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Universidade Federal do Rio de Janeiro

Museu Nacional / Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social

MNA 907 – Antropologia do lúdico e do humor

Docente: John Comerford e Ana Carneiro

Aluna: Tássia Mendonça

Minha Vó Tá Maluca: Humor, Arte e Criação em Mc Carol

Rio de Janeiro, 11 de Agosto de 2015


Minha Vó Tá Maluca: Humor, Arte e Criação em Mc Carol

Prazer eu sou Carol Bandida


Amante do seu marido
Seu aniversário ele passou comigo!

Em “Sociabilidade” texto de 1950 de Simmel, o autor explora as possibilidades

de tratamento do jogo enquanto modalidade de sociação privilegiada para análise da vida

social. O mesmo se apresenta como uma modalidade de interação não-objetiva, na qual

as formas se autonomizam dos conteúdos da vida social. Tudo se passa como se os

elementos materiais da vida dobrassem-se sobre si mesmos, o jogo é o espaço no qual os

conteúdos são abstraídos no mesmo movimento em que se reflete sobre eles – de maneira

análoga à arte. O sócios é assim o jogo entre os espaços lúcidos e as realizações “a sério”

dessas “brincadeiras”, de modo que o lúdico seria, portanto, a forma reflexiva da vida

social.

“Tudo isso que antes aderia à vida em sua seriedade, agora se subtrai a
seu fluxo, à sua matéria, desapega-se da vida. Autonomamente, escolhe
ou cria os objetos nos quais irá de testar e representar-se em sua pureza.
Isso confere ao jogo tanto sua alegria quanto seu significado simbólico,
tornando-o diferente do puro divertimento. Aqui se encontra a analogia
legítima entre jogo e arte. (...) Sempre que arte e jogo se esvaziam de
vida, tornam-se artifício e mero entretenimento [Spielerei]. Assim, seu
significado e sua essência se encontram justamente nessa mudança
fundamental pela qual as formas criadas pelas finalidades e pelas
matérias da vida se desprendem dela e se tornam finalidade e matéria
da própria existência. ” (2006: 63)

O jogo criando a vida como arte. Mais do que metáfora o jogo é criação de novas

formas que deslocam/reposicionam relações e conteúdos. No presente trabalho proponho

analisar os elementos lúdicos, do humor e do riso, presentes na fabulação artística dos

funks de Mc Carol, entendendo-os como lócus privilegiado de análise na medida em que


possibilita compreender as formas mesmas pelas quais a socialidade que orbita o funk

carioca se (re)cria.

Mc Carol ou Carol Bandida é uma das mais novas cantoras na cena funk carioca.

Com apenas 21 anos a cantora, moradora do Morro do Preventório em Niterói, compõe

suas próprias músicas além de inovas nas dramatizações cênicas em palco. Carol

impressiona na medida em que passa entre diferentes estilos do funk sem ser capturada

de todo por nenhum deles, tecendo assim um território próprio de criação artística. Com

letras calcadas em situações cotidianas, a Mc compõe tanto proibidões que falam do uso

de drogas ou violência, quanto funks com temática sexual – putaria –, canções de humor

e mesmo os chamados “funks conscientes”. Minha proposta é menos elaborar uma análise

descritivo-categórica da multiplicidade das composições da Mc Carol e mais por em

evidência as diferentes linhas que atravessam paralelamente suas criações, tendo em vista

que qualquer classificação propriamente dita eclipsaria a multiplicidade indexada em

cada composição1.

O texto segue assim partindo das canções para análise do que os elementos lúdicos

e do humor dos funks de Mc Carol criam, que territórios eles possibilitam, que poderes

eles desfazem, que socialidades eles agenciam. Assim como Facina e Lopes (2012),

minha aposta nesse trabalho é na força de criação e de reinvenção do funk:

“Primeiro, o funk evidencia como a juventude negra e favelada


reinventa-se criativamente com os escassos recursos disponíveis,
subvertendo, muitas vezes, as representações que insistem em situá-la
como baixa e perigosa. Assim, o jovem favelado é construído no
singular como um grande perigoso sujeito. [...]
As representações dos grupos hegemônicos não acionam imagens de
favelas no plural, mas sim a imagem de uma única entidade totalizante.

