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Resumo
Este artigo analisa um programa de universaliza- Abstract
ção do saneamento em assentamentos precários This article analyzes a sanitation universalization
urbanos adotado pela prefeitura de Medellín, program in precarious urban settlements,
Colômbia. Com base na Teoria da Ecologia Polí- implemented by the municipal government of
tica, discute sobre os aspectos que possibilitam Medellin, Colombia. Based on the theory of
ou restringem a expansão do saneamento para a Political Ecology, it discusses aspects that enable
população pobre e analisa a experiência de Bello or restrict the expansion of sanitation services to
Oriente, um assentamento não atendido pelo the poor population, and analyzes the experience
programa, no qual a população, contando com o of Bello Oriente, a settlement not served by the
apoio de uma ONG local, conseguiu melhorar as program, where the population, with the support
condições do abastecimento de água e mitigar os of a local NGO, has managed to improve water
riscos geotécnicos. O artigo mostra que a solução supply conditions and mitigate geotechnical risks.
desenvolvida pela comunidade está muito mais The article shows that the solution developed
próxima de um modelo de unidade socioambien- by the community is much closer to a concept of
tal do que a política urbana municipal, que propõe socioenvironmental unit than the municipal urban
um desenvolvimento baseado em urbanismo eco- policy, which proposes a development based on
lógico, mas está sujeito ao modelo neoliberal de ecological urbanism, but is subject to the neoliberal
mercantilização da cidade. model of commodification of the city.
Palavras-chave: Agenda 2030; gestão das águas Keywords: 2030 Agenda for Sustainable Development;
urbanas; Programa Unidos por el Agua; urbanismo urban water management; Unidos por el Agua
ecológico; urbanização de favelas. Program; ecological urbanism; slum upgrading.
Cad. Metrop., São Paulo, v. 22, n. 48, pp. 479-498, maio/ago 2020 Artigo publicado em Open Acess
http://dx.doi.org/10.1590/2236-9996.2020-4807 Creative Commons Atribution
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O Programa Mínimo Vital de Água Potá- suas metas. Porém, o autor identificou mais
vel foi implementado, entre 2008 e 2011, com de 30 mil domicílios não conectados aos ser-
o nome Litros de Amor, pretendendo atingir 45 viços e que, portanto, não podiam acessar ao
mil famílias em condição de pobreza extrema, programa. Esses domicílios abrigavam famílias
garantindo 2.500 litros mensais de água per imigrantes e aquelas moradoras em áreas de
capita, para satisfazer as necessidades básicas risco consideradas “não mitigáveis”. Além des-
de higiene e alimentação (Zuluaga, 2014). se grupo, havia também pessoas que tinham
Segundo Zuluaga (ibid.), esse programa, seus serviços cortados ou suspensos por fal-
que em 2012 atendeu a 24.694 domicílios per- ta de pagamento. Em 2006, os “desconecta-
tencentes a famílias de baixa renda, baseou-se dos” somavam 60 mil pessoas (Medellín cómo
nos registros da própria EPM, para estabelecer vamos,2007).
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Figura 2 – Modelo de ocupação proposto pelo POT de Medellín, com vigência até 2027
Legenda:
Projeto Rio: em azul.
Projeto de Transversalidades Oriente-Ocidente: em marrom.
Projeto de Cinturão Verde Metropolitano: em verde escuro.
Em destaque vermelho, estão as Comunas 1, 3 e 8.
Fonte: adaptado de Medellín (2014a).
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Segundo Ruales (2015), os bairros locali- cidadeatraente, a violência ainda faz parte do
zados na parte alta da zona nordeste da cidade cotidiano. No entanto, a solidariedade entre
(Comunas 1, 3 e 8) e sujeitos às influências do os que já vivem nos bairros populares (as al-
macroprojeto Cinturão Verde Metropolitano, tas ladeiras) e os que chegam continua a ser
são áreas de extrema precariedade habitacio- cultivada, fortalecendo laços comunitários e
nal e urbana, e foram formadas por processos expandindo essas comunidades.3
de deslocamentos forçados da população ru- O POT prevê atender às necessidades
ral e urbana na época de forte conflito social habitacionais do município num horizonte de
e armado ocorrido no país ao longo do século longo prazo, consonante a Agenda 2030, pre-
XX. Como esse autor expressa, esses bairros vendo-se a construção de 185.463 unidades
foram construídos pelo esforço e pela solida- habitacionais. Já o Plano de Desenvolvimento
riedade das pessoas que se abrigaram ali, e Municipal 2016-20194 (Medellín, 2016) prevê
assim foram surgindo as moradias, as vias de atuar nos déficits quantitativos com a provisão
circulação, as redes de água artesanais, etc. de novas moradias e subsídios para famílias
Apesar de já terem recebido muitas interven- em situações de risco ou de deslocamento for-
ções urbanas, esses territórios ainda mantêm çado. Incluem-se, nessa modalidade, os pro-
situações de pobreza extrema e de desigual- gramas de requalificação urbana, como o Pro-
dade marcantes. Segundo Veeduría... (2018), grama de Melhoramento Integral de Bairros,
em 2017, as Comunas 1, 3 e 8 apresentaram os de requalificação de edificações, por meio de
maiores percentuais de pessoas em situação acompanhamento técnico para melhorias ha-
de extrema pobreza, com 7,3%, 5,8% e 4,9% bitacionais e o Programa Unidos por el Agua.
