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RESERVA DE DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL AMANÃ (1998-2018):
20 anos de pesquisas
SOCIOBIODIVERSIDADE DA
RESERVA DE DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL AMANÃ (1998-2018):
20 anos de pesquisas
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 3
Governo do Brasil
PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Jair Bolsonaro
DIRETOR GERAL
João Valsecchi do Amaral
DIRETORA ADMINISTRATIVA
Joycimara Rocha de Sousa
DIRETOR TÉCNICO-CIENTÍFICO
Emiliano Esterci Ramalho
4 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
SOCIOBIODIVERSIDADE DA
RESERVA DE DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL AMANÃ (1998-2018):
20 anos de pesquisas
Organizadores
Ana Claudeise Silva do Nascimento, Maria Isabel Figueiredo Pereira
de Oliveira Martins, Maria Cecília Rosinski Lima Gomes, Jefferson
Ferreira-Ferreira, Isabel Soares de Sousa, Caetano Lucas Borges
Franco e Marília de Jesus da Silva e Souza
Tefé/AM
2019
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 5
SOCIOBIODIVERSIDADE DA RESERVA DE
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL AMANÃ (1998-2018):
20 anos de pesquisas
Ficha técnica
ORGANIZAÇÃO
Ana Claudeise Silva do Nascimento
Maria Isabel Figueiredo Pereira de Oliveira Martins
Maria Cecília Rosinski Lima Gomes
Jefferson Ferreira-Ferreira
Isabel Soares de Sousa
Caetano Lucas Borges Franco
Marília de Jesus da Silva e Souza
REVISÃO
Marise Reis
PROJETO GRÁFICO
Doizum Comunicações
FICHA CATALOGRÁFICA
Graciete do Socorro da Silva Rolim
COMITÊ EDITORIAL
Helder Lima de Queiroz
Joycimara Rocha de Sousa
Isabel Soares de Sousa
João Valsecchi do Amaral
Eunice Venturi
Dávila Suelen Souza Corrêa
Emiliano Esterci Ramalho
FOTO CAPA
André Dib
FOTO CONTRACAPA
Marilene Ribeiro
352p.
6 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
DEDICATÓRIA
Dedicamos este livro aos moradores da região do Médio Solimões, aos
gestores e lideranças locais, aos tomadores de decisões e aos elementos
naturais que compõem esse ambiente, que vivem e habitam a imensidão
territorial da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã. Sem a união
desses protagonistas, este livro não faria sentido.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 7
AGRADECIMENTOS
Agradecemos a sinergia interdisciplinar que conseguimos reunir neste
livro, por meio das ações e dos esforços de toda a equipe do Instituto
de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM) e das pessoas que
colaboraram direta e indiretamente. As especialidades de cada um resultaram
em uma importante pluralidade para o contexto dos trabalhos sobre Unidades
de Conservação no Brasil.
Sem o apoio e a anuência dessas pessoas não teria sido possível realizar uma
boa parte das pesquisas apresentadas neste trabalho, pois não teríamos
acessado a inúmeras áreas que são conhecidas somente por quem vive no local.
Além disso, agradecemos pelas recepções acolhedoras, pelo aprendizado,
e pela construção do conhecimento em conjunto compartilhado com todos
nesta publicação.
8 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
LISTAS DE SIGLAS E ABREVIATURAS
AAV------- Agente Ambiental MAPA ---- Ministério da Agricultura,
---- Voluntário --- Pecuária e Abastecimento
AC Áreas de Coleta MCTIC ---- Ministério de Ciências
ADAF------ Agência de Defesa --------- Tecnologia, Inovação e
---------- Agropecuária e Florestal do --------- Comunicação
--- Amazonas MEB------ Movimento de Educação de
AP Antes do Presente ----- Base
APC Áreas Potenciais de Coleta MHNBA --- Museu de História Natural
APSC------ Associação de Produtores --------- da Universidade Federal da
------- do Setor Coraci --------- Bahia
APT------- Assessoria de Populações MMA----- Ministério do Meio
------ Tradicionais ------ Ambiente
BIOSIS (UFBA)- Laboratório de Bionomia, PAC Projeto Amazônia Central
----------- Biogeografia e Sistemática
----------- de Insetos PAF Programa Agrícola Familiar
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 9
SUMÁRIO
10 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
SEÇÃO II: POPULAÇÕES HUMANAS 150 Bárbara Tadzia Trautman Richers
E ORGANIZAÇÃO SOCIAL
A IMPORTÂNCIA DOS RECURSOS
DIÁLOGOS E PRÁTICAS PESQUEIROS PARA AS 252
ARQUEOLÓGICAS 152 COMUNIDADES E A DINÂMICA
Eduardo Kazuo Tamanaha
Márcio Amaral
NAS ÁREAS EM REGIME DE
Mariana Franco Cassino MANEJO SUSTENTÁVEL
Cunha Lima Ana Claudia Torres Gonçalves
Eduardo Góes Neves Isabel Soares de Sousa
Laura Pereira Furquim
Márjorie Lima
DINÂMICA E PRÁTICAS DE
Maurício André Silva
Jaqueline Gomes
274
MANEJO DA AGRICULTURA
Silvia Carla Gibertoni Carneiro
MIGRATÓRIA: padrões de uso
HISTÓRICO DE OCUPAÇÃO dos recursos, caracterização e
HUMANA a partir do século XX 170 transformações na paisagem
Edna Ferreira Alencar Fernanda Maria Freitas Viana
Isabel Soares de Sousa Angela May Steward
Camille Rognant
DINÂMICAS Jéssica Poliane Gomes dos Santos
SOCIODEMOGRÁFICAS 186
Ana Claudeise S. do Nascimento DINÂMICA E CARACTERIZAÇÃO
Edila Arnaud F. Moura 292
Dávila S. S. Corrêa DA ATIVIDADE DE PRODUÇÃO
Maria Isabel F. P. de Oliveira Martins ANIMAL: bovino e bubalinocultura
Hudson Cruz das Chagas Angela May Steward
Paula de Carvalho Machado Araujo
ECONOMIA FAMILIAR Jéssica Poliane dos Santos
Nelissa Peralta 214 Fábio Paz
Deborah Lima Fernanda Maria de Freitas Viana
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 11
12 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
© André Dib
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 13
APRESENTAÇÃO
H e l d e r L i m a d e Q u e i ro z
14 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
tes, os textos que integram este livro. Ele
está organizado em três sessões distintas. A
primeira, composta de seis capítulos, trata
dos aspectos físicos e biológicos da RDSA.
A segunda seção, com cinco capítulos, dis-
cute aspectos socioeconômicos e demográ-
ficos das populações que vivem na Reserva.
A terceira e última seção, também forma-
da por cinco capítulos, apresenta aspectos
relacionados ao uso dos recursos naturais
em Amanã. O total de 17 textos, resumidos
e dirigidos a um público de não especialis-
tas, representa a contribuição de quase 60
profissionais. A quase totalidade destes foi,
ou continua sendo, formada por membros
do Instituto Mamirauá, sejam eles pesqui-
sadores contratados para compor o quadro
permanente da instituição, ou bolsistas
que assim permaneceram entre nós apenas
temporariamente, mas tempo suficiente
para deixarem suas importantíssimas con-
tribuições científicas. Este conhecimento,
associado à sabedoria tradicional dos mo-
radores, é o que permite a definição de al-
ternativas eficientes de uso sustentável dos
recursos naturais, a principal estratégia de
conservação da biodiversidade adotada pelo
Instituto Mamirauá.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 15
© Marcelo Ismar Santana
16 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 17
TERRITÓRIO
DA RESERVA DE
DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL AMANÃ
C a e t a n o L . B . F ra n c o
18 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 19
© Thiago Figueiredo © Aline Fidelix © Bruno Kelly
20 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Seção I:
ASPECTOS FÍSICOS
E BIOLÓGICOS
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 21
© Thiago Figueiredo
22 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
HISTÓRIA GEOLÓGICA
E CONFORMAÇÃO
SUPERFICIAL DAS
PAISAGENS
J e f f e r s o n Fe r r e i r a - Fe r r e i r a
Caetano Franco
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 23
HISTÓRIA GEOLÓGICA
E CONFORMAÇÃO
SUPERFICIAL DAS
PAISAGENS
J e f f e r s o n Fe r re i ra - Fe r re i ra
C a e t a n o F ra n c o
24 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
cações na configuração das placas tectôni- recobrem e dividem o Cráton Amazônico
cas ao longo do Pacífico, sendo, em última em dois escudos: o Escudo das Guianas, ao
instância, responsável pelos pulsos de so- norte, e o Escudo do Brasil Central, ao sul
erguimento da Cordilheira dos Andes – que (Figura 1). Essas coberturas sedimentares
atingiram seu clímax durante o Mioceno Paleozóicas atingem até 5 mil metros de es-
Tardio e Plioceno (10-4 M.a), exercendo pessura e, na calha principal do sistema flu-
vial Solimões/Amazonas, estão divididas,
papel determinante no futuro geográfico e
de E para W, nas bacias sedimentares do
biogeográfico da Bacia Amazônica.
Marajó, Amazonas, Solimões e Acre. Essas
bacias foram separadas por feições estrutu-
Atualmemente, cruzando o Cráton Ama- rais positivas - chamadas arcos estruturais
zônico em alinhamento E-W, encontra-se -, de orientação geral NW-SE que as indivi-
uma ampla faixa de sinéclise coberta por dualizaram geologicamente (WANDERLEY-
pacotes sedimentares Fanerozóicos que o -FILHO e COSTA, 1991).
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 25
A área da RDSA estende-se sobre a bacia se- persequência, Siluro-Devoniana (ii), que é
dimentar do Solimões, delimitada pelo Arco estratigraficamente representada pela For-
Purus, à leste, e pelo Arco Iquitos, à oes- mação Jutaí (clásticos e calcários neríticos).
te. Entre esses arcos, o Arco Carauari forma Durante a terceira incursão marinha, no
um alto regional de rampa suave norte-sul, Devoniano Médio, o papel do Arco Carauari
responsável pelo controle da distribuição de como divisor das sub-bacias torna-se evi-
sedimentos ao longo da bacia do Solimões, dente. O clima frio é marcado por depósitos
especialmente antes do Mesozóico (WAN- glaciais que recobrem essa terceira super-
DERLEY-FILHO et al., 2010). O Arco de Ca- seqüência Devoniano-Carbonífera (iii), re-
rauari divide a bacia sedimentar do Solimões presentada por rochas sedimentares mari-
em duas sub-bacias: Jandiatuba, a oeste, so- nhas e glácio-marinhas do Grupo Marimari
toposta por rochas ígneas e metamórficas, (formações Uerê e Jandiatuba), que ultra-
e cuja espessura do pacote sedimentar pode passam o Arco de Carauari, estendendo-se
atingir até 3100 metros, e Juruá, a leste, com para a sub-bacia de Juruá.
