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Considera-se que um autor plagia a si mesmo quando reutiliza material próprio que já tenha
sido publicado, sem indicar a referência de seu trabalho anterior. Na verdade, com maior
rigor editorial, dependendo do contexto da publicação e da extensão do texto copiado, a
inclusão da referência poderia ser suficiente, pois não indica claramente ao leitor (nem ao
editor) o alcance da cópia.
Mas… é possível um autor “plagiar” a si mesmo? Isso soa um pouco absurdo, é como se
uma pessoa entrasse em sua casa pela janela e fosse acusado de roubar sua própria casa.
Do ponto de vista dos direitos do autor, não parece ser um crime, mas do ponto de vista da
integridade acadêmica é considerado antiético ou má conduta. Esta prática é muito comum
e é encontrada na lista dos 10 casos mais frequentes de plágio¹. Os autores podem
argumentar que, como são seus próprios escritos, eles podem usá-los uma e outra vez, na
íntegra ou em trechos… o que há de errado nisso?
Quando se configura o autoplágio? Qual é a fronteira entre reusar o seu próprio material e
o autoplágio? Esse conceito varia em diferentes áreas acadêmicas?
Apesar de ser prática frequente e conhecida pelos editores de periódicos científicos que
tentam controlar, é interessante notar que há poucos estudos sistemáticos sobre o
problema. Uma revisão da literatura, utilizando como fontes os trabalhos publicados
no iThenticate, base de dados especializada no assunto, e até mesmo a Wikipedia², todos
os trabalhos se referem finalmente a alguns autores originais que publicaram suas
pesquisas cerca de 10 ou 15 anos atrás. Possivelmente, um dos autores mais prolíficos é
Miguel Roig, que tem cerca de 70 obras de autoria no Google Scholar indexadas sobre esse
tema, alguns selecionados para esse post e indicados nas referências.
Uma definição simples de autoplágio é usar a própria pesquisa anterior e apresentá-la para
publicação como algo novo e original. Por que um pesquisador faria isso? O clima
acadêmico de publish or perish, e a competição por fundos de pesquisa, índices de citação,
etc. poderiam ser alguns dos motivos.
O autoplágio pode ser explicado por diferentes razões, e não é, necessariamente, sempre
antiético, alguns podem ser justificados e outros estão em uma “zona cinzenta”, que deve
ser resolvida pelo editor da publicação.
É muito comum que se disponha de uma pesquisa realizada tempos atrás, mas com
novos dados é possível para extender a reflexão e conclusões. Essa pesquisa não é
necessariamente original, mas é a maneira como a ciência funciona, à medida que se
vai adicionando nova informação, isso leva a reexaminar as hipóteses e conclusões.
O tipo de publicação salami, ou seja, uma pesquisa que está dividida em partes
mínimas e enviada para publicação e, em cada uma delas se repete uma parte
importante em comum. Deve-se notar que a publicação pode ser salami sem cometer
autoplágio, mas isso também é uma falta de ética de outro tipo.
Os periódicos não têm uma política explícita nas instruções aos autores sobre as regras
de autoplágio, autocitações e políticas diretas sobre plágio. No caso particular do
autoplágio, essas regras não são assumidas como default pelo autor, deveriam ser
especificadas na política do periódico.
Um autor reutiliza a informação de sua própria tese de doutorado, que não foi publicada
em periódicos, por um artigo em um periódico referindo-se à sua tese. Isso é
considerado autoplágio? E se a situação se inverter? Publicar um artigo em um
periódico e, em seguida, reutilizar tal informação em sua tese de doutorado.
Em geral, pode ser lícito publicar artigos a partir de uma tese, mas tem que constar no artigo.
E ao contrário, por exemplo, na Espanha, desde algum tempo, muitas universidades aceitam
que os doutorandos escrevam 3 ou 4 artigos em periódicos com Fator de Impacto no lugar
da tese⁴.
O Google Scholar reporta mais de 2.300 resultados sob o termo “autoplágio” e, apesar de
muitas dessas obras referirem-se ao jornalismo free- lance, muitos outros se referem a essa
prática no campo da publicação acadêmica.
Alguns autores também acreditam que podem se autoplagiar publicando seu artigo em outro
idioma. Isso, na verdade, é feito e é legítimo, por exemplo, com um romance, cedendo
direitos autorais para editoras de outros países, está completamente em desacordo com a
ética científica original submetida à revisão por pares. Novamente, se for um artigo de
divulgação, então, sim, é moral fazê-lo.
