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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2020.0001023439

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


1064396-02.2019.8.26.0002, da Comarca de São Paulo, em que é apelante
AYMORÉ CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A, é apelado
ALOIZIO DEMESIO PEREIRA.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 20ª Câmara de Direito


Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram
provimento em parte ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator,
que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores ROBERTO MAIA


(Presidente) E REBELLO PINHO.

São Paulo, 15 de dezembro de 2020.

LUIS CARLOS DE BARROS


Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Apelação Cível nº 1064396-02.2019.8.26.0002


Apelante: Aymoré Crédito, Financimento e Investimento S/A
Apelado: Aloizio Demesio Pereira
Comarca: São Paulo
Voto nº 45044

Ementa: Ação revisional de contrato.


Financiamento de veículo. Tarifa de registro de
contrato e de avaliação de bem. Possibilidade de
cobrança, desde que demonstrada a efetiva
prestação do serviço. Aplicação das teses fixadas no
julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº
1.578.553 SP (Tema 958). Seguro. Não
demonstração de que o consumidor teve opção ao
contratar. Possibilidade de compensação. Recurso
parcialmente provido.

A r. sentença, cujo relatório se adota, julgou


parcialmente procedente o pedido deduzido em ação revisional
de contrato c.c. repetição de indébito (fls. 117/122).

Apela a requerida procurando modificar o


resultado do julgamento. O recurso foi processado com as
formalidades legais.

As contrarrazões foram ofertadas.

É o relatório.

O dispositivo da r. sentença foi redigido nos


seguintes termos: “Do exposto, julgo parcialmente procedente o
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pedido para o fim de afastar a cobrança de seguro (R$


1.545,89), e tarifa de avaliação de bem (R$ 450,00),
determinando à parte requerida que restitua à parte autora o
valor pago por parcela a esse título, incluindo juros
remuneratórios que eventualmente tenham incidido sobre tais
valores, corrigidos conforme Tabela Prática do Tribunal de
Justiça de São Paulo desde o desembolso (14/04/2016), com
juros de mora de 1% ao mês a partir da citação. Diante da
substancial sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento
das despesas processuais e honorários advocatícios, arbitrados
em 10% do valor rechaçado do pedido, devidamente atualizado,
nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Transitada em julgado,
certifique-se. Nada requerido, arquivem-se. P.I” (fls. 122).

A apelante diz que o apelado não “foi induzido


em erro e não ignorava o teor das cláusulas, não foi vítima de
dolo, coação ou simulação, tampouco desconhecia as cláusulas
contratuais e as eventuais modificações que alega 'excessivas'”
(fls. 127).

Afirma que o STJ julgou válidas as cobranças


das tarifas de registro de contrato e avaliação de bem na REsp
1.578.533/SP.

Aduz que o “art. 52 da Lei n°. 8.078/90, dispõe


que na outorga de crédito ou concessão de financiamento ao

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consumidor, deve haver a prévia e adequada informação a


respeito do montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual
de juros. O CET - Custo Efetivo Total, previsto na Resolução
3.517/2007, objetiva justamente informar o consumidor de
todos os encargos e as despesas do financiamento ou leasing”
(fls. 131).

Frisa que “a exigência de pagamento de taxas e


tarifas pelas instituições financeiras está autorizada
expressamente pelas Resoluções nºs 2.303/1996, 2.747/2000,
2.878/2001, 2.892/2001, 3.518/2007 e 3.919/2010, editadas
com base no arts. 4º, VI e IX, e 9º da Lei 4.595/1964, e se
harmoniza com o CDC, pois não constitui abusividade, já que o
custo da operação pode ou não ser inserido na taxa de juros
remuneratórios” (fls. 132).

Defende a validade da cobrança de tarifa de


seguro proteção financeira, que foi pactuada com livre
concordância da parte apelada, não havendo que se falar em
venda casada. Acrescenta que “a cobrança de seguros vem
legalmente amparada nas Resoluções nº 2.303, de 28/07/1996 e
nº 2.747, de 28/06/2000, do Banco Central do Brasil e também
se encontra expressamente previstas no Contrato de
Empréstimo/Financiamento pactuado entre as partes” (fls. 136).
Diz que “para a instituição financeira que concede o crédito, o
seguro nada mais é do que uma garantia de que a inadimplência
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poderá ser evitada. Geralmente ele é contratado com o objetivo


saldar o débito do empréstimo/financiamento efetivado pelo
cliente, caso venha a falecer ou sofrer outro impedimento
coberto (invalidez permanente por doença ou acidente, por
exemplo) que o impossibilite de honrar seu compromisso com a
instituição financeira (credor). De tudo isso se depreende que a
condenação de restituição dos valores pagos viola os
dispositivos legais e princípios contratuais citados nesta defesa,
não lhe sendo reconhecida eficácia” (fls. 137).

