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Clara Vasconcelos

António Almeida

Aprendizagem Baseada na Resolução de


Problemas
no Ensino das Ciências.

Propostas de trabalho para as Ciências Naturais, Biologia e Geologia

Porto Editora

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2012

Como planificar

Para melhor clarificar a estrutura que seguimos na planificação das nossas propostas de
trabalho, iremos exemplificar um cenário ABRP. Cada componente da planificação
será, assim, explicada a partir de um cenário criado e que intitulámos: Saída de campo
às minas de Castromil (Concelho de Paredes).

A contextualização curricular é obtida consultando as orientações curriculares para o 3º


Ciclo do Ensino Básico. O tempo necessário para a realização da proposta de trabalho
varia entre os 45 a 90 minutos.

▪ Contextualização curricular: 7º ano de escolaridade: Dinâmica interna da Terra.


Ocorrência de falhas e dobras.
▪ Tempo previsto: 45 (ou 90 minutos).

Os pré-requisitos correspondem aos saberes aprendidos em anos anteriores,


nomeadamente ao nível do ciclo de estudos precedente, e auxiliarão no questionamento
e na planificação da atividade de investigação a desenvolver.

▪ Pré-requisitos:
Importa referir que no decurso do 2º Ciclo não é abordado o tema da deformação da
litosfera. Consequentemente, o tema é novo em termos de abordagem em contexto
formal de aprendizagem, o que não significa que alguns alunos não possam ter ideias
sobre o mesmo, fruto de conhecimentos adquiridos em outros contextos de
aprendizagem.

Os objetivos dizem respeito a saberes e capacidade que se pretende que os alunos


atinjam com o desenvolvimento da investigação. Estão definidos de acordo com o
programa do 3º Ciclo do Ensino Básico. Os objetivos relacionados com a aplicação da

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ABRP estão sempre presente como, por exemplo, revelar raciocínio científico ao
planear e executar atividades de simulação (modelação análoga).

▪ Objetivos específicos
- Identificar falhas em figuras/esquemas.
- Associar o tipo de força que origina os diferentes tipos de falhas.
- Identificar tipos de falhas.
- Associar tipos de falhas a ação de forças, características das rochas e ambiente
geodinâmico.

Os conceitos a mobilizar estão implícitos na temática selecionada e nos objetivos a


atingir. Encontram-se disseminados pelos manuais escolares e terão que ser abordados
durante a investigação.

▪ Conceitos a mobilizar
Fratura, falha normal, falha inversa, forças distensivas, forças compressivas,
comportamento dúctil, regime frágil, teto, muro.

O cenário (contextualização problemática) pode ser apresentado de várias maneiras:


textos, notícias, bandas-desenhadas conceptuais, fotografias comentadas,
diálogos…Contudo, partimos do pressuposto de que uma organização de base comum
facilita a sua elaboração e ajuda os alunos a melhor se familiarizarem com a
metodologia. Assim, ao problema deve ser sempre atribuído um nome para que possa
ser facilmente reconhecido entre alunos e professores. Os problemas ficam, então,
conhecidos pela sua designação, que é geralmente apelativa e é definida como o caso
(por exemplo: Caso – Saída de campo às minas de Castromil)

Caso: Saída de campo às minas de Castromil

Problema

A última aula de Ciências Naturais foi diferente…O professor António levou-nos a uma
saída de campo às Minas de Ouro de Castromil. Na aula anterior à saída de campo o

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professor explicou as paragens que íamos efetuar e dialogámos bastante sobre o que
íamos observar, os dados a recolher e as perguntas do guião a que teríamos de responder
em grupo e de forma autónoma. Durante a visita tudo correu como o previsto, até que
numa paragem nos deparámos com uma falha, que não soubemos identificar. Como os
meus colegas dos outros grupos também não conseguiram, tirei uma fotografia à falha e
trouxe-a para a aula de Ciências.

Figura II.1: Falha em Castromil


(Concelho de Paredes)

A falha, observável num afloramento junto da linha de comboio, tinha o seu plano
preenchido por quartzo, com ocorrência de mineralizações de pirite e arsenopirite.
O professor deu-nos uma ajuda assinalando, com setas vermelhas sobre a fotografia, o
movimento dos blocos da falha – o teto tinha subido relativamente ao muro.
Que atividades podem os alunos desenvolver para compreender a formação de falhas?

