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A Estaca da Arte

por Edan Kane

Esse que é ainda um dos mais desconhecidos instrumentos da Bruxaria revela


grandes usos mágicos e simbolismo infindável que nos renderia um livro todo para
o tema. A Estaca que representa a Antiga Arte ganhou seu espaço há muito, e
embora sua história se perca no tempo como veremos, podemos analisar sua
importância a nós Bruxas e Bruxos de hoje.

Uma forquilha de árvore parece bem simples. Olhe à sua volta e tente encontrar
nas árvores que conhece um ramo: de 1,60 a 1,70 m de altura que em seu topo se
divida em dois galhos proporcionados formando a estrutura toda algo como um
grande “Y”. Não tão simples não é mesmo? Esses são os moldes tradicionais de
uma estaca pessoal de um Bruxo ou mesmo uma Estaca que sirva no círculo
mágico de grupos e Covens.

As Estacas como usadas na Europa são tradicionalmente também feitas de


árvores como o Freixo (Ash), pois segundo muitos, essa era a árvore mais
propícia a se fazer forcados rudimentares para o trabalho no campo. Esse é o uso
primitivo desse instrumento na Idade Média e mesmo antes dela, ligando o culto
das bruxas à fertilidade da Terra. Ao lado do Freixo, o Carvalho é igualmente
propício, mas árvores como o Loureiro e o Pinheiro, são igualmente relacionadas
ao aspecto solar do Deus da vegetação.

O Deus é o grande representado na Estaca como o caçador, o Senhor da morte, o


Sacrificado.

Os dois chifres da bifurcação representam o Deus que se divide em rei ano-claro e


rei ano-escuro que são os gêmeos que se sacrificam pela Senhora, ou seja, o
Deus se divide, mas é sempre um, o que nos faz lembra das duas faces de Janus,
aquele que está no fim e no inicio e pode contemplar a ambos. Os caminhos da
direita e esquerda também são representados, como as colunas clara e escura do
Templo de Mistérios e todos os tipos de dualidades que são no fim, uma única
coisa.

Na Bruxaria Tradicional Britânica, na qual a Estaca é o instrumento mais


importante símbolo do “Mestre Cornudo da Bruxaria” (o Deus) a Estaca é o altar,
pois não são usadas mesas nos ritos. É o instrumento do Sacerdote do Coven
chamado Magister ou Magistra.

Em grupos tradicionais a Estaca é, por vezes afixada a três passos do ponto


cardeal Norte do perímetro do círculo mágico, não só para indica-lo e direcionar o
foco, mas para, além disso, guardar o círculo de trabalho das Bruxas como um
“para-raio” para ele. É por ela que o Deus de Chifres é invocado ao círculo e por
isso, na Estaca é acesa uma vela em sua forquilha e o vinho consagrado é
oferecido numa libação em frente a ela ou em sua base. Por meio dela também
se pode despejar energias ao chão, “aterrando-as”.
É fincada no solo em ritos a céu aberto e em locais fechados, fixada em um vaso
com terra ou areia e pedras ou mesmo colocada em um suporte.

Em muitas tradições a Estaca pode ter chifres de ferro sobre um


mastro de freixo, ao invés de ser toda de madeira. Cochrane em
seu artigo “A Estaca das Bruxas” (“The Witches Stang”) para a
revista O Caldeirão (“The Cauldron”) número 76, cita em sua
costumeira linguagem poética que “a forma mais fácil de se obter
uma Estaca é pedir, emprestar, comprar ou roubar um velho e
antiquado forcado”.

Como representante do Deus que guarda o Círculo e de sua


passagem pela Roda do Ano da Senhora, a Estaca recebe os
enfeites apropriados tais quais guirlandas de trigo em Lammas e
cordões em Mabon e Samhain. A cor da vela da Estaca pode
também ser indicada pelo ritual. Em algumas Tradições,
dependendo da época do ano, a estaca é decorada com uma
guirlanda e flechas cruzadas (Fig 01).
Fig.
Entre outras Tradições a Estaca do Deus (forquilha) é colocada ao Norte do
Círculo somente no período reinado pelo Deus (os meses escuros) e outra Estaca
conhecida também como “Trívia” (um tridente de madeira, também símbolo de
Hécate como “senhora das encruzilhadas”), é colocada no lugar para representar
a soberania da Senhora sobre a metade clara do ano.