3.800 m de espessura de sedimentos, sobre
substrato semelhante, além de riftes prote- O Grupo Tefé (formações Juruá, Carauari e
rozóicos (EIRAS et al., 1994). Fonte Boa) é representativo da quarta su-
persequência, Carbonífero-Permiana (iv), e
Duas sequências sedimentares Fanerozói- diz respeito à quarta e última incursão ma-
cas de primeira ordem constituem o preen- rinha na Bacia do Solimões. Seus clásticos,
chimento da Bacia do Solimões. A mais an- carbonatos e evaporitos marinhos e conti-
tiga e significativa delas é Paleozóica, com nentais são encontrados em quase toda esta
origem no Ordoviciano Inicial, contendo as bacia. Durante esta época, o clima tornou-
rochas fonte e reservatório de seu sistema -se quente e úmido, favorecendo o desen-
petrolífero, além de extensivas intrusões de volvimento de barras de maré e dunas eóli-
diabásio na forma de diques e soleiras. Essa cas costeiras que, posteriomente, vieram a
sequência foi interrompida posteriormente constituir clásticos e carbonatos, as melho-
no Permiano, na fase inicial de colisão en- res rochas reservatórios da bacia. Elas fo-
tre os continentes de Gondwana e Laurásia. ram seguidas pelo desenvolvimento de uma
Esse evento ocasionou um longo período espessa sequência de evaporitos marinhos e
de hiato deposicional através do Triássico, continentais que agiram como um selador
do Jurássico e do Cretáceo Inicial. A segun- efetivo para os campos de petróleo da Bacia
da e mais recente sequência deposicional do Solimões. Do Grupo Tefé, apenas a For-
de primeira ordem é relativamente delga- mação Carauari tem continuidade física na
da e corresponde às sequências Mesozói- Bacia Amazônica, representada pelas for-
cas e Cenozóicas do Cretáceo e do Neógeno. mações Itaituba e Nova Olinda (REIS e AL-
Elas recobrem completamente as sequên- MEIDA, 2010).
cias Paleozóicas e, diferentemente da vizi-
nha Bacia do Amazonas, não são conheci- Não há qualquer evidência de sistemas de-
dos afloramentos da sequência Paleozóica posicionais Triássicos ou Jurássicos na Ba-
(WANDERLEY-FILHO et al., 2010). cia do Solimões. Pelo contrário, intensos
processos erosionais foram desencadeados
Essas duas sequências principais que pre- durante esses períodos devido à orogenia
encheram a Bacia do Solimões consistem Herciniana e a soerguimentos causados
de pacotes sedimentares separados por dis- por extensas intrusões de soleiras de dia-
cordâncias bem marcadas, formando seis básio entre as sequências do Carbonífe-
supersequências, que serão aqui descritas ro-Permiano (CUNHA et al., 1994). Essas
conforme Eiras et al. (1994a, 1994b) e Wan- manifestações magmáticas são datadas de
derley-Filho et al. (2010). A superseqüência aproximadamente 204 M.a. (Triássico) e
Ordoviciana (i) consiste da primeira incur- coincidem com o magmatismo Penatecaua,
são marinha na região e é representada pe- amplamente reconhecido ao longo da plata-
las formações Benjamim Constant (clásticos forma continental brasileira e que é relacio-
neríticos) - restritas à sub-bacia de Jandia- nado à abertura do Oceano Atlântico Central
tuba. Essa transgressão marinha vinda de (WANDERLEY-FILHO et al., 2005, 2007).
oeste é também bem documentada por fá- Estima-se, através de modelos e análises
cies proximais correlacionáveis a esses sis- termo-mecânicas da espessura total das
temas distais. No Siluriano Inicial, tem-se a intrusões de diabásio, que pelo menos 800
primeira manifestação do Arco de Carauari metros de depósitos Permianos foram ero-
como um divisor das sub-bacias. Neste pe- didos nesse período (WANDERLEY-FILHO
ríodo, ocorreu a segunda incursão marinha et al., 2010).
de oeste, que cobriu apenas o extremo oeste
da sub-bacia de Juruá, não muito além do A supersequência Cretácea (v) correspon-
Arco Carauari. Essa constitui a segunda su- de aos depósitos fluviais da Formação Alter
26 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
do Chão, preservados devido à subsidência áreas úmidas que depositaram camadas la-
retomada no Cretáceo Tardio nas bacias do mosas da seção mais antiga da Formação
Solimões e Amazonas e que está relacionada Solimões. Com a conformação final da Cor-
à orogenia Andina. Esta fase foi dominada dilheira dos Andes, durante o Neógeno, a
pela erosão das rochas paleozoicas, com seu bacia de drenagem começou a receber altas
retrabalhamento eólico, e pela passagem cargas sedimentares originárias das mon-
para um sistema lacustrino e fluvial anas- tanhas, reorganizando o sistema fluvial e o
tomosado e meandrante, que ainda drena- redirecionando para o Oceano Atlântico – o
vam para o Oceano Paleopacífico ou Mar do moderno sistema fluvial transcontinental
Caribe, e que foi responsável pela deposição Solimões/Amazonas (HOORN et al., 1995).
da Formação Alter do Chão. Esse primeiro
ciclo foi seguido pela progradação de de-
A supersequência Terciária (vi) correspon-
pósitos sedimentares fluviais, lacustrinos
de aos pelitos e arenitos fluviolacustres
e deltáicos intercalados com conglomera-
dos. Os leitos de arenitos são de granulo- Miopleistocênicos da Formação Solimões,
metria fina a média, vermelhos, variegados depositados em conexão com a orogenia
e cauliníticos. Muitas bandas massivas de Andina. Essa unidade forma uma cunha
limonita ocorrem entre essas deposições e a sedimentar, desde o Arco Purus até as ba-
parte superior, por vezes, formando platôs cias subandinas, atingindo mais de 7.000
capeados por bauxita. m de espessura (WANDERLEY-FILHO et al.,
2010; MOSMANN et al., 1986). Superficial-
O soerguimento andino ocorrido no Cretá- mente, em toda área da RDSA, atualmente,
ceo-Paleógeno inicia o isolamento da bacia predomina a Formação Içá, que é produto
fluvial amazônica. A sobrecarga dessa oro- de sedimentação pleistocênica e foi depo-
genia sobre a placa litosférica sul-america- sitada em ambiente fluvial de oeste para
na causou flexuramentos, responsáveis pela leste, composta litologicamente por areni-
mudança do centro de deposição dos sedi- tos silto-argilosos amarelo avermelhados,
mentos Cenozóicos para as bacias subandi- (MELO e VILLAS BOAS, 1993). Em menor
nas (WANDERLEY-FILHO et al., 2010). Du- proporção, e ao longo das planícies fluviais
rante o Mioceno, os sistemas fluviais deram atuais da área, ocorrem aluviões Holocêni-
lugar a extensos sistemas de lagos rasos e cos (Figura 2).
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 27
Conformação Superficial das Paisagens No interior da RDSA, as formas são majo-
ritariamente compostas por modelados de
dissecação (65% da área da RDSA, conf.
Geomorfologia e relevo
Figura 3), cujo relevo consiste de formas
de topos tabulares, conformando feições
O território do estado do Amazonas é com- de rampas suavemente inclinadas e lom-
partimentado em nove domínios geomor- bas esculpidas em coberturas sedimenta-
fológicos: (i) Planície Amazônica; (ii) Tabu- res inconsolidadas, denotando um eventual
leiros da Amazônia Centro-Ocidental; (iii) controle estrutural (BARBOSA et al., 1978).
Domínio Colinoso da Amazônia Ocidental; De acordo com a análise do Modelo Digital
(iv) Baixos Platôs da Amazônia Centro-O- de Elevação, derivado dos dados da missão
riental; (v) Superfícies Aplainadas do Nor- de radar orbital SRTM (Shuttle Radar To-
te da Amazônia; (vi) Planalto Residual do pography Mission/SRTM-DEM), esses to-
Norte da Amazônia; (vii) Planalto do Di- pos tabulares possuem baixa amplitude de
visor Amazonas-Orenoco; (viii) Superfí- relevo, geralmente menor que 15 metros. A
cies Aplainadas do Sul da Amazônia e (ix) extensão espacial e as dimensões dos topos
Planaltos Dissecados do Sul da Amazônia tabulares, aliadas ao baixo grau de incisão
(DANTAS e MAIA, 2010). da drenagem, indicam que a região passou
por um processo de aplainamento anterior
Segundo o mapeamento geomorfológico a instalação da drenagem atual. Com o fraco
realizado pelo Serviço Geológico do Brasil retrabalhamento hidrológico recente, ori-
(CPRM, 2007), cerca de 81% do território da ginaram-se os interflúvios tabulares atuais,
RDSA é constituído pelo domínio dos Tabu- que equivalem a uma fase inicial de disseca-
leiros da Amazônia Centro-Ocidental, deno- ção desses relevos aplainados, cuja idade é
minado em trabalhos anteriores (e.g. Projeto de difícil determinação, sendo, porém, ad-
RADAMBRASIL) como Planalto Rebaixado mitida a do Pleistoceno Tardio (BARBOSA et
da Amazônia Ocidental. Nessa região, esse al.,1978).
domínio é totalmente representado pela
unidade geomorfológica classificada por De- Os modelados de aplainamento constituem
pressão do Solimões – Unini (IBGE, 2009). uma segunda categoria de modelado
28 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
superficial dos tabuleiros interfluviais. fluviais (55%) ocorrem na porção oeste
Cobrindo 12% da área superficial da RDSA, da RSDA e são parte da ampla planície
restringem-se à porção mais ao norte, de inundação do rio Solimões, que nessa
cruzando toda sua extensão no sentido leste- região atinge cerca de 50 km de largura. Tais
oeste. São representados por pediplanos formas de relevo consistem nas majoritárias
formados durante fases sucessivas de zonas deposicionais ativas da Amazônia,
retomada dos processos de erosão, gerando excetuando-se as pequenas e isoladas
sistemas de planos inclinados, às vezes regiões interfluviais, com deposição
levemente côncavos. Na maioria dos casos, lenta de material fino (e.g. playas). Essas
essas formas encontram-se inumadas planícies aluviais, normalmente recobertas
por coberturas detríticas e/ou mantos de por vegetação de igapó e matas de várzea
alteração (BARBOSA et al., 1978). Muito adaptadas a ambientes inundáveis, são
embora tenham ocorrido comprovados compostas por depósitos sedimentares
paleoclimas mais secos na Amazônia atuais ou subatuais, sendo os terraços
durante o Quaternário (DANTAS e MAIA, fluviais correlatos ao Pleistoceno Superior,
2010), é inegável a marcante influência e as planícies de inundação, ao Holoceno
do intemperismo químico em ambiente (DANTAS e MAIA, 2010).
quente e úmido sobre os relevos da região.
