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© Editora Brazil Publishing


Rua Fernando Simas, 95 Sala - 6
Bigorrilho - Curitiba - PR - 80430-190
+55 (41) 3022-6005

Conselho Editorial:
Presidente: Rodrigo Horochovski
Vice Presidente: Afonso Murata
Membros do Conselho: Daniel Canavese Luciana Ferreira
Denise Kluge Luciana M. Nascimento
Dione Tinti Marcia M. Ribeiro
Fabrício R. L. Tomio Marcos C. Signorelli
Ilton R. Filho Marilia Murata
Joelma Estevam Milene Z. Vosgerau
José E. Feger Rodrigo A. Reis
José R. G. Cella Rodrigo Kanayama

Presidente Executiva: Sandra Heck


Vice Presidente Executivo: João Paulo Neto
Capa: João Paulo Neto
Editoração: João Paulo Neto | Romulo Monteiro Jr.

Dados internacionais de catalogação na publicação


Bibliotecária responsável: Mara Rejane Vicente Teixeira

Práticas pedagógicas na promoção da igualdade racial /


organizadores: Aline Ruiz Menezes, Clézio Roberto
Gonçalves, Kassandra da Silva Muniz. - Curitiba, PR :
Brazil Publishing, 2017.
269 p. : il. ; 21 cm.

Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-68419-16-8 Papel
978-85-68419-19-9 E-book

1. Discriminação na educação. 2. Discriminação racial -


Brasil. 3. Professores – Formação. I. Menezes, Aline Ruiz.
II. Gonçalves, Clézio Roberto. III. Muniz, Kassandra da Silva.

CDD ( 22ª ed.)


1. 370.1150981

Impresso no Brasil / Printed in Brazil


2017

2
3
UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
NÚCLEO DE ESTUDOS AFRO-BRASILEIROS E
INDÍGENAS (NEABI-UFOP)
Profª. Drª. Ana Mónica Henriques Lopes
(Coordenadora Geral)
Ms. Adilson Pereira dos Santos
(Coordenador de Assuntos Institucionais)
Prof. Dr. Erisvaldo Pereira dos Santos
(Assessor de Assuntos Institucionais)
Profª. Ms. Dulce Maria Pereira
(Assessora de Assuntos Internacionais)
Profª. Drª. Kassandra da Silva Muniz
(Assessora de Assuntos Acadêmicos)
Profª. Drª. Verônica Mendes Pereira
(Assessora de Assuntos Indígenas)
Maria Helena Rodrigues
(Secretária)
Denise Maria Sales Neto Freitas
(Secretária)
Zulmira Maria Fialho
(Bolsista)

4
ALINE RUIZ MENEZES
CLÉZIO ROBERTO GONÇALVES
KASSANDRA DA SILVA MUNIZ
(Orgs.)

5
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO UNIAFRO:
PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA

Prof. Dr. Clézio Roberto Gonçalves


(Coordenador Adjunto)
Profª. Drª. Kassandra da Silva Muniz
(Coordenadora Adjunta)
Prof. Ms. José Américo Martins Júnior
(Coordenador de Tutoria)
Prof. Dr. Erisvaldo Pereira dos Santos
(Supervisor Pedagógico)
Profª. Silvana Vanessa Peixoto
(Especialista em EAD)
Polos atendidos:
Barroso (MG), Campinas (SP), Mariana (MG), Ponte
Nova (MG), Timóteo (MG)

6
AGRADECIMENTOS

Aos professores, orientadores, tutores e alunos


que deram forma e sentido ao primeiro Curso de
Especialização UNIAFRO: política da promoção da
igualdade racial na escola;
Às secretárias e bolsistas do NEABI-UFOP, Aline
Rafaela Lelis, Ingrid Borges, Zulmira Fialho, Denise
Freitas e Maria Helena Rodrigues, pela imprescindível
colaboração;
Aos professores e alunos integrantes do NEABI-
UFOP, pelas trocas;
Ao Prof. Dr. Marco Antônio Torres (Coordenador
COMFOR/ UFOP), pela oportunidade e pela confiança;
Ao Departamento de Letras (DELET-UFOP), por
abrigar o referido curso;
Ao Centro de Educação à Distância (CEAD-
UFOP), pelo suporte técnico;
À Fundação Educativa de Rádio e Televisão de
Ouro Preto (FEOP), pelo apoio;
À Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização, Diversidade e Inclusão/Ministério da
Educação (SECADI/MEC) e ao Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE), pela liberação
de recursos aplicados neste livro, nossos mais sinceros
agradecimentos.

Em tempo... este livro só foi possível,


porque houve um trabalho em/de equipe.

Os Organizadores

7
SUMÁRIO

PARTE 1 - EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNI-


CO-RACIAIS...............................................................16

RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NA EDUCAÇÃO INFAN-


TIL: REFLEXOS DA ABORDAGEM CURRICULAR E DAS
PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA PROMOÇÃO DA IGUAL-
DADE RACIAL...............................................................17
Juliana da Conceição Silva
Ana Luiza Pinheiro Flauzina

RACISMO NO AMBIENTE DE UMA ESCOLA PÚBLICA DO


MUNICÍPIO DE RAUL SOARES (MG).............................34
Maria Carmem Vieira Verissimo Fioravante
Carmen Regina Teixeira Gonçalves

“PRÔ, EU TAMBÉM SOU MACUMBEIRA”. CONQUISTA E


RESISTÊNCIAS A IMPLEMENTAÇÃO DA LEI 10.639/03
NUMA ESCOLA DE ED. INFANTIL..............................63
Luciana do Amaral e Silva
José Américo Martins

A LEI 10.639/03 E SUA APLICABILIDADE EM ESCOLAS


PÚBLICAS DE PONTE NOVA (MG)...............................86
Erlaine Aparecida Silva
Paulo Alberto dos Santos Vieira

EDUCAÇÃO E CULTURA: PROMOVENDO A DIVERSIDA-


DE ÉTNICA, CULTURAL E RACIAL NAS ESCOLAS DE
LAGOA DOURADA (MG)..............................................103
Viviane Aparecida de Oliveira
Paulo Alberto Dos Santos Vieira

PIBID AFRO E A IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA ES-


TADUAL DOM BENEVIDES ........................................144
Aline Ângela de Jesus
Kassandra da Silva Muniz

8
PARTE 2 - LEI 10.639/2003: AVANÇOS E DESA-
FIOS.............................................................. 169

LEI 10.639/03: DIFICULDADES DOS PROFESSORES DE


UMA ESCOLA DA REDE ESTADUAL, EM PONTE NOVA
(MG), AO TRABALHAR, NO ENSINO FUNDAMENTAL II,
COM TEMÁTICAS DE CULTURA AFRICANA EM SALA DE
AULA, EM ESPECIAL COM AS RELIGIÕES................170
Mírian J. C. Carvalho
Aurino José Gois

LEI 10.639 NA PERIFERIA DE BELO HORIZONTE: OS


LIMITES ENTRE O QUE JÁ FOI FEITO E O QUE AINDA
HÁ POR FAZER............................................................198
Fernanda de Oliveira e Silva Colcerniani
Edgar Rodrigues Barbosa Neto

A LEI N°10.639/2003 E O CURRÍCULO AFROCENTRA-


DO: DESAFIOS E POSSIBILIDADES DA EDUCAÇÃO
PARA AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS......................218
Sirlei Alves Torres
Leandro Santos Bulhões de Jesus

REPENSANDO A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DIANTE


DA EFETIVAÇÃO DA LEI 10.639/03 EM UMA ESCOLA DA
REDE PÚBLICA MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO....246
Gustavo Pinto Alves Da Silva
Clézio Roberto Gonçalves

SOBRE OS ORGANIZADORES.....................................268

9
PREFÁCIO

Quando olhamos para o passado dos povos


africanos e seus descendentes em geral somos
tomados por uma impressão de passividade por parte
da população negra. É como se o colonizador aqui e
na África tivesse ordenado monoliticamente o mundo,
determinado de forma unilateral as condições e
colocado inteiramente sob seus desejos as populações
em África e também os mais de dez milhões de
africanos transportados via atlântico e escravizados
do lado de cá – para o Brasil vieram mais de 40%.
Essa suposta condição de inferioridade criou uma
perspectiva tutelar que ainda nos dias atuais coloca
a população negra no Brasil é inferior! Inferior em
todos os sentidos. Ela encontrar-se-ia dependente de
benesses governamentais, flutuando na tolerância
branca e privilegiada por uma espécie de “caridade”
nacional.

Essa impressão é tão forte que nos permite


explicar a cultura, as relações sociais e a política
por códigos externos aos processos históricos. Desse
procedimento nasce a firme opinião de que é real a
inferioridade ou passividade africana herdada pelos
descendentes no Brasil. Nasce ainda a afirmação da
marginalidade do negro numa estrutura de pensamento
tautológica que os vê como uma população vulnerável
porque eram escravos e chegaram a essa condição
por serem africanos que não tiveram condições de se
impor ao traficante. Assim é com certa facilidade com
que ouvimos falar dos produtos culturais africanos e
afro-brasileiros dissociando-os de seu aspecto político
e cientifico pois foi nos ensinado que eles não eram

10
agentes de sua própria história.

Segundo um ditado africano “enquanto a


história da caça ao leão for contada pelos caçadores,
os leões serão sempre perdedores” Quando quando
mudamos o olhar e passamos a questionar a “história
única” contada pelo caçador passamos a perceber
que esse pensamento tautológico tem como função
reafirmar um discurso ocidental branco. Talvez seja
importante então perguntar como esse africano
escravizado deve condições de manter várias
estruturas culturais ao ponto de serem facilmente
reconhecidas hoje? Como uma estética sobreviveu?
Como a religiosidade se manteve e reestruturou em
solo brasileiro? Como o negro conquistou voz pela
literatura e música? Como assumiu lugares públicos e
como se fez ouvir ao ponto de gerar a Lei 10.639/03?

Algumas pequenas distinções feitas no


discurso cotidiano nos mostram o caminho por onde
o preconceito se mantém e eterniza o raciocínio
tautológico descrito acima, por exemplo: 1. ser
vulnerável é diferente de estar em condição de
vulnerabilidade. A primeira forma nos conduz a uma
estrutura imutável e a segunda reflete um estado
atual. O mesmo procedimento ocorre quando ao invés
de pensarmos em pessoas escravizadas pensamos
em escravos ou peças – como ainda se usa em obras
sobre a escravidão – pois uma condição política e
econômica determina a existência de um indivíduo.
Num procedimento metonímico um africanidade vista
de forma pejorativa foi disseminada pela diáspora.

Olharmos a umbanda ou o candomblé, por exemplo,


apenas sob a perspectiva religiosa significa retirar destas

11
seu componente político e visualizar o “permitido”
pelo colonizador; é operar apenas com o produto
em si – o ritual. Ao questionarmos seu surgimento e
manutenção nos deparamos com códigos e estruturas
políticas, com uma cosmogonia própria e um sistema
filosófico que agregando elementos advindos do
contato com o outro definiram um lugar de resistência
e um espaço político. Talvez, e apenas sugerimos, os
produtos culturais (teatro negro, literatura, música,
religiões afro-brasileiras ...) sejam apenas reflexos com
maior visibilidade de embates políticos e estratégias
de sobrevivência em meio a uma sociedade racista e
excludente.

Uma das melhores demonstrações desses


embates é a Lei 10.639/03. A promulgação e
implementação são resultantes de um longo percurso
de lutas envolvendo diferentes setores ligados direta ou
indiretamente ao Movimento Negro. Mas é importante
pensarmos nesta lei também como um indício ou
sintoma do processo de exclusão e negação a que a
população afro-descendente foi submetida bem como
a indígena – contemplada pela Lei 11.645/08. Por qual
motivo se fez necessário obrigar o ensino da história e
cultura afro-brasileira e indígena? Não deveriam eles
compor a história do Brasil? Essa é a questão. Antes
das leis os conteúdos abordavam apenas uma parte
da trajetória dessas populações e como resultado na
maioria das vezes o caçador saia vitorioso.

Os artigos que compõem o presente livro


são resultado das pesquisas elaboradas a partir de
leitura e debates em aulas presenciais e a distância
no curso de pós-graduação lato sensu UNIAFRO:
Política de promoção da igualdade racial na escola.

12
Utilizando diferentes suporte e fontes foram focadas
as africanidades em suas práticas cotidianas, nas
reflexões intelectuais e nos ambientes educacionais.
Cada um dos temos procurou trazer para o debate
acadêmicos questões locais que revelam problemas
globais/brasileiros.

A leitura da presente obra é importante


por comportar dados e informações referentes as
temáticas negras, por partilhar experiências, por
revelar possibilidades de diálogo e, acima de tudo,
por contribuir para minimizar o desconhecimento a
respeito das formas de autoinscrição da população
negra no Brasil. Tratam-se de trabalhos que ao revelar
os embates e estratégias desta população trabalha por
uma educação mais igualitária e libertadora.

Profa. Dra. Ana Mónica Lopes

Professora do Departamento de História (UFOP)

Coordenadora do NEABI-UFOP (2015/2016)

13
APRESENTAÇÃO

A presente publicação é um dos resultados


do Curso de Especialização UNIAFRO: política de
promoção da igualdade racial na escola, ofertado
pelo Departamento de Letras da Universidade
Federal de Ouro Preto (DELET/UFOP). Essa
iniciativa é fruto de um Convênio firmado entre
esta Instituição de Ensino Superior e o Ministério
da Educação (MEC), a Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão
(SECADI), a Diretoria de Políticas de Educação do
Campo, Indígena e para as Relações Étnico-Raciais
(DPECIRER) e a Coordenação-Geral de Educação
para as Relações Étnico-Raciais (CGERER), Processo
nº 23000.017995/2013-76.

Esse Curso de Especialização foi coordenado


e executado como uma das ações do Núcleo de
Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (NEABI-UFOP).
Não apenas o tema é de relevância como também a
proposta do curso foi uma forma de implementação
das Leis 10.639/03 e 11.645/08, ambas alterações da
LDB/96 que instituem o ensino da História e Cultura
Africana e Afro-Brasileira bem como a História e
Cultura Indígena nas instituições de educação básica
e cursos de licenciatura do Ensino Superior.

O NEABI-UFOP já vinha desenvolvendo cursos


presenciais de extensão dentro da temática e o Curso
de Especialização UNIAFRO foi uma oportunidade de
sedimentar o trabalho que já vinha sendo desenvolvido,
além de ampliar a atuação dos cursos oferecidos pelo
núcleo. Nesse curso, especialmente, deu-se ênfase às

14
questões das africanidades e suas diásporas, com o
objetivo primeiro de promover a educação antirracista
no âmbito da educação básica e superior, visando a
preservação e o empodeiramento da cultura material
e imaterial afrodescendente no Brasil.

Este livro apresenta textos que foram Trabalhos


de Conclusão de Curso (TCCs) apresentados por
nossos alunos como um dos requisitos para aprovação
no curso. É uma iniciativa de publicação pensada
para proporcionar uma primeira publicação científica
e acadêmica para muitos deles. É um registro que
marca, também, o esforço, o empenho e a dedicação
do seleto grupo de professores-orientadores.

O livro está organizado em duas partes: uma


primeira que trata da “Educação das relações étnico-
raciais” e uma segunda que privilegia textos com
uma abordagem voltada para as questões da “Lei
10.639/2003: avanços e desafios”.

Destacamos que as opiniões expressas neste


livro são de responsabilidade de seus autores e não
representam necessariamente a posição do Ministério
da Educação ou do Governo Federal.

Aline Ruiz de Menezes (NEABI/UFOP)

Clézio Roberto Gonçalves (NEABI/UFOP)

Kassandra da Silva Muniz (NEABI/UFOP)

15
Parte I:
Educação
das relações
étnico-raciais
16
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NA EDUCAÇÃO
INFANTIL: REFLEXOS DA ABORDAGEM CUR-
RICULAR E DAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA
PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL

Juliana da Conceição Silva (UFOP/UNIAFRO)1


Ana Luiza Pinheiro Flauzina (Orientadora)2
Resumo
Essa pesquisa visou analisar o tema das relações
étnico-raciais como forma de promover a igualdade
racial, observando como a escola retrata a diversidade
na educação infantil. Mais especificamente, pautou a
forma como os currículos escolares reproduzem padrões
elitistas, invisibilizando temáticas e experiências
relacionadas à população negra. O trabalho foi
realizado a partir de uma análise metodológica
bibliográfica, de cunho qualitativo.Consideramos que
a proposta apresentada é pertinente para a discussão
das relações raciais na educação infantil, visto que a
literatura traz uma abordagem restrita em torno do
currículo e das práticas pedagógicas diversificadas.
Palavras-chave: Educação Infantil, Relações Étnico-
Raciais, Currículo.
Introdução
Atualmente muito se tem discutido sobre
relações étnico-raciais na educação, pois é por meio
da interação com a diversidade que analisamos a
prática pedagógica do professor e a forma como as
crianças convivem com a diferença. Nesse sentido,
tem sido exigida uma participação efetiva de todos os
1-Universidade Federal de Ouro Preto, Curso de Especialização UNIAFRO: promoção
da igualdade racial na escola.
2-Doutora em Direito pela American Univeristy. Professora Orientadora deste
Trabalho de Conclusão de Curso de Especialização.

17
sujeitos envolvidos no processo ensino-aprendizagem,
incluindo professores, gestores, alunos e pais.
Pensar em uma escola com uma abordagem
diferente da tradicional levantou questionamentos
sobre trabalhos que podem ser desenvolvidos com
relação à questão da diversidade dentro da sala de
aula. Em especial, o posicionamento de professores e
alunos frente à essa questão é um ponto a ser discutido
e pesquisado.
Entende-se que a importância de se respeitar
as diferenças deve ser apresentada aos alunos desde
os primeiros anos de escolaridade, lembrando-se
que a discussão em torno das relações étnico-raciais
é um tema novo na educação, tanto para os alunos
quanto para os professores. Tendo em vista o fato dos
alunos se encontrarem na fase inicial do processo de
aprendizagem, isso possibilita uma maior abertura para
a apreensão do conteúdo, sendo vital uma exposição
a abordagens que tratem a questão étnico-racial a
partir de parâmetros que visem o empoderamento da
população negra.
Dessa forma, pesquisar como o tema é
desenvolvido nas escolas e levantar dados que
mostrem a importância dessa discussão na educação
infantil faz-se premente para aruptura de um padrão
que não reconhece a relevância da temática. Essa
tendência pode ser observada, por exemplo, pelo
fato dos conteúdos relacionados as relações étnico-
raciais serem, muitas vezes, trabalhados nas escolas
somente em contextos específicos, tais como o dia da
consciência negra. Há portanto, que se reposicionar a
forma como se lida com essa questão, impulsionando-
se uma mudança de postura por parte das instituições
e dos professores.
A presente investigação espera, portanto,
18
sustentar uma perspectiva de que a postura assumida
no contexto da educação infantil no que tange à
igualdade racial e social é vital para que as crianças
possam crescer com a ideia de que a diferença é o que
faz de nós importantes. A abordagem dessa temática
no período da educação infantil é especialmente
relevante, pois, apesar de receberem outros estímulos e
influências, os alunos ainda não possuem estereótipos
consolidados, facilitando o processo de sensibilização.
Ressalta-se que a educação infantil possui
um papel expressivo para o desenvolvimento
humano, para a formação da individualidade e para
a aprendizagem. Dessa forma, existe a necessidade
de uma discussão ampla e diversa em torno das
relações sociais, principalmente no que tange as
relações étnicas, pois há uma necessidade dessa
amplitude, mas primeiramente deve-se investir na
formação pedagógica, para que os educadores estejam
preparados para discutir a diversidade na sala de aula
de forma segura e positiva (TELES, 2009).
Sabe-se que o educador é a peça chave para que
a criança desenvolva sua autonomia e construa sua
identidade, pois essa ocorre no processo de ensino-
aprendizagem, devendo-se sempre respeitar os
limites e as possibilidades de cada um. Sabemos que
as crianças trazem de casa suas vivências e devemos
considerá-las como parte importante para nortear os
objetivos educativos.
Em suma, quer-se ressaltar o fato de que os
primeiros anos da educação infantil servem de base
para o desenvolvimento das relações sociais das
crianças. É nessa fase em que elas começam a interagir
com os colegas. Nasce, dessa forma, a necessidade de
um conhecimento amplo de algumas relações sociais

19
possíveis, principalmente as relações étnicas. Para
isso, é necessária a formação dos profissionais da
educação para lidar e trabalhar com essas questões.
Assim, nesse processo vale destacar que:
A escola, enquanto instituição social responsável
pela organização, transmissão e socialização do
conhecimento e da cultura, revela-se como um dos
espaços em que as representações negativas sobre o
negro são difundidas. E por isso mesmo ela também é
um importante local onde estas podem ser superadas
(GOMES, 2003, p. 77).
Nesse sentido, será pesquisado o desenvolvimen-
to do tema das relações étnico-raciais na educação
infantil, problematizando-se se os professores estão
preparados para a abordagem dessa temática. Mais
especificamente, trataremos da questão do currículo
escolar como instrumento de reprodução de estrutu-
ras de poder, inclusive as de caráter racial, e da forma
como a temática deve ser inserida no nível da educa-
ção infantil.
O currículo e a diversidade cultural
Segundo Silva (2007), o currículo tornou-se
campo de estudo nos Estados Unidos, no período
pós-guerra, em que aconteceu a grande expansão
industrial. Tal processo desencadeou uma grande
onda de imigração para as metrópoles em busca de
trabalho. Essa dinâmica interferiu diretamente no
sistema educacional, gerando grande necessidade de
reformulação do processo educativo vigente. De acordo
com o autor, pensou-se então num currículo voltado
para a formação a partir das exigências do mercado de
trabalho. Já nesse período, surgem contestações a esse
modelo pautando-se a necessidade da superação de
um paradigma que fixa um currículo desinteressado

20
dos aspectos sociais e culturais, em especial no que
tange as questões de cunho étnico-raciais.
Desde então, o campo do currículo passa
constantemente por lutas e conflitos envolvendo
os objetivos da educação. Este artefato social atua
como um caminho e uma sequência de conteúdos,
influenciando, portanto, o estabelecimento de regras
e disciplinas. Apesar dos muitos debates travados, fica
claro que a produção curricular carrega ainda um
perfil elitista afastando a discussão da diversidade.
Aqui, é importante lembrar que houveram
várias mudanças na educação na década de 1960,
caracterizada pela intensa agitação de vários
movimentos sociais e culturais. Nesse período, foi
pensado o movimento de renovação do currículo
educacional, com diferentes discussões teóricas.
Entendia-se que o modelo tradicional do currículo
não se preocupava com a prática, mas apenas
com a tecnicidade do mesmo. Ou seja, os padrões
conservadores da educação estavam pautados num
currículo sem maiores densidades que conseguisse de
certa forma direcionar o ensino no ambiente escolar.
(SILVA, 2007).
Insurgindo-se contra esse modelo, as teorias
críticas surgiram como um campo atento às
transformações sociais, pautando o papel curricular
na sociedade.
No bojo desse processo transformador, surge, no
início dos anos 70, um movimento de reconceptua-
lização curricular. De acordo com as teorias sociais
envolvidas no debate, eram necessárias mais pesqui-
sas e um maior desenvolvimento das que já existiam
para a ampliação dos conhecimentos sobre a temáti-
ca. O movimento de reconceptualização observou em
particular a necessidade de transformações curricu-
21
lares atendesse à diversidade, afastando-se do mode-
lo tradicional que tendia a afirmar a homogeneidade
funcional ao capitalismo. Além disso, destacava-se a
importância da humanização dos processos escolares,
por se tratar de um exercício para a formação de su-
jeitos éticos no exercício da cidadania (SILVA, 2007).
No debate contemporâneo, o currículo passa
a ser entendido como uma trajetória que o sujeito
percorre. Esse caminho é organizado e disponibilizado
de acordo com a sequência dos acontecimentos
escolares. Porém, essa ordem não é a mesma para
todos, pois a forma com que as pessoas encaram a
trajetória curricular é diferente. Nessa perspectiva,
pode-se visualizar o currículo como um mecanismo de
formação da autonomia. Assim, por exemplo, quando
se discute a importância de trabalhar a autobiografia,
está se apresentando a necessidade de se lidar com
todos os acontecimentos no decorrer da vida cotidiana
do sujeito, como um processo auto transformativo,
em que a observação da vida escolar, vida social e o
desenvolvimento intelectual e profissional influenciam
a transformação social (PINAR, 2002).
Considerando-se esse panorama, de acordo com
a teoria de Berstein, o fracasso escolar dos grupos
subordinados está claramente imposto pelas regras
ou códigos que são propostos pela escola e baseados
em uma cultura específica, a cultura dominante. O
sucesso do currículo depende do contexto social e
cultural do sujeito, estando a realidade das classes
subalternizadas na contramão do que está expresso nos
currículos. Segundo o autor, em consequência disso,
facilita-se a evasão do processo educacional, já que,
os segmentos sociais marginalizados não conseguem
uma interação com as questões e conhecimento

22
que são disponibilizadas pela escola devido à
descontextualização de seu cotidiano (BERSTEIN,
1996).
Para Althusser, os dilemas em torno do currículo
educacional estão fundamentados numa construção
ideológica, em que o currículo é um artefato social
reprodutor das classes dominantes. A escola, portanto,
opera como um campo de repetição das relações
sociais e o currículo acaba refletindo o funcionamento
delas: limita-se o que o estudante deve aprender,
desconsiderando-se a importância da formação de
um sujeito autônomo com atitudes de liderança
(ALTHUSSER, 1985).
O autor observa que o currículo é construído
dentro de uma ideologia materializada, como, por
exemplo, a construção dos livros didáticos para as
camadas populares, que destacam a posição social
dos sujeitos, colocando-os em nível de desigualdade
no processo educacional. Porém, segundo Althusser,
há uma crença de que aquilo transmitido pela escola
é o melhor para esses estudantes. Nessa concepção,
portanto, a educação, fundamentalmente, reproduz o
pensamento da classe dominante, num processo de
expropriação social e intelectual dos segmentos sociais
vulneráveis (ALTHUSSER, 1985).
Apesar da concepção ainda predominantemente
elitista desse material, sabe-se que a escola é formada
por sujeitos que possuem diferentes aspectos culturais
e que trazem para esse espaço suas experiências. Para
que haja respeito à diversidade cultural, é necessária
uma organização do conhecimento, gerida através da
preservação do diálogo entre as diferenças, a fim de que
das relações sociais construam saberes significativos
em que todos tenham a mesma oportunidade de

23
ascensão social.
Para isso, o currículo deve deixar de ser
classificatório e estruturalista, abrangendo a
diversidade, tendo em vista do fato da heterogeneidade
permitir a construção de subjetividades plurais. A
fim de que isso possa repercutir positivamente, esse
deve ser construído de forma democrática, para que
sua produção e a reprodução sejam constituídas a
partir das experiências dos sujeitos na sala de aula
(MOREIRA e CANDAU, 2003).
Moreira e Candau (2003) afirmam que, no
campo que desenvolve pesquisas sobre emancipação
cultural, há um grande esforço em reconhecer a
diversidade e as diferenças no ambiente escolar. Para
que isso ocorra, é necessário que haja a superação de
uma suposta homogeneidade entre os sujeitos, para
que o valor das diferenças culturais seja expresso
nos processos educacionais. Segundo os autores, um
dos fatores importantes a ser pensado a fim de que a
diversidade dos alunos seja considerada, é a formação
dos professores.
Nesse tocante, é importante reconhecer que há
uma grande dificuldade de se trabalhar as relações ét-
nicas no ambiente escolar. A fim de que a emancipa-
ção cultural possa se concretizar, o primeiro obstáculo
está firmado na formação crítica dos profissionais para
lidar com a diversidade. Assim, cabe aos docentes, de-
vidamente qualificados para tal fim, a tarefa de se re-
pensar a escola como um ambiente de interação entre
diversos sujeitos, propondo a validação da diversidade
cultural, em especial no que tange à valorização da
cultura negra.
Nesse sentido Gomes (2003) afirma que:
...isso requer um posicionamento.

24
Implica a construção de práticas
pedagógicas de combate à
discriminação racial, um rompimento
com a “naturalização” das diferenças
étnico/raciais, pois esta sempre desliza
para o racismo biológico e acaba por
reforçar o mito da democracia racial.
Uma alternativa para a construção
de práticas pedagógicas que se
posicionem contra a discriminação
racial é a compreensão, a divulgação
e o trabalho educativo que destaca a
radicalidade da cultura negra. Essa
é uma tarefa tanto dos cursos de
formação de professores quanto dos
profissionais e pesquisadores/as que já
estão na prática (GOMES, 2003, p. 77)
Indubitavelmente, uma das maiores
problemáticas nessa seara, é fazer com que as
identidades culturais sejam preservadas nos currí-
culos. A relação e o conjunto de diversas culturas,
especialmente as dos grupos sociais marginalizados,
devem ser levadas em consideração nesse processo.
Segundo os autores, ao analisar esse aspecto, o multi-
culturalismo aparece como um meio de combate à de-
sigualdade expressa pelo currículo escolar, destacan-
do igualmente as contribuições de todos os segmentos
sociais (MOREIRA e CANDAU, 2003).
As influências desse aporte teórico têm sido
sentidas principalmente na seara das políticas de
inclusão, visto que são ações que visam a diminuição
das desigualdades na educação.
Nesse sentido, destaca-se a importância da
implementação da Lei 10.639/03, uma alternativa
de inserir a discussão étnico-racial nas escolas,
especialmente na educação infantil e nas séries

25
iniciais do ensino fundamental. Enfatiza-se ainda a
necessidade de um trabalho mais dinâmico e interativo
nos ensinos fundamental II e médio visto que os
alunos estão adquirindo conhecimentos diversos para
o exercício mais efetivo da cidadania.
Para Caetano e Nascimento (2011):
“É válido ressaltar que, a Lei 10.639/03,
assim como suas diretrizes, surge
como caminho favorável ao combate
à discriminação e ao preconceito que
há séculos ocupam grande espaço
nas nossas instituições escolares,
estruturadas a partir do pensamento
social nacional, provido de valores
e categorias desiguais em relação
à condição humana” (CAETANO e
NASCIMENTO, 2011, p. 88).
Assim, sabemos que a lei 10.639/03 foi de suma
importância para o reconhecimento da temática, já
que o currículo ressalta de forma restrita os interesses
da diversidade, em especial no que tange às questões
relativas à população negra. De uma forma geral, o
debate sobre os temas caros aos alunos negros e negras
não estão pautados de forma adequados, resumindo-
se a sua exploração em datas comemorativas pontuais.
Com isso, não se discute a importância e toda influência
da cultura africana para o nosso país.
Se, como já afirmado anteriormente, a
assimilação dos conteúdos referentes à história e à
cultura africana e afro-brasileira são de interesse
em todos os níveis de escolarização, é na educação
infantil que se dão as primeiras oportunidades de se
pautar a temática de forma adequada, atentando para
a consolidação de uma visão de mundo baseada na
igualdade desde o início da formação do indivíduo. Por

26
essa razão, faz-se oportuno discutir a forma como se
deve pautar a temática nessa seara.
Como discutir as relações etnicorraciais na
educação infantil
Existe, no ambiente escolar, interações entre
identidades diferentes. Ressalta-se, dessa forma, a
necessidade de se refletir sobre as relações étnico-
raciais na educação infantil, pois esse é o momento
em que as crianças começam a estabelecer relações
fora do contexto familiar. Nesses espaços de interações
sociais, as crianças se identificam com os estímulos
ofertados pelo contato com a realidade na construção
de sua identidade. Como Teles explica:
“[...] tanto as crianças negras
como as brancas não nascem com
um sentimento negativo, ligado a
inferioridade sobre a população negra,
mas constroem o significado que o
sujeito negro tem no nosso meio social,
com bases nas construções históricas
e sociais já estereotipadas em nossa
sociedade” (TELES, 2009, p. 2).
Nessa fase da vida das crianças é crucial uma
intervenção positiva em prol da valorização da
diversidade, a fim de formar cidadãos sem preconceito,
capazes de aceitar as diferenças com naturalidade. Se
esse processo tiver início na educação infantil, não
haverá necessidade de lutar e desconstruir uma ideia
negativa sobre a população negra posteriormente.
Dentro desta perspectiva, entendemos
que a identidade e a consciência da
criança negra estão sendo constituídas
por valores sociais sobre o negro que
circulam primeiramente na sociedade
e que depois passam a fazer parte de

27
seus próprios valores no processo de
interação social (TELES 2009, p.3).
De acordo com Teles (2009), ao se analisar o
ambiente da educação infantil, é fundamental lembrar
que essa é uma fase essencial para o desenvolvimento
humano, visto que os conhecimentos adquiridos terão
grande influência para o desenvolvimento futuro
da criança, requerendo-se empenho por parte dos
docentes para a utilização de práticas pedagógicas
consistentes e inovadoras no enfrentamento ao
racismo:
Para obter êxito, a escola e seus
professores não podem improvisar.
Têm que desfazer mentalidade
racista e discriminadora secular,
superando o etnocentrismo europeu,
reestruturando relações etnicorraciais
e sociais, desalienando processos
pedagógicos. Isto não pode ficar
reduzido a palavras e a raciocínios
desvinculados da experiência de ser
inferiorizada vivida pelos negros,
tampouco das baixas classificações
que lhe são atribuídas nas escalas de
desigualdades sociais, econômicas,
educativas e políticas (BRASIL, 2004
P.15).
Nesse sentido, vale destacar que é importante
que as crianças tenham uma representação positiva
de sua imagem, assim Teles (2009), coloca que:
A criança que internaliza essa
representação negativa tende a não
gostar de si própria, o que leva a
procurar valores e características
brancas. As crianças negras, no
ambiente escolar, têm muitas razões

28
para odiar sua cor, pois esta não é,
em nenhum momento vista, notada
ou ao menos valorizada, ao contrário
da branca que é majoritariamente
bem representada nesse mesmo local.
Podemos ter nesse momento o início da
construção de uma identidade branca,
mas que não pertence à criança negra,
assim acreditamos que presenciamos
ao final do processo de internalização,
o seu resultado que é o ideal do
branqueamento, uma identidade
deteriorada, que se configura através
da negação de qualquer semelhança
com indivíduos negros (TELES, 2009,
p. 8).
Assim, forja-se um ambiente propício para que as
crianças negras rejeitem a própria imagem, pois a falta
de valorização e representação da identidade negra no
ambiente escolar desempodera esse segmento. Além
disso, o currículo afirma esse processo, internalizando
de forma direta e indireta uma realidade que valoriza
e vangloria apenas um grupo social, associado aos
ideais da branquitude.
Tendo em vista esse tipo de padrão discriminatório
recorrentemente reproduzido nos círculos escolares,
é fundamental o engajamento da docência da quebra
desse paradigma conservador, já que “... o trabalho
pedagógico com questões étnico-raciais é importante
para auxiliar os educandos a compreender que a
diferença entre indivíduos, povos e nações é saudável
e enriquecedor”. (SILVA e PALUDO, 2011, p.3).
Essa perspectiva permite afirmar que, nos
meandres da educação infantil, faz-se necessário
atentar tanto para as relações estabelecidas entre
professores e alunos; para o currículo trabalhado em
sala de aula; e para a própria formação docente, como
requisitos fundamentais para a estruturação de uma

29
ambiência adequada ao desenvolvimento de práticas
pedagógicas associadas as pautas de igualdade e da
justiça.
Conclusão
O presente trabalho discutiu possíveis formas
de valorização da diversidade cultural no currículo,
lançando um olhar crítico sob as possibilidades de
construir uma educação de qualidade, em que os
sujeitos atuem de maneira autônoma, em busca da
superação da desigualdade e da desvalorização da
classe dominada, em especial a população negra, em
que a prática escolar esteja voltada a um contexto
social diversificado.
O currículo deve ser refletido como um
campo de construção social, em que o foco não seja
apenas o conteúdo, mas sim o contexto social, o
sujeito e a diversidade cultural. Nessa perspectiva
é possível a formação de uma sociedade igualitária,
já que o processo de ensino/aprendizagem está em
conformidade com as necessidades do meio social.
Contudo, faz-se necessário que os educadores
tenham uma formação crítica, para que atuem sob a
perspectiva de repensar suas práticas a favor de uma
sociedade democrática, sejam capazes de reconhecer
a diferença, assentar-se na centralidade cultural e
contribuir para a construção da igualdade.
No decorrer da pesquisa, analisou-se o processo
de socialização do conhecimento da criança.
Nesse processo de socialização que a
criança constrói sua identidade, pois o
espaço da educação infantil possibilita
as interações entre as crianças e
os adultos e a convivência com as
diferentes culturas presentes na
sociedade. No entanto, dependendo de
como é tratada a diferença, ela poderá

30
contribuir para o reconhecimento
do outro e para a constatação das
diferenças como algo a ser valorizado
(TELES, 2009, p.4).
O trabalho com ações que possibilitem a discussão
da diversidade na infância é imprescindível para
formação da identidade das crianças e a valorização
das diferentes culturas. Faz parte do papel de todos
os profissionais da educação educar a favor de uma
sociedade justa e sem preconceitos. Dessa forma, será
possível pensar em uma escola que possa romper toda
e qualquer atitude discriminatória.
Reconhecimento implica justiça e
iguais direitos sociais, civis, culturais e
econômicos, bem como valorização da
diversidade daquilo que distingue os
negros dos outros grupos que compõem
a população brasileira. E isto requer
mudança nos discursos, raciocínios,
lógicas, gestos, posturas, modo de tratar
as pessoas negras. Requer também
Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação das Relações Étnicos
Raciais e para o Ensino de História e
Cultura Afro-Brasileira e Africana que
se conheça a sua história e cultura
apresentadas, explicadas, buscando-se
especificamente desconstruir o mito
da democracia racial na sociedade
brasileira; mito este que difunde
a crença de que, se os negros não
atingem os mesmos patamares que os
não negros, é por falta de competência
ou de interesse, desconsiderando
as desigualdades seculares que a
estrutura social hierárquica cria com
prejuízos para os negros (BRASIL,
2004, p. 11).

31
Em suma, cabe aos profissionais da educação
interpretar as diferentes linguagens da criança, a
fim de criar estratégias e ações favoráveis, capazes
de desconstruir as visões estereotipadas acerca das
relações étnico-raciais, para que as crianças possam
estar em um mesmo nível de valorização, em que não
há relação de poder e legitimação de uma cultura
apenas, para que a escola seja um espaço que acolha
a diversidade.
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33
RACISMO NO AMBIENTE DE UMA ESCOLA PÚ-
BLICA DO MUNICÍPIO DE RAUL SOARES (MG)

Maria Carmem Vieira Verissimo Fioravante (UFOP/UNIAFRO)1


Carmen Regina Teixeira Gonçalves (Orientadora)2

Resumo
Este artigo tem por objetivo descrever uma
pesquisa realizada na Escola Municipal Coronel “João
Domingos” cujo objetivo é verificar como a escola e
também os educadores, lidam com as questões e os
processos discriminatórios presentes no espaço escolar
de uma escola pública do Município de Raul Soares.
Neste estudo foi feito uma revisão bibliográfica com
autores que são referência na temática étnico-racial.
A metodologia utilizada foi entrevista com análise
de dados junto a alunos do 8º e 9º Ano e professores
atuantes no Ensino Fundamental. Através da análise
dos dados apurados, pôde-se notar que grande parte
dos docentes revela uma posição de retraimento
às questões referentes ao racismo, principalmente
quando acontece em sala de aula.
Palavras-chave: Discriminação Racial, Educação,
Racismo, Preconceito.
Introdução
Esta pesquisa teve por objetivo entender como
os alunos do 8º e 9º Ano e professores de uma escola
pública, localizada no Município de Raul Soares –
Minas Gerais, lidam com as diferenças étnico-raciais
e as práticas de racismo no espaço escolar.
Os brasileiros evidenciam-se por uma
1-Universidade Federal de Ouro Preto. Curso de Especialização UNIAFRO:
promoção da igualdade racial na escola.
2-Professora orientadora deste trabalho de conclusão de curso de especialização.

34
diversidade étnico-racial sendo esta, resultado de um
processo histórico que incluiu, numa mesma cena,
grupos diversos: negros africanos, povos indígenas,
portugueses (majoritariamente) e outros povos. Esse
encontro possibilitou a comunicação dessas culturas,
transpondo para a formação de um país obviamente
mestiço, com diversas faces, marcado pela pluralidade.
A instituição de ensino, como espaço social,
é responsável por uma parte da socialização
dos indivíduos e, assim, é por meio dela que
também se firmam relações com a diversidade e,
impreterivelmente, com diversas culturas. Esse
encontro entre diferentes poderá tornar a instituição
de ensino um dos espaços de convivência das tensões,
dentre tantas, principalmente as raciais. A relação
determinada entre alunos brancos e negros numa
mesma sala de aula pode se estabelecer de maneira
tensa, ou melhor, discriminando, afastando, excluindo,
e assim o aluno negro poderá não se destacar, por
receio de não ser aceito ou ser ridicularizado pelos
colegas.
As manifestações de discriminação no espaço
escolar contradizem a expressão comum de que o
estabelecimento de ensino é o local da expressão e
relações de igualdade. A escola é tida como um local
de fortalecimento da cidadania, à formação para a
capacidade crítica, à preparação para o mundo do
trabalho, porém também é vista como um espaço de
exclusão racial.
A discriminação racial pode ser vista como a
prática do racismo e a confirmação do preconceito.
Enquanto o preconceito e o racismo encontram-se no
campo das doutrinas e dos julgamentos, da compre-
ensão de mundo e das doutrinas, a discriminação é a

35
adoção de práticas que os efetivam. Precisamos tomar
cuidado, porém, para não considerar a discriminação
como produto direto do preconceito. Esse tipo de con-
sideração possui grande aceitação no Brasil. Segundo
Maria Aparecida Silva Bento Teixeira (1992: 21), ele é
fruto do mito da democracia racial onde se diz: “como
não temos preconceito racial no Brasil, aqui não temos
discriminação racial”. Para essa autora, neste modelo
de preconceito que causa discriminação notamos a
ênfase que recai sobre o indivíduo como portador de
preconceito, como a fonte que gera a discriminação.
Porém, a questão do racismo no Brasil é um problema
social e não se restringe ao indivíduo.
Partindo da hipótese de que a prática
preconceituosa e racista do professor, frente a um
aluno negro pode ter como um de seus efeitos o
fracasso nos estudos, é que se coloca a questão que
orienta este estudo. Como os alunos e professores em
geral do 8º e 9º Ano do Ensino fundamental de uma
escola pública lidam com as diferenças étnico-raciais
e o racismo no espaço escolar?
Escolheu-se este tema de pesquisa, devido a
relevância em analisar um assunto que merece ser
debatido e estudado no que se refere às possíveis
maneiras de tentar resolver ou pelo menos diminuir
a discriminação na escola, uma prática que tem
proporcionado graves consequências no sistema de
ensino e aprendizado de crianças que, muitas vezes,
terminam sendo vítimas de outros que se sentem
superiores, a ponto de praticar esse ato denominado
racismo que é o convencimento sobre a superioridade
de certas raças, com base em várias motivações,
principalmente os traços físicos e outras características
do ser humano.