da população, respectivamente. Somam-se, a Os níveis de investimentos em políticas
este fato, os deslocamentos forçados que ain- habitacionais nos últimos dois anos foram
da marcam a realidade da Colômbia e da cida- marcados pela prioridade no Programa Melho-
de de Medellín, levando a fluxos migratórios ramento Integral de Bairros e em subsídios ha-
rurais-urbanos e interurbanos significativos, e bitacionais. Além disso, quando se comparam
que causam a expansão constante desses ter- os investimentos habitacionais realizados ao
ritórios. Ainda segundo Veeduría... (2018), em longo do tempo, eles situam-se, em média, em
2017, Medellín foi receptora de 7.816 pessoas 2,6% dos investimentos urbanos totais, tendo
em situação de deslocamento forçado. Outras sido maior em 2009, com 3,2%, e, em 2013,
3.517 pessoas deslocaram-se internamente no com 4,9% do total (Medellín cómo vamos,
município, por problemas relacionados a vio- 2019, p. 145).
lência em seus lugares de origem. A velocidade de produção de moradias
Segundo Miguel Tamayo, tecnólogo em não consegue inverter a tendência de cresci-
Gestão Comunitária e membro da Corporación mento do déficit habitacional. Em 2015, en-
Convivamos, Medellín atrai muita gente de quanto o POT previa atender 10.477 famílias,
fora da cidade, sugestionada pelo próprio o déficit constatado foi de 24.199 unidades,
marketing urbano promovido pelas institui- elevando-se rapidamente para 32.733 unida-
ções, públicas e privadas, que querem atrair des em 2017, sendo 88% desse total relaciona-
negócios para a cidade. Apesar de ser uma do às necessidades dos estratos de renda mais
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baixos (Medellín cómo vamos, 2018a). Assim, definida. A parte baixa do assentamento é
por mais que os assentamentos precários se- reconhecida pela Prefeitura, e lá se desenvol-
jam atendidos por projetos de melhorias habi- vem ações do Programa Unidos por el Agua.
tacionais e urbanas, a produção de novas mo- A porção superior abriga uma ocupação
radias para atender às estratégias relacionadas esparsa, muito próxima do sopé da encosta,
aos macroprojetos carece de alto investimento e que já sofreu danos por deslizamento de
público, mas não é representada no planeja- terra. O acidente, segundo informado pelas
mento orçamentário municipal. lideranças locais, ocorreu devido a infiltra-
Com relação aos sistemas de abasteci- ção de água de abastecimento, que acontece
mento de água e esgotamento sanitário, o POT de forma irregular e que foi construída pelos
impõe restrições à ocupação nas zonas de alto próprios moradores.
risco não mitigável e nas faixas de proteção de Esse assentamento, assim como outros
cursos d’água e nascentes (Medellín, 2014a). próximos, que também não são reconheci-
O POT define o limite urbano segundo o que é dos pela Prefeitura, capta água oriunda de
chamado de limite sanitário, que é a cota 2.100 uma estação de acumulação de água, cha-
acima do nível do mar, sobre a qual não é per- mada Tanque el Toldo, construída pela EPM.
mitida a ocupação, muito menos a prestação Esse tanque recebe águas da represa Piedras
de serviços públicos de água e esgoto. Assim, Blancas e alimenta a Estação de Tratamento
por mais que as legislações municipal e nacio- La Montana, que se situa a menos de 500 me-
nal tenham flexibilizado as regras de prestação tros de Bello Oriente (Figura 3). O excesso das
de serviços de saneamento para abranger um águas que chegam ao tanque El Toldo é extra-
número maior de pessoas, o limite sanitário vasado por uma escada hidráulica que lança as
exclui todos os assentamentos precários que águas em uma caixa de amortecimento para
estejam acima dessa cota e que não estejam ser “devolvida” à natureza, à meia encosta. É
na parte urbana ou de expansão urbana (ibid.). dessa caixa que os moradores coletam água e
a conduzem, por meio de adutoras comunitá-
rias, às suas casas (Figura 4).
