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PRINCÍPIO DE FUNCIONAMENTO E ACIONAMENTO DO MOTOR A

RELUTÂNCIA VARIÁVEL
Celso Ferreira Carvalho, Mauro Henrique Alves Signorelli
Faculdade de Engenharia Elétrica – Laboratório de Acionamentos Elétricos: Universidade Federal de Uberlândia
CEP 38408-08108, C.P.593, Uberlândia - M G
Brasil
celsof_carvalho@yahoo.com.br, mhasignorelli@yahoo.com.br

Resumo - O objetivo deste trabalho é apresentar de computacionais adequadas. Assim, seu uso foi difundido
uma maneira simples e objetiva o princípio de apenas nas últimas décadas graças aos avanços da eletrônica.
funcionamento de um motor a relutância variável (MRV) Apesar de algumas limitações, os MRV´s têm muitas
e sua forma de acionamento. Será feito o vantagens em relação a outros tipos de motores. Até a
equacionamento do conjugado do motor para uma potência de 150KW eles apresentam bom rendimento, boa
melhor compreensão do seu princípio de funcionamento. densidade de potência, baixa inércia, baixo custo de
fabricação, confiabilidade e tolerância a falhas, podendo
Palavras-Chave – acionamento de motores, conjugado, operar com a perda de uma das fases.
motor a relutância variável. Em alguns países, estes motores já são fabricados em
escala industrial, sendo empregados em aplicações que
PRINCIPLE OF OPERATION AND demandam acionamento com velocidade variável, operação
DRIVING OF SWITCHED RELUCTANCE em alta velocidade, tração com alto conjugado, controle de
posição, etc. São utilizados nos mais diversos setores, como
MOTORS por exemplo: veículos elétricos, empilhadeiras, compressores
de ar, bombas, maquinaria têxtil, acessórios automotivos,
Abstract – This paper presents in a simple and
máquinas de limpeza e eletrodomésticos.
objective way the principle of operation and driving
characteristics of the Switched Reluctance Motors I.2 Justificativas e Objetivos do Trabalho
(SRM). SRMs are rapidly becoming an alternative for
applications that require variable speeds and high Com crescente interesse por parte da comunidade
starting torque. They are very robust, nearly científica, novos estudos sobre o motor a relutância variável
maintenance free and operate at rather high efficiency. não param de surgir. Inúmeras publicações abordam desde o
Some relevant equations are presented in the text in projeto do motor (incluindo geometria, número de pólos,
order to highlight the principle of operation. material construtivo, diminuição de vibrações) até o estudo
de novas técnicas de controle e acionamento para otimização
Keywords – driving motors, switched reluctance motor, da operação. É pelo fato de o motor a relutância variável ser
torque. potencialmente viável para vários tipos de aplicações,
apresentando resultados melhores do que os motores de
I. INTRODUÇÃO indução e síncrono, que o presente trabalho se justifica.

