDSTEIN, 1991).

2.2.2 Hemiceluloses

Segundo Rowell (2005), as hemiceluloses são definidas como “o conjunto de polímeros


de polissacarídeos com grau de polimerização menor que a celulose (DP médio entre 100 e 200)
contendo, principalmente, os açúcares xilose, galactose, arabinose, manose, ácidos
hexourônicos e outros componentes em menores quantidades”. Esses açúcares são pentoses e
hexoses e estão em associação com a celulose na parede celular (LEWIN; GOLDSTEIN, 1991)
e, nas madeiras, costumam apresentar-se em 20% a 30% da massa seca total (EK et al., 2009;
LEWIN; GOLDSTEIN, 1991). As hemiceluloses apresentam estabilidades química e física
menores do que a celulose por serem estruturas amorfas e por possuírem menor massa molar,
sendo mais solúveis e mais susceptíveis à hidrólise ácida (EK et al., 2009; LEWIN;
GOLDSTEIN, 1991).
15

Exemplos dos principais monômeros presentes no grupo das hemiceluloses são


mostrados na Figura 2.

Figura 2 – Principais monômeros componentes da hemicelulose.


Fonte: ROWELL, 2005.

No bagaço de malte, os polímeros constituintes de hemiceluloses mais encontrados são


xilana e arabinana, formados pelos açúcares xilose e arabinose, respectivamente (MUSSATTO;
ROBERTO, 2006; PINHEIRO et al., 2019; QIN et al., 2018).

2.2.3 Lignina

As ligninas são estruturas poliméricas complexas e tridimensionais de diferentes


monômeros ligados por diferentes tipos de ligação química (LEWIN; GOLDSTEIN, 1991),
sendo um dos biopolímeros mais abundantes na natureza (EK et al., 2009). Elas são estruturas
hidrofóbicas (EK et al., 2009; ROWELL, 2005) e podem ser classificadas de diversas maneiras,
sendo as classificações mais comuns as de acordo com os elementos estruturais de seus grupos
precursores (ROWELL, 2005), que estão evidenciados na Figura 3.
16

Figura 3 – Estrutura química dos principais precursores das ligninas: (1) álcool cumarílico, (2)
álcool coniferílico e (3) álcool sinapílico.
Fonte: ROWELL, 2005.

Na construção da parede celular, as ligninas encontram-se entre as fibras e revestindo


as hemiceluloses, que, por sua vez, revestem as cadeias de celulose, funcionando como uma
liga que une e que dá firmeza à estrutura. Suas contribuições às células ainda se estendem à
proteção contra a degradação microbial e à resistência contra ação da água (EK et al., 2009).

2.2.4 Extrativos

Os extrativos são os componentes químicos de baixa massa molecular que podem ser
extraídos das paredes celulares insolúveis das células por sua solubilidade em água ou em
solventes orgânicos (EK et al., 2009; LEWIN; GOLDSTEIN, 1991). Esses componentes, em
sua maioria, são lipídios, ácidos graxos, terpenos, fenóis, esteroides, ceras e compostos
aromáticos (EK et al., 2009; LEWIN; GOLDSTEIN, 1991; ROWELL, 2005), sendo
responsáveis pela cor, pelo cheiro e pela durabilidade da biomassa (ROWELL, 2005).

Extrativos possuem diversas aplicações comerciais, como na medicina, na indústria de


cosméticos, na de preservativos e na de produtos químicos diversos (ROWELL, 2005). Porém,
em algumas indústrias como na de papel e celulose, são agentes prejudiciais no processo, sendo
essencial que seja feita sua retirada antes do processamento da matéria-prima. Caso não seja
feita de maneira apropriada, o papel pode adquirir odores indesejáveis e pode ter sua resistência
afetada pela má aderência entre as fibras de celulose (EK et al., 2009).
17

2.2.5 Cinzas

As cinzas são definidas como o conteúdo de sais minerais e de outros componentes


inorgânicos remanescentes na biomassa após combustão do material em temperatura de 575 ±
25°C. Esses compostos são derivados, majoritariamente, de potássio, de cálcio e de magnésio,
porém elementos como sódio, boro, manganês, cobre, zinco, etc. também podem ser
encontrados em menores quantidades, dependendo do tipo de material carbonizado (ROWELL,
2005). Estes elementos estão ligados à absorção de nutrientes essenciais para o crescimento dos
vegetais e representam uma pequena parte de sua massa em base seca (LEWIN; GOLDSTEIN,
1991).

2.2.6 Proteínas

Segundo Nelson e Cox (2002), “proteínas são polímeros resultantes da desidratação de


aminoácidos, e cada resíduo de aminoácido liga-se a seu vizinho por um tipo específico de
ligação covalente”. Apesar de pouca ocorrência nos materiais lignocelulósicos mais estudados,
como o bagaço de cana, as proteínas existem em grandes quantidades em subprodutos do
processamento de grãos e cereais, como é o caso do bagaço de malte. O malte de cevada, antes
do processamento, tem como principal tipo de proteína as hordeínas ou prolaminas, que
possuem função de armazenamento e que podem representar até 60% do total de proteínas do
grão (LINSKENS; JACKSON, 1988; MOLINA-CANO et al., 2001). Estas são solúveis apenas
em soluções alcoólicas 70 a 80%, portanto sendo pouco extraídas no processo de mosturação
da produção de cerveja (MOLINA-CANO et al., 2001; SGARBIERI, 1996). (NELSON; COX, 2002)

2.3 Etanol de segunda geração

Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (2018), etanol


de segunda geração é definido como aquele produzido a partir de matérias-primas
lignocelulósicas, por rotas bioquímicas. Dessa forma, é um combustível que não impacta
diretamente o uso de terras de plantio, uma vez que os materiais lignocelulósicos são a fonte
mais abundante de biomassa inutilizada, gerados como subprodutos de outros processos e
considerados como resíduos (PANDEY, 2009). (BRASIL, 2018)

Na produção de etanol convencional, também chamado de primeira geração, os açúcares


são extraídos diretamente da matéria-prima para a fermentação. Já no etanol de segunda
18

geração, deve ser feita a conversão da matriz lignocelulósica em açúcares fermentescíveis,


através de etapas de pré-tratamento e hidrólise enzimática ou ácida (DRAPCHO et al., 2008).
Dessa forma, pode-se representar esse processo de forma simplificada por meio do diagrama
de blocos apresentado na Figura 4.

Figura 4 – Processo produtivo para etanol de segunda geração.


Fonte: Adaptado de DRAPCHO et al., 2008.

2.3.1 Pré-tratamento da biomassa

O pré-tratamento da biomassa lignocelulósica tem por objetivos principais a liberação


de açúcares fermentescíveis e a exposição das fibras de celulose para a posterior hidrólise, como
demonstrado na Figura 5. Para um processo ideal, este deveria expor as fibras adequadamente,
proporcionar bons rendimentos para açúcares, minimizar a degradação de carboidratos e
consequente formação de inibidores de fermentação, utilizar condições brandas e materiais de
baixo custo, além de possibilitar reciclo de reagentes e de gerar poucos resíduos (DRAPCHO
et al., 2008). Entre as formas mais comuns, pode-se citar os tratamentos hidrotérmicos
catalisados ou não por ácido ou por base, ultrassom, explosão a vapor, explosão com amônia e
micro-ondas (DRAPCHO et al., 2008; MUSSATTO, 2014).
19

Figura 5 – Exposição esperada das fibras de celulose após o pré-tratamento.


