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CÓDIGO DE ÉTICA DOS FACILITADORES DE PRÁTICAS RESTAURATIVAS

INTRODUÇÃO

O NÚCLEO DE JUSTIÇA RESTAURATIVA DE CAXIAS DO SUL, a fim de garantir


que a intervenção dos Facilitadores de Práticas Restaurativas seja realizada com
total adequação e qualidade, vem propor o presente Código de Ética. Este visa
pautar a atuação dos Facilitadores de Práticas Restaurativas, de forma a efetivar a
pacificação social e a prevenção de conflitos e norteou-se em princípios que formam
a consciência profissional do Facilitador e representam imperativos de sua conduta.
Inspirado nestes postulados é que o Núcleo de Justiça Restaurativa de Caxias do
Sul, no uso das atribuições que lhe são conferidas pela Lei Municipal n.7.754/2014
e tendo por base o Anexo III da Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça,
propõe este Código e exorta os Facilitadores à sua fiel observância.

Dos princípios e garantias das Práticas Restaurativas

Artigo 1º - São princípios fundamentais que regem a atuação dos Facilitadores de


Práticas Restaurativas: confidencialidade, competência, imparcialidade,
neutralidade, independência e autonomia, respeito à ordem pública e às leis
vigentes, segurança, informação, voluntariedade, busca por restabelecimento das
relações, busca por reparação de danos, consenso, horizontalidade, alteridade ,
empatia e empoderamento.

§1º. Confidencialidade – Dever de manter sigilo sobre todas as informações


compartilhadas pelos Participantes, salvo autorização expressa das partes (Termo
de Acordo), violação à ordem pública ou às leis vigentes. O Facilitador não pode ser
testemunha do caso, em hipótese alguma. A quebra do sigilo só é admissível quando
se tratarem de situações cuja gravidade possa, envolvendo ou não fato delituoso,
trazer risco, potencial ou efetivo, à segurança de algum dos participantes, de
terceiros e da coletividade. A revelação será feita dentro do estritamente necessário,
quer em relação ao assunto revelado, quer ao grau e número de pessoas que dele
devam tomar conhecimento.

§2º. Competência – Dever de possuir qualificação, junto a órgão ou instituição


formadora, reconhecida como tal junto ao Núcleo de Justiça Restaurativa de Caxias
do Sul, que o habilite como Facilitador de Práticas Restaurativas; bem como o dever
de apropriar-se do tema que será trabalhado no Procedimento, conhecendo suas
especificidades e seus possíveis desdobramentos, quais sejam: conhecer sobre o
tema explicitamente apresentado, reconhecer os conteúdos subjacentes que
emerjam durante o Procedimento, identificar possíveis assuntos conexos a serem
trabalhados durante o Procedimento, conhecer a legislação vigente afeta ao tema,
conhecer a rede profissionalizada e as formas de acesso a esta.

§3º. Imparcialidade – Dever de agir com ausência de favoritismo, preferência ou


preconceito, assegurando que valores e conceitos pessoais não interfiram no
resultado do trabalho, reconhecendo a realidade dos Participantes.
§4º. Neutralidade – Dever de manter equidistância das partes, respeitando seus
pontos de vista, com atribuição de igual valor a cada um deles.

§5º. Independência e autonomia - Dever de atuar com liberdade, sem sofrer qualquer
pressão interna ou externa, sendo permitido recusar, suspender ou interromper o
Encontro se ausentes as condições necessárias para seu bom desenvolvimento,
tampouco havendo obrigação de redigir acordo ilegal ou inexequível.

§6º. Respeito à ordem pública e às leis vigentes – Dever de velar para que eventual
acordo entre os participantes não viole a ordem pública, nem contrarie as leis
vigentes.

§7º. Segurança – Dever de avaliar, durante os Encontros, se os Participantes estão


comprometidos a agir com respeito para com os outros Participantes, garantindo,
assim, que haja segurança para a realização do Procedimento Restaurativo. Cabe
ao Facilitador a responsabilidade de interromper Procedimentos nos quais surjam
indícios consistentes de riscos aos Participantes e/ou ao Procedimento.

§8º. Informação – Dever de informar, de forma clara e precisa, aos Participantes


sobre o método de trabalho, as características e objetivos do Procedimento
Restaurativo, bem como informar sobre os possíveis desfechos deste.