36
Objetiva-se também, com este trabalho,
pesquisar e investigar as práticas de preconceito
e racismo por parte dos discentes e educadores
no espaço escolar, verificar a necessidade de uma
educação multicultural que diminua as manifestações
de racismo e discriminação que acontecem com os
alunos negros e investigar a conduta do professor no
que se refere à pluralidade cultural.
A escolha da escola se deu pelo fato da facilidade
em desenvolver a pesquisa, pois tanto os alunos quanto
os professores se mostraram a favor da realização da
mesma, pela pluralidade étnico-racial existente, os
muitos conflitos raciais encontrados, a necessidade de
intervir em algumas situações de preconceito surgidas
em algumas salas de aula e também por trabalhar
nesse local. A realidade socioeconômica de muitos
estudantes se destaca na dificuldade de aprendizado e
ausência dos responsáveis no desenvolvimento escolar
dos alunos.
Muitas vezes os alunos negros que são vítimas
das práticas de racismo, não percebem (ou fingem não
perceber) o quanto estão sendo discriminados. Devido
a este problema, o estudo se faz importante, pois
procura destacar as consequências que as práticas
racistas ou impassíveis frente ao racismo trazem para
o ensino e aprendizado e também para a vivência em
sociedade.
Fundamentação teórica
Preconceito racial não é algo tão simples,
especialmente nas escolas, que sempre foram vistas
como um espaço democrático e como tal não deveria
existir distinção e discriminação.
De acordo com Munanga (2008) o preconceito
étnico-racial se tornou parte de nossa conduta coti-
37
dianamente. Sempre presenciamos atos preconceitu-
osos, seja em expressões verbais, atitudes ou manifes-
tações. A sala de aula não se livra disso. Lidar com
esse assunto, ou também com a não tolerância, não
está nas atividades mais fáceis do educador. Mas não
são assuntos novos.
Nota-se que o ato preconceituoso pode acontecer
de muitos modos e em diversos locais, mas quando
acontece na escola, os efeitos podem ser grandes e
necessitam um estudo profundo em se tratando da
função da escola frente os assuntos raciais, pois como
menciona Ribeiro; Marques; Ribeiro (2003: 93):
A escola não pode continuar a desen-
volver o papel de agência produtora
de mão de obra. Seu objetivo princi-
pal deve ser formar o educando como
homem humanizado e não apenas
prepará-lo para o exercício de funções
produtivas, para ser consumidor de
produtos, logo, esvaziados, alienados,
deprimidos, fetichizados.
O preconceito racial pode se apresentar em
tantos aspectos como no dia-a-dia das escolas, no
trabalho, nos livros, etc. Quase sempre as escolas
fazem “vista grossa” para as circunstâncias que
mostram práticas discriminatórias, como no uso de
palavras preconceituosas, como: “serviço de preto”,
“a coisa tá preta”, “cabelo de Bombril” e outras.
De acordo com Cavalleiro (2003) a instituição
de ensino deve ser um espaço em que o aluno se
sinta acolhido, os afro-descendentes, assim como os
brancos, devem fazer parte das histórias infantis, não
camuflados como fazem algumas pessoas.
O modo de se referir ao afro descendente
causa intimidações que não deve ser admitido, visto

38
que as atividades da escola não podem ser julgadas
imparciais, livres de objetivos sejam positivos ou
negativos já que o contato com certas colocações são
uma grande complicação especialmente para quem
sofre a discriminação.
Gonçalves (1985) analisa que o preconceito
racial e a discriminação se expandem, nas escolas,
por meio de mecanismos ou funcionamento do ritual
pedagógico, entendido como a materialização da
prática educativa, vivida na sala de aula, a qual elimina
dos currículos escolares a história de luta dos negros
na sociedade brasileira.
É flagrante a ausência de um questio-
namento crítico por parte dos profis-
sionais da escola sobre a presença de
crianças negras no cotidiano escolar.
Esse fato, além de confirmar o despre-
paro das educadoras para relaciona-
rem com os alunos negros evidencia,
também, seu desinteresse em incluí-
-los positivamente na vida escolar. In-
teragem com eles diariamente, mas
não se preocupam em conhecer suas
especificidades e necessidades (CA-
VALLEIRO, 2000:35).
São muitas as situações e ocorrências que
levam o racismo a se perdurar na instituição de
ensino, considerando que os próprios livros didáticos
destacam em sua maioria os indivíduos brancos como
referência, e o negro é somente referenciado como
modelo de uma fase da história como o período da
escravidão do Brasil ou também para enaltecer alguns
indivíduos negros que se destacam em várias áreas,
como esporte e música, por exemplo. Porém, quase
nunca vemos referenciais científicos de pesquisadores

39
negros.
Como enfrentar a diversidade cultural em sala
de aula? É possível fugir de um modelo monocultural
de ensino? Poderão educadores incluir a igualdade de
oportunidades educacionais entre suas metas? Como
socializar, por meio do currículo e de procedimentos
de ensino, para atuar em uma sociedade de muitas
culturas? Esses desafios se mostram como: modo
de propor novas metodologias para o ensino de
estudos étnicos; reformulação de currículos e
espaços escolares, articulando cultura e identidade;
desempenho escolar e diversidade cultural; criar
ações que gerem oportunidades de sucesso escolar
para todos os educandos independentemente de sua
raça, seu grupo social, religioso, político e de gênero;
valorizar a importância da diversidade étnica e cultural
na configuração dos diferentes modos de vida.
Assim, é papel do educador verificar, a partir
de sua prática no cotidiano escolar, se acontece atos
de discriminação e racismo na escola, para, dessa
maneira, contribuir para a redução desses padrões de
exclusão, e como o educador é um formador de opinião
de adolescentes e crianças, precisa estimular o debate
em sala de aula sobre esses assuntos e apresentar a
diversidade das visões de mundo.
A concepção de escola sob o modelo
democrático
Para definir o que é escola entendendo que ela
possa ser conceituada como democrática, vale ressaltar
o projeto de escola que é nomeado por Paulo Freire
(1997) como Escola Cidadã, que surgiu em meio ao
movimento de manifestação de educação popular.
Designa-se comumente por “Escola

40
Cidadã” uma certa concepção e uma
certa prática da educação “para e
pela cidadania”, que, sob diferentes
denominações, são realizadas, em
diversas regiões do país, principalmente
em municipalidades onde o poder
local foi assumido por partidos do
chamado campo democrático-popular
(GADOTTI, 2003, p.23).
O maior objetivo da escola cidadã é cooperar
para a criação das condições para o aparecimento de
uma nova cidadania, como local de organização da
sociedade para a defesa e garantia de direitos.
Atividades de inclusão: quebrando o ciclo de
exclusão na escola
Educar pessoas para minimizar os problemas
causados pela discriminação é a função da Instituição
de Ensino. As ações necessárias e provisórias,
desenvolvidas pelo Estado ou pela iniciativa privada,
naturalmente, ou de modo obrigatório, com a
finalidade de acabar com as desigualdades vinculadas
a diversos grupos sociais, permitindo a igualdade de
oportunidades e tratamentos, assim como igualar
perdas ocasionadas pela diferenciação e segregação
quer sejam por motivos étnicos raciais, de gêneros,
religiosos, e outros.
Contra essa corrente, a primeira função da escola,
nessa perspectiva, é problematizar e desnaturalizar o
racismo que há em nossa sociedade. Essa percepção do
preconceito se torna possível por meio da tematização
das diferenças sociais, ocasionadas por um processo
histórico de discriminação dos negros como também
de privilégios para grupos sócio raciais dominantes
Preconceito, racismo e antirracismo

41
O racismo é um conjunto de teorias formuladas
onde o principal objetivo é reconhecer as desigualdades
biológicas entre as pessoas, em que alguns creem ser
melhores que as outras considerando sua raça.
Para Munanga (1999) como a maioria dos
conceitos, o de raça tem seu campo semântico e uma
dimensão temporal e especial. No latim medieval, o
conceito de raça passou a designar a descendência, a
linhagem, ou seja, um grupo de pessoa que têm um
ancestral comum e que, ipso facto, possuem algumas
características físicas em comum
No Brasil, a democracia racial é nitidamente
percebida como mito, ao observarmos os elevados
índices que mostram as desigualdade existentes. As
pesquisas mostradas por instituições como o IPEA
(Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e o IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) ambas
no período de 2012/2014, esclarecem sobre a grave
situação vivida pelos negros. E, a partir do momento
em que o país foi prosperando, uma convicção em
torno deste país começou a ser formada: o mito da
democracia racial, com efeito o povo brasileiro ainda
não vive numa democracia racial.
Com a substituição da ordem escravo-
crata por outra ordem hierárquica, a
“cor” passou a ser uma marca de ori-
gem, um código cifrado para “raça”. O
racismo colonial, fundado sobre a ideia
da pureza de sangue dos colonizadores
portugueses, cedeu lugar, depois da in-
dependência do país, a ideia de uma
nação mestiça (SKIDMORE, 1993, p.
48).
Desse modo, a discriminação racial na concep-
ção de Munanga (2006) é “qualquer distinção, ex-

42
clusão, restrição ou preferência em função da raça,
ascendência, origem nacional ou étnica”. Fernandes
(2005), ao estudar as questões raciais no país, assina-
lou que o povo brasileiro diz não ter preconceito, no
entanto, democracia racial é uma farsa. E ainda de
acordo com Fernandes:
(...) a sociedade brasileira largou o
negro ao seu próprio destino, deitando
sobre seus ombros a responsabilidade
de reeducar- se e de transformar-se
para corresponder aos novos padrões e
ideais de homem, criados pelo advento
do trabalho livre, do regime republicano
e capitalista (FERNANDES,1978: 20).
De certa forma podemos compreender a exclusão
do negro do cenário social como consequência direta
do processo de abolição da escravidão. Em outras
palavras, a inserção precáriado negro aconteceu
de forma lenta com a ocupação dos setores mais
subalternos na sociedade.
Possibilidades trazidas pela lei no 10.639, de 9
de janeiro de 2003
A Lei 10.639/2003 pode ser julgada um ponto
de chegada de uma história da população negra para
se ver descrita com o mesmo valor dos outros povos
que para aqui vieram, e um ponto inicial para uma
transformação social. Na educação, a confirmação
desta lei significou interrupção intensa com um tipo
de postura educativa que não identifica as diferenças
que resultam do nosso processo de formação nacional.
Para além do impacto positivo junto à população
negra, essa lei deve ser vista como desafio primordial
do conjunto das políticas que objetivam na melhoria
da qualidade da educação do país para todos. A

43
necessidade e a obrigação de integrar a Cultura Afro-
Brasileira e Africana nos currículos de Educação Básica
refere-se à resolução fomentada pela organização dos
movimentos negros na luta em reconhecer, valorizar o
negro e sua cultura. Além do mais, por acesso a bens
sociais, como também para a eliminação do racismo,
com grandes ressonâncias pedagógicas, também na
formação de educadores.
A Lei 10.639/03 e suas respectivas
diretrizes curriculares nacionais
podem ser consideradas como parte
do projeto educativo emancipatório
do Movimento Negro em prol de uma
educação antirracista e que reconheça
e respeite a diversidade. Por isso, essa
legislação deve ser entendida como
uma medida de ação afirmativa, pois
introduz em uma política de caráter
universal, a LDBEN 9394/96, uma
ação específica voltada para um
segmento da população brasileira com
um comprovado histórico de exclusão,
de desigualdades de oportunidades
educacionais e que luta pelo respeito à
sua diferença (LDBEN 9394/96,2007,
p.106).
A Lei 10.639/03 fortalece a luta em favor dos afro-
brasileiros e é consequência de uma luta antirracista.
Fazer vir aflorar os debates sobre o racismo é um
modo de não calar as mais variadas discriminações e
preconceitos presentes nas instituições educacionais,
além de favorecer relações mais democráticas.
Metodologia
Esta pesquisa foi realizada durante um período
de 31 dias, no mês de maio de 2015, com o objetivo

44
de verificar como alunos e educadores lidam com as
diferenças étnico-raciais e práticas de racismo no am-
biente escolar , como também contribuir na elabora-
ção de práticas educativas que objetivem combater a
desigualdade racial, com alunos, professores de uma
escola pública de Ensino Fundamental II, por consi-
derar que a escola, estando localizada no centro da
cidade, consegue agregar alunos de várias realidades
culturais, sociais e econômicas.
Os 120 alunos envolvidos na pesquisa corres-
pondem ao 8º e 9º ano do ensino fundamental II.
Também foram envolvidos na pesquisa 14 professores
de todos os conteúdos da escola pesquisada.
As idades dos alunos variam entre 13 e 17 anos.
Todos os professores, sujeitos dessa pesquisa, têm
licenciatura em Pedagogia, realizada pela Universidade
Federal de Ouro Preto.
Os participantes foram escolhidos tendo por
meio de alguns critérios, os alunos por estudarem
nessa instituição escolar ao passo que os docentes
por trabalharem na mesma e por aceitarem participar
da pesquisa. Os questionários semiestruturados com
perguntas de múltipla escolha foram respondidos de
forma individual e voluntária.
A pesquisa foi realizada na escola municipal
de porte médio, localizada em área urbana, situada
no Centro do município de Raul Soares que atende
ao ensino fundamental, com um total de 870 alunos
divididos em três turnos (1º ao 9º ano).
A entrevista não causou grandes impactos,
visto que muitos educadores não aceitaram
participar, alegando não terem tempo de responder
ao questionário, e em relação a alguns alunos, estes
demonstraram surpresa, dizendo que a questão

45
racial não deveria existir na escola e muito menos na
sociedade, pois todos têm a obrigação de respeitar as
diferenças. Ressalta-se que foram entrevistados todos
os 14 professores, e 120 alunos.
Foi elaborado um questionário semi-estruturado,
com a ajuda de uma pedagoga da escola e pela
pesquisadora com 10 perguntas de múltipla escolha
direcionado aos alunos e professores participantes
da pesquisa e entregue aos alunos e professores para
serem respondidos e devolvidos à pesquisadora.
O que me motivou a fazer esta pesquisa sobre
racismo foi uma entrevista feita no período de março
a julho de 2013 para o Censo sobre a etnia a que
eles pertencem, notei constrangimento entre eles de
se assumirem como negro, além desse fato, quase
sempre verifica sinais de discriminação no espaço
escolar, demonstrados por meio de agressões físicas e
verbais.
De acordo com a autoclassificação a composição
racial dos 120 alunos participantes da pesquisa foi: 14
brancos, 06 amarelos, 70 pardos, 13 indígenas e 17
afrodescendentes, 78 eram meninas e 42 meninos.
Resultados e discussões
A primeira questão referiu-se a classificação
racial, os alunos marcaram qual a cor/raça eles
consideravam pertencer, tendo 5 opções para declarar.
Na classificação racial foi utilizado as categorias
branco, amarelo, pardo, indígena e preto, categorias
utilizadas pelo IBGE.
Quanto a questão referente ao entendimento de
si mesmo diante de outras pessoas, 80% assinalaram
que têm amizade com todos, não considerando a raça,
cor, religião e situação financeira. Quando perguntado
se são vítimas de racismo ou preconceito, 4% dos
46
alunos disseram que sim.
A finalidade desta pergunta foi perceber
qual a compreensão dos alunos por preconceito.
Somente 45% responderam que é um juízo pensado,
expressado principalmente na forma de uma postura
que discrimina perante pessoas, os outros pesquisados
marcaram outras opções.
Quanto a questão, referente à expressão verbal,
vários estudantes não marcaram nenhuma opção e
dos que marcaram a opção mais aceita menciona que
nem sempre quando se dizem algo com relação ao
negro, querem discriminá-lo.
Questionou-se aos alunos como frequentemente
a história do negro era estudada, dos 120 alunos que
responderam, 40% disseram que estudavam sobre o
assunto em História, e 72 alunos mencionaram que
não era abordado o assunto ou somente na abolição da
escravatura e no dia da consciência negra.
Em se tratando do racismo, 55% dos 120 alunos,
marcaram a alternativa que diz ser notório que as
distinções raciais acontecem sempre em qualquer
lugar, tanto na escola quanto na sociedade. Porém
20% creem que não existe discriminação racial, que
todas as pessoas são bem tratadas e 25% dos alunos
optaram pela alternativa que diz não entender nada
sobre a questão.
Na questão referente às condutas racistas
90% acham que não deve haver, porque temos que
respeitar as desigualdades, 10% dos alunos marcaram
outras alternativas e desses, 9% assinalaram que não
respeitar as pessoas por serem diferentes acontece
sempre no dia a dia.
Quando foi indagado aos pesquisados se
vivenciaram condutas discriminatórias 95% dos 120

47
entrevistados, disseram que quase sempre isso faz
parte do dia a dia da escola e disseram, também que
presenciaram com parentes. O fato causou grande
espanto, em todos os envolvidos na pesquisa, pois
vivemos em uma nação com imensa pluralidade
cultural.
Quando perguntado qual a função da escola
perante as práticas de racismo, 90% dos alunos
se posicionaram em relação a questão e 10% não
responderam. Porém 60% dos alunos disseram que é
necessário favorecer o diálogo coletivo sobre o assunto
e outras ações contra o racismo preconceituosas,
com a atuação de todas as pessoas envolvidas com a
educação, os demais assinalaram outras opções.
De acordo com o resultado da pesquisa,
verificamos que os alunos admitem que não pode
haver prática de racismo e que todos necessitam
ser respeitados indiferente de cor, raça, religião ou
condição social. Nas outras perguntas percebeu-se
claramente a presença de ações discriminatórias
porque os indícios das mesmas se concretizaram nas
respostas a algumas questões.
Sendo assim, os estudantes entendem a
importância que precisa ser dada aos assuntos
referentes ao racismo, porque quando questionado
sobre a função da escola, disseram, que se faz
necessário incrementar debates coletivos sobre o
racismo e outras ações de preconceitos, com a atuação
de todos envolvidos.
O questionário direcionado aos educadores
foi entregue para ser respondido e devolvido no dia
seguinte, a fim de esclarecer a percepção dos mesmos
sobre o tema.
A questão sobre como deve ser tratado assuntos

48
referentes ao racismo, 72% dos docentes, disseram
no contexto educativo pela escola e somente um
mencionou que poderia ser quando por acaso surgisse
na escola.
Na questão relacionada ao planejamento da
escola, a resposta que foi marcada majoritariamente foi
que o planejamento mostra aos discentes informações
sobre a cultura negra e indígena. Quanto como a
escola age diante das questões raciais, as opiniões
ficaram bem divididas, sendo que a maioria dos
entrevistados marcou que a escola atua de maneira
neutra em se tratando de questões raciais, permitindo
que os educadores invistam em cursos para melhor
lidar com esses assuntos.
Em relação a pergunta de como a escola deve
proceder para melhorar os relacionamentos, aceitar
a pluralidade étnica e respeitar as diferenças raciais,
a maioria dos docentes disse que deveria dar maior
destaque ao conhecimento em relação as heranças
culturais do país.
Sobre a pergunta que trata do que pensam em
relação a expressão verbal, mais da metade respondeu
que em determinadas situações usam outras
linguagens para referir-se as raças dos alunos e assim
não ofendê-los, a opção que se refere a linguagem
com o poder de intervir nas questões raciais não foi
assinalada por nenhum entrevistado.
Um grande erro que o educador comete é o de
ficar preocupado com o modo com que vai chamar
seus alunos negros, sem correr o risco de ofendê-los.
Ser negro é muito mais que característica física, ser
negro faz parte de uma escolha de afirmação de sua
identidade. É necessário lembrar, desse modo, que
a palavra “preto” ainda é uma categoria usado pelo

49
IBGE para classificar a cor da população brasileira.
A palavra negro foi usada por muitos, de modo
depreciativo, incutindo, nas pessoas, o sentimento de
alguma coisa negativa para tudo que se diz negro (por
exemplo, quando a situação está complicada, diz-se
que ela está “preta”). De acordo com o descrito, este
sentido negativo da palavra ainda existe.
Nesse sentido, o racismo moderno
constitui-se, enquanto forma de do-
minação de uma classe sobre a outra,
dentro das relações de produção da
vida material, o que não é o caso da
escravidão presente nas antigas socie-
dades greco-romanas. Estas não de-
senvolveram teorias de superioridade
branca (ROCHA, 2006:7).
Sobre a pergunta referente aos materiais da
escola para tratar do assunto racial, a maioria disse
que quase não se encontram livros relacionados ao
tema em questão. Quase todos professores acham
que é preciso estudar o assunto. Também a maioria
acha que é necessário mostrar que todos são distintos
uns dos outros e precisamos respeitar as diferenças e
precisamos agir de maneira adequada, para lidar com
a questão.
A maioria das alternativas assinaladas pelos
docentes, esclarecem, que a escola trabalha a cultura
do negro somente duas vezes ao ano, porém que
os assuntos referentes ao racismo, necessitam ser
abordados no dia a dia pela escola, pois percebe-se ser
necessário mais atenção no tema em questão.
Os educadores mostraram-se bem divididos em
relação ao agir da escola quanto as condutas racistas,
porque assinalaram que a Instituição de Ensino atua de
maneira indiferente, deixando a cargo dos educadores

50
a discussão sobre o racismo na área da escola.
Sobre a capacitação dos educadores sobre
assuntos raciais, notou-se falta de entendimento sobre
o assunto porque muitos entrevistados assinalaram
que é preciso estudar o assunto mais profundamente.
O que menos preocupa nos debates a respeito da
discriminação e racismo na escola é a firmeza dos
educadores, sabendo como atuar nos casos de
discriminação, porque quase todos entrevistados
disseram que é necessário mostrar que todos nós
somos distintos uns dos outros e precisamos ter
respeito pelas diferenças, entretanto precisam se
atualizar sobre o assunto.
Conforme o Parecer Nº 3/2004, que visa a aten-
der os propósitos expressos na Indicação CNE/CP
6/2002, bem como regulamentar a alteração trazida à
Lei 9394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacio-
nal, pela Lei 10.639/03, que estabelece a obrigatorie-
dade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e
Africana na Educação Básica, torna-se indispensável
que exista formação para os educadores sobre assun-
tos referentes à diversidade étnico-racial, para que
eles se sintam preparados para trabalhar com seus
alunos e consigam desenvolver estratégias educativas
que reeduquem a todos sobre estas questões.
Considerações finais
Através do resultado da pesquisa, pode-se
verificar que a maioria dos entrevistados admitem
existir racismo na escola e que essa prática deveria
ser excluída na sociedade, pois todos precisam ser
respeitados.
Em muitas perguntas percebeu-se claramente a
presença de ações discriminatórias porque os indícios
se concretizaram nas respostas a algumas questões.
51
Sendo assim, os entrevistados entendem a
importância que precisa ser dada aos assuntos
referentes ao racismo, porque quando questionado
sobre a função da escola, disseram, que faz-se
necessário incrementar debates coletivos sobre o
racismo e outras ações de preconceitos, com a atuação
de todos envolvidos.
O estudo mostrou que o racismo em suas
múltiplas faces acontece, e desse modo, é preciso
entender a concepção de racismo e raça, considerando
o ponto de vista antropológico, biológico e jurídico.
O entendimento dos alcances e limites de um
julgamento é essencial para progredirmos nos debates
a respeito do racismo e para formarmos um novo
costume orientado para o formação da cidadania total.
Abordar o racismo como se ele não existisse, ou optar
pelo silêncio, como modo de enfrenta-lo, atraiçoa
o sentido da democracia que reclama das pessoas e
também das escolas uma atitude clara e firme quando
discutimos sobre o tema em questão.
Contestar ou não identificar o racismo no país
que se mostra principalmente de modo silencioso
e insidioso é, revigorar um país racista que,
frequentemente seleciona políticas que quase sempre
buscam disfarçar, de vários modos, a diversidade de
valores que existem na cultura africana.
São muitas as possibilidades para acabar com
o preconceito racial e a Instituição de Ensino tem o
dever de assumir a função de uma escola democrática
e cidadã, priorizando as atitudes positivas e respeitando
as diferenças.
A pesquisa feita na escola propiciou uma
consideração de como são vividos os assuntos
referentes à discriminação e ao racismo, especialmente

52
por ter propiciado uma comparação entre as opiniões
dos educadores e estudantes da escola. Sendo assim,
faz-se necessário enfatizar que quando se refere aos
assuntos étnicos raciais, dificilmente nos debates
sobre o tema são atribuídos o devido valor e isso prova
quando o estudo demonstrou que a pesquisa sobre os
negros ou referente ao racismo é tratado somente na
disciplina de História ou datas comemorativas.
O discernimento dos discentes sobre a ocorrência
do racismo no espaço escolar é notado nas questões
respondidas por eles na pesquisa, mostrando, desse
modo que eles sabem da existência, ainda que se calem
ou não se importem com as situações observadas.
Considerando as respostas dos professores,
certificou-se que a maioria deles reconhecem que há
condutas racistas na escola, porém ficam sem saber
como agir nas situações de discriminação, entretanto
creem que a instituição de ensino necessita investir
em cursos sobre como lidar com essa questão na sala
de aula e diante de circunstancias racistas.
De acordo com as respostas dos entrevistados
aponta para o investimento na formação do educa-
dor(a), para que ele possa tratar as desigualdades ét-
nico-raciais no espaço escolar, não o exonerando dos
compromissos de pesquisar e procurar conhecimen-
tos sobre o assunto e desse modo propiciar um melhor
tratamento às posições de discriminação.
Finalmente, os dados reunidos mostraram que a
pesquisa mesmo que feita de maneira simples, destaca
a ocorrência do racismo, mesmo sendo de modo
silencioso e de condutas avaliadas como normais, mas
que necessitam ser erradicadas com atitudes positivas
e respeito ao diferente.
Os dados da pesquisa foram divulgados nas

53
salas do 8º e 9º Ano, estando presentes os professores
que participaram da mesma, o que causou impactos
transformadores e benéficos, pois favoreceu o
crescimento da noção de cidadania.
A maioria dos alunos percebeu a importância de
cada ser humano e sua responsabilidade no combate
ao racismo. Os professores sentiram a necessidade de
criar um projeto envolvendo todas as turmas, fazendo
reuniões com toda a comunidade escolar para tentar
disseminar o combate ao racismo, trabalhando valores
com os alunos e realizando palestras sobre o tema
para toda a comunidade escolar.
Portanto, o que o estudo sugere como um ins-
trumento de combate ao racismo é que o assunto não
continue sendo ocultado no Estabelecimento de En-
sino, devendo favorecer um ambiente infindável para
análises e discussões de posturas preconceituosas e
racistas objetivando superar os padrões, discrimina-
ções e estigmas contra a população negra que é tão
comum no espaço escolar, porque a formação para a
diferença é trabalhosa na medida em que o educador
é prisioneiro da ideia da igualdade, não se percebendo
racista.
Necessitamos construir instrumentos educativos
no interior da formação de docentes, do currículo, dos
livros didáticos, no espaço físico e em todos os locais
onde acontece a educação, no sentido de tomar a
diferença como tema e sentido da ação educativa.
Referências Bibliográficas

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de diretrizes e bases da educação nacional. Brasília:
Ministério da Educação, 1996.

CAVALLEIRO, Eliane dos Santos. Do silêncio do lar ao


silêncio escolar: racismo, preconceito e discriminação
na educação infantil. 3ª ed. São Paulo: Contexto, 2003.

54
FERREIRA, Ricardo Franklin. Afro-descendente:
identidade em construção. São Paulo: EDUC; Rio de
Janeiro: PALLAS, 2004.

FERNANDES, Florestan. A integração do Negro na


Sociedade de Classes Volume I - 3ª ed. São Paulo: Ed.
Ática, 1978.

ALVES, José Augusto Lindgren Alves. São Paulo.


Coleção Estudos Dirigidos por J. Guinsburg. Ed.
Perspectiva S.s, 2005.

GADOTTI, Moacir. Escola Cidadã, Cidade Educadora


– Projetos e Práticas em Processo, out, 2003.

GUIMARÃES. Antonio Sérgio Alfredo. Intelectuais


negros e modernidade no Brasil. Departamento de
Sociologia. USP, 1995. Racismo e anti-racismo no
Brasil. 2 ed. São Paulo: Ed. 34, 2005.

MUNANGA, Kabengele. Rediscutindo a mestiçagem


no Brasil: identidade nacional versus identidade
negra. 3 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.

TEIXEIRA, Maria Aparecida Silva Bento. Resgatando


a minha bisavó: discriminação racial no trabalho
e resistência na voz dos trabalhadores negros. São
Paulo: Pontifícia Universidade Católica, 1992, 135 p.
(Dissertação, Mestrado em Psicologia Social).'

SKIDMORE, Thomas E. Preto no Branco:  Raça e


nacionalidade no pensamento brasileiro. 2ª ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1993.

55
Anexo I

Questionário alunos
Marque a opção que você considerar correta:
1. Considerando as expressões relacionadas à
cor e raça, você se considera:
(A) Branco
(B) Amarelo
(C) Pardo
(D) Indígena
(E) Preto
2. Você se considera:
(A) Amigo de todos independentemente da cor
ou raça, condição social ou religião.
(B) Diferente de todos, porque cada um tem sua
característica.
(C) Superior aos outros, já que tenho tudo que
quero.
(D) Vítima do preconceito por não ser igual aos
outros.
3. Preconceito é:
(A) Achar-se melhor que o outro.
(B) É uma opinião preconcebida, manifestada
geralmente na forma de uma postura que discri-
mina perante os outros, lugares ou tradições con-
siderados diversos ou esquisitos.
(C) Ter atitudes egoístas, agindo e pensando de
acordo com seus interesses.
(D) Julgar que todos são iguais perante as leis.

56
4. Em se referindo às expressões verbais:
(A) É comum ouvir expressões do tipo: você é
feio(a) porque é negro(a), sai daqui negão, cabe-
lo de Bombril e outros termos para referir-se ao
negro.
(B) As palavras não influenciam diretamente nos
assuntos raciais.
(C) A linguagem utilizada diariamente na escola
influencia diretamente nos assuntos referentes a
discriminação ou racismo.
(D) Às vezes quando se diz algo referente ao ne-
gro, não quer dizer que estamos sendo preconcei-
tuosos.
5. Normalmente a história referente ao afro-
-descendente é analisada:
(A) Em História.
(B) Em agosto, no dia da Abolição da escravatu-
ra, no mês do folclore, e também no dia da Cons-
ciência Negra.
(C) Nunca é estudada.
(D) Em todas as disciplinas que dão possibilidade
de tratar o assunto.
6. Em relação ao racismo você acredita que:
(A) Todos são tratados da mesma maneira, por-
tanto não existe.
(B) É lógico que as desigualdades de raça aconte-
cem sempre na Escola e fora dela.
(C) Nota-se uma cena que preocupa: o aumento
das hostilidades raciais e étnicas.
(D) Não entendo nada sobre a questão.

57
7. Quanto às condutas racistas você considera:
(A) Que não pode existir, porque precisamos
respeitar e conviver bem com as desigualdades.
(B) Não respeitar as outras pessoas por não
serem iguais é comum na nossa sociedade.
(C) É evidente que atitudes que diz que as pessoas
têm vocação para defender a sua identidade
manchando a dos outros sempre existiu.
(D) Lamentável já que temos uma sociedade que
diz ser antirracista.
8. Você já testemunhou atitudes consideradas
racistas:
(A) Sempre e isso faz parte do dia-a-dia da
sociedade e da escola.
(B) Nunca testemunhei e considero lamentável
essa atitude.
(C) Sim. E com pessoas do meu convívio, e tal
fato me deixou chocado, já que vivemos em um
país de grande pluralidade cultural.
(D) Não existe.
10. Quanto à função da escola em relação ao
racismo:
(A) Deve favorecer debates coletivos a respeito
do racismo e de outros atos de preconceito, com o
envolvimento de toda a comunidade escolar.
(B) Debater sobre racismo somente na disciplina
de História, já que estuda a história de todos os
povos.
(C) Informar a todos sobre a importância do ne-
gro e sua história.
(D) Enaltecer alguns negros que são destaque
para a história como: Cantores, Pelé, Barack Oba-
ma, e outros.

58
Anexo II

Questionário professores
Marque a alternativa que corresponde à realidade do
seu ambiente escolar:
1. O tema que envolve a história dos afro
descendentes é tratado na escola:
(A) Nas datas comemorativas como: Abolição da
Escravatura, em agosto, mês do Folclore, e no dia
da Consciência negra.
(B) Em forma de conteúdo, dentro das áreas que
possibilitam tratar o assunto;
(C) Em projetos preparados pela escola.
(D) Não é estudada.
2. Os assuntos que envolvem o racismo devem
ser abordados:
(A) No contexto Pedagógico pela escola.
(B) Pelos movimentos ligados a questão social.
(C) De acordo com casos que porventura se des-
taquem na escola.
(D) Como se não houvesse, para evitar muitos
problemas entre alunos e professores.
3. Quanto à organização do currículo:
(A) Baseia-se nas contribuições dos europeus e
de acordo com os livros didáticos.
(B) Baseia-se em métodos que distingue de modo
positivo a variedade de raças.
(C) Retrata aos alunos a cultura do índio e
afrodescendente.
(D) Desconsidera a realidade plural e destaca
um caráter monocultural.

59
4. Em relação à Instituição de Ensino:
(A) Atua de maneira neutra em se referindo aos
assuntos sociais, deixando que os educadores tra-
balhem de acordo com os conteúdos específicos
das áreas.
(B) Reavalia e avalia frequentemente a prática
da escola e reflete sobre os conceitos e valores
mostrados em relação ao afrodescendente e sua
cultura para informar aos alunos da sua impor-
tância.
(C) Tem pouca informação para tomar posição
de modo crítico no que se refere à cultura negra.
(D) Tem tentado investir em sua formação para
melhor lidar com os assuntos raciais.
5. Quanto à heterogeneidade entre grupos et-
noculturais:
(A) Não são estudados, porque pode causar con-
flitos.
(B) É importante promover discussões sobre
as relações entre os grupos etnoculturais e des-
se modo promover a socialização tranquila entre
ambas.
(C) São manifestadas como parte da pluralidade
cultural brasileira.
(D) Não podemos desconsiderar as árduas ques-
tões do pluriculturalismo, das diversidades de lin-
guagem, religiosa, sexuais, étnicas, de raça, gêne-
ro, e de linguagem.
6. Para a Instituição de Ensino fortalecer a re-
lação harmoniosa, aceitar a diversidade étnica
e o respeito às diversidades precisa:

60
(A) Convencer que todos precisam ter orgulho de
pertencer a uma determinada raça.
(B) Não dar a devida importância para as opiniões
generalizadas em relação ao afrodescendente
encontrada nos livros didáticos, nas produções e
em outros textos do material didático existente.
(C) Dar grande destaque às informações sobre as
heranças culturais do povo brasileiro.
(D) Favorecer momentos de diálogo sobre o
assunto.
7. Sobre à expressão verbal:
(A) A linguagem não pode exercer influência
diretamente nos assuntos raciais.
(B) De vez em quando é melhor utilizar o
eufemismo para referir-se as etnias dos discentes
e desse modo não magoá-los diretamente.
(C) Certamente a linguagem utilizada no
cotidiano escolar pode influenciar nos assuntos
relacionados a discriminação e ao racismo.
(D) É necessário não dar importância a linguagem
de indivíduos preconceituosos.
8. Quanto aos livros existentes na biblioteca:
(A) Há uma grande variedade de livros que se
referem a questão racial.
(B) Não observamos se existem livros referentes
ao tema.
(C) Existem poucos livros referentes a questão
racial.
(D) Não há livros sobre o tema.
9. Quanto à formação dos educadores em
relação à questão racial:

61
(A) Sempre fazem cursos ou grupos de estudo
sobre o assunto racial.
(B) Ainda não fizeram nenhum estudo sobre a
questão.
(C) Inserimos o assunto nas reuniões e
principalmente nos encontros pedagógicos e
momentos da formação da equipe de profissionais.
(D) É preciso estudar mais profundamente sobre
a questão e depois realizar debates com a equipe.

10. Diante de uma situação de racismo é


preciso:
(A) Não comentar para evitar outros transtornos.
(B) Agir de modo harmônico, para resolver a
situação, comentando que nem sempre as pessoas
querem magoar os outros, desse modo podemos
pedir desculpas a quem foi magoado.
(C) Convencer que todos são distintos uns dos
outros e precisamos conviver e ter respeito pelas
diferenças.
(D) Agir de modo enérgico, castigando quem
magoar o outro por ser diferente na cor e na raça.

62
“PRÔ, EU TAMBÉM SOU MACUMBEIRA”.
CONQUISTA E RESISTÊNCIAS A IMPLEMEN-
TAÇÃO DA LEI 10.639/03 NUMA ESCOLA DE
ED. INFANTIL.

Luciana do Amaral e Silva (UFOP/UNIAFRO)1


José Américo Martins (Orientador)2

Resumo
O trabalho tem como objetivo descrever as ex-
periências pedagógicas e seus desdobramentos numa
perspectiva de ação anti racista. Quais possibilidades
de formação de identidade a criança negra encon-
tra no espaço escolar para formação positiva de sua
identidade? Essa foi a questão que orientou o projeto
“África daqui” realizado no ano de 2014 por uma tur-
ma de EMEI, em são Paulo. A crença de que vivemos
em uma “democracia” e de que por isto já teríamos
superado as desigualdades raciais e sociais são base
para a meritocracia, que aprofunda e legitima a desi-
gualdade social e racial. Na medida em que o projeto
“África daqui” se aprofunda na perspectiva critica so-
bre a história da África e suas manifestações culturais,
reconhecendo-as como patrimônio cultural de toda a
humanidade. Assim, conflitos antes, (in)visibilizados
se tornam mais nítidos, o que acaba por contribuir
para o enfrentamento coletivo do racismo. Não é mais,
apenas a criança, de forma individual, que o enfren-
ta, na busca por sua afirmação como sujeito social. A
hegemonia dos conteúdos que supervalorizam os fei-
tos históricos dos Europeus em detrimentos das con-
tribuições do negro(a), é perverso e se expressa pela
1-Universidade Federal de Ouro Preto, Curso de Especialização UNIAFRO: promoção
da igualdade racial na escola.
2-Professor Orientador deste Trabalho de Conclusão de Curso de Especialização.

63
negação da existência do negro(a) como sujeito social
e protagonista de sua cultura. A escola ao reproduzir
de forma alienada esses conteúdos, acaba por negar a
possibilidade das crianças e jovens se reconhecerem e
sentirem-se pertencentes de suas próprias vidas.
Palavras-chave: Relações Étnico-Raciais, Educação
Anti-Racista, Ed. Infantil, Identidade, Racismo e Polí-
ticas Públicas.
Introdução
Este artigo tem como objetivo relatar as
experiências vivenciadas por uma professora que
desenvolveu, durante o ano letivo de 2014, um
projeto anual sobre relações étnico-raciais e seus
desdobramentos sob a comunidade escolar, numa
perspectiva de ação pedagógica anti-racista. Este
projeto foi desenvolvido na Emei Brigadeiro Eduardo
Gomes, com uma turma que contava com 35 crianças
de idade entre 5 e 6 anos. A escola fica na zona norte
da cidade de São Paulo, no bairro Parque Peruche.
Foi objeto de investigação as relações sociais
dos diferentes sujeitos presentes no cotidiano escolar,
a partir do desenvolvimento de um projeto pautado,
também, pela lei 10.639/03. A professora teve como
pressupostos e ponto de partida a necessidade de
democratizar o acesso a outras culturas, que não a
eurocêntrica, na busca por situações pedagógicas que
favoreçam o pertencimento e reconhecimento da
cultura Wa, e também indígena, em nossa formação
cultural. A escolha foi, portanto, a cultura de matriz
africana.
O recorte para o conteúdo trabalhado se justifica,
na medida em que a professora presenciou diferentes
situações de racismo em seu cotidiano escolar. Essas

64
ações são oriundas de diferentes atores/sujeitos que
produzem e reproduzem o racismo cotidianamente na
escola.
Outro ponto importante em relação ao surgi-
mento do projeto foi o entusiasmo das crianças ao
se reconhecerem nas propostas e no repertório apre-
sentado pela professora, sobretudo nos momentos do
brincar. A professora escolheu canções e brincadeiras
que circulam através do que comumente conhece-
mos como universo da cultura popular.
De acordo com a autora Almeida de Oliveira
(2013), históricamente, os conteúdos que circulam
no cotidiano escolar são herança cultural dos
colonizadores europeus, mesmo quando se colocam
na perspectiva de garantir a “diversidade”.
No entanto, é importante destacar que, nesse
sentido, percebemos que as relações étnico-raciais
dentro das escolas, bem como a História e a Cultura
Afro-brasileira e Africana, vêm sendo abordadas, ainda
de maneira superficial e sob uma visão eurocêntrica.
Persiste em nosso país um imaginário que privilegia
a branquitude e valoriza principalmente as raízes
da herança cultural dos colonizadores europeus,
ignorando as não brancas. Moura (1988) nos fala sobre
o que define como “ideologia do branqueamento” e
sua relação com a produção e reprodução do racismo,
na medida em que o brasileiro foge da sua realidade
étnica, através do que denomina como “simbolismos
de fuga”, onde o negro busca a identificação com o
modelo tido como superior, e para tanto acaba por
negar a sí mesmo e se identificar com o padrão branco:
Por mecanismos alienadores, a ideo-
logia da elite dominadora introjetou
em vastas camadas de não-brancos os

65
seus valores fundamentais. Significa,
também, que a nossa realidade étnica,
ao contrário do que se diz, não iguala
pela miscigenação, mas, pelo contrá-
rio, diferencia, hierarquiza e inferio-
riza socialmente de tal maneira que
esses não-brancos procuram criar uma
realidade simbólica onde se refugiam,
tentando escapar da inferiorização que
a sua cor expressa nesse tipo de socie-
dade. Nessa fuga simbólica, eles dese-
jam compensar-se da discriminação
social e racial de que são vítimas no
processo de interação com as camadas
brancas dominadoras que projetaram
uma sociedade democrática para eles,
criando, por outro lado, uma ideologia
escamoteadora capaz de encobrir as
condições reais sob as quais os conta-
tos interétnicos se realizam no Brasil
(MOURA. 1988. P. 62-63).

Por isto as ações pedagógicas eleitas pela pro-


fessora são aquelas que colocam em evidência os
conteúdos sobre a história da África e dos afrodescen-
dentes. Esses conteúdos geram ou desvelam conflitos
amortizados históricamente pela “teoria do embran-
quecimento e da democracia racial”. O mito da de-
mocracia racial nega os conflitos oriundos do racismo
e impendem, por sua vez, a formação de identidade
positiva de negros e negras, na medida em que repro-
duz de forma alienada os estereótipos históricamente
criados para justificar a dominação e opressão sofrida
pelo povo negro, herança de um passado escravocrata
do Brasil, não tão distante de nós.

Fundamentação teórica

66
A bibliografia utilizada orientou e aprofundou as
reflexões sobre as ações pedagógicas, que tinham
como recorte principal o pertencimento racial, reco-
nhecimento de sí e do outro e a democratização da
cultura negra e indígena, como forma de combate ao
racismo. O recorte para as expressões culturais de
matriz africana e também indígena, se dá pela com-
preensão de que essas representam parte primordial
do patrimônio cultural de toda humanidade, sobretu-
do brasileira.
Para facilitar o reconhecimento do racismo
pelos diferentes sujeitos e nas diferentes práticas
presentes no cotidiano escolar, optamos por uma
abordagem de conteúdos do currículo que se baseie
em uma perspectiva crítica em relação ao “ideal da
democracia racial” . Este ideal de “democracia racial”
é disseminado por Gilberto Freyre em seu livro Casa
Grande e Senzala (1933). Nesta obra Gilberto oculta e
nega ao racismo, na medida em que afirma que houve
um encontro harmonioso quanto as relações raciais,
em que ambas puderam usufruir da relação posta
por uma estrutura escravagista. Uma acomodação
amigável entre índios, negros e o português, o que
nega os conflitos e as resistências que os negros
e indígenas travaram contra as barbaridades da
escravidão. Segundo Freire, 2011:
Híbrida desde o início, a sociedade
brasileira é de todas da América a que
se construiu mais harmoniosamente
quanto às relações raciais: dentro de
um ambiente de quase reciprocidade
cultural que resultou no máximo apro-
veitamento dos valores e experiências
dos povos mais atrasados pelo adian-
tado; no máximo da contemporização

67
da cultura adventícia com a nativa, da
do conquistador com o conquistado
(FREYRE, 2011, p 91).
Essa “ ideia de democracia” racial como bem nos
fala Munanga serviu como forma predominante na
sociedade capitalista de invisibilizar e assim reproduzir
o racismo. Na escola também é reproduzido o ideal
de democracia racial, e assim as diferentes relações
vivenciadas na escola seguem reproduzindo o racismo
e silenciando e invisibilizando o negro. De acordo com
MUNANGA (2000):
O mito da democracia racial, baseado
na dupla mestiçagem biológica e cul-
tural entre as três raças originárias
[...] Exalta a idéia de convivência har-
moniosa entre os indivíduos de todas
as camadas sociais e grupos étnicos,
permitindo às elites dominantes dis-
simular as desigualdades e impedindo
os membros das camadas não brancas
de terem consciência dos mecanismos
de exclusão da qual são vítimas na so-
ciedade. Ou seja, encobre os conflitos
raciais. Possibilitando a todos se reco-
nhecerem como brasileiros e afastando
das comunidades subalternas a toma-
da de consciência de suas caracterís-
ticas culturais que teriam contribuído
para a construção e expressão de uma
identidade própria. Essas característi-
cas são “expropriadas”, “dominadas”
e “convertidas” em símbolos nacionais
pelas elites dirigentes (MUNANGA,
2000, p. 235).

Reconhecer o racismo e combater as diferentes


expressões do racismo na escola é combater a ideia de

68
democracia racial. O que acaba por evidenciar o con-
flito que sempre busca ser negado, ocultado. É funda-
mental nomear, caracterizar e reconhecer expressões
do racismo no cotidiano escolar. As ações, por exem-
plo, que desqualificam e estereotipam negativamente
os negros são expressões do racismo. A censura em
relação a produção cultural que traz signos da cultura
negra revestidas de uma defesa legítima da “laicidade”
da escola, também. Anjos (2009) nos fala sobre o que
ele chama de um “desinteresse histórico” em tratar
sobre o problema do preconceito racial de forma mais
profunda.
Na medida em que reproduzimos o cotidiano de
forma alienada na escola, reproduzimos também o ra-
cismo, a ideologia dominante que busca invisibilizar o
negro ao negar a história da África e dos afrodescen-
dentes aqui no Brasil. Esse país “oficialmente mesti-
ço” impede que as crianças compreendam as relações
raciais no Brasil e a condição atual do negro como
consequência histórica, impossibilitando assim, uma
apropriação positiva do papel do negro na história da
humanidade. O ideal do “embraquecimento” pode ser
percebido pela busca constante em supervalorizar
“características brancas”, na busca por uma identifi-
cação com o modelo do branco, para afirmação social
e individual. Torna-se uma necessidade e estratégia
de existência do negro se identificar com o branco.
Clóvis Moura (1988) nos fala sobre esse “sistema clas-
sificatório do negro” como estratégia para dominação
e “amortização de consciência”.

“O sistema classificatório que o coloni-


zador português impôs, criou a catego-
ria de ‘mulato’ que entra como dobra-
diça amortecedora dessa consciência.