Fonte: ANDRADE, 2017.

2.3.2 Hidrólise

O processo de hidrólise da biomassa pré-tratada pode ser ácido ou enzimático, sendo o


enzimático mais realizado industrialmente. O tratamento ácido geralmente é feito com ácido
sulfúrico e é muito eficiente, alcançando cerca de 90% de rendimento, porém utiliza reagentes
tóxicos e corrosivos, além de ser necessária a recuperação do ácido para tornar o processo
economicamente viável (PANDEY, 2009).

A hidrólise enzimática pode ser utilizada para minimizar esses problemas por meio da
utilização de um complexo enzimático denominado Celulase, o qual hidrolisa as fibras gerando
açúcares fermentescíveis. Essas enzimas são obtidas a partir de microrganismos capazes de
degradar celulose, como alguns fungos e bactérias. A hidrólise enzimática das hemiceluloses é
mais complexa, requerendo as chamadas hemicelulases, porém nas celulases comerciais
também é observada atividade hidrolítica para hemiceluloses, favorecendo altos rendimentos
para o processo, que podem chegar a mais de 95%. Por outro lado, alguns fatores dificultam a
aplicação industrial, como o elevado custo das enzimas, a longa duração (48 a 72 horas) e a
desativação catalítica por inibição das enzimas devido ao acúmulo de açúcares (DRAPCHO et
al., 2008; PINTO, 2010).
20

2.3.3 Geração de inibidores de fermentação

A geração de inibidores de fermentação durante o pré-tratamento e/ou hidrólise da


biomassa lignocelulósica está relacionada à degradação de seus componentes. A glicose,
advinda da celulose, e os açúcares de seis carbonos provenientes de algumas hemiceluloses
podem ser desidratados, formando o 5-hidroximetilfurfural (HMF), o qual ainda pode sofrer
decomposição gerando ácidos orgânicos como o levulínico e o fórmico. Os açúcares de cinco
carbonos extraídos das hemiceluloses, como a xilose e a arabinose, também podem sofrer
desidratação, formando o furfural. Há ainda os produtos de degradação da lignina, os quais são,
majoritariamente, compostos fenólicos (ALMEIDA et al., 2007).

Durante o tratamento ácido, os principais inibidores formados são os produtos de


degradação dos açúcares presentes, ou seja, HMF e furfural (DRAPCHO et al., 2008). Estes
são metabolizados pela levedura Saccharomyces cerevisiae e por outros microrganismos,
formando produtos tóxicos que inibem a fermentação alcoólica, retardando a fase lag e
reduzindo o rendimento em etanol (BOYER et al., 1992; PALMQVIST; HAHN-HÄGERDAL,
2000). O metabolismo dos dois compostos é similar, porém há evidências de inibição mais
intensa pelo furfural (PALMQVIST; HAHN-HÄGERDAL, 2000).

Para ocorrência de inibição significativa da fermentação, estes compostos devem estar


em concentrações acima de 4,0 g L-1 para o HMF (BAPTISTA, 2013; TAHERZADEH et al.,
2000) e de 1,0 g L-1 para o furfural (BOYER et al., 1992; LU et al., 2007; PALMQVIST et al.,
1999), sendo interessante buscar a mínima geração destes agentes durante o pré-tratamento e a
hidrólise da biomassa.

2.3.4 Fermentação

Após a etapa de hidrólise, pode ser realizada a fermentação alcoólica. Esta pode ser
conduzida por diferentes microrganismos, sendo os mais comuns Saccharomyces cerevisiae e
Zymomonas mobilis. Apesar de mais utilizada na produção de etanol convencional, a levedura
S. cerevisiae não metaboliza outros tipos de açúcares além da glicose, tornando-a menos efetiva
para etanol de segunda geração. Por outro lado, estudos com tecnologia de DNA recombinante
inseriram genes de Escherichia coli na bactéria Z. mobilis, possibilitando a fermentação de
21

xilose a etanol e, consequentemente, melhorando o rendimento do processo (DRAPCHO et al.,


2008).

O processo de fermentação pode ocorrer separadamente, logo após a hidrólise, ou de


forma simultânea com a hidrólise. Esta possibilidade surgiu para minimizar problemas da
realização separada dos processos, como a inibição das enzimas por acúmulo de açúcares.
Assim, foi possível alcançar maiores rendimentos de etanol utilizando menos enzimas,
diminuindo o custo do processo. Por outro lado, o controle de alguns parâmetros como pH,
concentração de substrato e temperatura deve ser rígido para possibilitar a compatibilidade entre
hidrólise e fermentação. Além disso, deve-se atentar aos possíveis inibidores gerados na
hidrólise, que podem prejudicar severamente o rendimento da fermentação (PANDEY, 2009).

2.3.5 Etanol de segunda geração a partir de bagaço de malte

A crescente busca por reaproveitamento de resíduos para geração de produtos com valor
agregado tornou o bagaço de malte uma potencial matéria-prima para o etanol de segunda
geração. Seus altos teores de celulose e de hemiceluloses despertaram o interesse de diversos
pesquisadores da área, que avaliaram diferentes condições para este processo buscando otimizá-
lo. Os rendimentos encontrados são muito variados, consequência não só dos processos
utilizados para pré-tratamento, hidrólise e fermentação, mas também da diversidade de maltes
existentes, fato que pode ser observado pela heterogeneidade das caracterizações realizadas
para o material (MUSSATTO, 2014; PINHEIRO et al., 2019).

Wilkinson et al. (2014) avaliaram o efeito do pré-tratamento hidrotérmico catalisado na


liberação de açúcares e na formação de inibidores. Foram estudados diversos ácidos e bases
diluídos a 121 ºC por 30 minutos, com carregamento de sólidos 25% massa/volume, além de
posterior sacarificação enzimática. Os melhores resultados foram alcançados para os ácidos
clorídrico e sulfúrico, porém com formação superior à obtida com outros catalisadores de HMF
(0,23 g L-1 no tratamento com ácido sulfúrico e 0,44 g L-1 no tratamento com ácido clorídrico)
e de furfural (0,46 g L-1 no tratamento com ácido sulfúrico e 0,41 g L-1 no tratamento com ácido
clorídrico). Ainda assim foram obtidos rendimentos próximos a 70% do etanol teórico. (WILKINSON et al., 2014)

Pinheiro et al. (2019) focaram seu estudo na razão massa/volume do carregamento de


sólidos, utilizando pré-tratamento hidrotérmico sem catalisador (água, 170 ºC, 5 minutos) e
22

sacarificação enzimática. O melhor cenário apresentado foi para carga de 25% sólidos,
fornecendo um rendimento de 94% em etanol. (PINHEIRO et al., 2019)

Ravindran et. al (2018) avaliaram as diferentes formas de pré-tratamento buscando


encontrar o melhor em termos de extração dos açúcares do bagaço. Para isso, foram comparados
os pré-tratamentos utilizando ácido diluído, explosão a vapor, explosão de fibra por amônia,
cloreto férrico, organosolv e alcalino com micro-ondas. Os melhores resultados, em termos de
açúcares redutores, foram encontrados para o tratamento alcalino com micro-ondas (228,78 mg
g-1), seguido da explosão de fibra por amônia (211,2 mg g-1) e do ácido diluído (208,8 mg g-1)
que, apesar de bom rendimento, provocou também a formação de furfural (17 mg g-1). (RAVINDRAN et al., 2018)

2.4 Metodologia de superfícies de resposta

A Metodologia de Superfícies de Resposta (MSR) compreende um grupo de técnicas


estatísticas e matemáticas para a construção e a exploração de modelos empíricos. A partir do
delineamento do experimento e de sua análise, é possível relacionar o comportamento das
respostas obtidas (outputs/saídas) e das variáveis independentes (inputs/entradas) analisadas
(BOX; DRAPER, 1987).