§9º. Voluntariedade – Dever de informar e garantir ao Participante que sua presença


no Procedimento se dê forma plenamente voluntária, explicando-lhe que tem total
liberdade de desistir da participação a qualquer momento, sem que isso lhe acarrete
prejuízo algum, mesmo que o Procedimento esteja sendo realizado na esfera
judicial.

§10º. Busca por restabelecimento das relações – Dever de conduzir o Procedimento


de forma que, no seu decurso, os Participantes tenham a oportunidade de reavaliar
sua conduta e de ter seus sentimentos validados, criando assim possibilidades de
reconstrução dos vínculos rompidos pela situação conflitiva.

§11º. Busca por reparação de danos – Dever de conduzir o Procedimento de forma


que, seja possível construir, através do consenso, planos para o futuro, na forma de
um Termo de Acordo, e que neste conste a reparação de danos, seja esta de forma
direta ou indireta.

§12º. Consenso – Dever de assegurar que quaisquer decisões que surjam como
resultado do Procedimento sejam construídos com a colaboração de todos os
Participantes, e que resultem de consenso do grupo. A participação do Facilitador
na construção do consenso deve se dar com imparcialidade e neutralidade, sem
qualquer forma de indução, sugestão, orientação profissional, avaliação, julgamento
de valor e/ou encaminhamentos.

§13º. Horizontalidade – Dever de assegurar que a participação de todos tenha igual


valor e importância, garantindo que ninguém se sobressaia no Procedimento em
função de seu cargo, profissão, posição social, econômica, cultural e/ou hierárquica.

§14º. Alteridade – Dever de garantir que, durante o Procedimento, cada Participante


seja reconhecido e respeitado pelos outros em suas idiossincrasias.

§15º. Empatia – Dever de envidar enforços para compreender sentimentos e


emoções, de forma racional e objetiva, colocando-se no lugar do outro, sem que isso
implique em privilégios de qualquer espécie.

§16º. Empoderamento – Dever de garantir que todos participem de forma ativa para
determinar suas necessidades e o modo de satisfazê-las, através do respeito à
autodeterminação e à autonomia da vontade, a fim de assegurar que o consenso
resulte exclusivamente da autocomposição.

Das regras que regem o Procedimento Restaurativo

Art. 2º. As regras que regem o Procedimento Restaurativo são normas de conduta a
serem observadas pelos Facilitadores para seu bom desenvolvimento, permitindo
que haja o engajamento dos participantes, com vistas à sua pacificação, à obtenção
de compreensão mútua, à resolução da situação conflitiva e ao comprometimento
com eventual acordo obtido, sendo elas:

§1º. Informação - Dever de esclarecer os participantes sobre o método de trabalho


a ser empregado, apresentando-o de forma completa, clara e precisa, informando
sobre os Princípios Restaurativos, as regras de conduta, as etapas do
Procedimento, seus objetivos e possíveis resultados.

§2º. Autonomia da vontade – Dever de respeitar os diferentes pontos de vista dos


Participantes, assegurando-lhes que possam chegar a uma decisão consensual,
voluntária e não coercitiva, podendo o Participante inclusive retirar-se do
Procedimento a qualquer momento.

§3º. Ausência de obrigação de resultado – Dever de não forçar um acordo, dar


sugestões ou orientações além das estritamente necessárias à realização do
Procedimento, e de não tomar decisões pelos Participantes.

§4º. Desvinculação da profissão de origem – Dever de esclarecer aos participantes


que atua desvinculado de sua profissão de origem, informando que, caso seja
necessária orientação ou aconselhamento afetos a qualquer área do conhecimento
poderá ser convidado para o Procedimento o(s) profissional(is) respectivo(s), desde
que com o consentimento de todos.

§5º. Teste de realidade – Dever de assegurar que os participantes, ao chegarem a


um acordo, compreendam perfeitamente suas disposições, que devem ser
exequíveis, e suas consequências – imediatas e futuras – gerando o
comprometimento com seu cumprimento.

§6º. Publicização – Dever de informar e garantir aos Participantes, através da


assinatura bilateral de um “Termo de Consentimento Livre e Esclarecido”, que, caso
o Procedimento seja utilizado em pesquisas, como material de estudo, ou ainda
como material de divulgação, os Participantes não tenham sua identidade revelada.