Disso implica que dificilmente poderia-se Através da análise do SRTM-DEM, é possível
explicar a evolução geomorfológica da área observar que há um gradiente altitudinal
evocando, apenas, a geração de pediplanos geral de direção W-E na RDSA, formando
em clima semiúmido (DANTAS e MAIA, um declive geral muito suave, desde cerca de
2010). Portanto, pode-se sugerir um 80 metros acima do nível do mar (m.a.n.m.),
predomínio de processos de etchplanação na região NW, até cerca de 50 m.a.n.m. no
(BÜDEL, 1982), com o rebaixamento extremo leste da área (Figura 4). Portanto,
progressivo do relevo da região, por um desnível de 30 metros que se estende
meio da lenta denudação das superfícies por 230 quilômetros. É possível identificar
de aplainamento, condicionada por três distintos patamares: (1) do ponto A até
progressivo rebaixamento do nível de base. o rio Braquinho, cujas altitudes situam-se
em torno dos 70 m.a.n.m.; (2) deste rio até
Por fim, a terceira categoria de modelado o rio Arara, em média 5-10 metros abaixo;
encontrado nas formas de topos tabulares e (3) a partir daí, em um declive mais
da RDSA, constitui-se de modelados de acentuado, até as planícies de inundação
acumulação interfluviais (21% da RDSA). do rio Unini. Observa-se também, com
São definidos por planos convergentes auxílio de interpretação visual de imagens
abaciados (côncavos) de composição de sensores orbitais óticos (e.g. Landsat 5/
arenosa e/ou argilosa em posição TM, Landsat 8/OLI), que não há um divisor
interfluvial e sujeitos a inundações. Essas de drenagem preciso entre os rios que se
áreas podem apresentar arreismo ou dirigem para o rio Negro e os que se dirigem
impedimento de drenagem, devido ao para o rio Solimões. Os afluentes da margem
terreno depressivo, com lagoas fechadas direita do rio Negro são mais longos que
ou precariamente incorporadas à rede de os da margem esquerda do rio Solimões.
drenagem. São interpretadas por Barbosa O mapeamento geomorfológico efetuado
et al. (1978) como playas e sugerem zonas pelo Projeto RADAMBRASIL indicou que
de antiga deposição, que hoje são cobertas a área foi afetada por basculamentos que
por vegetação de formações pioneiras ou deslocaram os rios para NW e criaram uma
campinas/campinaranas, onde domina assimetria, tanto de margens como das
a vegetação de gramíneas. As gramíneas bacias dos rios Negro e Solimões, sugerindo
costumam dominar o interior dessas áreas, que movimentos de báscula originados de
mas o estrato arbustivo avança sobre elas processos de neotectônica também atuaram
e o arbóreo sobre o arbustivo, das bordas na área no sentido de inclinar regionalmente
para o interior, com espécies de palmeiras o terreno em direção ao rio Negro. A partir
colonizando primeiro as áreas arbustivas, das áreas de paleovárzea onde localiza-se
seguidas por árvores copadas (BARBOSA et o lago Amanã, a leste, a rede de drenagem
al., 1978). dirige-se para a Bacia do Rio Negro.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 29
Figura 4 - Mapa hipsométrico da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá.
A região do lago Amanã e de seus tributários realizados em 2002 pelo Dr. Georg Irion
situa-se em posição topograficamente concluiram que pode haver ao menos duas
intermediária com relação às porções gerações de paleovárzeas nos arredores do
centro-leste da RDSA e às várzeas atuais, lago Amanã (IRION et al., 2010).
a oeste (ver Figura 4). Essa região está
delimitada pelo curso superior do rio Piorini O lago Amanã mostra margens recurvadas
e por seu prolongamento para noroeste, semelhantes a arcos de praia, que, pela
constituindo um marcado alinhamento grande extensão superfícial de seu espelho
hipsométrico, claramente visível no SRTM- d’água, possibilita a formação de ondas que
DEM. Para oeste desta quebra de relevo, e em ocasionam trabalho de abrasão semelhante
direção às várzeas do rio Solimões, situa- àqueles que se verifica em zonas litorâneas
se o que é reconhecido como paleovárzea (BARBOSA et al., 1978). Esse mecanismo
(IRION, 1976). A região apresenta formas contribui para acentuar os recurvamentos
deposicionais típicas das atuais várzeas, das margens, configurando as praias.
mas com suas feições levemente suavizadas
e posicionadas cerca de 15-20 metros acima Mesmo fora da atual planície de inundação
das altitudes das atuais várzeas. São visíveis ativa, o lago Amanã se conecta aos rios
sucessivas cristas lineares, por vezes Solimões e Japurá através de furos e
recurvadas, entremeadas por depressões paranás. Nas épocas da enchente e da
que resultaram de processos deposicionais cheia, esses canais, que em outros períodos
fluviais rítmicos. Essas paleovárzeas são dão vazão para o lago, passam a correr
estimadas como sendo do Pleistonceno em sentido contrário, levando as águas
Tardio, formadas durante o último período dos rios e os seus sedimentos para dentro.
interglacial, o Sangamoniano (75 – 125 A influência desse processo através do
mil anos A.P) (IRION et al., 2010). Embora sistema de furos e paranás é evidenciada
ainda não se tenha conhecimento de pela progressão de zonas de colmatagem
descrições de perfis sedimentares que em sua foz, formando depósitos de deltas
permitam estimativas de idade precisa internos no lago. Esses depósitos deltáicos,
destas paleovárzeas, trabalhos de campo por sua configuração alongada, atuam
30 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
no sentido de isolar pequenas porções formava com este um corpo hídrico
do corpo principal do lago Amanã. Esse unificado. Com a evolução deste processo,
processo ocorre a cada cheia, havendo o lago Urini tende a ser colmatado, dando
uma colmatagem progressiva. Registra-se,
ainda, o isolamento e a colmatagem do lago lugar a um furo que ligará o lago Amanã
Urini, disposto em ângulo de 90 graus em ao paraná Tambaqui e a um sistema de
relação ao lago Amanã, que, no passado, pequenos lagos marginais (Figura 5).
Figura 5 - Processo de colmatação do lago Urini de 1986 a 2015 por desenvolvimento de deltas internos.
Solos
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 31
Figura 6 - Distribuição das classes de solo no interior da RDSA.
De modo geral, os argissolos possuem perfis porção (< 50%) de cátions básicos trocáveis
bem desenvolvidos, de profundos a mediana- na maior parte do horizonte subsuperfícial.
mente profundos. Essa classe constitui-se de
solos minerais, não hidromórficos, que No interior destes, em maior proporção nas
tem como características diferenciais um áreas de paleovárzeas, e em menor propor-
horizonte B textural (Bt), com textura ção em meio ao ARGISSOLO AMARELO Alí-
franco-arenosa ou mais fina, onde houve tico, a noroeste, encontra-se o ESPODOS-
incremento de argila por migração verti- SOLO HUMILÚVICO Hidro-hiperespesso
cal (iluviação) imediatamente abaixo de (6,6% da RDSA). Os caracteres humilúvico
qualquer tipo de horizonte superficial, ex- e hidro-hiperespesso dizem respeito à pre-
ceto o hístico. São solos que variam de for- sença de horizonte B espódico após 200 cm
te a moderamente ácidos, de bem a mode- da superfície do solo, e permanecem satu-
radamente drenados, com saturação por rados com água em um ou mais horizontes
bases alta ou baixa, predominantemente dentro de 100 cm da superfície do solo, du-
cauliníticos e com relação molecular Ki rante algum tempo, na maioria dos anos (ou
variando de 1,0 a 2,3, em correlação com a são artificialmente drenados).
baixa atividade das argilas.
Os espodossolos são solos predominante-
Disposto em sentido leste-oeste, em uma mente arenosos, caracterizados por um ho-
faixa ao norte da RDSA, encontra-se o AR- rizonte B espódico, ou seja, com acumulação
GISSOLO AMARELO Alítico (23,6% da área), iluvial de matéria orgânica, e compostos de
que reflete o caráter crômico amarelado da alumínio, com presença ou não de ferro. Em
maior parte dos primeiros 100 cm do hori- geral, a estrutura do horizonte B espódico
zonte B desses solos, e mais de 50% do com- é maciça e pode se apresentar sob a forma
plexo de troca de cátions saturados pelo íon consolidada e de consistência extremamente
alumínio. O ARGISSOLO AMARELO Distrófi- dura, por conta da cimentação por matéria
co (35,1% da área) encontra-se entremeado orgânica ou ferro, denominado “orstein”.
em forma de manchas em meio ao ARGIS- São solos geralmente profundos, com acen-
SOLO AMARELO Alítico, cobrindo a maior tuado contraste de cor entre os horizontes,
parte da região definida como paleovárzea. apresentando reduzida fertilidade, forte-
O caráter distrófico diz respeito à baixa pro- mente ácidos. Devido à limitada drenagem
32 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
do horizonte espódico, há um encharca- de água estagnada no perfil por um período
mento temporário nos períodos de maio- ou o ano todo.
res precipitações. Paradoxalmente, esses
solos, pela textura arenosa e pela estrutura O NEOSSOLO FLÚVICO Ta Eutrófico perfaz
em grãos soltos, apresentam reduzida ca- 1,2% da área da RDSA e está restrito ao seu
pacidade de armazenamento de água. Por extremo oeste, nas planícies de inundação
conseguinte, a vegetação que cresce nesses do rio Solimões. Essa classe de solo com-
locais sofre períodos de estresse por defi- preende os solos minerais pouco desenvol-
ciência hídrica nos períodos de estiagem. vidos, apresentando pequena expressão dos
Possuem sérias restrições ao uso agrícola, processos pedogenéticos em consequência
condicionadas à sua textura arenosa, à fer- das características do próprio material, por
tilidade natural muito baixa e em função sua resistência ao intemperismo ou pela
da reduzida capacidade de reter água e nu- composição química, e ainda pelo relevo,
trientes, e, no caso do horizonte espódico condições que podem impedir ou limitar a
cimentado (“orstein”), há restrições pelo sua evolução. Os Neossolos Flúvicos estão
excesso de água, devido à drenagem defi- associados principalmente aos diques alu-
ciente do horizonte espódico. viais e às partes mais elevadas do interior da
várzea, enquanto os Gleissolos ocorrem na
Os Gleissolos perfazem cerca de 14,6% da parte mais interior e mais rebaixada da vár-
RDSA e estão restritos às planícies de inun- zea. Possuem argilas de alta atividade, e o
dação dos corpos hídricos principais que caráter eutrófico está associado ao proces-
drenam a RDSA e às áreas a oeste, nas pla- so de colmatagem de sedimentos ricos em
nícies de inundação do rio Solimões. A na- nutrientes do rio Solimões. São solos de ele-
tureza do material de origem, a posição na vada fertilidade natural, entretanto, apre-
paisagem (pequena diferença de cota em re- sentam sérias restrições às culturas perenes
lação ao nível das águas no período seco), as e à silvicultura, devido, principalmente, ao
condições restritas de drenagem e as inun- alagamento durante longos períodos.
dações periódicas a que estão sujeitos esses
solos resultam em reduzida taxa de intem- Os Plintossolos são solos minerais que
perismo, sendo, por isso, os solos mais no- apresentam horizonte plíntico, ou seja, ho-
vos da paisagem. O GLEISSOLO HÁPLICO Tb
rizonte mineral de espessura igual ou maior
Distrófico (6,4% da área) possui argilas de
que 15 cm, caracterizado pela presença de
baixa atividade (< 27 cmolc/kg de argila) e
plintita em quantidade igual ou superior
baixa saturação por bases (< 50%) na maior
a 15% por volume de solo. Os Plintossolos,
parte dos primeiros 120 cm do perfil a partir
normalmente, são encontrados em áreas
da superfície do solo, e dizem respeito aos
deprimidas, planícies aluvionais e terços
solos formados nas planícies de inundação
inferiores de encosta, situações que impli-
da rede de drenagem da RDSA. O GLEISSO-
cam reduzida drenagem. Dentro da RDSA,
LO HÁPLICO Ta Eutrófico (8,2% da área),
localizam-se nas áreas de tabuleiros inte-
por outro lado, possui argilas de alta ativi-
fluviais e em uma mancha isolada entre os
dade (≥ 27 cmolc/kg de argila) e alta satura-
lagos Amanã e Urini. Estão representados
ção por bases (≥ 50%).
pela classe PLINTOSSOLO ARGILÚVICO Alí-
tico e perfazem cerca de 9,6% da área da
Os Gleissolos são solos hidromórficos cons- Reserva. O caráter argilúvico diz respeito ao
tituídos por material mineral, que apresen- horizonte B textural, coincidindo com o ho-
tam horizonte glei dentro de 150 cm da su- rizonte plíntico.
perfície, imediatamente abaixo de horizon-
te A ou E (gleizados ou não), ou de horizonte
hístico com menos de 40 cm de espessura.