1
Ao invés de analisa-los por meio das possíveis categorias nas quais os funks se agrupam (proibidão,
putaria, humor, “conscientes”) proponho evidenciar as linhas que atravessam cada composição.
Como se esses territórios estivessem situados em outra cidade, utilizam
um olhar que não enxerga as práticas cotidianas e concretas que por lá
circulam. Como se os sujeitos que lá habitam não fossem tão sujeitos,
criam um discurso que silencia as vozes locais e delimitam os
“territórios favelas” como um espaço genérico do perigo e da barbárie
ligada, única e exclusivamente, ao chamado tráfico de drogas. Porém,
para a juventude favelada do funk cada favela tem nome próprio e é
significada como um local heterogêneo e de habitação. Em outras
palavras, a linguagem do funk “dá sentido” à favela: “fazendo ver”
outros mapas e “desenhando” diferentes percursos na cidade do Rio de
Janeiro. (2012: 196 – 197)

É o som de preto e favelado que reinventa raça e território em jogos de humor e

resistência. Minha proposta é colocar a bibliografia que versa sobre o lúdico, sobre o

grotesco, o riso e a resistência em diálogo com os funks de Mc Carol, evidenciando sua

potência criativa, sua capacidade de (re)invenção da favela e dos favelados.

Bateu Uma Onda Forte: Fazendo Riso, Desfazendo a Ordem

“If we (...) spoke logically all the


time, we would never get
anywhere. We would only
parrot the old cliches.”
Gregory Bateson (1987)

Em um de seus metálogos, Bateson trata dos jogos, de como a brincadeira se

destaca da seriedade, ao mesmo tempo que implica num comprometimento com as regras

que a possibilitam. Brincar é assim um mecanismo de fuga do lógico, do presumido, que

possui em si mesmo formas específicas a fim de que a criação seja possível. É brincando

que se cria, afinal a criação acontece no terreno do caos, de modo que é preciso um

embaralhamento (muddle) de signos e sinais para que se transformem as velhas formas.


A brincadeira é assim um mecanismo que coloca em questão as premissas sobre as quais

o sistema se estabelece, é ela mesma transformação das premissas relacionais.

De maneira análoga Huizinga (1980) também estabelece uma conexão entre o

lúdico e a criação:

“Procuremos considerar o jogo como fazem os próprios jogadores, isto


é, em sua significação primária. Verificarmos que o jogo se baseia na
manipulação de certas imagens, numa certa “imaginação” da realidade
(ou seja, a transformação desta em imagens) nossa preocupação
fundamental será, então, captar o valor e o significado dessas imagens
e dessa “imaginação”. (...) Por detrás de toda expressão abstrata se
oculta uma metáfora, e toda metáfora é jogo de palavras. Assim ao dar
expressão à vida, o homem cria outro mundo, um mundo poético, ao
lado do da natureza. ” (1980: 7)
O autor propõe em “Homo Ludens” uma teoria geral para a compreensão da

cultura através do lúdico, na qual o jogo é entendido enquanto território lúdico por

excelência, como criação na medida em que suspende a vida cotidiana possuindo

temporalidades e espaços específicos. Ao destacar-se da vida cotidiana o jogo relaciona-

se estreitamente com a festa, encontrando na dança sua interseção mais forte.

Certeau (1994) analisa de maneira distinta a relação forma/conteúdo nas criações

lúdicas. A criação da vida reside nos conteúdos lúdicos que fazem fugir as formas

estabelecidas, que de alguma forma resistem ao status quo. Em Simmel o lúdico é o

espaço de criação das formas de interação/sociação – criação análoga a arte, para

Huizinga o jogo é o espaço de criação de formas que ordenam a vida social. Já Certeau o

lúdico é momento de resistência às formas, isto é, aos espaços consolidados.

Destarte, proponho uma compreensão do funk no cruzamento entre humor, lúdico

e criação, como uma arte na brincadeira, que estabelece outras formas sociais possíveis –

fora da ordem racial e territorial estabelecida, na qual um certo burburinho, um muddle

de referências lúdicas se estabelece.


Em um dos seus primeiros sucessos, Mc Carol brinca com as loucuras de uma

avó, há um muddle, uma confusão de referências e situações que cria uma nova imagem

de matriarca que faz fugir a figura da centralidade e dos comedimentos próprios de uma

Dona Benta. A vó de Mc Carol tá maluca, se diverte, consome drogas, sai com rapazes.

Traça movimentos que não só provocam riso – posto que se opõe a imagens consolidadas

da velhice da mulher – mas também indexam uma outra imagem possível de família, que

não a do comercial de margarina da família branca de classe média:

Minha vó ta maluca
Minha vó ta maluca
Tanta coisa pra comprar
Ela comprou uma peruca
Deu 120 na peruca - na peruca

Minha casa no tijolo


Minha geladeira pura

Minha vó ta maluca
Tá rodando de twister2
Com um playboy da jurujuba

Minha vó ta maluca

Pancando pra caralho


Fumando maconha na rua

As canções de Mc Carol brincam assim com imagens consolidadas, desfazendo

seriedades, deslocando ordens estabelecidas. Em Bateu uma onda forte3 e Tô usando

Crack o tema é o uso de drogas, que ao mesmo tempo que escapa ao pânico moral e social

que orbita o consumo de determinadas substância, insere imagens lúdicas do mesmo. A

2
Modelo de motocicleta da Honda.
3
“Caralho, caralho / Bateu uma onda forte / Tô vendo um macaco em cima do poste / Ai caralho, que mina
maluca / Tô vendo um macaco em cima do poste / Caralho, bateu uma onda forte / Tô sentindo um rato
dentro do meu short / Novinho interesseiro, eu vou te deixar forte / Vai fumar maconha segurando o meu
malote / Novinho interesseiro, eu vou te deixar forte / Vai fumar maconha segurando o meu malote. ”
droga não mais como decadência moral e física, mas na sua potência recreativa, de fuga

e escape.

