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Prova Final – Interpretações do Brasil

Felipe Moreti Bolini

1. O que você entende por “jeitinho brasileiro”?


O jeitinho brasileiro, muito bem descrito por DaMatta, é uma forma de
sobrevivência simpática e desesperada do brasileiro à ausência de um bom
posicionamento político-governamental no país, de tal forma que ele cria uma
relação entre o pessoal e o impessoal, entre o indivíduo, sujeito às leis universais, e
a pessoa, sujeita às relações sociais, para resolver uma determinada situação, tal
qual faz o Homem Cordial, descrito por Holanda em Raízes do Brasil, muito
frequentemente através do patrimonialismo, bem desenvolvido por Almeida. Assim,
o jeitinho brasileiro pode ser classificado como uma corrupção que se dá através de
uma troca, uma proximidade pessoal (modo harmonioso) ou, até mesmo, imposição
hierárquica (modo conflituoso), sempre buscando resolver uma situação conflituosa
ou impessoal que deve ser superada. O jeitinho brasileiro se constitui a partir do fato
de que, no Brasil, as leis são feitas de forma proibitiva, e não adequando-se ao usos
e costumes da sociedade (como feito em outros países), de tal forma que em nosso
país nem sempre existe o certo e o errado, quase sempre existe o meio termo, que
podemos caracterizar como uma atuação direta do jeitinho. Posso exemplificar um
contexto em que se faz presente o jeitinho brasileiro quando o indivíduo é
desembargador e se recusa a utilizar uma máscara em um ambiente público em
meio a uma pandemia, afirmando para o policial que o aborda: “Você sabe com que
está falando? Eu sou Desembargador! Vou ligar para o secretário de segurança
pública!”, evidenciando não só a questão do jeitinho brasileiro pelo meio conflituoso,
mas também como sempre há um meio de realizar o jeitinho por meio da existência
de um indivíduo num cargo hierárquico sempre acima do em questão
(desembargador dizendo ao policial que ligará para o secretário de segurança
pública). Os casos de jeitinho por meio de aproximação pessoal, de forma
harmoniosa, são diversos e inúmeras vezes feitos de forma velada, podendo ser
construído através do compartilhamento de um time de futebol entre as partes, do
fato de os indivíduos serem conterrâneos, entre outros.
 
2. Qual é a relação entre patrimonialismo e “capitalismo de laços”
segundo a definição de Lazzarini.
Para responder a esta questão, iniciemos definindo os conceitos. O
patrimonialismo, conceito desenvolvido por Weber, se dá na indistinção entre o
público e o privado, onde o patrimonialista considera tudo como seu patrimônio,
utilizando-se de bens públicos para o benefício próprio. Já o capitalismo de laços, da
forma como o Lazzarini o retrata, é uma distorção no mercado que pode ser
causada por tomadas de decisão com base em contatos sociais e critérios políticos,
que podem ocasionar em más alocações, e através da indução de decisões
empresariais pautadas por ideologias particulares ou motivos políticos dos
governantes, ou através de vantagens conferidas àqueles que têm os “contatos
certos”, independentemente de seu mérito. Dessa forma, se evidencia muito bem a
relação entre o patrimonialismo e o capitalismo de laços, onde o político realiza o
patrimonialismo para, em conjunto com o empresário, realizar o capitalismo de
laços. Ou seja, o político se utiliza da máquina pública para beneficiar o empresário
que, de alguma forma, retorna o favor ao político. O patrimonialismo se evidencia no
fato de o político utilizar do público em benefício próprio, e o capitalismo de laços se
evidencia no fato de o empresário realizar investimentos com base na ajuda e na
pauta posta pelo político. Um exemplo dado por Lazzarini é a relação entre o ex-
presidente Lula e o empresário Eike Batista, onde Lula concedeu empréstimos,
através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, às empresas
de Eike Batista que, em troca, financiou a campanha e o filme do ex-presidente,
além de ter auxiliado Lula a pressionar a empresa Vale para que as vontades de
Lula fossem postas em prática. Em suma, Lula fez favores a Eike através da
máquina pública (capitalismo de laços), e Eike retribuiu financiando as campanhas e
auxiliando Lula nas diretrizes do país (concluindo o patrimonialismo).
 
3. Explique o que há de peculiar no Brasil na desigualdade racial.
Inicialmente, podemos fazer uma análise histórica para introduzir as
peculiaridades na desigualdade racial existente no Brasil. Na história brasileira, há
grandes diferenças em relação a outras colônias, sobretudo pelo fato de o Brasil ter
sido colonizado por portugueses, Ibéricos, que em sua origem possuem a influência
não só europeia, mas também africana, o que leva a uma indecisão étnica da nação,
que acaba por ser transmitida ao Brasil, haja vista que, durante a colonização, houve
também a conotação de expansão étnica, e não só de controle econômico, como em
outras colônias. Como bem retrata Freyre, as questões de raça na história do Brasil
se deram de forma diferente da Europa. Enquanto na Inglaterra escravos eram
importados com o únicos viés de trabalharem na agricultura, no Brasil escravos
eram utilizados para suprir demandas sexuais, realizar trabalhos domésticos, cuidar
de crianças, entre outras coisas. Quando passamos a analisar o período pós
escravidão, o Brasil apresenta fortes problemas com relação aos cuidados prestados
aos ex-escravos e a sua inserção na sociedade, de tal forma que, em meio a um
contexto de racismo científico, fora estimulada a imigração de europeus (sobretudo
Italianos) para suprir a demanda ocasionada pelo fim da escravidão, o que acabou
por marginalizar os negros na sociedade brasileira, que sequer conseguiam
trabalhar de maneira digna, o que acabou por construir uma relação de inferioridade
negra na sociedade brasileira, diferente das encontradas em outros países, de tal
forma que, como bem retrata Schwarcz, hodiernamente o brasileiro ressalta muito
mais o fato de “ser preconceituoso com o preconceito”, do que de fato não ter
preconceito racial, o que acaba por desenvolver um racismo peculiar, onde em
alguns momentos, sobretudo no ambiente particular, ele é aceito e, até mesmo, tido
como algo carinhoso, quando utilizado na forma de apelido, por exemplo, mas não é
nada aceito quando utilizado em meio público, como exemplifica Schwarcz com o
caso do jogador Grafite, que aceita ter um apelido designado pela sua cor da pele,
mas não aceitou conotações racistas em meio a uma partida de futebol.

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