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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO


Centro de Ciências Exatas e Naturais - Ensino de Graduação
Equações Diferenciais – Aula 4
Prof. Alexsandro Belém – email address: alexsandro.belem@ufersa.edu.br

Princı́pio da Superposição
Lembrando que na equação
dn y dn−1 y dy
an (x) n
+ an−1 (x) n−1
+ · · · + a1 (x) + a0 (x)y = g(x) (1)
dx dx dx
quando g(x) é uma função identicamente nula, dizemos que a equação é homogênea. Caso
contrário, a equação é chamada não-homogênea.
Por exemplo, a equação 2y 00 + 3y 0 − 5y = 0 é uma E.D.O. linear, homogênea, de segunda
ordem. Enquanto que x3 y 000 − 2xy 00 + 5y 0 + 6y = ex é uma E.D.O. linear, não-homogênea, de
terceira ordem.
Veremos mais tarde que para resolver uma equação não-homogênea é preciso, primeiro,
resolver a “equação homogênea associada”.
Para evitar repetições desnecessárias, a menos que se especifique o contrário, suporemos
em (1), em algum intervalo I:

• ai (x), i = 1, . . . , n contı́nuos;

• g(x) contı́nua;

• an (x) 6= 0, para todo x ∈ I.

Nesse contexto, o resultado a seguir é conhecido como Princı́pio da Superposição para


Equações Homogêneas

Theorem 0.1 Sejam y1 , . . . , yk soluções de (1) em algum intervalo I. Então


k
X
y= ci yi (x) = c1 y1 (x) + · · · + ck yk (x), ci ∈ R, i = 1, . . . , n (2)
i=1

é também uma solução de (1) no mesmo intervalo.

A prova desse teorema é absolutamente trivial e segue imediatamente do fato que a


derivada da soma de duas, três ou mais funções é igual soma das derivadas dessas mesmas
funções. Aléem disso, a derivada de uma função multiplicada por um constante é igual a
constante multiplicada pela derivada da função. Faça como exercı́cio!
O princı́pio da superposição dado anteriormente, assim como o item 1 do corolário (0.2),
a seguir, são propriedades que equações não-lineares, em geral, não possuem.
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Exercı́cios:

1. Verifique que y1 = 1 e y2 = ln x são soluções para e ED não-linear y 00 + (y 0 )2 = 0


no intervalo (0, ∞). y1 + y2 é uma solução para essa equação? c1 y1 + c2 y2 , c1 e c2
constantes arbitrárias, é uma solução para essa equação? Isso contradiz o princı́pio da
superposição?
1
2. Verifique que y = é uma solução para a equação diferencial y 00 = 2y 3 no intervalo
x
1
(0, ∞). Mostre ainda que um múltiplo y = k não é solução para essa mesma equação
x
quando k 6= ±1. Isso contradiz o corolário do princı́pio da superposição?

O corolário a seguir é imediato.

Corolário 0.2 (Do Teorema 0.1)

1. Um múltiplo y = cy1 (x) de uma solução y1 (x) para uma equação diferencial linear
homogênea também é uma solução dessa equação.

2. Uma equação diferencial homogênea sempre possui a solução trivial y = 0.

Exemplos:

1. É imediato verificar que y1 = x2 e y2 = x2 ln x são soluções da equação x3 y 000 − 2xy 0 +


4y = 0 em (0, +∞). Como trata-sse de uma equação linear e homogênea, o teorema
(0.1) garante que a combinação y = c1 x2 + c2 x2 ln x, para quaisquer constantes c1 e c2 ,
é também uma soluação para essa equação nesse intervalo.

2. As funções y1 = ex , y2 = e2x , y3 = e3x são soluções da equação y 000 −6y 00 +11y 0 −6y = 0
em R. Pelo princı́pio da superposição y = c1 ex + c2 e2x + c3 e3x é ainda uma solução
dessa equação para quaiquer constantes c1 , c2 , c3 .

3. A função y = x2 é solução de x2 y 00 − 3xy 0 + 4y = 0 no intervalo (0, +∞). Pelo item 1 do


corolário (0.2), y = cx2 , para todo c ∈ R é também solução dessa equação nesse mesmo
intervalo. Em particular, y = 3x2 , y = ex2 , y = 0, por exemplo, são todas soluções
dessa mesma equação nesse mesmo intervalo.

