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OS CANTOS DE TRABALHO COMO FORMAS CULTURAIS DE


PRODUÇÃO DE SAÚDE E SUBJETIVIDADE NO MEIO RURAL
BRASILEIRO
JOSÉ ANDERSON MARQUES GUEIROS1
DENISE DA SILVA ARAÚJO2

Resumo: No meio rural o trabalhador se exxperiencia enquanto sujeito autônomo em sua atividade ao passo
que se estabelecem, coletivamente, estratégias promotoras de saúde em seus ambientes laborais. Diante disso,
nosso objetivo com este trabalho é de discorrer e analisar sobre a função que os chamados “cantos de
trabalho” exercem como estratégias de promoção de saúde, sobre o modo como a subjetividade do
trabalhador é convocada e como ele se implica nesses processos. Para coletar os dados para a análise, nos
utilizamos de um documentário intitulado “Cantos de Trabalho – Bahia Singular e Plural”, exibido pela
TVEBahia e disponível no Youtube; também lançamos mão de pesquisas bibliográficas em bases de dados
com enfoque de pressupostos da ergologia. O uso do espaço e do tempo de trabalho nos permite refletir
sobre a questão de como se produz saúde nesses contextos. Saúde será tratada aqui a partir da posição ativa
desses trabalhadores no ato laboral quando cantam, ressignificam e estabelecem novas formas de lidar com
uma atividade complexa, repetitiva e que requer esforço físico. Partimos de um referencial de uma
subjetividade entendida como um processo em constante produção coletiva, não padronizada e que se
modifica no tempo e na história. Vale ressaltar que a relação desses trabalhadores e seus cantos vão para além
do trabalho prescrito, pois se inserem em seus contextos de vida os fazendo construir e falar de algo que está
diante deles e os afeta.

Palavras-chave: Cantos de Trabalho. Trabalho Rural. Ergologia.

ISSN 2318.4329.
ANAIS do IX Encontro de Pesquisa e Extensão da Faculdade Luciano Feijão.
INTRODUÇÃO

Nosso objetivo com esse trabalho é de discorrer e analisar sobre a função que os
chamados “cantos de trabalho” exercem como estratégias de promoção de saúde no modo
como a subjetividade do trabalhador é convocada e como ele se implica nesses processos.
Embora a maioria das discussões a respeito da Psicologia Organizacional seja
voltada para uma análise no âmbito das organizações industriais e vinculada comumente ao
cotidiano urbano – talvez pelo fato de proporcionar mais fácil apreensão até pela realidade
que vivemos atualmente – nos chamou atenção questões relativas ao trabalho no âmbito
rural enquanto permeado (também) por longas e intensas jornadas de trabalho, relações
informais de trabalho, predominância de com baixos salários, resistência – ou mesmo
Sobral-CE, novembro de 2017.

desconhecimento dos trabalhadores – em utilizar os equipamentos de proteção individual

1 Graduando no 9º semestre em Psicologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC) – Campus de Sobral. E-
mail: anderson7154@gmail.com
2 Graduanda no 9º semestre em Psicologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC) – Campus de Sobral. E-

mail: denisesilvaar@hotmail.com
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(EPIs), o que pode agravar o surgimento de lesões devido à demanda física de trabalho,
podendo assim criar com maior facilidade um nexo causal entre a atividade laboral e
surgimento de algum sofrimento psíquico ou enfermidades atrelados a isso. Muitas vezes
esses afazeres assemelham-se a condições trabalho escravo, devido a muitos desses fatores
que foram supracitados (ALVES & GUIMARÃES, 2012).
A escolha dos cantos como tema dessa produção, se deu a partir da observação do
arcabouço cultural, histórico, político, econômico e existencial contidos nestes e que
traduzem o cotidiano desses trabalhadores, que tivemos podemos perceber através das
pesquisas realizadas e das questões que nos surgiram. Desse modo, é possível identificar
como a subjetividade do trabalhador rural é revelada a partir da análise desses cantos que
também podem ou são construídos coletivamente. Há uma especificidade no canto que nos
chama a atenção: o fato de estes serem formulados de modo a desviar a voz de seu uso
comum (SILVA, 2007). A dinamicidade e o improviso com que as canções são criadas
simbolizam uma tradição espontânea, cujo ritmo obedece ao ritmo do trabalho e do corpo
ao realizar esse trabalho, ao passo que retratam um sujeito consciente de sua história.

