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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CIÊNCIAS BIOLÓGICAS COM ÊNFASE EM CIÊNCIAS AMBIENTAIS

SISTEMÁTICA E EVOLUÇÃO

Jonathan Vicente da Silva

Vida e Obra de Carl Friedrich Philipp von Martius e Johann Baptist von Spix
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Introdução

O zoólogo Johann Baptist von Spix e o botânico Carl Friedrich Martius figuram entre os mais
famosos e importantes viajantes que já desembarcaram no Brasil. O século XIX foi um período de
intensa movimentação no país com a chegada de cientistas e artistas empenhados em descobrir e
reproduzir em seus estudos e obras a biodiversidade brasileira. Spix e Martius, mais
especificamente, embarcaram então na que ficou conhecida como expedição austríaca que, além
de razões políticas, nas palavras do imperador Maximiliano I do então reino da Baviera, tinha o
intuito de realizar investigações científicas pelo bem da ciência e da humanidade. De fato, a viagem
dos dois pesquisadores propiciou a mais completa exploração da fauna e da flora brasileiras até os
dias de hoje, dando origem a uma série de produções responsáveis por revelar detalhes fascinantes
e profundos do Brasil; A dupla lançou as bases para a divisão dos biomas brasileiros além de
catalogar quase metade de todas as espécies de plantas brasileiras. De 1817 a 1820 os naturalistas
percorreram mais de 10 mil km, passando por diversos estados, entre os quais São Paulo, Minas
Gerais, Rio de Janeiro, Piauí, Maranhão, Pará e Amazonas, legando uma vasta produção científica
publicada em diversos volumes e, ainda, um relato da viagem, intitulado Viagem pelo Brasil,
publicado em 1823.

Os alemães tinham uma obsessão na cabeça: o Brasil; A paixão pelo país aconteceu com a
primeira viagem que realizou na companhia de Spix. As suas pesquisas abriram todo um campo de
prospecção para o conhecimento do Brasil, inventando um modelo de classificação para a
paisagem brasileira, fundado na relação entre as plantas e o espaço. Era uma antecipação do que
hoje se chama de ecossistema. Ainda na década de 1820, na botânica e na zoologia, Spix e Martius
ofereceram ao público em geral belas obras de taxonomia vegetal e animal, as quais foram muito
bem recebidas. Especial destaque merece a catalogação das espécies das palmeiras (Historia
naturalis palmarum), obra que idealizou já durante a viagem ao ver os elegantes espécimes nas
mais diversas regiões do Brasil. Com o tempo, Martius se propôs levar adiante uma enciclopédica
catalogação da totalidade da flora do Brasil com a Flora brasiliensis, uma obra iniciada em 1840 e
concluída postumamente, em 1906. Essa catalogação das plantas lhe permitiu perceber a
existência de diversos biomas, que descreve e analisa com detalhe. Trata-se de edições fartamente
ilustradas e construídas com um sofisticado sentido estético. Na perspectiva histórica, a obra de
Spix e, sobretudo, a de Martius nos legou, em primeiro lugar, abundantes materiais para o
conhecimento da natureza e dos povos do Brasil no início dos Oitocentos. Nesse cenário, dois
naturalistas bávaros, o botânico Martius e o zoólogo Spix desembarcaram no porto do Rio de
Janeiro, em 1817, justamente com essa missão: estudar e dar nome às coisas. No caso, a natureza
brasileira, cujo inventário estava praticamente inteiro por fazer. E conseguiram. Durante três anos,
eles percorreram mais de 14 mil quilômetros pelo interior do país naquela que é considerada a
maior expedição científica de exploração da fauna brasileira. Os estudos de von Martius e von Spix
foram tão completos que devemos a eles a divisão natural do território brasileiro em cinco biomas
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como conhecemos: Mata Atlântica, Amazônia, Caatinga, Cerrado e Pampa. A dupla coletou 22 mil
espécies de plantas no século 19, quase metade do que todas as espécies brasileiras conhecidas
até hoje.