Estamos interessados em determinar quando as n soluções y1 , y2 , . . . , yn para a equação


diferencial homogênea
dn y dn−1 y dy
an (x) n
+ an−1 (x) n−1
+ · · · + a1 (x) + a0 (x)y = 0 (3)
dx dx dx
são linearmente independentes.
O Wronskiano não nulo é necessário e suficiente para essa independêcia linear.

Theorem 0.3 (Critério para indepedência linear de soluções) Sejam y1 , y2 , . . . , yn para


a equação linear homogênea de n−ésima ordem (3) em um intervalor I. Então o conjunto
dessas n soluções é linearmente independente em I se, e somente se, W (y1 , y2 , . . . , yn ) 6= 0
para todo x ∈ I.
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Prova: Quando o wronskiano de funções pelo menos n − 1 vezes diferenciável é não nulo
em um intervalo, o teorema 1.3 da aula 5 garante que essas funções são L.I. nesse intervalo.
As funções y1 , y2 , . . . , yn são diferenciáveis até ordem n, pelo menos, já que são soluções de
uma equação diferencial de ordem n, logo, o teorema citado antes, garante que elas são L.I.
quando o Wronskiano é não nulo.
Para a recı́proca, a fim de simplificar os cálculos, vamos fazer o caso n = 2. O caso geral é
análogo. Supomnhamos, então, y1 , y2 linearmente independentes e suponha que existe x0 ∈ I
tal que W (y1 (x0 ), y2 (x0 )) = 0. Por definição, existem c1 , c2 ∈ R tais que

c1 y1 (x0 ) + c2 y2 (x0 ) = 0 e
. (4)
c1 y10 (x0 ) + c2 y20 (x0 ) =0

Ponhamos y(x) = c1 y1 (x) + c2 y2 (x). Pelo princı́pio da superposição y é ainda uma solução
de (3). Além disso,
y(x0 ) = c1 y1 (x0 ) + c2 y2 (x0 ) e y 0 (x0 ) = 0. (5)

Mas a solução trivial y = 0 também satisfaz (3) e as condições iniciais em (5). Como estamos
supondo ai (x) contı́nuos para todo i = 0, . . . , n e an (x) 6= 0, para todo x ∈ I, segue do
teorema de existência e unicidade que y = 0 é a única solução de (3) que satisfaz (5). Logo,
c1 y1 (x) + c2 y2 (x) = 0, para todo x ∈ I, com c1 , c2 ∈ R não ambas nulas. Mas isso contradiz
o fato de que y1 e y2 são linearmente independentes no itervalo I. 

O teorema anterior nos permite dar a seguinte definição

Definição 0.4 Qualquer conjunto y1 , y2 , . . . , yn de n soluções linearmente independentes


para a equação (3) em um intervalo I é chamado de conjunto fundamental de soluções da
equação no intervalo I.

Theorem 0.5 Sejam y1 , y2 , . . . , yn soluções linearmente independentes de 3 em um intervalo


I. Então toda solução Y (x) de 3 é uma combninação linear de y1 , y2 , . . . , yn .

Prova: Seja Y uma solução e sejam y1 , y2 , . . . , yn n soluções linearmente independentes


para (3) em um intervalo I. Suponha que x = t seja um ponto desse intervalo para o qual
W (y1 (t), y2 (t), . . . , yn (t)) 6= 0. Suponha também que os valores de Y (t), Y 0 (t), . . . , Y (n−1)
sejam dados por
Y (t) = k1 , Y 0 (t) = k2 , . . . , Y (n−1) = kn .

Se examinarmos agora o sistema de equações

C1 y1 (t) + C2 y2 (t) + · · · + Cn yn (t) = k1


C1 y10 (t) + C2 y20 (t) + · · · + Cn yn0 (t) = k2
.. .. ..
. . .
(n−1) (n−1) (n−1)
C1 y1 (t) + C2 y2 (t) + · · · + Cn yn (t) = kn

segue-se que podemos determinar C1 , C2 , . . . , Cn de maneira única, desde que o determinante


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dos coeficientes satisfaça



y (t)
1 y2 (t) ··· yn (t)

0 0
yn0 (t)

y1 (t) y2 (t) ···
6= 0.