Na intenção de demonstrar essas superfícies visualmente em gráficos tridimensionais, é


feita a construção de um modelo matemático que descreva os comportamentos observados. Esse
modelo permitirá a construção da MSR e, nesse ponto, é feita a otimização do sistema, onde
busca-se maximizar ou minimizar alguma resposta. Por último, faz-se necessário avaliar se o
modelo pronto é realmente adequado (BARROS NETO et al., 1995; MYERS;
MONTGOMERY, 1995). Geralmente, essa avaliação é feita a partir de análises de regressão e
de variância do modelo encontrado em relação aos dados experimentais.

Em relação à confecção do modelo matemático que descreve a relação entre variáveis


de entrada e saída, há uma série de exemplares na literatura e muitas aplicações. Box e Draper
(1987) descrevem a “Aproximação de Segunda Ordem” como uma aproximação bem eficaz da
representação de um experimento para superfície de resposta quadrática. Ele é relativamente
simples e é demonstrado na Equação 01.

𝑓(𝑥, 𝛽) = 𝛽0 + 𝛽1 𝑥1 + 𝛽2 𝑥2 + 𝛽11 𝑥12 + 𝛽22 𝑥22 + 𝛽12 𝑥1 𝑥2 + 𝑒 (01)


23

Em que: 𝑓(𝑥, 𝛽) é a resposta obtida para um par de entradas; 𝑥𝑖 são as variáveis de


entrada; 𝛽𝑖 são parâmetros empíricos determinados a partir dos dados de entrada e saída; e é o
erro puro.

2.5 Delineamento Composto Central Rotacional

O Delineamento Composto Central Rotacional (DCCR) é uma técnica de design


experimental muito popular que permite a plotagem de superfícies de respostas em modelos de
segunda ordem. Ele compreende-se pela união de uma análise fatorial 2k (onde k é o número
de variáveis independentes), do uso de 2k pontos axiais de distância α do ponto central e de nc
pontos centrais (MYERS; MONTGOMERY, 1995). Não são realizadas replicatas em todas as
corridas deste tipo de análise, o que é uma vantagem na confecção de experimentos muito
dispendiosos ou complexos em relação à rentabilidade dos mesmos. Tal possibilidade deve-se
ao número de repetições somente nos pontos centrais, e elas possibilitam a produção de um
bom perfil para a função estatística obtida, minimizam o erro quadrático médio integrado e dão
robustez ao design, que se torna insensível a “valores ruins” obtidos por outros pontos do
experimento (BOX; DRAPER, 1987). Deve-se utilizar pelo menos 3 a 5 corridas no ponto
central para que se evite equívocos na análise, entretanto, quanto maior esse número, mais
confiável ela é (MYERS; MONTGOMERY, 1995).

A determinação do α é feita a partir da Equação 02.

4
𝛼 = √2𝑘 (02)

Nota-se que todos os pontos analisados, fatoriais e axiais, são equidistantes em relação
ao ponto central. Para k = 2, isso pode ser visualizado em um plano cartesiano. Para k = 3, a
visualização é feita num cubo. Porém, ainda se pode generalizar esses dois casos num design
esférico, onde os pontos são k0,5 distantes do ponto central (para k = 3, o valor é aproximado).

Produzido o experimento a partir deste planejamento, faz-se possível a determinação


das superfícies de respostas dos eventos e a análise da confiabilidade dos dados.
24

3 OBJETIVOS

3.1 Objetivo geral

Este trabalho tem como objetivo geral a avaliação de três parâmetros na determinação
de uma condição mais favorável à liberação de açúcares fermentescíveis e de inibidores de
fermentação para a produção de etanol de segunda geração, utilizando pré-tratamento ácido. Os
parâmetros são: razão entre massa de resíduo e volume de solução, granulometria do bagaço e
tempo de reação. Foi utilizado o planejamento experimental DCCR (Delineamento Composto
Central Rotacional) para a aferição estatística do experimento.

3.2 Objetivos específicos

• Determinar a composição química do bagaço de malte;


• Extrair açúcares fermentescíveis do bagaço de malte por pré-tratamento com ácido diluído;
• Caracterizar as frações extraídas;
• Calcular o rendimento dos processos de extração;
• Determinar uma condição ótima para o pré-tratamento ácido;
• Avaliar o potencial de utilização do resíduo para a produção de etanol de segunda geração.
25

4 MATERIAL E MÉTODOS

4.1 Preparo do material

O bagaço de malte utilizado, de tipo pilsen, foi fornecido pela cervejaria Wegas Bier,
situada em Cajuri – MG. O material foi coletado logo após a filtração do mosto e armazenado
sob refrigeração por um dia, quando foi manipulado. Foi realizada uma prensagem manual do
bagaço com objetivo de retirar o excesso de água, seguido de secagem em estufa (Nova Ética,
400 ND) a 60 ± 3 °C até possuir teor a.s. (absolutamente seco) superior a 90%.

Após seco, o material passou por moagem em moinho tipo Wiley e classificado em
sistema de peneiras Bertel utilizando mesh 28, 32, 35, 42, 48 e 60. As frações de topo e de
fundo não foram utilizadas nos procedimentos realizados.

4.2 Caracterização química do bagaço de malte

A caracterização química do bagaço de malte foi feita da forma apresentada na Figura


6. A partir do bagaço de malte seco, foram feitas análises quantitativas dos teores de extrativos,
de lignina solúvel, de lignina insolúvel, de celulose, de hemiceluloses (xilana e arabinana), de
cinzas e de proteínas. A descrição de cada método com os respectivos cálculos é demonstrada
a seguir.
26

Figura 6 – Sequência utilizada na caracterização química do bagaço de malte.


Fonte: elaborado pelos autores.

4.2.1 Determinação do teor de umidade

A determinação de umidade no material cru e frações posteriores foi realizada em um


analisador de umidade (Shimadzu, MOC63 UniBloc), utilizando 0,5 a 1,0 g de amostra por
análise.

4.2.2 Determinação do teor de proteínas

Para determinação do teor de proteínas do bagaço de malte, foi utilizado o método de


Kjeldahl, adaptado do Laboratório Nacional Agropecuário, código MET POA/11/02/01
(ANDRADE et al., 2013). Este método quantifica o teor de nitrogênio total na amostra, sendo
este convertido em teor de proteínas utilizando fator de conversão adequado. Para o bagaço de
malte, o fator utilizado foi 6,25, assim como nos estudos realizados por Pinheiro et al. (2019),
Wilkinson et al. (2014) e Mussatto e Roberto (2006).

Foram pesados, em triplicata, aproximadamente 0,5 g de amostra em papel livre de


nitrogênio, que foi colocado em tubo de digestão. Para o ensaio em branco, foi utilizado apenas
27

o papel. Foram adicionados 10 mL de mistura contendo ácido sulfúrico concentrado, sulfato de


cobre e sulfato de potássio, e, então, os tubos foram aquecidos, gradativamente, permanecendo
por 15 minutos a cada 50 °C. Após atingir 400 °C, a amostra foi digerida até apresentar aspecto
límpido de cor azul-esverdeada. Após a digestão, os tubos foram resfriados e foram adicionados
10 mL de água destilada para evitar a cristalização.