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É ainda essa questão da dinamicidade de formas de expressão que nos permite

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considerar os cantos de trabalho como uma cultura propriamente brasileira. Cultura aqui é
entendida não apenas enquanto “um conjunto de fenômenos, objetos ou fatos sociais que
guardariam propriedades materiais ou imateriais específicas com a vida cotidiana” (SESC,
2015, p.14), mas, sobretudo, como “um sistema simbólico em constante estado de
transformação, que anima práticas sociais e revela diferentes formas de apropriação sujeitas
a processos diferenciados de representação”. (SESC, 2015, p.14).
Sobre o aspecto do corpo que se mobiliza a partir do ritmo da música para realizar
o trabalho, Silva (2007, p. 10) ressalta que
A música, o canto, a dança estão presentes em todas as culturas, por mais
diversas que sejam suas manifestações. A canção em ato é sempre corporal,
podendo estar ou não associada à dança. Embora não seja a dança o nosso
enfoque, é preciso perceber que há uma indissociabilidade entre música e
Sobral-CE, novembro de 2017.

movimento corporal.
Vale salientar que, esses momentos coletivos de trabalho devem ser analisados
de acordo com o contexto social e histórico das comunidades e grupos sociais
em que ocorrem, esses momentos serão embalados por cantos e/ou
performances rítmicas seja com paus, palmas, enxadas ou pilões, que ritualizarão
os necessários e, por vezes, repetitivos movimentos corporais durante a lida,
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visando em muitos casos atenuar um pouco os rigores das tarefas a serem


realizadas (SESC, 2015, p.15).
MÉTODO

O método utilizado para essa breve análise em questão será uma pesquisa
bibliográfica de base documental de caráter qualitativo. Justificamos a pesquisa
bibliográfica, pois permite ao pesquisador ter uma ampla visão dos fenômenos pesquisados
em um tempo mais curto e com maior amplitude, do que se teria pesquisando diretamente
(GIL, 2008).
Para coletar os dados necessários para análise, nos utilizaremos das bases de dados
online de produção acadêmica, como: Scielo, Google Acadêmico e PePsic, com a finalidade
de encontrar quais representações acadêmicas são produzidas com base nessas práticas.
Utilizaremos ainda a ergologia como referencial teórico para análise desses
fenômenos, pois essa clínica do trabalho, o trabalhador toma um lugar de evidência,
também entendendo que essa atividade humana, que é a sua lida, é “encontro de encontros,
plena de debates de normas e valores e sempre a ser tecida através das renormalizações”
(MOTTA, 2014, p. 291).

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Entendemos que o trabalho deveria ser uma situação de produção de saúde para os
sujeitos que realização essas tarefas, e tendo em vista o processo de intensificação do
trabalho e o enriquecimento das funções que vêm acontecendo nos últimos anos, além as
contradições existentes nesse cotidiano, é importante analisar de como se estrutura e se
organiza o ato laboral como produtor de saúde e subjetividade. (DEJOURS, 1998 apud
AQUINO, 2008, p.195).
Alguns pressupostos da Ergologia trazem a tona o protagonismo dos trabalhadores.
Além disso, essa clínica do trabalho pretende em suas análises diminuir as distâncias entre o
saber e o fazer, de modo que o trabalhador, para além de ser um mero agregador de valor
ao produto final de seu trabalho, também constrói certo conhecimento sobre a sua prática
(BORGES, 2005, p. 44-5).
Sobral-CE, novembro de 2017.