69
O mulato é diferente do negro por ser
mais claro e passa a se considerar su-
perior, assimilando a ideologia étnica
do dominador, a servir de anteparo
contra essa tomada de consciência ge-
ral do segmento explorado/discrimina-
do” (MOURA 1988.p. 70).
Para definirmos o que chamamos de cotidiano,
utilizamos conceito de “cotidiano” adotado por Duar-
te (2001):
“As objetivações genéricas em si, assim
como a estrutura das formas de pen-
samento e ação da vida cotidiana, não
podem ser identificadas com a aliena-
ção. Mas podemos considerar um pro-
cesso de alienação quando as relações
sociais impedem o indivíduo de relacio-
nar-se conscientemente com essas ob-
jetivações e estruturas, isto é, podemos
falar em alienação quando as relações
sociais não permitem que o individuo
se aproprie das objetivações genéricas
para-si, sejam utilizadas pelo indivi-
duo como mediações fundamentais
no processo de direção consciente de
sua própria vida. Quando o individuo
não consegue dirigir conscientemente
sua vida como um todo, incluída como
parte desse todo a vida cotidiana, o que
acontece é que sua vida como um todo
passa a ser dirigida pela vida cotidiana”
(DUARTE. 2001. pg. 38).
E conclui, “é nesse contexto teórico, portanto, que
defendemos uma concepção de educação escolar como
mediadora, na formação do indivíduo, entre a esfera da
vida cotidiana e as esferas não cotidianas da objetivação
do gênero humano” (DUARTE. 2001, p. 38).

70
Assim o cotidiano se coloca como ponto de parti-
da das ações pedagógicas do projeto “A África daqui”,
através do diálogo, escuta e observação sobre a reali-
dade do educando, porém a ação pedagógica serviu
para que as crianças pudessem ampliar seu conheci-
mento sobre sua realidade, numa perspectiva históri-
ca, ancestral.
Nossa ação pedagógica orientou-se pela defini-
ção do que Saviani (2000) defini como prática peda-
gógica como mediadora entre a prática social no ponto
de partida e a prática social no ponto de chegada.
O trabalho educativo pode ser possibilidade de
humanização, na medida em que ele possibilita que
os educandos se apropriem das objetivações histori-
camente produzidas por toda humanidade. Nesse
sentido, é importante compreender historicamente a
disputa social travada pela história do negro como pro-
dutor de cultura mediante sua existência objetiva e lo-
calização nas relações de trabalho, Duarte (2001) nos
fala sobre o trabalho educativo na perspectiva defen-
dida por ele, “O trabalho educativo é o ato de produzir,
diretamente e intencionalmente, em cada individuo
singular, a humanidade que é produzida histórica e
coletivamente pelo conjunto dos homens não há pro-
dução do novo sem a reprodução do que já foi cons-
truído historicamente” (DUARTE. 2001, pag. 23).
“Manter uma relação consciente para
com o papel do trabalho educativo na
formação daquele individuo-educando-
concreto que tem diante de si e para
com as implicações desse trabalho
educativo na produção e reprodução
da vida social. Em outras palavras,
não basta formar indivíduos, é preciso
saber para que tipo de sociedade, para

71
que tipo de prática social o educador
está formando indivíduos (DUARTE,
2001. P. 51).
Metodologia
Muitas foram as questões que surgiram no
decorrer do projeto. A bibliografia utilizada contribuiu
para compreender e aprofundar essas questões.
Quais conteúdos circulam pelo território escolar?
Quais são as relações que estão postas nesse espaço?
Após 12 anos da implementação da lei 10.639/03
qual espaço no currículo e no cotidiano escolar ocupa
o ensino sobre a cultura e a história da África e dos
afrodescendentes? Quais são as oportunidades de
formação de uma identidade positiva que a escola
oferece às crianças, sobretudo as negras e indígenas?
Essas perguntas levaram a professora a desen-
volver um projeto anual sobre a história da África. É
possível ignorar o racismo e conviver com ele? Bom,
essa tem sido, inclusive, a postura mais comum en-
contrada na escola e em toda sociedade. Convivemos
e toleramos o racismo, cotidianamente.
Frases que a professora ouviu durante o projeto
como, por exemplo: “eles são muito pequenos para
conversarem sobre racismo”, ou ainda, “mas aqui
na escola não temos racismo”, “ele não é macaco,
por isso não precisa se ofender” revelam bem toda
invisibilidade e negligência presente na questão.
Desenvolver o trabalho educativo de maneira
organizada e com uma proposta de pesquisa com os
alunos oportunizou a professora a questionar não só
suas práticas educacionais, mas todo o percurso que
fez como educadora e estudante de escola pública.
Nesse processo as experiências que mais contaram
para refletir e orientar a prática pedagógica ajustada
72
a uma ação anti-racista, foram as experiências com os
movimentos sociais organizados, as discussões e ações
já vivenciadas nesse campo. O conteúdo que circula
na escola é sobre a história do branco do Europeu.
O valor estético presente nos materiais que circulam
na escola é sobre as características do “branco”,
assim como a história que é contada também gira em
torno dos feitos dos homens brancos, ou seja, temos
uma escola que nos embranquece na medida que
impede ou dificulta nosso reconhecimento enquanto
descendentes de africanos e indígena, ao nos negar o
direito de acessar esse conhecimento humano.
A escola mostra-se ainda bastante insuficiente
na formação da consciência para si (LUKÁCS, 2013,
Cap. 1), a superficialidade com que os temas são
trabalhados no currículo contribui para isto, na medida
em que, não conseguimos ultrapassar o senso comum
em nosso cotidiano escolar. Muito pelo contrário,
a escola reproduz de maneira a alienar o cotidiano.
Reproduzimos os diferentes tipos de opressão na
escola de forma mecânica e alienada.
A professora relatou, também, no grupo de
professoras que um colega agrediu outra criança ao
chamá-lo de macaco, na tentativa de exemplificar
“sim” há racismo na escola e as crianças estão lidando
da forma que podem com ele. A atitude de algumas
professoras sinalizou “que ser chamado de macaco”
não é ofensa, já que a criança não é um macaco. Isso
é individualizar a questão do racismo, na medida
em que negamos sua existência, e pior, exigir que
a criança lide individualmente com uma questão
histórica e social. A pergunta que nos fica é, qual nosso
papel como educador para garantirmos igualdade de
condições para a formação positiva da identidade de

73
todos na escola?
Para tanto é fundamental que a escola se locali-
ze junto aos movimentos sociais que apresentam um
acúmulo sobre a história daqueles que foram histo-
ricamente marginalizados, estereotipados e negados
em sua existência. A organização e sistematização das
lutas e resistências travadas ao longo da história pela
população trabalhadora negra escravizada são possibi-
lidades de conhecimento crítico sobre a realidade.
Alguns relatos registrados pela professora dos
educandos revelam a percepção que fazem sobre si. É
importante perceber a presença do “ideial de branqui-
tude e a crença na democracia racial” nas diferentes
expressões das crianças.
Segue o relato de K. 5 anos, negra, sobre como
percebe a si própria:
Eu sou marrom. As princesas são brancas e os príncipes
são brancos, também. Não dá pra ser príncipe/princesa marrom.
Eu sou meio branca.
Ela sabe que não é branca, mas não consegue se
declarar como negra, pois já percebeu que ser negro
não é algo que lhe ofereça vantagens nessa sociedade.
Nega a sí, portanto, como possibilidade de existência,
na medida que busca se afirmar e se sentir valorizada.
L. 5 anos, também mostra como é doloroso ser
negro numa sociedade racista. O que os relatos nos
mostram é que as crianças formam sua identidade
como sujeito sociais, através das relações sociais que
vivenciam. Mostra-se assim a importância de uma ação
educativa que esteja envolvida com os movimentos e
organizações que trazem a discussão do que é ser um
sujeito social, fazer parte de uma sociedade, exigir
direitos, lidar com conflitos e desigualdades sociais.
O relato de L. é revelador sobre o estereótipo

74
negativo que a criança negra constrói sobre si.
Eu sou preto e não tenho músculos no braço. Eu mudaria o
tamanho de minhas orelhas. Por que todo mundo diz que com elas
eu pareço um macaco. Eu sou marrom como chocolate. Eu pareço
preto, mas minhas unhas são brancas, meu pé é sujo de lama.
Meus olhos também são brancos. Tenho muitos machucados. Sou
meio feio também. Se pudesse mudaria minha cor, por que eu
acho estranho, queria ser colorido, como o arco-íris. Eu queria
ser cor de pele, uma outra cor. As pessoas cor de pele são legais,
espertas. Olha lá, O João Luiz, a Sabrina e o Bruno. Queria ter
amigos espertos, o amigo mais esperto é o Diego, ele não é negro.
O depoimento de L. foi fundamental para a
orientação das ações do projeto. O L. quando se refere
aos amigos espertos, se refere aos amigos que tem a
pele mais clara. A frase ”eu queria ser cor de pele”,
demonstra a percepção de que há um tipo de pele que
é superior há outro, e essa não é a cor da pele dele.
O que é ser negro em nossa sociedade?
(Pertencimento) Quem são e onde estão os negro em
nossa sociedade? (Representatividade). Essas foram
as perguntas que motivaram as ações pedagógicas que
buscavam democratizar o conteúdo, para garantir a
representação positiva dos negros e indígenas.
O senso comum reproduz a ideologia dominante,
as falas dos educandos revelam todo o processo de
desumanização colocado para a população negra. As
crianças preferem ser qualquer cor, menos negras.
K. em seu relato também revela como a ideia do
“embranquecimento” é profunda e mascara o racismo,
na medida em que encobre e distorce a realidade. A
condição de desumanização imposta pelo capitalismo
ao trabalhador negro, não é pela sua cor ou qualquer
outra característica biológica, mas pela localização no
sistema de produção que ele ocupa.

75
Eu sou da cor da minha mãe. Sou marrom. Tenho cabelo
cacheado marrom. Eu Tenho olho igual ao seu, castanho. Eu
queria mudar minha sobrancelha e cabelo, eu queria que meu
cabelo fosse mais claro.Eu gosto mais ou menos de ser marrom,
por que as vezes eu fico com vergonha de ser preta e todo mundo
ser branco. Acho ser branco bonito e preto mais ou menos.
K. explica o que a motiva ter vergonha de ser
negra, é que vê o mundo do qual faz parte como branco.
Curioso é saber que dos 35 alunos mais de 90% eram
negros e indígenas, entre esses alguns bolivianos. A
professora percebeu que algumas crianças para não se
dizerem negras nas entrevistas, se diziam diferentes.
K. continuou:
Eu não gosto das pessoas que dizem que eu sou feia e que
eu sou diferente. Parece que sou estranha, todo mundo olha pra
mim. Queria ser igual a Barbie Girl, ela é mais bonita. Eu tenho
o olho, a boca e o cabelo quase igual o dela. A pele branca é mais
bonita. Ninguém olha para a pele branca, só para a pele preta
que é diferente.
A descrição que muitos educandos fazem
sobre si, como sendo “diferentes”, pode sinalizar a
dificuldade de reconhecimento com os conteúdos que
circulam de forma hegemônica, também na escola.
A predominância e reafirmação do padrão branco,
reafirma o lugar do negro como o exótico, o diferente,
o marginal, o burro, o preguiço, o incapaz e tantos
outros.
O trabalho com conteúdos que trazem a
população negra como produtora de cultura é o
contra peso da balança. M. em sua fala sobre o projeto
mostra essa importância de reconhecer sua história
nos diferentes espaços, sobretudo na escola:
Eu achei a África e a sereia no canal 8. Passou os africanos,
eles usam roupa colorida e com bolinhas. Eu queria ser jongueiro.

76
Eu gosto de ser africano, mas não escravo. O instrumento que eu
mais gosto é a cabaça. Eu sou moreno, ser moreno é mais legal
que ser branco. Eu queria saber uma coisa porque os homens
brancos foram maus? Os africanos não fizeram nada para eles?
Quando M. 5 anos, afirma que gosta de ser
negro, mas, não gosta de ser escravo, demonstra que
compreende que ser negro não significa ser escravo. M.
já reconhece algumas manifestações culturais que são
de matriz africana e apresenta um reconhecimento
dessas manifestações.
É interessante a presença da expressão “ser
diferente” na fala das crianças, a G. também se
descreve como “diferente”:
Eu sou quase negra, meus olhos são de cor diferente.
Meu cabelo é preto. Eu queria mudar minha cor. Queria ser um
pouquinho branca. Queria que meu cabelo fosse castanho, não
branco. Queria ser da cor de minha amiga Izabelli, um pouco
branca e um pouco preta.
O mito da democracia racial (FREYRE, 2011)
sustenta o racismo à medida que justifica e legitima
a supremacia dos brancos. No relato da professora
é possível perceber diferentes momentos em que
o racismo se expressou de forma mais nítida e
organizada, foram os momentos em que a cultura negra
se coloca com mais liberdade e de forma significativa
e contextualizada, no caso através do projeto e das
situações significativas que ele oportunizou.
A relação da “aceitação da diferença” e o “mito
da democracia racial” tem relação na forma como
se materializam. A fala da educadora que diz “você
acha mesmo que há racismo na escola?”, demonstra
a crença de que na escola “supostamente” possamos
conseguir superar o racismo. Essa “crença” de que a
escola pode superar o racismo é ingênua e favorece

77
a reprodução e produção do mesmo. O “ideal da
democracia racial” e a possibilidade de igualdade a
partir do “respeito das diferenças” parece mais afirmar
o racismo, muito mais do que combatê-lo.
A função da escola é de socializar todo o
conhecimento produzido historicamente pela
humanidade (DUARTE, 2001). No entanto, o que se
nota é que a escolha do que entra ou sai do currículo
escolar passa também por uma disputa sobre qual
educação queremos e qual realmente colocamos em
ação. A escola também reproduz a sociedade que
vivemos, apesar da contradição inerente, que há nesse
movimento.
No final do ano a professora realizou entrevistas
com os pais das crianças para registro da percepção
da família sobre o desenvolvimento da criança em
relação ao projeto:
A A. se desenvolveu bastante durante o ano. Sobre a
cultura africana ela se desenvolveu muito, desenha bastante
sobre isso e fala também, pois acho que esse foi muito importante
para ela (Mãe da A.).
Eu parabenizo as professoras pelo empenho e dedicação
que junto aos projetos fizeram com que cada criança olhasse
para o mundo e pessoas, em especial para si mesmas, de forma a
compreenderem quem eles são e onde vivem, como é essa relação
entre varias outras coisas boas (mãe do B. T).
A S. adora contar as histórias que são tema do projeto, teve
um desenvolvimento muito grande na parte musical e artísticas
(Mãe da S.).
Os relatos dos pais nos mostra como o trabalho
organizado através de projetos, que tenham como
ponto de partida as necessidades das crianças,
dialoga com todos os envolvidos do que chamamos de
contexto escolar. O que contribui, sobretudo, para que

78
a criança possa estabelecer relações e conexões entre
seu cotidiano. O que permite que ela possa ampliar o
conhecimento sobre o mundo e relações sociais que
ela vivência. Não seria possível uma ação consciente
e intencional no mundo, e com isso possibilidade
de ação transformadora, sem o conhecimento sobre
nossa história (pertencimento).
Apesar do discurso de neutralidade presente no
ambiente escolar, o que favorece a reprodução das
diferentes formas de opressão social, o que vigora no
cotidiano é a escolha feita de forma consciente, ou
não, de “embranquecer” a todos nós. Essa escolha
se materializa, também pela desqualificação e
esteriotipação do negro.
No desenvolvimento histórico das práticas edu-
cativas, coexistiram ações e pensamentos para ratifi-
car posição social excludente do negro, “naturaliza-
das” nos ambientes de ensino, e que necessitavam ser
combatidos. (ALTAIR; NASCIMENTO. 2011).
É recorrente a defesa por conteúdos de padrão
europeu através do discurso presente na escola
que afirma que a “escolha” desses conteúdos que
reproduzem a ideologia racista é o que os alunos
gostam de ver, aprender e fazer. Duarte (2001) nos
fala sobre como a naturalização das relações sociais
oriundas do capitalismo reproduzem-se na realidade,
por isto, a ação pedagógica deve ter como objetivo a
desalienação do cotidiano.
A educação e os ambientes de ensino também
refletem as situações de desigualdade e desvantagem
vivenciadas pela população negra, como demonstramos
estudos de Carlos Hasenbalg e Nelson do Valle Silva
(GUIMARÃES, 2004), onde o conteúdo curricular
prestigiado tende a desprezar os elementos que

79
caracterizam o universo étnico cultural deste grupo
populacional (ALTAIR; NASCIMENTO, 2011).
Nesse sentido, essa é uma escolha, também,
política do professor que reconhece em sua ação
docente uma ação política. O posicionamento do
professor por uma educação escolar que combata o
racismo, o coloca numa posição também política e
de exposição, frente aos padrões racistas, revestido
de grande cinismo, que são reproduzidos no contexto
escolar. O professor que assume uma prática que
combate a teoria do “embranquecimento” e o “ideal
da democracia racial” estará mexendo no “vespeiro
histórico do racismo”. Por isto a importância da
formação do professor, pois o conhecimento sobre a
história, lutas e resistências que o povo negro travou
após anos de escravidão e de exploração, está na
contramão dos conteúdos curriculares de todos os
níveis de escolaridade.
Newton Duarte nos diz que “a sociedade atual é
pródiga em mecanismos que criam entre a maioria da
população e os bens culturais elevados da humanidade
uma barreira quase instransponível, constituída pela
difusão maciça de lixo cultural e pela precariedade da
educação escolar” (DUARTE, 2001).
O cinismo do qual falamos anteriormente é
materializado pela permissividade da hegemonia dos
conteúdos cristãos e europeus presentes no espaço
escolar. O calendário escolar é um bom exemplo, que
se organiza por algumas datas de origem cristã, num
grande pacto de uma suposta ”paz”, que significa
na verdade a invisibilisação da cultura do negro e
a reprodução perversa do racismo. Individualizar o
racismo, é negar as condições objetivas e históricas
que invisibilizou e negou a trajetória do negro como

80
ser social, sujeito histórico.
Quando há uma ação pedagógica direcionada a
combater o racismo na escola, surge também como
reação conservadora, a resistência em aprofundar
a questão. Essa resistência é de cunho conservador
e busca impedir que a cultura e o conhecimento
sobre a cultura africana seja democratizado. O
reconhecimento como classe historicamente oprimida
é também consciência de pertencimento de classe
(pertencimento).
Por isto uma ação pedagógica anti-racista coloca
em evidência os limites que a democracia tem como
possibilidade de superação do racismo, na medida
em que não consegue superar sua condição racista.
A reação conservadora quando passamos a nomear
e identificar ações racistas e discriminatórias é a
de difundir o ideal da democracia racial, negando e
fingindo não ver o racismo cotidiano que as crianças
lidam, todos os dias, individualmente.
Considerações finais
O objetivo da pesquisa foi organizar através do
relato da professora e da bibliografia citada algumas
tensões que são reveladas na medida em que o pro-
fessor começa a desenvolver um trabalho pedagógico
organizado por uma ação anti-racista. Este trabalho
ocorre a partir da escolha dos conteúdos. Os conte-
údos que fizeram parte do projeto foram a Historia
da África e a chegada dos africanos aqui no Brasil, o
sistema de escravidão, as produções materiais negras,
história de resistência travada pelos negros como es-
tratégia de sobrevivência (negro como protagonista),
diferentes manifestações artísticas e artistas negros.
Esses foram os conteúdos centrais do trabalho.
A partir do contado com o conteúdo apresentado pela
81
professora, iniciávamos um processo de pesquisa sobre
o conteúdo, apoiado na observação, registro, pesquisa
e problematização do conteúdo. Todo o processo se
dava pelo diálogo, sistematizado de maneiras variadas
com o grupo de crianças para observação e registro
do que pensavam sobre o conteúdo, fizemos também
pesquisas sobre o conteúdo em diferentes fontes de
conhecimento, filmes, música, artistas plásticos etc.
Haviam momentos de problematização dos registro e
processo de pesquisa já percorrido pelo grupo.
A arte negra, e suas diferentes expressões, foi o
caminho percorrido para aprofundar o ensino sobre
história da África e dos afrodescendentes aqui no
Brasil. De acordo com DUARTE (2001), a apropriação
da cultura é o processo mediador entre o processo
histórico de formação do gênero humano e o processo
de formação de cada indivíduo como um ser humano.
Educar é dotar o outro de humanidade, por isto, é
fundamental que o currículo escolar garanta o acesso
democrático a cultura humana produzida ao longo da
história. Isso significa que um currículo centrado na
cultura européia é incapaz de garantir uma escola que
proponha “educar para a diversidade”.
A educação escolar é um processo intencional,
um processo educativo. Formar o indivíduo é opor-
tunizar para ele possibilidades materiais para que se
aproprie dos diferentes saberes objetivados pelo gê-
nero humano, ao longo da história. As diferentes ma-
nifestações culturais de matriz africana são possibili-
dades de apreensão sobre o que foi materializado ao
longo da história como possibilidade de existência e
resistência do africano e afrodescendente.
Reconhecer o racismo e combater as diferentes
expressões do racismo na escola é combater o ideal de

82
democracia racial. Assumir e evidenciar o conflito
que sempre busca ser negado, ocultado, mas que é
vivido pela criança, e que por isto devem ser focos
da ação docente que é destinada para a criança.
É fundamental nomear, caracterizar e reconhecer
expressões do racismo no cotidiano escolar. As ações,
por exemplo, que desqualificam e estereotipam os
negros são expressões do racismo. A censura em
relação à produção cultural que traz signos da cultura
negra revestidas de uma defesa legítima da “laicidade”
da escola, também.
Temos uma escola que nos “embranquece” na
medida que impede ou dificulta nosso reconhecimento
enquanto descendentes de africanos e indígenas,
ao nos negar o direito de nos apropriarmos desse
conhecimento humano.
Sem dúvida as crianças ampliaram seu
conhecimento sobre a cultura africana, mas também
ampliaram o conhecimento sobre si mesmas, na
medida que vivenciaram e brincaram com formas
diferentes de ser e estar no mundo, puderam se
reconhecer enquanto produtores de cultura, na
medida em se apropriavam da dança, música e outras
artes de matriz africana e indígena.

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85
A LEI 10.639/03 E SUA APLICABILIDADE EM
ESCOLAS PÚBLICAS DE PONTE NOVA (MG)

Erlaine Aparecida Silva (UFOP/UNIAFRO)1


Paulo Alberto dos Santos Vieira (Orientador)2
Resumo
O presente trabalho é uma pequena análise sobre
a maneira como a Lei 10.639/03 que torna obrigatório
o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e
Africana é interpretada e colocada em prática em
quatro escolas públicas da cidade de Ponte Nova,
Minas Gerais, sendo que três são da rede estadual
e uma da rede municipal. A Introdução apresenta
a relevância e os objetivos traçados para a pesquisa,
além de trazer uma prévia do que será discutido no
texto que se segue. A Fundamentação Teórica traz
as reflexões que alguns autores fazem sobre a Lei
10.639/03 e sua aplicabilidade nas escolas de nosso
país. A metodologia utilizada englobou a revisão
de literatura sobre a temática que norteou toda a
pesquisa, a aplicação de questionários e as conversas
informais com os professores envolvidos no trabalho,
ou seja, ela descreve os passos que foram utilizados pela
pesquisadora para concretizar o trabalho. No tópico
das discussões, os dados e a as informações coletadas
no campo de investigação foram sistematizadas e
analisadas de acordo com as referências bibliográficas
utilizadas com a intenção de responder a pergunta que
conduz toda a pesquisa, ou seja, se as escolas públicas
de Ponte Nova colocam a Lei 10.639/03 em prática de
forma coerente e condizente com a realidade de seus
alunos. Ao final são apresentadas as conclusões que o
1-Universidade Federal de Ouro Preto, Curso de Especialização UNIAFRO: promoção
da igualdade racial na escola.
2-Professor Orientador deste Trabalho de Conclusão de Curso de Especialização.

86
trabalho permitiu inferir.
Palavras-chave: Lei 10.639/03, Cultura Afro Brasilei-
ra e Africana, Educação, Formação de Professores.
Introdução
Vivemos em uma sociedade marcada pela
diversidade que nem sempre recebe o mérito que
deveria receber. Segundo Oliveira (2004, p. 402), as
diferenças geram conflitos entre os indivíduos que se
materializam na repulsa e na negação do outro, que
é visto como o inaceitável do grupo. Esse fato origina
o preconceito e o racismo que, muitas vezes, passam
despercebidos no cotidiano. As atitudes racistas, por
vezes, são sufocadas ou abafadas pela falsa ideia de
igualdade que se dissemina pelo senso comum entre
a população.
Ainda, segundo Oliveira (2004, p.402), “O
racismo constitui-se num processo de hierarquização,
exclusão e discriminação contra um indivíduo ou
toda uma categoria social...”, assim a identidade
cultural e individual do que sofre racismo tende a ser
ridicularizada ou até mesmo ignorada por aqueles que
se auto definem superiores. Esse autor ainda afirma
que a ascensão de movimentos sociais que defendiam
as minorias nos Estados Unidos, as atrocidades
cometidas contra os judeus pelos alemães nazistas e,
finalmente a elaboração da Declaração dos Direitos
Humanos (OLIVEIRA, 2004: p.402), no final da
Segunda Guerra Mundial contribuíram para que as
manifestações racistas se tornassem mais discretas no
continente europeu, mas não significou o extermínio
do preconceito racial. As atitudes racistas persistem
em nossa sociedade, fruto da ignorância, da falta de
respeito pelo outro, da ausência de conhecimento

87
sobre sua própria origem e de sua história.
Neste universo conflituoso, a escola surge como
uma possibilidade de mudança, mas o que se vê na
prática escolar não é bem isso, muitas vezes, ela so-
lidifica e reproduz desigualdades que foram constru-
ídas pela sociedade (GOMES, 2012: p. 403), pois não
considera os diferentes obstáculos que os seus alunos
enfrentam para alcançar seus objetivos pessoais e co-
letivos. Por outro lado, a escola também se constitui
em um local onde os vários discursos públicos sobre a
questão racial podem ser analisados e discutidos.
O ambiente escolar é um lugar propício à cria-
ção de mecanismos de inibição de práticas discrimi-
natórias e racistas pois é onde a diversidade se mostra
mais presente. Além disso, dentro do proposto pela
educação formal, é o local em que os estudantes de-
vem construir conhecimentos que contribuam para a
formação de cidadãos conscientes que enxergam as
diferenças como um fator positivo que acrescenta à
nossa essência e não como algo negativo que deve ser
ignorado ou excluído.
Partindo dessa premissa, a escola deixa de ser um
local de imposição de ideias e passa a ser um espaço
de diálogo que possibilita o crescimento de todas as
partes envolvidas, inclusive do professor que passa a
ser um mediador e não apenas um agente que repassa
informações. E se o professor se torna um mediador
do conhecimento é necessário que ele tenha uma
formação especifica e continuada para atender às
novas demandas de seus alunos, afinal novas leis são
criadas com frequência e é necessário que o docente
conheça essas mudanças com profundidade para
poder colocá-las em prática.
Uma das leis criadas, em 2003, no âmbito
educacional, foi a Lei 10. 639 que tem como objetivo
88
valorizar a História e a Cultura Africana por meio da
obrigatoriedade do seu ensino em todas as séries do
Ensino Fundamental e Médio. Assim, se os estudantes
perceberem o quanto a formação histórica e social da
população brasileira está atrelada ao povo africano, mais
respeito e admiração por eles nossos futuros cidadãos
terão e, por conseqüência, adotarão cada vez menos
atitudes racistas, pois saberão que a descendência
africana não pode ser apenas simbolizada pelo tom
da cor da pele, mas ela também está presente nos
alimentos que consumimos, nas festas populares,
nas religiões e em outras formas de manifestações
culturais que adotamos.
Neste contexto, a presente pesquisa tem como
objetivo principal investigar se os professores tem
conhecimento sobre a Lei 10.639 e se aqueles que a
conhecessem, a colocam em prática de forma correta
em algumas da escolas públicas de Ponte Nova,
cidade em que leciono e resido desde que nasci. Os
objetivos específicos deste trabalho são verificar se os
professores tem conhecimento sobre a Lei 10.639,
e se as escolas tem momentos de formação sobre a
mesma. Além disso, tem se a intenção de analisar a
forma como a Lei é colocada em prática.
Tendo por base a lei 10.639/03 o problema da
pesquisa é identificar como os professores do Ensino
Fundamental e Médio da rede pública de Ponte Nova
(MG) trabalham a temática da diversidade racial na
escola. Neste contexto, a pesquisa busca saber se os
professores tem conhecimento sobre essa lei, se as es-
colas abrem espaços para discussões e, principalmen-
te, como os educadores levam a temática para as suas
aulas e como eles lidam com as atitudes discriminató-
rias dos estudantes.
A inquietude surgiu ao longo da graduação,
89
cursado em uma instituição federal de Ensino
Superior, em que as disciplinas ligadas à Licenciatura
não discutiram a Lei 10.639 e suas possibilidades. Para
muitos docentes, o conhecimento sobre a Lei 10.639,
só veio por meio de cursos de especialização e outros
momentos de formação, desvinculados das atividades
da graduação. Neste contexto, o professor que sai de
um curso de licenciatura que omitiu algumas leis e
regimentos importantes, no âmbito educacional, acaba
reproduzindo o que a escola já faz a muito tempo. Tal
fato contribui para que a lei ainda seja considerada
um “amontoado de palavras” para alguns docentes
e, muitas vezes, a culpa por essa leitura errônea ou
mesmo o desconhecimento não é apenas deles.
Fundamentação teórica
No debate sobre a inserção das relações étnico-
-raciais na educação, Abreu (2008, p.06) afirma que
as mesmas se tornaram mais frequentes na década de
1990, com a elaboração de leis específicas criadas pelo
Ministério da Educação (MEC). Essa normatização é
fruto das lutas de vários movimentos sociais e repre-
senta um passo importante para auxiliar na democra-
tização e na extinção de desigualdades, principalmen-
te daquelas vinculadas à raça que perdura por séculos
em nossa sociedade. Na perspectiva desse mesmo au-
tor, a discriminação racial no Brasil se faz presente
em todos os ambientes, passando pelos mais simples
até os mais requintados, e o ambiente escolar não foge
à essa regra, pelo contrário, muitas vezes se torna o
local onde a mesma se manifesta cada vez mais cedo.
O autor ainda lembra que a discriminação racial, não
está atrelada somente ao desprezo por determinada
cor de pele, mas também se caracteriza pela desva-

90
lorização da cultura de origem africana e pela recusa
em reconhecer o negro como ator social importante
na constituição da sociedade brasileira.
A Lei 10.639/03 é fruto de uma longa luta por
igualdade racial e, principalmente, pela valorização da
cultura afro-descendente. Mas, a promulgação dessa
lei não significou a imediata inserção prática da mes-
ma nos ambientes escolares. Ainda há resistência ou
mesmo equívocos em relação a sua real intencionali-
dade.
Para Teruya e Felipe (2010, p.251) a Lei 10.639/03
é uma forma de romper com os discursos eurocêntricos
e auxilia na construção de uma educação antirracista
pautada na igualdade entre todos sem distinção de
credo, cor ou classe social. Os autores ainda afirmam
que as alterações ocorridas no currículo escolar não
foram alcançadas com facilidade, foi preciso muita
dedicação e empenho de movimentos sociais e de
outros órgãos que se engajaram na temática.
O Movimento Negro Unificado (MNU), segundo
Teruya e Felipe (2010, p.252), teve papel de destaque
na década de 1970 em São Paulo, pois ele denunciava
a existência de racismo no Brasil questionando a falsa
Teoria da Democracia Racial, que pregava que os bra-
sileiros não adotavam posturas discriminatórias e que
não havia conflitos raciais explícitos em nossa nação.
Além disso, esse grupo trabalhou para a construção de
uma imagem positiva do negro e da sua importância
para a sociedade brasileira. Para o MNU não basta-
va apenas identificar atos racistas, mas era necessário
combatê-los em sua raiz e não há ambiente mais pro-
pício e eficaz para iniciar essa luta do que na escola,
local em que os futuros cidadãos são moldados e cons-
truídos. Para tanto, havia a necessidade de repensar

91
os currículos escolares porque os mesmos ignoravam
a cultura africana e sua importância para nossa socie-
dade, o que culminava na formação de uma identida-
de negativa sobre o negro, reforçada pela visão euro-
cêntrica, calcada na figura do escravo submisso, cuja
cultura e costumes não deveriam ser valorizados e se
quer considerados.
Silva (1998 p.203) compartilha da mesma con-
cepção de Teruya e Felipe (2010, p. 251) ao afirmar
que as minorias (negros e indígenas, principalmente)
são desprezadas no ensino escolar brasileiro, por isso
há a necessidade de se repensar o currículo escolar.
As imagens dos materiais didáticos reduzem essas
minorias às imagens pejorativas, estereotipadas e pre-
conceituosas não contemplando sua real função en-
quanto sujeito histórico e cultural.
Neste contexto a figura do professor, entendido
como um agente transformador e mediador no
processo de ensino-aprendizagem, capaz de promover
e construir mudanças nas atitudes dos seus alunos
e daqueles que estão ao seu redor é essencial. Para
tanto é necessário que o professor deixe de ser um
agente passivo, que apenas recebe as informações e
as transmite, ele tem que ser em sua essência um
pesquisador que busca a todo instante se reciclar,
se renovar, conhecer de verdade as novas leis
educacionais vigentes para colocá-las em prática na
sala de aula de maneira coerente e condizente com a
realidade de seus alunos
Podemos afirmar que a Lei 10639 é uma con-
quista que deve ser entendida, no contexto escolar e
social, não como uma punição, mas como um instru-
mento de formação de um cidadão mais consciente,
mais humanizado, capaz de ver no outro não “ser hu-

92
mano de cor”, mas como um sujeito que contribuiu
muito para a constituição de nossa sociedade em to-
dos os sentidos, ele veio para ser escravizado sim, mas
sua contribuição em termos culturais e sociais foi bem
maior e mais relevante que este fato.
E como afirma Gomes (2010, p.83), uma educa-
ção voltada de verdade para a libertação e a constru-
ção de uma sociedade mais igualitária é aquela que
se compromete a fazer com que seus alunos avaliem
e questionem suas próprias atitudes e que, principal-
mente, tenha o poder de provocar transformações em
posturas discriminatórias e que compreendam e valo-
rizem as diferenças como um fator que enaltece nossa
história.
Metodologia
O primeiro momento do trabalho contemplou a
pesquisa bibliográfica. Dentro deste contexto, houve
uma revisão de literatura mais abrangente sobre a Lei
10.639/03, a formação de professores e as relações
étnico-raciais no ambiente escolar. Nesta perspectiva,
foram utilizados textos e artigos de alguns autores
que fazem uma discussão sobre a temática abordada
no trabalho. A utilização desses materiais teve como
objetivo principal auxiliar a busca pela resposta da
pergunta geradora que norteia toda à pesquisa: A Lei
10.639/03 é colocada em prática de forma coerente
nas escolas públicas de Ponte Nova?
No segundo momento foi realizada uma
pesquisa de campo, ou seja, foram feitas visitas a
quatro escolas públicas com os maiores números
de alunos da cidade. Nessas visitas foram aplicados
questionários e houve uma conversa informal com
os professores sobre a temática. Por questões éticas
o nome das escolas será preservado, assim, as escolas

93
foram nomeadas da seguinte forma: a Escola Azul,
Escola Verde, Escola Vermelha e Escola Amarela.
Sendo importante ressaltar que só participaram das
entrevistas os professores que quiseram colaborar por
livre e espontânea vontade.
Na escola Azul, os professores foram entrevistados
durante o recreio no decorrer de uma semana. Nesta
escola, houve a participação de trinta e dois professores
de áreas e de turnos diferentes, ou seja, da manhã, da
tarde e da noite. A escola atende, aproximadamente,
mil e quinhentos alunos do Ensino Fundamental II
(sexto ao nono ano), Ensino Médio (primeiro ao
terceiro ano) e ainda o período integral. Já a Escola
Verde, atende cerca de quatrocentos alunos do Ensino
Fundamental, Médio e Período Integral no período
diurno e vespertino. As entrevistas foram realizadas
no momento de intervalo dos professores, também
durante uma semana, sendo que foram entrevistados
vinte e três professores.
As entrevistas na Escola Vermelha foram
realizadas durante uma semana também, nos turnos
da manhã e da tarde nos momentos de recreio. A escola
atende seiscentos alunos do Ensino Fundamental
II e Médio. Nesta escola, vinte e sete professores se
prontificaram a responder o questionário. A Escola
Amarela é a única da rede municipal e a que concentra
o maior número de alunos atendidos pelo município.
As outras três escolas pesquisadas são da rede
estadual. A Escola Amarela atende aproximadamente
mil alunos somente do Ensino Fundamental II (sexto
ao nono ano) e funciona apenas no turno da manha e
da tarde. Nesta escola trinta professores colaboraram
com a pesquisa.
Por fim, as informações coletadas nos questio-
nários e nas conversas informais com os professores
94
foram sistematizadas originando um banco de dados
que será exposto no próximo tópico. Mais além as in-
formações e dados sistematizados em campo foram
confrontados com a bibliografia e fundamentaram a
presente pesquisa.
Resultados e discussões
Os questionários foram respondidos por 112
docentes que atuam em todas as áreas do conheci-
mento, como por exemplo, Biologia, Geografia, Mate-
mática e História, sendo que alguns se formaram em
universidades federais e outros em faculdades priva-
das a distância ou presencialmente. A pesquisadora
fez questão de entrevistar professores de formações
diferentes, pois acredita que a implementação da Lei
10.639/03 deve ser uma construção coletiva entre os
educadores, não cabendo somente ao professor de
História essa função. Além disso, é importante salien-
tar que participaram da pesquisa, docentes contrata-
dos e efetivos sem a preocupação em diferenciá-los.
A primeira questão indagava sobre o tempo de
serviço dos professores, trinta e cinco professores
tem menos de dez anos de sala de aula, quarenta e
cinco possuem entre dez e vinte anos de atividade
e o restante, ou seja, trinta e dois estão próximos da
aposentadoria.
Quando o assunto foi o conhecimento sobre a
Lei 10.639/03, setenta e três educadores alegaram
não conhecê-la, apenas 15 disseram que a conheciam
de fato e vinte e quatro disseram que “ouviram falar”,
mas não procuraram saber do que se tratava. Sobre a
presença de racismo na escola, a maioria dos profes-
sores reforçou a ideia de Teoria da Democracia Social,
afirmando que seus alunos não expressam sentimen-
tos racistas em suas palavras, o que a maioria dos do-
centes relata é que meras brincadeiras de mau gosto,
que são consideradas sem importância e até consen-

95
tidas por aqueles que são alvo das mesmas. Uma pe-
quena minoria de professores entende essas atitudes
como um desrespeito ao outro que deve ser discutido
no meio escolar.
Como a maioria dos professores não conhecia
de verdade a Lei 10.639/03 foi necessário fazer uma
pequena explicação sobre a mesma para que eles
pudessem responder às questões que se seguiam. Em
relação aos momentos de formação para docentes
sobre a temática, a maioria dos professores alegou que
tanto o município quanto o estado oferecem raramente
esses momentos, e que eles não são obrigatórios, e que
normalmente a maioria dos docentes não participa
por falta de tempo ou por negligência mesmo. Sobre
os momentos de discussão entre os professores de
cada escola, aqueles que lecionam a mais tempo
disseram que quando a Lei foi decretada no final de
2003, muitas escolas tiveram sim esse momentos de
formação. Mas com o tempo, a discussão a respeito da
Lei se reduziu a semana da Consciência Negra ou ao
Dia da Abolição da Escravidão, que são denominados
de projetos. Nesta perspectiva, como verificado em
campo, as escolas transformaram a Lei em um evento
anual, desconexo, que muitas vezes se resume a
apresentações sobre as principais personagens dessas
datas importantes. Não há espaço para uma conversa
sobre diversidade, sobre a importância de respeitá-la
e tampouco sobre a importância dos africanos para a
nossa sociedade.
Sobre a postura dos professores em sala de
aula sobre possíveis atitudes racistas, a maioria disse
que seus alunos como já foi dito, demonstra muito
pouco esse tipo de atitude. Quando as mesmas são
diagnosticadas como verdadeiras, a atitude do docente
se resume a recriminar o aluno e a continuar sua aula
normalmente. O assunto não é discutido de forma
aberta pelos professores, principalmente, os da área

96
de exatas (Matemática, Física, etc) que acreditam
que tal tarefa é função do professor de História ou da
área de Humanas, pois alguns professores julgam que
se a temática está dentro da grade curricular de uma
disciplina, ela deve ser explorada por aquele docente
de forma isolada.
Quando perguntados se havia a preocupação
em produzir murais com imagens que abordassem a
diversidade, se nas salas de aula os professores tinham
esse cuidado de mostrar figuras que enaltecem a
figura tanto de negros quanto de brancos. A resposta
foi negativa, que na maioria das vezes na sala de aula,
o professor utiliza a imagem que o livro didático trás de
forma mecânica e sem um senso crítico. Apenas vinte
e dois disseram que havia esse cuidado sim e que não
concordavam com as imagens algumas coleções de
livros disponibilizam para seus alunos.
O último assunto tratado na pesquisa foi as pos-
síveis sugestões de mudança na conduta dos profes-
sores para melhorar a abordagem da Lei 10.639/03
nas escolas. Alguns professores disseram que poderia
haver mais momentos de discussão sobre o assunto
em seminários ou eventos organizados pelo estado
ou município. Um grupo destacou a importância do
cursos de pós graduação com a temática que estão se
espalhando pelo país que são oferecidos de forma gra-
tuita pelas universidades federais. Outros foram bem
pontuais e apontaram a necessidade do professor se
mover, de procurar conhecimento por conta própria
e organizar grupos de estudo nas escolas em que es-
tão inseridos. Houve aqueles que disseram os projetos
desenvolvidos pelas escolas são importantes sim, mas
que eles tem que ser repensados e direcionados para
ações mais concretas e aproximadas da realidade de
seus alunos.
Considerações finais

97
A intenção dessa pesquisa não é colocar o
professor como o culpado pelas limitações que a
Lei 10.639/03 sofre, pelo contrário, o objetivo desse
trabalho é chamar a atenção para as reais necessidades
dos docentes, de como momentos de discussão e
reflexão sobre a temática são tão importantes para
a formação de um professor capaz de promover
mudanças efetivas em seus estudantes. O professor
tem que deixar a zona de conforto, ele tem que ser
pesquisador, tem que se interar sobre o que de novo
tem em sua área, mas ele também precisa de suporte
profissional para isso. Algumas coisas já tem sido feitas
pelos órgãos públicos, mas nunca é de mais investir
em educação, um dos exemplos são cursos de pós
graduação que são oferecidos de forma gratuita para
docentes da rede pública, mas ainda a muito que
caminhar.
A escola é um espaço aberto às transformações,
em que ideias e concepções podem ser desconstruídas
e construídas com facilidade, e é onde a diversidade
se faz presente em todos os sentidos, não podemos
deixar que nossos alunos transformem esse lugar em
palco para a celebração de racismos e outras atitudes
discriminatórias. Para se construir, digo construir
pois o estudante é um ser em desenvolvimento que
é capaz de transformar a realidade em que está
inserido, cidadãos compromissados e aptos a mudar as
atitudes dos indivíduos que convive e a contribuir para
a construção de uma sociedade mais justa e igualitária
é preciso que seus docentes sejam capacitados para
esta tarefa.
Mas a escola sozinha não é capaz de promover
essas transformações, é preciso desconstruir mitos,
transformar ideias em ações concretas e para isso
conhecer as ferramentas que podem nos auxiliar
é indispensável. A jornada extensa de trabalho
dos professores é um empecilho, mas ele pode ser

98
contornado com um pouco de boa vontade e dedicação.
A família também tem que se fazer presente, a escola
educa para a vida, mas incutir valores é um dever
familiar.
Respondendo a pergunta que norteia a
pesquisa. Infelizmente, boa parte dos professores
das escolas pesquisadas ainda precisa aprimorar
seus conhecimentos sobre a Lei 0.639/03. Como
aponta os questionários respondidos pela maioria dos
professores, algumas escolas tentam, mas acabam
reproduzindo as atividades mecânicas, que celebram a
abolição da escravatura, por exemplo, mas que pecam
por não discutirem a importância do negro para a
constituição social e cultural de nosso país e o quanto
a diversidade deve ser valorizada em nosso cotidiano.

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266, set.2010 - ISSN: 1676-2584.

Anexo – QUESTIONÁRIO RESPONDIDO


PELOS PROFESSORES:

1-Há quanto tempo você leciona?

( ) Menos de dez anos.


( ) Entre dez e vinte anos
( ) Mais de vinte um anos.
Disciplina______________________
2-Você já presenciou atos racistas entre alunos?

( ) Sim.
( ) Não.
( ) Não tenho certeza.
3-Você conhece a Lei 10.639/03?

100
( ) Sim.
( ) Não.
( ) Apenas ouvi falar.
4-Você já participou de alguma formação conti-
nuada de professores sobre o tema “ Ensino de
História Afro brasileira e Africana”?

( ) Sim.
( ) Não.
5- E na escola, há momentos de discussão sobre
essa temática (grupos de estudo,etc..)?

( ) Sim.
( ) Não.

Quando? __________________________________
___________________________________________
___________________________________________
6-Há planejamento e realização de projetos in-
terdisciplinares sobre esse tema na escola?