A destilação foi realizada em destilador de nitrogênio (Tecnal, TE-036/1). Foi acoplado


ao aparelho frasco erlenmeyer contendo 10 mL de solução de ácido bórico 4% e foi adicionada
solução de NaOH 50% até que o conteúdo do tubo ficasse negro, momento em que foi ligada a
alimentação de vapor de água. Após completa destilação da amônia, o frasco coletor foi titulado
com solução 0,1 M de ácido clorídrico utilizando vermelho de metila como indicador.

Para o cálculo do teor de proteínas, foi utilizada a Equação 03.

(𝑉𝐿 − 𝑉𝐵 ) ∗ 𝑁 ∗ 0,014 ∗ 𝐹 (03)


𝑇𝑃(%) = ∗ 100
𝑀𝑎 ∗ 𝑇𝐴𝑆

Em que: TP = teor de proteínas, %; VB = volume gasto de HCl 0,1 M na titulação em


branco, mL; VL = volume gasto de HCl 0,1 M na titulação da amostra, mL; N = concentração
molar do HCL usado na titulação, mol L-1; F = fator de conversão; TAS = teor a.s.; Ma = massa
de amostra utilizada, g.

4.2.3 Determinação do teor de cinzas

O teor de cinzas do material foi determinado a partir da metodologia NREL/TP-510-


42622 (SLUITER et al., 2008). Três amostras de 1,0 g do bagaço de malte moído com
granulometria entre 42 e 60 mesh foram inseridas em três cadinhos de porcelana previamente
tarados em mufla (Jung, 0612) por 2 h a 550 ± 25 °C, dessecados à temperatura ambiente e
pesados em balança analítica (TKS, FA2004C), com precisão de 0,1 mg.

Os cadinhos contendo o material foram inseridos na mufla a 550 ± 25 °C por 8 h até


completa calcinação. Em seguida, foram colocados em dessecador até alcançada temperatura
ambiente e, então, pesados para determinação da massa de amostra remanescente, referente aos
componentes minerais (cinzas) do material, sendo seu teor determinado pela Equação 04.
28

𝑚2 − 𝑚1 (04)
𝑇𝐶 (%) = ∗ 100
𝑀𝑎 ∗ 𝑇𝐴𝑆

Em que: TC = teor de cinzas da amostra, %; m1 = massa do cadinho tarado, g; m2 =


massa do cadinho com amostra calcinada, g; TAS = teor a.s.; Ma = massa de amostra, g.

4.2.4 Determinação do teor de extrativos

A metodologia utilizada na determinação do teor de extrativos do material foi adaptada


da metodologia NREL/TP-510-42619. Foi pesada, em balança analítica (Shimadzu, ATY224
UniBloc), com precisão de 0,1 mg, uma amostra de 2,6 g do bagaço de malte moído com
granulometria entre 42 e 60 mesh, que foi inserida em cartucho de papel filtro para extração em
aparato soxhlet. Foram utilizados 150 mL de etanol 80% v/v como solvente extrator, que foram
inseridos em balão de fundo chato de 250 mL previamente seco em estufa a 105 ± 3 °C por 2
h. O balão foi colocado em manta de aquecimento, o aparato foi montado e o procedimento de
extração ocorreu por 8 h, contabilizando a partir do primeiro ciclo de viragem do solvente pelo
sifão, totalizando 24 ciclos (três por hora).

Passado o período de extração, o balão contendo solvente e extrativos foi colocado


novamente na estufa a 105 ± 3 °C para retirada do solvente até massa constante. A massa final
foi anotada e o teor de extrativos foi determinado a partir da Equação 05. O procedimento foi
conduzido em duplicata.

𝑚2 − 𝑚1 (05)
𝑇𝐸 (%) = ∗ 100
𝑀𝑎 ∗ 𝑇𝐴𝑆

Em que: TE = teor de extrativos da amostra, %; m1 = massa do balão tarado, g; m2 =


massa do balão com extrativos e sem solvente, g; TAS = teor a.s.; Ma = massa de amostra, g.

O procedimento utilizado para extração, porém, também retira proteínas da amostra,


principalmente as hordeínas, as quais são solúveis em etanol 70 a 80% (SGARBIERI, 1996).
Desta forma, foi realizada uma análise Kjeldahl no material sem extrativos, assim como
detalhado no item 4.2.2, para possibilitar a correção do teor de extrativos do material e o cálculo
do teor real, utilizando a Equação 06.

𝑇𝑅𝐸 (%) = 𝑇𝐸 − (𝑇𝑃 − 𝑇𝑃𝑆𝐸) (06)


29

Em que: TRE = teor real de extrativos da amostra, %; TE = teor de extrativos contendo


proteínas, %; TP = teor de proteínas do material cru, %; TPSE = teor de proteínas no material
livre de extrativos, %.

4.2.5 Determinação do teor de lignina insolúvel

O método utilizado para determinação da lignina insolúvel do bagaço de malte foi o


método Klason, descrito por Gomide e Demuner (1986), com uma metodologia adaptada à
proposta pela TAPPI T222 os-74. Esta adaptação foi feita buscando-se a utilização de uma
menor massa de amostra e a otimização do tempo de processo. (GOMIDE; DEMUNER, 1986)

Foram pesadas 3 alíquotas (previamente secas e com teor a. s. determinado) de cerca de


0,3 g do material, com granulometria entre 42 e 60 mesh e livre de extrativos, diretamente em
3 tubos de ensaios reacionais e, em seguida, 3,0 mL de ácido sulfúrico 72% v/v resfriado foram
adicionados em cada um. Os tubos foram inseridos em um suporte e colocados em banho
termostático com recirculação (Matoli, 170M020), controlado a 30 °C por 60 minutos. O
conteúdo dos frascos foi agitado manualmente a cada 10 minutos utilizando bastonetes de vidro
para homogeneização do meio reacional, buscando promover a hidrólise completa.

Após decorridos os 60 minutos, os hidrolisados foram transferidos para frascos de tipo


penicilina, havendo seguinte adição de 84,0 mL de água destilada em cada um. Os frascos foram
fechados com tampa de borracha e lacrados com lacre de alumínio para vedação hermética. Em
seguida, foram inseridos em reator pressurizado, onde foi feita a reação a, aproximadamente,
120 °C e por 50 minutos.

Na sequência, foi feita a filtragem a vácuo dos hidrolisados em cadinhos de vidro


sinterizado com manta de amianto de 2 g. Eles foram previamente secos em estufa Nova Ética
a 105 ± 3 °C até massa constante. Os sólidos presentes em cada cadinho foram lavados com
água destilada para a remoção do ácido residual durante a filtragem e, em seguida, os cadinhos
foram levados à estufa para secagem até massa constante a 105 ± 3 °C e pesados, sendo a massa
obtida referente à lignina insolúvel da amostra. Os filtrados tiveram seus volumes completados
para 500 mL e foram armazenados em frascos âmbar, sendo utilizados para determinação dos
teores de lignina solúvel, de celulose e de hemiceluloses presentes.

O teor de lignina insolúvel presente na amostra seca foi determinado pela Equação 07.
30

(m2 − m1 ) ∗ (1 − 𝑇𝐸) (07)


TLI (%) = ∗ 100
Ma ∗ TAS

Em que: TLI = teor de lignina insolúvel da amostra, %; m1 = massa do cadinho seco


antes da filtragem, g; m2 = massa do cadinho pós filtragem e secagem (contendo a lignina
insolúvel), g; Ma = massa de amostra livre de extrativos, g; TAS = teor a.s.; TE = teor de
extrativos.