Não apresentam horizonte vértico ou ho-
rizonte B textural com mudança textural Conformação das Paisagens e Ocupação
abrupta acima ou coincidente com hori- Humana
zonte glei, tampouco qualquer outro tipo de
horizonte B diagnóstico acima do mesmo. O A descrição da dinâmica de alguns elemen-
horizonte plíntico, quando presente, deve tos abióticos do meio físico da RDSA, além
estar a uma profundidade superior a 100 de propor um cenário sobre a conformação
cm da superfície do solo. O horizonte glei é da paisagem natural, pode, a partir das lo-
um horizonte mineral, C, B, E ou A, subsu- calidades de uso e ocupação do território
perficial ou eventualmente superficial, ca- pelas comunidades locais da UC, fornecer
racterizado por condições anaeróbicas com subsídios para compreensão da atual paisa-
consequente redução do íon férrico para o gem geográfica. Esse conceito de paisagem,
íon ferroso - no processo denominado glei- segundo Corrêa e Rosendahl (1998), é visto
zação - devido, principalmente, à presença por Sauer, como:
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 33
[...] um conjunto de formas naturais
e culturais associadas em uma dada
área, é analisada morfologicamen-
te, vendo-se a integração das formas
entre si e o caráter orgânico ou quase
orgânico delas. O tempo é uma variá-
vel fundamental. A paisagem cultural
ou geográfica resulta da ação, ao lon-
go do tempo, da cultura sobre a paisa-
gem natural. (CORRÊA e ROSENDAHL,
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34 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
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36 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
© Caetano Franco
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 37
© Bruno Kelly
38 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
VARIAÇÃO
FLORÍSTICA DO
COMPONENTE
ARBÓREO DE TRÊS
FITOFISIONOMIAS
M a r i a n a Te r r ô l a M a r t i n s Fe r r e i r a
Au r i s t e l a d o s S a n t o s C o n s e r v a
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 39
VARIAÇÃO FLORÍSTICA
DO COMPONENTE
ARBÓREO DE TRÊS
FITOFISIONOMIAS
M a r i a n a Te r rô l a M a r t i n s Fe r re i ra
Au r i s t e l a d o s S a n t o s C o n s e r v a
40 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Reserva são ainda pouco ou nada conhecidas tribuídas igualmente - duas parcelas - para
em relação à sua vegetação e à flora asso- cada fitofisionomia (Terra firme, Várzea e
ciada. Dados sobre a composição florística e Paleovárzea). As parcelas foram subdividi-
estrutural da Reserva podem ser encontra- das em 16 quadrados contínuos de 25 por
dos em Ayres (1993), Souza (2006), Inuma 25 m, nos quais todos os indivíduos arbó-
(2007), Rodrigues (2007), Stadtler (2007), reos maiores ou iguais a 10 cm de diâmetro
Guterres et al. (2008), Machado (2010) e Oli- à altura do peito (DAP) foram mensurados
veira (2010). Estes estudos somam um total com fita diamétrica. Todos os indivíduos
de 11,50 hectares inventariados, sendo 5,75 inventariados tiveram o tronco marcado
hectares de Terra Firme, 4,69 hectares de com tinta permanente na altura de medição
Paleovárzea e 1,06 hectares de Várzea. Não e receberam uma placa de identificação in-
há relatos de estudos nas fitofisionomias de dividualizada numerada.
campinaranas, bem como nas Áreas Eco-
tonais de Tensão Ecológica da Reserva, ou Um indivíduo de cada fitofisionomia, em
seja, áreas nas quais diferentes comunidades cada classe diamétrica de 1 centímetro (p.e.
ecológicas entram em contato, sendo essas 10, 11, 12...) foi escolhido arbitrariamente,
potencialmente indicadoras de respostas a tendo aferida sua altura com auxílio do cli-
mudanças climáticas e reguladoras de fluxos nômetro. Além desses, todas as palmeiras e
nos ambientes, além de serem importan- demais árvores com mais de 50 cm de DAP
tes para compreensão dos mecanismos que tiveram também sua altura mensurada.
moldam a biogeografia dos organismos.
Foram coletados ramos férteis ou estéreis
Este trabalho objetiva ampliar o conhe- de pelo menos um exemplar de cada morfo-
cimento sobre as formações florestais na tipo para posterior identificação (exemplo
RDSA, enfocando as diferenças e semelhan- na Figura 7 e Figura 13). As identificações
ças estruturais e florísticas do componente foram realizadas no Instituto de Desenvol-
arbóreo entre as três principais fitofisiono- vimento Sustentável Mamirauá (IDSM), em
mias de ocorrência na RDSA. Tefé, valendo-se de método comparativo,
com utilização de imagens de exsicatas dis-
poníveis em sites de herbários e por compa-
ração a exemplares pertencentes ao Her-
bário Emílio Goeldi /Museu Paraense Emí-
Procedimentos Metodológicos lio Goeldi, Belém - Pará. As coletas férteis
foram depositadas no Acervo Botânico do
Foram inventariadas seis parcelas de áreas Instituto de Desenvolvimento Sustentável
medindo 1 hectare cada (50 por 200 m), dis- Mamirauá, e os exemplares estéreis com-
tando, no mínimo, 800 metros entre si, dis- põem o folhiario de coleta de cada parcela.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 41
Resultados inserida na categoria Vulnerável (A4cd)
(MARTINELLI e MORAES, 2013), possuindo
Ao todo, foram inventariados 3.706 indiví- uso madeireiro e farmacêutico (Figura 9).
duos maiores ou iguais a 10 cm de diâme- A espécie Pterocarpus santalinoides L’Hér.
tro, distribuídos em 410 espécies perten- ex DC. (Fabaceae), apesar de não ser con-
centes a 54 famílias (Figura 8). siderada ameaçada, é citada na Lista Ver-
melha da Flora do Brasil (MARTINELLI e
Das espécies inventariadas nas três fito- MORAES, 2013), considerada de interesse
fisionomias, apenas a Virola surinamensis para a atividade de pesquisa e para fins de
(Rol. ex Rottb.) Warb. - Ucuuba (Myristica- conservação devido ao uso do látex para o
ceae) é considerada ameaçada de extinção, beneficiamento da borracha.
1.404
1.400
Número de ocorrências
1.200 1.171
1.131
1.000
800
600
400
Indivíduos
213
200
Espécies
101 96
42 35 32
0
Famílias
Terra Firme Várzea Baixa Paleo-várzea
Ambientes amostrados
42 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
As três fitofisionomias inventariadas 43 m. As cinco espécies com maior Índice de
apresentaram baixíssima similaridade Valor de Importância (IVI) foram Eschweilera
florística, no entanto, as espécies naturais tessmannii R. Knuth, Iryanthera juruensis
das florestas inundáveis apresentaram mais Warb., Swartzia laurifolia Benth., Eschweilera
semelhanças entre si quando comparadas coriacea (DC.) S.A. Mori e Hydrochorea
às florestas de terra firme. Essas últimas, corymbosa (Rich.) Barneby & J.W. Grimes. As
por sua vez, apresentaram a maior riqueza três famílias mais importantes abrangeram
de espécies, registrando-se 1.171 indivíduos as cinco espécies de maior IVI, a saber:
distribuídos entre 213 espécies pertencentes Fabaceae, Lecythidaceae e Myristicaceae,
a 42 famílias, com altura média de 20,33 m, e destacando-se, em seguida, Euphorbiaceae,
indivíduos emergentes podendo atingir até Burseraceae e Sapotaceae.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 43
Figura 12 - Plantula de Eschweilera ovalifolia recém germinadas.
44 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
variando de 29,67 a 1,70 m, respectivamen- amostrados 152 indivíduos de Euterpe
te. Destaca-se, nestas florestas, o elevado precatoria e 30 indivíduos de Goupia glabra.
número de árvores inclinadas ou caídas e Observou-se marcas de extração de látex
com troncos múltiplos. O indivíduo de maior na casca dos indivíduos inventariados de
DAP foi Calophyllum brasiliense – Jacareúba Hevea pauciflora (Spruce ex Benth.) Müll.
(Clusiaceae), com 78,9 cm, enquanto que a Arg. – Seringueira. As seis famílias de maior
média diamétrica das comunidades amos- importância foram Fabaceae, Lecythidaceae,
tradas foi de 18,25 cm. Apocynaceae, Euphorbiaceae, Arecaceae e
Chrysobalanaceae.
As florestas de paleovárzea totalizaram 1.131
indivíduos distribuídos em 96 espécies, por
Estruturalmente, as florestas de paleovár-
sua vez, pertencentes a 32 famílias. A cota de
zea apresentaram alturas com variação de
inundação das áreas inventariadas no ano
32,91 a 8,08 metros, sendo a altura média de
de 2014 foi de 2 metros de altura. As cinco
espécies de maior IVI foram Eschweilera 20,76 metros. O indivíduo de maior DAP foi
coriacea (DC.) S.A. Mori, Euterpe precatoria Taralea oppositifolia – Cumaru (Fabaceae),
Mart., Lecointea amazonica Ducke, Sterculia com 90,9 cm de diâmetro, enquanto que a
pruriens (Aubl.) K. Schum. e Eschweilera média diamétrica encontrada para as co-
ovalifolia (DC.) Nied (ver Figuras 10, 11 e 12). munidades inventariadas foi de 19,17 cm. O
Assis et al. (2015) consideram a ocorrência Quadro 1 apresenta uma síntese dos princi-
dos gêneros Euterpe, Dypterex e Goupia como pais resultados obtidos com os levantamen-
importantes indicativos da fitofisionomia tos florísticos e estruturais, e o Apêndice 1
de paleovárzea. No presente estudo, foram corresponde à listagem florística da RDSA.