Vida e obra de Martius

Karl Friedrich Philipp von Martius formou-se em medicina e dedicou-se às ciências naturais.
Em 1817, integrou a missão científica enviada ao Brasil pelos governos bávaro e austríaco,
encarregando-se da seção de botânica, enquanto Johann Baptist von Spix (1781-1826) chefiava a
parte de zoologia. Chegando ao Rio de Janeiro a 15 de julho de 1817, Martius iniciou
imediatamente expedições científicas nos arredores da capital. Martius internou-se no sertão,
fazendo contato com índios antropófagos e, subindo o rio São Francisco, chegou ao interior de
Goiás. Atravessou a Bahia, Pernambuco e, transpondo a Serra Dois Irmãos, visitou as províncias do
Piauí e Maranhão. No decorrer dessa viagem, Martius reuniu cerca de 6.500 espécies de plantas,
sem contar o material etnográfico e filológico. Partindo de Belém do Pará, subiu o rio Amazonas,
terminando sua viagem em Santarém, de onde embarcou para a Europa. Seguiu para São Paulo e,
depois, permaneceu vários meses na província de Minas Gerais. De volta à Alemanha, foi nomeado
professor da Universidade de Munique e diretor do Jardim Botânico dessa cidade.

A maior realização desse notável botânico foi a monumental Flora Brasiliensis, considerada
uma das maiores obras botânicas de todos os tempos, a Flora brasiliensis impressiona até hoje
pela sua escala monumental, o tamanho físico dos volumes e, acima de tudo, a qualidade e beleza
das suas ilustrações. Uma série de expedições realizadas sem nenhum acidente sério ou perda dos
materiais coletados, algo incomum para expedições científicas naquela época, e trouxe de volta
para Europa a coleção inteira de 20.000 exsicatas, contendo ao redor de 6.500 espécies de plantas,
além de grande número de espécimes zoológicos e uma extensa coleção de artefatos das
diferentes tribos de indígenas encontradas durante a viagem. Voltando para Munique, Spix e
Martius iniciaram a publicação dos resultados da expedição, começando com o relato da própria
viagem, mas a morte prematura de Spix, em 1826, deixou Martius sozinho com a tarefa de
completar os últimos dois volumes. Com a morte de Spix, Martius também assumiu as tarefas de
revisão e publicação dos resultados zoológicos, junto com suas próprias obras sobre as coleções
botânicas. Após uma tentativa inicial, logo abandonada, de publicar uma Flora do Brasil em
colaboração com seu amigo Nees von Esenbeck, Martius foi encorajado pelo príncipe Metternich
a iniciar a publicação em escala muito maior e bem mais ambiciosa de uma Flora do Brasil. Esse foi
o projeto que se tornou a Flora brasiliensis que nós conhecemos hoje. O projeto recebeu apoio
financeiro do imperador Ferdinando I da Áustria, do rei Ludovico I da Baviera e do imperador Dom
Pedro II do Brasil. Em 1840, foi publicado o primeiro dos 140 fascículos que iriam compor a obra e