4.2.6 Determinação do teor de lignina solúvel

O teor de lignina solúvel da amostra foi determinado a partir da utilização da


metodologia proposta por Goldschmid (1971). Os filtrados obtidos na etapa de determinação
do teor de lignina solúvel tiveram suas absorbâncias analisadas em espectrofotômetro UV-vis
Agilent 8453 nos comprimentos de onda de 215 e 280 nm, utilizando solução de ácido sulfúrico
0,5% v/v como “branco”. (GOLDSHMID, 1971)

Os valores de absorbância obtidos foram utilizados na Equação 08 para determinação


dos resultados.

[(4,538 ∗ 𝐴215 ) − 𝐴280 ] ∗ 0,5 ∗ (1 − 𝑇𝐸) (08)


𝑇𝐿𝑆 (%) = ∗ 100
300 ∗ 𝑀𝑎 ∗ 𝑇𝐴𝑆

Em que: TLS = teor de lignina solúvel, %; A215 = absorbância obtida no comprimento


de onda de 215 nm; A280 = absorbância obtida no comprimento de onda de 280 nm; Ma = massa
de amostra livre de extrativos utilizada, g; TAS = teor a.s.; TE = teor de extrativos.

4.2.7 Determinação dos teores de celulose e de hemiceluloses

As determinações dos teores de celulose e de hemiceluloses seguiram metodologia


adaptada à proposta na NREL/TP-510-42618 (SLUITER et al., 2012). Estas foram conduzidas
a partir de análise em cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC), no cromatógrafo
Shimadzu modelo Prominence, utilizando o hidrolisado filtrado obtido previamente na
determinação do teor de lignina insolúvel da amostra (método Klason). Foram quantificados os
monômeros glicose, xilose e arabinose. As condições de análise foram: coluna Phenomenex
Rezex RPM-Monossacharide, fase estacionária de chumbo, fase móvel 85% água, 15%
31

acetonitrila, temperatura 80 °C, fluxo 0,85 mL min-1, por 18 minutos, com quantificação por
detector evaporativo com espalhamento de luz (ELSD).

No cálculo do teor destes constituintes, levou-se em consideração a diluição feita no


processo da quantificação de lignina. Os valores reais foram calculados através da Equação 09.

𝐶𝑀𝐻𝑃𝐿𝐶 ∗ 𝑉 ∗ 𝐹𝐷 ∗ (1 − 𝑇𝐸) (09)


𝑇𝑀 (%) = ∗ 100
𝑀𝑎 ∗ 𝑇𝐴𝑆

Em que: TM = teor do monômero, %; TE = teor de extrativos; CMHPLC = concentração


do monômero obtida no HPLC, mg mL-1; Ma = massa de amostra livre de extrativos, mg; V =
volume de hidrolisado, mL; TAS = teor a.s.; FD = fator de diluição.

Para converter os teores de monômeros nos teores de seus respectivos polímeros, foi
utilizada a Equação 10 com o fator de correção. Para os teores de celulose, de xilana e de
arabinana, foram considerados os teores de glicose, de xilose e de arabinose, respectivamente.
No cálculo do teor de celulose, o fator é 0,9, enquanto, para xilana e arabinana, este é 0,88.
Além disso, o teor de hemiceluloses é considerado como a soma dos teores de xilana e de
arabinana, seus principais polímeros constituintes.

𝑇𝑃𝐿 (%) = 𝑇𝑀 ∗ 𝐹𝐶 (10)

Em que: TPL = teor do polímero, %; TM = teor do monômero, %; FC = fator de correção


para cada polímero.

4.3 Delineamento experimental

O planejamento dos experimentos foi realizado utilizando delineamento composto


central rotacional (DCCR) com quatro repetições no ponto central e três variáveis
independentes: granulometria do bagaço (DP), razão entre massa de amostra e volume de
solução (Rmv) e tempo de reação (T). Tais variáveis foram definidas por serem de grande
importância para o dimensionamento de equipamentos em uma possível aplicação industrial.
As matrizes codificada e decodificada são apresentadas na Tabela 3. Para três variáveis, o valor
de alfa é aproximadamente 1,68 conforme pode ser calculado pela Equação 02 apresentada
anteriormente. Além disso, o ponto central foi definido para diâmetro médio de partícula 390
µm, 20% massa/volume e 30 minutos de tratamento.
32

Tabela 3 – Matrizes obtidas no delineamento experimental.

Valores codificados Valores decodificados


Ensaio
DP Rmv T DP (µm) Rmv (%) T (min)
1 -1 -1 -1 310 15 25
2 +1 -1 -1 470 15 25
3 -1 +1 -1 310 25 25
4 +1 +1 -1 470 25 25
5 -1 -1 +1 310 15 35
6 +1 -1 +1 470 15 35
7 -1 +1 +1 310 25 35
8 +1 +1 +1 470 25 35
9 -α 0 0 255,46 20 30
10 +α 0 0 524,54 20 30
11 0 -α 0 390 11,59 30
12 0 +α 0 390 28,41 30
13 0 0 -α 390 20 21,59
14 0 0 +α 390 20 38,41
15 0 0 0 390 20 30
16 0 0 0 390 20 30
17 0 0 0 390 20 30
18 0 0 0 390 20 30
Fonte: Elaborada pelos autores.

4.4 Pré-tratamento ácido da biomassa

Para o pré-tratamento da biomassa, foi pesada a massa de amostra referente à razão


massa/volume desejada e colocada em frasco de penicilina contendo 30 mL de solução 1% v/v
de ácido sulfúrico. Após vedação com tampa de borracha e com lacre de alumínio, os frascos
foram inseridos em reator pressurizado, onde ocorreu o pré-tratamento a 120 °C pelo tempo
determinado, contado a partir da pressurização completa do reator.
33

Após o término do tratamento, os frascos foram resfriados e o conteúdo filtrado em


tecido. A fração líquida, de interesse, foi centrifugada em centrífuga Excelsa® II, modelo 206
BL, por 10 minutos a 3500 rpm e armazenada sob refrigeração para posterior análise.

4.5 Determinação de açúcares e de inibidores de fermentação

As amostras provenientes do pré-tratamento tiveram seu pH ajustado com adição lenta


de carbonato de cálcio para faixa entre 5,0 e 6,0, utilizando medidor de pH portátil (Hanna, HI
8424), foram diluídas 20 vezes, filtradas em filtro de seringa (0,22 µm) e armazenadas em
frascos vial de 2 mL sob refrigeração. As análises foram realizadas para os açúcares glicose,
xilose e arabinose, bem como os inibidores 5-hidroximetilfurfural (HMF) e furfural. Foi
utilizada a cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) com as mesmas condições de análise
descritas no item 4.2.7, porém utilizando também o detector UV-visível para quantificação de
HMF e furfural, possibilitando o cálculo de rendimento das extrações e formação de inibidores.
34

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.1 Caracterização química do bagaço de malte

A caracterização química do bagaço de malte está apresentada, em base seca, na Tabela


4. A lignina total é a soma entre lignina insolúvel (Klason) e solúvel, enquanto o teor de
hemiceluloses é considerado como a soma entre os teores de xilana e de arabinana.