I.I Considerações iniciais II. PRINCÍPIO DE FUNCIONAMENTO DOS MRV’S


O motor a relutância variável (MRV) é um dos tipos de Por definição um motor a relutância é um motor elétrico
motores elétricos mais antigos. O primeiro motor que se tem no qual o conjugado é produzido pela tendência da sua parte
notícia foi construído por Davidson em 1838 na Escócia, e móvel se deslocar para a posição onde a indutância do
foi utilizado em uma locomotiva. enrolamento excitado é maximizada, ou seja, quando
Sua característica 1 marcante é a estrutura simples, energizamos uma fase qualquer do motor os pólos da parte
combinando a simplicidade dos enrolamentos de campo dos móvel tendem a se alinhar com os pólos da parte fixa mais
motores de corrente contínua com a robustez associada aos próximos, portanto para produzir o conjugado, os MRV´s
motores de indução, além da vantagem de não utilizar ímãs devem ser projetados de tal forma que as indutâncias do
permanentes, escovas ou comutadores. enrolamento do estator variem com a posição do rotor. Desta
Devido às características construtivas, estes motores não maneira, utilizando-se os princípios de conjugado e de
podem ser conectados diretamente à rede de alimentação, e inércia (a tendência de um corpo qualquer continuar em
requerem acionamento eletrônico e conhecimento da posição movimento após ter sido acelerado), própria de qualquer
instantânea do rotor. Adicionalmente, seu projeto exige a sistema mecânico e utilizando-se também a lógica adequada
análise do circuito magnético e simulações com ferramentas de energização das fases, pode-se acionar o MRV de maneira
bastante simples. O enrolamento consiste de uma série de
circuitos elétricos independentes – fases, que podem ser
“Artigo publicado na IV Conferência de Estudos em Engenharia Elétrica (IV energizadas separadamente ou simultaneamente, com pulsos
CEEL) realizada no período de 22 a 25 de Novembro na Universidade unidirecionais de corrente nas fases. As máquinas de
Federal de Uberlândia, Uberlândia MG.”
relutância variável podem ser divididas em duas categorias: saliência do estator aumenta a diferença entre os valores
saliência simples ou dupla. Em ambos os casos, sua máximo e mínimo da indutância, o que por sua vez melhora
característica mais notável é a não existência de as características de produção do conjugado da máquina.
enrolamentos ou imãs permanentes no rotor, ele é construído Observa-se na figura 2 que as indutâncias têm período de
com lâminas de material magnético fixadas ao longo do eixo, 90º que corresponde ao passo polar no rotor. Entre as fases, o
formando os pólos salientes. Esta característica garante deslocamento é de 60º, o que corresponde a 360º dividido
robustez, viabiliza operação em velocidades elevadas e pelo número de pólos do estator
operacionalmente não ocorrem perdas Joule no rotor, o que
contribui favoravelmente para que a máquina opere com
rendimento elevado. Sua única fonte de excitação é o
enrolamento do estator. Devido ao fato de o estator
geralmente poder ser resfriado mais fácil e eficientemente
que o rotor, o resultado é geralmente um motor menor para
uma dada potência e tamanho da carcaça se comparado a
outros tipos de motores.
Nas máquinas polifásicas, o número de pólos do estator e
rotor deve ser diferente, sendo possíveis várias combinações
tais como 6/4 (6 pólos no estator e 4 pólos no rotor), 8/6,
10/6, 12/8. As configurações com maior número de pólos
resultam em menores oscilações do conjugado produzido,
mas requerem um número maior de dispositivos estáticos no
conversor. Figura 2 – Perfil das indutâncias de fase idealizadas
Pode-se observar na figura 1 que os enrolamentos de fase .
são conectados em pólos diametralmente opostos.
A indutância da fase A é máxima em 0º, 90º, 180º, 270º,
posições em que o rotor se alinha com o pólo do estator. A
medida que o rotor gira no sentido horário, os pólos se
desalinham e a indutância decresce linearmente (dL/d? é
constante e negativo). Na seqüência, a fase B inicia a
sobreposição dos pólos e a indutância cresce linearmente
(dL/d? é constante e positiva).

III. PRODUÇÃO DE CONJUGADO

Partindo do princípio do balanço da energia para definir


acoplamento eletromecânico, o trabalho mecânico necessário
para mover o rotor do motor a relutância é definido pela
Figura 1- Motor a relutância variável 6/4 energia elétrica líquida de entrada, menos a energia
armazenada no campo, tal como expresso em (1).
Ao alimentar uma das fases, o par de pólos do estator
respectivo atrai o pólo do rotor mais próximo, buscado dWmec = dWele − dWcpo (1)
minimizar a indutância do caminho magnético. A
energização sucessiva das fases produz a rotação do motor, Onde:
em qualquer direção.
Quando um par de pólos do rotor estiver alinhado com os dWmec = energia mecânica diferencial de saída, inluindo
pólos do estator, essa fase se encontra na posição alinhada. as perdas por atrito e ventilação;
Nesta posição a indutância de fase é máxima e a relutância dWele = energia elétrica diferencial de entrada
do caminho magnético é mínima. Assim, quando os pólos descontadas as perdas resistivas;
estiverem alinhados não haverá produção de conjugado dWcpo = energia de campo diferencial.
naquela fase, pois a tendência é que o rotor permaneça nessa
posição de mínima relutância. A energia líquida de entrada pode ser expressa em termos
Girando o rotor 45º no sentido horário, o pólo do estator das correntes e tensões nos circuitos elétricos do dispositivo
ficará desalinhado dos pólos do rotor. Diz-se então que o de acoplamento, conforme a equação (2), onde o primeiro
rotor encontra-se na posição desalinhada. Esta é uma posição termo do lado direito da equação corresponde ao diferencial
instável e qualquer deslocamento do eixo moverá o rotor de energia elétrica de entrada no tempo dt e o segundo termo
para a próxima posição de alinhamento desde que haja corresponde às perdas resistivas.
corrente na fase. Nesta posição de total desalinhamento, a
indutância de fase é mínima e a relutância é máxima devido
ao entreferro.
É importante observar que a indutância varia com a dWele = V .i.dt − R.i 2 .dt (2)
posição do rotor e também com as correntes de fase. A
Onde:
La ( θ)ia 2 + Lb ( θ)ib 2 + Lc (θ)ic 2 (11)
1 1 1
W ' cpo =
2 2 2
V = Tensão aplicada aos terminais do enrolamento;
R = Resistência do enrolamento; Tomando-se a derivada parcial da co-energia e mantendo
I = corrente no enrolamento. constantes as correntes das fases tem-se:

Para que o dispositivo de acoplamento possa absorver


∂ W' cpo (i, θ)
energia do circuito elétrico, o campo de acoplamento deve C= (12)
produzir uma reação sobre o circuito, que segundo a Lei de ∂θ
Faraday é:
e = vi − R.i (3) Portanto, substituindo 11 em 12 tem-se a expressão do
conjugado:
Onde:
1 2 dLa (θ) 1 2 dLb ( θ) 1 2 dLc (θ)
C= ia . + ib . + ic . (13)
e = tensão induzida no enrolamento. 2 d (θ) 2 d(θ) 2 d(θ)

Substituindo a equação (3) em (2): Conforme a equação (13), o conjugado é proporcional ao


quadrado das correntes nas fases e à indutância em relação à
dWele = e.i.dt (4) posição do rotor. Ao aplicar corrente nos intervalos de
Sabendo-se que: posição em que uma dada fase possui dL/d? positivo,
dλ conjugado positivo é produzido. Se for aplicada corrente
e= (5)
dt quando dL/d? é negativo, o conjugado produzido é negativo.
e substituindo a equação (5) em (4) tem-se: Quando uma fase é excitada, o conjugado tende a
movimentar o rotor para a posição mais próxima do máximo
dWele = i.d λ (6) enlaçamento de fluxo. Ao remover a excitação desta dada
fase e excitar a próxima, o rotor se movimenta no sentido de
Para a determinação da energia absorvida pelo campo, maximizar o fluxo da nova fase excitada e assim
considera-se que não há movimento mecânico e portanto o sucessivamente.
termo dWmec é igual a zero e a equação (1) se torna: Observa-se ainda pela análise da equação (13) que o
sentido do conjugado não depende do sentido da corrente
dWele = dWcpo (7) aplicada. Esta é uma característica marcante dos MRV’s pois
torna o acionamento do motor mais simples, uma vez que,
Desta forma, a energia elétrica de entrada associada uma sem a necessidade de corrente reversa, o circuito de controle
variação do fluxo é absorvida pelo campo: pode utilizar, em determinados modos de operação, somente
uma chave por fase, reduzindo assim o custo e a
λ2 complexidade do conjunto motor/conversor. A figura 3


dWcpo = id λ
λ1
(8) ilustra o conjugado em função da posição do rotor para cada
uma das fases do motor 6/4.

sendo que a expressão da co-energia de campo é:

i2

dW'cpo = λdi ∫
i1
(9)

onde,
λ = L.i (10)