Bello Oriente: Apesar da prática de captação de água
do El Toldo ser antiga (Zapata Hoyos, 2009),
onde o direito não chega depois do acidente ocorrido na encosta, a
e a Agenda 2030 não conta CorporaciónConvivamos, organização não go-
vernamental criada por moradores da Comuna
Bello Oriente é um assentamento precário lo- 1, convidou os moradores da parte irregular
calizado na Comuna 3, situado em parte abai- de Bello Oriente a se organizarem e melhora-
xo do limite sanitário da cidade e, em parte, rem as instalações da adutora, oferecendo as-
acima deste. De acordo com o POT, está sob sistência técnica e social para isso. A adutora
influênc ia do Macroprojeto Cinturão Verde original foi substituída por uma tubulação em
Metropolitano, e a população que está aci- PEADcom diâmetro de 75mm (mesmo diâme-
ma do limite sanitário deverá ser reassentada tro e material comumente utilizados pelas con-
em alguma outra região da cidade, ainda não cessionárias de saneamento para distribuição
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de água), para evitar rupturas em sua exten- não podem ter filtros domésticos, pois vivem
são. Os moradores organizaram-se entre si sob ameaça de corte das instalações pela EPM.
para realizar inspeções periódicas em todo o Alguns moradores optam por comprar água
trecho de tubulação, e as conexões para os ra- engarrafada ou de vizinhos da parte regular do
mais das moradias foram refeitos, instalando- núcleo, que recebem água tratada da EPM, en-
-se registros individuais para permitir a manu- tretanto, essas soluções são muitocaras para a
tenção, quando necessário (Figura 5). Todas população que vive em Bello Oriente.
essas soluções visavam a evitar vazamentos e Quanto ao esgotamento sanitário, os
desperdício de água, com foco na mitigação moradores são orientados para que não haja
dos riscos geotécnicos aos quais a comunidade lançamento direto no solo, então eles lançam
estava sujeita. seus efluentes nos talvegues naturais (quebra-
Apesar de todos esses cuidados, a água das), ou até mesmo na rede da EPM, quando
captada desse extravasor não é potável. Os mo- conseguem adaptar seus ramais até a parte re-
radores são orientados a ferver a água, já que gular do núcleo.
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Vale destacar que a EPM é uma empresa Bello Oriente, pode-se afirmar que, na medida
prestadora de serviços domiciliares e, além da em que as pessoas foram orientadas a lidar
água potável e da coleta de esgotos, fornece com os próprios riscos depois do acidente geo-
também energia elétrica e gás combustível técnico ocorrido, elas passaram a administrar a
para toda a cidade. Apesar de não haver abas- adutora de água e compreender a importância
tecimento de água e coleta de esgotos nessa da condução adequada dos esgotos sanitários.
porção irregular de Bello Oriente, existe o for- Por terem sido levados a analisar seus próprios
necimento de energia elétrica e iluminação pú- problemas, passaram também a questionar as
blica. Os limites entre as duas porções do terri- limitações impostas pela Prefeitura, já que se
tório são quase imperceptíveis, bastando uma sentem e se mostram capazes de lidar com o
rua para que as pessoas saibam qual o lado meio ambiente em que vivem.
está sendo beneficiado pelo Programa Unidos O tanque El Toldo extravasa parte das
por el Agua, e qual não será atendido. águas que chega de Piedras Blancas, permitin-
Destacam-se, portanto, as contradições do a essa população ter acesso a abundante
da política urbana de Medellín, que limitam a quantidade do líquido. Essa disponibilidade
ação estatal e o direito humano à água. Em pri- permitiria às pessoas viverem com segurança
meiro lugar, é difícil compreender a inviabili- hídrica, aprendendo a manejar seus consu-
dade técnica do serviço de saneamento acima mos para garantir o suprimento perene. Po-
do limite sanitário, quando o limite físico entre rém, quando se sentem impedidas de adotar
as áreas servida e não servida é tão tênue. Em técnicas artesanais de tratamento de água ou
segundo lugar, a proximidade da estação de são levadas a crer que estão “roubando” água
tratamento de água incomoda qualquer obser- da EPM, ficam limitadas ao consumo de água
vador, já que esse serviço, que garante a con- não potável, agredindo desnecessariamente
dição básica de saúde a qualquer ser huma- a própria saúde. Mais ainda, essa água não é
no, está tão próximo, mas restringe o acesso da EPM, pois está sendo descartada, devolvida
àquela população. Em terceiro lugar, no mapa para a natureza, sendo, portanto, um recurso à
de riscos e vulnerabilidade do POT (Medellín, disposição de quem dela necessite.