( ) Sim.
( ) Não.
Qual? _____________________________________
___________________________________________
7-Como é que você trata do assunto em sala de
aula?

___________________________________________
___________________________________________

101
8-A discriminação racial é assunto abordado
criticamente durante as aulas?

( ) Sim.
( ) Não.
9-Os murais da escola, em termos de imagens,
contemplavam a diversidade étnica racial da
comunidade escolar?

( ) Sim.
( ) Não.
10-As/os estudantes estão mobilizados para
a eliminação de práticas discriminatórias no
ambiente escolar?

( ) Sim.

( ) Não.
11-Quais as práticas que poderiam ser aplicadas
nas escolas para colaborar na implementação
da Lei 10.639\03?

___________________________________________
___________________________________________

12-Quem deveria ser o responsável por elas?

( ) Professores de todas as áreas trabalhando em


conjunto.
( ) Os pedagogos da escola.
( ) O professor de História.

102
EDUCAÇÃO E CULTURA: PROMOVENDO A DI-
VERSIDADE ÉTNICA, CULTURAL E RACIAL
NAS ESCOLAS DE LAGOA DOURADA (MG)

Viviane Aparecida de Oliveira (UFOP/UNIAFRO) 1


Paulo Alberto Dos Santos Vieira (Orientador) 2

Resumo
Este artigo discute os desafios que as escolas
municipais Angelina Medrado e Maria Marcília de
Rezende de Lagoa Dourada - MG encontram para
trabalhar a diversidade étnico-racial e social na sala
de aula. E assim fazer as adequações necessárias no
currículo escolar e no projeto político pedagógico,
de forma que promova uma educação diferenciada,
tendo como alvo a redução da defasagem escolar.
Principalmente daqueles alunos oriundos de turmas
multisseriadas do campo, com dificuldades de
aprendizagem, corrigindo as distorções de idade/série
dos mesmos através do PAV (Programa Acelerar para
Vencer), Tempo Integral - Programa Mais Educação.
E assim colocar em evidência a Lei 10639/2003
apontando as reais contribuições dos negros para a
história social, cultural e econômica de Lagoa Dourada
e também aplicar a Lei 11645/2008 principalmente
para o resgate da memória cultural indígena, visto
que em Lagoa Dourada houve várias tribos indígenas
e a partir delas surgiram algumas das comunidades
rurais do município. Ao aplicar estas Leis à escola
estará contribuindo para firmar a identidade étnica,
social e cultural dos alunos, além de transformar o
ambiente escolar num espaço representativo na luta
1-Universidade Federal de Ouro Preto, Curso de especialização UNIAFRO:Promoção da
Igualdade Racial na Escola.
2-Professor orientador deste trabalho de conclusão de Curso de Especialização.

103
contra o preconceito étnico-racial e social, acolhendo
as manifestações culturais, sociais e étnicas de
suas comunidades e respeitando a diversidade que
circunda no contexto escolar. E desta forma trabalhará
as diretrizes curriculares que o MEC dispõe sobre a
diversidade na escola. E ao explorar as relações étnicas,
raciais e culturais na mesma, promove a integração da
comunidade-escola tendo em vista a disseminação do
conhecimento e a propagação do saber em virtude dos
alunos lagoenses. Consequentemente irá transformar
a escola e a comunidade num espaço articulador de
conhecimento, equidade, justiça social e cultural que
visam à socialização e a construção de um novo olhar,
que reflete nas ações de toda a comunidade escolar.
Palavras-chave: Diversidade Étnica Social, Cultural
e Racial; Preconceito e Escola.
Introdução
Este trabalho tem como tema a História, Cultura
e Diversidade étnica e racial, nas duas maiores
escolas da rede Municipal de Ensino de Lagoa
Dourada: a Escola Municipal Angelina Medrado, que
no ano escolar de 2014 contava com 1236 alunos
matriculados, e a Escola Maria Marcília de Rezende
no povoado do Arame, com 624 alunos matriculados.
Estas escolas recebem alunos dos povoados:
Abóboras, Arame, Bandeirinhas, Bela Vista, Cachoeira
dos Forros, Cafundó, Catauá, Córrego das Figueiras,
Curralinho das Gameleiras, Curralinho dos Machados,
Diamante, Engenho, Laranjeiras, Jacu, Matatu,
Melos, Mutuca, Paiol Velho, Ressaca, Rochedo, Rosas
e Sítio Novo. Portanto, a diversidade étnica, social e
cultural representada em sala de aula é grande, o que
faz estas duas unidades educacionais interessantes

104
para o objeto de pesquisa.
De acordo com o PLANO MUNICIPAL DE EDU-
CAÇÃO (2015, p.74-75) em Lagoa Dourada em 2014
havia 2394 alunos matriculados no município, nas re-
des Municipal e Estadual de ensino. Sendo que a rede
Municipal de ensino é responsável por mais de 80%
dos alunos matriculados, e atende desde a Educação
Infantil até o Ensino Médio e a Educação de Jovens e
Adultos (EJA).
Um dos maiores desafio do município em aplicar
as Leis 10639/2003 e 11645/2008 é a inflexibilidade
curricular para atendê-las. Da mesma forma, a forma-
ção profissional na temática, e o Projeto Político Peda-
gógico em vigor que ainda não atende esta demanda.
Lagoa Dourada é uma cidade pequena com
aproximadamente com 13000 habitantes, foi uma ci-
dade rica em manifestações culturais afrodescenden-
tes como artesanato, capoeira, congada, culinária e
outras essa diversidade se deve a sua formação inicial
como cita o PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
(2015, p.42) de acordo com um censo realizado pelo
juiz de paz em 1831, na cidade de Lagoa Dourada ti-
nha 1207 pessoas livres e 954 cativos, totalizando 2161
moradores. E muitas dessas manifestações foram per-
didas ao longo dos anos, o que faz entender que uma
das possíveis causas é o fato dos negros ainda serem
submissos, pois a maioria ocupa profissões de baixa
remuneração, têm baixa escolaridade, politicamente
não são ativos e se encontram na zona rural da cida-
de. Outro fator é que eles não se impõem enquanto
cidadãos, visto que nestes 103 anos de emancipação
política ainda não teve nenhum líder negro na polí-
tica, ou em movimentos sociais, ou ocupando algum
cargo público, salvo que atualmente há dois diretores
de escola negros.
105
Em pesquisa realizada com os alunos das escolas
Angelina Medrado e Maria Marcília 20% deles não se
reconhecem como negros, ou descendentes de negros,
mesmo que tenham traços físicos como cabelo, cor da
pele que nos remete aos africanos ou descendentes da
África. Quando alguns desses alunos foram abordados
sobre o porquê de não se aceitarem como negros, eles
alegam preconceito, discriminação e principalmente
falta de representatividade política, social e cultural,
uma vez que a presença marcante do Movimento
Negro em Lagoa Dourada foram as Irmandades de
Santa Ifigênia, São Benedito e do Rosário que existiram
até o inicio do século XX.
Portanto resgatar as manifestações culturais per-
didas é um desafio que a cidade tem. Sobretudo fazer
que os alunos reflitam sobre a sua ancestralidade e
veja nela elementos que os façam firmar a sua identi-
dade, enquanto cidadãos participativos e interativos, e
que tenham história e corroborem com o meio em que
estão inseridos.
Evasão e distorção de Idade/Série: desafios
para democratizar o ensino
É preciso empreender no ensino ações que
promovam a igualdade entre os alunos, para que eles
aprendam a respeitar a diversidade étnica não só em
sala de aula, mas na sociedade.
E desta forma fazer com que eles sintam integra-
dos, respeitados e acolhidos pela escola é uma medida
que visa inserir este aluno no contexto social, princi-
palmente os da zona rural e da periferia. Porque eles
são vítimas das desigualdades sociais, econômicas e
muitos da ausência de uma estrutura familiar sólida,
o que reflete na sala de aula como falta de discipli-
na, desinteresses, dificuldade de aprendizagem ou de

106
concentração para apreender o que é transmitido etc.
Por isso a escola é decisiva na vida destes alunos,
reprová-los é uma porta que se abre para a exclusão
social, e para a ampliação dos índices negativos sobre
os negros que afligem o sistema educacional brasileiro
como nos apresenta Flúvia Rosemberg:
(...) como nas outras esferas negros
(pretos e pardos) são também os mais
penalizados no plano da educação: en-
frentam maiores dificuldades de aces-
so e permanência. (...) eles têm o ritmo
de progressão mais lento e acidentado
(...) apresentam os maiores índices
educacionais como analfabetismo, fal-
ta de instrução (...) a discriminação
ocorre mais intensamente dentro da
escola por meio de frequentes repro-
vações (...). Isto é, sempre os alunos
negros evidenciam atraso escolar mais
significativo do que os brancos, mesmo
quando se comparam entre si alunos
que só estudam ou os que trabalham
e estudam ao mesmo tempo (ROSEM-
BERG, 1998, p.79-81).
Portanto estes dados apontam para uma realidade
educacional, que não pode mais ser ignorada. Por
isso a escola ao identificar estes alunos, tem que ser
cautelosa, para não reproduzir ou acentuar esse estigma
desfavorável aos negros e pardos, representados pelas
constantes reprovações, que muitas vezes transforma-
se no estopim para o abandono escolar.
Quando isso acontece é uma denuncia que aluno
precisa de socorro, e o desafio da escola é acolher este
aluno e oferecê-lo uma assistência multifuncional
e profissional como a oferecida pelo Ciape (Centro
Interdisciplinar de Apoio Pedagógico ao Estudante).

107
Os alunos encaminhados ao Ciape têm um apoio
pedagógico, psicológico e outros é uma alternativa que
a Secretaria Municipal de Educação encontrou para
auxiliar a escola com este aluno especial.
Porque chegou ao consenso da necessidade de
humanizar o atendimento a esse aluno com o intuito
de reduzir a diferença social, cultural e intelectual do
mesmo, e assim quebrar o ciclo das injustiças que os
quais são submetidos.
Com este apoio multidisciplinar e profissional
oferecido pelo Ciape, juntamente com a Secretaria
de Educação e as escolas têm um desafio maior de
enfrentar os problemas sociais de seus alunos. Con-
sequentemente fazer com que estes permaneçam
na escola, buscando promover a inclusão cultural,
étnica e social. Já que constata uma grande defasa-
gem de aluno por série de acordo com os estudos do
Plano Municipal de Educação só 67,8% dos alunos
concluem o Ensino Fundamental antes dos 16 anos,
74,4% dos alunos entre 15 e 17 anos frequentam o
Ensino Médio. E quando se trata da população negra
entre 25 e 29 anos, 1,5% não conta com nenhum nível
de escolaridade, 84,1% estão fora da escola e apenas
5,7% possuem o ensino superior completo.
Para os alunos que estão com defasagem de
série e aprendizagem uma das medidas adotadas pelo
município para sanar essa discrepância no ensino
fundamental foi o PAV (Projeto Acelerar para Vencer),
regulamentado pelo DECRETO MUNICIPAL DE Nº
1630 de 02 de Janeiro de 2012
Art. 23 – Aos alunos do Ensino Regular
que estão com defasagem série/idade
será oferecido um Projeto especial de
ensino denominado PAV - Programa
Acelerar para Vencer, que compreen-

108
de os seguintes níveis: Parágrafo pri-
meiro – PAV I – Alunos a partir de 13
anos de idade.PAV II – Alunos a partir
de 15 anos de idade.Parágrafo segundo
– As escolas municipais que adotarem
o Projeto de ensino PAV se orientarão
pelo Projeto Pedagógico oferecido pela
SME (SECRETARIA MUNICIPAL DE
EDUCAÇÃO, 2012, P.6).
Este projeto veio acolher estes alunos, mas o que
percebe-se é que 60% deles são da zona rural oriundos
de turmas multisseriadas e da periferia. O PAV nem
sempre atinge o seu objetivo que é fazer este aluno
avançar nos estudos. Nestas turmas os alunos acabam
segregando, pois encontram sérios problemas de com-
portamento, aprendizagem e bullying o que desesti-
mula mais estes alunos, o que faz muitos abandona-
rem os estudos antes mesmos de concluir o Ensino
Fundamental.
Mesmo quando estes alunos concluem o Ensino
Fundamental, eles não dão sequência aos estudos. Na
escola Maria Marcília desde 2012 trabalha com o PAV
e dos muitos alunos que fizeram esta modalidade, há
apenas uma aluna concluindo o Ensino Médio.
Em 2014 na mesma escola os 15 alunos rema-
nescentes do PAV que se matricularam no Ensino Mé-
dio todos abandonaram antes de concluir o ano. A es-
cola tem um duplo desafio com estes alunos oferecer
a eles um ensino motivador e que realmente faça sen-
tido para a vida deles, reconhecendo principalmente
aqueles que têm Necessidades Educativas Especiais
(NEE). Ao identificar estes alunos, é importante tra-
zer a família para escola e juntos conscientizá-los da
importância de manter até o fim do ciclo da educação
básica.

109
Entretanto muitos desses alunos abandonam
o estudo para trabalhar, e muitas vezes a escola vai
até eles e tenta convencê-los a retornar para a sala
de aula. Mas não encontram o apoio necessário dos
familiares para que isso aconteça.
Contudo é preciso conscientizar alunos e fami-
liares que o trabalho infantil, seguido de abandono es-
colar, pode trazer consequências irremediáveis como
a perpetuação do ciclo do analfabetismo. Principal-
mente o analfabetismo funcional, a precariedade do
trabalho e até mesmo o desemprego futuro por falta
de qualificação e outras consequências como a vulne-
rabilidade, a marginalidade, e ao uso de drogas, reali-
dade esta que já se faz presente no contexto escolar.
Agindo assim a escola está
(...) assumindo a realidade do aluno e
valorizando as diferenças individuais,
que pode resolver diminuir a intensi-
dade ou, ainda, evitar que se acentuem
as dificuldades enfrentadas por alunos
“comuns”, mas portadores de NEE.
(...) (FELTRIN, 2007, p.25).
Segundo Feltrin (2007, p.25-26) estes alunos
que não são portadores de deficiência física e mental,
mas são excluídas por causa da indisciplina, aprendi-
zagem, etnia e classe social merecem atenção e cuida-
do por parte de todos da comunidade escolar. A partir
da realidade vivenciada com estes alunos a escola co-
locará em prática o conceito da diversidade e acolherá
cada educando com suas especificidades, porque ela
foi feita para ser heterogênea, para acolher seus alu-
nos diferentes e com tratamento diferente exercendo
efetivamente a democracia escolar.

110
A aplicação da lei para consolidar a diversidade
étnica na escola
Ao aplicar a Lei 10639 na escola estará ofertan-
do aos alunos uma educação que convida para um
olhar crítico sobre as questões relacionadas com a
construção de nossas identidades individuais e cole-
tivas, fazendo delas uma fonte de riqueza e de desen-
volvimento individual e coletivo (MUNANGA, 2008,
p.1), e através da valorização da identidade podemos
despertar em nossos alunos o desejo de transformar a
realidade social que os quais estão inseridos. E desta
forma, estará promovendo políticas sociais que visam
mantê-los em sala de aula, por mais tempo e fazer
com que eles cheguem com êxito ao fim do ciclo da
educação básica.
Será uma conquista social para o município
principalmente para o desenvolvimento humano.
Este, por sua vez, será o primeiro passo para o desen-
volvimento econômico, pois, uma vez contando com
mão de obra qualificada, novas oportunidades de tra-
balho e de desenvolvimento social e econômico pode
ser inauguradas. Este desenvolvimento pode ser tanto
na indústria, na agricultura, quanto nas atividades ar-
tesanais tão presentes na cidade.
Consequentemente, a aplicação das Leis
10639/2003 e 11645/2008 em sala de aula tornam-
-se imprescindíveis para que os alunos conheçam a
história da cidade. Porque irá ressaltar a importância
dos muitos escravos e índios que aqui viveram e dei-
xaram as suas marcas para a arquitetura, agricultura
e a economia. Desta forma todos poderão conhecer,
orgulhar-se e, sobretudo desmistificar os preconceitos
existentes, e assim, valorizar a miscigenação étnica
que é tão marcante.

111
Porque Lagoa Dourada representa a sociedade
étnica brasileira discursada por Munanga, pois nesta
cidade teve europeus, índios e negros.
Os povos indígenas de diversas origens
étnicas, os europeus de diversas ori-
gens étnicas, os africanos escravizados
de diversas origens étnicas ou cultu-
rais, todos sem exceção deram suas
notáveis contribuições na formação
do povo brasileiro, na construção de
sua cultura e de sua identidade plural
(MUNANGA, 2008, p.3).
É importante ter no currículo escolar conteúdo
que emprega a diversidade étnica, cultural e social.
Pois através do conhecimento da história é possível
informar e formar cidadãos íntegros e capazes de
respeitar a diversidade além de compreender que
são frutos desta miscigenação da qual é formada a
sociedade brasileira.
Trabalhar a educação voltada para o resgate da
identidade étnica, de nossos alunos, é promover uma
educação inclusiva, que os acolham juntamente com
seus familiares a sua história e a sua cultura. E desta
forma fazer que todos sintam integrados no contexto
escolar, independentemente de suas crenças e etnias.
Isso é possível com a soma de esforços de toda a
comunidade para reconstituir a nossa história, e
valorizar o nosso passado, porque conhecê-lo é o jeito
mais eficaz para desenvolver cidadãos conscientes e
participativos, porque irão firmar a identidade étnica
e social dos alunos e seus familiares.
Por isso que trabalhar no currículo as demandas
étnico-raciais a partir do contexto peculiar do aluno,
estará contemplando a diversidade que é encontrada
em sala de aula e também aplicando as Leis 10.639/03

112
e 11645/2008 no currículo escolar.
Essa diversidade se deve a extensão territorial do
município que é de 476 km², e dos seus diversos po-
voados de zona rural. Portanto essa variedade encon-
trada em sala de aula mostra a importância de incluir
a história e a cultura Afro-Brasileira no currículo, e
fazer as adequações no Projeto Político Pedagógico
das escolas Angelina Medrado e Maria Marcília tendo
como base:
O § 2º da Resolução nº 1, de 17 de ju-
nho de 2004 do Conselho Nacional de
Educação (CNE), versa que o ensino
de história e Cultura Afrobrasileira e
Africana objetiva o reconhecimento
e a valorização da identidade, da his-
tória e da cultura dos afro-brasileiros.
Além disso, garante o reconhecimento
e a igualdade de valorização das raízes
africanas da nação brasileira ao lado
das indígenas, européias e asiáticas.
A autonomia dos estabelecimentos de
ensino para compor os projetos peda-
gógicos, no cumprimento do exigido
no artigo de Lei citado, permite que
se valham da colaboração das comu-
nidades a que a escola serve, do apoio
direto e indireto das universidades, do
Movimento Negro, de grupos de capo-
eira ou congada, entre outros, portan-
to, propicia um momento de interação
escola/comunidade (BORGES, 2010,
p.72-73).

Para efetivar o ensino da História da Cultura


Afro-Brasileira é necessária a colaboração de todos
da comunidade escolar, juntamente com os grupos
e movimentos sociais. Segundo Borges, viabilizar a

113
democratização do ensino é fundamental para que
se construa uma educação justa e com equidade que
faça a diferença na vida dos educandos, embasada
nos pilares de um alicerce edificado nos valores éticos
e morais, habilidade para empreender e cooperar
na construção de uma sociedade democrática, e
conhecimento para discernir os preceitos para erguer
uma sociedade com igualdade e equidade.
Com o ensino da história e da Cultura Afro-
Brasileira e Indígena na escola apresentará aos alunos
três princípios motivadores “o princípio da consciência
política e histórica da diversidade; o do fortalecimento
de identidades e de direitos; e o das ações educativas de
combate ao racismo e às discriminações” (BORGES,
2010, p.74-75). Sob essas perspectivas relacionadas
à diversidade étnica, articulará o conhecimento
histórico, social e político para que os alunos se
posicionem criticamente diante de situações adversas
e criem mecanismos para se afirmarem enquanto
cidadãos de direito, que lutam por seus ideais e, acima
de tudo respeitam a diversidade étnico-racial.
Sendo assim espera-se que eles entendam e
compreendam a grandeza do país que é acolhedor e
disseminador de cultura desde suas origens, o que faz
compreender e reconhecer a grandeza da identidade.
Uma vez que esta é fundamental na formação do
indivíduo, portanto ela não deve ser compreendida
como uma afabilidade que se faz a alguém, e sim
uma necessidade humana. Por isso que é essencial o
conhecer e o valorizar o pluralismo étnico e cultural
da formação da sociedade brasileira, com o objetivo de
firmar a identidade da comunidade escolar.
Uma vez que a escola ao agregar em seu
currículo a discussão do multiculturalismo, ela estará

114
aplicando o conhecimento que visa o “princípio do
fortalecimento de identidades e de direitos, o que deve
orientar o desencadeamento do processo de afirmação
de identidades, de historicidade negada ou distorcida,
e o combate à privação e à violação de direitos”
(BORGES 2010, p.75). Dessa forma, é crucial que
se traga para a realidade em sala de aula a história
e a cultura dos alunos, para que eles se reconheçam
como agentes da representatividade social, cultural
e intelectual na sociedade. E assim conscientizar
os educandos da importância das influências que
a cultura africana e indígena exerce na sociedade,
disseminando a diversidade étnica, cultural e social.
Educação e cultura: a diversidade na promoção
do indivíduo
Em Lagoa Dourada a Educação de Tempo
Integral vem desenvolvendo medidas sócio-educativas
em parceria com o Programa Mais Educação do
Governo Federal, conforme o Decreto nº 7.083, de 27
de janeiro de 2010, que dispõe sobre o programa Mais
Educação que
O desenvolvimento de atividades de
acompanhamento pedagógico, expe-
rimentação e investigação científica,
cultura e artes, esporte e lazer, cultura
digital, educação econômica, comuni-
cação e uso de mídias, meio ambiente,
direitos humanos, práticas de preven-
ção aos agravos à saúde, promoção da
saúde e da alimentação saudável, entre
outras atividades”(art.º, § 2º) (Apud,
PLANO MUNICIPAL DE EDUCA-
ÇÃO, 2015, 112).
Os 200 alunos assistidos pelo programa têm

115
acesso às aulas de basquete e capoeira como um
meio de resgatar a autoestima e a cultura deles. De
acordo com a pesquisa realizada com eles e seus
familiares a capoeira foi muito presente na cultura da
cidade até a década de 1960/1970, mas hoje não tem
representatividade e, no entanto ela foi marca de lutas,
entretenimento e de resistência as desigualdades e
injustiça sofridas pelos negros no período colonial e
pós-abolição.
Este trabalho realizado com parceria do Grupo
Teatral Manicômicos de São João Del Rei visa também
mostrar aos alunos que o conceito de luta, disciplina
e ideologia que motivaram os capoeiristas podem
ser aplicados em diversas situações da vida. E estes
conhecimentos aproveitados no dia a dia podem
transformá-los em líderes criativos, e justos capazes
de compreender e colaborar com a sua comunidade.
E desta forma O Tempo Integral e o Projeto Mais
Educação visam resgatar estes alunos da marginalidade
social e cultural, oferecendo a eles um conhecimento
epistemológico e cognitivo através do apoio artístico,
cultural e pedagógico, tendo como princípio trabalhar
as diferenças, respeitando a diversidade não só em
sala de aula, mas, sobretudo na comunidade.
Estas aulas acontecem na quadra poliesportiva
do Parque de Exposições e em um clube aquático e
poliesportivo, os alunos têm transporte escolar e ali-
mentação balanceada acompanhado por nutricionis-
ta, acompanhamento social e psicológico para aqueles
alunos que estão desprovidos de atenção e acompa-
nhamento familiar, ou que tenham alguma proximi-
dade com as drogas ilícitas e licitas, e nestes casos têm
a função preventiva com intuito de preservar a idonei-
dade do alunado e de seus familiares.

116
Essa iniciativa do Programa Mais Educação de
proporcionar este trabalho multifuncional e profissio-
nal veio mostrar que a escola tem que integrar com a
sociedade e assim delegar funções, buscando parce-
rias com outros setores públicos, privados e movimen-
tos sociais, e de tal modo atender as diretrizes das Leis
10639/2003 e 11645/2008. É também uma forma de
implantar ações de políticas afirmativas que têm em
vista medidas que implicam a correção de desigualda-
des raciais e sociais com o intuito de reduzir ou abo-
lir com a marginalização instituída e conservada por
uma estrutura social excludente e discriminatória.
Por isso é importante que outras ações como o
currículo e o projeto político pedagógico mude a favor
das relações etnicorraciais e sociais na escola, para
efetivar as Leis 10639/2003 e 11645/2008 conforme
já está previsto no Plano Municipal de Educação 2015.
É importante também ressaltar que a Secretaria
de Cultura tem trabalhado em alguns bairros da
periferia o projeto “Arte Por Toda Parte” com parceria
do grupo Manicômicos, da Secretaria Municipal de
Educação e Prefeitura Municipal de Lagoa Dourada.
É um projeto muito especial, pois ele visa resgatar a
autoestima, a participação social, além de oferecer
arte e cultura como instrumento para tirar crianças
e jovens da marginalidade sócio-cultural, além de ser
um trabalho efetivo contra a violência e as drogas.
Este projeto oferece aulas de Capoeira, Dança, Samba
e Teatro , visto que a arte inova, resgata a autoestima,
valores e desperta a sensibilidade para acolher a
diversidade étnica e cultural presente na cidade.
(...) a sensibilidade promovida pelo es-
tado da arte é vista como fator funda-
mental de agenciamento e negociação

117
de ideias, ideais e valores. Em outras
palavras, a arte pode diminuir o pre-
conceito e a discriminação contra a
população negra, por meio de uma va-
loração humana que se afirma a partir
das condições afrodescendentes (XA-
VIER, 2011,32-33).
Portanto as oficinas de Samba e Capoeira
oferecidas pelo Programa Mais Educação no Tempo
Integral e pela Secretaria de Cultura é o meio de
resgatar a autoestima e ressaltar as contribuições
reais que os africanos deixaram na música, artes,
dança, religião e na língua. E estas atividades refletem
na sociedade, pois elas entretêm e promovem políticas
públicas de inserção social que através da cultura
social e ideológica e dinamizam as relações e inter-
relações pessoais, incutindo valores e saberes que são
primordiais no resgate social, cultural e intelectual
dos participantes.
Preconceito uma realidade que precisa ser
combatida
Ao analisar os dados da matrícula dos alunos da
escola Municipal Angelina Medrado em 2014, constata
que 38,6% declararam negros, 0,16% índios, 9,55%
não declararam etnia e 51,69% dos matriculados
declararam brancos. Porém ao confrontar estes dados
com os da pesquisa realizada com os alunos percebe
que 20% deles não assumem a cor da pele e os
traços físicos. O que torna evidente o preconceito e
a discriminação racial na sociedade. Portanto é essa
realidade que deve ser combatida, para que os alunos
Lagoenses firmem a sua identidade etnicorracial
No entanto são preocupantes estes dados, os
que não declararam etnia, e os que não assumiram a

118
identidade étnica, porque muitos ao omitir, ou recusar
a cor, os seus traços físicos e a sua descendência, eles
mostram que há uma dificuldade sistêmica em aceitar
os seus traços étnicos, e escancara o preconceito que
muitas vezes é ignorado pelo sistema escolar e pela
sociedade. Pois estes ainda têm como representação a
sociedade do século XIX que foi projetada e idealizada
por brancos para brancos como é citada a seguir:
Quando se pensou a formulação de
uma História do Brasil. Projetou-se,
então, a história de uma nação ame-
ricana construída com a participação
de três elementos étnicos: o branco,
o negro e o índio, que narraria o nas-
cimento e a formação de uma nação,
havendo contato com a inteligência do
branco, a força do negro e a alegria do
índio. A força fundamental, o pilar de
constituição da nação e da nacionali-
dade, portanto, seria dado pelo branco,
que moldaria as contribuições dos de-
mais, formando o país da cordialidade.
Ao longo de mais de um século, essa
foi a História do Brasil e a sua repre-
sentação. Na literatura e na imprensa,
as imagens brasileiras davam conta de
um país de brancos – ou de um país
em vias de embranquecer-se. Desde
os anos de 1940, no entanto, essa re-
presentação vem sendo questionada,
primeiramente no seio da sociedade
civil e, depois, no ambiente acadêmico
(COELHO, 2010, 26-27).
Ao observar a população da cidade percebemos
que é muito marcante a presença do negro, pois o
trabalho escravo aqui foi muito significativo. Visto que
é uma cidade localizada na região do ciclo do ouro,

119
e também pelas muitas fazendas do período colonial
existente, e todas estas fazendas foram erguidas pela
mão de obra escrava, ou seja, pela força.
Mesmo com todo processo histórico que nos cir-
cundam, as pessoas negam a cor, a identidade e a his-
tória. A escola tem uma missão importante, promover
em nossa sociedade o conhecimento que liberta e que
resgata a memória de nossa ancestralidade e faça as
pessoas reconhecerem e assumir sua identidade, li-
vres de qualquer armadilha do preconceito que opri-
me e acomoda.
A educação: um novo olhar para as relações
sociais na escola
A comunidade ao compreender que a escola é
mais que um espaço físico, ela é desencadeadora de
um processo interativo social individual que agrega
todos os artifícios econômicos, políticos e cultural.
Visto a importância de entender e colaborar com
espaço escolar, pois este vai além da materialidade
física, ele constrói sujeitos capazes de compreender
a história e ratificar transformações provocadas pelo
desenvolvimento social e cultural da sociedade.
E ao mesmo tempo produzir um legado por essas
transformações. Que representarão o sujeito coletivo
que ganhará dimensões diferentes representando a
diversidade do contexto escolar.
Por isso é essencial criar estímulos, para que
os alunos e seus familiares percebam que o conheci-
mento, que a escola transmite é uma ferramenta im-
prescindível para o crescimento pessoal, intelectual,
cultural e social. Logo é preciso concluir a educação
básica e apoderar de todas as políticas afirmativas do
governo para reconstruir uma cidade participativa e
inclusiva.
120
Portanto a representatividade dos afrodescen-
dentes no Ensino Fundamental é considerável, mas
no Ensino Médio há uma evasão imensa que aproxima
de 50% dos alunos negros e pardos. Na escola Maria
Marcília de Rezende havia 129 alunos matriculados
em 2014, e destes apenas 19 eram afrodescendentes,
e frequentaram até o fim do ano apenas 12 alunos.
Por isso que é de suma importância que a esco-
la cumpra as exigências legais contida na Lei 10639
a Resolução CNE/CP 01/2004 e o Parecer CNE/CP
003/2004 para democratizar o ensino. Principalmente
o Médio com o intuito de reduzir a evasão escolar dos
alunos dessa faixa etária e ampliar a demanda como
versa as diretrizes a seguir como: reformular ou for-
mular junto à comunidade escolar o seu Projeto Polí-
tico Pedagógico adequando seu currículo ao ensino de
história e cultura afro-brasileira e africana; estimular
estudos sobre Educação das Relações Étnico-raciais.
E desta forma proporcionar condições para
os professores, gestores e funcionários de apoio
participarem de atividades de formação continuada
e/ou forme grupos de estudos sobre a temática;
para que possam detectar e combater com medidas
sócio-educativas casos de racismo e preconceito e
discriminação nas dependências escolares.
Uma vez que estará contribuindo para o
desenvolvimento de práticas pedagógicas reflexivas,
participativas e interdisciplinares, que possibilitem
ao educando o entendimento da estrutura social
desigual. Visto que implementará ações, inclusive dos
próprios educandos, de pesquisa, desenvolvimento e
aquisição de materiais didático diversos que respeitam,
valorizam e promovam a diversidade cultural.
Consequentemente ao subsidiar as práticas

121
pedagógicas adequadas à educação para as relações
étnico-raciais, como prover as bibliotecas e as salas
de leitura de materiais didáticos e paradidáticos sobre
a temática étnico-racial adequados à faixa etária e à
região geográfica do aluno.
Logo que ao articular estas medidas os alunos
sentirão representados pela escola e dessa forma irá
instigá-los a frequentar e colaborar com as práticas
educativas em sala de aula e em suas comunidades
com o objetivo de conscientizá-los de serem agentes
transformadores.
E desta forma a escola integrará a sociedade
convocando a comunidade negra a participar de suas
ações educativas, dando a ela voz para que manifeste
e represente as suas especificidades, para que esta
assuma a sua identidade e reconheçam como agente
transformador de direitos e cidadania. Pois as leis
que tratam da diversidade na escola será o suporte
que esta parcela da sociedade terá para se manter na
escola e disseminar os seus interesses, a sua história
e a sua identidade mostrando a sua expressividade no
contexto social e cultural local.
Como constatado por Wilma Coelho (2008) o
Brasil constitui o país de maior população negra, fora
do continente africano, não proporciona visibilidade –
positiva – à cultura afro-brasileira, e, por conseguinte,
ao negro. O município de Lagoa Dourada-MG repre-
senta bem este percentual, observando a matrícula
dos alunos da rede municipal de ensino constatamos
que apesar de quase metade dos alunos serem des-
cendentes de pessoas negras. Eles não têm a sua his-
tória e a sua cultura representada. E o currículo esco-
lar quando trata a história dos negros enfatiza apenas
o passado escravocrata, ou seja, ele aparece como um

122
problema social: sua condição, o lugar que ocupa na
escala social seria o resultado estrutural do País, e não
do preconceito, ou somente de seu passado escravista
(COELHO, 2008, p. 6).
Nas aulas de Literatura e Artes é trabalhada
a cultura afro-brasileira sob novas perspectivas de
mostrar as contribuições reais deles para a cultura,
a economia , as artes e para o contexto social. Além
de aproximar o ensino da história de fatos reais que
estão próximos da realidade dos alunos, construindo
uma interação em sala de aula integrando o aluno e
a sua realidade dentro do contexto escolar. Como a
identidade e a diversidade da cultura dos ancestrais e
as influências delas no dia a dia através das artes, no
artesanato, na dança, na música, ressaltando a impor-
tância da tradição oral representada pelos contadores
de história.
Através dos documentários: Raça, um filme so-
bre Igualdade, retrata a história de três pessoas repre-
sentam a nossa sociedade, todas buscam a igualdade.
Principalmente entre as raças em um país que orgu-
lha de ter democracia racial. Este filme faz refletir so-
bre as ações do dia a dia, principalmente das relações
sociais que mascara o preconceito e a discriminação
racial, indicando assim uma pseudo democracia ra-
cial.
Mas também mostra a importância do Estatuto
da Igualdade Racial no Brasil, principalmente os
avanços das discussões sobre esta, e também a
promoção racial através das políticas afirmativas. Estas
políticas refletem em todo o Brasil como o acesso a
programas sociais do Governo Federal, e também as
cotas de acesso as universidades que possibilitaram
a profissionalização e a carreira de muitos negros.
Mas há desafios como consolidar Igualdade Racial no
123
Brasil, acabar com o preconceito e a discriminação
racial, promover a igualdade de gênero e acabar com a
intolerância religiosa entre outros.
Através deste documentário: O Negro no Brasil
Caminhos da Reportagem (17/11/2011) estará abor-
dando temas pontuais como o mercado de trabalho
para os negros os desafios que encontram mesmo
quanto têm a formação exigida; o sistema de cotas
para entrar na faculdade, distribuição de renda e ou-
tros temas. Pois, é um documentário que discute a
situação do negro no Brasil, além de trazer números
que mapeiam as principais dificuldades que o Brasil
tem para banir a desigualdade de renda e de acesso à
educação, a pobreza, a violência e a intolerância racial
e religiosa.
Também é trabalhado alguns textos de Mia Cou-
to, José Craveirinha, Conceição Evaristo; que proble-
matizam ações do dia a dia como a busca de direitos,
a participação política tendo esta como provocadora.
Porque a maioria deles são omissos, por causa das bri-
gas partidárias, a expectativa de mercado de trabalho
e profissionalização e do mesmo modo que as políticas
afirmativas como as cotas, já beneficiaram muitas pes-
soas da cidade.
A discussão continua com os filmes Besouro; 12
Anos de Escravidão; Quanto Vale ou É por Quilo; O
Xadrez das Cores e Nzinga Atabaques as discussões
tornam se mais calorosas. Pois estes filmes mexem
com a questão do preconceito, tanto da raça, social e
religioso. O preconceito muitas vezes é sutil e cruel,
pois impede à democratização social e cultural, isto faz
com que as manifestações culturais e religiosas serem
tolhidas, por isso a ausência desses movimentos hoje
na cidade.
Na escola Maria Marcília em uma turma de
124
Ensino Médio na aula de Literatura foi trabalhado e
contextualizado o período histórico do século XVIII /
XIX. Estudaram o contexto histórico, as revoluções e
entre elas a resistência dos negros no período colonial,
assim como a formação dos quilombos e seus ideais e
a história da capoeira e como sugestão do livro Língua
Portuguesa da Editora Positivo (PNL EM 2015). Para
a conclusão dos estudos foi ilustrado com o filme O
Besouro, os alunos mostraram tão resistentes ao
conteúdo e principalmente as ideias ideológicas e
políticas do filme.
Portanto para resolver esse impasse foi preciso
uma intervenção pedagógica para mostrá-los que
este conteúdo está de acordo com o planejamento
da disciplina e com o livro adotado. Neste episódio o
que ficou claro foi o preconceito que é arraigado nas
relações sociais, quando evidenciamos a diversidade
em nossa sociedade, as máscaras caem e o preconceito
surge com todo vigor, é essa realidade que precisa ser
combatida não só em sala de aula, mas em toda a
sociedade.
Porque o preconceito étnico-racial é uma reali-
dade que está constante em nossa sociedade, especial-
mente no contexto escolar, visto que o levantamento
sobre a etnia com os alunos das escolas estudadas
percebe-se que em média 20% deles negam a etnia
e a cor de sua pele. Portanto a partir do princípio que
só terá uma sociedade igualitária, quando não houver
tolerância ao preconceito, porque “apesar da diversi-
dade cultural em que vivemos, ainda é presente em
nossos dias a intolerância que tem dentre seus muitos
fatores causais está a falta de conhecimento” (MORA-
ES, 2013, p.1).
No entanto a sociedade não reconhece a
diversidade étnica existente em Lagoa Dourada, e
125
muitas vezes a escola é conivente com essa falsa
realidade. Ela continua reproduzindo um discurso
conservador e privativo tratam todos como se fossem
iguais e neste momento evidencia o caráter excludente
que aborta as relações interdiscursiva, dialógicas.
Porque a educação de Lagoa Dourada representa
a educação brasileira, “em sua ausência de uma
reflexão sobre as relações raciais no planejamento
escolar o que tem impedido a promoção de relações
interpessoais respeitáveis e igualitárias entre os
agentes sociais que integram o cotidiano da escola”.
(MEC/SECAD, 2005,11).
Consequentemente quando o preconceito racial
é ignorado pela sociedade e pela escola, não é per-
mitida que a diversidade étnica seja assegurada e va-
lorizada, o que faz aumentar a discriminação racial
e a segregação. Visto que a cidade tem 103 anos de
independência política e o primeiro homem negro a
concluir um curso superior foi em 2003.
O silêncio sobre o racismo, o
preconceito e a discriminação raciais
nas diversas instituições educacionais
contribui para que as diferenças
de fenótipo entre negros e brancos
sejam entendidas como desigualdades
naturais. Mais do que isso, reproduzem
ou constroem os negros como sinônimos
de seres inferiores. O silêncio escolar
sobre o racismo cotidiano não só
impede o florescimento do potencial
intelectual de milhares de mentes
brilhantes nas escolas brasileiras,
tanto de alunos negros quanto de
brancos, como também nos embrutece
ao longo de nossas vidas, impedindo-
nos de sermos seres realmente livres
“para ser o que for e ser tudo” – livres
dos preconceitos, dos estereótipos, dos

126
estigmas, entre outros males (MEC/
SECAD 2005,11-12).
Portanto é preciso que a escola lute para aplicar a
história e a cultura da África e dos seus descendentes
no currículo, ser combativa contra quaisquer espécies
de preconceito e discriminação na sala de aula. Pois
para este mal não deve haver tolerância e para isso
deve conscientizar os seus alunos da importância
de conviver e respeitar a diversidade. É preciso
que a escola difunda a igualdade e a liberdade e
principalmente o respeito à diferença, e acolha
abertamente as especificidades de cada um que
constrói a comunidade escolar.
Mas as ideias preconceituosas muitas vezes não
são declaradas abertamente, e sim através de gestos
sutis e que se tornam corriqueiros em nossa realidade.
Porém quando se trata do preconceito religioso, as
pessoas mostram mais intolerantes, principalmente
com as religiões das matrizes africanas. No entanto
no obscurantismo há várias pessoas que seguem
ou são adeptas, mas não demonstram por medo de
serem tolhidas, e a escola como instituição laica deve
propagar as filosofias e as doutrinas religiosas de
forma que aumente esse sincretismo, sem se impor
nenhuma doutrina aos seus alunos.
Visto que é o debate livre de qualquer ideologia
ou conduta que a escola deve proporcionar aos alunos,
para que eles conheçam as manifestações religiosas,
e aprendam a respeitar a individualidade de cada
um e compreender a importância de respeitar as
manifestações religiosas como cita Pereira (2007,
p.76-7), que é na diferença que cada um exprime a
sua individualidade, a sua crença e seus valores.
Por isso todos devem ser respeitados, este é o

127
princípio da diversidade inerente a identidade étnica,
cultural, religiosa e social, além de enriquecer as
relações humanas e de preservar a herança sócio-
cultural das manifestações populares.
O desafio da Educação de Lagoa Dourada tam-
bém é resgatar a autoestima de seus alunos e mos-
trá-los o valor de reconhecer as suas origens. Prin-
cipalmente resgatar a história de suas comunidades
e a origem de seus nomes como Cafundó, Canjica,
Córrego das Figueiras e Cachoeira dos Forros, Catauá,
Ressaca, Matatu, Mutuca. Porque há forte indício de
comunidades remanescentes de quilombos, e tribos
indígenas, mas a maioria destes povoados negam a sua
história. Ao fazer isso negam a sua identidade, e desta
forma ficam desprovidos de recursos financeiros, cul-
turais e sociais que poderiam efetivar uma distribui-
ção de renda através de incentivos de programas de
políticas públicas e outros.
Entretanto estes alunos não veem a sua história,
representada no contexto social e cultural da escola,
mesmo sabendo que muitos destes alunos são rema-
nescentes de áreas quilombolas e tribos indígenas.
Por isso, torna-se necessário a escola atender o anseio
desses alunos e tornar-se representante do resgate da
História e Tradição da cultura afrodescendente e in-
dígena local. Pois com o tempo muitas das manifesta-
ções culturais africanas e indígenas ficaram esqueci-
das ou até mesmo perdidas.
Ao resgatar a história destas comunidades a es-
cola estará ofertando a estes alunos a oportunidade de
conhecer a sua verdadeira origem, a sua ancestralida-
de devolvendo lhes ferramentas imprescindíveis para
o fortalecimento da identidade étnica-racial e social.
E assim estará difundindo conhecimento e também

128
propagando o conhecimento, para preservar e recons-
tituir a memória cultural, promovendo a integração
entre o Estado e família para firmar a identidade dos
remanescentes.
Porque é preciso compreender o quanto é im-
portante a participação de toda a comunidade neste
processo de autoafirmação, e todos conhecerão suas
raízes e terão a oportunidade de reivindicar seus di-
reitos e desta forma promover a cidadania de direitos
assegurados e o reconhecimento social e a valorização
em quanto sujeito e indivíduos perante o poder públi-
co.
A democracia que não deve ser transformada
em um mito
No texto A integração do negro na sociedade de
classes: o mito da democracia traz a visão do sociólogo
Florestan Fernandes sobre a construção da identidade
do negro que sempre teve que superar vários
obstáculos para a sua inserção na sociedade após a
Abolição da Escravatura. Ele faz críticas a sociedade
civil que não se prontificou a reconhecer o direito de
igualdade aos recém libertos, mas também faz crítica
aos negros e mulatos que não se impuseram ao “negro
e o mulato ficaram apáticos diante de semelhante
processo histórico-social e de suas consequências
iníquas”(FERNANDES 1978, p. 304).
Porque o autor sabe das dificuldades que os
afrodescendentes teriam para ser inclusos, mas
acredita-se que faltou aos negros o espírito guerreiro
para brigar pelos seus direitos. Talvez este comodismo
fosse por causa da condição de submissão que eles
sempre viveram, ou porque a sociedade negou a eles
o direito de ser homens livres de ação e pensamento.