O humor em Tô usando Crack está calcado não apenas na criação de novas

imagens, mas na temporalidade, na astúcia própria do funk em brincar com temas

correntes, em se reinserir no espaço público desfazendo as próprias formas nas quais um

assunto está sendo tratado social e politicamente. De modo que frente ao pânico moral e

a criminalização que orbita as cenas de uso do crack, bem como medidas de estado como

remoções e recolhimentos compulsórios para eliminação dos usuários, Tô usando Crack

desfaz a droga-problema. No mesmo movimento em que Mc Carol descreve as cenas e

contextos de uso, ela menos romantiza a droga e mais revela outras realidades possíveis

provocando riso ao fazer uso dos clichês utilizados no debate público:

Tô usando crack
Tô usando crack

Larguei minha família


A escola, você sabe
Parei com a maconha
Tô usando crack
Tô usando crack

Larguei minha família


A escola, você sabe
Parei com a maconha
Tô usando crack

No copo de Guaravita
Eu fico suave!
Tô usando crack
Tô usando crack

A maconha te engorda,
Use crack que é mais light!
Tô usando crack
Tô usando crack

Vou perder os meus amigos


Se prostituir faz parte
Tô usando crack
Nessas três primeiras composições vemos movimentos de reapropriação de

imagens e debates públicos, nas quais a criação é lúdica e provoca o riso na medida em

que desloca ordens consolidadas. Certeau (1987) fala da linguagem como espaço dos que

detém poder e da astúcia, por sua vez, como ferramenta “dos mais fracos”, o meio pelo

qual a linguagem é atravessada, aberta. Podemos de certa forma entender o funk de Mc

Carol esses rasgos, traçados por meio de táticas, localizadas, circunstanciais. Trata-se de

enfrentamentos abertos e contingentes – como em um jogo de xadrez. Os movimentos

daqueles que Certeau identifica como “os mais fracos” não conformam, por conseguinte,

uma estratégia, posto que não são providos de objetividade/finalidade4. Dessa forma, o

autor trabalha com o jogo enquanto (re)apresentação de imagens e situações conformadas

distintamente, o lúdico está assim associado à subversão das formas realizada através de

táticas contingentes e astúcias momentâneas.

Táticas são assim re-apropriações dos espaços ordenados estrategicamente, pelo

Estado ou por interesses econômicos – por exemplo, se constituem enquanto ações

calculadas em função da ausência de um espaço próprio. As estratégias são traços

objetivos de circunscrição, estabelecendo aquilo que o autor chama de “espaços

próprios”, a estratégia é por conseguinte ferramenta de quem domina ou possui, por

oposição a tática como conjunto de usos daqueles que tem de aproveitar as oportunidades.

A tática pressupõe dessa forma a astúcia para o aproveitamento do momento (timing). Se

estratégia é sobre a dominação e o controle dos espaços (geográficos e simbólicos), a

tática é a apropriação contingente, é oportunizar o momento, é o humor enquanto

temporalidade da resistência. O lúdico enquanto espírito constitutivo da tática, que se

4
Por oposição aos programas e estratégias de governo para a “solução” do problema da droga, as
composições de Mc Carol são fabulações artísticas, por definição não-objetivas, que provocam riso por
meio de jogos que deslocam as formas estabelecidas de se falar do crack, por exemplo.
reapropria das formas consolidadas, indexando resistências localizadas nos espaços

dominados.

O tratamento analítico que Certeau confere a noção de tática é muito inspirado

pela reflexão de Freud (1991) a respeito do chiste e suas funções catárticas, no que se

refere a uma certa economia das emoções – da qual derivaria o prazer do humor. De modo

que o humor é como uma recusa ao sofrimento, tal como o chiste consiste na liberação

dos mecanismos sociais de repressão. Enquanto os teóricos sociais do lúdico que vimos

até aqui estão preocupados com aspectos não intencionais do lúdico, Freud tem como

problema o chiste em relação.

O mesmo envolve uma tríade. Destarte, há o humorista, aquele que ri de (o público

que se cria ao mesmo tempo em que é condição necessária para a piada se estabelecer),

aquele que ri com e aquele que não ri na medida em que é ele mesmo a piada. No momento

em que o sujeito ri de si mesmo a relação de poder é desfeita/reconfigurada, sendo este

talvez o aspecto mais rebelde ou liberador do humor.