Contaremos ainda com outra ferramenta utilizada nessa coleta: a análise de um


documentário intitulado “Cantos do Trabalho – Bahia Singular e Plural (TVEBahia, 2012)”
disponível no Youtube. Nesse documentário são retratadas algumas práticas laborais, que
tem a elaboração de cantos como um dos focos principais, mostrando também o contexto,
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a partir das falas dos trabalhadores nos seus respectivos locais de trabalho nos quais estão
inseridos, de modo que nos dá oportunidade de compreender como a música perpassa os
espaços de trabalho e como esses grupos que citamos se organizam a partir dessas ideias.
A análise do documentário será feita a partir dos modos como as músicas são
significadas nesses ambientes de trabalho e no modo que se produz saúde e constrói a
subjetividade desses sujeitos. Outro ponto que vale a pena ressaltar através das análises
feitas, é como esse ato pode ser uma forma de resistência e preservação de tradição desses
povos, ainda de identificação dos sujeitos ao seu trabalho e as significações que os mesmo
dão a essa atividade.

CANTOS, SAÚDE E SUBJETIVIDADE

O que chamamos de “Cantos do trabalho” aqui, são canções presente no processo


de atividades produtivas manuais, seja em trabalhos no campo, urbano, individuais ou
coletivas (PIRES, 2012). É uma prática antiga e tradicional presente no Brasil e suas origens
nos remonta às raízes da construção de nosso país, com inspirações indígenas combinadas

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com influências africanas e europeias (PINTO, s/d).
Esses cantos nos apresentam um contexto próprio de construção e de
representação, contando questões de cunho coletivo, relativos à região que foi produzido,
questões politicas, sociais, econômicos e da complexidade que o cotidiano apresenta.
(SANTOS, 2007, p.1-2).
No documentário “Cantos do Trabalho – Bahia Singular e Plural (TVEBahia,
2012)”, nos são apresentados cantos realizados em vários tipos de atividades: no trabalho
rural agrário, na lavoura, nas batas de milho, café, mandioca e feijão e nas casas de farinha.
Há variações no arcabouço dessas canções já que estas são feitas no improviso durante a
realização desse trabalho, dentre elas é possível citar: os “bois-de roça”, que são musicas
utilizadas no plantio e colheita de cereais; as “batas de feijão/milho”, que tem um ritmo
Sobral-CE, novembro de 2017.

marcado na batida no porrete usado para descascar o milho/feijão; ainda aparecem os


cantos de pilar e colher café, bem como outros cantos presentes nas casas de farinha, os
cantos das lavadeiras e os aboiadeiros, o livre ou em versos (Pires, 2012). Existem outros
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cantos de trabalho, vale citar alguns “as canções de fiar, canções de quebrar pedra, as
canções de plantar e colher, as canções de remar, chamar o gado, apregoar, etc.” (ibidem).
No início do vídeo há uma cena de trabalhadores batendo feijão. Na ocasião, já é
salientado o teor fatigante desse tipo de trabalho. No entanto, quando é trago a questão dos
cantos, uma nova perspectiva é posta em cena, que é a do trabalho alegre e menos
cansativo, como mostram as feições dos participantes. Acaba que a presença da música na
realização dessas atividades laborais faz com que seja quase um momento de lazer coletivo.
A utilização do espaço e do tempo de trabalho para se expressar e ressingularizar a
atividade, nos permite pensar na questão de como se produz saúde nesses contextos.
Certamente, saúde não se limita a ausência de uma patologia, mas, sobretudo, refere-se à
posição ativa desses trabalhadores no ato laboral, seja quando cantam durante a realização
do trabalho, ao passo que cantam ressignificam e estabelecem novas formas de lidar com
algo que poderia gerar grande desprazer.
O trabalho realizado com os cantos improvisados é o que chamamos de trabalho
real. Tratamos do como os trabalhadores passam a lidar com seu trabalho a partir dos

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cantos com o que, na Ergologia, chama-se “uso de si” e “dramática do uso de si”.