Comparando os valores obtidos na caracterização do bagaço de malte estudado com os


resultados encontrados na literatura, expostos na Tabela 2, observa-se que o material possui
composição dentro da faixa esperada. O teor de celulose (15,99%) é próximo aos valores
encontrados por Mussatto e Roberto (2006) e por Wilkinson et al. (2014), sendo estes 16,78%
e 19,2%, respectivamente. Para a hemicelulose, foi obtido teor de 29,92%, semelhante aos de
Mussatto e Roberto (2006), 28,42%, e de Qin et al. (2018), 25,97%. Apesar das grandes
divergências na literatura, o teor de lignina encontrado (20,80%) foi similar ao de Qin et al.
(2018), 19,57%. Os teores de proteínas (21,16%) e de cinzas (3,76%) foram próximos aos de
Pinheiro et al. (2019), 14,3% a 20,2% e 1,9% a 3,7%, e Qin et al. (2018), 22,44% e 3,54%,
respectivamente. Já o teor de extrativos (8,33%) se aproximou dos valores encontrados por
Mussatto e Roberto (2006), 5,82%, por Wilkinson et al. (2014), 5,2%, e por Qin et al. (2018),
5,30%.

Tabela 4 – Constituintes do bagaço de malte e porcentagem na composição, em base seca.

Componente Teor (%)


Celulose 15,99 ± 0,88
Hemiceluloses, sendo: 29,92 ± 1,60
Xilana 25,22 ± 1,46
Arabinana 4,71 ± 0,14
Lignina, sendo: 20,80 ± 0,42
Lignina insolúvel 17,78 ± 0,41
Lignina solúvel 3,02 ± 0,01
Proteínas 21,16 ± 0,61
Extrativos 8,33 ± 0,76
Cinzas 3,76 ± 0,05
Fonte: Elaborado pelos autores.
35

As diferenças entre os resultados encontrados podem ser devido não só à diversidade de


tipos de malte e receitas cervejeiras, mas também às metodologias de análise, que diferem em
virtude da evolução dos métodos de quantificação e dos equipamentos, dos reagentes e dos
instrumentos disponíveis.

5.2 Avaliação quantitativa dos ensaios do pré-tratamento com ácido diluído

Os resultados obtidos nos ensaios do pré-tratamento com ácido diluído estão expostos
na Tabela 5.

Entre os inibidores, foi possível observar que a geração de furfural foi superior à de
HMF em quase todos os cenários, fato decorrente da origem desses compostos. O furfural é
produto da degradação de carboidratos com cinco carbonos, como xilose e arabinose, presentes
nas hemiceluloses. Estas são mais reativas por possuírem cadeias curtas e ramificadas,
favorecendo a ação do ácido no pré-tratamento. Por outro lado, o HMF é oriundo da degradação
de carboidratos com seis carbonos, presentes na celulose, na forma de glicose, e em pequenas
quantidades nas hemiceluloses, nas formas de galactose e de manose, por exemplo. A celulose
é um polímero de cadeias mais longas do que as hemiceluloses, além de não ser ramificada, o
que a torna menos reativa e, consequentemente, menos susceptível à ação do ácido no pré-
tratamento.

As maiores liberações de glicose e xilose + arabinose ocorreram no ensaio 14 (maior


tempo reacional), apresentando valores de 33,1 e 122,7 mg g-1 respectivamente, ou seja,
rendimentos de 18,63% e 36,08% sobre o material in natura. Este ensaio proporcionou a
formação de 0,118 mg g-1 de HMF e de 0,297 mg g-1 de furfural, o que poderia prejudicar a
fermentação. Em concentração, estes valores seriam equivalentes a 6,62 g L-1 de glicose, a
24,54 g L-1 de xilose + arabinose, a 0,02 g L-1 de HMF e a 0,06 g L-1 de furfural. Mussatto e
Roberto (2006) encontraram resultados semelhantes, com exceção à liberação de glicose, em
seu melhor ensaio, conduzido sob condições similares às deste estudo, sendo: 0,32 g L-1 de
glicose, 21,42 g L-1 de xilose + arabinose, 0,03 g L-1 de HMF e 0,02 g L-1 de furfural.
36

Tabela 5 – Resultados obtidos para extração de açúcares e formação de inibidores nos ensaios
de pré-tratamento com ácido diluído.

Valores codificados Resultados obtidos (mg g-1)


Ensaio
DP Rmv T GLI XIL + ARA HMF FUR
1 -1 -1 -1 26,53 100,67 0,085 0,102
2 +1 -1 -1 23,07 87,73 0,078 0,110
3 -1 +1 -1 13,12 77,52 0,053 0,072
4 +1 +1 -1 15,52 79,52 0,068 0,086
5 -1 -1 +1 20,12 51,73 0,070 0,115
6 +1 -1 +1 30,93 114,67 0,106 0,190
7 -1 +1 +1 26,09 84,32 0,089 0,117
8 +1 +1 +1 20,10 78,08 0,072 0,104
9 -α 0 0 28,48 100,40 0,093 0,136
10 +α 0 0 26,20 109,00 0,095 0,153
11 0 -α 0 30,65 116,30 0,099 0,399
12 0 +α 0 18,41 82,02 0,068 0,147
13 0 0 -α 14,70 64,50 0,044 0,095
14 0 0 +α 33,10 122,70 0,118 0,297
15 0 0 0 25,99 77,30 0,078 0,241
16 0 0 0 20,91 96,80 0,091 0,120
17 0 0 0 20,70 80,80 0,073 0,093
18 0 0 0 20,38 76,50 0,119 0,107
Legenda: GLI = Glicose; XIL = Xilose; ARA = Arabinose; HMF = 5-hidroximetilfurfural; FUR
= Furfural; DP = Diâmetro médio de partícula; Rmv = Razão massa/volume de alimentação; T
= Tempo reacional.
Fonte: Elaborada pelos autores.

5.3 Análise estatística de parâmetros do pré-tratamento ácido

É possível analisar o efeito das variáveis estudadas por meio dos modelos obtidos pela
regressão no software Minitab® (MINITAB, 2019). Os modelos para glicose (GLI), para xilose
+ arabinose (XIL + ARA), para 5-hidroximetilfurfural (HMF) e para furfural (FUR) seguem a
fórmula geral, apresentada na Equação 11. Os coeficientes βi são apresentados na Tabela 6 e as
tabelas da análise de variância (ANOVA) se encontram no Apêndice A. A análise para xilose
37

e para arabinose foi realizada de forma conjunta pelo fato de serem moléculas da mesma classe
de açúcares (C5), sendo apenas isômeros, com metabolismo de fermentação muito semelhante.
As variáveis do modelo são o diâmetro médio de partícula (DP), razão massa/volume da
alimentação (Rmv) e tempo reacional (T).

𝑅𝐸𝑆 = 𝛽0 + 𝛽1 ∗ 𝐷𝑃 + 𝛽2 ∗ 𝑅𝑚𝑣 + 𝛽3 ∗ 𝑇 + 𝛽4 ∗ 𝐷𝑃 ∗ 𝐷𝑃 + 𝛽5 ∗ 𝑅𝑚𝑣 ∗ 𝑅𝑚𝑣 (11)


+ 𝛽6 ∗ 𝑇 ∗ 𝑇 + 𝛽7 ∗ 𝐷𝑃 ∗ 𝑅𝑚𝑣 + 𝛽8 ∗ 𝐷𝑃 ∗ 𝑇 + 𝛽9 ∗ 𝑅𝑚𝑣 ∗ 𝑇

Em que: RES = resposta avaliada, mg g-1; DP = diâmetro médio de partícula, µm; Rmv
= razão massa/volume de alimentação, %; T = tempo reacional, min; 𝛽𝑖 = parâmetros empíricos.