Tal qual a tática, o chiste depende de temporalidade: ou o chiste é imediato ou

não é. Além disso, o chiste não é apenas rápido, mas oportuno na medida em que é ele

mesmo uma contra efetuação. As piadas têm um tempo, tem um ciclo. A linguagem tem

que ser a do costume, do uso, no sentido pragmático, técnico, de reapropriação que o

próprio Certeau faz referência. Sendo assim, saber fazer o chiste é saber fazer uma relação

com o tempo, constituir o momento atual, indexá-lo. A piada mais cria um contexto do

que se refere a um contexto, ela tem a capacidade de circunscrever, de capturar uma certa

atualidade. O chiste cria o atual no mesmo movimento que estabelece uma relação com

ele.
Voltamos, por conseguinte, ao tema do humor como criação – de territórios,

resistências, das próprias formas da vida social. No caso do chiste o mesmo cria um

tecido, cria e reforça relações. Fazer uma piada e obter reconhecimento é em certo sentido

uma confirmação de cumplicidade. A economia emocional do chiste está em condensar

para não precisar explicar, desenvolver, economia da qual deriva o prazer, bem como do

estabelecimento ou fortalecimento das relações.

O humor por sua vez é rebelde, é não-resignado, seu prazer deriva da recusa ao

sofrimento, da afirmação do ego frente a inevitabilidade da dor. Para Freud (1927) essa

recusa é também ilusória, tratar-se-ia de uma negação da realidade. Ao invés de explorar

em que nível essa “recusa ao sofrimento” é “ilusória” por oposição ao sofrimento “real”

proponho trazer análises de outros autores no que se refere ao que o humor pode criar –

em termos de alteridade, identidade, poder e resistência.

Ao pensar as potências criativas do humor, volto para a diferenciação que Certeau

faz da conformação de dois espaços distintos. O espaço polemológico é aquele

circunscrito através da separação de uma alteridade, na delimitação daquilo que é

“próprio” com razões estratégicas de longo prazo. Em contraposição ao espaço utópico,

o local próprio a imaginação de outros mundos e realidades possíveis, que ao mesmo

tempo que escapam às circunscrições polemológicas, as reposicionam. É o espaço que se

constitui nos movimentos táticos de resistências às ordens estabelecidas, “uma maneira

de utilizar sistemas impostos” que por sua vez “constitui a resistência à lei histórica de

um estado de fato e as suas legitimações dogmáticas”.

É nesse jogo de movimentos de re-apropriação dos espaços das linguagens

dominantes é que se manifesta aquilo que Certeau chama de opacidade da cultura

popular, ou seja, a astúcia necessária para se desfazer a ordem estabelecida em um jogo

de referências entre forças desiguais:


“O que aí se chama sabedoria, define-se como trampolinagem, palavra
que um jogo de palavras associa a acrobacia do saltimbanco e à sua arte
de saltar no trampolim, e como trapaçaria, astúcia e esperteza no modo
de utilizar ou de driblar os termos dos contratos sociais. Mil maneiras
de jogar/desfazer o jogo do outro, ou seja, o espaço instituído por
outros, caracterizam a atividade, sutil, tenaz, resistente, de grupos que,
por não ter um próprio, devem desembaraçar-se em uma rede de forças
e de representações estabelecidas. ” (1994: 79)
Em Não foi Cabral, um dos últimos lançamentos de Mc Carol, a funkeira enfrenta

versões oficiais da história e as desfaz logo no prelúdio ao sobrepor a batida do funk na

melodia do hino nacional.

Professora me desculpe
Mas agora vou falar
Esse ano na escola
As coisas vão mudar

Nada contra ti
Não me leve a mal
Quem descobriu o Brasil
Não foi Cabral

Pedro Álvares Cabral


Chegou 22 de abril
Depois colonizou
Chamando de Pau-Brasil
Ninguém trouxe família
Muito menos filho
Porque já sabia
Que ia matar vários índios

Treze Caravelas
Trouxe muita morte
Um milhão de índio
Morreu de tuberculose
Falando de sofrimento
Dos tupis e guaranis
Lembrei do guerreiro
Quilombo Zumbi

Zumbi dos Palmares


Vítima de uma emboscada
Se não fosse a Dandara
Eu levava chicotada
Nessa última composição o enfrentamento se dá duplamente nos conteúdos e

formas, desfazendo as formalidades e as versões da história oficial num jogo de

referências.