esta foi terminada somente em 1906, muito após a morte de Martius. A Flora brasiliensis, na sua
forma final, consiste de 15 volumes subdivididos em 40 partes originalmente publicados na forma
de 140 fascículos individuais. Descreve um total de 22.767 espécies, das quais 19.629 são nativas
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e 5.689 foram descritas como novas na obra. Ilustrando 6.246 espécies e 59 pranchas que com
paisagens e tipos de vegetação, a maioria acompanhada por uma descrição minuciosa do próprio
Martius, e usadas para explicar o sistema de classificação da vegetação brasileira criada por ele.
Muitas dessas pranchas foram adaptadas dos desenhos e pinturas de Thomas Ender, o artista que
acompanhou Spix e Martius durante o primeiro ano da viagem, mas teve que voltar para Europa
posteriormente por problemas de saúde. Até hoje a Flora brasiliensis é a única Flora completa para
o Brasil e, para muitas famílias, continua sendo a única revisão completa disponível.
Com os dados obtidos no Brasil, Martius publicou também: História natural das
palmeiras; Novos gêneros e espécies de plantas; Desenhos selecionados das plantas criptogâmicas
brasileiras; e Sistema dos remédios vegetais brasileiros. Martius também contribuiu para o estudo
da etnografia e da linguística indígenas com as obras Contribuição para a etnografia e a linguística
da América, especialmente do Brasil e Glossário das línguas brasileiras, reunindo os termos
indígenas colhidos por Spix. Martius foi o cientista que mais contribuiu com as descrições
taxonômicas de diversas espécies brasileiras, utilizando litografias de altíssima qualidade que são
de grande valia para a identificação das mesmas. Disponibilizamos aqui obras que versam sobre a
fauna, a flora, a política, a cultura e a medicina brasileira, textos e ilustrações que são utilizadas
por pesquisadores do mundo todo devido ao seu alto valor histórico e biológico e as suas múltiplas
intersecções disciplinares. Prova de que Martius tinha consciência da relevância que o seu trabalho
alcançaria a longo prazo é o fato de ele ter se empenhado por organizar e procurar o financiamento
para a edição da monumental obra, em 40 tomos, da Flora brasiliensis, ao ponto de ter podido ser
concluída 40 anos depois da sua morte. Parece-nos fora de dúvida que Martius foi um cientista
apaixonado pelo seu trabalho, com vocação naturalista, mas que também adquiriu uma enorme
curiosidade por todos os assuntos vinculados com a população do Brasil. Cultivou vínculos
institucionais, em primeiro lugar com o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, do qual foi
membro correspondente, mas também com inúmeros intelectuais, cientistas e políticos
brasileiros. Martius quis entender e explicar o Brasil, um país para o qual via uma fabulosa
perspectiva de futuro.