CRITÉRIOS DE RESULTADOS
AMOSTRAGEM
E PARÂMETROS Floresta de Floresta de Floresta de
Terra Firme Várzea Baixa Paleovárzea
FITOSSOCIOLÓGICOS
Índice de Diversidade
4,29 3,72 3,61
de Shannon (H’)
Espécies
Ameaçadas de Pterocarpus
Virola surinamensis -
Extinção ou santalinoides
Presumivelmente
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 45
46 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
© Everson Tavares
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 47
Considerações Finais
48 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
REFERÊNCIAS
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SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 49
© Aline Fidelix
50 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
AS ABELHAS NATIVAS “SEM-
FERRÃO” (HYMENOPTERA,
ANTHOPHILA, MELIPONINI)
E SUA IMPORTÂNCIA PARA A
CONSERVAÇÃO AMBIENTAL
Fa v í z i a F r e i t a s d e O l i v e i r a
B á r b a r a Ta d z i a Tr a u t m a n R i c h e r s
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 51
AS ABELHAS NATIVAS “SEM-
FERRÃO” (HYMENOPTERA,
ANTHOPHILA, MELIPONINI)
E SUA IMPORTÂNCIA PARA A
CONSERVAÇÃO AMBIENTAL
Fa v í z i a F re i t a s d e O l i v e i ra
B á r b a ra Ta d z i a Tra u t m a n R i c h e r s
52 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
cerca de 90 formas não descritas (prováveis mente, de forma medicinal, no combate a
espécies novas para a ciência), distribuídas diferentes enfermidades, como as doenças
em 29 gêneros (PEDRO, 2014), dois deles pulmonares, infecções dos olhos e para a
com ocorrência registrada exclusivamente falta de apetite (SOUZA et al.et al., 2004),
no Brasil até o momento - Friesella Moure, assim como em rituais religiosos. Além do
1946 e Trichotrigona Camargo e Moure, 1983. mel, a cera e as larvas das abelhas também
são aproveitadas pelos ribeirinhos; a pri-
Embora cerca de 88% dos táxons dos Me- meira para a utilização em cartuchos de es-
liponini Neotropicais ocorram no Brasil, a pingardas de caça, e a segunda no preparo
diversidade de espécies de abelhas, no ge- de iscas para a pesca (OLIVEIRA et al.et al.,
ral, ainda é extremamente subamostrada, 2013). No entanto, a extração tradicional do
pois os estudos e levantamentos tendem mel e de seus derivados pelos “meleiros”
a se concentrar em algumas regiões (Sul e pode ser predatória, se não tomados os de-
Sudeste, principalmente), deixando impor- vidos cuidados com a manutenção da col-
tantes lacunas amostrais, especialmente na meia explorada.
Região Norte e no Centro-Oeste do país, ao
longo dos biomas de Floresta Amazônica e Quando as colmeias são abertas sem cuida-
no Pantanal. dos apropriados, a colônia acaba morrendo
porque os favos de cria são destruídos, a cera
Os meliponíneos formam um grupo de abe- é retirada e os potes são espremidos com as
lhas eussociais, sem ferrão, que constroem mãos para a extração do mel. As chances de
colônias perenes, com divisão de castas e uma colmeia explorada dessa forma sobre-
trabalho, com sobreposição de gerações. viver são praticamente nulas, pois além da
Essas características especiais favorecem o destruição da estrutura interna do ninho,
manejo para a produção de mel, de própo- ainda pode ocorrer o ataque de formigas e
lis (ainda em potencial), do geoprópolis, da forídeos que a dizimam por completo (OLI-
cera e do pólen (ou saburá) - atividade essa VEIRA et al., 2013). Mesmo as colmeias que
conhecida como meliponicultura -, bem não chegam a ser totalmente destruídas
como para a multiplicação das colônias, vi- ficam expostas e suscetíveis ao ataque de
sando o aumento da produção dos deriva- predadores devido à abertura no fuste da
dos anteriormente citados, a reintrodução árvore. (BRILHANTE e MITOSO, 2002).
em áreas degradadas ou ainda a polinização
dirigida de espécies vegetais de interesse Da mesma forma, como mencionado por
econômico. Estas práticas têm contribuído Oliveira et al. (2013), a extração de mel sem
para ampliar o conhecimento sobre a biodi- os cuidados necessários resulta em um pro-
versidade de abelhas, sobre os hábitos das duto de baixa qualidade, devido ao contato
abelhas sem ferrão, e, consequentemente, com os resíduos da colmeia, pela conta-
para a sua conservação. minação por coliformes fecais e por outros
microrganismos que causam a fermentação
De uma forma mais geral, as principais indevida, dificultando a armazenagem e
espécies de Meliponíneos manejadas comprometendo o valor final da produção.
na região Neotropical pertencem aos
seguintes gêneros: Melipona Illiger, 1806; A meliponicultura ganhou considerável
Cephalotrigona Schwarz, 1940; Scaptotrigona evidência nos últimos 20 anos, em todas as
Moure, 1942; Tetragona Lepeletier & regiões do Brasil, com o crescente aumen-
Serville, 1828; Cortopassi-Laurino et al.et al. to de trabalhos científicos sobre a prática
(2006); Tetragonisca Moure, 1946, e Plebeia (CORTOPASSI-LAURINO e MACEDO, 1998;
Schwarz, 1938. KERR et al., 2001; VENTURIERI, 2008; LO-
PES et al., 2005). A atividade propõe a extra-
ção “ecologicamente correta” de colmeias
da mata e, principalmente, a recuperação
Meliponíneos Versus Humanos de enxames remanescentes de troncos ca-
ídos ou árvores mortas, garantindo, assim,
A relação entre os povos e as abelhas tem um número suficiente de colônias para dar
sido bastante estreita ao longo das gera- continuidade à criação, priorizando tam-
ções, e tal fato se verifica entre diversas bém a multiplicação sistemática das colô-
civilizações das Américas (AYALA, 1996; nias manejadas (visando a extração de mel,
NOGUEIRA-NETO, 1997). É sabido também própolis, pólen, etc.). Ou seja, com a meli-
que, há séculos, as populações ribeirinhas ponicultura, propõe-se a transformação de
amazônicas têm por hábito procurar por uma atividade extrativa pouco sustentável
colmeias de Meliponini nas matas, para o em uma criação planejada de abelhas nati-
consumo do mel, utilizando-o, principal- vas sem ferrão.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 53
No âmbito das Reservas de Desenvolvimen- As atividades de agricultura vêm sendo pro-
to Sustentável (RDSs), a criação de abelhas movidas pelo Instituto de Desenvolvimento
estimula a implementação e o manejo de Sustentável Mamirauá (IDSM) por meio de
sistemas agroflorestais diversificados, bus- programas de extensão desde o ano de 1994,
cando garantir um pasto apícola variado e quando foi criado o Núcleo de Agricultura,
florido ao longo de todo o ano. Ao mesmo que, em 2001, passa a se chamar Progra-
tempo, a localização do meliponário, dentro ma de Agricultura Familiar (PAF), sendo,
ou próximo aos sistemas agroflorestais, fa- no final de 2011, renomeado para Progra-
vorece a polinização e, com isso, a produção ma de Manejo de Agroecossistemas (PMA).
frutífera das espécies de interesse (OLIVEI- Ao longo desses quase 20 anos, pesquisas
RA et al., 2013). vêm sendo desenvolvidas sobre o tema com
o fim de gerar informações sobre os siste-
Levando-se em conta tais fatores, a capa- mas agrícolas tradicionais da Amazônia e
citação das populações ribeirinhas em me- subsidiar a assessoria técnica, voltada para
liponicultura constitui uma estratégia im- aumentar a sustentabilidade e a produtivi-
portante com intuito de reduzir a extração dade dos sistemas agrícolas, incluindo as
predatória e, consequentemente, já con- atividades realizadas na RDSA.
tribui para a multiplicação de colmeias na
região, visto que a coleta do mel enquanto O Programa de Manejo dos Agroecossiste-
atividade extrativa não garante a provi- mas (PMA), baseado em princípios da agro-
são periódica das famílias coletoras, nem a ecologia, estimula o manejo participativo de
conservação das populações de abelhas ex- recursos naturais próprios dos agroecossis-
ploradas, e nem tampouco das plantas e de temas, enfatizando, principalmente, o ma-
animais que dependem dos serviços de po- nejo sustentável do solo e da agrobiodiver-
linização da espécie. sidade (que envolve a vida presente no solo,
as espécies cultivadas, os polinizadores,
dispersores e espécies de “serviço”, etc.),
buscando também promover a organização
dos produtores para a comercialização e a
A Experiência da Reserva de conscientização ambiental e cidadã, ativi-
Desenvolvimento Sustentável Amanã (RDSA) dades estas que contribuem para os desíg-
nios de conservação.
Criada pelo governo do Estado do Amazo-
nas, em 1998, através do decreto 19.021/98, Nesse contexto, o programa de manejo e a
a Reserva de Desenvolvimento Sustentável criação de abelhas nativas “sem ferrão” são
Amanã (RDSA) se sobressai nessa categoria, parte da estratégia do PMA para efetivar a
como uma das mais importantes do esta- diversificação produtiva, promovendo o
do e do Brasil. Localizada entre o rio Negro manejo sustentável de recursos da agrobio-
e o baixo curso do rio Japurá, perfazendo diversidade, gerando renda aos produtores
2.313.000 ha, abrange terras pertencentes e assegurando a conservação da biodiver-
aos municípios de Maraã, Coari, Barcelos sidade (colaborando para a manutenção do
e Codajás, sendo uma das maiores áreas processo de polinização das florestas nati-
protegidas da América do Sul, hospedando vas) ao reduzir a pressão sobre as popula-
vasta biodiversidade, abrangendo florestas ções de abelhas das matas, as quais, sem o
de várzea (área periodicamente alagada por manejo, têm suas colmeias destruídas para
águas brancas), de igapó (área periodica- a retirada de mel, larvas e cera.
mente alagada por águas pretas) e de terra
firme, ou paleovárzea, já que são eventual- A coleta de mel em ninhos, comumente en-
mente alagáveis, conforme a intensidade da contrados em roçados, igapós e rotas de caça,
cheia. Uma descrição detalhada da Reserva é é uma atividade tradicional que vem sendo
fornecida por Oliveira et al. (2013), incluin- pratica pelas populações ribeirinhas da re-
do sua fitofisionomia e aspectos biológicos. gião do médio Solimões ao longo do tem-
po (OLIVEIRA et al., 2013). Embora algumas
Os moradores tradicionais que vivem na tentativas pontuais de incentivo ao manejo
região dessa UC são estimulados a perma- de abelhas nativas tenham sido desenvolvi-
necerem no território protegido e a cola- das anteriormente na região, apenas a partir
borarem ativamente na conservação da de 2009 foi iniciado um trabalho sistemá-
biodiversidade local. Assim, as populações tico com a meliponicultura entre os mora-
humanas que habitam os domínios da RDSA dores das RDSA, por meio da promoção de
recebem incentivo do IDSM para desenvol- capacitações multimodulares e da assessoria
ver suas atividades produtivas tradicionais, técnica contínua (OLIVEIRA et al., 2013). Es-
adequando-se aos critérios e práticas sus- tima-se que na região da RDSA cada produ-
tentáveis de uso dos recursos naturais. tor - que hoje é um meliponicultor - retira
54 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
em média, pelo menos, dois ninhos por ano “sem ferrão”, do PMA-IDSM, cujos resul-
do ambiente natural, sendo que atualmente tados mais relevantes são nele compilados,
ele mesmo recupera os enxames ameaçados, apresentados e discutidos.
multiplicando suas colônias no próprio me-
liponário (OLIVEIRA et al., 2013).