Patricinha: Humor, Raça e Alteridade

Nas composições e mais notadamente nos shows Carol faz referências constantes

a patricinha, imagem do feminino que se distingue seja pelo pertencimento territorial –

asfalto –, seja pela raça e/ou classe social. A patricinha é ridicularizada na sua falta de

conhecimento – da dança, dos espaços, das músicas –, sua atitude esnobe ou indecisa

também causa riso. Em Dá ou Desce, Mc Carol brinca com as palavras ridicularizando o

jogo de sedução da patricinha com o chefe5:

Dá ou desce
Pra todas patricinhas
Que gostam de se envolver com o chefe

Dá ou desce, dá ou desce
Andou de picape
Andou de Peugeot
E só dá estresse

Dá ou desce, dá ou desce
Se vacilar com o chefe
Vai trabalhar de garçonete

Dá ou desce, dá ou desce
Pra todas patricinhas
Que gostam de se envolver com o chefe

5
Chefe ou patrão é o primeiro homem na estrutura de comando do tráfico. Para uma análise mais
aprofundada das diferentes funções que compõe essa estrutura, vale conferir: para o contexto do Rio,
Barbosa (1998); para o contexto de São Paulo, Biondi (2009).
Em Dá ou Desce o humor reside na ausência de um comportamento sexual ativo,

direto, por parte da patricinha. A alteridade aí indexada é aquela que se refere a

sexualidade não-censurada que descreve Mc Carol em suas músicas6.

Keith Basso (1979) em “Portraits of ‘the whiteman’” faz uma etnografia das

formas de diferenciação e alteridade entre os Apaches da América do Norte nas imagens

cômicas que os mesmos criam dos “homens brancos”. Trata-se de uma certa antropologia

reversa, na medida em que através das piadas é possível entender como os Apaches

investigam os brancos, as relações com os brancos e as qualidades do humano. Desse

modo o humor possui uma potência analítico-reflexiva na produção de conhecimentos

sobre o outro e sobre si. O humor se conforma enquanto uma das ferramentas para lidar

com os problemas filosóficos que a presença do “whiteman” coloca.

A presença do “whiteman” é como uma presença ausente, que por sua vez causa

mal-estar. A imitação do branco é um modelo de relação que é de poder/autoridade.

Assim o humor está em evidenciar a hierarquia das relações inscrevendo-as por meio do

modo branco de impor/oprimir. Basso trata assim de como a ridicularização do branco

informa também sobre as relações entre as pessoas que brincam, na medida em que

transporta a forma hierárquica e hierarquizante branca para as relações internas

(mãe:filho::criança:cachorro::branco:índio), havendo, por conseguinte um risco iminente

no jogo, além disso a possibilidade de brincar reforça as relações de amizade.

Destarte, uma das questões centrais do Basso é como se criam os efeitos de

dramatização e performance da alteridade e de como essa metalinguagem funciona. A

dramatização no caso do “whiteman” se dá pela passagem de código: passar a falar em

6
Essa sexualidade não-censurada e ativa fica evidente por exemplo no funk Vou Tirar Sua Virgindade:
Eu me amarro em novinho / Diz pra mim a sua idade / Porque essa noite / Eu vou tirar sua virgindade /
Novinho de 15 anos / Eu vou tirar sua virgindade / Vou tirar / Senta no sofá e fica à vontade / Porque a
Carol Bandida / Vai tirar sua virgindade.
inglês se transforma no frame, na forma a entrada no frame da piada/do humor. De modo

que o que evidencia a antropologia reversa é a marcação dramatizada da alteridade na

linguagem, essa caricatura é como um comentário sobre um modo de ser que se distingue.

A mudança de código é sempre significativa, seja ela uma mudança de língua ou de

modos da língua. Fala-se inglês ou para falar com os brancos ou para fazer piada dos

mesmos. A mudança de código na linguagem funciona assim como uma

metacomunicação.

O whiteman aparece nas suas posições de autoridade, tendo essa mesma

autoridade ridicularizada: a professora, o médico. O exagero dramatizado, a caricatura, a

hipérbole traz à tona ou põe em evidência a aspecto imoral dessa liderança/autoridade

branca, daquilo que no limite qualifica a alteridade branca naquilo que ela mais se

afasta/se opõe aos modos apache. A brincadeira é então feita através do contraste e da

comparação, que implica uma dimensão moral/moralizante. A análise é, portanto,

engajada, na medida em que traz à tona o que é “maligno” dos brancos7.