Por fim, afirma que o “banco foi condenado a


restituir os valores cobrados supostamente indevidos pelas
mesmas taxas do contrato. Primeiramente, foi firmada a tese no
RECURSO ESPECIAL Nº 1.552.434 - GO (2015/0206990-0),
de que não é permitida a repetição de indébito pelas mesmas
taxas do mercado. A Seção, por unanimidade, acolheu tese
repetitiva proposta pelo Sr. Ministro Relator, consolidando,
para os fins do artigo 1.040 do CPC/2015, a seguinte tese
aplicável a todo contrato de mútuo feneratício celebrado com
instituição financeira mutuante: 'Descabimento da repetição do
indébito com os mesmos encargos do contrato'” (fls. 144).

Aduz que, “caso o apelado se encontrar


inadimplente junto banco, o que pode haver é a simples
compensação entre esta dívida e os valores eventualmente
descontados indevidamente pelo banco, nos termos do art. 368
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do CC” (fls. 146).

Também alega que, inexistente “má-fé da


instituição financeira, não se justifica a aplicação do art. 42,
parágrafo único, do CDC, para repetir em dobro” (fls. 147).

Pois bem.

Tem-se que o C. Superior Tribunal de Justiça,


no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.578.553
SP (Tema 958), fixou determinadas teses que abrangem a
discussão travada no caso concreto acerca de tarifas bancárias.
Ficou determinado que: “2.3. Validade da tarifa de avaliação
do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o
ressarcimento de despesa com o registro do contrato,
ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não
efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da
onerosidade excessiva, em cada caso concreto”.

No contrato firmado pelo autor houve


cobrança de tarifa de avaliação de bem (R$ 450,00, fls. 23).
Contudo, não tendo sido demonstrado pelo banco a efetiva
prestação do serviço, resta mantida a determinação de
devolução da respectiva quantia ao autor.

Quanto ao seguro prestamista:

“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO.


TEMA 972/STJ. DIREITO BANCÁRIO. DESPESA DE PRÉ-
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GRAVAME. VALIDADE NOS CONTRATOS


CELEBRADOS ATÉ 25/02/2011. SEGURO DE PROTEÇÃO
FINANCEIRA. VENDA CASADA. RESTRIÇÃO À
ESCOLHA DA SEGURADORA. ANALOGIA COM O
ENTENDIMENTO DA SÚMULA 473/STJ.
DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. NÃO OCORRÊNCIA.
ENCARGOS ACESSÓRIOS.

1. DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA:
Contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com
instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente, seja
por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das
relações de consumo.

2. TESES FIXADAS PARA OS FINS DO


ART. 1.040 DO CPC/2015: (...). 2.2 - Nos contratos bancários
em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar
seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela
indicada. 2.3 - A abusividade de encargos acessórios do
contrato não descaracteriza a mora.

3. CASO CONCRETO. 3.1. Aplicação da tese


2.3 ao caso concreto, mantendo-se a procedência da ação de
reintegração de posse do bem arrendado. 4. RECURSO
ESPECIAL DESPROVIDO. (REsp 1639320/SP, Rel. Ministro
PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO,

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julgado em 12/12/2018, DJe 17/12/2018)

Relativamente ao montante exigido a título de


seguro, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no
sentido de que o consumidor não pode ser compelido a
contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora
por ela indicada. Assim, caberia à requerida ter demonstrado
que houve a concessão de outras opções de seguradoras ao
consumidor no momento da contratação, o que não ocorreu no
presente caso.

Dessa forma, de rigor o reconhecimento a


abusividade da cobrança da quantia de R$ 1.540,03 a título de
seguro (fls. 25).

Note-se que consta na fundamentação da r.


sentença que a “devolução de eventuais valores cobrados a esse
título deverá se dar de forma simples, não verificada má-fé na
cobrança” (fls. 122). Portanto, nesta parte não há interesse
jurídico do banco na insurgência contra devolução em dobro,
vez que não houve tal determinação na r. sentença.

Diversamente do que afirma o apelante, não


houve condenação de devolução do indébito corrigido com as
mesmas taxas do contrato. No dispositivo da r. sentença foi
apenas determinada a devolução das quantias pagas a título de
seguro e tarifa de avalição de bem, “incluindo juros

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remuneratórios que eventualmente tenham incidido sobre tais


valores, corrigidos conforme a Tabela Prática do Tribunal de
Justiça de São Paulo desde o desembolso (14/04/2016), com
juros de mora de 1% ao mês a partir da citação” (fls. 122).

Entrementes, tem razão o recorrente quanto a


fazer jus à compensação com eventual saldo devedor do autor
relativamente ao contrato discutido nos autos.

Ante o exposto, dá-se parcial provimento ao


recurso apenas para reconhecer a possibilidade de compensação
do indébito a ser restituído com eventual saldo devedor
ostentado pelo contrato. Dada a sucumbência quase integral do
autor, resta mantida a condenação nos ônus da sucumbência na
forma definida na r. sentença.

LUIS CARLOS DE BARROS


Relator

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