2014a) a porção irregular de Bello Oriente O projeto de desenvolvimento urba-
não configura zona de risco não mitigável. Fi- no proposto no POT, que pretende limitar a
nalmente, o POT admite que a universalização expansão urbana por meio da implantação
dos serviços domiciliares é conflituosa com as de uma região de ecoparques, não conside-
normas urbanísticas, quando se considera que rou que existem pessoas vivendo ali, e que
as regras de prestação de serviços de energia assim acontece por falta de opções viáveis
elétrica são menos restritivas que as de sanea de moradia. São famílias pobres, vítimas da
mento, “confundindo o direito ao acesso uni- violência e da segregação urbana. O POT não
versal com os princípios de ocupação segura permite que elas fiquem ali, porque planeja
do território” (ibid., p. 393). segregar as atividades urbanas das necessida-
Considerando a experiência da ges- des ecológicas, sem que se saiba o que será
tão comunitária de risco promovida pela feito com esses moradores. De acordo com
CorporaciónConvivamos com os moradores de Ruales (2015), é preciso ampliar a participação
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popular no processo de ordenamento territo- só ocorre depois que ele acontece, revelando
rial, dando às pessoas o direito de planejar o uma posição passiva no desenvolvimento da
território, reconhecendo os espaços de solida- cidade (ibid.).
riedade e vizinhança como adequados à habi- Essas organizações propõem transfor-
tação, respeitando o direito dessas pessoas a mar as pessoas de potenciais vítimas de de-
buscarem melhores condições de vida. sastres em agentes mitigadores, conhecedores
dos próprios riscos, sem negar a sua problemá-
tica. Fazem da gestão de risco a base de tra-
balho, tendo por princípio que “o território é
Água, território e a luta uma construção em diferentes escalas, uma
pela permanência em Medellín ação política” (ibid.).
O projeto chama-se Escuela Territorial
As pessoas em Bello Oriente não podem ficar de Barrios de Ladera e define que o desen-
onde estão. Esta é a regra do Plano de Ordena- volvimento territorial dos bairros ocorre em
mento Territorial de Medellín. Não é pelo fato três escalas: 1) no âmbito familiar, que tem na
de estarem em zonas de risco não mitigável, moradia a força dinamizadora para construção
muito menos pelo fato de não haver tecno- dos bairros e deve ocorrer com base nos prin-
logia suficiente para prestação de serviços de cípios de segurança, cooperação, solidarieda-
água e saneamento. Apesar do plano habita- de, progressividade e produtividade; 2) no âm-
cional de Medellín prever o reassentamento bito do entorno, ou seja, nos bairros, onde a
dessas famílias em outro lugar da cidade, a da- comunidade se encontra e interage com as re-
ta ainda é incerta, e não se sabe onde a Prefei- gras de ordenamento territorial e onde ocorre
tura planeja reassentá-los. a participação popular. Nessa escala estão os
As organizações comunitárias serviços domiciliares, a mobilidade e o trans-
CorporaciónCon-Vivamos, Montano-A e Mesa porte, os espaços públicos e os equipamentos;
de Vivienda y Servicios Publicos Domiciliarios e 3) no âmbito socioeconômico, que deve ser
de La Comuna 8 propõem um projeto alter- pensado nas escalas da cidade, da região e do
nativo a esse Cinturão Verde Metropolitano. País, definindo-se um modelo econômico e de
Seus princípios norteadores são a identidade desenvolvimento social que tenha por objetivo
popular, o direito à cidade, a defesa do territó- a superação da pobreza e da iniquidade, indo
rio e a gestão comunitária de riscos (Conviva- além da mera contratação de “mão de obra
mos..., 2019?). local”nos projetos de melhoramentos urbanos
Segundo esse projeto, o conceito de ris- e habitacionais (ibid.).