.
.. .
.. .. ..

. .

(n−1) (n−1) (n−1)
y1 (t) y2 (t) · · · yn (t)

Mas esse determinante é simplesmente o Wronskiano das funções y1 , y2 , . . . , yn calculado no


ponto x = t e, desde que essas funções são L.I., o teorema (0.3) W 6= 0 em I. Definindo
então a função
G(x) = C1 y1 (x) + C2 y2 (x) + Cn yn

observamos que:

• Pelo Teorema da superposição, G(x) satisfaz a equação (3), pois ela é a superposição
de duas soluções y1 , y2 , . . . yn ;

• G(x) satisfaz as condições iniciais

G(t) = k1 , G0 (t) = k2 , . . . , G(n−1) (t) = kn ;

• Y (x) satisfaz a mesma equação linear e as mesmas condições iniciais.

Além disso, o teorema de existência e unicidade garante que a solução para esse problema
linear de valor inicial é única, assim Y (x) = G(x), ou

Y (x) = C1 y1 (x) + C2 y2 (x) + Cn yn (x).

Como querı́amos provar. 


O toerema anterior, juntamente com o teorema (0.3), garate que quando o Wronskiano
das soluções y1 , y2 , . . . , yn da equação (3) for não nulo em um intervalo então qualquer outra
solução dessa equação, nesse intervalo, é uma combinação linear das soluções y1 , y2 , . . . , yn .
É natural, então, chamar a expressão
n
X
y= ci yi (x) = c1 y1 (x) + · · · + cn yn (x)
i=1

com coeficientes constantes arbitrários de solução geral da equação (3) nesse intervalo.

Equações não-homogêneas
Voltemos nossa atenção para a equação diferencial linear não homogênea

dn y dy
+ · · · + a1 (x)
an (x) + a0 (x)y = g(x) (6)
dxn dx
Com as hipóteses de sempre: ai (x) contı́nuos, i = 0, . . . , n g(x) contı́nua e an (x) 6= 0.
E considere a equação diferencial homogênea associada.

dy n dy
an (x) n
+ · · · + a1 (x) + a0 (x)y = 0. (7)
dx dx
5

Qualquer solução yp , independente de parâmetros, que satisfaça (6) é chamada de solução


particular para a equação (as vezes chamada também de integral particular).

Exemplos:

4. A função yp = 3 é na solução particular de y 00 + 9y = 27 pois 0 + 9 · 3 = 27

5. A função jp = x3 − x é uma solução particular para x2 y 00 + 2xy 0 − 8y = −8x3 + 6x pois


yp0 = 3x2 −1 e yp00 = 6x ⇒ x2 (6x)+2x(3x2 −1)−8(x3 −x) = 6x3 +6x3 −2x−8x3 +8x =
8x3 + 6x.

A prova do teorema a seguir é trivial, e por isso deixamos como exercicio.

Theorem 0.6 Seja y1 , . . . , yn soluções para (7) em I e seja yp qualquer solução para (6) no
Pp
mesmo intervalo. Então y = i=1 ci y1 (x) ci ∈ R constantes é também solução de (6) em I.

Para equações não-homogêneas temos a seguinte versão do teorema (0.5).

Theorem 0.7 Seja yp uma solução para (6) em algum intervalo I e seja y1 , . . . , yn um con-
junto fundamental de soluções para a equação homogênea associada (7) no mesmo intervalo.
Então para qualquer solução y(x) de (6) em I, podemos encontrar constantes C1 , C2 , . . . , Cn
tais que
p
X
y= Ci yi (x) = C1 y1 (x) + · · · + Cn yn (x) + Cp yp (x)
i=1

[Ou seja, qualquer solução da equação não-homogênea é uma combinação linear das soluções
da equação homogênea com a solução conhecida da equação não-homogênea].

Prova: Para diminuir os cálculos, vamos provar o caso n = 2. O caso geral é abolutamente
análogo. Suponha Y e yp soluções de

a2 (x)y 00 + a1 (x)y 0 + a0 (x)y = g(x).