129
Negaram aos negros o direito de ser gente quando
deixaram as senzalas, e naquele momento não tinham
sequer forças para lutar.
Pois ainda não distinguia bem o que era ser
livre da opressão de seus senhores. Nas comunidades
remanescentes de quilombolas de Lagoa Dourada
é visível a submissão da sociedade. Principalmente
quando eles não reivindicam a presença efetiva do
poder público para assegurar seus direitos como
serviços públicos, educação de qualidade sendo que
a maioria dos alunos destas comunidades estudam
em turmas multisseriadas e com poucos recursos
didáticos. Condenando estes alunos a defasagem
de ensino-aprendizagem e eles convivem com esses
resquícios em sua vida escolar.
O que preza em todo o processo de democratiza-
ção é a escolarização, esta é um fator essencial para a
ascensão social. Portanto é necessário que os negros
tenham acesso a escola e que permaneçam e conclu-
am ao menos o ciclo básico do ensino, para que possa
diminuir ou erradicar a desigualdade racial e social.
Atualmente com a universalização do ensino
os negros têm acesso às escolas, mas a maioria não
conclui o ciclo da educação básica, ou seja, não
concluem o Ensino Médio. Consequentemente o ciclo
da desigualdade perpetua entre eles, pois a maioria
entra no mercado de trabalho muito jovem e não se
profissionalizam adequadamente. Por isso que eles
prevalecem no mercado de trabalho informal e de
menor remuneração, e desta forma dá continuidade
ao ciclo da desigualdade, da má distribuição de renda,
da baixa escolaridade e até mesmo do analfabetismo.
Mas neste mito da democracia a memória
do passado rústico e degradante social resiste o

130
tempo, pois a sociedade ainda é marcada pela classe
dominante, que detém o poder, porque apesar de todas
as políticas afirmativas, ainda há resquícios severos,
as denúncias de Fernandes tornam-se marcantes,
porque a referência que ele tinha para os seus
estudos, ainda não houve grandes avanços, é preciso
que as autoridades tomem medidas mais eficazes para
integrar o negro na sociedade.
Uma vez que a democratização racial deve livrar
-se de qualquer conceito discriminador e mostrar que
o encontro de todas as raças e povos não é deformador
e sim a maior riqueza da nação: a diversidade inter-
racial. Neste encontro deve haver lugar para todos, só
assim haverá de fato a democratização racial e não um
processo de branqueamento da sociedade, ou meio
negro, ou algum outro termo que esconda o precon-
ceito arraigado.
Nos dias atuais a democratização racial não pode
ser mais um sonho utópico, tem que haver políticas
reais que visam à conscientização de toda a sociedade
que o negro e o índio merecem respeito. E os gover-
nantes devem investir em políticas públicas que resga-
tam a autoestima destes povos e, sobretudo promova a
ascensão social dos mesmos, independentes se são da
zona rural ou urbana, religião ou sigla partidária.
No entanto a luta dos negros por um espaço não
foi fácil, assim sendo tornou-se periférico no espa-
ço territorial e também na sociedade, sua existência
transformou-se na subsistência da dignidade huma-
na, a maioria ficaram esquecidos pela sociedade e pelo
governo, por isso a necessidade da efetivação das Leis
10639/2003 e a 11645/2008 nas instituições de ensi-
no.
Portanto a dívida da nação brasileira com os

131
nativos e com os descendentes de africanos que aqui
chegaram através dos navios negreiros é também
moral, ética, social e cultural. Pois a democracia
brasileira sempre os manteve na marginalidade social,
por isso a importância de não permitir que a integração
do negro na sociedade, transforme em uma falácia de
uma democracia que muitas vezes parece um mito é
um dever de civilidade e brasilidade.
A descolonização do currículo em busca do
resgate cultural
A escola ao flexibilizar seu currículo de forma
que todos possam ser ouvidos, para otimizar as
contribuições sociais e culturais que os alunos e sua
comunidade podem aderir a sala de aula. Tornando-
se assim este espaço interativo e desta forma todos
poderão ser co-responsáveis pelo conhecimento que é
registrado em sala de aula.
Com o intuito de fazê-los sentir representado
pelo contexto histórico social, e também é a oportuni-
dade de levar a nossa história para o conjunto escolar,
e fazer constar a “diversidade epistemológica do mun-
do que se encontra maior espaço nas ciências huma-
nas e sociais” (GOMES, 2012, p.99), segundo Nilma
neste processo de descolonização as escolas ganham
flexibilização curricular para implementar no currícu-
lo o ensino da história local. Sendo assim “nesse con-
texto que a educação participa como um campo que
articula de maneira tensa a teoria e a prática” (GO-
MES, 2012, p.99).
Desta forma fará o aluno entender a história de
sua comunidade, e despertar o interesse do alunado
em penetrar no universo das suas memórias, da sua
cultura e da sua identidade. Pois entende-se que o

132
desenvolvimento do indivíduo começa pela valorização
de sua história, do seu contexto social, a partir de
então, ele passa a exercer a sua cidadania.
Pois entende-se que o papel do professor como
educador é valorizar a pluralidade de conhecimento
e ideias, no intuito de democratizar o ensino, e todos
conhecerão as especificidades de cada região. Pois o
município é extenso, é sabido que isso dificulta um
pouco, mas não deixa de ser atraente, essa diversidade
existente tem muito a engrandecer o trabalho da
escola e da comunidade. Por isso que:
(...) as questões colocadas pelos sujei-
tos sociais organizados em movimen-
tos sociais e ações coletivas ao campo
educacional. Quanto mais se amplia
o direito à educação, quanto mais se
universaliza a educação básica e se
democratiza o acesso ao ensino supe-
rior, mais entram para o espaço es-
colar sujeitos antes invisibilizados ou
desconsiderados como sujeitos de co-
nhecimento. Eles chegam com os seus
conhecimentos, demandas políticas,
valores, corporeidade, condições de
vida, sofrimentos e vitórias (GOMES,
2012, p.99).
Desta forma a comunidade ganha voz no contex-
to escolar, e a escola passa a representar a diversidade
étnica, social e cultural da comunidade e fazer o aluno
transformar em agentes da sua história, tendo partici-
pação ativa em suas comunidades.
Uma vez que a escola ao agregar a história da
comunidade atenderá o artigo 26A da Lei 9.394/1996
que dispõe sobre a pluralidade que dá autonomia
as escolas para elaborar o seu projeto pedagógico,
permitindo que se amparam da colaboração das
comunidades e de seus movimentos sociais e incluindo

133
as vivências promovidas pela escola.
Além de atender também a Constituição Federal
de 1988, em seu Art. 3º, inciso IV, garante a promoção
do indivíduo, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação;
e também o inciso 42 do Artigo 5º que trata da prática do
racismo como crime inafiançável e imprescritível; do §
1º do Art. 215 que trata da proteção das manifestações
culturais.
Portanto ao cumprir a legislação para a aplicação
do ensino da História e da Cultura africana e indígena
na escola dará aos alunos a oportunidade de ter
uma educação que vai ao encontro de seus anseios
e das necessidades do grupo escolar que almeja um
conhecimento que desperta o desejo de progressão
social e intelectual. Consequentemente construirá
uma Educação que abre o caminho para a inserção
social, atingindo um dos seus principais objetivos.
Uma das formas que a escola tem para atingir
a comunidade é abrir espaço para discutir e eviden-
ciar as manifestações artísticas e culturais local, con-
vertendo-se num sítio propagador e disseminador de
ideias e culturas, tornando se referência na consoli-
dação da identidade étnica de seus alunos e comuni-
dade.
A partir da identidade étnica, eles terão o
conhecimento, e poderão fazer dele uma ferramenta
eficaz para reconstituir a história de seus antepassados,
pois eles participarão efetivamente das ações políticas
que trazem benefícios sociais, culturais e financeiros
para suas comunidades.
A religiosidade perdida no tempo
O autoconhecimento é imprescindível para
reconstituir as memórias que foram importantes
134
para a sociedade como as Irmandades de Nossa
Senhora do Rosário, São Benedito e Santa Ifigênia
e Santa Catharina e coroações de reis e rainhas que
foram representativos para os lagoenses. Sendo que
de acordo com os arquivos da Igreja Matriz de Santo
Antônio a última eleição de reis e rainhas foi no ano
de 1913, as irmandades tinham o objetivo de acolher
os parentes de nação como nos diz:
(...) Às irmandades cabia a assistência
material e espiritual de seus irmãos.
Cada irmão, ao ingressar no grupo,
deveria pagar uma “joia”, espécie de
taxa de adesão, que servia a confraria
ao lado de doações dos integrantes e
de outros benfeitores. Os fundos eram
empregados de acordo com as neces-
sidades dos membros, após decisões
tomadas conjuntamente e referenda-
das pelas mesas administrativas. Além
disso, o dinheiro é utilizado para um
dos momentos máximo da irmandade:
a festa do padroeiro, realizado anual-
mente, bem como nos funerais dos ir-
mãos (RIBEIRO, 2012, 30).
As irmandades foram essenciais para os
remanescentes da África e seus descendentes, pois
elas tinham a preocupação de oferecer aos seus irmãos
de nação um pouco de dignidade. Principalmente na
celebração dos seus padroeiros, que era o momento de
fazer a reverência aos seus antepassados, ressaltando
a memória da ancestralidade e também dignificar a
morte dos seus entes confederados.
Visto que ela era celebrada, como um momento
de união e solidariedade com a dor do outro. E o se-
pultamento deveria ocorrer num espaço sagrado em
Lagoa Dourada, o cemitério, e até os dias atuais às

135
pessoas. Sobretudo os povos da zona rural, reveren-
ciam os seus mortos, marcando presença de conhe-
cido e desconhecidos fazendo vigília ao féretro até o
momento do seu sepultamento.
Em pesquisa realizada pelos alunos das escolas
Angelina Medrado e Maria Marcília constataram
que uma das representações mais significativa para
os afrodescendentes é a festa de Nossa Senhora do
Rosário que tinha a novena e a coroação do rei e
rainha do Congado. Segundo os relatos de alguns
entrevistados, ouvira dizer que era uma festa muito
animada e contava com a participação de comunidades
vizinhas, e todos sempre ficavam na expectativa da
festa e muitos não entenderam como que tal festejo
acabou. Pois era um momento que eles mostravam a
sua devoção aos santos e juntos faziam reverências aos
seus sagrados e coroavam aqueles que simbolicamente
representavam a sua ancestralidade.
A festa do Rosário e a congada são manifestações
que muitos dos entrevistados pelos alunos acreditam
que deveria ser resgatada como forma de firmar a
identidade cultural da cidade.
... a forte presença de santos negros, como
Santa Ifigênia, São Elesbão e São Benedi-
to,que,por ter essa característica biológica
,aglutinavam diversos fiéis também negros
em seu entorno. Os folguedos populares ou
festas de santos são exemplos vibrantes de
contiguidade, resistência e permanência de
práticas construídas sobre bases de susten-
tação africanas. A presença dos tambores,
ngomas,atabaques,ganzá,xequeres ou ago-
gôs como marcadores de pulso rítmico dá
entender a inegável presença africana em
expressões não necessariamente origina-
rias de territórios africanos (...) até missas

136
vinculadas a formas populares do catoli-
cismo, tal qual a missa conga , decorrente
das festas de São Benedito em Minas Ge-
rais (SANTOS, 2012, 39).
Atualmente uma das manifestações culturais
que sobrevive na cidade é a folia de reis em algumas
comunidades da zona rural como Catauá, Melos, Ma-
tatu e os bairros Cruzeiro das Cavalhadas e o Cruzei-
ro do Bom Jesus, mas segundo Santos (2012). O to-
que sincopado não é encontrado apenas nas culturas
africanas, mas no ritmo estrutural das folias de reis,
festividades do rosário ou no fandango caiçara em de-
corrência da presença negra em vilas, cidades ou fa-
zendas do território colonial.
Porque se sabe que sem história, sem passado
não há reconhecimento da identidade e nem valoriza-
ção do ser humano. Pois o que se percebe é a desva-
lorização do indivíduo e da sua história da sua arte e
sua cultura.
Portanto é fundamental que a escola juntamente
com a comunidade articule ações que promovam as
manifestações culturais de forma idônea e multipli-
cadora de conhecimentos, e assim construa políticas
afirmativas que agenciam a diversidade étnica, cultu-
ral e social na comunidade que está inserida.
Tendo em vista a importância de trazer a África
para a escola como uma ferramenta indispensável
para o processo da construção das diversas identidades
que estão inseridas no contexto escolar, que serão
resgatadas por intermédio de pesquisa de campo e
também das memórias que circundam a sociedade,
valorizando assim as pesquisas e iniciativas dos alunos.
É preciso empreender na comunidade escolar
conhecimento para que busquem novas perspectivas

137
ao relacionar com as manifestações religiosas de
matizes africanas na cidade. Visto que ao serem
omitidas impede que a sociedade conheça a grandeza
simbólica e ritualística que as religiões mantêm.
Além de impedir que o sincretismo religioso perpetue
na cidade, democratizando as ideologias sociais,
filosóficas e políticas que estimule o conhecimento
religioso, científico e popular dos lagoenses.
Considerações finais
A Educação de Lagoa Dourada deve contemplar
as diversidades na sala de aula, buscando um olhar
que sensibiliza para as relações etnico-raciais, cultural
e social. Que busca um ensino que incute valores
éticos e morais de forma que os alunos aprendam a
respeitar as diferenças de cada um, para que possam
firmar a sua identidade.
Pois esta é primordial na promoção da igualdade
na escola, principalmente ao fazer um educandário
participativo e interativo, que atenda as demandas da
diversidade étnica, social e cultural e assim implantar
ações que promovam o indivíduo através de políticas
afirmativas e que instiga a igualdade racial na escola.
Visto que uma das ações para firmar a identi-
dade do alunado é a escola trabalhar junto com a co-
munidade, e ambas propagar conhecimentos com o
intuito de promover o saber, através das pesquisas re-
alizadas pelos professores, alunos e comunidade. Res-
gatar a história local, principalmente as manifestações
religiosas afrodescendentes que existiram em Lagoa
Dourada e que foram extintas no início do século XX.
Também é importante incitar os alunos conhecer
a verdadeira história dos seus ancestrais e de suas
comunidades, principalmente aqueles remanescentes
de tribos indígenas e quilombolas, para que juntos
138
possam integrar escola e comunidade valorizando o
seu universo e especialmente fazer ser representado
dignamente pelo poder público e movimentos sociais.
A cidade de Lagoa Dourada precisa difundir para
toda a comunidade escolar ações como as ofertadas
pelo Programa Mais Educação, Tempo Integral e
o Projeto Arte Por Toda Parte com o objetivo de
fortalecer os laços culturais entre escola- comunidade-
movimentos sociais, através das aulas de Basquete,
Capoeira, Dança, Samba e Teatro. Pois são atividades
que têm como perspectivas as relações sociais entre
alunos e comunidade, uma vez que eles aprendam os
princípios básicos da igualdade e equidade, de forma
que eles compreendam a grandeza do respeitar o
outro na sua individualidade.
Consequentemente a cidade empreenderá ações
positivas que estimulam a solidariedade, a amizade
e o cooperativismo na construção de uma educação
sólida. E desta forma construir novos conceitos e
pensamentos que visem à mudança na estrutura
educacional Lagoense. Mudanças essas que devem
contemplar o Projeto de Políticas Pedagógicas e também
o Currículo Escolar de forma que proporcione novas
perspectivas de ensino, que contemple a diversidade
com o intuito de promover uma escola transformadora,
participativa e interativa que incentiva a liberdade do
pensar e do conhecimento de forma que dissemine a
democratização do ensino.
Referências Bibliográficas

BRASIL, Ministério da Educação e Cultura. Lei nº


10639, de 9 de janeiro de 2003. Altera a Lei no 9.394,
de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes
e bases da educação nacional, para incluir no

139
currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade
da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e
dá outras providências. Diário Oficial [da] República
Federativa do Brasil. Brasília, DF, 9 jan. 2003.
Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
leis/2003/L10639.htm>. Acessado em fevereiro de
2015.

________________. Diretrizes curriculares nacionais


para a educação das relações Étnico-raciais e para o
ensino de história e cultura afro-brasileira e africana.
Brasília: MEC, [s.d.]. Disponível em: <http://portal.
mec.gov.br/cne/>. Acessado em fevereiro de 2015.

________________. Grupo de Trabalho Interminis-


terial. Contribuições para a Implementação da Lei
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143
PIBID AFRO E A IGUALDADE RACIAL NA ES-
COLA ESTADUAL DOM BENEVIDES

Aline Ângela de Jesus (UFOP/UNIAFRO)1


Kassandra da Silva Muniz (Orientadora)2

Resumo
Este trabalho apresenta o projeto desenvolvido
na escola Estadual Dom Benevides nos anos de
2012, 2013 e 2014. O projeto do PIBID com temática
voltada para as questões raciais, além de estimular à
docência, teve (e tem) o objetivo de fazer cumprir a
lei 10.639/2003 que tornou obrigatório o ensino de
cultura afro e afro-brasileira nas instituições de ensino.
Palavras-chave: Afro, Escola, Igualdade Racial, Pibid.
Introdução
Este artigo pretende analisar as ações desenvol-
vidas pelo Programa Institucional de Bolsa de Inicia-
ção à Docência (PIBID) Afro (pois trata das questões
de igualdade racial) na escola Estadual Dom Benevi-
des. O projeto buscou desenvolver ações pedagógicas
para fazer cumprir a lei 10.639/2003; atualizada pela
lei 11.645/08 que torna obrigatório o Ensino de Histó-
ria e Cultura Afro-Brasileira e Africana e Indígena em
todos os níveis da educação.
Trabalhar as questões relacionadas à identi-
dade dos alunos em diálogo com a cultura africana e
afro-brasileira e o combate ao preconceito e ao racis-
mo, tornou-se urgente, uma vez que práticas discrimi-
natórias são cada vez mais frequentes e, por conta do
avanço das tecnologias e das redes sociais, tornaram-
1 -Universidade Federal de Ouro Preto. Curso de Especialização UNIAFRO:
promoção da igualdade racial na escola.
2 -Professora orientadora deste trabalho de conclusão de curso de
especialização.

144
-se mais “populares”.
Antes de falar a respeito das ações do PIBID Afro
é preciso saber como ele surgiu. O Programa Insti-
tucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID)
é um programa do Governo Federal gerenciado
pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior (CAPES), e é uma iniciativa para
o aperfeiçoamento e a valorização da formação de
professores para a educação básica.
O programa concede bolsas a alunos de
licenciatura, professores da educação básica e do
ensino superior participantes de projetos de iniciação
à docência desenvolvidos por Instituições de Educação
Superior (IES), em parceria com escolas de educação
básica da rede pública de ensino.  O PIBID UFOP –
Universidade Federal de Ouro Preto, teve início de suas
atividades em 2009, quando foi aprovado o primeiro
Projeto de Estímulo à Docência (PED) da UFOP. O
projeto envolve 21 escolas de educação básica, 246
bolsistas de iniciação à docência, 46 professores
das escolas de educação básica de Ouro Preto e
Mariana, 17 professores dos cursos de licenciatura
da Instituição, dois coordenadores pedagógicos e um
coordenador institucional.
A principal contribuição do PIBID UFOP é a
valorização da licenciatura, que pode ser evidenciado
pela demanda dos alunos interessados em participar
do programa. O trabalho constitui-se em um espaço
de troca de saberes e práticas educativas entre os
licenciandos, os professores da educação básica e
do ensino superior, bem como, demais profissionais
envolvidos no fazer educacional.
O que é o PIBID-AFRO?
É o nome pelo qual ficou conhecido o Subpro-
145
jeto  HISTÓRIA, LITERATURA E CULTURA AFRI-
CANA E AFRO-BRASILEIRA que tem como objetivo
trabalhar pela implementação da Lei 10.639/2003;
atualizada pela lei 11.645/08 que torna obrigatório o
Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africa-
na e Indígena em todos os níveis da educação.

PIBID-AFRO Dom Benevides

Em parceria com a Escola Estadual Dom Bene-


vides, sobre a coordenação da Profª. Dra Kassandra
da Silva Muniz e sob a supervisão da Professora Aline
Ângela de Jesus, nos anos de 2012 a 2014, foram rea-
lizadas ações que buscavam destacar a cultura afro e
afro-brasileira no espaço escolar. A equipe era (e ain-
da é, mas agora por outros bolsistas e supervisora) é
formada por graduandos da UFOP de áreas distintas:
História, Letras, Artes Cênicas, Música e Pedagogia
(Interdisciplinar).
A Escola Estadual Dom Benevides está situada
na Praça Dom Benevides, número 23, no centro
da cidade de Mariana. Foi a primeira escola da
cidade, inaugurada pelo nome “Grupo Escolar de
Mariana”. Ela atende alunos da periferia desta cidade,
principalmente os bairros Cabanas e São Pedro.
Durante muito tempo carregou o estigma de abrigar
os alunos que as outras escolas rejeitavam.
No ano de 2014, atendia quinhentos e oitenta
e sete alunos do ensino infantil, médio, Educação
de Jovens e Adultos (EJA), O Programa Nacional de
Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC),
contabilizando com o distrito de Santa Rita Durão, no
período noturno. A maioria do corpo discente é negra.
Isso foi comprovado por uma entrevista feita junto aos
alunos, em que eram perguntados qual a sua cor, raça,

146
etc. Mais de 70% destes alunos se autodeclararam
negros.
Uma das primeiras questões levantadas pelo
grupo do PED AFRO Dom Benevides, que está
relacionada ao título deste trabalho é: a escola é
realmente um ambiente para todos? Quem são estes
“todos”?
Ao analisar os livros e manuais didáticos, fica
explícito que a educação ainda privilegia uma cultura
branca ou “embranquecedora”. E é por isso que, no
ano de 2012 foi implantado na escola Estadual “Dom
Benevides” (escola escolhida para esta análise) um
projeto de pesquisa (e ação) intitulado PIBID AFRO,
que trata (va) de questões étnico-raciais.
O “problema do negro”, tal como
colocado na sociologia brasileira, é, à
luz de uma psicanálise sociológica, um
ato de má-fé ou um equívoco, e este
equívoco só poderá ser desfeito por
meio da tomada de consciência pelo
nosso branco ou pelo nosso negro,
culturalmente embranquecido, de
sua alienação, de sua enfermidade
psicológica (RAMOS, 1957).
Nos anos de 2012 e 2013, visando valorizar a cul-
tura afro e afro-brasileira, tão invisibilizada pelos ma-
nuais didáticos, o Projeto teve como temática “Guiné-
-Bissau: um olhar interdisciplinar sobre a perspectiva
dos ‘balantas’” (o povo que resiste). Os trabalhos rela-
cionados a este tema duraram até o ano de 2013.
Já em 2014, o país escolhido foi a Angola e sua
diversidade cultural. Trabalhando com leitura de
contos, exibição e produção de curtas, que buscavam
valorizar a cultura afro da região escolhida, fazendo
um paralelo com a cultura brasileira. Através de aulas,

147
debates, palestras, minicursos, feiras culturais o
projeto foi se desenvolvendo ao longo destes três anos.
As turmas escolhidas para as aulas do projeto
eram sempre turmas de Ensino Médio, sobretudo os
terceiros anos. Porém, as feiras culturais, minicursos,
palestras e debates eram oferecidos a toda a
comunidade escolar. Foram, inclusive, oferecidos
cursos de formação para professores. Um deles
voltado para professores do Ensino Fundamental I e
buscava apresentar possibilidades de trabalho com
histórias infantis que valorizassem a cultura afro e
afro-brasileira.
Depois destes três anos do PIBID AFRO
na escola estadual Dom Benevides, tornou-se
fundamental avaliar se a lei 10.639/2003, atualizada
pela lei 11.645/08 está de fato sendo cumprida e, qual
a importância do Projeto para a comunidade escolar.
É isso o que este artigo busca fazer.
Fundamentação teórica
Questões raciais e educação: avanços e
desafios 
Segundo o Art. 5º da Constituição da República
Federativa do Brasil, “Todos são iguais perante a lei,
sem distinção de qualquer natureza, (...)”. Mas, o que
dizer quando a teoria não se aplica à prática?
Teria muito que dizer a respeito disso, mas voltemos
nossa atenção apenas para as questões relacionadas à
educação.
Já que “Todos são iguais perante a lei...”, os direitos de
todos deveriam ser igualmente respeitados. Quando falamos
deste campo amplo chamado educação, podemos observar
que, ainda nos dias de hoje existe uma supervalorização de
uma cultura branca ou “embranquecedora”.

148
Analisando alguns livros didáticos, podemos
observar, por exemplo, a forma como a África é descrita. Na
maioria das vezes, este amplo continente, além de reduzido
a um país, tem sido mencionado nos manuais apenas o lado
exótico, a fome, a miséria, as doenças, etc. Nesta perspectiva
cultural branca ou como dito acima, embranquecedora, a
voz negra e todos os traços culturais de matriz africana são
inferiorizados e muitas vezes simplesmente ignorados.
É como se a história do Brasil, fosse exclusiva-
mente formada por uma cultura branca oficial, en-
quanto a cultura negra fosse oficialmente posta à
margem. O silenciamento da identidade negra é insti-
tucionalizado pela forma como tal cultura é apresen-
tada aos alunos nas diversas formas de adquirir co-
nhecimento.
Em oposição a este silenciamento Munanga
(1986. P.44) afirma:
“Poetas, romancistas, etnólogos, filóso-
fos, historiadores etc, quiseram resti-
tuir à África o orgulho do seu passado,
afirmar o valor de suas culturas, rejei-
tar uma assimilação que teria sufoca-
do sua personalidade” (MUNANGA,
1986. p.44).
Como uma primeira tentativa, através da lei, em
20 de Dezembro de 1996, foi decretada e sancionada
a Lei no  9.394, que segundo o Art. 3, o ensino
seria ministrado, dentre outras coisas, valorizando
a consideração com a diversidade étnico-racial. Porém,
apesar de ser uma “lei”, a maioria das instituições de
ensino não a cumprem.
Tanto que, no ano de 2003, o país tem sancionada
a lei no 10.639 que altera a lei no 9.3943, estabelecendo
as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir
1-Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

149
no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade
da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”. Dez
anos depois, em 2013, a presidenta Dilma Rousseff,
altera a Lei no 9.394 e aprova a lei no 12.796, de 4 de
abril de 2013, que cita novamente a importância da
valorização da diversidade étnico-racial. Não se pode
deixar de citar que todas estas ações foram fruto de um
longo e histórico trabalho promovido pelo Movimento
Negro (nome genérico dado aos diversos movimentos
sociais afro-brasileiros).
Todas estas leis partiram da necessidade de uma
nova forma de pensar a educação, ou seja, uma nova
forma de tornar a educação mais inclusiva no que se
refere ao respeito pela diversidade cultural de nosso
país.
Os PCNs – Parâmetros Curriculares Nacionais –
consideraram que era necessário incluir temas novos
ao currículo escolar. Estudos comprovaram que era
necessário o tratamento transversal de temáticas
sociais na escola. Antes, os professores, juntamente
com a comunidade escolar, decidiam o que era
importante ser abordado nas salas de aula e demais
atividades educativas. Depois de sancionadas as leis
citadas acima, não é suficiente cada professor de cada
disciplina citar o conteúdo que esteja relacionado à
sua área de estudo, temática como a questão étnico-
racial agora passam a ser responsabilidade da escola
como um todo.
Em 2004, também foi criado a Secretaria de
Educação a Distância, Alfabetização e Diversidade
(SECAD), um órgão componente da estrutura
administrativa do Ministério da Educação (MEC).
Sua principal função é articular junto às três
secretarias do MEC responsáveis por gerir a educação

150
formal (SEB – Secretaria de Educação Básica, Setec
– Secretaria de Educação Tecnológica e Secretaria do
Ensino Superior – SESU) políticas públicas voltadas à
ampliação do acesso a educação a todos os cidadãos,
levando-se em conta especificidades de gênero, idade,
raça, etnia etc.
Apesar de todos os avanços no que se refere à
implantação da questão racial no ambiente escolar,
ainda é possível perceber que há muito que se fazer.
“Mas uma coisa é consenso para todos
que trabalham nesse campo de estu-
do: há muito o que ser feito em termos
de pesquisa e ensino para que a Lei
10.639/03 (agora ampliada pela Lei
11.645/08, com a inserção da obrigato-
riedade do ensino de história e cultura
dos povos indígenas) seja implementa-
da de fato e possa alterar o aspecto eu-
rocêntrico ainda tão presente no ensi-
no de História nas escolas brasileiras”
(PEREIRA, 2011).
Muitas instituições ainda não cumprem a lei,
às vezes, alegando que tratar do tema racial poderia
despertar um preconceito que não existe em uma
sociedade de cultura uniforme, de um Brasil sem
diferenças.
“A ideia vinculada na escola de um
Brasil sem diferenças, formado origi-
nalmente pelas três raças – o índio, o
branco e o negro – que se dissolveram
dando origem ao brasileiro, também
tem sido difundida nos livros didáticos,
neutralizando as diferenças culturais e
às vezes, subordinando uma cultura a
outra. Divulgou-se então uma concep-
ção de cultura uniforme, depreciando

151
as diversas contribuições que compuse-
ram a identidade nacional” (PCN).
Qual África está presente nas escolas?
Ao observar a leitura a respeito de África
feita pelos manuais didáticos, tornou-se importante
implantar um projeto que buscasse “desbravar”
uma “nova” África, tão diferente e tão verdadeira,
distanciada daquela imposta pelos livros utilizados nas
escolas.
“A história da África é necessária à
compreensão da história universal, da
qual muitas passagens permanecerão
enigmas obscuros, enquanto o
horizonte do continente africano não
tiver sido iluminado” (JOSEPH KI-
ZERBO).
E qual seria a real importância de se conhecer
uma África diferente? Segundo afirma Amilcar Araújo
Pereira (2011):
“Assim, compreendendo que, como
diz a sabedoria popular, “é preciso co-
nhecer para respeitar”, acredito que
o maior benefício que a lei 10.639/03
pode nos trazer é a valorização das di-
ferenças, elemento fundamental para
combatermos as hierarquizações étni-
co-racial e cultural, alimentadas por
“pré-conceitos” e ignorância, e ainda
tão presentes em nossas escolas. (...)
Neste sentido, o conhecimento das
histórias dos diferentes grupos popula-
cionais é fundamental”.
Pensando assim, nos anos de 2012, 2013 e 2014,
na Escola Estadual Dom Benevides, Mariana, MG,
foi implantado um projeto do Programa Institucional

152
de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), o Projeto
de Iniciação à Docência (PED) AFRO (que trata
de questões étnico-raciais). O projeto pretendia e
ainda pretende fazer cumprir a lei nº 10.639, já
citada anteriormente neste trabalho. Para isso, foi
escolhido inicialmente o país Guiné-Bissau, mais
especificamente o povo balanta (aquele que resiste),
pelo desejo de apresentar à comunidade escolar algo
diferente do que todos estão acostumados a ver e ouvir
sobre a África. Foi feito um estudo sócio-histórico-
cultural e apresentado à escola como um todo.
Aulas, feiras culturais, palestras e minicursos foram
oferecidos à escola e comunidade em geral.
Depois de um ano e meio de trabalhos e estudos
sobre Guiné-Bissau, outro país africano foi escolhido:
Angola. Agora a intenção era tentar aproximar por meio
da música, do cinema e da literatura as duas culturas:
angolana e brasileira. O local de Angola escolhido foi
a periferia, a favela. O desejo era apresentar a África
do povo, das ruas. Além dos trabalhos já desenvolvidos
durante os estudos sobre Guiné-Bissau, foram feitos
vídeos produzidos pelos alunos, buscando falar de
temas sucintamente escondidos debaixo do pano
como o preconceito racial.
Ao falar de ambos os países, o objetivo geral era
desmistificar a África. Era fugir do local óbvio (safá-
ris, fome, miséria, doenças etc.) e apresentar países
com costumes, tradições e características tão amplas
e muito superiores ao que os livros didáticos apresen-
tam.
Metodologia
O projeto do PIBID AFRO, nas escolas em que
foi desenvolvido (mas aqui citaremos apenas o projeto
da Escola Estadual Dom Benevides), teve início com
153
uma formação destinada a bolsistas (estudantes da
UFOP) e a supervisores (professores da rede pública
de ensino). Leituras, fichamentos, estudos de grupo,
palestras, debates fizeram parte do processo de for-
mação para que o projeto pudesse ser implantado nas
escolas e apresentado aos alunos e a toda comunidade
escolar.
Depois de algum tempo, os bolsistas começaram
a observar o espaço escolar e as aulas da professora
supervisora do projeto. O objetivo era aproximar os
bolsistas dos alunos e da escola como um todo, para
que houvesse troca de experiências. Além da formação
com a professora coordenadora, Kassandra da Silva
Muniz, nas reuniões semanais na escola, eram feitos
grupos de estudo com a finalidade de aprender sobre
a temática afro.
Nestes encontros semanais, os bolsistas
desenvolveram o primeiro projeto sobre Guiné-Bissau,
especificamente o povo balanta e foi subdividido
em duas partes: a primeira parte foi a da escrita do
projeto e a segunda parte foi a da apresentação para a
comunidade escolar.
Inicialmente, o trabalho foi apresentado para
duas turmas de terceiro ano do Ensino Médio em 2012
(40 alunos), na forma de aulas e que foram regidas
pelos bolsistas da UFOP e observadas pela professora
supervisora e pela professora coordenadora, visavam
implantar de fato a lei 10.639/2003, desmistificar
a África, apresentar o país Guiné-Bissau, além de
debater questões trazidas pelos alunos (Anexo I).
A partir do diagnóstico realizado na escola no ano
de 2012, com perguntas feitas aos alunos, constatou-
se que a maioria dos estudantes se declarou negro.
Descobriu-se que nesta escola ocorrem conflitos

154
raciais, por isso, tornou-se importante discutir uma das
propostas apresentadas pelas Diretrizes Curriculares
Nacionais:
“Reconhecer exige que os estabeleci-
mentos de ensino, frequentados em
sua maioria por população negra, con-
tem com instalações e equipamentos
sólidos, atualizados, com professores
competentes no domínio dos conte-
údos de ensino, comprometidos com
a educação de negros e brancos, no
sentido de que venham a relacionar-se
com respeito, sendo capazes de corri-
gir posturas, atitudes e palavras que
impliquem desrespeito e discrimina-
ção “ (p.12).
Para iniciar, apresentamos aspectos geográficos
gerais do continente africano, dando foco ao país
Guiné-Bissau, situado na costa oeste da África. Após,
focalizamos aspectos do povo Balanta4, através de
mapas, imagens, vídeos, músicas, artesanatos, dança,
literatura entre outras mediações.
Este momento serviu também para desmistificar
a ideia que a maioria das pessoas (por falta de
informação) tem de que a África é apenas um
país, ignorando a sua pluralidade. O trabalho era
voltado para apresentar a África, mas os estudantes
introduziram temas como preconceito e cotas raciais,
ampliando assim o debate.
Ao aproximarmos os estudantes dos aspectos
geográficos, históricos e culturais, tornou-se impor-
2- Os  balantas  (palavra que significa literalmente “aqueles que resistem”) são
um grupo étnico dividido entre a Guiné-Bissau, o Senegal e a Gâmbia. São o
maior grupo étnico da Guiné-Bissau, representando mais de 25% da população
total do país. No entanto, mantiveram-se sempre fora do estado colonial e pós-
colonial, devido à sua organização social. Os balantas podem ser divididos em seis
subgrupos: balantas bravos, balantas cunantes, balantas de dentro, balantas de
fora, balantas manés e balantas nagas.

155
tante apresentar também os aspectos linguísticos. Os
discentes puderam pesquisar e aprender palavras, ou,
até mesmo, reconhecer a origem africana de muitas
palavras que utilizamos em nosso dia a dia. Foi o mo-
mento de usarmos os equipamentos de informática
oferecidos pela escola para fazermos uma pesquisa.
Utilizamos recursos audiovisuais para mostrar
aspectos do cotidiano urbano, contrapondo a imagem
estereotipada que associa a África somente ao exótico
e ao selvagem. Ao mesmo tempo, procuramos destacar
a forma de transmissão de cultura, através da dança e
da religião, mostrando que para a maioria dos africanos
corpo e mente não são dissociados.
Envolvemos os estudantes com jogos teatrais,
para estimular a consciência corporal, através de
oficinas de ludicidade africana. Aproveitando o
material didático dos alunos, debatemos a questão da
literatura e o preconceito racial.
As turmas de terceiro ano do Ensino Médio, na
ocasião, estavam estudando o Pré-Modernismo e o
Modernismo. Assim, fazendo um paralelo com as aulas
de literatura da professora supervisora, foi possível
acrescentar às sequências didáticas um estudo dos
autores Lima Barreto e Monteiro Lobato.
Como na primeira aula os estudantes propuseram
o tema a respeito das cotas raciais, foi acrescentado
às sequências didáticas elaboradas no projeto, um
momento de conscientização e debate a respeito das
Políticas de Ação Afirmativa (PAA). Mas, o ambiente
escolhido para esta aula não poderia ser a mesma sala
de aula de todos os dias. Os estudantes foram levados
a um dos Campus da Universidade Federal de Ouro
Preto (UFOP), o Instituto de Ciências Humanas
e Sociais (ICHS). Além de debater o tema “cotas

156
raciais”, os estudantes puderam ter a oportunidade
de se aproximarem da universidade, de perceberem o
espaço e de conversarem a respeito de seus sonhos e
planos sobre a vida acadêmica.
Como não poderia deixar de ser esta, que foi a
última aula da sequência didática de 2013, além de
propor um estudo sobre as cotas, teve como tema,
proposto pelos alunos, o preconceito racial. Muitos
deles puderam apresentar situações do cotidiano em
que foram vítimas ou viram seus familiares e amigos
sendo vítimas de discriminação. Foi um daqueles
momentos em que o planejado é ampliado pela
necessidade de desabafo. Em situações assim é que a
frase do grande mestre da literatura João Guimarães
Rosa faz todo o sentido, “Mestre não é quem ensina,
mas quem, de repente, aprende.”
Para que o projeto pudesse ser apresentado à
comunidade escolar, foi promovida a primeira Semana
da Consciência Negra, cujo título escolhido por
votação pelos alunos da escola foi “Minha consciência
é negra”. Aconteceram várias apresentações como
teatro, música, sarau, palestras, debates. Professores,
alunos e supervisão escolar puderam interagir e
discutir a questão racial de forma lúdica (Anexo II).
A I Feira Cultural “Somos Todos África” e a II
Semana da Consciência Negra aconteceram no ano
de 2013. A direção da escola já contava com o PIBID
AFRO e suas ações no espaço escolar (Anexo III).
No ano de 2014, aconteceram mudanças. Alguns
bolsistas saíram, outros chegaram. Além disso, o projeto
contemplou outro país africano, Angola. O objetivo era
trabalhar o cinema e a literatura da periferia de Angola
e comparar ao cinema e à literatura da periferia do
Brasil. Novos estudos e a escritura de um novo projeto

157
embalaram o novo grupo que se formou. A turma
escolhida para que as aulas fossem ministradas foi um
terceiro ano noturno (por volta de 30 alunos).
A nova sequência didática do ano de 2014 ini-
ciou-se com um jogo diagnóstico, visando compre-
ender melhor o pensamento dos estudantes sobre as
relações raciais e os aspectos sociais e culturais do
continente africano. Os discentes precisavam comple-
tar a frase “Eu sei que na África tem...”, para que pu-
desse ser feito um debate a respeito do que eles pen-
savam ou sabiam da África. Este primeiro momento
serviu também para desmistificar ideias sobre a África
e evidenciar sua pluralidade cultural, econômica e ra-
cial (Anexo IV).
Depois da primeira aula, como havia um novo
país escolhido, Angola, buscamos, através da literatura
e do cinema, mostrar aspectos do cotidiano urbano
de Luanda, capital de Angola. Ao mesmo tempo,
procuramos destacar a construção da identidade,
através da dança, da música e dos processos históricos.
Além de aprender sobre este novo país e sua
diversidade, neste novo projeto, os estudantes
puderam fazer vídeos com os recursos que contavam:
câmeras e celulares. Foi uma oportunidade de
registrar o que pensavam: seus sonhos, seus medos
e suas angústias. Eles fizeram entrevistas com outros
colegas, professores e com a coordenação da escola.
Nestes vídeos, eles puderam falar sobre vários temas,
inclusive sobre as questões étnico-raciais, além de
mostrar sua arte e a forma com vêem o mundo.
No ano em questão, além da III Semana da
Consciência Negra e da II Feira Cultural (que
aconteceram na mesma data, 19 de novembro de
2014), foi proposto aos bolsistas que desenvolvessem

158
um debate a respeito do dia 13 de Maio, dia da Abolição
Jurídica da Escravidão. Foi uma oportunidade de
pensar o quanto a abolição trouxe de liberdade (ou
não).
Todas as ações do PIBID AFRO UFOP na Escola
Estadual Dom Benevides buscaram fazer cumprir a
lei 10.639/2003.
Análise e discussão dos dados
Os resultados obtidos durante os três anos do
PIBID AFRO na Escola Estadual Dom Benevides
apontam para o que já era conhecido no início dos
estudos que motivaram a necessidade de criação deste
projeto, no que se refere a questões étnico-raciais no
espaço escolar, estamos apenas começando.
A implantação do PIBID AFRO na escola citada
neste trabalho trouxe questões e discussões que antes
não eram levantados neste espaço escolar. Como é
sabido e foi citado aqui, desde 1996, existe uma lei
que valoriza e considera a diversidade étnico-racial.
Porém, o que foi observado durante os três anos
analisados do projeto é que a escola, vez ou outra, no
dia 20 de Novembro5, faz alguma menção à cultura
afro e afro-brasileira, ficando por conta dos membros
do projeto a aplicação da lei 10.639/2003.
Quando o corpo docente é questionado sobre a lei,
as respostas aparecem, na maioria das vezes, de forma
uniforme. A maioria não vê a necessidade de uma
lei que privilegie a cultura negra. Alguns acreditam,
inclusive, que tal lei é que despertaria o preconceito,
uma vez que traria à tona a discussão de um tema
“espinhoso”. Outros ainda são a favor da política
3-O Dia Nacional da Consciência Negra é comemorado em 20 de novembro, dia
da morte de Zumbi dos Palmares, e reivindica essa figura histórica como símbolo
de resistência.

159
da miscigenação, do “somos todos iguais”. Existem
aqueles que afirmam que já tratam do tema dentro
de sua matéria: o professor de história fala da cultura
negra, afinal, o livro fala da escravidão; o professor de
geografia fala do tema, pois o material didático cita
os aspectos geográficos, as doenças, a pobreza e a
selva africana; o professor de literatura afirma que o
tema lhe é familiar, pois citam em suas aulas Castro
Alves, Cruz e Souza, mas, às vezes, esquecendo que
Machado de Assis, por exemplo, era negro.
Uma das dinâmicas desenvolvidas pelo projeto
a “Eu sei que na África tem...” trouxe importantes
discussões. Os estudantes tiveram a oportunidade
de citar o que eles imaginavam que tinha na África.
Foi curioso perceber que mesmo sendo uma turma
de terceiro ano do ensino médio, muitos estudantes
ainda pensavam que o continente africano era apenas
um país. Além disso, a maioria relacionava a África
apenas ao exótico, a doenças e à pobreza.

Cartaz produzido pelo alunos da 3ª Série do Ensino Médio, noturno - 2014

Foi possível perceber que os materiais didáticos


utilizados, as sequências didáticas produzidas, contri-

160
buíram para a discussão racial à medida que ofere-
ceram um espaço, uma oportunidade para se falasse
sobre o assunto. Algumas vezes foi possível perceber
que estudantes que inicialmente não aprovavam tra-
tar do tema étnico-racial na escola se envolveram e,
de certa forma, mudaram de postura, adquirindo uma
visão mais crítica sobre a discriminação no Brasil.
Além de despertar uma postura um pouco mais
crítica, um dos saldos positivos do projeto foi promo-
ver aulas que buscavam tratar de forma lúdica o tema
racial, o que é uma das propostas do PIBID, que as se-
quências didáticas promovam inovação metodológica.
Os estudantes puderam, através do corpo, das artes,
aprenderem uma nova cultura.

Oficina de Confecção de Máscaras Africanas – II Feira Afro - 2014



O que causa certo desânimo é perceber que
apesar de todo trabalho e esforço, as ações que
busquem uma igualdade racial ficam restritas mais ao
que é promovido pelo projeto.
Há certo receio que ao se retirar o projeto da
escola o tema caia no esquecimento. Porém, como disse

161
certa vez Albert Einstein “A mente que se abre a uma
nova ideia, jamais voltará ao seu tamanho original.”
Se por um lado há o receio, por outro, há a esperança
de que os estudantes envolvidos no projeto possam
continuar a propagar e a exigir práticas que promovam
a igualdade racial nas escolas e em todos os ambientes.
Considerações finais
O objetivo de fazer cumprir a lei 10.639/2003 foi
alcançado à medida que pudemos discutir a questão
racial no espaço escolar Dom Benevides. Há muito
que se fazer. O projeto do PIBID ainda acontece nesta
escola. Isso é uma prova de que as vozes que foram
introduzidas em 2012, não foram silenciadas, ainda
são ouvidas.
Os resultados obtidos durante os três anos do
PIBID AFRO na Escola Estadual Dom Benevides
apontam para o que já era conhecido no início dos
estudos que motivaram a necessidade de criação deste
projeto, no que se refere a questões étnico-raciais no
espaço escolar, estamos apenas começando.
Referências Bibliográficas
Livros

CABRAL, Amílcar. Guiné-Bissau – Nação Forjada na


Luta. Afrontamento. Lisboa, 1976.

HISTÓRIA GERAL DA ÁFRICA I: Metodologia e pré-


história da África / editado por Joseph. 8 v. Ki - Zerbo.
– 2. ed. rev. – Brasília: UNESCO, 2010.

MUNANGA, Kabengele. Negritude: Usos e Sentidos,


2ª edição. São Paulo: Ática, 1986. p.44.

162
PEREIRA, A. M. Por que estudar a História da África.
Rio de Janeiro: CEAP, 2006. 40p.

PEREIRA, Amilcar Araújo. Escola Mais Justa. 2011.