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 55
famílias ribeirinhas, abrangendo indivíduos réplicas doadas às coleções de invertebrados
visitantes dos florais de fruteiras e de outras do INPA, BIOSIS (UFBA) e do MHNBA
plantas por elas cultivadas. (MZUFBA), como forma de preservação dos
conhecimentos adquiridos para a realização
Uma vez localizadas, as colônias naturais de pesquisas futuras.
foram georreferenciadas, e, no caso das
caixas artificiais, os dados foram registrados
por unidade produtora (constando a
identificação do meliponicultor, o número Resultados e Discussões
das caixas, o local do ninho, a caracterização
de colônia mãe ou filha, etc.). Com o auxílio Através das atividades realizadas para a
de redes entomológicas, alguns exemplares elaboração do “Guia Ilustrado das Abelhas
de cada uma das espécies encontradas ‘Sem-Ferrão’ das Reservas Amanã e Ma-
foram coletados na entrada das colônias mirauá”, foram inventariadas 34 espécies
para subsequente identificação. Sempre de meliponíneos nas áreas das duas Reser-
que possível, quando o substrato de vas, RDSA e RDSM. Entre essas espécies,
nidificação constituía um vegetal vivo, oito correspondem a Melipona, gênero que
foram amostradas peças férteis (compostas reúne as únicas espécies criadas por meli-
de folhas, frutos ou ramos floridos). Os ponicultores da RDSA e da RDSM (seis no
ramos foram prensados no campo, num total). Isso significa que somente 17,7% das
total de três exsicatas para cada espécie, espécies amostradas são de fato manejadas
e encaminhados ao herbário do IDSM. na meliponicultura local, devido, principal-
Na impossibilidade de coleta, foram mente, à sua maior capacidade de produção
fotografados para posterior identificação. de mel (Quadro 2).
Coletou-se ainda amostras de plantas em
floração, especialmente anteras, e de pólen,
Observa-se ainda que 62,5% das espécies
extraídos dos ninhos amostrados e do corpo
de Melipona criadas pertencem ao subgê-
das abelhas, com o intuito de confeccionar
nero Melipona (Michmelia) Moure, 1975,
uma palinoteca de referência para estudos
representado por abelhas maiores, mais
posteriores e identificações polínicas.
robustas, que habitam ninhos mais popu-
losos, o que demonstra a preferência por
O material coletado foi montado em espécies com essas características e que
alfinetes entomológicos, de acordo com apresentam maior potencial meliponícola
a metodologia padrão de preparação (Figura 14 e Quadro 2).
de insetos para estudos científicos, e
encaminhado ao Laboratório de Bionomia,
Esse primeiro diagnóstico revela, portanto,
Biogeografia e Sistemática de Insetos
o baixo aproveitamento das espécies locais,
(BIOSIS) da Universidade Federal da Bahia
não apenas para obtenção dos “produtos das
(UFBA), onde empreendeu-se o estudo
abelhas”, como também para o incremento
morfológico dos espécimes coletados, com
da polinização dos pomares cultivados por
auxílio de microscópio estereoscópico Leica
moradores das comunidades locais. Esses
M165C, acoplado a uma câmera Digital
dados são significativos, pois muitas frutei-
Leica DFC295, e a análise do material, por
ras importantes para as populações da área
meio do software Leica Application Suite V4.1
são polinizadas exclusivamente (a exemplo
Interactive Measurements, Montage. Assim,
do cupuaçu, Theobroma grandiflorum (Willd.
exemplares de cada espécie foram estudados
ex Spreng.) Schum, Sterculiaceae (GRIBEL
com base nas descrições originais e em
et al., 2008) ou em grande parte (a exemplo
diversos estudos taxonômicos de diferentes
do açaí, Euterpe precatoria Mart., Arecaceae)
autores, a depender de cada espécie
por abelhas menores de diferentes gêneros.
em particular, a exemplo de Camargo,
Cockerell, Ducke, Moure e Schwarz (e seus
colaboradores), entre outros (cf. referências
bibliográficas, ao final), tendo sido os insetos
comparados também com representantes
da mesma espécie catalogada nas Coleções
Entomológicas do Instituto Nacional de
Pesquisas da Amazônia (INPA), BIOSIS
(UFBA) e do Museu de História Natural da
UFBA (MHNBA-MZUFBA). Exemplares de
cada espécie coletada foram fotografados
para compor o Guia (OLIVEIRA et al.,
2013) e todo o material foi depositado na
Coleção Entomológica do IDSM, sendo as
56 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Figura 14 - Gráfico de representatividade dos subgêneros de Melipona Illiger, 1806, amostrados
nas RDS’s Amanã e Mamirauá, Amazonas, Brasil.
n=5 (62,5%)
Número de espécies
5
por subgênero
n=2 (25%)
n=1 (12,5%)
0 Série 1
Entre os outros gêneros de meliponídeos 2); Plebeia Schwarz, 1938 (n= 1); Ptilotrigona
amostrados, que apresentam abelhas Moure, 1951 (n= 1); Scaura Schwarz, 1938
menores e de menor potencial para produção (n= 2); Tetragona Lepeletier & Serville, 1828
de mel foram computadas 26 espécies (n= 2); Trigona Jurine, 1807 (n= 8); Trigonisca
distribuídas em 14 gêneros, todas coletadas Moure, 1950 (n= 2) (Quadro 2; Figura 15).
em ninhos naturais na mata, quer em troncos
retirados das árvores pelos meliponicultores,
As espécies Frieseomelitta trichocerata Moure,
em moirões de cercas, esteios de casas, quer
visitando flores ou em voo: Aparatrigona 1988 e Cephalotrigona capitata Smith, 1854, são
Moure, 1951 (n=1); Cephalotrigona Schwarz, as únicas, entre abelhas coletadas em ambas
1940 (n=2); Dolichotrigona Moure, 1950 as RDSs, que foram observadas somente em
(n=1); Frieseomelitta Ihering, 1912 (n=1); criatórios de colmeias racionais, pertencentes
Lestrimelitta Friese, 1903 (n=1); Nannotrigona a um único meliponicultor, morador, no
Cockerell, 1922 (n=1); Paratrigona Schwarz, entanto, de localidade situada fora da área das
1938 (n= 1); Partamona Schwarz, 1939 (n= Reservas, na Missão do Lago Tefé.
Quadro 2 - Espécies coletadas para elaboração do “Guia Ilustrado das Abelhas ‘Sem-Ferrão’ das
Reservas Amanã e Mamirauá, Amazonas, Brasil (Hymenoptera, Apidae, Meliponini)”.
CONTINUA...
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 57
Quadro 2 - (Continuação)
CONTINUA...
58 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Quadro 2 - (Continuação)
8% 6% 8%
24%
23%
2% 2%
2%
8%6% 2%
2% 23%
6%
6%
6%
Melipona
Cephalotrigona Illiger, 1806
Schwarz, 1940 Tetragona
Trigona Jurine,Lepeletier
1807 & Serville, 1828
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 59
Figura 16 - Gráfico de representatividade da apifauna de Meliponini em número de espécies
amostradas nas RDS’s Amanã e Mamirauá, Amazonas, Brasil.
n = 4; 12%
n = 4; 12%
é nova para a ciência. Assim sendo, essas dados foram obtidos através da literatu-
informações foram atualizadas no Quadro ra especializada ou pela observação dos
2, complementando os dados apresentados ninhos localizados. No livro, foi provida
por Oliveira et al. (2013), com descrições também uma chave para identificação das
completas das espécies de Scaura coletadas espécies que ocorrem em ambas as RDSs.
nas RDSA e RDSM, que auxiliaram na nova
interpretação da espécie Scaura latitarsis
(FRIESE, 1900).
60 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Figura 17 - Espécies de abelhas do gênero Melipona Illiger, 1806 - coletas exclusivas na Reserva de
Desenvolvimento Sustentável Amanã (RDSA).
1 2
3 4
5 6
1, 2 e 5 3, 4 e 6 1e3
Melipona (Eomelipona) Melipona (Michmelia) Vista frontal
illustris Schwarz, 1932; seminigra aff Merrillae da cabeça;
Cockerell, 1919;
2e4 5e6
Corpo em vista/ Vista dorsal do
perfil lateral; mesossoma (tórax).
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 61
Figura 18 - Espécies de abelhas do gênero Trigona Jurine, 1807 - coletas exclusivas na Reserva de
Desenvolvimento Sustentável Amanã (RDSA).
7 8
9 10
11 12
7, 8 e 11 9, 10 e 12 7e9
Trigona amazonensis Trigona dallatorreana Vista frontal
(Ducke, 1916); Friese, 1900. da cabeça;
8 e 10 11 e 12
Corpo em vista/ Vista dorsal do
perfil lateral; mesossoma (tórax).
62 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Figura 19 - Espécies de abelhas do gênero Trigona Jurine, 1807 - coletadas exclusivamente na
Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã (RDSA).
13 14
15 16
17 18
13, 14 e 17 15, 16 e 18 13 e 15
Trigonapallens Trigona recursa Vista frontal
Fabricius, 1798; Smith, 1863; da cabeça;
14 e 16 17 e 18
Corpo em vista/ Vista dorsal do
perfil lateral; mesossoma (tórax).
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 63
Embora as coletas para esse trabalho Considerações Finais
tenham sido esporádicas, valendo-se
de uma metodologia pouco especializa- Já é consenso entre os estudiosos que a
da (principalmente as capturas realiza- meliponicultura tem um potencial trans-
das em ambientes naturais e antrópi- formador para conservar e aumentar as
cos com uso de redes entomológicas e a populações de abelhas nativas “sem fer-
identificação de ninhos nas matas com rão”, auxiliando na conservação da bio-
coleta de espécimes), duas expedições diversidade local e na dinâmica dos ecos-
foram dedicadas exclusivamente à cap- sistemas naturais, estimulando a im-
tura de abelhas, podendo a quantidade plementação de sistemas agroflorestais
de espécies de Meliponini obtidas ser diversificados e incrementando a polini-
considerada maior do que a encontrada zação de árvores frutíferas de interesse.
em muitas partes do mundo onde esses É fato também que proporciona alimento
insetos ocorrem. nutritivo, energético e medicinal para as
famílias que as criam, permitindo a co-
Os dados mostram que a biodiversidade mercialização de um mel de qualidade e
de abelhas na RDSA e na RDSM represen- preço vantajoso para o produtor.
ta 2% da biodiversidade total da espécie
computada até o momento para o Brasil; Neste contexto, o incentivo à melipo-
corresponde a 8,76% da biodiversidade nicultura, o treinamento dos povos da
de abelhas em todo o estado do Ama- floresta para essa prática e a publica-
zonas (um total de 388 espécies válidas ção de trabalhos como o “Guia Ilustrado
de todas as famílias já catalogadas), e a das Abelhas ‘Sem-Ferrão’ das Reservas
3,39% da biodiversidade estimada para Amanã e Mamirauá, Amazonas, Brasil
o estado (um total de 1.003 espécies de (Hymenoptera, Apidae, Meliponini)” são
abelhas previstas para a biodiversida- condições importantes para produção de
de do estado). Representa ainda 11,5% conhecimento e para a divulgação da bio-
da biodiversidade de espécies da família diversidade na região da Amazônia Cen-
Apidae (n=295) registrada no estado do tral, bem como para promover a cons-
Amazonas (MOURE et al., 2007). cientização sobre os benefícios gerados
por esse grupo da fauna para a conserva-
Ao se considerar, ainda, apenas as es- ção ambiental como um todo.
pécies de Meliponini estimadas para
o Amazonas (n = 116), esse núme- Sem dúvida, as abelhas são peças-chave
ro aumenta significativamente para no processo do uso sustentável dos re-
29,31% do total da fauna de abelhas cursos naturais pelos povos das flores-
“sem ferrão”, reportada para o estado tas, sendo um dos requisitos importan-
(PEDRO, 2014). tes para atingir esse fim a produção de
conhecimento sobre a diversidade local.