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Trabalhar, segundo Borges (2004), é sempre um drama no sentido de que envolve o
trabalhador em toda sua complexidade. Além disso,

A expressão “uso de si” remete ao fato de que não há somente execução nessa
dramática (...) é a pessoa sendo convocada em toda a sua subjetividade(...). O
conceito de uso de si chama a atenção para a complexidade do humano.
(BORGES, 2004, p. 45).
Vale salientar que o que é cantado pelos trabalhadores, são cantos autorais,
intimamente vinculados a experiências cotidianas e ao trabalho, com um ritmo que se
assemelha ao movimento empregado pelo corpo para realizar o trabalho ou como forma de
comunicação, como pode ser citado o canto de aboio.

Ser vaqueiro é na caatinga,


correndo nos matagais,
Sobral-CE, novembro de 2017.

levanta de madrugada pra cuidar dos animais,


ser poeta é trovador,
ter seu nome no interior
mostrando como é que faz êêê
Nos aboios, o vaqueiro canta versos curtos e improvisados, de modo a dar
prioridade à repetição de vogais em tons diferentes para tanger o gado. É como se eles
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cantassem o mugido do gado para incitar a boiada, como um dos vaqueiros diz no
documentário “é o aboio que chama o gado”.

Êêêooaaooeei boiada êêê


ê boiada tu me conhece
vou te mostrar a ração
você hoje tá no pasto
na sua alimentação
e amanhã para o mundo
em rádio e televisão iêê
Na roça, surge um novo estilo de canto: o boi-de-roça ou boi-de-corda. Esse novo
estido é comumente cantado por duplas de lavradores durante o plantio e a colheita de
cereais, dentre eles milho e feijão. Além disso, quando os trabalhadores vão roçar na terra
de um dos colegas da comunidade, eles chamam o movimento de “batalhão”. Quando um
batalhão é feito em segredo, ou seja, sem que o lavrador beneficiado saiba do que os outros
lavradores estão planejando, é chamado de “boi-roubado”.
Observa-se que expressões cunhadas pelos próprios trabalhadores, enquanto grupo,
são formas de estabelecimento de vínculos. Além disso, outra questão relativa a esses
batalhões é que ocorrem desde antes do advento da tecnologia no campo, e apesar de ter

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essa tecnologia que facilite o trabalho, a dimensão da preferência pelo trabalho coletiva
prevalece.
Nesses batalhões, os cantos possuem uma peculiaridade: cada verso é cantado por
duplas, de modo que só se passa para as próximas estrofes quando todos terminam de
cantar a anterior. Além disso, os cantos dessa jornada podem ser de criados livremente no
ato laboral ou alguém cria um canto novo. No entanto, o lavrador que elaborar os versos
anteriormente ensina a cada colega como cantar, para que todos possam participar. Desse
modo, uma única música pode demorar horas para que se termine de cantá-la. A última
dupla que canta termina a estrofe entoando uma nota longa, que, segundo falam no
documentário é “até esgotar o folego do cantador”. Desse modo, enfatizamos que o canto,
ao passo que é (re)produzido
Sobral-CE, novembro de 2017.

opera desvios nesse meio que muitas vezes parece estar dominado(...) funciona
como uma dupla ferramenta que, por intermédio da repetição, produz novos
sentidos, advindos tanto das palavras como da música e da afetividade
performática. (SILVA, 2007, p.12)
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Nesses casos em que há a criação de um novo canto por parte de um trabalhador e


no esforço empenhado de ensinar a todos os outros colegas, é possível observar que