Podemos traçar assim uma analogia entre o “whiteman” e a patricinha, na qual o

humor reside na ridicularização de uma alteridade racializada. A brincadeira é assim

analítico-reflexiva na medida em que ao mesmo tempo que faz uma avaliação moral do

outro reflete também sobre si próprio e aquilo que lhe caracteriza. Há, por conseguinte

uma dimensão criativa do próprio joker, quem sabe brincar é quem tem capacidade de

7
“Dramatizations of Western Apache experience, joking imitations are also Western Apache interpretations
of it. And, like all successful dramatic forms, they entail a modification of experience in such a way that its
significance can be more tellingly stated and more acutely perceived. By making of 'the Whiteman' an
improbable buffoon, Apache jokers isolate and accentuate significant contrasts between their own cultural
practices and those of Anglo-Americans. And by presenting the behavior of Anglo-Americans as something
laughable and "wrong," by displaying with the help of butts how and why it violates the rights of others,
they denounce these standards as morally deficient and unworthy of emulation. In sum, joking
performances make it emphatically clear that White men and Western Apaches come to social encounters
with conflicting ideas of what constitutes deferential comportment – ideas that are ultimately grounded in
conflicting conceptions of what it means to be a person and the kinds of actions that can discredit a person's
worth in public situations.” (1979: 64)
refletir, de produzir uma análise ontológica, um comentário social indireto, e, por

conseguinte há um alto risco na medida em que se trata de desfazer/reposicionar a

humilhação implícita em todas as relações com os brancos, por meio da ridicularização

do dominante.

Meu Namorado é o Maior Otário: Riso, Gênero e Poder

O namorado é outro personagem recorrente nas composições de Carol. Os funks

narram tensões, violências e dinâmicas de poder na relação nas quais em boa parte das

vezes a imagem do namorado é a do ridículo e sua emasculação o motivo do riso. Na

música que dá título a esse tópico o namorado é tratado com desdém no mesmo

movimento em que a independência do eu-lírico – da namorada – se impõe, o humor está

no paradoxo, na inversão mesmo dos papéis:

Meu namorado é maior otário


Ele lava minhas calcinhas
Se ele fica cheio de marra eu mando ele pra cozinha
Se tu não tá gostando, então dorme no portão
Porque eu vou pro baile, vou pra minha curtição

A inversão de papeis é de fato uma das linhas lúdicas que atravessa a letra desse

funk, no entanto não se trata somente de contrapor papeis binários de gênero. Trata-se da

afirmação do feminino através do funk – da arte que é necessariamente pública – criando

imagens de um outro espaço doméstico possível, no qual o trabalho doméstico troca de

mãos e a violência não é um texto apenas masculino, como em Jorginho Me Empresta a

Doze8:

Filho da puta
Me deixou a pé
Veio pra cá pro Baile
Pra comer outra mulher

Me trancou em casa
Me deixou sem dinheiro

8
Doze é uma referência a espingarda de calibre 12.
Jorginho me empresta a 12
Vou matar esse maconheiro

Ôh Jorginho me empresta a 12
Pra mim fazer um barulho
Vou matar esse maconheiro

Em Vou Largar de Barriga, composição da Mc Carol interpretada por ela e o Mc

Parafuso, evidencia de maneira mais direta a relação contraposta e agonística entre os

gêneros, em uma discussão na qual o homem ameaça abandonar uma mulher grávida e

ela por sua vez o coage a ficar por meio de uma infinidade de ameaças.

Ele chegou lá em casa pedindo um copo d'agua


Vai rolar uma pentada, vai rolar uma pentada
Pediu pra tomar banho se enrolou na minha toalha
Mc Carol Vai rolar uma pentada, vai rolar uma pentada
Eu não quero nem saber se você tem namorada
Vai rolar uma pentada, vai rolar uma pentada
Fica me assoviando no portão de madrugada
Vai rolar uma pentada, vai rolar uma pentada

A missão vai ser comprida


Mc Parafuso Vou largar de barriga, vou largar de barriga
Pra dá de minissaia e de calça comprida
Vou largar de barriga, vou largar de barriga

Te meto atrás das grades, eu destruo sua vida


Se largar de barriga, se largar de barriga
Mc Carol Eu vou na Maria da Penha, vou no batalhão
Não adianta tú fugir, tu vai pagar pensão
Tu vai ter que trabalhar no PAC9 noite e dia
Se largar de barriga, se largar de barriga

Mc Parafuso Vai dormir na minha casa, vai comer da minha comida


Vou largar de barriga, vou largar de barriga

Eu não moro na tua casa, nem como da sua comida


Vou te processar botar seu nome na justiça
Vou chamar o advogado, te acuso de agressão
Mc Carol Conto umas historinhas pra te ver no camburão
Conto mentira pros meus pais pra conseguir tudo o que eu quero
Roubei o seu caráter, te joguei no inferno
Estourei a camisinha sou esperta pra caralho
Ganhei na justiça, te dei golpe de estado
9
Referência às obras do Plano de Aceleração do Crescimento que destino verbas para obras de
infraestrutura em diversas favelas da Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
E fudeu! Que a missão vai ser comprida
Mc Parafuso Vou largar de barriga, vou largar de barriga
A comida que eu te do é ovo com linguiça
Vou largar de barriga, vou largar de barriga