Este problema, que poderia ser apenas ético em periódicos de matemática ou filosofia, pode
ser prejudicial em biomedicina. Se o artigo é sobre a eficácia de um novo medicamento,
essa estratégia pode servir para promover os interesses acadêmicos e/ou comerciais de
quem está por trás da pesquisa. A publicação redundante dá ênfase exagerada à
importância das descobertas dando aos leitores desavisados uma ideia superestimada da
eficácia das intervenções ou dos ensaios clínicos.
De todas as maneiras, Samuelson indica que a publicação salami é um grave desvio ético
das práticas aceitáveis e o considera má conduta de acordo com as normas de pesquisa
científica e tecnológica. De acordo com Samuelson, a “regra de ouro” (rule of thumb) poderia
ser que até 30% de autoplágio seria aceitável, mas que isso pode variar em diferentes
disciplinas, no entanto, não seria possível estabelecer um limite máximo em termos legais,
pois se trata de uma “zona cinzenta”.
Uma posição radical e divergente é apresentada por Andrea Lunsford, ilustre professora e
vice-diretora do Departamento de Inglês da The Ohio State University. A Dra. Lundsford
(1999) apresenta uma visão diferente. Do seu ponto de vista pós-moderna e da área de
ciências humanas, considera que o conceito de plágio e os direitos autorais são
“construções” ou objetos conceituais, historicamente novos de um intrincado sistema de
propriedade intelectual e da economia capitalista, que estão profundamente entrelaçados
no conceito de plágio, e, em seguida, a partir desta nova definição, conduz a diferentes
avaliações.
Periódicos acadêmicos têm códigos de ética, que em alguns casos referem-se
especificamente ao autoplágio, no entanto outras o mencionam de forma marginal, e outros
ainda não o consideram diretamente, pois o assumem dentro do plágio em geral (o que não
é preciso). Os exemplos a seguir foram tomados a partir das publicações
do iThenticate listadas nas referências:
The MLA Style Manual and Guide to Scholarly Publishing (1998), dá ao termo
“autoplágio” um tratamento superfícial.
The Publication Manual of the American Psychological Association (APA) não usa o
termo “autoplágio”, até sua 5ª edição, inclusive o termo aparece pela primeira vez na
6ª edição por duas vezes. Entretanto, a sessão “Ethics of Scientific Publication”, contém
uma análise detalhada da “publicação duplicada de dados”.
O Journal of International Business Studies, bem como a Association for Computing
Machinery(ACM) criaram políticas específicas para o tema.
The American Political Science Association (APSA), seu código de ética descreve o
plágio, mas nenhuma referência ao autoplágio.
El Profesional de la Información (EPI)⁵, não aceita artigos cuja originalidade seja menor
do que 70%, conforme a tendência atual de todos os periódicos em ser mais rigorosos
ao aceitarem artigos.
De acordo com Miguel Roig (citado em Scanlon 2007), a quantidade de texto reciclado que
pode ser aceito para publicação acadêmica não foi adequadamente tratada na literatura e,
de todas as formas de autoplágio, a reciclagem é a mais problemática pois há poucas
diretrizes pertinentes.
Miguel Roig (2002, 2005, 2010) , oferece em seu trabalho um conjunto de orientações para
que os autores evitem autoplágio. Alguns de seus principais pontos estão listados abaixo, e
o autor sugere que as políticas devam ser explicitadas nas instruções aos autores dos
periódicos.
Agradecimento
Agradeço ao Dr. Tomás Baiget, diretor de “El profesional de la información”⁵ (EPI) por corrigir
alguns erros no meu manuscrito original. Os erros que permanecem são de minha
responsabilidade.
Notas
⁵ El Profesional de la Información
Referências
ROIG, M. Recycling portions of text from the same author/s previously published papers in
psychology: An exploratory study. Paper presented at the second Office of Research
Integrity’s conference on Research Integrity, Bethesda,MD. November, 2002.
ROIG, M. Plagiarism and self-plagiarism: What every author should know. Biochemia
Medica. 2010, vol. 20, nº 3, pp. 295-300. Available from:
<http://dx.doi.org/10.11613/BM.2010.037>.
ROIG, M. Re-using text from one’s own previouslypublished papers: An exploratory study
ofpotential self-plagiarism. Psychological Reports. 2005, vol. 97, pp. 43-49. Available from:
<http://apfei.edu.au/resources/bibliography/re-using-text-ones-own-previously-published-
papers-exploratory-study-potentia>.