RAMOS, Alberto Guerreiro. Introdução crítica à


sociologia brasileira. Rio de Janeiro: Andes, 1957.

ROSA, J.G. Grande sertão: veredas.  13. ed. Rio de


Janeiro, J. Olympio, 1979.    

Sites

http://www.revistadehistoria.com.br/secao/educacao/
escola-mais-justa. Acesso em: 5 de maio. 2015.

http://culturaguine.blogspot.com.br/p/mandingas.
html. Acesso em: 15 de maio. 2015.

http://www.ueangola.com/. Acesso em: 15 de maio.


2015.

http://www.senado.gov.br/legislacao/const/con1988/
con1988_05.10.1988/art_5_.shtm. Acesso em: 10 de
jun. 2015.

http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf.
Acesso em: 13 de jun. 2015.

https://ensinosuperiorindigena.wordpress.com/
atores/instituicoes/secad/. Acesso em: 13 de jul. 2015.
163
Anexo I

Fotografia e identidade – aula sobre fotografia - 2014

Anexo II

Bolsistas, coordenadora e supervisora do PIBID na I Semana da Consciência


Negra - 2012

164
Bolsistas, coordenadora e supervisora do PIBID na I Semana da Consciência
Negra - 2012

Palestra e exibição de curtas sobre a cultura de Guiné-Bissau - 2013

165
Anexo III

Bolsistas e supervisora do PIBID na II Semana da Consciência Negra - 2013

Programação da I Feira Cultural “Somos todos África” – 2013

166
Programação da I Feira Cultural “Somos todos África” – 2013

Anexo IV

Aluno da 3ª Série do Ensino Médio 2014, durante atividade “Eu sei que na África tem”

167
Atividade da 3ª Série do Ensino Médio 2014, “Eu sei que na África tem”

Alunos da 3ª Série do Ensino Médio (noturno) 2014, bolsistas e supervisora do PIBID

168
Parte II
Lei 0.639/2003:
avanços e desafios
169
LEI 10.639/03: DIFICULDADES DOS PROFES-
SORES DE UMA ESCOLA DA REDE ESTADU-
AL, EM PONTE NOVA (MG), AO TRABALHAR,
NO ENSINO FUNDAMENTAL II, COM TEMÁ-
TICAS DE CULTURA AFRICANA EM SALA DE
AULA, EM ESPECIAL COM AS RELIGIÕES

Mírian J. C. Carvalho (UFOP/UNIAFRO)


Dr. Aurino José Gois (Orientador)1

“Na minha opinião, trabalhar com a cultura negra,


na educação de um modo geral e na escola em es-
pecífico, é considerar a consciência cultural do povo
negro, ou seja, é atentar para o uso auto-reflexivo
dessa cultura pelos sujeitos” (GOMES, 2003, p.17).
Resumo
O presente artigo buscou analisar as principais
dificuldades com as quais professores, de uma escola
da rede estadual em Ponte Nova (MG) se deparam
ao abordar assuntos ligados a cultura afro-brasileira,
dando uma ênfase àqueles que são encontrados
quando estes mencionam em suas aulas as religiões
de matrizes africanas. Educadores têm nos dias atuais
a missão de discutir e incrustar em seus alunos o
respeito e a aceitação da diversidade. Cabe aos docentes
buscarem novas metodologias de ensino para que
suas aulas saiam do modo tradicional propedêutico e
passem a fomentar as discussões sociais que se fazem
presentes na sociedade contemporânea. A proposta
deste trabalho, não é julgar, mas analisar e buscar
os autores e as legislações educacionais disponíveis
e vigentes no Brasil que possam servir de auxílio e
1-Professor do Departamento de Ciências da Religião da Pontifícia Universidade Católica
de Minas Gerais. Email: aurino.puc@gmail.com.

170
suporte para, se não sanar, pelo menos amenizar as
problemáticas encontradas nas salas de aula pelos
professores que participaram da pesquisa. Serão
discutidos ao longo deste texto os conceitos, autores,
aparatos didáticos metodológicos e espaços formativos
que possibilitem o trabalho dos docentes com a
temática. Assim, esse artigo tem como finalidade
pesquisar mais suportes para os professores da área da
educação básica que trabalham principalmente com
o ensino fundamental II, pois parte-se da premissa
que em cada fase ou modalidade educacional, alunos
e professores possuem necessidades e capacidades
reflexivas diferenciadas, então não se pode dissociar
os resultados obtidos com a modalidade na qual a
observação se concentrou.
Palavras-chave: Cultura, Matriz Africana, Formação,
Diversidade, Currículo.
Introdução
O objetivo geral desta pesquisa é encontrar as
principais dificuldades dos docentes em trabalhar a
cultura africana em sala de aula. Nada poderia ser
mais indispensável a este projeto como fazer uma
observação da atuação destes professores no dia a
dia de seu trabalho. No acompanhamento de suas
atividades em sala, pode-se observar a clareza e
objetividade de como eles abordam a temática sugerida
pela Lei 10.639/03, e a partir dessa observação, sugerir
um aprimoramento dessa abordagem, o que vem a
constituir em última análise o propósito deste artigo.
De acordo com Meirelles (2012), com a Lei
10.639/03 é incluído no currículo da Educação Básica
a questão da história da África e das religiões afro-
brasileiras como temática transversal a ser trabalhada

171
pelas disciplinas que compõem esse nível de ensino.
Assim, o autor busca as contribuições da antropologia
para a aplicação da lei em questão, colocando em
linhas gerais como os antropólogos abordam esta
temática voltada para educação básica.
As pesquisas são uma das principais fontes
usadas pelos docentes quando precisam lidar com um
novo tema. Os artigos resultantes dessas pesquisas
oferecem aos docentes uma base inicial a partir da
qual eles poderão aprimorar e incorporar novas
perspectivas às suas abordagens em sala de aula.
Aparatos Legais Disponíveis
Um importante fator a se observar em qualquer
área, seja em seu cotidiano pessoal ou profissional, é
a legislação. Considerando que na sociedade existem
regulamentações para reger todos os aspectos do
cotidiano, a educação sendo uma atividade social,
não seria diferente. Assim, é importante perguntar
até onde o professorado está ciente das exigências e
responsabilidades inerentes a sua profissão.
Seguindo uma ordem básica das exigências e
determinações legais sobre o tema aqui abordado tem-
se: a Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes
da Educação (LDB) de 1998, as Diretrizes Curriculares
Nacionais da Educação Básica atualizada em 2013,
a Lei 10.639/03, a resolução Nº 1 de 17 de junho
de 2004, o Parecer CNE/CP 3/2004, os Conteúdos
Básicos Curriculares do Estado de Minas Gerais
(CBC) de 2005, 2197/2013 (legislação estadual) e o
Ofício Circular 217/2014 de MG.
Com a Constituição de 1988, atual constituição
brasileira, a principal fonte legal no país, localiza-se já
em seu primeiro artigo, dos direitos sobre a educação,
a primeira fonte para o incentivo ao trabalho da
172
cultura africana e afro-brasileira dentro dos espaços
educativos oficiais:
“A educação, direito de todos e dever
do Estado e da família, será promovi-
da e incentivada com a colaboração da
sociedade, visando ao pleno desenvol-
vimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualifica-
ção para o trabalho” (BRASIL, 1988,
Art. 205).
LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação)
9394/98, normatiza a educação no Brasil, sendo esta
a principal lei quando necessário se referir a qualquer
etapa da educação, alterada com respeito a cultura
africana com a lei 10.639/03 serve de base para o
funcionamento de todos os níveis e especificidades da
educação nacional.
Lei 10.639/03 é uma das principais conquistas
dos africanos e afrodescendentes, pois com esta
Lei altera-se a LDB/98, incluindo no currículo da
educação básica, mesmo que ainda, em uma forma
de trabalho interdisciplinar, o ensino da história da
cultura africana e afro brasileira, nas escolas públicas
e privadas atuantes em todo território nacional.
Nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Edu-
cação Básica revisada em 2013, e distribuída para
todas as Instituições de Educação Pública do país,
já foi acrescido em seu texto, normatizações para a
Educação Escolar Quilombola e para a Educação das
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História
e cultura Afro-Brasileira e Africana. Essas normatiza-
ções assinalavam o histórico do tema, o direito a edu-
cação diferenciada; conceitos ligados a temática; lutas
envolvendo seu reconhecimento e de seu povo; sua
implicação em cada etapa da educação; seu funciona-

173
mento; materiais didáticos e de apoio pedagógico; ali-
mentação escolar; currículo específico da Educação
Escolar Quilombola; calendário diferenciado; projeto
político pedagógico e avaliação da mesma; formação
inicial e continuada de gestores e professores para li-
darem com o assunto. As Diretrizes Curriculares Na-
cionais da Educação Básica tornaram-se uma ótima
fonte de suporte para a superação das dificuldades
encontradas pelos professores em sala de aula e no
cotidiano escolar, porém como outras legislações, se
mostrou pouco conhecida pelos docentes conforme se
verificou nas entrevistas informais e na aplicação do
questionário durante esta pesquisa.
Dois importantes suportes foram criados para
facilitar o trabalho dos docentes com o tema da
cultura afro, oferecendo a eles embasamento para
formularem seus planos de trabalho. O primeiro foi o
Parecer CNE/CP 3/2004 que normatiza as diretrizes
curriculares para a educação das Relações Étnico
-Raciais e para o ensino da História da Cultura
Africana e Afro-Brasileira. O segundo foi a resolução
Nº 1, de 17 de junho de 2004, instituída pelo conselho
Nacional de Educação que estabelece as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das relações
Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e africana.
A partir de 2005, o Estado de Minas Gerais apre-
senta os Conteúdos Básicos Curriculares do Estado
(CBC) de 2005, que, segundo Dias, tinha como obje-
tivo:
“Estabelecer os conhecimentos, as ha-
bilidades e as competências a serem
adquiridos pelos alunos na educação
básica, bem como as metas a serem
alcançadas pelo professor a cada ano,

174
são uma condição indispensável para
o sucesso de todo sistema escolar que
pretenda oferecer serviços educacio-
nais de qualidade à população” (DIAS,
2005 p.1).
Os CBC´s escritos por Dias e autores especialistas
em cada uma das disciplinas do Ensino Fundamental
II, citados na bibliografia, são hoje o carro chefe para
o trabalho dos educadores da rede estadual de ensino,
não podendo as escolas da rede desconsiderá-lo em
nenhum momento.
A Lei 2197/2013 e o Ofício 221/2015 de MG,
que altera o ofício 360 de 2013, são as normatizações
específicas sobre o funcionamento da educação básica
nas escolas estaduais do estado de Minas Gerais.
São essas as principais legislações que amparam
os docentes e que servem de base para construção do
seu planejamento diário de trabalho em se tratando da
inserção da cultura africana e afro-brasileira.
Abordagem Curricular da Temática
Um ponto importante a se analisar em uma
pesquisa que tenha pretensão de servir de suporte
para atuação em sala de aula é o currículo efetivo
dos docentes. Como não é o objetivo deste trabalho
a análise profunda do currículo atual do ensino
fundamental no estado de Minas Gerais, será feita
apenas uma pequena abordagem do mesmo, pois,
este é um dos muitos entraves encontrados pelos
docentes atuantes nesta modalidade de ensino,
conforme assinalou os participantes dessa pesquisa.
De acordo com Meirelles:
“De um modo geral, e sem que seja
necessária uma profunda reflexão,
tem-se que, para que a Lei 10.639 seja

175
efetivamente cumprida e de fato atinja
os objetivos a que se propõe fazem-se
necessárias profundas mudanças no
modo como as referidas disciplinas
acadêmicas estão estruturadas e, tam-
bém, no modo como os professores que
hoje saem de nossas universidades são
preparados para lidar com essas ques-
tões. Contudo, a história nos mostra
que, transformações na Educação Bá-
sica sempre requerem uma adequação
do Ensino Superior, especialmente,
no que se refere à formação docente”
(MEIRELLES, 2012, p.153).
Meirelles (2012) retrata uma das principais rei-
vindicações dos professores desta etapa da educação.
De acordo com esses professores, a temática da cultu-
ral africana e afro-brasileira é muito pouco abordada
nos cursos de licenciatura. Eles também criticam a
forma estrutural do currículo do ensino fundamental
nas instituições escolares, no que diz respeito à diver-
sidade cultural e isso acarreta dificuldades no exercí-
cio cotidiano de sua profissão.
O currículo básico do ensino fundamental no
estado de minas é formado de maneira linear, apesar
de que a todo o momento exige-se que os docentes
desta área trabalhem de modo interdisciplinar.
Atualmente ao se pegar a matriz curricular desta
etapa da educação vê-se esta constituída por nove
disciplinas com um número de aulas pré-definidas
com seus conteúdos estipulados pelos CBC´S onde
o encaixe de novas temáticas se torna um trabalho
difícil no cotidiano da sala de aula.
Não resta dúvida que para a lei 10639/03 ser
bem sucedida em sua proposta, primeiramente deve-
rá ser feito um trabalho efetivo na abordagem desta

176
temática em cursos de licenciatura e pós-graduações,
pois estes formarão os docentes, que por sua vez terão
que colocar a citada lei em prática.
Levando em consideração o espaço em que a
pesquisa foi realizada, parece ser imprescindível que
se repense a estruturação das disciplinas no ensino
fundamental II na rede estadual do estado de Minas
Gerais. Essa exigência de repensar essa etapa do
ensino formal, para atender as necessidades tanto dos
educadores quanto a dos educandos, poderá também
ser aplicada aos demais Estados dessa nação.
Intolerância às Religiões de Matrizes Africa-
nas
O Brasil é um país conhecido por sua laicidade
constitucional, como estipulado na Constituição
Federal de 1988, art.19:
“Art. 19. É vedado à União, aos Esta-
dos, ao Distrito Federal e aos Municí-
pios:
I - estabelecer cultos religiosos ou igre-
jas, subvencioná-los, embaraçar-lhes
o funcionamento ou manter com eles
ou seus representantes relações de de-
pendência ou aliança, ressalvada, na
forma da lei, a colaboração de interes-
se público;
II - recusar fé aos documentos públi-
cos;
III - criar distinções entre brasileiros
ou preferências entre si” (BRASIL,
1988, Art. 205).
Sendo a escola uma instituição pública suben-
tende-se que esta não deve recriminar ou privilegiar
uma manifestação religiosa em detrimento de outra,
mas se for levado em consideração que esta institui-

177
ção é comandada por pessoas com suas preferências
definidas em todos os campos da vida social com a área
religiosa não poderia ser diferente. O espaço escolar
como nos relata Erisvaldo P. Santos (2005), se torna
em função de seus agentes em um local de construção
e manifestação de diversas identidades, não podendo
descartar sua responsabilidade na discussão ou sim-
plesmente reprodução do preconceito, seja ele de que
natureza for: religiosa, sociocultural, racial etc.
Para Santos (2005), a educação apresenta três
pressupostos:
“O primeiro é o de que a educação es-
colar constitui-se em espaço e tempo
de formação de identidades sóciocul-
turais, de reprodução e enfrentamento
de preconceitos e também de formas
correlatas de intolerâncias. O segun-
do pressuposto é o de que em vários
segmentos da sociedade brasileira en-
contram-se atitudes de preconceitos e
de intolerância, com relação aos adep-
tos e às religiões de matriz africana.
O terceiro pressuposto é o de que a
hegemonia das religiões de matriz ju-
daico-cristã, a discriminação racial e
a satanização de entidades espirituais
produzem uma invisibilidade das reli-
giões de matriz africana, pelas políti-
cas educacionais, e contribuem com a
indiferença de educadores, diante da
experiência de adeptos juvenis, que
vivem com medo de dizer o nome da
religião a que pertencem” (SANTOS,
2005, p. 18).

A maior dificuldade da sociedade atual em acei-


tar os costumes e culturas africanas está ligada princi-
palmente ao preconceito em relação a essa matriz re-

178
ligiosa. Na sociedade brasileira, o tema África parece
remeter imediatamente à religião, mas não a religião
em seu aspecto antropológico e cultural, e sim numa
versão preconceituosa e historicamente construída,
elaborada por instituições e pessoas que as combatia.
Com isso tornou-se o trabalho com esta temática na
escola algo muito difícil de ser realizado. É plausível a
notoriedade desse preconceito na sociedade brasilei-
ra e nas instituições de ensino apesar desse país ser
constitucionalmente um país laico.
Se considerar como dito inicialmente que a es-
cola é um espaço de construção e manifestação de
identidade, Nilma Lino Gomes (2005) expõe perfeita-
mente o papel da escola no desenvolvimento, positivo
ou negativo, sobre a identidade negra.
De acordo com Gomes:
“Sendo entendida como um processo
contínuo, construído pelos negros
e negros nos vários espaços –
institucionais ou não – nos quais
circulam, podemos concluir que a
identidade negra também é construída
durante a trajetória escolar desses
sujeitos e, nesse caso, a escola tem a
responsabilidade social e educativa de
compreendê-la na sua complexidade,
respeitá-la, assim como a outras
identidades construídas pelos sujeitos
que atuam no processo educativo
escolar, e lidar positivamente com a
mesma” (GOMES, 2005, p. 44).
Ao ignorar a existência das religiões de matriz
africana interfere-se diretamente na construção da
identidade dos praticantes da mesma, pois o sujeito ao
sentir parte de sua cultura rejeitada sente-se automa-
ticamente, obrigado a assimilar outras culturas para

179
se integrar e ser aceito no meio sociocultural, o que
irá modificar a forma como este se vê e se apresenta.
Essas publicações aqui abordadas como MEI-
RELLES (2012), SANTOS (2005) e GOMES (2003 e
2005), retratam a perspectiva de escritores e estudio-
sos do assunto a respeito do tema “África em sala de
aula”, não resta dúvida que hoje em pleno século XXI
muito se avançou em relação aos africanos e seus des-
cendentes na sociedade brasileira, porém, ainda está
longe de ter condições de se dizer que este é um país
livre de preconceito e totalmente adepto a aceitação
de toda e qualquer diversidade sócio- cultural.
Metodologia
Para descobrir as dificuldades dos docentes do
ensino fundamental II, no estado de Minas Gerais
foram aplicados um total de trinta questionários
interpelando, docentes de todas as disciplinas da
matriz curricular, de uma escola estadual na cidade de
Ponte Nova (MG), a respeito do que estes se deparam
como problemáticas no exercício de sua função. A
opção pelo questionário se deu exatamente pela
dificuldade de se encontrar tempo com os professores
para realizar entrevistas. Os questionários possuem
a característica de serem mais dinâmicos ao serem
respondidos e atendiam objetivamente a finalidade
buscada pela pesquisa.
Ao se formular o questionário foram levados em
consideração o que se pretendia com a pesquisa de
forma clara e objetiva. A escolha do local de aplicação
dos questionários se deu pela relação de proximidade
entre o pesquisador e a escola escolhida para à
aplicação dos mesmos.
A proximidade citada entre a escola participante
da pesquisa e a pesquisadora se deve ao fato da cidade

180
de Ponte Nova ser sua cidade natal, além de ser o
ambiente de trabalho desta.
A escola selecionada se localiza no centro comer-
cial da cidade de Ponte Nova (MG), recebendo alu-
nos de todos os bairros da cidade, principalmente dos
bairros periféricos, possui 275 alunos frequentando o
Ensino Fundamental II, divididos em 8 turmas sendo
duas de cada ano de escolaridade. O funcionamento
do Ensino Fundamental II acontece no 3° turno, pe-
ríodo da tarde, sendo que esta escola atua no Ensino
fundamental II, Ensino Médio e EJA (Educação de
jovens e Adultos), 35 professores atuam nesta etapa
de Educação Básica, sendo que destes somente trinta
se dispuseram responder ao questionário e conversar
sobre o tema.
Além de ter acontecido observações de aulas das
disciplinas como: história, arte, português, geografia e
ensino religioso, ocorreram também conversas infor-
mais com os professores a respeito de suas práticas e
desafios no desenvolvimento da temática pesquisada,
nessas disciplinas.
De acordo com a necessidade foram analisados
dados contidos nas fichas dos alunos, arquivados na
secretaria escolar e dados funcionais e dos docentes
da instituição arquivados nos recursos humanos desta
escola.
Como embasamento teórico estudou-se teoria
de pesquisadores renomados na temática africana e
afro-brasileira ligando seus trabalhos as respostas dos
docentes ao questionário proposto.
Análise de dados
O questionário aplicado foi constituído por nove
questões de investigação da temática, levando em
conta as premissas levantadas pelos pesquisadores

181
do assunto e pela sociedade a qual a instituição de
ensino está inserida. Essas premissas são aquelas
supramencionadas, a saber: a ausência da temática no
processo de formação dos professores nas instituições
formadoras, o preconceito vigente no país em relação às
religiões de matrizes africanas decorrente do processo
de formação da sociedade brasileira e a dificuldade
e resistência dos professores para trabalhar com a
temática.
Levando em conta as diversidades existentes na
sociedade contemporânea observa-se a formação do
professor como um dos entraves encontrados por estes
no exercício da docência, sendo assim perguntou-
se aos professores da escola pesquisada seu grau de
escolaridade e como sua graduação abordava os temas
transversais. Até porque segundo Moraes:
“Entendemos que para implementa-
ção da lei e o cumprimento de seus
pressupostos, é necessário a aproxima-
ção das novas pesquisas sobre escravi-
dão e o ensino escolar de história, atu-
alização e reformulação de materiais
didáticos e formação de profissionais,
estes elementos são fundamentais na
formação de uma consciência política
e histórica da diversidade” (MORAES,
2006, p. 2).
Dos trinta professores que participaram da
pesquisa 100% possuíam licenciatura em sua área
de atuação, porém todos disseram não ter sido
aprofundado em sua graduação a temática da
cultura africana. Aqueles que responderam possuir
conhecimento neste assunto o adquiriram através de
pós-graduação entre especialização e mestrado, sendo
estes apenas 20% dos professores pesquisados.

182
Um ponto positivo destas respostas está na
inexistência de profissionais que não possuem
licenciatura, o que se descarta a falta de metodologia
de ensino para tratar desses assuntos em sala de
aula. Afinal, em todas as licenciaturas, levando em
conta suas grades curriculares, existem disciplinas de
didática, onde se ensina aos futuros docentes como
trabalhar seus conteúdos de forma a ser absorvida
pelas diversas etapas da educação básica.
Porém, como ponto negativo temos a existência
de poucos profissionais com pós-graduação na
área, dando a estes pouco acesso ao conhecimento
específico sobre o assunto, dificultando assim o
trabalho com o temática. Essa constatação ocorre
ainda hoje, mesmo existindo atualmente uma
facilitação para especializações específicas sobre o
conteúdo, como na Universidade federal de Ouro
Preto (UFOP) promovida pela UNIAFRO e mestrados
Profissionais como os executados pela Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG) e pela Universidade
Federal de Juiz de Fora (UFJF) com linhas onde se
abrange a diversidade cultural e que são facilitados
para profissionais da área da educação.
Essa formação como o próprio Moraes (2006) se
posiciona é de fundamental importância para a exis-
tência de um trabalho efetivo e de qualidade, pois sem
o conhecimento se torna impossível o desenvolvimen-
to de um bom trabalho com o assunto, tendo em vista
que, além do pouco ou nenhum aprofundamento da
temática africana nas licenciaturas, nota-se, por parte
desses profissionais, pouca busca pelas pós-gradua-
ções como meio de formação continuada.
Outro tema abordado no questionário e nas
conversas informais com os professores foi sobre

183
a abordagem desta temática pelos CBC´s de suas
disciplinas, onde 85% disseram não existir uma
abordagem específica e apenas 15% disseram já ter
encontrado nos CBC´s este assunto.
Dos 85% que apontaram a ausência da temática,
55% foi advindo de professores de Ciências, Inglês,
Educação Física e Matemática. Os já 30% restantes
compreendiam professores das disciplinas de
Português, História, Geografia, Arte e Religião.
Dos 15% que disseram possuir em seu CBC
abordagem dessa cultura, 10% compreendiam as
disciplinas Português, História, Geografia, Arte e
Religião, 5% Matemática e Ciências.
O que os professores costumam errar muitas
vezes ao se trabalhar legislações e Normatizações,
como por exemplo, o CBC, é que nem sempre a
palavra em si, como Cultura Africana, irá aparecer.
Isto, no entanto, não quer dizer que esta não esteja
inclusa na temática de discussão. Nos CBC´s de
todas as disciplinas pode-se encontrar ou a influência
africana sendo trabalhada ou no mínimo espaço para
que esta seja discutida, como nos casos abaixo:
- No CBC de Língua Estrangeira, não existe uma
habilidade específica onde se aborde a temática, porém
como é uma disciplina onde se trabalha com leitura
e interpretação, em língua diferente da materna do
país, é possível trabalhar o assunto trazendo textos
que discutam o tema na língua escolhida pela escola
nesta categoria, que pode ser Inglês ou Espanhol em
Minas Gerais;
-Já no CBC de Geografia por obrigação didático
científica presente na formulação do conteúdo, o
professor terá que abordar o continente africano,
podendo utilizar esses momentos como espaço de

184
debate entre o passado e o presente, tanto na geografia
física, como política, e todas as outras divisões
existentes neste conteúdo;
-Em Ciências, como citado por um dos
profissionais da escola participante da pesquisa, o
docente pode trabalhar como já acontece nas escolas
quilombolas, onde neste conteúdo aproveita-se para
abordar as doenças que afligem os negros, africanos e
afro-brasileiros, principalmente. Pode-se usar o tema:
Mecanismos de Herança, Alteração das Características
pelo ambiente, dentre outras do CBC;
- No CBC de Português, como este possui grande
preocupação com a leitura e interpretação, se faz
imprescindível um forte trabalho de autoconhecimento
do sujeito com quem se trabalha, uma vez que, a
cultura deste influenciará diretamente em sua visão
de mundo, isso se vê principalmente no subtema:
Operação de Enunciação, nos tópicos: Vozes do
Discurso, e Organização do Suporte Jornal: Relações
com Público Alvo etc;
- Na disciplina de História, tanto na geral como
na do Brasil, é impossível o CBC ignorar a cultura
africana como uma das principais influenciadoras
e também influenciadas no cenário Brasileiro e
Mundial. Vê-se isso facilmente nos subtemas do
CBC: Histórias de Vida, Diversidade Populacional e
Migrações, Transformações Econômicas, Diversidade
Populacional e Colonização Portuguesa no Brasil etc;
- Em Educação Física assim como no conteúdo
de ciências o CBC se volta bastante para o lado da
saúde, onde o professor desta disciplina pode abordar
as limitações e habilidades dos povos africanos e seus
descendentes nos esportes, pois seu CBC trabalha
todas as práticas esportivas. Nota-se uma possibilidade

185
de trabalho com este tema nos tópicos: Diferença
entre o esporte educacional, de rendimento e da
participação, Inclusão no esporte etc;
- No CBC de Matemática como muito bem citado
por um dos professores participantes da pesquisa, não
existe abordagem específica da influência africana
para este conteúdo, porém esse docente diz colocar
no exercício de sua disciplina em sala de aula a
importância do povo africano na disseminação do
sistema indo-arábico. Este professor em questão é
praticante da Religião brasileira de matriz africana,
Umbanda, tendo assim forte proximidade com a
temática;
- Na disciplina de Ensino Religioso o professor,
segundo o CBC, deve discutir e demonstrar, se não
o reconhecimento pelo menos compreensão de todas
as religiões, incluindo as de matrizes africanas. Não
é porque o Brasil seja constitucionalmente laico, que
o torna desprovido de manifestações religiosas, mas,
sim que este aceita todas as manifestações religiosas e
as torna bem-vindas no território nacional.
Notou-se também uma divergência quando aos
professores, por meio do questionário, foi perguntado
a respeito do preconceito com a cultura africana
abordada em sala de aula e a receptividade dos alunos
com relação às religiões de cultura africana, onde 85%
disseram não existir preconceito com a cultura e 30%
disseram não ser bem aceita essas religiões dentro da
sala de aula. Segundo os docentes, 95% dos alunos são
praticantes da religião católica e veem nas religiões de
matriz africana o preconceito social difundido sobre
“macumba”, algo que segundo os mesmos, é repassado
pelo contexto onde estes estão inseridos.
Segundo os docentes desta escola, a temática

186
somente é cogitada na semana da consciência
negra. Analisando os projetos em andamento nesta
escola nota-se um forte trabalho sobre a valorização
da beleza negra, da construção da identidade negra
feminina, porém estes projetos englobam em sua
maioria professores das disciplinas de história, arte e
religião. Dos 90% dos professores que disseram existir
somente o projeto da consciência negra, somente16%
abrangem os profissionais das áreas de arte, história
e religião. A maioria dos profissionais destas áreas
supramencionadas, 84%, dizem estar envolvidos com
outros projetos que abordam a temática.
De acordo com Denys Cuche, a respeito da
definição de cultura:
“(...) ela diz respeito as vivências
concretas dos sujeitos, a variabilidadde
de formas de conceber o mundo e
as particularidades e semelhanças
construídas pelos seres humanos ao
longo do processo histórico e social”
(CUCHE, 1999, p. 25).
Laraia (2001, p.67) relata que Ruth Benedict es-
creveu, em O crisântemo e a espada, que a cultura é
como uma lente através da qual o homem vê o mun-
do. Se a cultura africana não é abordada corretamen-
te/ cotidianamente, seus adeptos ou herdeiros, terão a
tendência a desconsiderá-la em função de uma outra
considerada como digna de atenção e disseminação.
O trabalho da cultura africana em nenhum momento
poderá ficar restrito a uma data comemorativa, como
o dia 20 de novembro, “Dia da Consciência Negra”,
um dos motivos para se vetar na lei 10.639/03 o art.
78 b, foi que se determinou pouco mais de 10% do
currículo da Educação Básica para o trabalho com a
cultura africana e afro-brasileira. Portanto, o que se
187
dirá desta restrição a um único dia, como se viu pre-
senciado ou pelo menos disseminado entre a maioria
os professores pesquisados.
Os professores foram interpelados sobre o
conhecimento que estes possuem sobre as religiões de
matrizes africanas, 87% dizem não possuir nenhum
conhecimento e dos 13%, apenas 8% disseram já
ter participado de algum evento de manifestação
dessas religiões tais como: o dia da consciência negra,
lavagem da escadaria da penha, culto realizado em
praça pública na semana da consciência negra, em
sua maioria realizada por padres católicos.
Se for analisado que a cidade de Ponte Nova (MG),
possui um bairro, o bairro de Fátima, reconhecido
pala Fundação Palmares, em 2007, como bairro de
remanescentes quilombolas, além da existência de
terreiros de Umbanda e Candomblé, congado e folia
de reis, é um ponto curioso pensar que apenas 3,3%
dos docentes e 5% dos alunos possuem contato direto
com estas religiões e manifestações de cunho religioso
e não apenas em cultos populares. Ainda mais curioso
é o fato de que aproximadamente 25% dos alunos
desta instituição são moradores do bairro de Fátima
assim com 3,3% dos docentes, com base nos dados da
secretaria escolar e recursos humanos, bairro onde se
constatou a existência do grupo afro Gamga Zumba,
com seguidores do Candomblé, e com 90% dos
alunos negros. Estes dados foram coletados através
das pastas dos alunos na secretaria escolar. Trata-se
de um indicador numérico que deve ser levado em
consideração na preparação das aulas e do currículo
específico desta escola.
Nota-se pouca divulgação das especializações e
mestrados onde os profissionais da área da educação

188
poderão aumentar seu conhecimento sobre o assunto,
além de pouco trabalho junto aos mesmos sobre os
aparatos legais disponíveis para àqueles que abordam
a cultura afro dentro do ambiente escolar. Outro fator
a se levar em consideração é o meio social a que esses
profissionais fazem parte difere do meio dos discentes
que frequentam a instituição de ensino, até porque
93,4% dos docentes da escola declaram-se “pardos”,
e moradores de bairros centrais da cidade de Ponte
Nova (MG), seu olhar sobre o assunto não pode e não
deve ser dissociado desse dado.
Segundo Valente:
“De nada adianta dispor do livro didá-
tico e currículo apropriados se o pro-
fessor for preconceituoso, racista e não
souber lidar adequadamente com a
questão” (VALENTE, 2005, p. 63).
O que é importante se manter em mente é o fato
de que tanto o professor como aluno são membros ou
frutos do meio social do qual fazem parte, cabendo
a este não se anular, mas se posicionar criticamente
sobre tudo o que está em discussão na sociedade
contemporânea, mesmo que esta discussão nada
influencie seu meio de origem. Afinal ignorar ou
descartar uma discussão nada mais é que uma
manifestação de ignorância advindo do preconceito
social.
Conclusão
Com este trabalho pôde-se ter um vislumbre
do que vem ocorrendo em sala de aula, no que diz
respeito ao ensino da cultura africana e Afro-brasileira.
É necessário manter em mente que a lei que obriga
o ensino desta temática, 10.639/03, completou em
2015 nada mais que 12 anos de existência, ou seja,
189
mais que uma década se passou para o preparo dos
docentes no uso e trabalho com a mesma.
Considera- se que hoje a desculpa de não conhecer
a lei em questão não seja aceitável, pois se verifica
sua divulgação em diversos meios de comunicação de
massa: como televisão, programas de rádios, banners
e outdoors, sobre o trabalho antirracista.
O Brasil é um país atualmente onde existe uma
forte preocupação com o social, com a igualdade de
acesso e aceitação, assim sendo, esta lei deve ter sua
temática abordada de forma correta e densa pelas
escolas de todo o país. Afinal falar em igualdade é muito
fácil, o difícil está presente na hora de concretizá-la.
Nesta pesquisa abordaram-se as dificuldades
que o professor, de hoje, encontra ao tentar abordar
a cultura africana em sala de aula, em especial
quando este direciona seu trabalho para as religiões
de matrizes africanas. Tendo este questionamento
em mente formulou-se o questionário respondido
pelos docentes da escola escolhida e realizaram-se
conversas informais com os mesmos. Pôde-se notar
durante o levantamento dos dados que atualmente
todos têm em mente que a temática existe para ser
abordada, que existe uma lei que a obriga. O que se
viu, foi ainda pouca importância dada ao preparo que
os docentes possuem em seu currículo, para o trato
da temática, pouca busca por especializações e cursos
rápidos, afinal, poucos afirmaram que possuíam base
científica para trabalhar a temática.
O decreto estadual 46.125, de 4 de janeiro de
2013 traz um importante dado a ser observado com
relação a preparação do docente e de suas aulas:
“Art. 1º - A carga horária semanal de
trabalho correspondente a um cargo

190
de Professor de Educação Básica com
jornada de vinte e quatro horas com-
preende:
I - dezesseis horas semanais destina-
das à docência;
II- oito horas semanais destinadas a
atividades extraclasses, observada a
seguinte distribuição:
a) quatro horas semanais em local de
livre escolha do professor;
b) quatro horas semanais na própria
escola ou em local definido pela dire-
ção da escola, sendo até duas horas
semanais dedicadas a reuniões” (ES-
TADO DE MINAS GERAIS, 2013, Art.
1º).
Este decreto pode ser usado no momento de
preparação do professor para o trabalho com a cultura
africana e com demais temas transversais presentes
no currículo da educação básica. Afinal o professor
no estado de minas gerais, possui hoje uma carga
horária de 16 horas em sala de aula, onde antes eram
de 20 horas, para que 4 horas sejam utilizadas para
planejamento de suas aulas e discussão pedagógica,
que se fizerem necessárias para melhoria de sua
didática. Basta os supervisores e gestores utilizarem
parte dessas horas, como treinamento para os mesmos
e momento de ampliação de conhecimento, sendo
essas horas conhecidas nas escolas estaduais como
MÓDULO II.
Mas um fator determinante que se pode notar
com a aplicação da pesquisa é que na maioria das
vezes o meio em que o professor e o aluno vivem é
muitas vezes um obstáculo a ser encarado no trabalho
com a cultura africana, em especial com as religiões
dessa matriz cultural. Afinal como já abordado a
cultura de ambas as influências atuam diretamente

191
na sua visão de mundo, e principalmente, a forma
como estes encararão os problemas enfrentados pela
sociedade contemporânea, portanto antes de qualquer
coisa cabe aos docentes não ignorar suas próprias
características culturais, mas ter claro que não poderá
deixar que suas aulas se resumam a reprodução desta.
Para finalizar o tema aqui discutido se propõe
aos docentes, que busquem especializar-se da
melhor forma possível para o trabalho com os temas
transversais, em especial, com a cultura africana,
pois todo brasileiro tem em seu sangue a africanidade
fluindo.
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197
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ZONTE: OS LIMITES ENTRE O QUE JÁ FOI
FEITO E O QUE AINDA HÁ POR FAZER
Fernanda de Oliveira e Silva Colcerniani (UFOP/UNIAFRO)1
Edgar Rodrigues Barbosa Neto (Orientador)2
Resumo
A lei 10.639, promulgada em 09 de janeiro
de 2003, tornou obrigatório o ensino da história
e da cultura afro-brasileira nas escolas públicas
e particulares de todo o território nacional. A
implementação dessa lei é fruto da luta constante de
grupos do movimento negro brasileiro e se torna um
grande avanço para a educação, visto que o ambiente
escolar é um dos mais propícios para a construção de
um país mais democrático e menos preconceituoso.
Apesar da existência de uma Lei que busca incluir um
ensino mais igualitário dentro das escolas do Brasil,
percebe-se que há uma lentidão na aplicação efetiva
da Lei. Tendo em vista que a inserção da Lei caminha
a passos lentos, o atual trabalho buscou apresentar
os reais motivos que dificultam a aplicabilidade da
Lei dentro das escolas Estaduais da periferia de Belo
Horizonte.
Palavras-chave: Lei 10.639, Cultura Afro-Brasileira,
Ecolas Estaduais; Aplicabilidade.
Introdução
A criação da lei 10.639/03 foi um grande avanço
para o combate ao preconceito e uma vitória importante
para aqueles que acreditam que a educação é a
melhor maneira de se combater o racismo no Brasil. A
1-Universidade Federal de Ouro Preto. Curso de Especialização UNIAFRO:
promoção da igualdade racial na escola.
2-Professor orientador deste trabalho de conclusão de curso de especialização.

198
referida lei teria por objetivo modificar a LDB e exigir
o ensino da história e da cultura africana nas escolas
públicas e particulares de todo o território nacional. A
lei, portanto, é um grande passo para uma educação
democrática e igualitária.
Contudo, ainda hoje, mesmo após 12 anos da
promulgação da lei 10.639, a educação no país ainda
traça um caminho divergente. Nota-se que o currículo
pedagógico ainda mantém o foco numa educação
eurocêntrica que apenas fortalece as diferenças raciais
e sociais enraizadas no país. Ao observar que ao longo
dos anos obtivemos pouca evolução no que concerne
à implementação efetiva da lei, este trabalho buscou
observar o caminho que tem sido trilhado pelas
escolas públicas da periferia de Belo Horizonte para
fazer valer os direitos e obrigações previstos pela lei.
Para isso, foi realizada análises através de entrevistas
e observações a cinco escolas da periferia de Belo
Horizonte: E.E Djanira Rodrigues de Oliveira, no
bairro Jardim Europa; E.E Maria Carolina Campos,
no bairro Jardim Leblon; E.E Mendes Pimentel, no
bairro Fernão Dias; E.E X (a entrevistada pediu sigilo
do seu nome e do nome da escola), no bairro Ribeiro
de Abreu e, E.E. Zilda Arns Neumman, no bairro
Belmonte.
A realização do trabalho levou a seguinte
reflexão: porque se torna necessária a criação de uma
lei que obrigue o ensino da real história do Brasil e
da África? A preocupação com a real aplicabilidade da
lei ocorre por perceber que, somente através de uma
verdadeira educação igualitária, é que teremos um
salto em nossa educação. Segundo Eliane dos Santos
Cavalheiro, Coordenadora-Geral de Diversidade e
Inclusão Educacional da Secretária de Educação

199
Continuada, Secad/MEC:
“O silêncio sobre o racismo, o
preconceito e a discriminação raciais
nas diversas instituições educacionais
contribui para que as diferenças
de fenótipo entre negros e brancos
sejam entendidas como desigualdades
naturais. Mais do que isso, reproduzem
ou constroem os negros como sinônimos
de seres inferiores. O silêncio escolar
sobre o racismo cotidiano não só
impede o florescimento do potencial
intelectual de milhares de mentes
brilhantes nas escolas brasileiras,
tanto de alunos negros quanto de
brancos, como também nos embrutece
ao longo de nossas vidas, impedindo-
nos de sermos seres realmente livres”
(CAVALLEIRO, 2005, p. 11-12).
Ao pensar no processo de modificação da
educação e do currículo escolar pelos quais as escolas
públicas deveriam estar inseridas e, ao observar que,
o processo tem sido muito lento, surgiram as seguintes
indagações:
• O trabalho sobre as questões raciais é feito de
maneira gradual ao longo do ano letivo ou é
mantido apenas na comemoração do dia 20
de novembro?
• Os professores e a direção conhecem a
história da cultura africana ou trabalha as
questões voltadas para o senso comum dando
foco apenas na escravidão e na lei Áurea?
• O trabalho que envolve as questões raciais
dentro das escolas possui efetiva participação
dos professores de todas as áreas de ensino?
• O que de fato impede a efetivação da lei

200
nas escolas públicas da periferia de Belo
Horizonte?
Para responder a essas perguntas buscou-
se verificar como são realizados os trabalhos que
envolvem as questões ligadas ao negro e a sua história;
se a comunidade escolar, composta pelos docentes,
se envolve de forma efetiva para o desenvolvimento
pleno dos trabalhos; se os docentes e a direção
conhecem a lei em questão e se esforçam para que a
sua efetivação ocorra e se os trabalhos são realizados
de forma gradual, inseridos no currículo escolar e não
se reduzem apenas as comemorações do dia 20 de
Novembro.
Para alcançar os objetivos propostos priorizou-se
não só a observação do dia a dia escolar, como também
a entrevista semi-estruturada com professores, vice-
diretores e diretores que vivenciam o cotidiano nas
escolas e que estão à frente dos trabalhos realizados
com os alunos. A escolha da entrevista semi-
estruturada se deu porque se entende que a interação
com os entrevistados ocorra de maneira mais livre e
espontânea. De acordo com Alves-Mazotti (1999) “por
sua natureza interativa, a entrevista permite tratar
de temas complexos, que dificilmente poderiam ser
investigados adequadamente através de questionários,
explorando-os em profundidade” (p.168).
Fundamentação teórica
O norte para a pesquisa desenvolvida é a
alteração da lei 9.394 de 1996. Além de estabelecer as
diretrizes e bases da educação nacional que inclui no
currículo oficial da Rede de ensino a obrigatoriedade
da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, a lei
inclui também:
Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fun-
201
damental e médio, oficiais e particulares, torna-se
obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Bra-
sileira.
§ 1o O conteúdo programático a que se refere
o caput deste artigo incluirá o estudo da História da
África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil,
a cultura negra brasileira e o negro na formação da
sociedade nacional, resgatando a contribuição do
povo negro nas áreas social, econômica e política
pertinentes à História do Brasil.
§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura
Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o
currículo escolar, em especial nas áreas de Educação
Artística e de Literatura e História Brasileiras.
Tendo como base o que promulgou a lei, é natural
que se questione o que foi feito e a maneira como foi
feito até hoje para que a lei fosse cumprida. Como
professora de escola pública Estadual é impossível
não se incomodar ao perceber que, mesmo após mais
de 10 anos, a aplicação de um novo currículo que se
adapte ao proposto ainda está longe de ser realidade
nas escolas. É certo que a modificação da LDB é um
grande avanço e um passo primordial para que a África,
o negro e a sua cultura sejam entendidos e inseridos
na educação a fim de minimizar - quiçá, abolir – o
preconceito racial no Brasil. Contudo, a criação da lei
por si só não é suficiente para que as modificações
ocorram.
Aplicar a lei é tão ou mais importante que a
existência da lei por si só. E não basta aplicar de forma
incoerente, descontextualizada ou focada apenas
no dia 20 de novembro. Para que haja mudanças
necessárias e expressivas é necessária uma mudança
efetiva dentro das escolas. De acordo com Sales:

202
“Os movimentos sociais negros, bem
como muitos intelectuais negros
engajados na luta antirracismo,
levaram mais de meio século para
conseguir a obrigatoriedade do estudo
da história do continente africano e
dos africanos, da luta dos negros no
Brasil, da cultura negra brasileira e
do negro na formação da sociedade
nacional brasileira. Contudo, torná-
los obrigatórios, embora seja condição
necessária, não é condição suficiente
para a sua implementação de fato.
Segundo o nosso entendimento, a
Lei nª 10.639, de 9 de janeiro de
2003, apresenta falhas que podem
inviabilizar o seu real objetivo, qual
seja, a valorização dos negros e o fim do
embranquecimento cultural do sistema
de ensino brasileiro” (SANTOS, 2005,
p. 34).
A lei prevê não apenas a inserção do ensino da
Cultura Afro, mas também a qualificação dos profes-
sores e o seu constante aperfeiçoamento pedagógico
ficando a cargo do Poder Executivo fiscalizar a aplica-
ção da lei. Contudo, na prática, não percebemos uma
efetiva aplicação, nem a preparação dos professores
e tampouco a fiscalização pelo Poder Executivo. É
primordial, então, que os movimentos sociais negros
que conseguiram que a lei fosse implementada, pres-
sionem os órgãos responsáveis para que a lei não se
transforme em “letra morta do nosso sistema judiciá-
rio” (SANTOS, 2005, p. 35).
Ao longo dos anos percebeu-se um aumento em
relação ao número de crianças matriculadas nas esco-
las em todo o país, contudo, esse aumento, não se re-
laciona a melhora do ensino e, tampouco, contribuiu

203
para a redução da desigualdade racial no país.
Carlos Henrique Araújo, do MEC, e Ubiratan
Castro de Araújo, presidente da Fundação Cultural
Palmares, analisando os dados do Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica (Saeb), apontaram que
“os alunos negros que sobrevivem na escola são víti-
mas de uma sistemática queda de desempenho. Entre
1995 e 2001, a diferença no desempenho escolar na
prova de leitura dos estudantes negros, em relação aos
brancos, aumentou de 20 para 26 pontos. O estudo
mostra ainda que, em leitura, na 4ª série do Ensino
Fundamental, 67% dos estudantes negros apresentam
desempenho classificado como ‘crítico’ e ‘muito críti-
co’, contra 44% de alunos brancos. Os dados revelam
que, mesmo entre estudantes de escolas particulares,
portanto com níveis socioeconômicos similares, o de-
sempenho entre brancos e negros não é igual. Na 4ª
série, em Língua Portuguesa, alunos negros alcançam
uma pontuação de 179, na escala de desempenho, e
os brancos, de 228 pontos” (A cor da cultura– Cader-
no 1, “Modos de ver” pg 34).
Obviamente, esses números demonstram que a
escola é um lugar desinteressante para os negros e,
portanto, aprender em um local em que não é possível
se enxergar, se torna inviável. Para que haja mudança
nessa realidade atual, é necessário o envolvimento de
toda comunidade escolar. Não só no sentido de aplicar
a lei, mas também compreendendo a sua importância
e relevância para a modificação do sistema educacional
eurocêntrico.
Metodologia
Este trabalho visa analisar como as escolas
Estaduais da periferia de Belo Horizonte trabalham
com as questões previstas na lei 10.639. O principal
204
objetivo é verificar se os trabalhos relacionados à África
e a cultura negra são realizados de forma gradual (e
como são realizados), ou se o tema é abordado apenas
no dia 20 de Novembro. Além disso, é essencial a
este trabalho averiguar se a direção e a equipe de
docentes têm conhecimento da referida lei e como
eles trabalham a história da África e do negro com os
alunos.
O recorte é dado às escolas de periferia, visto
que é na periferia que encontramos o maior número
de negros. Logo, as escolas de periferia também pos-
sui a maior concentração de alunos negros. Segundo
o IBGE, o índice de alunos negros e pardos chega a
56,4% em escolas públicas do Brasil, porém, cerca de
20% dos entrevistados não se pronunciaram na en-
trevista (Censo Escolar 2005). Além disso, verifica-se
que existe uma grande disparidade nos indicadores de
escolaridade. A população negra possui menos índice
de escolaridade quando comparados com os brancos,
segundo dados do Censo de 2000.
De acordo com dados do Censo 2000, levantados
pelo Observatório Afro-Brasileiro, dos 15,3 milhões
de analfabetos brasileiros existentes naquele ano, 9,7
milhões eram formados por negros e negras. Entre
os 32,7 milhões de analfabetos funcionais, os negros
totalizavam 18,8 milhões de pessoas. Assim, segundo
os indicadores do Censo Demográfico de 2000, a taxa
de analfabetismo dos negros maiores de 15 anos, em
todo o Brasil, era de 18,7%, e a taxa de analfabetismo
funcional da população negra maior de 15 anos era
de 36,1%. Esses percentuais eram substancialmente
maiores do que os verificados entre a população branca,
cujos percentuais de analfabetismo e de analfabetismo
funcional eram de, respectivamente, 8,3% e 20,8%.