Os trabalhadores inventam/elaboram/transmitem uns aos outros


procedimentos não ensinados, nem pela formação, nem pela supervisão. Esse
saber é fonte não só de criação, como também de produção de resistências, de
novos sujeitos/objetos, de outras formas de gestão de si. (BARROS apud
BARROS, 2004, p. 45).
Ainda nos batalhões ou mutirões, como também são chamados, há uma cerimônia
ao fim do trabalho. O membro da comunidade que recebe o batalhão precisa oferecer
comida e bebida até o final deste. Na cerimônia, inicialmente, uma lona é estendida no chão
e funciona como mesa onde é servida uma refeição feita por mulheres à base de feijão,
carne e farinha. Posteriormente, há um ritual com uma bandeira, que é repassada ao grupo
que se mobilizou para fazer o mutirão. A entrega da bandeira é tida como símbolo de
gratidão à solidariedade do grupo. Em seguida, bebe-se cachaça, bebida típica de festas
populares, e finaliza-se cantando e dançando sambas.
Os momentos do mutirão são uma forma de apoio mútuo dos lavradores, onde eles
cantam, se divertem, compartilham experiências e reveem os amigos. A extensão do

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momento de trabalho para momentos em que predomina também um certo lazer, é uma
forma de ressingularizar esse trabalho, ao passo que não se limita apenas à realização da
atividade laboral.
Nesses momentos é possível observar as três características presentes nesses cantos
e na reprodução deles, são citadas por Turino (2008, p. 36 apud MOTTA, 2014): a primeira
é relativa à participação das pessoas nesses cantos, que serve para apoiar ou inspirar uns aos
outros; a segunda serve para aumentar os laços sociais entre os participantes, que está
ligada a própria tradição; e a última, é que essas participação dos membros, faz com que
essas práticas cresçam e permaneçam a acontecer (p. 294-5)”.
Isso pode ser visto de forma mais clara no documentário, onde um dos lavradores
relata sua relação com os seus batalhões, muito emocionado o mesmo diz que é um
Sobral-CE, novembro de 2017.

momento que se sente bem, é onde faz e rever seus amigos, estimula seus filho a participar
como forma de manter a tradição, e ainda diz “só deixo meu batalhão quando morrer”. Em
outros momentos outros trabalhadores relatam como aprenderam esses cantos, se
remontando as suas infâncias onde ajudavam seus pais e familiares nas lavouras. Disso
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podemos depreender como esses cantos estão presentes e arreigados no cotidianos dos
mesmo, não só parte de seus contextos, mas estruturantes e um ponto do qual para eles é
organizador de suas subjetividade.
No período de setembro a outubro há a colheita de milho e feijão. Posteriormente à
colheita há o momento de bater os cereais para retirar a casca do feijão e o milho do
sabugo para estocar. Os cantos que embalam as “batas” como são chamados esses
momentos, possuem características muito rítmicas que se assemelham aos movimentos
corporais realizados. O instrumento utilizado para bater é uma espécie de cassetete. O
ritmo da batida durante o trabalho inspira a música e vice-versa. Esses cantos também são
feitos de forma improvisada.
Antunes (2006) salienta que, atualmente, é possível encontrar a questão do trabalho
em uma nova morfologia que recupera questões do âmbito social ao atentar para questões
de aspecto relacional da criação de vínculos ou laços afetivos no ambiente laboral. Nesse
sentido, essa nova morfologia

nos obriga a (re)conceber o trabalho como sendo dotado de autonomia,


autocontrole e autocomando, cuja fruição seja pautada pelo tempo disponível

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para a sociedade, ao contrário da heteronomia, da sujeição e da alienação regidas
pelo tempo excedente voltado para acumulação privada do excedente, típica da
sociedade fetichizada em que vivemos. (ANTUNES, 2006, p.20).
Apesar de o trabalho ser voltado para uma forma de acumulação, os cantos vão
além dessa questão, que no meio rural é mais centrado nas formas de produção para a
subsistência.
Segundo Silva (2007), os cantos possibilitam formas de significar a realidade ao
passo que produz subjetividade. Diante das multiplicidades dos cantos, partimos de um
referencial de uma subjetividade entendida como processo que está em constante produção
coletiva, e, sobretudo, “que não segue padrões fixos, que é mutável no tempo e na história”
(p.16). Essa concepção de subjetividade impacta no modo com a saúde do trabalhador foi
aqui ressaltada.
Sobral-CE, novembro de 2017.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por fim, entendemos assim como a Ergologia entende atividade, e essa atividade
em questão, o canto do trabalho tem em si, segundo Durrive e Schwartz (2008), enquanto