Vida e Obra de Spix

Sétimo de 11 filhos, Johann Baptist Spix nasceu em 9 de fevereiro de 1781 na pequena


cidade de Höechstädt am der Aisch. Com 11 anos, ingressou na Escola Episcopal de Bamberg. Era
um menino sem recursos financeiros, porém dotado de inteligência excepcional. O pai, que faleceu
cedo, era barbeiro, dentista, farmacêutico e ainda cirurgião-médico. Foi também um respeitado
conselheiro de sua cidade. A mãe de Spix era filha de um comerciante italiano. Dizem ter sido
herdado dela o temperamento que Johann desenvolveu e que lhe causou problemas, mais de uma
vez; o gosto pela pesquisa da natureza teria recebido do pai. Em 1793, o jovem Spix transferiu-se
para o Seminário Episcopal, em Bamberg, onde se destacou como o melhor aluno. Em 1800, com
19 anos, doutorou-se em filosofia. Incentivado pela igreja, ingressou em 1801 no Seminário
Episcopal para preparação de Sacerdotes, em Würzburg, mas três anos depois abandonou o estudo
da teologia para se dedicar à medicina e às ciências naturais. Nesse período, Spix foi um aluno
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entusiasmado de Schelling, então um filósofo da natureza muito famoso. Spix garantia sua
subsistência com o que auferia como professor particular. Em 1807, doutorou-se em medicina e
começou a exercer a profissão em Bamberg. Schelling influiu consideravelmente na formação de
Spix. Em outubro de 1810 foi contratado pela Academia Real de Ciências para organizar o museu
de zoologia em Munique, onde desenvolveu importantes trabalhos sobre anatomia morfológica,
biologia evolutiva e história natural, sendo o primeiro zoólogo da capital da Baviera. Ele descobriu
a obra de sua vida no campo da história natural, zoologia especifiCamente, quando em 1811 ele
foi nomeado o primeiro curador de Zoologia da Bayerische Akademie der Wissenschaften (a
Academia Bávara de Ciências), em Munique. Em 1815 Spix, botânico Carl Friedrich Philipp von
Martius (1.794-1.868), e vários outros naturalistas foram selecionados para participar de uma
expedição austríaca oficial ao Brasil. A oportunidade foi ocasionada pelo casamento da filha do
imperador austríaco para o príncipe herdeiro de Portugal, em seguida, residentes no Brasil, graças
à invasão napoleônica de seu país. De 1817 a 1820, viajando separadamente ou em conjunto em
diferentes fases, as explorações de Martius no interior do país de Spix e acabou por ser uma das
expedições científicas mais importantes do século 19. Apesar de doenças e obstáculos
angustiantes Spix subiu o rio Amazonas e por meio de suas selvas, tanto quanto a fronteira com o
Peru. Eles foram os primeiros europeus a explorar estas áreas desde La Condamine na década de
1730/40, e as suas colecções incluindo 85 espécies de mamíferos, 350 espécies de aves, cerca de
2.700 espécies de insetos, e cinqüenta e sete animais vivos forneceram material para um vasto
número de obras , como o Dicionário da biografia científica observa. Após o seu regresso Spix
trabalhou incansavelmente, analisando suas coleções zoológicas e descrições de publicação de
muitas espécies novas para a ciência europeia em seus trabalhos sobre os mamíferos, anfíbios e
répteis e aves do Brasil. Junto a Carl Friedrich von Martius, a expedição científica no Brasil resultou
na publicação de obras importantes para o conhecimento da natureza brasileira, pois a descreve
com riqueza de detalhes, principalmente em relação à fauna e indígenas. Spix percorreu sozinho o
rio Solimões, de Tefé a Tabatinga, e o rio Negro, de Manaus a Barcelos. Concentrado no estudo da
fauna, fez o inventário de 3.381 espécies de animais brasileiros. Spix deixou numerosos artigos e
memórias, publicados principalmente pela Academia Bávara de Ciências. Tragicamente morreu
apenas 6 anos depois dos males contraídas durante a viagem. No final do século XIX, foram
confeccionados em Munique dois monumentos para o parque do Museu Goeldi, em Belém, (PA):
um dedicado a Martius e o outro a “Johannes de Spix ex Baviera, o qual fez-se benemérito, através
de sua pesquisa sobre a fauna brasileira”. A lápide de Spix, em Munique, destruída na Segunda
Guerra Mundial, aludia aos restos mortais do mais sagaz, honrado e respeitável dos homens, dr.
Johann von Spix, cavaleiro da Ordem do Mérito Civil, membro da Academia Real de Ciências.
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Biografia de Carl Friedrich Philip Von Martius