co que tem sido utilizado pela prefeitura de A Escuela Territorial de Barrios de Ladera
Medellín serve como justificativa para não se pretende garantir à população desses assenta-
fazer o que é preciso, restringindo o direito mentos precários urbanos o direito à perma-
das pessoas a um território seguro, ao mesmo nência, com respeito ao que foi autoconstruí-
tempo que não direciona adequadamente o do, dando a oportunidade de as pessoas terem
crescimento urbano. Segundo essas organi- um novo começo diante da violência sofrida. A
zações, a atenção estatal ao desastre natural superação das condições de risco, da pobreza
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e da segregação urbana deve acontecer sem a primeira exclui pessoas, deixando de cumprir
gerar novas vítimas, tecendo o que se chama seus próprios objetivos, que são as propostas
de “território popular” com identidade comu- da Agenda 2030, a segunda ignora a inviabili-
nitária, para a formação de uma nova paisa- dade da política habitacional em curto prazo,
gem, associada com os elementos naturais e além de não considerar os motivos que leva-
os elementos estratégicos de desenvolvimento ram a população a essa situação de vulnerabi-
municipal (ibid.). lidade. O POT impõe regras de ocupação que
Esse projeto, portanto, propõe um pa- não condizem com a realidade territorial, su-
radigma socioambiental diferente da orga- bestima a capacidade popular e a história indi-
nização territorial convencional, em que se vidual das pessoas. Como resposta, as pessoas
limitam os espaços de morar, de trabalhar e subvertem as regras injustas da política urbana
de proteger o meio natural de forma segrega- e promovem frentes de expansão constante,
da, como se fosse possível retomar a natureza lutando pelo direito à cidade.
para que ela parecesse intocada. É sobre isso
que Swyngedouw (2004) discorre: a metabo-
lização da natureza já ocorreu e continuará Considerações finais
ocorrendo,num processo contínuo de produ-
ção de espaços. Este artigo teve por objetivo discutir os de-
Observando a experiência de Bello safios e as possibilidades da universalização
Oriente, em que os moradores demonstram a do saneamento em assentamentos precários
capacidade efetiva de pensarem seu território urbanos, com base na análise do Programa
e sua segurança, verifica-se uma possibilidade Unidos por el Agua, implementado pela pre-
efetiva de autonomia e construção da paz que feitura de Medellín, na Colômbia. Com esse
eles tanto almejam. A falta de argumentação programa, a Prefeitura pretendia ampliar o
para justificar que não se abasteça de água o acesso da população dos assentamentos pre-
assentamento coloca em xeque a própria fina- cários urbanos aos serviços de água e esgoto,
lidade do POT, pois outros territórios, pouco a visando a atingir as metas propostas no âm-
pouco, são inseridos na zona urbana. Exemplo bito da Agenda 2030 para o Desenvolvimento
disso é o assentamento Maria Cano Carambo- Sustentável. Foi possível verificar que as ações
la, muito próximo de Bello Oriente e incluído propostas pela prefeitura de Medellín estão
no POT como área de expansão, que enche de limitadas principalmente pela política tarifária
esperança tanto os moradores de Bello Orien- dos serviços de água e esgoto e pela política
te, quanto os loteadores ilegais que continuam de uso e ocupação do solo urbano.
vendendo terras tanto nos assentamentos pre- O Plano de Ordenamento Territorial li-
cários como nas partes nobres das montanhas mita o direito à terra e à moradia à população
de Medellín. pobre, uma vez que propõe um modelo de
Assim, pode-se dizer que, apesar de uma urbanismo ecológico que não leva em conta
política de universalização do saneamento tão as dinâmicas sociais e urbanas preexistentes
contundente, seus resultados são reféns da que marcam o território das chamadas altas
política de ordenamento territorial. Enquanto laderas. Isso porque o projeto de Cinturão
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convencionais da EPM e da prefeitura de Me- pelo poder e pelo capital, uma vez que o pla-
dellín. Até que tais modelos se flexibilizem, a nejamento urbano tem estado a serviço des-
água continuará seguindo fluxos determinados tes, e não como motor principal.
[I] https://orcid.org/0000-0001-7640-0148
Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Programa de
Pós-Graduação em Urbanismo. Campinas, SP/Brasil.
renatafurigo@gmail.com
[II] https://orcid.org/0000-0002-2105-8557
Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Programa de
Pós-Graduação em Urbanismo. Campinas, SP/Brasil.
patricia.samora@puc-campinas.edu.br
[III] https://orcid.org/0000-0003-0617-9905
Universidad de Antioquia, Grupo de Pesquisa Medio Ambiente y Sociedad. Medelín, Colombia.
albertolgutierrezt@gmail.com
Notas
(1) O Conselho Municipal é o equivalente à Câmara de Vereadores no Brasil.
(2) As informações citadas foram prestadas pelo Eng. Edgardo Martinez Echeverri, diretor de
Relações de Mercado da EPM, em julho de 2019, numa entrevista concedida aos pesquisadores.
(3) Entrevista concedida, aos pesquisadores, em encontro ocorrido no dia 23 de julho de 2019, na
sede da Corporación Convivamos, em Medellín, para discussão sobre o Programa Unidos por el
Agua.
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