um impulso de vida, de saúde, sem limite predefinido, que sintetiza, cruza e liga
tudo o que se representa separadamente: o corpo e o espírito; o individual e o
coletivo; o fazer e os valores; o privado e o profissional; o imposto e o desejado
(p.23).
A relação desses trabalhadores e seus cantos vão para além do trabalho prescrito,
que por vezes nesse ambiente pode ser penoso ou até perigoso, se insere em seus contexto
de vida e fazer um recorte nesse cotidiano, os fazendo construir e falar de algo que está
diante deles e os afeta, sendo essa uma das forma de se por frente a esse mundo e de existir
nesse mundo.

REFERÊNCIAS

ALVES, R. A., & GUIMARÃES, M. C. (2012). “De que sofrem os trabalhadores rurais? Análise dos
principais motivos de acidentes e adoecimentos nas atividades rurais”. In: Informe Gepec, 16(2), 39-56.

ISSN 2318.4329.
ANAIS do IX Encontro de Pesquisa e Extensão da Faculdade Luciano Feijão.
ANTUNES, R.(2006) O caracol e sua concha: ensaios sobre a morfologia do trabalho. São Paulo:
Boitempo.

BORGES, Maria Elisa Siqueira.(2004) “Trabalho e gestão de si: para além dos recursos humanos”. In:
Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, São Paulo, v.7.

DURRIVE, L.; Schwartz, Y. (2008). “Revisões temáticas: glossário da ergologia”. In: Laboreal, Porto, 4(1),
p.23-28.

GIL, A. C.(2008). Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas.

MOTTA, A. R. (2015). “O papel da música nas atividades de trabalho”. In: Bakhtiniana. Revista de
Estudos do Discurso. ISSN 2176-4573, 10(2), 90-114.

______. (2014) Muito além da cigarra e a formiga. Letras de Hoje, Porto Alegre, 49(3), p.290-296.

PINTO, Tales. Brasil Escola. Cantos do trabalho e a cultura nacional. Disponível em


<http://educador.brasilescola.uol.com.br/estrategias-ensino/cantos-trabalho-cultura-nacional.htm>
Acessado: 25/06/17

PIRES, J. (2012). “GGN – o jornal de todos os brasis. Cantos do Trabalho – Bahia singular e Plural”.
Sobral-CE, novembro de 2017.

Disponível em: < http://jornalggn.com.br/video/cantos-de-trabalho-bahia-singular-e-plural> Acessado:


27/06/17

SANTOS, R. C. dos. (2007). “Cantos de Trabalho: rupturas e permanências no Recôncavo Sul da Bahia”. In:
Anais do III Encontro Estadual de História: Poder, cultura e diversidade [CD-ROM]/Organização
Jairo Carvalho do Nascimento e Luiz Henrique dos Santos Blume. Associação Nacional de História-Seção
Bahia. Caetité: UNEB.
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SILVA, R. S. (2007). Canções, Mídia e Produção de Subjetividade. Universidade Federal Fluminense.


Niterói. 104p. Sonoros Ofícios: cantos de trabalho (2015). Rio de Janeiro: SESC, Departamento Nacional.
ISBN 978-85-8254-043-5. 80 p.

TVEBahia, Cantos do trabalho – Bahia singylar e plural. Disponível em <


https:<//www.youtube.com/watch?v=O0AoVe3RIzY> Acesso em 26/06/14.

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Sobral-CE, novembro de 2017.

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