Como mencionado por Oliveira et al. Conhecer as espécies de abelhas nativas
(2013), a fauna levantada nas RDSs ama- e a sua taxonomia, já que muitos aspec-
zônicas e apresentada no presente diag- tos de seu comportamento estão ligados
nóstico pode ser considerada compará- à sua identidade taxonômica, permite o
vel também à riqueza de espécies (n=54) conhecimento das condições de manejo
encontrada por Oliveira et al. (1995) em exigidas para a criação de cada uma das
inventário realizado na região de Ma- espécies em particular, constituindo uma
naus, porém, observa-se que esse con- das metodologias mais importantes para
tou com maior esforço amostral e utili- que se logre sucesso com projetos de de-
zou metodologia diversificada de coleta senvolvimento sustentável que incluem a
(essências atrativas, etc.). meliponicultura como estratégia de con-
servação. A continuidade dos estudos so-
Esses dados são bastante relevantes e bre a biologia desses indivíduos e o apri-
comprovam a necessidade de desenvol- moramento do manejo das espécies locais
ver um mapeamento das espécies e um permitem que a prática da meliponicul-
monitoramento da área de forma mais tura seja respaldada em conhecimentos
sistemática, visando ampliar o conhe- práticos e científicos, indicando o uso das
cimento sobre a biodiversidade local de espécies corretas, evitando a perda de co-
abelhas, sobre seu papel potencial para lônias e a depredação de ninhos naturais,
produção e para direcionar a poliniza- possibilitando a geração de renda de for-
ção de culturas localmente importan- ma sustentável e contribuindo para a ma-
tes, e, em especial, para conservação nutenção da diversidade biológica (VEN-
ambiental. TURIERI, 2008).
64 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Esse primeiro diagnóstico revela a pre-
ferência pelo manejo de apenas seis es-
pécies de Melipona pelas populações da
RDSA e RDSM, o que ainda representa um
baixo aproveitamento em termos de meli-
ponicultura, não apenas do ponto de vista
da obtenção dos “produtos das abelhas”,
como também para o incremento da poli-
nização dos pomares cultivados pelas co-
munidades locais, o que atesta a necessi-
dade de dar continuidade ao programa de
meliponicultura desenvolvido pelo PMA-
-IDSM, visando ampliar sua abrangência
e diversificar as espécies criadas. Assim,
esses dados preliminares poderão nor-
tear os próximos passos do Programa de
Meliponicultura do PMA-IDSM para as-
segurar o melhor aproveitamento da bio-
diversidade local de abelhas, em especial,
voltando-se igualmente a atenção para o
manejo das espécies menores, de menor
potencial produtivo, mas extremamente
importantes para a polinização de plan-
tas necessárias às populações locais.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 65
66 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
© Aline Fidelix
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 67
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SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 69
© Amanda Lelis
70 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
A FAUNA
DE PEIXES
D a n i e l l e P e d r o c i a n e C a v a l c a n t e Ro s s a t o
J o n a s Al v e s d e O l i v e i r a
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 71
A FAUNA DE PEIXES
D a n i e l l e P e d ro c i a n e C a v a l c a n t e R o s s a t o
J o n a s A l v e s d e O l i v e i ra
72 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
2002 e 2003, na região das bocas dos prin- (COSTA e LAZZAROTTO, 2014) e Rivulus
cipais igarapés dos lagos de águas pretas, amanan (COSTA e LAZZAROTTO, 2008),
Amanã e Urini, e em alguns outros lagos de esta última, tendo o gênero alterado após
várzea. Os principais tipos de habitat aquá- sua descrição, sendo o táxon atualmente
ticos e respectivos micro-habitat amostra- válido o Anablepsoides amanan.
dos indicaram uma grande riqueza e abun-
dância de espécies nessa região. O primeiro inventário completo foi oficial-
mente publicado em um livro enfocando a
Nestes inventários, foram identificadas, ictiofauna ornamental da RDSA (HERCOS et
para a RDSA, 315 espécies pertencentes a 11 al., 2009). Neste material estão compiladas
ordens, 42 famílias e 179 gêneros. Durante informações de diversos projetos de pes-
este estudo, foi levantado o potencial para quisa desenvolvidos no lago Amanã e em 25
exploração de peixes ornamentais na região áreas das adjacências, incluindo três levan-
como alternativa econômica em um sistema tamentos de distintas metodologias, che-
de manejo, e cerca de 150 espécies foram gando a registrar um total de 330 espécies,
apontadas como promissoras, sobretudo os pertencentes a 43 famílias e 06 ordens.
acarás-disco, Synphysodon aequefasciatus
(PELLEGRIN, 1904), os lápis, da família A maior parte dos ambientes estudados são
Lebiasinidae e várias outras espécies formados de águas pretas, sendo poucos os
de Cichlidae e Loricariidae. Também foi paranás e lagos de águas brancas amostra-
registrada a ocorrência do raro e brilhante dos. Os igarapés de terra firme e as cabecei-
neon, Paracheirodon inessi (MYERS, 1936), ras dos igarapés maiores também não foram
uma das espécies mais procuradas pelos foco de pesquisas até o momento, devido às
aquarofilistas, ampliando, assim, a sua dificuldades apresentadas, como a distância
distribuição natural na Amazônia. a ser percorrida, a falta de estrutura física,
além da carência de pessoal para chegar nas
Entre os anos de 2005 e 2008, o Instituto localidades mais distantes.
Mamirauá, em parceria com a Zoological
Society of London (ZSL), realizou um Os instrumentos de coleta mais utilizados
amplo levantamento ictiofaunístico nos inventários foram: a redinha, a malha-
da RDSA para subsidiar a exploração deira, o rapiché (puçá), o arrasto manual e o
sustentável de algumas espécies. Nestes matapi. As principais localidades escolhidas
levantamentos, registrou-se a ocorrência para a coleta de amostras de peixes na RDSA
de duas espécies novas: Laimosenion ubim são apresentadas na Tabela 1, a seguir.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 73
Com base nas informações obtidas em coleções ictiológicas do Instituto Mamirauá e
relatórios, publicações e em revisão dos do Instituo de Pesquisa da Amazônia (INPA).
exemplares de coleção de peixes do IDSM,
atualmente, têm-se o registro de 440 Quanto à composição da ictiofauna esta é
espécies de peixes para a RDSA, pertencentes similar à esperada para a bacia amazônica,
a 11 ordens, 42 famílias, 179 gêneros. com as ordens Characiformes, Siluriformes
e Perciformes representando 51,0%,
Do total de espécies que ocorrem em Amanã, 27,1% e 10,7% das espécies registradas
61 se encontram classificadas somente respectivamente (Figura 20). Uma grande
quanto ao gênero, e 59 estão em processo parte dessa diversidade é composta de
de revisão por apresentarem identificação espécies de pequeno porte que habitam
ainda duvidosa. Grande parte do material pequenos rios de planície de inundação e
coletado nos últimos inventários realizados igarapés, tal como aqueles encontrados na
na RDSA encontra-se depositado nas bacia do rio Negro e em seus tributários.
60%
51,025057
50%
40%
30% 27,107062
20%
%
10,70615
10% 6,1503417
1,8223235 1,1389522 0,6833713 0,6833713 0,6833713
0%
es
es
es
es
es
es
es
es
s
ro
m
rm
rm
rm
rm
rm
rm
ut
or
or
fo
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fo
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on
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up
lo
nc
Pe
ar
Si
Be
ym
od
Cl
ra
Ch
nb
in
G
pr
Sy
Cy
Ordens
74 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Quadro 3 - Espécies ornamentais selecionadas para manejo na RDSA.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 75
Embora ocorram sérios problemas realizados na área, esta biodiversidade
ambientais em várias partes da Amazônia ainda não pode ser acessada por completo.
que afetam as comunidades de peixes,
entre eles, o desmatamento, a sobrepesca, Peixes de grande interesse comercial estão
o garimpo, a construção de hidrelétricas, presentes na RDSA, e muitos são utilizados
sobretudo, até o momento, nenhuma para o consumo da população local
das espécies encontradas na RDSA estão (Apêndice). A presença de várias espécies de
ameaçadas de extinção. As informações aqui peixes ornamentais e as diversas pesquisas
apresentadas mostram que a RDSA possui desenvolvidas na área permitem, hoje, a
uma ictiofauna extremamente abundante exploração de forma sustentável, indicando
em espécies, representando cerca de 15% uma alternativa econômica viável através
de toda riqueza estimada para a bacia de um sistema de manejo das espécies,
amazônica, e que mesmo após mais de 15 assegurando que o impacto ambiental seja
anos de inventários e amostragens sendo o menor possível.
80
Figura 21 - Gráficos de micro-habitat amostrados.
% sp. associadas
70
60
80
% sp. associadas
50
70
40
60
30
50
A
20
40
10
30
0
20
Igarape Lago Parana
10
Habitats
0
50
% spp. associadas
45
40
35
B
50
% spp. associadas
30
45
25
40
20
35
15
30
10
25
5
20
0
15
CP FR IG PR VA VM
10
5
Micro habitats
0
As mesmas associadas aos micro-hábitats amostrados
CP FR IG PR VA VM
(CP = canal principal; FR= furos; IG = igapó; PR = Paraná;
VA= vegetação flutuante e VM = vegetação marginal).
