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“Contemplar não é idealizar; contemplar é dissolver, com o olhar contemplativo, a casca dura das aparên-
cias, para descobrir, no mais profundo de toda pessoa e realidade, o agir do Pai, que continua
criando vida nova em abundância, inclusive de maneira privilegiada, nas realidades mais desu-
manizadas e destruídas. É urgente olhar. Deus não nos diz: “Buscai-me no vazio”. Ele é o
“Deus escondido”, mas na realidade”. (Joseph M. Rambla)
Nesse espaço pagão não há nenhuma referência religiosa por parte de Jesus,
nenhuma pergunta sobre a fé do paralítico como condição de sua cura.
O paralítico não sabe nada sobre a pessoa de Jesus, que somente lhe pergunta se
quer ficar curado.
A pergunta de Jesus ajuda a des-velar o real desejo do paralítico; isso porque, às
vezes, as pessoas se acomodam em suas paralisias, delas tirando vantagens e
não querendo assumir os compromissos de estarem curadas.
A ternura de Jesus se faz gesto que antecede, ação atenciosa, orientada a fazer o
enfermo sair de sua condição de marginalização e exclusão.
Realiza-se um encontro tão profundamente humano como só Deus encarnado poderia fazer; uma
acolhida sem medida e sem condições, de tal maneira que o paralítico encontra o espaço aquecido onde se
atreve a ensaiar seu gesto de vida. A ordem “levanta-te” é a graça de uma vida reencontrada e de uma
reencontrada dignidade de vida.
O paralítico sai pelas ruas de Jerusalém carregando seu leito como um sinal do
Reino que não “desce” do céu, mas “sobe” a partir dos abismos da exclusão e
miséria.
Quando todos “olhavam” para cima esperando os sinais do Reino, Jesus
mostrou, à vista de todos, os sinais do Reino brotando de baixo, a vida brotando
das cinzas da condição humana.
Esse é o poder do Amor de Deus que se faz ternura e abraço acolhedor de todo
ser humano.
“Amar alguém é lhe dizer: não morrerás” (G. Marcel).
Jesus também não faz complicados raciocínios para atuar e justificar sua ação,
mas revela que a maneira de agir do Pai se faz presente n’Ele através dos seus
sentidos contemplativos.
Essa possibilidade de “olhar” é um dom do Pai, não o produto final de refinadas
técnicas psicológicas e espirituais. “O Pai ama o Filho e lhe revela tudo o que faz” (v. 20).
Revelar a beleza de alguém é revelar o seu valor e dignidade, dedicando-lhe tempo, atenção e ternura.
Amar não é apenas fazer algo pelo outro, mas revelar ao outro sua própria originalidade, comunicando-
lhe, assim, que ele é especial e digno de atenção.
Podemos expressar essa revelação por meio da nossa presença aberta e gentil, pela maneira como
olhamos e escutamos uma pessoa, pelo modo como falamos com ela e cuidamos dela.
Os sentidos, cristificados na contemplação, nos impulsionam em direção ao outro e nos fazem acreditar
na beleza e dignidade escondidas na fragilidade da condição humana.
Mergulhar na realidade que nos cerca, por meio dos sentidos bem abertos e evangelizados, é deixar
estremecer de vida divina a fragilidade de nossa condição humana.