Neste momento, é importante considerar que, devido ao


princípio de funcionamento do MRV, duas variáveis
independentes são necessárias para descrever a energia total
do sistema. Uma delas é a posição do rotor e a escolha da
corrente ou do fluxo enlaçado como a outra variável de
estado é arbitrária, e a as duas conduzem à expressão do
conjugado.
Assim, o conjugado eletromagnético é determinado a
partir da expressão da co-energia, conforme segue:
Figura 3 - Produção de conjugado
Na posição de máxima indutância em ? = 0º, a O circuito de controle geralmente consiste de
contribuição de conjugado da fase A é nula pois neste ponto componentes eletrônicos de baixa potência os quais não
não há variação da indutância. Em seguida, inicia-se o podem ser usados para fornecer diretamente as correntes
decrescimento da indutância e, se houver aplicação de necessárias para excitar a fases do motor. O circuito de
corrente neste momento, o conjugado produzido será controle atua no inversor, que por sua vez fornece a corrente
negativo. No momento em que a indutância é mínima de fase. Em geral o inversor consiste de uma fonte cc e um
também não é produzido conjugado. A partir de 60º, quando conjunto de chaves controláveis cuja função é conectar as
a indutância começa a crescer, é produzido conjugado várias fases na fonte cc em tempos apropriados determinados
positivo. pelo controlador
Uma observação importante é que, para obter conjugado O controle do MRV é obtido pela aplicação de correntes
com características específicas é importante sincronizar a aos enrolamentos de fase. O enrolamento de fase do MRV
energização das fases com a posição angular do rotor pode ser visto como uma indutância não linear (devido aos
Desta forma, deve-se conhecer a posição instantânea do efeitos da saturação magnética), variável no tempo (devido
rotor em relação aos pólos do estator. Isto pode ser obtido às mudanças na posição do rotor com o tempo). Muitas das
através de sensores de posição no eixo do motor ou através questões associadas ao controle de corrente nesses sitemas
de técnicas de determinação indireta de posição do rotor. podem ser investigadas considerando-se a situação de
Adicionalmente, a escolha a adequada dos ângulos de indutância constante fornecida por uma fonte cc.
chaveamento é muito importante na definição do perfil e O desempenho de um sistema de acionamento completo
nível de conjugado que uma dada máquina pode desenvolver. de um MRV está amarrado ao desempenho de todos os seus
componentes, incluindo o MRV, seu controlador e seu
IV.SISTEMAS DE ACIONAMENTO DO MRV inversor. Como resultado, é útil projetar um sistema de
acionamento completo como um conjunto integrado, e não
Diferentemente das máquinas ca e cc (síncrona ou projetar seus componentes individuais. A escolha de um
indução), não se pode simplesmente ligar os MRV’s numa inversor para uma aplicação específica deve ser feita baseada
fonte de ca ou cc e esperar que eles funcionem. Como foi em considerações técnicas e financeiras como parte de um
visto, as fases devem ser excitadas com correntes projeto integrado do sistema de acionamento do MRV.
(geralmente unipolares), e a temporização dessas correntes
deve ser cuidadosamente relacionada com a posição dos V- CONCLUSÕES
pólos do rotor para produzir um conjugado médio útil. O
resultado é que apesar do MRV ser em si talvez a máquina Foi apresentada uma análise do motor a relutância
rotativa mais simples, um sistema de controle real para um variável sob seu aspecto operacional. O princípio de
MRV é relativamente complexo. funcionamento foi discutido visando uma compreensão da
Sis temas de controle de MRV são competitivos somente dinâmica do motor, seguida de uma abordagem sobre a
porque esta complexidade pode ser facilmente realizada produção de conjugado da máquina. A forma de acionamento
utilizando circuitos da eletrônica de potência e desse tipo de motor foi abordada, uma vez que é de extrema
microeletrônica, cujos custos são relativamente baixos. importância a sua compreensão para que se obtenha o
Devido ao fato desses sistemas de acionamento exigirem um melhor desempenho possível.
nível bastante sofisticado de controlabilidade, mesmo para os
modos mais simples de operação do MRV, características de AGRADECIMENTOS
controle sofisticadas podem ser incorporadas (geralmente na
forma de softwares adicionais) com pequeno custo adicional, Agradecemos ao professor Darizon Alves de Andrade por
aumentando assim a competitividade dos MRV’s. nos dar a oportunidade de ingressarmos em um projeto de
A função do sensor de posição do rotor é fornecer uma pesquisa e nos oferecer as condições de escrever esse artigo.
indicação da posição do eixo, a qual pode ser usada para
controlar a temporização e a forma de onda da excitação da REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
fase.
[1] FITZGERALD, A. E.; KINGSLEY JR, C.; KUSKO,
O controlador é geralmente implementado em softwares
th
em circuitos de microeletrônica (microprocessador). Sua A. “Electric Machinery”, 6 Edition, McGraw-Hill Inc,
função é determinar a seqüência e as formas de onda da 1971.
excitação da fase requerida para obter as características [2] HWANG, Gisele Regina; “Modelagem da Máquina à
conjugado-velocidade desejadas. Além de determinar pontos Relutância Chaveada Incluindo a Saturação Magnética” ,
de velocidade e/ou conjugado e posições do eixo (através do Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de
sensor de posição), controladores sofisticados geralmente Uberlândia, Outubro, 2002 .
incorporam entradas adicionais, incluindo velocidade do eixo
[3] COSTA, Rogério dos Santos; “Estudo da Melhoria de
e a magnitude da corrente de fase. Junto com a função básica
Desempenho de Acionamentos Elétricos Utilizando MRC’s
de controle, para determinar o conjugado desejado para uma
Monofásicos”, Dissertação de Mestrado, Universidade
dada velocidade, os controladores mais sofisticados visam
Federal de Uberlândia, Outubro, 2004
fornecer excitações as quais são de alguma forma otimizadas
(para máxima eficiência, comportamento transitório estável, [4] T.J.E MILLER “ Switched Reluctance Motors and
etc.). their Control ”. Magna Physics Publishing and Clarendon
Press – Oxford. 1993. ISBN 1-881855-02-3.
[5] KRISHNAN, R.; “Switched Reluctance Motors
Drives”, 1st Edition, Industrial Electronics Series, 2001.

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