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Após a apresentação do problema os alunos devem compreender que: (i) o
problema fornece factos; (ii) a resolução do problema implica o levantamento de
questões; (iii) a investigação é necessária para encontrar respostas às questões
problema; (iv) nem sempre existe apenas uma solução, mas a solução apresentada tem
que ser argumentada.

Além do referido, o professor, como mediador, deve saber facilitar o processo,


orientando os alunos no levantamento de questões e conduzindo-os na investigação,
sem dar respostas mas evitando que os alunos se desviem das aprendizagens
necessárias à resolução do problema. Antes do levantamento de questões, os alunos
devem recolher factos do problema. Esta tarefa é difícil, pelo menos numa fase inicial,
sendo muitos os factos que os alunos recolhem que não têm interesse para a
investigação, assim como se esquecem de outros relevantes.

Após algumas aplicações deste tipo de cenário, os alunos familiarizam-se com a


metodologia e o tempo utilizado nestas primeiras atividades torna-se produtivo e
rentável. O fornecimento da ficha de monitorização da ABRP pode ajudar os alunos no
processo, sendo mesmo fundamental para uma autorregulação da aprendizagem.
A figura II.2 apresenta a ficha referida com indicação de uma proposta de
preenchimento relativamente aos factos do caso apresentado. Esta ficha, ou outra com
características semelhantes, constitui o documento de base para auxiliar o aluno no
processo da ABRP. A ficha foi elaborada seguindo propostas de autores como Delisle
[43] e Lambros [9].

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Figura II.2: Lista de monotorização da ABRP

Caso: Saída de campo às minas de Castromil

Lista de factos Questões-problema

Observamos uma falha.

A falha tinha o seu plano


preenchido por quartzo, com
ocorrência de mineralizações de
pirite e arsenopirite.

O teto tinha subido relativamente


ao muro.

Planificar investigação:

Proposta de solução:

As questões problema devem ser referidas pelos alunos. Cada grupo deve trabalhar
individualmente e, no fim, o professor faz uma síntese no quadro. Se o cenário for bem
apresentado, as questões levantadas pelos alunos são muito semelhantes às previstas
pelo professor facilitador. As questões são depois escritas na lista de monotorização da
ABRP.

▪ Questões-problema
- O que é uma falha?
- Que tipo de forças pode originar falhas?
- Como se forma uma falha normal?
- Como se forma uma falha inversa?
- Que tipo de características tem o material onde se formam as falhas normais? E as
falhas inversas?

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O produto final indica ao aluno o que o professor espera que resulte do trabalho de
investigação. Com a apresentação do produto final ao grupo turma devem ser discutidas
as soluções encontradas para as questões-problema formuladas no âmbito do cenário
apresentado. Primeiro os alunos devem responder às questões –problema e só depois
elaboram o produto final.
Para responderem às questões-problema e obterem o produto final os alunos têm que
realizar pequenas investigações, cujo tempo deve ser bem gerido pelo professor,
evitando o risco de transformar a ABRP numa aprendizagem por projetos. As
investigações terão que permitir aos alunos encontrarem evidências para proporem as
soluções.

▪ Produto Final
Os alunos terão que planificar uma atividade que simule a formação de falhas. Poderão
usar blocos de sabão, esferovite ou, com a ajuda do professor, montar um modelo com
acrílico, areia e pó de junta de diferentes cores. Em ambos os casos, terão que exercer
forças distensivas e forças compressivas, e esquematizar o tipo de falhas que as
originam. Depois, confrontando com imagens e informação presentes no manual
escolar, saberão identificá-las como normais ou inversas. O registo das aprendizagens
realizadas com a modelação deve resultar no preenchimento de um V de Gowin.

Dispositivo de acrílico

Falhas normais (distensão)

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Falhas inversas (compressão)