Carl Friedrich Philipp von Martius nasceu em Erlangen, Baviera, Alemanha, em


17 de abril de 1794, foi um médico, botânico, antropólogo e um dos mais importantes
pesquisadores alemães que estudaram o Brasil e especialmente a região da Amazônia. Era filho
do boticário Ernest Wilhelm Martius, um dos fundadores da Sociedade Real de Botânica, de
Regensburg. Ingressou em 1810, aos dezesseis anos, na Universidade Fredericus Alexander, para
estudar medicina. Na universidade dedicou-se ao estudo de botânica, tendo sido aluno de
naturalistas alemães de tradição iluminista, dentre os quais, Johann von Schreber, botânico que
estudou com Carlos Lineu. Recebeu o diploma de doutorado em 1814, com a tese intitulada
Plantarum horti academici Erlangensis enumeratio, construída como um catálogo científico para
o Jardim Botânico de Erlangen. Foi recomendado por Johann Baptist von Spix, que conhecera em
sua cidade natal, para pesquisador do Jardim Botânico da Academia de Ciências de Munique,
tornando-se assistente do botânico Franz von Paula Schranck. Em 1817 veio para o Brasil,
convidado pelo rei Maximiliano, da Baviera, como integrante da comitiva da arquiduquesa Maria
Leopoldina, por ocasião de seu casamento com d. Pedro I, na chamada Missão Austríaca. Entre
1817 e 1820, ao lado de Johann Baptist von Spix e do artista Thomas Ender, investigou a flora
brasileira, numa viagem que percorreu as províncias de Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais,
Bahia, Maranhão, Pernambuco, Piauí, Pará e Amazonas. Von Martius passou dez meses de sua
vida na região norte do país, tempo suficiente para marcar os 40 anos posteriores à sua
passagem, tão intensa foi sua ligação com essa região, sendo seus estudos sobre botânica um
grande legado cultuado até os dias atuais, com a publicação de sua notória obra Flora
Brasiliensis. Contudo, sua produção não se restringiu à botânica, e, de acordo com Erwin Theodor
Rosenthal, é impossível não consultar suas obras hoje quando se está fazendo pesquisa sobre
metodologia histórica corrente no século XIX, por exemplo, ou mesmo questões sobre
etnografia, folclore brasileiro e estudos das línguas indígenas. Com o falecimento de Spix, Martius
publicou o relato de viagem e divulgou o material coletado no Brasil. Segundo a obra "Brasiliana
da Biblioteca Nacional", página 69, "os botânicos que vieram ao Brasil tiveram sempre como
parte importante de sua missão a coleta de informações e o envio de sementes de plantas
medicinais ou úteis ao homem, como é o caso da viagem de Carl Friedrich von Martius. Como se
sabe, este naturalista veio ao Brasil com a comitiva científica que acompanhou a arquiduquesa
Leopoldina, na ocasião de seu casamento com o príncipe D. Pedro. Ele e seu companheiro, o
zoólogo Johan Baptist von Spix, ficaram no país de 1817 a 1820. A atitude de Martius para com o
Brasil é semelhante à de Auguste de Saint-Hilaire. Fizeram amigos aqui, gostavam do país e
ganharam celebridade acadêmica graças às coleções que formaram e aos livros que publicaram
sobre o Brasil. Martius, apesar de jovem, era um cientista formado em 1817. Durante sua
viagem, enfrentou com profundidade diversos problemas referentes à história do planeta, à
distribuição geográfica dos organismos, aos indígenas da América. Uma de suas principais
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preocupações foi justamente a busca de produtos medicinais eficazes que pudessem ser
difundidos na Europa e mesmo na América. Sua contribuição para o Brasil viria justamente de sua
formação de especialista. Submeteu os conhecimentos dos indígenas e dos colonos brasileiros a
seu método científico, baseado, segundo ele, na indução e na verificação. Em seu livro "Systema
materiae medicae vegetabilis brasiliensis", Martius relaciona 470 plantas medicinais do Brasil.
Parte dela não era conhecida dos indígenas, que particavam uma medicina que considera por
demais rústica. Várias espécies foram descobertas pelos europeus, que se basearam na analogia
com as espécies usadas na Europa. Outras plantas, apesar de serem utilizadas no resto da
América, não eram do conhecimento dos indígenas locais. Ou seja, não basta a um povo estar
próximo de plantas úteis, se não souber tirar proveito delas. O botânico, procedendo ao