Tabela 6 – Coeficientes dos modelos obtidos para glicose, xilose + arabinose, HMF e furfural.

Coeficientes GLI XIL + ARA HMF FUR


𝛽0 82,8 403 -0,175 -0,18
𝛽1 -0,124 -0,763 0,000157 0,00259
𝛽2 -1,98 -2,6 0,0046 -0,0356
𝛽3 -1,38 -10,7 0,0108 0,0084
𝛽4 0,000176 0,00067 0,0 -0,000003
𝛽5 0,0054 0,093 -0,000168 0,001042
𝛽6 -0,0035 0,015 -0,000204 -0,000048
𝛽7 -0,00342 -0,0169 -0,000009 -0,000025
𝛽8 0,00184 0,0211 0,000004 0,000012
𝛽9 0,0805 0,137 0,000134 -0,00015
R2 0,7168 0,4451 0,5659 0,4941
Legenda: GLI = Glicose; XIL = Xilose; ARA = Arabinose; HMF = 5-hidroximetilfurfural;
FUR = Furfural.
Fonte: Elaborado pelos autores.

De forma geral, estes não são satisfatórios por apresentarem valores baixos de R2,
indicando sua baixa capacidade de predizer respostas a partir de valores definidos para as
entradas. Apesar disso, ainda é possível observar o comportamento das respostas para cada
variável, auxiliando na compreensão do fenômeno estudado. Para isso, puderam ser analisadas
as superfícies de resposta, que apresentam o comportamento de cada saída perante duas
entradas, enquanto a terceira foi fixada no ponto central, o qual proporciona a robustez do
modelo.
38

Na análise da liberação de glicose, foi possível identificar nas superfícies de respostas


destacadas na Figura 7 que o diâmetro de partícula e o tempo de reação foram diretamente
proporcionais à extração e a razão massa/volume do bagaço de malte em ácido diluído foi
inversamente proporcional à mesma. Os melhores resultados foram obtidos nos pontos
extremos dessas variáveis nessa conformação (+ α para DP e T, - α para Rmv). Também foi
identificada uma faixa de DP que minimiza a liberação do carboidrato no meio (próxima de 390
µm), sendo interessante evitá-la em pré-tratamentos semelhantes.

Figura 7 – Superfícies de resposta para liberação de glicose. A, B e C apresentam Glicose x


Rmv, T; Glicose x T, DP e Glicose x Rmv, DP, respectivamente.
Legenda: GLI = Glicose; DP = Diâmetro médio de partícula; Rmv = Razão massa/volume de
alimentação; T = Tempo reacional.
Fonte: elaborado pelos autores.

As superfícies de resposta obtidas para a liberação de xilose + arabinose estão expostas


na Figura 8. Elas foram semelhantes às obtidas para a liberação de glicose. DP e T foram
parâmetros diretamente proporcionais à resposta e Rmv foi inversamente proporcional. Foi
possível observar uma mudança de comportamento em relação ao tempo de reação e diâmetro
39

de partícula quando a razão massa/volume foi fixada: para a glicose, o aumento de T provocou
aumento da liberação em DP baixo. Porém, para estes açúcares, o mesmo cenário provocou
diminuição da sua quantidade no meio, o que pode ser explicado pelo fato de eles serem
liberados da matriz lignocelulósica mais rapidamente do que a glicose, fato acentuado em
menores DP pela maior superfície de ação do ácido, consequentemente gerando degradação em
maior escala.

Figura 8 – Superfícies de resposta para liberação de xilose e arabinose. A, B e C apresentam


(Xilose + Arabinose) x Rmv, T; (Xilose + Arabinose) x T, DP e (Xilose + Arabinose) x Rmv,
DP, respectivamente.
Legenda: XIL = Xilose; ARA = Arabinose; DP = Diâmetro médio de partícula; Rmv = Razão
massa/volume de alimentação; T = Tempo reacional.
Fonte: elaborado pelos autores.

A partir da análise das superfícies de resposta que descrevem a geração de HMF,


demonstradas na Figura 9, foi possível identificar que o DP foi um parâmetro praticamente
insignificante para a resposta e a Rmv foi inversamente proporcional, porém também não
apresentou grandes efeitos. Por outro lado, o tempo de reação T foi um parâmetro bastante
relevante, sendo considerado o principal fator de influência para a geração do HMF,
40

apresentando comportamento diretamente proporcional ao mesmo. Portanto, para minimizar a


produção de HMF, o pré-tratamento deveria ser conduzido no menor tempo de reação possível.

Figura 9 – Superfícies de resposta para formação de HMF. A, B e C apresentam HMF x Rmv,


T; HMF x T, DP e HMF x Rmv, DP, respectivamente.
Legenda: HMF = 5-hidroximetilfurfural; DP = Diâmetro médio de partícula; Rmv = Razão
massa/volume de alimentação; T = Tempo reacional.
Fonte: elaborado pelos autores.

Nas superfícies de resposta descrevendo a produção de furfural, mostradas na Figura


10, foi identificado que houve uma região de inflexão para DP de 390 µm, sendo este o pior
diâmetro a ser escolhido, neste caso, para o pré-tratamento do bagaço de malte. Valores
menores e maiores de DP proporcionaram uma menor produção de furfural e, dentre estes, os
menores foram mais adequados. A Rmv apresentou relação inversamente proporcional à
formação de furfural, ao contrário do T, que foi diretamente proporcional. Os valores de Rmv
mais adequados foram os mais próximos de 28,4% (+ α), enquanto, para o T, foram os mais
próximos de 21,6 minutos (- α).
41

Figura 10 – Superfícies de resposta para formação de furfural. A, B e C apresentam Furfural x


Rmv, T; Furfural x T, DP e Furfural x Rmv, DP, respectivamente.
Legenda: FUR = Furfural; DP = Diâmetro médio de partícula; Rmv = Razão massa/volume de
alimentação; T = Tempo reacional.
Fonte: elaborado pelos autores.

Por meio da análise dos gráficos de Pareto dos efeitos padronizados, foi possível avaliar
a significância das variáveis para cada resposta em nível de confiança de 90%. Os gráficos são
apresentados na Figura 11, em que A representa o diâmetro médio de partícula (DP), B
representa a razão massa/volume de alimentação (Rmv), C representa o tempo reacional (T) e
as combinações de letras mostram o efeito das interações entre as variáveis. As barras que
cruzam a linha pontilhada indicam que aquela variável ou interação é significativa para a
resposta, de acordo com o modelo.
42

Figura 11 – Gráficos de Pareto dos efeitos padronizados. Os gráficos I, II, III e IV se referem
às respostas Glicose, Xilose + Arabinose, 5-hidroximetilfurfural e furfural, respectivamente.
Legenda: GLI = Glicose; XIL = Xilose; ARA = Arabinose; HMF = 5-hidroximetilfurfural;
FUR = Furfural; A = Diâmetro médio de partícula (DP); B = Razão massa/volume de
alimentação (Rmv); C = Tempo reacional (T).
Fonte: Elaborado pelos autores.

Foi possível identificar com um nível de confiança de 90%, pelo gráfico I da Figura 11,
que houve influência significativa do tempo de reação e da razão massa/volume de alimentação
na liberação de glicose. O modelo obtido descreveu que o diâmetro médio de partícula não
apresentou significância para o resultado, assim como todas as interações entre as variáveis.