Defina u(x) = y(x) − yp (x), x ∈ I. Assim,

u00 (x) = y 00 (x) − yp00 (x) ⇒


a2 (x)u00 (x) + a1 (x)u0 (x) + a0 (x)u =
a2 (x)[y 00 (x) − yp00 (x)] + a1 (x)[y 0 (x) − yp0 (x)] + a0 (x)(y(x) − yp (x)) =
a0 (x)y 00 (x) + a1 (x) + y 0 (x) + a0 y(x) − (a2 yp00 (x) + a1 (x) + a0 (x)yp (x)) =
g(x) − g(x) = 0.

Portanto, u é solução da equação homogênea associada a2 (x)y 00 + a1 (x)y 0 + a0 (x)y = 0.


Pelo teorema (0.5), u é uma combinação linear das soluções L.I. y1 e y2 em I, isto é, u(x) =
C1 y1 (x) + C2 y2 (x) com C, C2 ∈ R constantes. Assim, y(x) − yp (x) = C1 y1 (x) + C2 y2 (x) e,
consequentemente, y(x) = C1 y1 (x) + C2 y2 (x) + yp (x). 

Definição 0.8 Seja yp na solução dada pra (6) em um intervalo I e seja

n
X
yc = ci yi (x), ci ∈ R (8)
p=1
6

A solução geral para a equação (7) em I. A solução geral para (6) em I é definida por

y = C1 y1 (x) + · · · + Cn yn (x) + yp (x) = yc (x) + yp (x).

A combinação linear (8), que é a solução geral de (7), é chamada de função complementar
para a equação (6).
Noutras palavras, a solução geral de uma equação não-homogênea é

y = função complementar + qualquer solução particular.

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Exemplo 6: A função yp = − − x é uma solução particular para y 000 −6y 00 +11y 0 −6y = 3x,
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o que pode ser verificado facilmente.
Para escrever a solução geral dessa equação devemos resolver a equação homogênea asso-
ciada. Mas já vimos no exemplo 2 que a solução geral de y 000 − 6y 0 + 11y 0 − 6x = 0 é dada
por yc = C1 ex + C2 e2x + C3e3x . Portanto, a solução geral dessa equação é
11 1
y = c1 ex + c2 e2x + c3 e3x − − x.
12 2

Para equações não-homogêneas, temos a seguinte versão do Princı́pio da Superposição.

Theorem 0.9 Sejam yp1 , yp2 , . . . , ypk soluções particulares para (6) correspondendo a k fun-
ções distintas g1 , g2 , . . . , gk , isto é, ypi é uma solução particular para

an (x)y (n) + an−1 (x)y (n−1) + · · · + a1 (x)y 0 + a0 (x)y = gi (x),

para cada i = 1, . . . , k. Então


k
X
yp = ypi (x)
i=1
é uma solução particular para
k
X
an (x)y (n) + · · · + a1 (x)y 0 + a0 (x)y = gi (x)
i=1

Prova: Exercı́cio!

Exemplo 7: Verifique que yp1 = −4x2 é uma solução para y 00 − 3y 0 + 4y = −16x2 + 24x − 8,
yp2 = e2x é uma solução para y 00 − 3y 0 + 4y = 2e2x e yp3 = xex é uma solução para
y 00 − 3y 0 + 4y = 2xex − ex
Segue do teorema anterior que a superposição de yp1 , yp2 , yp3 , ou seja,

y = yp1 + yp2 + yp3 = −4x2 + e2x + xex

é uma solução para

y 00 − 3y 0 + 4y = −16x2 + 24x − 8 + 2e2x + 2xex − ex .

EXERCÍCIOS: LISTAS 2.1 e 2.2 E EXERCÍCIIOS DA SEÇÃO 4.1 DO LIVRO DO ZILL.


Referências Bibliográficas

[1] Boyce, W. E. e DiPrima, R. C. – Equações Diferenciais Elementares e Problemas de


Valores de Contorno. 8ed. Rio de Janeiro, L.T.C.

[2] Guidorizzi, H.L. – Um Curso de Cálculo, vol. 4 – 5ed. Rio de Janeiro, LTC, 2011.

[3] Zill, D. G. e Cullen, M. R. – Equações Diferenciais, vol. 1. São Paulo, PEARSON, 2007.

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