Mc Carol Você me engravidou pra mim ta tudo bem


Agora eu vou tirar tudo o que você tem

Clastres (2003) em “De que riem os índios? ”, analisa através de dois mitos, tanto

de sua estrutura e quanto de sua dramatização, os usos do humor entre os Chulupi. Os

mitos-humor estão em relação direta com a filosofia política do desfazer contínuo do

poder-estado, de maneira análoga à guerra. O humor ameríndio consistiria assim na

ridicularização de qualquer acúmulo de poder. O mito/o humor é aquele plano no qual se

desmistifica, se desdramatiza a existência. O ridículo são menos as figuras ridicularizadas

nos mitos (o jaguar e o xamã) e mais o movimento de acúmulo ou até simplesmente o

desejo por “mais poder”. A reapropriação das relações hierárquica diverte, a diversão é

essa própria desestabilização. Por fim, conclui o autor: a obsessão secreta de rir daquilo

que se teme revela no riso um equivalente da morte, afinal entre os Chulupi o ridículo

mata.

Em Vou Largar de Barriga, o poder de abandono do homem – tão real e cotidiano

– é desfeito, encontra sua morte na ridicularização. O eu lírico ameaça, constrange, desfaz

o poder estabelecido nas relações de gênero no mesmo movimento em que imobiliza o

homem no próprio contexto da sua ameaça de abandono. Podemos analisar a

ridicularização do namorado de maneira análoga a Clastres, do riso como um mecanismo

de desestabilização do poder, ao mesmo tempo em que é o próprio desestabilizar as

hierarquias motivo da diversão.


Vou te Fazer Homem: De Corpos Desfeitos e Sexualidades Deslocadas

Bakhtin (1987) ao analisar a obra do autor Rabelais sobre a cultura popular na

Idade Média realiza uma certa cosmologia do riso. Ao diferenciar as festas – a oficial e a

popular - através das distintas temporalidades o autor segue realizando oposições

análogas transversais à cultura popular. De modo que a festa possui temporalidade

própria, como o Carnaval que se inscreve no cotidiano de maneira a tomar conta do

mesmo, a festa é o campo do inescapável. É ali mesmo na fronteira entre a arte e a vida

que se insere o festejo popular, na medida em que não há separação (palco-

platéia::quadro-moldura), não se participa nem se assiste a festa, a mesma é vivida. As

festas populares criam, portanto, um outro mundo possível, que escapa aos controles e

regulações do Estado e da Igreja, é aquilo que o autor chama de segunda vida do povo.

Trata-se de uma liberação mesmo da vida, análoga a arte sem estar, entretanto,

circunscrita espacialmente, mas antes temporalmente.

“Ao contrário da festa oficial, o carnaval era o triunfo de uma espécie


de liberação temporária da verdade dominante e do regime vigente,
de abolição provisória de todas as relações hierárquicas, privilégios,
regras e tabus. Era a autêntica festa do tempo, a do futuro, das
alternâncias e renovações. Opunha-se a toda perpetuação, a todo
aperfeiçoamento e regulamentação, apontava para um futuro ainda
incompleto. ” (1987: 8)
O tempo da festa popular se distingue assim da imaterialidade do tempo da igreja,

como um segundo mundo que é vivido intensamente fora da Igreja e do Estado, das

formalidades, da higienização, da ordem. O momento da festa é assim o tempo de

contraposição a ordem estabelecida, ainda que a Igreja em certo sentido reconheça a

funcionalidade dessa temporalidade blasfema, dessas diabruras, de modo que o cômico

consegue escapar da acusação de heresia.


Temporalidades distintas implicam diferentes cosmologias. Os festejos populares

aludem a uma visão de mundo da fartura, do excesso, do exagero. Da mesma forma as

corporalidade não são individualizadas, coloca-se em evidência os orifícios que fazem

contato com o mundo em contraste com o corpo isolado. São corporalidades em relação,

através de excrementos, de contato, do grotesco. Bakhtin critica as leituras modernas que

consideram e analisam o grotesco enquanto negação e destruição, assinalando que a

negação realizada pelo grotesco é aquela da recriação da vida – como na imagem da velha

grávida. Ao destacar as protuberâncias, o grotesco atenta para a conexão entre os corpos

na mesma medida em que põe a vida em movimento, estabelecendo, por conseguinte,

socialidades que passam menos por uma noção de estrutura e mais por uma noção de

temporalidade.

O realismo grotesco da cultura popular europeia durante a Idade Médio atenta

assim para um riso que se faz no corpo despedaçado, desmembrado – no enfoque nas

protuberâncias, orifícios e excrescências, em tudo aquilo que abre o corpo, que coletiviza

corporalidades. O riso, o humor reside assim na capacidade de pôr em evidência

sexualidades exageradas, corporalidades coletivizadas, é ridicularizando o corpo que se

traça uma linha de fuga das socialidades individualizantes e civilizatórias.