O tempo de reação foi o único fator com influência significativa na geração de HMF,
como pode ser visto no gráfico III da Figura 11, com um nível de confiança também de 90%.
Os demais fatores e todas as interações não foram significativos, segundo o modelo.

Nos gráficos II e IV, observou-se que não houve significância de nenhum fator analisado
e nem de suas combinações num nível de confiança de 90% para a liberação de xilose +
43

arabinose e para a geração de furfural. Tal situação reforça o problema da baixa efetividade dos
modelos propostos.

5.4 Determinação de condições favoráveis para o pré-tratamento com ácido diluído

Em um cenário otimizado, o pré-tratamento ácido deve proporcionar alto rendimento


para extração de açúcares com baixa geração de inibidores. Contudo, a produção de HMF e
furfural provocada pela degradação de açúcares nos ensaios realizados pode ser considerada
desprezível para inibição de microrganismos fermentadores. Diferentes estudos comprovaram
que baixas concentrações de HMF e furfural são toleradas pelas células, provocando inibição
significativa apenas em concentrações acima de 4,0 g L-1 para o HMF (BAPTISTA, 2013;
TAHERZADEH et al., 2000) e de 1,0 g L-1 para o furfural (BOYER et al., 1992; LU et al.,
2007; PALMQVIST et al., 1999). Neste estudo, esta formação não excedeu 0,03 g L-1 de HMF
e 0,06 g L-1 de furfural, favorecendo a hipótese de que o pré-tratamento com ácido diluído tem
grande potencial para liberação de açúcares sem provocar degradação excessiva destes.

Dessa forma, pode-se avaliar o melhor cenário considerando apenas a liberação de


açúcares pelo pré-tratamento. Assim, foi obtido no software Minitab® (MINITAB, 2019) o
modelo para açúcares totais (glicose + xilose + arabinose, representados por ACT) extraídos,
visto que estes são os açúcares fermentescíveis desejados para a produção de etanol. Os
coeficientes do modelo, seguindo a Equação 11, e o valor de R2 obtidos são apresentados na
Tabela 7. Assim como para as outras respostas, o modelo não é satisfatório por apresentar baixo
R2 .

As condições estimadas pelo modelo para maximizar a extração de açúcares foram DP


524 µm, Rmv 11,59% e T 38,4 minutos, possibilitando a obtenção de 203,3 mg de açúcares
totais por grama de resíduo, em base seca, ou seja, de 39,27% dos açúcares contidos no material
cru. Nesse cenário seriam gerados, em estimativas dos modelos obtidos, 0,358 mg g-1 de furfural
e 0,107 mg g-1 de HMF, valores que, convertidos para concentração (0,04 g L-1 e 0,01 g L-1,
respectivamente), ainda não provocariam inibição significativa da fermentação. Por se tratar de
uma maximização em extremos, a estimativa pode ser falha, podendo haver um ponto ótimo
em outras faixas de valores das variáveis, não previstas pelo modelo.
44

Tabela 7 – Coeficientes do modelo obtido para açúcares totais extraídos.

Coeficientes ACT
𝛽0 486
𝛽1 -0,89
𝛽2 -4,6
𝛽3 -12,1
𝛽4 0,00085
𝛽5 0,099
𝛽6 0,011
𝛽7 0,0204
𝛽8 0,0230
𝛽9 0,217
R2 0,5039

Legenda: ACT = Açúcares totais.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Os resultados obtidos para o pré-tratamento com ácido diluído do bagaço de malte


podem ser comparados com outros estudos realizados sob condições semelhantes para outras
fontes de biomassa, objetivando avaliar a eficiência do processo. A Tabela 8 apresenta um
comparativo entre as eficiências de extração para cada biomassa, considerando o melhor ensaio
de cada estudo.

Tabela 8 – Eficiências de extração de açúcares por pré-tratamento com ácido diluído para
diferentes fontes de biomassa.

Extração de açúcares Extração de açúcares de


Referência Biomassa
da celulose (%) hemiceluloses (%)
Este trabalho Bagaço de malte 18,6 36,1
SILVA, 2009 Palha de cana 22,7 66,9
Pseudocaule de
SILVA, 2009 29,6 58,9
bananeira
SAHA et al., 2005 Palha de trigo 3,7 56,5
Fonte: Elaborado pelos autores
45

Observa-se que os rendimentos de extração para o bagaço de malte são inferiores na


maioria dos casos. Essa diferença pode ser causada pela variação nas metodologias de pré-
tratamento e de caracterização, além da disponibilidade destes polímeros, que se apresentam
em maior quantidade na composição centesimal das outras fontes de biomassa. Dessa forma,
pode-se inferir que o bagaço de malte é menos susceptível ao pré-tratamento sob essas
condições. Assim, deve-se buscar outras metodologias para alcançar rendimentos superiores.
46

6 CONCLUSÃO

A partir dos experimentos realizados, foi possível caracterizar quimicamente o bagaço


de malte e quantificar as frações com potencial para transformação em etanol de segunda
geração. Avaliando a granulometria, a razão massa/volume e o tempo reacional do pré-
tratamento ácido, foi encontrada a condição mais favorável para liberação de açúcares
fermentescíveis com 524 µm, 11,59% e 38,4 minutos, respectivamente, viabilizando a extração
de 203,3 mg de açúcares por grama de resíduo seco, ou seja, 39,27% dos açúcares contidos no
material cru. Entretanto, os baixos valores de R2 das regressões indicaram a pouca
confiabilidade das estimativas realizadas. Foi constatado que o diâmetro médio de partícula não
é uma variável significativa para o processo, uma vez que seus efeitos lineares, quadráticos e
de interação não foram significativos para as respostas.

Apesar disso, vale ressaltar que o resíduo estudado é uma matéria-prima potencial para
a produção de etanol de segunda geração por apresentar grande quantidade de hemiceluloses
(29,92%) e de carboidratos (45,91%) em sua composição, sendo as primeiras substâncias
facilmente hidrolisadas em açúcares fermentescíveis. Esta facilidade permitiu a obtenção de
açúcares isolados sem, contudo, geração de quantidades significativas de inibidores de
fermentação (HMF e furfural), para as condições estudadas. Por meio da comparação com
outras biomassas, foi possível identificar que os açúcares do bagaço de malte foram pouco
extraídos com as condições estudadas, indicando a necessidade de procurar metodologias mais
eficientes para o pré-tratamento.
47

7 SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS

Assim como abordado neste trabalho, deve ser realizada a mesma análise englobando
também fatores econômicos e operacionais, buscando o melhor para futuras aplicações em
escala industrial. Ainda, pode-se avaliar diferentes intervalos para as variáveis estudadas, uma
vez que o ponto de melhor resultado foi encontrado para extremos do modelo. Ainda, pode ser
realizado o deslocamento das faixas de entrada, buscando avaliar o efeito quadrático das
variáveis.

Para viabilizar o uso deste resíduo como matéria-prima para etanol de segunda geração,
é necessário também otimizar as condições de hidrólise, partindo do material sólido obtido no
pré-tratamento, e de fermentação, utilizando as frações líquidas obtidas nas duas etapas
precedentes.
48

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APÊNDICE A – Tabelas de análise de variância (ANOVA)

Legenda: GLI = Glicose; XIL = Xilose; ARA = Arabinose; HMF = 5-hidroximetilfurfural;


FUR = Furfural; DP = Diâmetro médio de partícula; Rmv = Razão massa/volume de
alimentação; T = Tempo reacional.

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