205
Vale salientar que, conforme dados levantados pelo
Observatório Afro-Brasileiro, no ano de 1950, segundo
o censo demográfico realizado naquele ano, a taxa
de alfabetização dos brancos de 15 anos ou mais de
idade era de 60,2%, ao passo que, para os negros da
mesma faixa etária, essa proporção era praticamente
a metade, ou seja, 30,7%. Isso quer dizer que, em 50
anos, aumentaram as distâncias relativas do indicador
da taxa de alfabetização de brancos e negros (A cor da
cultura– Caderno 1, “Modos de ver” pg 32).
Dessa maneira, torna-se imprescindível que a
escola, visto como locus de solução dos problemas de
desigualdade se envolva de maneira efetiva para fazer
valer a efetivação da lei 10.639. Além disso, devido a
realidade social das escolas de periferia, os temas que
se relacionam a história e a cultura do negro devem
se fazer mais presentes para que esse aluno negro,
marginalizado e excluído ao longo da história do
Brasil, consiga encontrar sua identidade como sujeito
na sociedade e, dessa maneira, superar os entraves
sociais e econômicos que permeia o seu cotidiano. A
importância de se trabalhar os assuntos referentes ao
negro e sua cultura é primordial em todas as classes
sociais e para todas as raças. Segundo a relatora das
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e
Cultura Afro-Brasileira e Africana Petronilha Beatriz
Gonçalves e Silva:
“Pedagogias de combate ao racismo
e a discriminações, elaboradas como
intuito de educação positiva, tem
como objetivo fortalecer entre os
negros e despertar entre os brancos
a consciência negra. Entre os negros,
poderão oferecer conhecimentos e

206
segurança para orgulharem-se da
sua origem africana; para os brancos,
poderão permitir que identifiquem
as influências, a contribuição a
participação e a importância da história
e da cultura dos negros no seu jeito de
ser, viver, se relacionar com outras
pessoas, notadamente as negras”
(Parecer CNE/CP 3/2004;16).
Para que a lei seja efetiva é necessária a
participação de toda comunidade escolar, em todas
as disciplinas e não apenas com projetos focados em
datas comemorativas. O ensino da Cultura Africana
é a melhor maneira de romper com um ensino
eurocêntrico que tem caracterizado o ensino escolar
até hoje, sendo assim, esse ensino não representa o
nosso povo e, portanto, o aluno negro não se identifica,
perdendo assim a sua autoconfiança e auto-estima. Do
outro lado, o branco se reconhece, mas não reconhece
o negro e, tampouco a importância de que o negro
teve na formação do país.
Acredita-se que a falta de preparação dos
docentes é um dos principais motivos que entrava a
aplicação efetiva da referida lei. Além de não haver
preparo e investimento do governo para a preparação
da equipe de professores do Estado, o currículo das
Universidades nos cursos de Licenciatura também
deixam a desejar. O Brasil não é um país que possui
relações raciais harmoniosas e, mesmo com todos
os esforços feitos para que esses problemas sejam
solucionados, pouco se pode fazer com uma lei que
não possui pessoas capacitadas e encorajadas a colocá-
la em prática.
Para que haja oportunidade de contar a
verdadeira história do negro e da África, muito mais

207
que uma lei, precisamos de pessoas capacitadas e que
tenham a real conhecimento exigido.
Resultados e discussões
Para a realização deste trabalho foram entrevis-
tados cinco profissionais da diretoria ou supervisão de
cinco escolas diferentes. Três, dos cinco profissionais
entrevistados, pediram que a identidade pessoal e da
escola fossem mantidas em sigilo. Portanto, para res-
peitar o desejo dos entrevistados, em alguns momen-
tos, serão criados nomes fictícios para a análise de re-
sultados.
Escola 1 - E.E Djanira Rodrigues de Oliveira –
bairro Jardim Leblon:
A vice-diretora Hailza, a principio, não se lem-
brava exatamente da lei 10.639. Mas, após ter sido
lembrada a que a lei se referia, disse conhecê-la. Con-
tudo, mesmo conhecendo a lei e, sabendo da obriga-
toriedade que a envolve, a vice-diretora afirma que a
escola trabalha com temas que circunda a África e as
Africanidades apenas no mês de Novembro. A escola
realiza feira de cultura com o tema, desfiles e apresen-
tação de comidas típicas de países Africanos.
Segundo Hailza, um dos fatores que impede a
realização de projetos ao longo de todo o ano letivo é
a exigência que a secretária de educação faz para a
realização de outros projetos. Dessa forma, a escola
fica muito atarefada e sem tempo de aprofundar em
outras questões.
Além disso, a vice-diretora acredita que, a falta
de preparação dos professores, a falta de treinamento
e a falta de debate sobre o assunto, são fatores que
dificultam a aplicabilidade da lei na E.E Djanira
Rodrigues de Oliveira. Contudo, ela também acredita

208
que os alunos já se dão bem, independente da cor.
Escola 2 - E.E X – bairro Ribeiro de Abreu (a
entrevistada pediu sigilo do seu nome e do
nome da escola):
A vice-diretora da escola em questão também
teve dificuldade de lembrar-se do que se tratava
a lei 10.639 (No entanto, também a conhecia). A
entrevistada relata que a escola realiza projetos no
mês de Novembro que tem, como foco, o preconceito
racial. Os trabalhos são realizados mais em sala de
aula, com apresentação de temas e elaboração de
cartazes.
Ao ser questionada sobre os motivos que levam a
escola a não realizar projetos que envolvem as questões
da África e das Africanidades ao longo do ano, disse
que a escola não pensa no assunto e nem enxerga a
necessidade. Ela acredita que existem vários outros
temas de igual importância e que, em cada época
do ano, cada um desses temas devem ser trabalhado
dentro da escola.
Para a vice-diretora o fator da existência de
outros projetos solicitados pela secretaria de educação
inviabiliza o foco para a lei 10.639. De acordo com
ela, se a escola for por em prática todos os projetos
solicitados pela secretaria, não haverá tempo para os
conteúdos programáticos de cada disciplina.

Escola 3 - E.E Y – bairro Belmonte (o entrevistado


pediu sigilo do seu nome e do nome da escola):
O supervisor da escola Y também precisou
ser relembrado da Lei 10.639 para saber do que se
tratava. Relata que não percebe muito interesse e
envolvimento da equipe de docentes, tampouco por

209
parte da direção e supervisão. Segundo o entrevistado,
as tarefas atribuídas à direção, impede que a diretoria
e a supervisão se envolvam mais no processo que
envolve os projetos. Portanto, todos os projetos
solicitados pela secretaria de educação são deixados
na mão dos professores. E, os professores, por sua vez,
possuem diversos projetos solicitados pela Secretaria
da Educação.
Em Novembro o projeto é realizado através de
feiras, palestras, desfiles e outras coisas. Para o vice-
diretor, um ano letivo é pouco para trabalhar tudo
que é pedido pela Secretaria, portanto, ter trabalhos
focados em determinada época do ano, é um fator
positivo e pontual para todos.
Contudo, o entrevistado acredita que há outra
questão: a criação da lei sem a devida preparação
dos docentes. As leis são criadas, mas, não há uma
preocupação em capacitar profissionais que sejam
capazes de colocar a Lei em prática da forma eficiente.
Escola 4 - E.E. Maria Carolina Campos – bairro
Jardim Leblon:
De acordo com a supervisora Luciana Tomaz, a
atribuição de trabalhar os conteúdos que envolvem a
África e as Africanidades, fica a cargo dos professores
de História e Artes. Mesmo ela tentando realizar
intervenções com esses professores, buscando a
interdisciplinaridade entre os conteúdos, a supervisora
relata que os trabalhos acabam ficando restritos ao dia
20 de Novembro.
Segundo Luciana o que impede que o trabalho seja
realizado ao longo do ano é o calendário extremamente
puxado, o currículo extenso e, principalmente, a
ausência de reuniões para planejar melhor as ações.
Em geral, os professores não apresentam resistência
210
para desenvolver os trabalhos, mesmo havendo
àqueles que tendem ao individualismo. Os trabalhos
realizados são, geralmente, interdisciplinares e que
buscam exaltar a beleza e o valor da cultura negro e
dos negros.
A supervisora acredita que, para que a lei
tivesse uma melhor aplicabilidade, seria necessário
maior planejamento, reuniões, organização a cada
bimestre do ano letivo e intervenções. Compreende
a necessidade de capacitação dos docentes, mas,
acredita que o planejamento é o primordial para a
organização da escola e dos projetos.

Escola 5 – E.E. Mendes Pimentel – bairro Fernão


Dias.
Ludmila, a vice-diretora da Escola Mendes
Pimentel, foi a única entrevistada que relatou algo
diferente dos demais. Segundo Ludmila, a escola
trabalha temas que envolve a África e as Africanidades
ao longo de todo o ano letivo. Uma professora de
história foi responsável por levar para a escola um
projeto chamado “A cor da cultura”, que envolveu os
professores e todo o alunado.
Em meio aos trabalhos realizados, surgiu um
grave problema: a questão religiosa. A apresentação
de um aluno candomblecista despertou a revolta de
alguns evangélicos e, por isso, quase se iniciou uma
guerra religiosa dentro da escola. Em decorrência
da apresentação do aluno, na hora do intervalo, os
evangélicos começaram a fazer cultos religiosos e,
a direção, abriu espaço para todas as religiões. No
entanto, os alunos que participavam dos cultos de
candomblé sempre eram hostilizados pelos demais.
Os trabalhos voltados para a cultura negra são

211
realizados ao longo do ano desde 2012, mas, em
Novembro, há intensificação dos trabalhos com desfiles,
concursos e outras atividades, com a participação de
todos. Segundo a vice-diretora, a equipe da direção não
sabe lidar bem com a questão da religiosidade dentro
da escola. A diretora é evangélica e preconceituosa e,
dessa maneira, torna-se difícil o enfrentamento.
Para Ludmila o que impede que o trabalho
seja melhor aplicado é a carga enorme de trabalho
da direção. Ela reconhece que implementar coisas
novas geram trabalho e, por isso, muitas vezes são
postas de lado. Além disso, para ela, o preconceito
contribui bastante para que as pessoas não percebam
a importância de trabalhar esses temas na escola.
Análise
Ao analisar as entrevistas realizadas notamos
que: três entrevistados não se lembravam da Lei, mas,
ao falar do que se tratava, eles disseram conhecer a
Lei em questão. Os outros dois sabiam perfeitamente
do que se tratava, mas, apesar disso, o resultado
encontrado com as entrevistas não causou grandes
surpresas.
Ao serem questionados como a Lei vem sido
aplicada dentro da escola, apenas uma vice-diretora
disse que há preocupação em realizar trabalhos
voltados para as discussões raciais ao longo de todo ano
letivo. Os outros quatro entrevistados reconheceram
que, apesar de conhecerem a lei, as atividades
voltadas para o estudo da África e das Africanidades
se mantêm apenas como um projeto sazonal realizado
na comemoração do “Dia da consciência negra” em
20 de Novembro de cada ano.
Após analisar as entrevistas realizadas percebe-
se que, grande parte da direção e da supervisão
212
ainda não compreende a importância da Lei 10.639
e, tampouco, como podem contribuir para que os
professores também se envolvam com a questão.
Apesar de a Lei ter sido criada há 12 anos, as escolas,
de fato, ainda não aplicam a lei da forma como deveria
ser. Ou seja, não encaram como processo contínuo,
em que toda a escola esteja envolvida e que sirva para
modificar a educação desde a sua raiz. É notório que
a criação da Lei trouxe pouco desenvolvimento nesse
âmbito para as escolas de periferia. Compreende-se
que o processo de modificação cultural dentro das
escolas é lento, mas, após 12 anos, muitas coisas já
podiam ter sido realizadas. Contudo, não é o que se
observa na prática.
Um dos itens que mais chama a atenção, após
observar a avaliar as entrevistas, é perceber no relato
da direção que, a própria Secretaria de Educação
dificulta a aplicabilidade da lei ao cobrar uma grande
demanda de projetos sobrecarregando, assim, o
cotidiano escolar e dificultando a aplicabilidade da Lei
10.639 e a realização eficientes de outros projetos. Além
disso, a crença de que os alunos não se discriminam
entre si e, por isso, não há a necessidade de se debater
o assunto, também gera um grande entrave para a
aplicabilidade legítima da Lei.
Percebe-se também que, alguns representantes
das escolas, não entendem a importância da Lei e nem
o porquê de sua existência. Dessa maneira, a Lei é vista
como algo exagerado e banal, não sendo necessário ser
discutido dentro de escolas que, a princípio, possuem
alunos negros e brancos convivendo em harmonia. A
falta de percepção e orientação por falta da diretoria
contribui para que a Lei passe de forma muito sutil
dentro das escolas e, assim, contribui pouco para a

213
mudança esperada. Claro que houve mudanças. Antes
da Lei, as questões raciais eram sequer discutidas,
porém, os passos ainda são lentos.
Outro fator que é interessante observar é que,
na escola em que a vice-diretora afirma haver um tra-
balho menos pontual e que se desenvolve ao longo do
ano letivo, surgiu outro entrave: a questão religiosa.
A intolerância religiosa é, de fato, um dos fatores que
dificulta a aplicabilidade da Lei. Adeptos de religiões
ligadas ao cristianismo veem as religiões de matrizes
Africanas relacionados à “macumba” e a todas as for-
mas pejorativas que envolvem a palavra. A falta de
conhecimento da cultura e da religião leva ao precon-
ceito e a intolerância, dessa forma, todo o ambiente
escolar, que deveria ser o melhor ambiente de promo-
ção da igualdade racial, torna-se um local de dissemi-
nação do preconceito já existente.
De acordo com a professora e pesquisadora
Ana Célia da Silva, da Universidade Federal da Bahia
(UFBA), em entrevista ao Portal EBC, a atuação dos
professores evangélicos torna-se um entrave para a
efetiva aplicação da Lei. De acordo com Silva, alguns
professores optam por não trabalharem os livros
enviados pelo MEC por acreditarem que, os livros que
tratam da cultura Afro, ensinam coisas do demônio.
Obviamente percebe-se a dificuldade que as
escolas possuem em trabalhar as questões raciais.
Seja pela falta de preparo dos docentes, pelo racismo
ainda pungente ou pela grande demanda de projetos
impostos pela Secretária de Educação, a escola ainda
não está preparada para debater os temas ligados ao
negro, a cultura negra, a História da África e, claro,
o racismo. Quando as escolas encontram professores
capazes de debater o tema, outro entrave surge: o
religioso. E dessa forma, vê-se que, a efetiva aplicação
214
da Lei 10.639 ainda é muito frágil e superficial.
Conclusão
Ao analisar como a Lei 10.639 está sendo
aplicada nas Escolas Estaduais da periferia de Belo
Horizonte, verifica-se que, apesar da lei ser conhecida
no contexto escolar, a sua real aplicabilidade encontra
diversos entraves. É notório que a aplicação da Lei
se mantém de forma superficial e sazonal, sendo
lembrada e tendo foco, na maioria das vezes, apenas
nas comemorações do dia 20 de Novembro. Além disso,
a maneira em que as escolas buscam tratar o assunto,
muitas vezes, acaba caindo no senso comum e reforça
a desvalorização da cultura e da identidade dos negros.
Para que a lei seja cumpria, ou seja, para que haja
valorização e respeito da cultura negra, é necessário
que o assunto esteja presente no dia a dia da escola e
que os alunos possam expor suas dúvidas e angústias
e, dessa maneira, possuir alguém que os oriente nas
questões. O negro no Brasil sofre preconceito pelo
seu tom de pele, pela sua forma de se vestir, por sua
religião, características físicas, entre outros. Portanto,
é dever da escola interferir na formação crítica das
crianças e adolescentes, para que, o preconceito já
enraizado, possa ser aos poucos, transformado. Dessa
maneira, as próximas gerações terão uma visão menos
discriminatória. Para tal, é necessário um diálogo de
valorização da cultura afro e uma lógica pedagógica
aberta ao diálogo intercultural.
O problema maior é que ainda hoje, as questões
que envolvem a negritude, são desvalorizadas e
minimizadas dentro do contexto escolar. A pouca
valorização cultural do negro é um grande entrave
para as conquistas que a lei 10.639 almejou alcançar.
Constata-se também que, a própria Secretaria de
Educação busca a valorização de outros projetos,

215
ocupando um tempo precioso e primordial dentro das
escolas. Seja pela preparação precária do docente, pela
falta de tempo disponível na escola ou pelo racismo
ainda permeado em nossa sociedade, a Lei 10.639,
dentro das escolas de periferia de Belo Horizonte,
caminha de forma lenta e previsível. É primordial,
ainda, reiterar a dificuldade em tratar do assunto
quando esse esbarra na questão da religiosidade.
Tratar a cultura negra significa entender todos os seus
ideais, inclusive os que tangem a religião. Contudo,
a sociedade brasileira culturalmente eurocêntrica,
associa a cultura religiosa de matriz africana a entidades
malignas e obscuras. Dessa maneira a dificuldade de
inserção histórica da cultura negra e africana se torna
mais complexa. O preconceito enraizado, em todas as
vertentes, é, portanto, uma das maiores dificuldades
existentes no contexto escolar.
Sendo assim, a cultura branca continua sendo
exaltada e a do negro sendo deixada de lado. Ainda
é notório que a beleza a ser alcançada socialmente
é a branca, os heróis estudados são os brancos, a
valorização cultural que possuímos é a do branco. Nas
escolas os alunos negros não se identificam com o que
é ensinado, afinal, a história e cultura do seu povo
não está sendo representada ali. Isso reflete de forma
negativa na autoestima dos alunos negros. Sendo
assim, a falta de preparo para trabalhar com a cultura
negra e as relações étnico-raciais em sala de aula,
faz com que os professores optam por negligenciá-
la. Dessa maneira, a aplicação efetiva da lei torna-
se restrita na prática. E após mais de dez anos da
criação da lei, é fato que não podemos desconsiderar
os avanços conquistados, mas, ainda há muito que
se fazer. É preciso maior interação da comunidade
escolar e maior percepção do problema para que a lei
possa ser de fato implementada por completo.
216
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Brasília, 2005.

217
A LEI N°10.639/2003 E O CURRÍCULO AFRO-
CENTRADO: DESAFIOS E POSSIBILIDADES
DA EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES ÉTNICO-
-RACIAIS
Sirlei Alves Torres (UFOP/UNIAFRO)1
Leandro Santos Bulhões de Jesus (Orientador)2
Resumo
O tema deste artigo é a Lei n°10639/2003, a
qual instituiu a obrigatoriedade do ensino da História
e Cultura Afro-Brasileira e Africana nos currículos
das escolas de Educação Básica de todo o Brasil,
buscando, entre outras coisas, desconstruir a imagem
negativa do negro e da negra na sociedade brasileira.
Nesse compasso, o presente artigo tem como objetivo
geral: analisar a teoria e a prática da Lei n°10639/2003
e como objetivos específicos: abordar a importância
da Lei e apontar as dificuldades e desafios de sua
aplicação no espaço escolar. Procurando atingir esses
objetivos, é feita uma abordagem dos conceitos de
raça e de racismo; dos antecedentes da Lei, resultado
da luta do movimento negro brasileiro contra a
discriminação racial; da importância da Lei como
ferramenta de combate ao racismo; do conceito de
afrocentricidade; da possibilidade da construção de
um currículo afrocentrado e das dificuldades e desafios
relacionados à aplicação da Lei no espaço escolar.
Verificam-se dificuldades relacionadas ao preconceito
ainda presente na cultura escolar; à falta de preparo
e de interesse dos professores em relação à temática
proposta pela Lei e ao conteúdo dos livros didáticos
1-Aluna do Curso de Especialização UNIAFRO: promoção da igualdade racial na escola.
Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
2-Doutor em História. Professor do Centro Universitário de Brasília (Uniceub) e
professor orientador do Curso de Especialização UNIAFRO – Promoção da Igualdade
Racial do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros da Universidade Federal de Ouro Preto.

218
que ainda privilegiam a visão eurocêntrica da história,
ressaltando o papel do negro como escravo e a África
como local de dominação branca. Daí, surgem desafios
à escola e ao professor: a escola deve se empenhar
para se constituir como espaço democrático, de
respeito à diversidade e combate ao preconceito racial
e o(a) professor(a) deve se esforçar para conhecer
melhor a história da África e da cultura afro-brasileira
e saber escolher e utilizar o livro didático. Considera-
se que este trabalho contribui para a reflexão de que
com o empenho da escola e do(a) educador(a), a
supracitada Lei pode servir como instrumento eficaz
de enfrentamento à discriminação racial, o que não
exclui o papel da família e da sociedade como um todo.
Palavras-chave: Lei N°10639/2003, Racismo, Escola,
Professor, Livro Didático, Afrocentricidade, Currículo
Afrocentrado.
Introdução
O presente artigo tem como tema a Lei
n°10639/2003, que estabelece a obrigatoriedade do
ensino da história e cultura Africana e Afro-Brasileira,
visando construir representações positivas dos africa-
nos e afro-brasileiros, em oposição à tradicional ima-
gem que coloca em evidência a subjugação da popula-
ção negra, especificamente no contexto da escravidão
no Brasil. Desta maneira, a Lei n°10639/2003 consis-
te em um instrumento de desconstrução do mito da
inferioridade do negro e do encobrimento de suas his-
tórias, personagens e narrativas emancipatórias.
A escolha do tema se justifica por sua importância
como objeto de discussão na área educacional no
Brasil atual, onde o preconceito racial ainda se faz
presente na mentalidade e nas atitudes dos brasileiros

219
e brasileiras. Nessa direção, a Lei em questão surge
como ferramenta de combate ao racismo.
Em uma perspectiva teórica, a temática proposta
pela Lei parece consistir em um mecanismo eficaz
para a valorização do negro e da negra e para a luta
contra o preconceito racial. Porém, é preciso saber
como tem sido a sua prática. Para isto, levanta-se a
seguinte problemática: quais as dificuldades e desafios
que surgem na aplicação da Lei n°10639/2003 nas
instituições escolares do país?
Tendo em vista problematizar esta questão, tem-
se como objetivo geral: analisar a teoria e a prática
da Lei n°10639/2003 e como objetivos específicos:
abordar a importância da Lei e apontar as dificuldades
e desafios de sua aplicação no espaço escolar e
possibilidades de elaboração de currículos com
abordagem afrocentrada.
A metodologia aplicada neste trabalho é uma
pesquisa bibliográfica, com base na consulta de livros,
artigos, textos e à legislação relacionada ao tema. Trata-
se de uma abordagem teórica da referida temática.
Este artigo está estruturado da seguinte forma:
primeiramente é realizada uma análise dos conceitos
de raça e racismo; em seguida, tratam-se dos
antecedentes e da importância da Lei n°10639/2003
e, por fim das dificuldades e desafios de sua aplicação,
considerando os papéis da escola, do professor e do
livro didático.
A teoria e a prática da LEI n°10639/2003
Considerando que a Lei n°10639/2003 constitui
uma política pública de enfrentamento à discrimina-
ção racial, especificamente em relação ao negro e às
negras, primeiramente faz-se necessária uma abor-
dagem, ainda que breve, dos conceitos de raça e de
220
racismo.
De acordo com Munanga (2006a), o termo
“raça” se origina da palavra italiana “razza” que, por
sua vez, tem origem no vocábulo latino “ratio”, que
significa categoria, espécie. O conceito de raça foi em-
pregado pela primeira vez nas ciências naturais para
classificar espécies animais e vegetais. O autor afirma
que, no latim medieval, esse conceito designava a li-
nhagem, a descendência, isto é, um grupo de pessoas
que possuíam em comum um ancestral e algumas ca-
racterísticas físicas.
Em um primeiro momento, tal termo se
restringia ao mundo animal e vegetal, mas, no final do
século XVII, passou a ser aplicado também para o ser
humano3. Mendes (2012) ressalta que essa aplicação
tornou-se mais frequente no século XVIII para dar
conta das diferenças entre humanos, como a cor da
pele.
No início do século XIX, surgiram teorias raciais
fundamentadas biologicamente, a exemplo da teoria
de Julien-Joseph Virey, antropólogo francês que dividiu
a raça humana em duas espécies distintas: negros
e não negros. Dialogando com premissas da história
natural, Mendes (2012) destaca que a raça consistia
em modificações de uma determinada espécie. Nesse
compasso, para o supracitado antropólogo, os negros
se diferenciavam dos não negros pelas seguintes
características: maior propensão às excitações
nervosas; menor predisposição para o raciocínio;
caráter indolente e tendência à submissão.
Ao longo do século XIX, com base na ideia da
divisão do gênero humano em raças superiores e raças
3-Em 1684, o francês François Bernier emprega o termo no sentido moderno da palavra,
para classificar a diversidade humana em grupos fisicamente contrastados, denominados
raças (MUNANGA, 2006a, p. 59).

221
inferiores, a ciência conferiu fundamento à crença da
inferioridade de certas raças, como a negra. Tal crença
esteve relacionada a motivos econômicos e políticos,
como a escravidão e o processo de colonização do
continente africano pelos europeus.
Para Munanga (2006a), não obstante a máscara
científica, o conceito de raça possui um conteúdo
mais doutrinário do que científico, uma vez que
seu discurso serviu mais como legitimação dos
sistemas de dominação racial do que explicação da
diversidade humana. Nessa linha de pensamento,
Rocha (2006) enfatiza que o conceito de raça oculta
as determinações biológicas sob a neutralidade da
determinação histórica.
Segundo Mendes (2012), a partir da década de
1930, a biologia passa a criticar a noção de raça, sob a
justificativa de que era impossível classificar os seres
humanos em categorias raciais. Daí a genética moderna
afirma que as diferenças biológicas entre as raças
humanas não são absolutas e que a hierarquização das
mesmas não pode ser justificada cientificamente. Nos
anos 40 do século XX, alguns cientistas propuseram o
banimento do conceito de raça dos dicionários e textos
científicos4.
Entretanto, o conceito ainda persiste em traba-
lhos produzidos na área das ciências sociais, pois, como
aponta Munanga (2006a), não demorou para que os
cientistas percebessem que tal banimento constituiria
uma ingenuidade. Não era necessário o conceito de
raça para a reprodução da ideologia racista. O comba-
te ao racismo não se sustenta na erradicação da raça,
que é somente um conceito e não uma realidade e
4-Após o fim da Segunda Guerra Mundial, tentou-se banir o termo “raça” do discurso
antropológico.. MENDES, Maria Manuela. Raça e racismo: controvérsias e ambiguidades.
In: Vivência, 2012, p.107.

222
nem na utilização de vocábulos como “etnia”5. “[...] o
racismo é uma ideologia capaz de parasitar em todos
os conceitos” (MUNANGA, 2006b, p.53).
Criado no século XIX e ampliado na década de
1920, o racismo é definido com base no termo “raça”,
como uma ideologia que pressupõe a divisão da
humanidade em grupos que possuem características
físicas hereditárias comuns, que servem como suportes
das características físicas, morais, psicológicas e
estéticas, situadas em uma escala de valores desiguais:
“[...] o racismo é essa tendência que
consiste em considerar que as carac-
terísticas intelectuais e morais de um
dado grupo, são consequências diretas
de suas características físicas ou bioló-
gicas” (MUNANGA, 2006a, p.60).
Rocha (2006) alerta para a necessidade de se
desmistificar a tese de que o racismo é tão antigo quanto
o surgimento da humanidade. A escravidão antiga
(greco-romana) e medieval não tinha justificativa
baseada na cor da pele. Desta forma, percebe-se que
o racismo é resultado da escravidão e não o contrário.
Para o autor, o racismo moderno6 consiste em uma
forma ideológica de dominação de uma classe sobre a
outra, no interior das relações capitalistas de produção.
Exemplo disso é a utilização do trabalho escravo
do negro africano em várias colônias europeias do
chamado Novo Mundo. A escravidão negra constituiu
5-A palavra “etnia” foi inventada pelo zoologista francês Vacher de Lapouge, por
volta de 1896, para designar o sentimento de vida comunitária, entre indivíduos,
distinguindo-se, portanto, da classificação dos seres humanos como pertencentes a raças
ou nações. PRAXEDES, Walter. A questão da educação para a diversidade sociocultural
e o etnocentrismo. In: ASSIS, Valéria (Org.). Introdução à antropologia, 2005 apud
ROCHA, Luiz Carlos Paixão da. Políticas afirmativas e educação: a Lei 10639/03 no
contexto das políticas educacionais no Brasil contemporâneo, 2006, p.6.
6-Desenvolvido entre os séculos XVI e XVII, esse racismo foi utilizado como justificativa
da utilização da força de trabalho escravo do negro africano. (CALLINICOS apud
ROCHA, 2006, p. 7).

223
um elemento de fundamental importância para o
desenvolvimento do capitalismo e se justificou por
uma suposta superioridade branca. No Brasil Colônia,
instituições ligadas às classes dominantes, como a
Igreja Católica, buscavam fundamentos para viabilizar
o domínio do branco sobre o negro.
“As igrejas católica e protestante, por
exemplo, para legitimar a escravidão
e o tráfico de africanos, utilizaram-se
de uma interpretação bíblica bastante
duvidosa. Por esta, os africanos seriam
um povo amaldiçoado, descendente de
Cam, filho de Noé, que teria cometido
um pecado grave. Cam teria visto seu
pai nú” (ROCHA, 2006, p.18).
Na linha de raciocínio de Rocha (2006), Tenório
e Gasparin (2009) apontam o racismo como resultado
da escravidão negra e responsável por categorizar
diferenças e pela posição privilegiada que determinadas
pessoas possuem em uma sociedade, em detrimento
de outras. No caso específico da sociedade brasileira,
a valorização da cultura branca, europeia, possibilitou
a construção de uma imagem pejorativa do negro e da
negra7.
Essa imagem tornou-se responsável pela
disseminação do racismo e de atitudes de discriminação
racial em relação às pessoas negras. E, a “[...] escola,
ao refletir a sociedade maior, também vivencia e
reproduz estas mesmas relações sociais” (TENÓRIO
e GASPARIN, 2009, p.4).
É necessário, então que a escola contribua
para uma formação com base no respeito e no
7-O termo “negro”, geralmente utilizado pelos “não negros” assume um tom paternalista
e, assim, pode ser encarado como pejorativo, pois, no interior da cultura ocidental, negro
significa perigo, poluente, impuro, em oposição ao termo “branco”, relacionado à pureza,
à limpidez e à imaculabilidade. (MENDES, 2012, p.108).

224
reconhecimento à diversidade e não na discriminação.
Para esse respeito e reconhecimento, é de fundamental
importância, de acordo com Tenório e Gasparin
(2009), a incorporação do estudo da História da África,
dos africanos e da cultura afro-brasileira no currículo
da Educação Básica, como prevê a Lei n°10639/2003.
Antecedentes da Lei n°10639/2003
Segundo Silveira et al (2011), a Lei n°10639/2003
constitui resultado das reivindicações do movimento
social negro, para incluir nos currículos escolares a
importância da contribuição dos povos negros na for-
mação da identidade nacional brasileira, introduzindo
como disciplina escolar a História e cultura da África
e afro-brasileira. Tenório e Gasparin (2009) ressaltam
que o movimento negro também protestava contra o
preconceito racial e a veiculação de ideias racistas nos
estabelecimentos de ensino.
No decorrer da primeira metade do século XX,
verifica-se a atuação de organizações do movimento
negro, como o Centro Cívico Palmares, marco impor-
tante da mobilização política dos negros e a Frente
Negra Brasileira (FNB), a maior organização do movi-
mento negro nesse período. Conforme Andrews (1998
apud PEREIRA, 2011), o Centro Cívico Palmares foi
criado em 1926, com o objetivo de proporcionar uma
biblioteca cooperativa à comunidade negra. Essa or-
ganização logo progrediu e passou a organizar encon-
tros e conferências a respeito de questões de interesse
público8. A FNB, criada em 1931, se destacou pela
apresentação de demandas do movimento negro à so-
ciedade e aos poderes públicos.
8-O Centro Cívico Palmares contribuiu para a valorização da história do quilombo
dos Palmares como exemplo de luta dos negros no Brasil, que ganha outra
dimensão para o movimento negro nos anos 1970 (PEREIRA, 2011, p.29)..

225
Pereira (2011) observa que, em sua primeira
fase, tal movimento tinha como característica a busca
pela inclusão do negro na sociedade, por meio da as-
similação e não da transformação da sociedade. Além
disso, o movimento negro se caracterizava por um na-
cionalismo exacerbado.
A segunda fase do movimento negro brasileiro foi
marcada pela criação da União dos Homens de Cor
(UHC) e do Teatro Experimental do Negro (TEN),
capitaneado por Abdias do Nascimento. Fundada em
1943, a UHC tinha por objetivo primordial a integra-
ção do negro na sociedade brasileira mediante a edu-
cação e sua inserção no mercado de trabalho. O TEN
foi criado em 1944 e também buscava integrar o negro
na sociedade9 e promovia campanhas de alfabetiza-
ção. Ainda nessa segunda fase, Rocha (2006) destaca
a realização do I Congresso do Negro Brasileiro, em
1950, organizado pelo TEN, como o objetivo de valo-
rizar o negro.
A terceira fase teve por características específi-
cas a oposição ao mito da democracia racial e a reava-
liação do papel do negro na história do Brasil. Pereira
(2011) ressalta que ambas as características integram
os princípios do Movimento Negro Unificado (MNU),
fundado em 1978. No que se refere ao supracitado
mito, o MNU propõe uma autêntica democracia ra-
cial, por intermédio de maiores oportunidades de em-
prego, saúde, habitação e educação ao negro. Quanto
à segunda característica, o MNU defendia o prota-
gonismo em relação ao processo da abolição para os
negros, tendo como referência a figura de Zumbi, lí-
9-Através do teatro, do psicodrama e de concursos de beleza, o TEN procurou não apenas
denunciar o preconceito e o estigma de que os negros eram vítimas, mas, acima de tudo,
oferecer uma via racional e politicamente construída de integração e mobilidade social
dos pretos, pardos e mulatos (GUIMARÃES, 2002, p. 93 apud PEREIRA , 2011, p.33).

226
der do Quilombo dos Palmares, recusando a figura de
Isabel, princesa branca que assinou a Lei Áurea que
extinguiu a escravidão no Brasil.
Para Silvério (2005 apud SANTOS; MACHADO,
2008) o movimento social negro ganha importância
no contexto de elaboração da Constituição de 1988,
a qual constitui um marco na construção de uma so-
ciedade inclusiva. Diversas atividades e debates foram
realizados pelas organizações negras, com o intuito de
apresentar propostas a serem incluídas no novo texto
constitucional.
Entre essas propostas figuram o combate ao ra-
cismo, previsto pelo artigo 5° inciso LXII como: “[...]
crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de
reclusão, nos termos da lei” (BRASIL, 1988) e tam-
bém a proposta de alteração curricular, cuja redação
final foi dada pelo parágrafo 1° do artigo 242, segundo
o qual: “[...] O ensino da História do Brasil levará em
conta as contribuições das diferentes culturas e etnias
para a formação do povo brasileiro” (BRASIL, 1988).
Em 1995, a educação constituiu tema de desta-
que da Marcha Zumbi dos Palmares, a qual reivindica-
va alterações nos currículos escolares. Rocha (2006)
afirma que, na perspectiva desse movimento, a escola
seria um espaço de aprendizagem do racismo, devi-
do ao conteúdo eurocêntrico do currículo escolar; ao
comportamento diferenciado dos professores frente a
crianças brancas e negras e às abordagens que super-
valorizam o branco e desvalorizam o negro, naturali-
zando e conservando uma ordem calcada na pretensa
superioridade branca, que atribui a brancos e negros
papéis e destinos diferentes.
Ainda segundo Rocha (2006), no ano seguinte,
no quadro do debate acerca da Nova Lei de Diretrizes

227
e Bases da Educação Nacional (LDB), a senadora Be-
nedita da Silva, representante do movimento negro,
trouxe à tona a proposta de alteração curricular que
foi apresentada no processo de elaboração da Consti-
tuição de 1988.
Como resultado, o parágrafo 4° do artigo 26 da
nova LDB (Lei n°9394/96) teve a seguinte redação:
“O ensino da História do Brasil levará em conta as
contribuições das diferentes culturas e etnias para
a formação do povo brasileiro, especialmente das
matrizes indígena, africana e europeia” (BRASIL,
1996).
Em 1999, a deputada Esther Grossi e o deputado
Bem-Hur Ferreira apresentaram o Projeto de Lei (PL)
n°259, o qual dispõe sobre a “[...] obrigatoriedade da
inclusão, no currículo oficial da Rede de Ensino, da
temática «História e Cultura Afro-Brasileira» [...]”
(BRASIL, 1999). Esse projeto se transformou na Lei
n°10639/2003.
A importância da Lei n°10639/2003
Sancionada em 2003, pelo então presidente da
República, Luiz Inácio Lula da Silva, a Lei n°10639
instituiu a obrigatoriedade do ensino da História e
Cultura Afro-Brasileira e Africana nos currículos das
escolas de Educação Básica de todo o Brasil.
A Lei n°10639/2003 altera a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB – Lei n°9394/1996),
à qual foram acrescentados os seguintes artigos:
“Art.26-A.  Nos estabelecimentos de
ensino fundamental e médio, oficiais
e particulares, torna-se obrigatório o
ensino sobre História e Cultura Afro-
-Brasileira.
§ 1o  O conteúdo programático a que

228
se refere o caput deste artigo incluirá
o estudo da História da África e dos
Africanos, a luta dos negros no Brasil,
a cultura negra brasileira e o negro na
formação da sociedade nacional, res-
gatando a contribuição do povo negro
nas áreas social, econômica e política
pertinentes à História do Brasil.
§ 2o Os conteúdos referentes à História
e Cultura Afro-Brasileira serão minis-
trados no âmbito de todo o currículo
escolar, em especial nas áreas de Edu-
cação Artística e de Literatura e Histó-
ria Brasileiras
§ 3o (VETADO).
Art. 79-A. (VETADO).
Art. 79-B. O calendário escolar inclui-
rá o dia 20 de novembro como Dia
Nacional da Consciência Negra”(BRA-
SIL, 2003).
Rocha (2006) coloca em evidência a importância
da Lei n°10639/2003 enquanto uma conquista para
o negro brasileiro. Para o autor, essa Lei deve atuar
no sentido de combater mecanismos ideológicos que
sustentam os mitos da inferioridade dos(as) negros(as)
e da democracia racial. “Essa compreensão parece
ser fundamental para o êxito da nova legislação,
na perspectiva da transformação das estruturas de
produção das desigualdades sociais e raciais no país”
(ROCHA, 2006, p.100).
Tornando obrigatórios o conteúdo referente à
história e à cultura afro-brasileira, a Lei n°10639/2003
busca, na perspectiva dos que lutaram por sua
implementação, construir representações positivas
dos afro-brasileiros, ao contrário da imagem que
ressalta a humilhação e a subjugação da população
negra, principalmente no cenário da escravidão no

229
Brasil.
A partir da oficialização da obrigatoriedade da
história e da cultura afro-brasileira no currículo escolar,
por meio da Lei n°10639/2003, torna-se possível a
discussão de temas até então silenciados na sociedade
brasileira, sob o chamado mito da democracia racial,
ou seja, sob o véu de que no Brasil não existe racismo.
De acordo com Oliveira e Cunha Jr. (2012), esse mito
oculta a real formação do povo brasileiro e a importância
de diversas etnias para a cultura brasileira. Assim, o
estudo da história dos povos africanos busca ampliar
as discussões a respeito da diversidade cultural, social
e econômica que existem no país.
De modo geral, a história ensinada na escola
tem por base as visões eurocêntricas, as quais são
reproduzidas e transmitidas às gerações. A Lei em
questão proporciona aos alunos outra leitura do real,
resgatando a história dos povos africanos sob outro
enfoque “[...] que por muitos anos foi escondida ou
camuflada nos livros didáticos, nos passando a ideia da
inferioridade negra, não resgatando a sua importância
na construção da nossa identidade [...]” (OLIVEIRA;
CUNHA Jr. 2012, p.4).
O processo de reelaboração da história dos afri-
canos é abordado por Rocha (2006), através do de-
poimento de um educador militante do movimento
negro. Conforme o educador, a Lei é de fundamental
importância para a comunidade negra, uma vez que
possibilita o reconhecimento da cultura africana no
espaço escolar, fazendo com que os alunos negros se
orgulhem de sua etnia. A aplicação da Lei é importan-
te para a valorização da produção cultural negra, das
realizações dos povos africanos, como: a construção
das pirâmides; a utilização do ferro e a organização da

230
agricultura.
No entanto, a importância histórica da África
não se restringe a essas realizações. Tendo por base
algumas pesquisas e descobertas científicas, o estu-
dioso afro-americano Molefi Asante (2009) afirma que
a raça humana se originou no continente africano, ou
seja, a humanidade é derivada de uma fonte africa-
na. Tal afirmação contraria o mito da origem grega da
civilização, o qual sustentou a visão eurocêntrica da
história. Passa-se, então do eurocentrismo para a ideia
de afrocentricidade.
Segundo Asante (2009), a afrocentricidade con-
siste em um pensamento, prática e perspectiva que
considera os africanos como sujeitos da história, para
além da objetivação e tutela promovidas pelas narra-
tivas ocidentais. O conceito de afrocentricidade sur-
giu no início da década de 1980, a partir da conscien-
tização política de um povo que vivia à margem dos
modelos de ciência, educação, arte, economia, tec-
nologia e comunicação estabelecidos pela concepção
eurocêntrica da história. Iniciou-se, então, o processo
de recentralização do povo africano que, se fosse bem
sucedido “[...] criaria uma nova realidade e abriria um
novo capítulo na libertação da mente dos africanos
[...]” (ASANTE, 2009, p.94).
Asante (2009) ainda destaca cinco aspectos
importantes que o projeto afrocêntrico deve englobar:
o interesse pela localização psicológica; compromisso
com a descoberta do lugar africano enquanto sujeito;
defesa dos elementos culturais africanos; compromisso
com o refinamento léxico e reflexão acerca de uma
nova narrativa da história da África.
Na esteira do pensamento de Asante (2009),
Mazama (2009) ressalta que a afrocentricidade

231
emergiu em resposta à supremacia branca.10 E,
para que os africanos se libertem dessa supremacia,
é preciso que eles façam uma reflexão acerca do
processo de aculturação branca ocultada sob o véu da
educação. Em outras palavras, faz-se necessário que o
povo africano avalie sua história a partir dos critérios
estabelecidos pela matriz cultural africana. Nesse
sentido:
“[...] a afrocentricidade surgiu como
um novo paradigma para desafiar o
eurocêntrico, responsável por desafiar
os africanos, destituí-los de soberania
e torna-los invisíveis – até mesmo
aos próprios olhos, em muitos casos”
(MAZAMA, 2009, p.114).
O supracitado paradigma tem por objetivo
descolonizar as mentes e ativar a consciência dos
africanos da importância do estudo de sua história e
cultura, por meio de suas próprias tradições culturais,
pois de modo geral, a história da África é obscurecida
por representações racistas que, por muito tempo
foram repassadas pelos(as) professores(as) e
assimiladas pelos(as) alunos(as) de forma equivocada
e preconceituosa e transmitida a partir de uma visão
eurocêntrica da história, desprezando o patrimônio
sócio-histórico e cultural do continente africano. “É
comum [...] a África ser assinalada como sendo um
único país, pensamento que só contribui para se
perpassar o desconhecimento incerto acerca de suas
particularidades” (OLIVEIRA; CUNHA Jr, 2012, p.5).
Santos Jr (2010) observa que enquanto a visão
eurocêntrica busca fundamentar a supremacia
10-Essa supremacia se expressou de várias formas: pela violência física, a exemplo
da escravização dos africanos pela apropriação, por parte dos europeus, dos recursos
econômicos dos povos dominados e da subjugação mental dos africanos às ideias, valores
e teorias dos europeus (MAZAMA, 2009, pp.111-112).