reconhecimento das analogias morfológicas íntimas que existem entre as plantas, é capaz de
dizer muito sobre uma flora que até então lhe era desconhecida." Ainda segundo o mesmo livro,
página 75: "Talvez um dos viajantes que mais tenha invertido o mito do bom selvagem ao
analisar os indígenas brasileiros tenha sido Carl Friedrich Philipp von Martius. Ele acreditava que
os índios eram os remanescentes degenerados de povos "superiores" que teriam construído
cidades, monumentos e teriam tido códigos de conduta muito mais "evoluídos". Suas críticas à
crença no ́bom selvagem ́ são explícitas: Ainda não há muito tempo era opinião geralmente
adotada que os indígenas da América foram homens diretamente emanados da mão do Criador.
Enfeitado com as cores de uma filantropia e filosofia enganadora, consideravam este estado como
primitivo do homem: procuravam explicá-lo, e dele derivavam os mais singulares princípios para
o Direito Público, a Religião e a História. Investigações mais aprofundadas, porém, provaram ao
homem desprevenido que aqui não se trata do estado primitivo do homem, e que pelo contrário
o triste e penível (sic) quadro que nos oferece o atual indígena brasileiro, não é senão o residuum
de uma muito antiga, posto que perdida história. Desde o período colonial, é possível encontrar
escritos que foram chamados de ́histórias do Brasil ́, tais como relatos de administradores,
missionários e viajantes que registraram os fatos ocorridos e observações sobre a vida e os
costumes dos habitantes do Brasil entre os séculos XVI ao XVIII. Todavia, a preocupação com uma
história que tomasse a idéia de um passado nacional é engendrada de maneira pontual com o
surgimento político do Brasil independente. A partir da criação do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro (1838), cerca de sete anos antes da data da monografia, é que se percebe mais
claramente a preocupação por parte da elite letrada e política com o projeto de formular uma
história do Brasil. Mas é somente na década seguinte é que se acentuam as questões referentes
à formulação de uma história pátria. Em um momento que a elite dirigente buscava consolidar o
Estado imperial, todas as questões relativas à história do Brasil seriam cruciais para traçar a forma
de se contá-la e a forma como os brasileiros se veriam a si próprios. Para buscar as respostas a
essas inúmeras questões, o secretário do referido Instituto, Januário da Cunha Barbosa, propôs
uma premiação para quem respondesse sobre qual o melhor sistema para escrever a História do
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Brasil. O ganhador do concurso foi von Martius, em contato com a voga da disciplina histórica na
Europa, particularmente na Alemanha e propôs uma história do Brasil que fosse ao mesmo tempo
"filosófica" e "pragmática", tendo como eixo a formação de seu povo, incluindo nesta formação a
"mescla das raças". A monografia de von Martius "Como se deve escrever a história do Brasil"
aparece inserida numa preocupação com uma história que tomasse a idéia de um passado
nacional, comum a todos os "brasileiros", que teve início com o surgimento político do Brasil
independente.
Retornou a Munique em 1820, onde reassumiu seu cargo de conservador do Jardim
Botânico, tornando-se diretor em 1832, além de professor da universidade desta cidade. O
material coletado no Brasil resultou em importantes obras científicas como Reise in Brasilien, em
co- autoria com Johann von Spix, publicada em três volumes; Nova genera et species plantarum
brasiliensiun, também em três volumes; Historia naturalis palmarum, em 3 volumes e com 135
ilustrações; Icones selectae plantarum cryptogamicarum brasiliensiun e Systema materiae
medicae vegetabilis brasiliensis. Deu início ao grande projeto Flora brasiliensis, publicado entre os
anos de 1840 e 1906, num total de 15 volumes, divididos em 40 partes, onde são descritas 22.767
espécies de plantas, em que colaboraram 66 botânicos de vários países. Foi nomeado membro
adjunto da Academia Real de Ciências de Munique em 1816. Sócio honorário do Instituto Histórico
Geográfico Brasileiro. Morreu em Munique, Alemanha, em decorrência de pneumonia em 15 de
dezembro de 1868.