COMO SE
FORMAM
TEORIA: Tectónica AS CONCLUSÃO: As falhas
de Placas FALHAS? formam-se por movimentos
__________________ de distensão e de
__________________ compressão.
PRINCÍPIOS:
__________________ ______________________
a) Consoante a natureza
__________________ ______________________
do material, este reage de TRANSFORMAÇÕES:
__________________ ______________________
forma diferente às tensões, Nas falhas normais o teto
__________________ ______________________
originando diferentes desce em relação ao muro.
__________________ ______________________
deformações Nas falhas inversas o teto
__________________ ______________________
sobe em relação ao muro.
__________________ ______________________
b) As falhas formam-se em
__________________ ______________________
regime frágil.
__________________ ______________________
__________________ ______________________
__________________ REGISTOS: Inicialmente as camadas
______________________
__________________ estavam______________________
horizontais; a distensão
_______ originou falhas normais; a compressão
______________________
originou falhas inversas.
____________
CONCEITOS: falha normal,
_________________________________
falha inversa, forças
c) _________________________________
distensivas, forças
_________________________________
compressivas, comportamento
_________________________________
dúctil, regime frágil, teto,
d) _________________________________
muro.
_________________________________
ACONTECIMENTOS/OBJETOS: _________________________________
e) _________________________________
_________________________________
_________________________________
_________________________________
_________________________________
_____________________________
Colocar no dispositivo, alternadamente, camadas de areia muito fina e de pó
de junta (ou óxidos de ferro) de diferentes cores.
Primeiro procede ao estiramento, lentamente. Observa e regista o tipo de
falha. Faz um esquema
Depois comprime, fazendo pressão dos dois lados das paredes laterais.
Observa e regista o tipo de falha. Faz um esquema.
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.
As fontes de dados são elementos de consulta para os alunos encontrarem evidências
para responderem às questões problema e terem maior informação para argumentarem
ao comunicarem à turma as propostas de solução.

▪ Fonte de dados
Manual escolar
Endereços eletrónicos (sites consultados em Fevereiro de 2012):
Aventuras nas minas de ouro de Castromil
http://www.fc.up.pt/pessoas/allima/Castromil/flash.swf
Fonseca, P. et al. Aplicação de modelos analógicos em regime frágil no domínio da
geologia aplicada: experiências recorrendo a caixas de deformação de areias. Disponível
em http://web.letras.up.pt/asaraujo/Trabalhos/56%20modelo.fragil.pdf
Barros, J.; Vasconcelos, C.; Lima, A. & Santos, M. J. (2009) Geologia e Ambiente. A
Educação Ambiental nas Minas de Ouro de Castromil. CAPTAR: Ciência para Todos,
1,1, 89-13. Disponível em http://captar.web.ua.pt/index.aspx?op=verResumo&ID=134

Sempre que possível, o ensino de uma temática e a aprendizagem de novos conteúdos


devem possibilitar a ligação de conceitos entre unidades da mesma disciplina
(intradisciplinaridade) e ainda de áreas disciplinares diferentes. Esta última articulação
obriga a um maior esforço de consulta dos diferentes programas curriculares e o diálogo
entre docentes.

▪ Articulações disciplinares
Intradisciplinares
Este assunto relaciona-se de forma evidente com a Teoria da Tectónica de Placas e com
a abordagem das paisagens geológicas.
Interdisciplinares
História

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Os Romanos exploraram, em Portugal, preferencialmente o cobre, o ouro e o ferro,
tendo sido, na sua época, verdadeiros mestres das artes mineiras. Em Castromil podem
observar-se cortas romanas, que são resultantes de extensos desmontes a céu aberto.
Ciências Físico-Químicas
A meteorização de algumas rochas (por exemplo, caulino) é observada em Castromil,
podendo as reações químicas ser estudas e aprofundadas nas aulas de Ciências Físico-
Químicas.

O ciclo de apresentação das atividades de ABRP não se altera muito, mas deve revelar
particularidades específicas do cenário envolvente.

▪ Ciclo de apresentação
Saída de campo (se possível).
Contextualização problemática com exploração didática do cenário.
Preenchimento da ficha de monitorização da ABRP.
Síntese em grande grupo das questões problema.
Planificação e execução de atividade de simulação (modelação análoga).
Apresentação do produto final e síntese das propostas de solução.

Caso haja tempo, ou o professor considere mais adequado, sugerem-se outras atividades
de auxílio aos alunos na procura de solução para as questões-problema.

▪ Outras atividades possíveis


Visionar vídeos com animações digitais que expliquem a formação de falhas. A
modelação digital é atualmente muito utilizada na investigação científica.

Após uma ABRP o aluno deve ser capaz de mobilizar os saberes aprendidos para
aplicações que envolvam pensamento crítico, raciocínio científico e capacidade de
argumentação.

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▪ Aplicação
Após a investigação que efetuaste serás capaz certamente de responder às seguintes
questões problema:

1-Por que razão surgem falhas inversas associadas a dobras?

2-Em que tipo de material são comuns as falhas normais?

3-Em que ambiente tectónico se geram falhas inversas por excelência? E normais?

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