232
branca, o paradigma afrocêntrico tem por finalidade
estabelecer o lugar dos africanos na história, mediante
suas próprias referências históricas e culturais, sem
desmerecer e inferiorizar outras civilizações.
Através da obrigatoriedade da histórica e da
cultura africana e afro-brasileira no currículo escolar,
a Lei n°10639/2003 abre caminho para a construção
de um currículo afrocentrado. Tendo por referência
os Princípios Asante11, Santos Jr. (2010) aponta a
possibilidade, por meio de um currículo afrocentrado,
da análise dos elementos históricos, sociológicos,
filosóficos e psicológicos dentro de uma perspectiva
africana.
Santos Jr. (2010) coloca em evidência a possibi-
lidade de elaboração de um currículo afroncentrado
a partir da articulação de três fatores: atendimento à
comunidade; integração dos seres humanos e equilí-
brio entre a vida e o meio ambiente com os Parâme-
tros Curriculares Nacionais (PCN), do Ensino Médio,
o qual dividiu as disciplinas em três grandes áreas:
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias (Língua Por-
tuguesa; Língua Estrangeira; Educação Física e Edu-
cação Artística); Ciências da Natureza, Matemática e
suas Tecnologias (Biologia, Química, Física e Matemá-
tica) e Ciências Humanas e suas Tecnologias (Histó-
ria, Geografia, Sociologia e Filosofia).
Para cada área, Santos Jr. (2010) traça estratégias
de inclusão de elementos afrocêntricos. Por exemplo,
na área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias,
trabalhar palavras que possuem uma conotação racista
e pejorativa, como “denegrir”; na área de Ciências da
11-Composto por dez artigos: Você e sua comunidade; Bem estar e biologia; Tradição
e inovação; Expressão e criação artística; Localização no tempo e no espaço; Produção
e distribuição; Poder e autoridade; Tecnologia e ciência; Escolhas e consequências e
Mundo e sociedade (SANTOS Jr., 2010, p.7).

233
Natureza, situar o continente africano como berço
da humanidade e estudar a tradição da medicina
africana e na área de Ciências Humanas, recusar a
visão eurocêntrica, problematizar a posição “inferior”
da África nos mapas, entre outras estratégias.
A proposta de um currículo baseado no conceito
de afrocentricidade tem por objetivos a valorização da
diversidade racial; a desconstrução das desigualdades
sociais e da ideia de periferia, ou seja, demonstrar que:
“[...] nenhum lugar deve ser visto como periférico”
(SANTOS JR., 2010, pp.13-14).
Em suma, segundo Krauss & Rosa (2010) a
inclusão da temática proposta pela Lei n°10639/2003
possibilita aos(às) educadores(as) e educandos(as) a
reflexão a respeito da presença dos afrodescendentes
na sociedade brasileira, presença muitas vezes
desconsiderada. Como tal Lei deve ser cumprida no
espaço escolar, as primeiras medidas a serem tomadas
pela escola, de acordo com Krauss & Rosa (2010),
são a capacitação dos professores e a aquisição de
material específico para o ensino da história e cultura
africana e afro-brasileira. Também é importante que
esse material proporcione ao docente uma reflexão
crítica da temática proposta pela Lei em questão.
Do ponto de vista teórico, é inegável a contribuição
da Lei n°10639/2003 para a valorização dos povos
africanos como sujeitos da história, como elementos
importantes na formação da cultura brasileira e não
como seres passivos, submissos e inferiores. Porém,
a aplicação da supracitada Lei na prática escolar
constitui um desafio.
Dificuldades e desafios referentes à aplicação
da Lei n°10639/2003 na escola
Enquanto espaço democrático, a escola deve
234
buscar a promoção da igualdade, por meio do
combate à segregação e à intolerância em relação à
diversidade, especificamente racial. Nessa direção,
a Lei n°10639/2003 constitui em uma ferramenta
de enfrentamento do preconceito racial, mas quem
é responsável por sua aplicação é a escola. Daí é
necessário que esta instituição saiba da existência da
Lei e crie condições para que ela seja aplicada na sala
de aula.
Refletindo sobre a responsabilidade da escola
na aplicação da referida Lei, Gomes (2012) aponta
a instituição escolar como lócus histórico da
repercussão e da reprodução do racismo. A autora
enfatiza que, historicamente, a escola tem dificuldade
de lidar com identidades forjadas em um contexto de
diversidade, tratando-as de modo igualitário. Deste
modo, dispositivos legais, como a Lei n°10639/2003
se chocam com as práticas racistas e com o mito da
democracia racial, os quais se encontram vinculados ao
tradicional processo de escolarização e no imaginário
dos educadores, cultura escolar e livros didáticos.
Isto interfere na construção das identidades dos
negros, indígenas, ciganos, mulheres, homossexuais,
transexuais entre outros grupos subalternizados.
Vale salientar que para a maioria dos(as)
pesquisadores(as) aqui analisados(as), as escolas não
têm demonstrado grande interesse em desenvolver a
temática proposta pela Lei n°10639/2003, limitando-
se a comemorar datas como o dia da “Consciência
Negra” ou “13 de Maio” “[...] não refletindo sobre o
real significado destas datas, perdendo-se, assim,
a oportunidade de instigar os alunos sobre o tema”
(GUEDES et al 2013, p.425).
As datas comemorativas, como aquelas acima

235
citadas, devem ser trabalhadas pelos professores
para que os alunos tenham pleno conhecimento do
significado e da importância delas no presente, pois
a simples comemoração dessas datas constitui aquilo
que Souza (2013) chama de pedagogia do evento,
conceito elaborado pela antropóloga Raquel Bakke.
Além disso, algumas atividades se propõem a
folclorizar a cultura negra, isto é, fazer com que as
manifestações culturais dos negros se tornem objeto
de entretenimento para as pessoas. Essa folclorização
transforma a cultura negra em algo curioso, exótico e
sem consistência.
Para a efetivação da Lei no espaço escolar, é
preciso que esse espaço se organize em uma direção
emancipatória, mediante a revisão do currículo,
das práticas pedagógicas e da cultura escolar. “Tal
transformação diz respeito ao reconhecimento da
educação, sobretudo a escolar, como um direito
de todos e, por conseguinte, da população negra”
(GOMES, 2012, p.24).
Segundo Munanga (2005), não existem leis ca-
pazes de extinguir o racismo presente na mentalidade
e nas atitudes dos seres humanos, pois aquelas se ori-
ginam dos sistemas culturais das sociedades huma-
nas. Entretanto, espera-se que a educação ofereça a
possibilidade de questionamento e de desconstrução
das supostas superioridade branca e inferioridade ne-
gra, inculcadas pela ideologia racista. Nesse cenário, é
imprescindível a atuação do(a) educador(a).
Contudo, como afirma Munanga (2005), os(as)
professores(as) geralmente não sabem lançar mão
de situações de discriminação no ambiente escolar
enquanto momento pedagógico privilegiado para o
debate acerca da diversidade e da conscientização dos

236
alunos sobre a riqueza que essa diversidade traz para
a cultura e para a identidade nacional. Em muitos
casos, esses professores estão despreparados.
A falta de preparo e de interesse de alguns
docentes também dificultam a aplicação da Lei
n°10639/2003 na escola. Nesse sentido, Guedes
et al (2013) destaca que, a maioria dos professores
não teve, durante a graduação, disciplinas que lhes
proporcionassem maiores conhecimentos a respeito
da história da África e dos povos africanos. No que se
refere ao desinteresse, Guedes et al (2013) observa
que, na maioria das escolas, apenas uma minoria
docente se esforça para desenvolver atividades
pedagógicas.
Além do despreparo e do desinteresse, Souza
(2013) aponta a resistência de alguns professores
(e até de alunos) em relação a temas ligados à
religiosidade afro-brasileira, tão caro ao racismo forjado
em nosso país. Na opinião da autora, esse mecanismo
constituiria um fator da dificuldade da aplicação da
temática proposta pela Lei n°10639/2003.
Diante disso, os cursos de licenciatura em
História devem proporcionar um conhecimento mais
detalhado da história do Brasil, tendo por enfoque
as relações de poder e o racismo característico da
sociedade brasileira. Assim, o(a) futura(o) professor(a)
terá condições de problematizar as situações de
discriminação racial que venham a ocorrer no espaço
da escola.
“Atualmente, as dimensões étnicas
do ensino da história desafiam os(as)
professores(as) a constituírem uma
formação profissional e uma prática
autoreflexiva e atenta à complexidade
dos processos históricos; exercendo

237
através da análise do debate
historiográfico referentes à questão da
escravidão e do racismo, ultrapassando
as abordagens pautadas em visões
etnocêntricas e superficiais sobre
os processos históricos” (PEREIRA,
2008, p. 28 apud KRAUSS & ROSA,
2012, p.863).
Além da instituição escolar e do corpo docente,
outro fator que pode dificultar a aplicação da Lei
n°10639/2003 é o livro didático. Este ainda figura na
atualidade como um dos recursos pedagógicos mais
utilizados, particularmente nos estabelecimentos
públicos de ensino, onde esses recursos consistem,
conforme Silva (2005), em única fonte de leitura para
os alunos provenientes das camadas sociais menos
favorecidas. Às vezes, também para o professor desses
estabelecimentos, o livro didático é o único recurso
disponível para auxiliar sua prática pedagógica.
Mas, tomando o conteúdo do livro didático
como verdade, o professor não nota a presença de
estereótipos12 nos conteúdos. No que diz respeito à
população negra, a presença no livro didático, foi(é)
caracterizada pela estereotipia e caricatura.
Oliveira & Cunha Jr. (2012) apontam que,
tradicionalmente a educação escolar tende a tratar
os africanos como povos submissos, em condições
de desigualdade, quando comparados ao branco
dominador. Essa imagem dos negros nos livros didáticos
reforça a criação e a permanência de estereótipos
acerca da condição dos negros como seres inferiores
e incapazes, desrespeitando, desta maneira, a origem
12-Considerado uma visão simplificada e conveniente de um indivíduo ou grupo,
o estereótipo cria uma ideia negativa a respeito do outro, nascida da necessidade
de promover e justificar a agressão. (SILVA. In: MUNANGA, Kabengele. (Org.).
Superando o racismo na escola. Brasília, 2005, p.24).

238
da população negra e considerada mestiça no Brasil.
Além disso, segundo Krauss & Rosa (2010),
os livros didáticos tradicionais se referem à África
utilizando termos discriminatórios. O conhecimento
sobre os aspectos econômicos, políticos e culturais é
quase inexistente, como se a África passasse a existir
depois da escravidão.
Ao passo em que veicula estereótipos que
ampliam uma imagem negativa do negro e positiva a
do branco, o livro didático está promovendo a expansão
da ideologia do branqueamento, a qual se efetiva na
internalização de uma imagem negativa de si próprio e
positiva do outro. “[...] o indivíduo estigmatizado tende
a se rejeitar, a não se estimar e a procurar aproximar-
se em tudo do indivíduo estereotipado positivamente e
dos seus valores, tidos como bons e perfeitos.” (SILVA,
2005, p.23)
Então, é preciso que o(a) educador(a) saiba
escolher e utilizar o livro didático para uma educação
de qualidade que auxilie a construção de uma
sociedade mais justa e menos discriminatória. A
realização dessa educação constitui um desafio e uma
grande responsabilidade para o professor, que implica
também na apropriação e(ou) criação de outros
materiais para serem utilizados em sala, para além
daquilo que sugerem os livros didáticos.
Mas, para que os alunos tenham plena consciência
das contribuições dos povos africanos para a história e
cultura brasileira e o devido respeito pela valorização
da diversidade, é de suma importância a proposta
tratada neste tópico, que se refere à elaboração de um
currículo afrocentrado.
Considerações Finais
Estabelecendo a obrigatoriedade do ensino
239
da história da África e da cultura afro-brasileira, a
Lei n°10639/2003, resultado da luta do movimento
negro contra o racismo, busca construir uma imagem
positiva dos(as) negro(as) e desconstruir o mito da
inferioridade racial dos povos africanos.
Observa-se, então, a importância da referida Lei
para a possibilidade de construção de um currículo
baseado no conceito de afrocentricidade e o combate
ao racismo. Mas, sob o ponto de vista teórico, esse
combate é eficaz. Porém, ao se tratar da aplicação
prática da Lei, foram verificadas algumas dificuldades
em relação à escola, cuja cultura ainda está impregnada
de racismo; ao docente, cujo despreparo e desinteresse
dificulta a concretização da temática proposta pela Lei
e ao livro didático, o qual tradicionalmente traz em
seu conteúdo uma representação negativa do negro,
ressaltando o seu papel como subjugado, dominado.
A partir da constatação dessas dificuldades,
surgem desafios para a escola, no que se refere à
necessidade de se transformar em um espaço de
respeito à diversidade e combate ao racismo e ao
professor, no que se relaciona à busca de maiores
conhecimentos acerca da história da África e da
herança cultural do negro na sociedade brasileira e
também em relação à escolha e à utilização do livro
didático, bem como de outros materiais didáticos
possíveis.
Ressaltando a diferença entre a teoria e a prática
da Lei n°10639/2003, este trabalho contribui para a
reflexão de que um dispositivo legal não erradica o
racismo ainda presente na mentalidade do brasileiro
e produto de cerca de três séculos de escravidão, mas,
com a contribuição da escola, do(a) educador(a), a
supracitada Lei pode servir como instrumento eficaz

240
de enfrentamento à discriminação racial.
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da educação nacional, para incluir no currículo oficial
da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática

241
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245
REPENSANDO A FORMAÇÃO DO PROFESSOR
DIANTE DA EFETIVAÇÃO DA LEI 10.639/03
EM UMA ESCOLA DA REDE PÚBLICA MUNI-
CIPAL DO RIO DE JANEIRO

Gustavo Pinto Alves Da Silva (UFOP/UNIAFRO) 1


Clézio Roberto Gonçalves (Orientador) 2
Resumo
Para compreender a desigualdade racial no espa-
ço escolar, faz-se necessário interrogarmos o dia-a-dia
no cotidiano escolar, e sobretudo no fazer profissional
e todos os agentes inseridos no processo educacional.
A escola não é somente um espaço de educação
científica, mas também formadora de saberes sociais
e culturais. O desenvolvimento desta pesquisa terá
como objetivo investigar através dos discursos, a tra-
jetória de professores do ensino fundamental de uma
escola da rede municipal de educação da cidade do
Rio de Janeiro, frente às práticas pedagógicas em sala
de aula, diante da lei nº 10639/03 que torna obriga-
tório o ensino de história e cultura afro-brasileira e
africana na educação básica. Todos os dados coletados
através de questionários serão transcritos.
Palavras-chave: História e Cultura Afro-Brasileira,
Praticas Pedagógicas, Formação de Professores, Lei
Nº 10.639.
Introdução
O interesse pelo tema étnico-racial no campo da
educação tem sua origem na vida acadêmica, perpas-
sando diferentes disciplinas, mas acentuou-se a partir
1-Universidade Federal de Ouro Preto, Curso de Especialização UNIAFRO:
promoção da igualdade racial na escola.
2- Professor Orientador deste Trabalho de Conclusão de Curso de Especialização.

246
de diálogos com alunos inseridos na educação de jo-
vens e adultos - EJA, em uma escola da rede estadu-
al, onde atuei como estagiário durante o período do
curso de Especialização em Orientação Educacional
(2009-2010). Durante o intervalo das aulas, havia um
grupo de seis alunos negros que se reuniam para con-
versar sobre as dificuldades nos exercícios, trabalhos
a serem feitos, dentre outros assuntos. No intuito de
conhecê-los melhor, aproximei-me do grupo e, duran-
te conversas recorrentes, relatavam o quanto era di-
fícil acompanhar as disciplinas e sobretudo enfrentar
o problema de ser estudante-trabalhador. A despeito
de todo esse discurso, questionei seus motivos e suas
motivações para seguir em busca da continuidade de
seus estudos. Alguns dos alunos explicavam que con-
tinuar seus estudos, interrompidos por questões que
enfrentaram como a discriminação durante a adoles-
cência nos espaços escolares, passou a ser uma neces-
sidade de realização. Outros motivos apresentados por
alguns alunos do grupo foram o quadro de empobre-
cimento da família, que passava a depender dessa in-
serção precoce no mundo do trabalho e o “sonho” de
construir caminhos para o acesso ao ensino superior.
A partir destes relatos, impulsionei minhas lei-
turas incluindo levantamentos bibliográficos (MIRAN-
DA, 2004), interpretação de dados estatísticos (PAI-
XÃO, 2010) acerca das desigualdades raciais no Brasil
e seus reflexos na escola, as experiências sobre di-
versidade étnico-racial em espaços não-formais, bem
como a produção de monografias, dissertações e teses
de estudiosos vinculados aos programas de pós-gradu-
ação. Com base nestas fontes, foi possível ampliar as
concepções sobre as propostas de educação para a di-
versidade, bem como reconhecer o lugar de importân-

247
cia da Lei 10/639 aprovada em 2003 pelo Congresso
Nacional e sancionada pelo presidente da república
(à época) Luiz Inácio Lula da Silva. Por legitimar a
obrigatoriedade do estudo da história e cultura africa-
na e afro-brasileira nos currículos de todas as escolas
do país, sua criação contribuiu para a consolidação de
um momento histórico de debates e tomada de cons-
ciência do racismo dentro da sociedade brasileira.
O ingresso, como professor na Rede Municipal
de Educação do Rio de Janeiro (2011), facilitou a
compreensão de desafios impostos pela diferença e,
consequentemente, de enfrentamentos das demandas
da escola pública. Nos estudos de Cavallero (2001),
Gomes (2002) e Souza (2009), as (os) autoras (es)
destacam práticas discriminatórias vivenciadas
por estudantes negros no cotidiano escolar, como
xingamentos, ofensas ao seu pertencimento racial,
apelidos e formas diversas de segregação que
dificultam sua plena convivência bem como o bom
desempenho desse segmento populacional no espaço
de educação formal. O início da carreira docente foi
marcado, ainda, pelo trabalho com um grupo do 4ª
ano das séries iniciais. Já no terceiro mês, apresentei
uma atividade incluindo aspectos sobre a história da
África e no decorrer da atividade uma provocação de
cunho racista desencadeou uma roda de conversa
sobre a diferença de cada um naquele espaço.
No enfrentamento destes fenômenos, buscamos
recursos junto ao corpo de gestores da escola para
avaliarmos nossas propostas de trabalho para o
cumprimento das diretrizes que apoiam o plano de
trabalho com a Lei 10639/03. Na situação específica,
avalio que a comunidade escolar pouco avançou já
que, após quase uma década de promulgação da lei,

248
a instituição não consolidou um projeto elaborado
com este intuito. Em conversa informal com alguns
professores, pode-se perceber as dificuldades para
lidar com a diversidade étnico-racial no processo
de ensinar e de aprender. Nas pesquisas sobre
experiências teóricas e práticas sobre relações raciais,
Maria Elena Viana Souza (2009, p. 64) destaca que
“há de se percorrer ainda um longo caminho para
que o professorado, como categoria, compreenda a
importância de sua prática e se dispa da ingenuidade
de acreditar na neutralidade do seu trabalho, de suas
ações e de sua postura”.
As questões que orientaram este projeto de
intervenção se constituem como um desafio para o
pensamento pedagógico, professores em exercício e a
sociedade como um todo. A despeito da emergência de
um número significativo de estudos sobre a diferença
que desafia a escola (CANDAU, 2006; 2009; 2012;
FLEURI, 2008), a produção de trabalhos sobre as
relações étnico-raciais e o currículo passam a ser
imperativos na proposta aqui apresentada. Assim,
tem como objetivo no primeiro momento uma análise
sobre a experiência docente da Escola Municipal
Clementino Fraga, localizada no bairro de Bangu na
cidade do Rio de Janeiro.
O projeto parte da reflexão sobre os caminhos
possíveis para a temática racial no âmbito escolar,
focando as práticas realizadas pelos docentes e suas
reais condições de percorrer esses itinerários mais
afro centrados e menos euro centrados para enfrentar
nossa condição de país multicultural com forte
herança africana.

Justificativa

249
A proposta apresentada neste trabalho tem como
foco de estudo a intervenção no campo educacional,
que está relacionada com as inquietações da prática
docente na rede oficial de ensino da cidade do Rio de
Janeiro. Como professor do ensino fundamental da
rede pública, tenho observado, no cotidiano escolar,
possibilidades de experimentar outras práticas
pedagógicas no sentido de fomentar novos processos de
ensino-aprendizagem ou de “ensinagem”3, conforme
os paradigmas emergentes indicam. Os processos
escolares, as diferenças culturais e a formação
docente são descritoras que orientam alguns aportes
desta proposta.
Pensando com Alves e Libâneo (2012), em que
a didática desenvolve um modo peculiar de atividade
pedagógica, promovendo o acontecer pedagógico
em contextos de ensino e aprendizagem, reconheço
a influência do importante diálogo estabelecido ao
longo da formação acadêmica com os autores do
campo do currículo e da didática, sendo estes os
eixos fundamentais para pensarmos a flexibilização
da seleção de conteúdos e validação de saberes
tradicionalmente deixados de lado. Interessa, neste
contexto, desenvolver estudos situados no campo
da “educação e relações raciais” por entender a
multidimensionalidade dos estudos curriculares e as
interseções possíveis entre transposição e a perspectiva
intercultural de educação em sentido mais amplo.
De modo mais sistemático, encontramos em Fleuri
(2003) proposições que delineiam o desenho de uma
análise intercultural sobre currículo e diversidade
cultural. Para Fleury (2003),
3-ANASTASIOU, Léa das Graças C. Ensinar, aprender, apreender e processos de
ensinagem. In NASTASIOU, Léa das Graças C. e ALVES, Leonir Pessate. .Processos de
ensinagem na universidade. Joinville, SC: Editora Univille, 2003.

250
A educação intercultural assumiu a
finalidade de promover a integração
entre cultura, a superação de velhos
e novos racismos, o acolhimento dos
filhos dos imigrantes na escola (...).
Nessa perspectiva, a intercultura vem
se configurando como um objeto de es-
tudo interdisciplinar e transversal, no
sentido de tematizar e teorizar a com-
plexidade (...) o objeto de nosso estu-
do, assim, constitui-se transversalmen-
te às temáticas de cultura, de etnia, de
gerações e de movimentos sociais. (p.
35).
Bem como considera Fleury (2003), a educação
intercultural aborda uma perspectiva mais ampla. No
campo da educação ela evidencia a troca e a interação,
ressalta as relações, valorizando uma comunicação
mais abrangente e o reconhecimento da identidade
cultural de diversos grupos sociais e culturais.
Durante muitos anos, a história do Brasil contada
nos bancos escolares privilegiou todo processo histórico
destacando com glorias e méritos a Europa e Estados
Unidos. A história apontava os padrões culturais destes
países como modelo a ser seguido para construção
de qualquer sociedade. Estes países eram vistos
como fundamentais para o processo de civilização e
fundamentais para construção de qualquer sociedade.
Dentro desta realidade, podemos entender que a
educação, como campo de transformação social, não
deve ficar retida a velhas teorias, é necessário atender
às novas necessidades da sociedade. A efetivação da
lei 10.639 é uma realidade que deve ser estudada para
sua aplicabilidade nas escolas, atendendo assim uma
educação intercultural.
Destaco que a referida lei proporciona a todos

251
os atores envolvidos com o processo de educação
(principalmente os professores regentes de turma) a
condução dos educandos a desertar que a história da
humanidade e sociedade brasileira não está pautada e
fundamentada somente dentro do referencial europeu.
Podemos apontar que a implementação da lei dentro do
campo educacional, está fundamentada por entender
que a educação é o grande “motor” de transformação
social.
A Lei no 10.639/03 é uma importante ação
afirmativa4 de enfretamento ao preconceito e a
discriminação racial. Destaca a relatora Beatriz
Petronilha Gonçalves & Silva (2004, p.11), que a
política curricular “visa ressarcir os danos psicológicos,
materiais, sociais, políticos e educacionais sofridos sob
o regime escravista”, pelos descendentes de africanos
negros. A fundamentação teórica da inclusão da lei no
campo da educação se baseia no fato de que a escola é
capaz de proporcionar a construção de forma positiva
sobre a história dos negros, não reproduzindo a ótica
humilhante, colocando o negro como inferior.
No cotidiano escolar ocorre o encontro das
diferentes culturas. Defrontam-se múltiplas histórias de
vida. Confortam-se preconceitos e criam-se resistências,
a sala de aula é um espaço onde se explicitam tensões.
A escola é um dos ambientes de socialização dos alunos,
onde se estabelece contato com alunos de diferentes
origens, com costumes e dogmas diferentes, com
visões de mundo diversas daquela que compartilha
em família. Este contato diversificado poderá fazer da
escola o primeiro espaço de vivência das tensões raciais.
4-Conforme considera Guimarães: ações afirmativas são ações que corrigem
distorções no sistema de alocação por mérito, assentando-se nos valores
individuais e republicanos que norteiam o direito civil ocidental (...). É vista como
um mecanismo para promover a equidade e a integração sociais. (...) (2005 p.
171 e 197).

252
Gomes (2002) aponta que são nesses espaços onde
acontecem as oportunidades de comparação, a presença
de outros padrões estéticos, estilos de vida e práticas
culturais ganham destaque no cotidiano da criança e
dos adolescestes negros, muitas vezes contrários àqueles
aprendidos na família.
O discurso dominador pode ser incorporado por
alguns alunos negros de modo maciço, passando então
a ser reconhecer dentro dele, como consequência
iniciando um processo de desvalorização de seus atributos
individuais, interferindo na construção da sua identidade.
A escola, como campo de construção da
cidadania, formação de seres críticos e campo de
integração de diversas culturas, não pode ser um
espaço de segregação, mas sim de inclusão e respeito
às diversidades sócio-culturais. Munanga (2005)
alerta que:
“Um professor ou um educador numa
classe é como um ator único num
cenário único. Apesar de o conteúdo
da mensagem ser o mesmo para todas
as classes, ele precisa adaptar sua
encenação ao espírito de cada classe,
senão será prejudicada a comunicação
e a mensagem não será igualmente
transmitida e entendida por todos”
(MUNANGA, 2005. p.19).
A partir desta perspectiva de Munanga, podemos
refletir sobre as práticas pedagógicas do professorado,
dos projetos educacionais, e considerar que um ponto
importante a ser destacado é o discernimento, isto
é, o professor não pode se omitir diante das práticas
discriminatórias, a omissão do ocorrido, estará a
contribuir para a proliferação do problema social.
Fazer da discriminação racial um ponto de

253
partida para refletir junto aos alunos sobre o problema,
proporciona uma ação educativa, que trabalha dentro
dos princípios aos quais defendemos e acreditamos
que podem ajudar na construção de uma educação
comprometida com a sociedade. Uma “escola para
todos” e em que “todos são diferentes” exige de cada
professor e professora, de cada direção, de todo corpo
administrativo, a capacidade e a flexibilidade para
inovar na linha de um paradigma que proporcione o
eixo e a mudança, sem “despersonalizar” e aculturar.
Acreditamos que a escola deva valorizar as
características étnicas e culturais dos diferentes grupos
sociais, ás desigualdades socioeconômica e a crítica
ás relações sociais discriminatórias e excludentes,
proporcionando assim aos alunos a possibilidades de
conhecer o Brasil como um país multicultural.
Souza (2009), destaca que:
Apesar da promulgação da Lei
10.639/03 constituir-se em uma res-
posta às demandas do Movimento Ne-
gro e a todos aqueles que vêm lutan-
do por uma sociedade brasileira mais
democrática a sua aplicação não tem
sido uma tarefa fácil: muitas vezes os
professores não se sentem motivados
em cumprir leis que consideram vir
de escalões superiores, não se sentem
preparados para lidar com as questões
e tem aqueles que ainda acreditam no
mito da democracia racial ou acredi-
tam “tocar na ferida”, preferindo o si-
lêncio para “não provocar constrangi-
mentos (SOUZA, 2009. p.8).
Embora o progresso da inclusão da História
da África e da Cultura afro-brasileira no currículo
escolar seja uma vitória, cabe destacar que não basta

254
para garantir melhoria no tratamento e respeito
da população negra na sociedade e na escola. Esta
iniciativa aponta para caminhos a serem conquistados
e novas políticas a serem criadas para minimizar as
desigualdades e prevalecer o respeito aos negros.
[...] nos instiga a pensar sobre os atuais
desafios teórico-práticos para o traba-
lho com as relações raciais no cotidia-
no escolar. [...] de forma visceral, ques-
tões que afetam a todos que fizeram
da negritude uma causa de lutas em
suas vidas, e, em especial na educação
(SOUZA, 2009, p. 8).
É percebido, nas conversas informais com
os professores e equipe pedagógica, um grande
incômodo e dificuldade de meus colegas ao trabalhar
com o tema, principalmente por parte dos professores
do primeiro seguimento, que envolvem os alunos da
educação infantil ao 5ª ano. Percebo que a dificuldade
da implementação na lei dentro da escola tem sido em
decorrência do não conhecimento da lei e de recursos
pedagógicos para trabalhar. Na biblioteca da escola,
poucos são os livros de literatura infantil e juvenil que
apresentam personagens negros como protagonistas
da história.
É necessária uma urgência para se trabalhar a
lei dentro do campo educacional, sair do discurso e da
teoria e passar para prática. A urgência do despertar
um novo olhar por parte dos professores da rede, dos
gestores educacionais, da coordenação pedagógica
e de todos os atores envolvidos dentro do campo
educacional. Despertar para as práticas de como
lidar com a diversidade, fazer uma nova releitura da
a história da África dentro da sala de aula, da luta dos
negros para construção da sociedade, do Continente

255
Africano.
Para trabalhar relações raciais no espa-
ço escolar, o professor, além de conhe-
cer sobre o assunto, deverá estar com-
prometido politicamente com certas
questões que diz respeito às consequ-
ências das experiências que as crian-
ças negras passam. [...] Mas, há de se
percorrer um longo caminho para que
o professorado, como categoria, com-
preenda a importância de sua prática
e se dispa da ingenuidade de acreditar
na ingenuidade do seu trabalho, de
suas ações e de sua postura (SOUZA,
2009, p. 64).
A partir desta problemática, coloco algumas
questões norteadoras que movem este pré-projeto:
1. Quais as representações sociais dos profes-
sores da Escola Municipal Clementino Fraga
da rede pública municipal do Rio de Janeiro
sobre a lei 10.639?
2. Quais as dificuldades encontradas pelos pro-
fessores para implementarem a lei em suas
atividades na sala de aula?
3. Os docentes recebem capacitação adequada
para utilizarem o proposto na lei em sala de
aulas?
Objetivo
Identificar as dificuldades da implementação da
lei 10.639, através da prática pedagógica de docentes
que atuam nas séries iniciais do Ensino Fundamental
em determinadas escolas da rede pública municipal
do Rio de Janeiro.

256
Objetivos específicos:
• Identificar as estratégias utilizadas pelos pro-
fessores para combater as práticas racistas
dentro da sala de aula.
• Compreender como os professores do ensino
fundamental da rede municipal de educação
do Rio de Janeiro lidam com a situação de ra-
cismo, preconceito, discriminação dentro do
ambiente escolar.
• Identificar as representações sociais dos pro-
fessores sobre a lei 10.639.
A relevância do projeto aponta para uma reflexão
na trajetória de professores do ensino fundamental da
Escola Municipal Clementino Fraga da rede municipal
de educação do Rio de Janeiro, frente ao combate da
discriminação racial no ambiente escolar bem como a
sua compreensão sobre a implementação da lei 10.639.
Dar voz às práticas escolares dos professores é pensar
nos significados que eles dão às suas experiências no
sistema educacional, e também pensar nas estratégias
pessoais, conscientes e não consciente, articulando
identificações étnico-raciais com um percurso de
combate racial no espaço escolar.
Abordagem teórico-metodológica
A metodologia proposta nesta pesquisa estará
baseada na Teoria das Representações sociais (RS),
sendo o pioneiro nesta metodologia o psicólogo social
Moscovici. Bem como considera Moscovici (2003), as
representações sociais proporcionam a definição dos
padrões de comportamento de um grupo, elaborando
uma identidade singular de um determinado grupo.
Entretanto cabe destacar que as representações sociais
não são estáticas, elas mudam conforme o processo de

257
construção dos indivíduos. Esta metodologia permite
uma aproximação maior aos diversos significados
atribuídos pelos atores às diferentes situações vividas
pelos mesmos, possibilitando-lhes partilhar suas
experiências mais significativas e reais do cotidiano.
Os sujeitos da pesquisa serão professores do
primeiro segmento de algumas escolas da rede
pública do município do Rio de Janeiro. Os dados
serão coletados através de questionários anônimos.
As perguntas que serão realizadas aos entrevistados
serão técnicas de levantamento de dados e de grande
importância à descrição verbal, possibilitando um
questionamento que se refiram aos acontecimentos.
Para a análise dos dados coletados, através dos
questionários, utilizaremos o Discurso do Sujeito Co-
letivo (DSC), que é definido por Lefèvre e Lefèvre
(2003), como um novo enfoque de análise do pen-
samento coletivo, numa pesquisa qualitativa. Para os
autores, é necessário ter consciência de que o pensa-
mento coletivo é discursivo, isto é, compõe-se de um
número variado de discursos individuais, de respostas
sobre o que determinados indivíduos pensam sobre
determinados temas e que constituem uma matéria
prima a ser trabalhada. Nos depoimentos coletados
serão identificadas as expressões-chave. O discurso do
sujeito coletivo se baseia na teoria das Representações
Sociais (RS) de Moscovici, 2003
Moscovici (2003) considera que
“Representando-se uma coisa ou uma
noção, não produzimos unicamente
nossas próprias ideias e imagens: cria-
mos e transmitimos um produto pro-
gressivamente elaborado em inúmeros
lugares, segundo regras variadas. Den-
tro desses limites, o fenômeno pode

258
ser denominado representação social”
(MOSCOVICI, 2003, p. 63).
Justifico a metodologia deste projeto dentro do
discurso do sujeito coletivo, pois permite dar vozes aos
professores para relatarem suas experiências de vidas
em relação à educação e o enfretamento das questões
raciais dentro da sala de aula.
Referências Bibliográficas

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lares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-
-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-
-Brasileira. Brasília. 2004.

______ Lei 10639 de 9 de janeiro de 2003.

______ Orientações e Ações para a Educação das Rela-


ções Étnico-raciais. Brasília: MEC; SECAD, 2006.

CANDAU, Vera. Educação Intercultural e cotidiano


escolar. Rio de Janeiro, 7LETRAS, 2006.

________ Educação Intercultural na América Lati-


na: entre concepções, tensões e propostas e propostas.
7LETRAS, 2009.

CAVALLEIRO, Eliane. Educação anti-racista: com-


promisso indispensável para um mundo melhor. In:
CAVALEIRO, Eliane (ed) – Racismo e anti-racismo
na educação: repensando nossa escola. SP: Summus,
2001, p. 141-160.

259
FLEURY, R. M. Intercultura e educação. In: Revista
Brasileira de Educação. São Paulo: Cortez,ANPED. n.
23, Mai/jun/jul/agosto de 2003.

GOMES, Nilma Lino. Trajetórias escolares? Corpo


e cabelo crespo: reprodução de estereótipos e ou
ressignificação cultural? Trabalho apresentado na 24º
reunião Anual da ANPED. Caxambu, MG, 2002.

GONÇALVES & SILVA, Beatriz Petronilha. (Relatora).


Parecer das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino
de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
Brasília: MEC/CNE, 2004.

LEFÈVRE, F.; LEFÈVRE, A. M. C; O discurso do


sujeito coletivo: uma nova abordagem metodológica
em pesquisa qualitativa. Caxias do Sul: EDUCS,
2003. p. 11 – 35.

LIBÂNEO, José Carlos; ALVES, Nilda. Temas de


Pedagogia: diálogos entre didática e currículo. Editora
Cortez. 2012.

MIRANDA, Claudia, AGUIAR, Francisco L. de,


DI PIERRO, Maria C. (orgs.). Bibliografia básica.
Bibliografia básica sobre relações raciais e educação.
Rio de Janeiro: DP&A, 2004.

MOSCOVICI, S. Representações sociais. Petrópolis:


Vozes. 2003.

260
MUNANGA, Kabengele.. Racismo e anti-racismo no
Brasil. Fundação de Apoio à Universidade de São
Paulo. São Paulo: Editora 34, 2005.

PAIXÃO, Marcelo; ROSSETTO, Irene; MONTOVA-


NELE, Fabiana; CARVANO, Luiz M. Relatório Anual
das Desigualdades Raciais no Brasil; 2009-2010.

SOUZA, Maria Elena Viana. Relações raciais no


cotidiano escolar: diálogo com a lei 10639 -03. Rio de
Janeiro: Editora Rovelle, 2009.
Anexo I

Prezado professor,
Este questionário faz parte da pesquisa que realizo
como uma etapa para a elaboração do meu trabalho
de conclusão do curso de especialização em Promo-
ção da Igualdade Racial na Escola pela Universidade
Federal de Ouro, sobre as representações sociais dos
professores do ensino fundamental I, acerca da lei nº
10.639/03, que trabalha o ensino da História e Cultu-
ra Afro-Brasileira e Africana nos currículos escolares.
Para realizar a pesquisa gostaria de contar com
sua colaboração para o preenchimento deste questio-
nário. Serão preservados o sigilo das informações e
a identidade dos participantes. As respostas do ques-
tionário serão utilizadas somente para fins científicos.
Agradeço a participação, me colocando à

261
disposição para quaisquer esclarecimentos.

Atenciosamente,

Gustavo Pinto
silvarj23@hotmail.com

Anexo II - QUESTIONÁRIO PARA O PROFESSOR

1. Sexo
(a) Masculino
(b) Feminino

2. . Qual é sua Idade:


(a) Até 25 anos
(b) De 26 a 30 anos
(c) De 31 a 35 anos
(d) De 36 a 40 anos
(e) De 41 a 45 anos
(f) Mais de 46 anos

3. Qual é sua cor?


(a) Branco
(b) Preto

262
(c) Pardo
(d) Indígena
(e) Amarelo

4. Há quanto tempo leciona?


(a) Menos de 5 anos
(b) De 5 a 10 anos
(c) De 10 a 15 anos
(d) Mais de 15 anos

5. Qual rede de ensino atua? (Pode se marcar mais de


uma opção)
(a) Município do Rio de Janeiro
(b) Outro município. Qual?______________
(c) Estado
(d) Federal
(f) Privada

6. Qual a sua escolaridade:


(a) Ensino médio- Formação de professores
(b) Ensino Superior. Qual curso?______________
Instituição?____________________

263
(c) Pós-Graduação – Lato sensu.
Qual?_________________
(d) Pós-Graduação –Stricto sensu. ( ) Mestrado
( ) Doutorado
7. Na escola, já viu, ouviu, sofreu ou presenciou alguma
discriminação racial?
( ) sim ( ) não. Como foi?
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
____________

8. Caso presenciasse uma situação de discriminação


racial em sala de aula ou espaço escolar, qual seria sua
reação?
(a) Manteria a omissão diante da situação
(b) Não saberia como agir; fico inseguro
(c)Tomaria uma atitude para pôr fim à situação de
discriminação. Qual? _________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
_____________
9. Dentro da unidade escolar onde você atua como
docente, tem percebido atuação ou preocupação da
escola com a questão racial dentro do currículo escolar?

264
(a) Nunca
(b) Sempre. Quais?______________
(c) Algumas vezes

10. Em 2003, foi implementada na grade curricular


das escolas brasileira a lei nº 10639/03, onde torna
obrigatório o ensino de História e Cultura Africana e
Afro-descendentes. Você conhece a lei?
( )Não ( )Sim. Como? _____________________
___________________________________________
___________________________________________
_______________________

11. Você acha que essa lei contribui para a diminuição


da discriminação racial nas escolas? Por quê?
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
_______________

12. Na sua prática cotidiana na sala de aula, tem


trabalhado a lei nº 10639/03?
( ) Não
( ) Sim. Dê que forma? ________________________

265
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
_____________________
13. Na sua escola tem material para trabalhar a lei nº
10639/03?
( ) Não ( ) Sim

14. Na rede que você atua tem capacitação para


professores sobre a História e Cultura Africana e Afro-
descendentes?
( ) Não ( ) Sim

15. Você tem buscado por conta própria a formação


continuada sobre História e Cultura Africana e Afro-
descendentes?
( ) Não. Por quê?
______________________________________
______________________________________
_____________________________________
_____________________________________
______________________-
( ) Sim. Dê que forma?
___________________________________________
___________________________________________

266
___________________________________________
___________________________________________
______________________________________

16. O que você pensa sobre a obrigatoriedade do ensino


de História e Cultura Africana e Afro-descendentes?
Justifique sua resposta.
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
______________________________________

267
SOBRE OS ORGANIZADORES

ALINE RUIZ MENEZES

Mestranda em Linguística Aplicada


(UNICAMP). Licenciada em Letras (UFOP). Tutora
do Curso de Especialização UNIAFRO: promoção
da igualdade racial na escola. Membro do
Grupo de Pesquisa em Linguagens, Culturas e
Identidades (GELCI-UFOP). Email: alineruizm@
gmail.com

CLÉZIO ROBERTO GONÇALVES

Doutor em Semiótica e Linguística Geral pela


USP, mestre em Estudos Linguísticos pela UFMG,
licenciado em Letras e bacharel em Estudos
Linguísticos pela UFOP. Professor Adjunto da
Universidade Federal de Ouro Preto, Coordenador
do Mestrado em Letras (POSLETRAS-UFOP),
Coordenador Adjunto do Curso de Especialização
UNIAFRO: promoção da igualdade racial na
268
escola, Coordenador do Grupo de Pesquisa em
Dialetologia e Sociogeolinguística (GPDS-UFOP),
sócio-fundador do Grupo de Pesquisas em
Dialetologia e Geolinguística (GPDG-USP), Líder
do Grupo de Pesquisa em Linguagens, Culturas
e Identidades (GELCI-UFOP); membro do Núcleo
de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (NEABI-
UFOP), membro do GT de Sociolinguística da
Associação Nacional de Pós-Graduação em
Linguística e Literatura (ANPOLL). Email:
cleziorob@gmail.com

KASSANDRA DA SILVA MUNIZ

Doutora e mestre em Linguística pela


UNICAMP. Licenciada em Letras pela UFPE.
Professora adjunta do Depto de Letras da UFOP.
Nesta instituição é Coordenadora adjunta do
curso de Especialização UNIAFRO: promoção
da igualdade racial na escola; Líder do Grupo de
Pesquisa em Linguagens, Culturas e Identidades
(GELCI-UFOP); Coordenadora do Subprojeto
PIBID História,  Cultura e Literatura Africana e
Afro-Brasileira; Assessora Acadêmica do NEABI/
UFOP; Membro do Grupo de Pesquisa Linguagem e
Identidade: abordagens pragmáticas (UNICAMP);
Membro, desde 2011, do GT Práticas Identitárias
em Linguística Aplicada da Associação Nacional
de Pós-Graduação em Linguística e Literatura
(ANPOLL). Email: kassymuniz@gmail.com

269

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