Referências
KALTNER, Leonardo F. Anotações sobre a biografia do naturalista Carl Friedrich Philipp von
Martius. Disponível em: <https://goo.gl/R6rnVu> . Acesso em: 12 out. 2021.

Carl Fr. Ph. von Martius: estudo e registro da flora brasileira | História, Ciências, Saúde
Manguinhos. Fiocruz.br, 2013. Disponível em: <http://www.revistahcsm.coc.fiocruz.br/carl-fr-
ph-von-martius-estudo-e-registro-da-flora-brasileira/>. Acesso em: 12 oct. 2021.

FRANCISCO, S. Edição reúne novos desenhos e documentos das viagens de Philipp von
Martius. Acervo, 2019. Disponível em:
<https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/diversao-e-
arte/2019/03/02/interna_diversao_arte,740725/edicao-reune-novos-desenhos-e-documentos-
das-viagens-de-philipp-von-ma.shtml>. Acesso em: 12 oct. 2021.
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Biografia de Johann Baptist von Spix


Nasceu em Höchstadt der Aisch, Baviera, Alemanha, em 9 de fevereiro de 1781. Oriundo
de família de poucos recursos, perdeu o pai precocemente. Ingressou na escola episcopal de
Bamberg aos onze anos, tendo-se transferido em 1793 para o seminário episcopal desta mesma
cidade, onde se destacou como o melhor aluno. Em 1800, aos 19 anos, doutorou-se em filosofia.
No ano seguinte ingressou no Seminário Episcopal em Würzburg, para preparação de sacerdotes,
mas abandonou três anos depois. Em 1804 iniciou os estudos em Medicina e Ciências Naturais,
onde foi aluno de Friedrich Wilhelm Joseph von Schelling, importante filósofo da natureza, que
teve papel importante em sua formação, doutorando-se em 1807. Em 1808, o rei Maximiliano
José I convidou-o para instalar o Gabinete de Zoologia da Academia Real de Ciências da Baviera,
em Munique, organizada por Schelling. Recebeu patrocínio real para um curso de dois anos em
zoologia, em Paris, antes de assumir seu posto, convivendo com renomados cientistas como
Georges Cuvier, Henri-Marie Ducrotay de Blainville, Jean Baptiste Lamarck e Auguste de Saint-
Hilaire. Retornou a Munique em 1810, assumindo sua função na Academia Real de Ciências,
empreendendo estudos sobre zoologia, anatomia comparada e morfologia. Planejou e coordenou
uma viagem de estudos ao Brasil, integrada por um grupo de naturalistas e cientistas, por ocasião
do casamento da arquiduquesa austríaca, dona Leopoldina com o príncipe d. Pedro. Ao seu lado,
integraram ainda a missão austríaca, o botânico Carl Friedrich Philipp von Martius e o artista
Thomas Ender. A expedição percorreu Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Bahia,
Pernambuco, Piauí, Maranhão, Belém e Ilha de Marajó, seguindo até Manaus. Retornou a
Munique em 1820 e, ao lado de Martius, produziu uma obra completa sobre a fauna e a flora
brasileiras. Com o material coletado, deu início à publicação de tratados sobre macacos e
morcegos (Simiarum et vespertilionum Brasiliensium species novae ou Historie Naturelle, 1823),
lagartos, cobras, tartarugas e sapos e duas obras sobre aves (Avium species novae, quas in itinere
per Brasiliam, com Johann G. Wagler, além da conhecida Viagem pelo Brasil, escrita em parceria
com Carl Fr. Philipp von Martius. Voltou ao seu país com a saúde bastante fragilizada, tendo
contraído moléstias tropicais na Amazônia. Outros trabalhos póstumos foram publicados, tendo
por base suas observações zoológicas, constituindo um conhecimento pormenorizado da história
natural brasileira. Morreu em Munique, na Alemanha, em 15 de maio de 1826. Spix, ocupa o titulo
de primeiro zoólogo a explorar a região amazônica, fato que o trabalho do naturalista chega a ser
influente a ponto de, nos dias atuais, pesquisadores ainda seguirem seus passos.
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Referências

FTTKAU, Ernst Josef. Johann Baptist Ritter von Spix: primeiro zoólogo de Munique e
pesquisador no Brasil. Hist. cienc. saude, Rio de Janeiro, v. 8, supl. p. 1109-1135, 2001. Disponível
em: <https://goo.gl/HRBxK7> . Acesso em: 11 out. 2021.

KURY, Lorelai. Viajantes-naturalistas no Brasil oitocentista: experiência, relato e imagem. Hist.


cienc. saude, Rio de Janeiro, v. 8, supl. p. 863-880, 2001. Disponível em: <https://goo.gl/pmb6Nn>
. Acesso 10 out. 2021.

Johann Baptist von Spix: o cientista que desbravou o Brasil. Disponível em:
<https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2021-02/johann-baptiste-von-spix>. Acesso em:
out de 2021.

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