Das responsabilidades e sanções do Facilitador de Práticas Restaurativas


Art. 3º. Apenas poderão exercer a função de Facilitador junto ao Núcleo de Justiça
Restaurativa de Caxias do Sul aqueles devidamente capacitados e cadastrados,
cabendo ao Núcleo de Justiça Restaurativa de Caxias do Sul regulamentar o
processo de inclusão e exclusão no respectivo cadastro.

Art. 4º. O Facilitador deve exercer sua função com lisura, respeitando os princípios
e regras deste Código, assinando, para tanto, no início do exercício, termo de
compromisso e submetendo-se às orientações do Núcleo de Justiça Restaurativa
de Caxias do Sul;

Art. 5º. Aplicam-se aos Facilitadores impedimento e suspeição quando estes tiverem
relacionamento prévio, seja ele pessoal ou profissional, com os Participantes do
Procedimento Restaurativo, devendo, quando constatados, serem informados aos
participantes, com a interrupção do Procedimento e sua substituição.

Art. 6º. No caso de impossibilidade temporária do exercício da função, o Facilitador


deverá informar com antecedência ao responsável para que seja providenciada sua
substituição na condução do Procedimento.

Art. 7º. O Facilitador fica absolutamente impedido de prestar serviços profissionais,


de qualquer natureza, pelo prazo de dois anos, aos participantes em Procedimento
Restaurativo sob sua Facilitação.

Art. 8º. O descumprimento dos princípios e regras estabelecidos neste Código, bem
como a condenação definitiva em processo criminal, resultará na exclusão do
Facilitador do respectivo cadastro.

Parágrafo único – Qualquer pessoa que venha a ter conhecimento de conduta


inadequada por parte do Facilitador poderá representar junto ao Núcleo de Justiça
Restaurativa de Caxias do Sul a fim de que sejam adotadas as providências
cabíveis.

Art. 9º. O facilitador deverá empenhar-se, permanentemente, em seu


aperfeiçoamento pessoal e profissional, devendo, para tanto, participar das
capacitações, cursos e treinamentos disponibilizados pelo Núcleo de Justiça
Restaurativa de Caxias do Sul. Bem como apresentar escusa, por escrito, quando
convocado, caso não possa, justificadamente, participar.

Da Publicidade

Art. 10º. O Facilitador que eventualmente participar de programa de televisão ou de


rádio, de entrevista na imprensa, de reportagem televisionada ou de qualquer outro
meio, para manifestação profissional, deve visar a objetivos exclusivamente
ilustrativos, educacionais e instrutivos, sem propósito de promoção pessoal ou
profissional, vedados pronunciamentos sobre métodos de trabalho usados por seus
colegas de profissão. Parágrafo único. Quando convidado para manifestação
pública, por qualquer modo e forma, visando ao esclarecimento de tema jurídico
de interesse geral, deve o Facilitador evitar insinuações a promoção pessoal ou
profissional, bem como o debate de caráter sensacionalista.
Art. 11. O facilitador deve abster-se de:
I – responder com habitualidade consulta nos meios de comunicação social,
com intuito de promover-se profissionalmente;
II – abordar tema de modo a comprometer a dignidade da profissão e da instituição
que o congrega;
III – divulgar ou deixar que seja divulgada a lista de participantes;
IV – insinuar-se para reportagens e declarações públicas.

Art. 12. A divulgação pública, pelo Facilitador, de assuntos técnicos ou fáticos


de que tenha ciência em razão do exercício profissional, deve limitar-se a
aspectos que não quebrem ou violem o segredo ou o sigilo profissional.

GLOSSÁRIO

Facilitador: pessoa capacitada em, no mínimo, uma Prática Restaurativa.


Práticas Restaurativas: métodos autocompositivos de solução de conflitos baseados
nos Princípios da Justiça Restaurativa.
Participante: toda e qualquer pessoa que tome parte no Procedimento Restaurativo.
Encontro: toda reunião dos Participantes com o Facilitador, seja ela individual ou em
grupo.
Procedimento Restaurativo: conjunto das ações realizadas pelo Facilitador em
atenção ao caso atendido.
Consenso: única forma possível de tomada de decisões num Procedimento
Restaurativo. Não se trata de unanimidade, mas sim de garantir que todos os
Participantes do Procedimento Restaurativo estejam comprometidos com a
realização do acordo construído coletivamente, de forma voluntária e sem coerção.

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