Alguns bruxos dizem que as Estacas se tornaram muito comuns na idade média,
pois naqueles tempos ter uma imagem da Deusa ou do Deus seria crime, por isso
a “Estaca macho” de duas pontas, seria a representação do Deus e a “Estaca
Fêmea” de três, a da Deusa. Contudo, o complemento da Estaca do Deus é
geralmente reconhecido como o Caldeirão.

Um tridente, que é artefato comumente associado ao


Diabo cristão, não passa de um tipo de Estaca de três
pontas que sendo um símbolo de Hécate, Rainha das
Bruxas foi interpretado como o “espetador” dos
demônios, sendo esse também mais um instrumento
rural exatamente como o Forcado. É também símbolo
do Deus que com três falos fertiliza a Deusa Tríplice.

O Tridente (Fig 02) era portado por Deuses corníferos


como Baal (Fig 03), Adad e Enlil, Netuno/Poseidon
(pois o Tridente era usado por pescadores) e por
Shiva, bem como por Deusas como Kali e Durga
(usado como arma, representando
criação/manutenção/destruição entre outras coisas, os
Fig 02 tridentes de Shiva/Kali/Durga também são vestidos de
guirlandas, como quase tudo na Índia!).
Fig 03 - Representação do Deus semelhante a uma Estaca

Outro artefato ainda, um forcado de quatro dentes feito


também de ramo de árvore, era usado pelas bruxas para
repelir espíritos ruins e problemas.

No entanto vendo a historia desse artefato mágico,


percebemos que nem mesmo a forquilha sempre esteve
somente associada ao Deus e ao masculino. Na
mitologia xamanica dos povos da Lapônia (chamado
“Sami”, que vivem desde a Finlândia à Rússia e são
anteriores aos germânicos), a Estaca é símbolo da
divisão que ocorre entre o bebê recém nascido e sua
mãe. O cajado forquilhado representava e ainda Fig 04
representa, portanto essa sagrada separação que deveria ocorrer com sucesso
para que uma nova vida viesse a este mundo. A Deusa Sáráhkká é a mais
cultuada entre os Sami ou Lapões que resistiram bravamente à cristianização.
Após os batismos, os Sami lavavam o recém batizado “descristianizando” a
criança, já que consideravam o nome cristão como causador de doenças, e está
registrado que, antes de ir às missas, pediam permissão ao tambor do xamã.
Mesmo se a permissão fosse dada, eles se ajoelhavam antes de entrar na igreja,
pedindo perdão a Sáráhkká por tomarem parte em ritos cristãos. Sáráhkká porta
uma Estaca exatamente como as que temos hoje, representando essa separação
já que Ela é a Deusa parteira que garante a saúde da mãe e do recém-nascido.
Sua irmã Juksahkka também porta a Estaca e um arco e flecha, e é chamada
Deusa do Arco. Ela é a responsável por transformar ou não, os fetos
primordialmente femininos em machos, determinando assim o nascimento de
homens ou mulheres no mundo (os antigos já sabiam disso!).

Após o trabalho de parto a primeira refeição era um mingau onde se punham três
bastões: um branco, um preto e uma pequena forquilha. Tirar o bastão branco em
seu prato de mingau representava sorte, o preto a morte, e a forquilha sucesso.

Assim vemos um simbolismo muito feminino nela, sendo que forquilhas também
parecem ter sido associadas às trompas ou ao “V” da área da vagina (chifres
também tiveram essa associação na antiguidade).

As “Volva” eram bruxas da Antigüidade germânica conhecidas por seus poderes


mágicos e por predizer o futuro quando em transe e há registros de que essa
prática tenha perdurado até a virada do primeiro milênio CE . O nome Volva vem
de “vole”, um cajado muito ornamentado ou “stang” que essas volva carregavam
como sinal de seu ofício.

Um cajado forquilhado também é descrito como sendo o símbolo do culto dos


Berber Dhulqarneni.
 

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