É nesse sentido que as composições o funk encontra ressonância nas imagens

rabelaisianas, na opulência dos corpos, das sexualidades grotescas, no destaque para os

orifícios e as secreções. Gahyva (2011)10 analisa essa interseção através da trajetória e

dos funks da cantora Valesca e do grupo Gaiola das Popuzadas. Gahyva fala de como o

realismo grotesco se insere inclusive nos corpos opulentos e grandes das Popozudas. Com

Carol não é diferente, a funkeira esbanja uma sexualidade e sensualidade que passam

10
Disponível em: http://revistapittacos.org/2011/09/02/ola-mundo/. Acessado em 11 de agosto de 2015.
necessariamente por um corpo de grandes proporções. De modo que o enfrentamento a

ordem estética passa pelo próprio corpo de Mc Carol, chegando as suas protuberâncias e

culminando num corpo opulento que se despedaça e refaz no sexo. Como em Vou Te

Fazer Homem:

Esse gostinho na sua boca se chama tesão


Se você cuspir
Vai ganhar um porradão
É azedo, é amargo
Mas tu ficou apaixonado
Até postou no face11 que era meu namorado
Eu vou te fazer homem
Vou te fazer homem
Hoje tu vai aprender a chupar buceta grande

Em Bakhtin, o festejo é menos um escape, um momento de catarse e mais uma

segunda vida, um período de regeneração. Também nos funks da Mc Carol essa é a

dimensão política do grotesco: a regeneração por meio da fabricação de um corpo

coletivo. A morte do indivíduo é ressignificada coletivamente, revelando os jogos

desidentitários das fronteiras corporais. Para que o sujeito se torne coletivo é preciso que

os corpos sejam violados, desfeitos e o princípio para tal é o jogo. O corpo torna-se

coletivo no momento em que se ri, em que o mesmo é ridicularizado, como em Liga pra

SAMU12:

Explanou no microfone que queria transar


Ela bebeu demais
Ela falou sem pensou
Minha amiga não é disso
Ela é mina de família
Se embalou no ritmo
Ritmo da putaria

Liga pra SAMU


Liga pra SAMU
Ela quis transar com três

11
Referência a rede social ‘Facebook’.
12
SAMU: Serviço de Atendimento Móvel de Urgência.
Deu hemorragia no cu

Eu fui atrás
Eu avisei
Quando eu fui ver
Ela foi embora com três
O DJ anunciou
Tô muito preocupada
A minha amiga tá na treta desmaiada

O povo é assim sujeito coletivo do riso no funk, um humor geral que está associado

a sexualidade, trata-se mesmo de uma cosmologia do movimento não individual. Um

sujeito coletivo composto por um corpo coletivo entrecortado por forças contrapostas –

alto/baixo, vivo/morto – que se relacionam provocando um riso alegre do paradoxo, do

renascimento da vida. O corpo é desfeito, despedaçado e seu despedaçamento é motivo

de riso e alegria, na medida em que põe em evidência a composição mutua entre morte e

vida, violência e renascimento.

Bibliografia

Bakhtin, Mikhail (1987) A Cultura Popular na Idade Média e no Renascimento. O

Contexto de François Rabelais. São Paulo: Hucitec, Brasília: Editora da UnB.

Barbosa, Antônio Carlos Rafael. Um abraço para todos os amigos: algumas

considerações sobre o tráfico de drogas no Rio de Janeiro. Niterói: EDUFF, 1998.

Basso, Keith (1979) Portraits of “the whiteman”. Linguistic play and cultural symbols

among the Western Apache. Cambridge: Cambridge University Press.

Biondi, Karina. Junto e misturado: imanência e transcendência no PCC. Dissertação de

Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social. UFSCar. 2009.

Certeau, Michel De (1994). A invenção do cotidiano. Petrópolis, Vozes.


Clastres, Pierre (2003 [1974]). De que riem os índios? Em A Sociedade Contra o

Estado. São Paulo: Cosac e Naify.

Detienne, Marcel e Vernant, Jean Pierre (2008) Metis: as astúcias da inteligência. São

Paulo: Odysseus.

Facina, Adriana; Lopes, Adriana Carvalho. Cidade do funk: expressões da diáspora negra

nas favelas cariocas. Revista do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, v. 6, p. 193-

206, 2012.

Freud, Sigmund. 1991 [1905]. Obras Completas. Volume 8: El chiste y su relación con

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___ O humor (1927). In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas.

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Huizinga, Johan (1980 [1938]). Homo Ludens. O jogo como elemento da cultura. São

Paulo, Perspectiva.

Simmel, George (1950) “Sociability”; “The lie”; In Wolff, Kurt (editor) The Sociology of

Georg Simmel. New York, The Free Press.

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