Micro habitats
76 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
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LAZZAROTTO, A. H. Variações na
história de vida de peixes na Reserva de
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 77
© Marcelo Ismar Santana
78 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
MAMÍFEROS
TERRESTRES
Gerson Paulino Lopes
Adriano Jaskulski
Al i n e Ta v a r e s S a n t o s
An e l i s e M o n t a n a r i n
D a n i e l Ro c h a
Diogo Gräbin
E m i l i a n o Ra m a l h o
G u i l h e r m e C o s t a Al v a r e n g a
H a n i Ro c h a E l B i z r i
Ivan Junqueira
I u r y Va l e n t e D e b i e n C o b r a
Lísley Gomes
M i c h e l e Ar a ú j o
Prisci la Pereira
J o n a s d a Ro s a G o n ç a l v e s
Nayara Cardoso
Re n a t a I l h a
Ro d o l f o C a r v a l h o
J o ã o Va l s e c c h i
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 79
MAMÍFEROS
TERRESTRES
Gerson Paulino Lopes
Adriano Jaskulski
A l i n e Ta v a re s S a n t o s
An e l i s e M o n t a n a r i n
Daniel Rocha
D i o g o G rä b i n
Emi liano Ramalho
G u i l h e r m e C o s t a A l v a re n g a
Hani Rocha El Bizri
I v a n J u n q u e i ra
I u r y Va l e n t e D e b i e n C o b ra
Lísley Gomes
M i c h e l e Ara ú j o
P r i s c i l a P e re i ra
Jonas da Rosa Gonçalves
N a y a ra C a rd o s o
Renata Ilha
Rodolfo Carvalho
J o ã o Va l s e c c h i
80 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
envolvendo coletas de mamíferos na Ama- Os registros de mamíferos de médio e gran-
zônia se resume à apresentação de listas de de porte foram obtidos, principalmente,
espécies, elaboradas a partir de inventários através do monitoramento da atividade de
rápidos, utilizando a taxonomia vigente, caça das comunidades locais e por métodos
que majoritariamente carece de revisões, de amostragem por distância, em trilhas
e com discussões parciais ou inexistentes abertas especialmente para esta finalida-
sobre as relações filogenéticas e geográ- de. As trilhas foram percorridas no turno
ficas dos grupos (e.g. SILVA et al., 2013; da manhã, entre 6:00h e 12:00h, por dois
OLIVEIRA et al., 2017; ABREU–JÚNIOR et observadores, um pesquisador e um as-
al., 2017). Entretanto, apesar da limitação sistente de campo local. Foram realizadas
deste tipo de abordagem, os trabalhos tra- também transecções noturnas, com fina-
zem ricas informações de base para a com- lidade de identificar a ocorrência de espé-
preensão dos padrões de distribuição das cies notívagas. Coletas realizadas por busca
espécies amazônicas e de seu de respectivo ativa, utilização de armadilhas fotográficas,
estado de conservação. entrevistas com moradores e encontros es-
porádicos contribuíram também substan-
O desenvolvimento e o refinamento das cialmente para a elaboração da lista apre-
técnicas para discriminação de espécies, sentada neste trabalho.
associados à utilização de novos e comple-
mentares métodos de coleta em vastas áre- Os pequenos mamíferos terrestres foram
as ainda inexploradas do ponto de vista zo- coletados com armadilhas de atração do
ológico, assim como os estudos realizados tipo Sherman e armadilhas de interceptação
em longo prazo, devem consequentemente e queda “pitfalls”. Registros fotográficos
revelar uma grande diversidade de espécies confiáveis também auxiliaram na elabora-
de mamíferos ainda não registrada, com a ção da lista. Os quirópteros foram captura-
presença de endemismos e de espécies ain- dos através de redes de neblina armadas ao
da não descritas (PAGLIA et al., 2012; OLI- nível do solo, próximas aos corpos d’água,
VEIRA et al., 2017). Neste contexto, a Reser- e abertas das 18:00 às 00:00h. A lista de es-
va de Desenvolvimento Sustentável Amanã pécies de morcegos foi complementada com
(RDSA) está localizada em uma das áreas o estudo de Pereira et al. (2010), que captu-
menos estudadas da Amazônia, com gran- raram as espécies em áreas de terra firme,
de deficiência de levantamentos faunísticos várzea e igapó.
(AYRES et al., 2005).
Material e Métodos
Resultados
A lista de mamíferos apresentada neste
trabalho é um compilado de registros ob- Os levantamentos indicaram a presença
tidos nos últimos quinze anos. Estes foram de 111 espécies, de 10 ordens e 31 famílias
realizados por diversos pesquisadores do (Quadro 4). Os morcegos contribuem com
Instituto de Desenvolvimento Sustentável mais da metade das espécies, 61 ao todo. A
Mamirauá durante a execução de estudos riqueza de espécies de mamíferos de mé-
de monitoramento da biodiversidade local. dio e grande porte aponta a predominân-
Ao longo dos anos, diversos métodos foram cia da ordem Carnivora, com 10 espécies,
utilizados com o objetivo de obter dados seguida de Primates, com oito espécies.
sobre a diversidade e a abundância de ma- Para os pequenos mamíferos terrestres,
míferos e para monitorar a fauna cinegéti- foram registradas 13 espécies, a maioria
ca da RDSA. da ordem Rodentia.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 81
Ao todo, 39 espécies de mamíferos foram Duas espécies, Galictis vittata e Herpailurus
identificadas como alvo de caça. Uma yagouaroundi, foram registradas apenas
espécie foi identificada somente por este através de armadilhas fotográficas.
tipo de registro - Cabassous unicinctus.
Caluromys lanatus
Caluromyinae
Marmosa (Micoureus)
demerarae
Didelphis marsupialis
Didelphimorphia Didelphidae Mucura
Philander opossum
Didelphinae
Marmosops aff. noctivagus
Marmosops bishopi
Cebinae
Sapajus apella
Cebidae Macaco-prego
macrocephalus
Saimiri sciureus
Saimiriinae Macaco-de-cheiro
Primates cassiquiarensis
Holochilus sciureus
Caviidae Hydrochoerus
Capivara
hydrochaeris
CONTINUA...
82 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Quadro 4 - (Continuação)
Centronycteris maximiliani
Cormura brevirostris
Peropteryx leucoptera
Peropteryx macrotis
Emballonuridae Emballonurinae Morcego
Rhynchonycteris naso
Saccopteryx bilineata
Saccopteryx canescens
Saccopteryx leptura
Micronycteris megalotis
Micronycteris microtis
Micronycteris schmidtorum
Lampronycteris brachiotis
Gardnerycteris crenulatum
Lophostoma brasiliense
Lophostoma carrikeri
Phyllostomidae Morcego
Lophostoma silvicolum
Phylloderma stenops
Phyllostomus discolor
Phyllostomus elongatus
Phyllostomus hastatus
Chrotopterus auritus
Glossophaga commissarisi
Glossophaga soricina
CONTINUA...
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 83
Quadro 4 - (Continuação)
Carollia brevicauda
Carollia perspicillata
Glyphonycteris daviesi
Trinycteris nicefori
Sturnira lilium
Sturnira tildae
Chiroderma trinitatum
Chiroderma villosum
Vampyriscus bidens
Vampyriscus brocki
Mesophyla macconnelli
Platyrrhinus helleri
Stenodermatinae
Artibeus cinereus
Artibeus concolor
Artibeus glaucus
Artibeus gnomus
Artibeus phaeotis
Artibeus watsoni
Artibeus obscurus
Artibeus lituratus
Artibeus planirostris
Ametrida centurio
Myotis albescens
Myotis riparius
CONTINUA...
84 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Quadro 4 - (Continuação)
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 85
mecanismo importante para geração de mesmo período, 101 espécimes de A. s. juara
linhagens de pequenos mamíferos na foram abatidos (PEREIRA et al., 2017). Esses
Amazônia (LIMA, 2017). fatores indicam que a caça é uma ameaça
importante para estas espécies (BOWLER et
A fauna de morcegos registrada até o al., 2013; PEREIRA et al., 2017).
momento representa mais da metade de
espécies de morcegos da Amazônia brasileira A paca (Cuniculus paca) está entre as espécies
(BERNARD et al., 2010) e, este é um dos mais vulneráveis à caça, assim como uma
sítios da Amazônia com uma das maiores das preferidas para alimentação entre
assembleias já registradas (BERNARD, os moradores locais. A cutia (Dasyprocta
2001; SAMPAIO et al., 2003; FERREIRA et fuliginosa) também é frequentemente
al., 2017; TAVARES et al., 2017). Conforme abatida (VALSECCHI e AMARAL, 2009;
esperado para outros mamíferos (PERES, VALSECCHI et al., 2014). Na comunidade
1997; HAUGAASEN e PERES, 2007), a terra Boa Esperança, há indícios de que a caça de
firme apresentou maior riqueza quando paca esteja atingindo níveis improdutivos
comparada à várzea e ao igapó (PEREIRA et (VALSECCHI et al., 2014).
al., 2010). Entretanto, o número de capturas
e biomassa foi maior nas áreas de várzea Os herbívoros também estão entre as
do que em outros ambientes (PEREIRA et espécies mais caçadas, e representam a maior
al., 2010). As diferenças nas riquezas entre porcentagem em termos do peso abatido
os ambientes mostram a importância do (VALSECCHI e AMARAL 2009). O queixada
mosaico de habitat para a manutenção da (Tayassu pecari) e a anta (Tapirus terrestres)
biodiversidade amazônica (HAUGAASEN e estão entre as espécies mais visadas entre
PERES, 2007; PEREIRA et al., 2010). todos os animais caçados (VALSECCHI e
AMARAL 2009). Tayassu pecari é a espécie
Para os primatas, apesar de diversos fato- mais caçada na área, e pode ser considerada
res influenciarem os padrões de riqueza na a mais importante para as comunidades
Amazônia, as florestas de terra firme são o devido à quantidade de indivíduos caçados,
tipo de fitofisionomia que apresenta a maior tanto para fins de subsistência como
diversidade do grupo (PERES, 1997; PERES e para a comercialização no mercado local
JANSON 1999; HAUGAASEN e PERES, 2005; (VALSECCHI e AMARAL, 2009).
PONTES et al., 2012). Entretanto, apesar de
a RDSA ser majoritariamente composta de Os felinos mais caçados são a onça–pintada
florestas de terra firme (QUEIROZ, 2005), (Panthera onca), a onça–vermelha (Puma
em termos de riqueza, nós detectamos so- concolor) e a jaguatirica (Leopardus pardalis)
mente oito espécies de primatas. Esta é uma (VALSECCHI, 2012). O abate de felinos
comunidade com menor riqueza em relação ocorre principalmente nas proximidades
a outras comunidades de primatas de terra- das comunidades ou em eventos de caça
-firme da Amazônia Central, onde é possí- a outras espécies (VALSECCHI, 2012).
vel registrar de 13 a 14 espécies simpátricas A onça-pintada é caçada com maior
(JOHNS, 1985; PERES, 1993, 1997, 1998; frequência nas áreas de várzea, e o puma
HAUGAASEN e PERES, 2005). e a jaguatirica nas áreas de terra firme
(VALSECCHI, 2012). A maior motivação para
Entre os mamíferos caçados, duas espécies o abate destas espécies pelos moradores
de primatas estão entre as mais procuradas é o conflito resultante da predação de
pelos moradores locais, especialmente o animais domésticos (VALSECCHI, 2012). A
bicó (Cacajao ouakary) e o guariba-verme- maior parte dos eventos de caça de felinos
lho (Alouatta seniculus juara) (VALSECCHI, é oportunista, e cerca de 50% dos animais
2012; BOWLER et al., 2013; PEREIRA et al., mortos são consumidos pelos moradores
2017). Estudos em comunidades da RDSA locais (VALSECCHI, 2012).
revelaram aspectos importantes sobre a
caça destas duas espécies (VALSECCHI e A caça é uma das principais ameaças às po-
AMARAL, 2009; VALSECCHI, 2012; PEREI- pulações de mamíferos de médio e de gran-
RA et al., 2017). de porte nas florestas tropicais (ROBINSON
E REDFORD, 1991). Para os mamíferos, as
Entre 2003 e 2013, 108 espécimes de C. características biológicas e as ameaças es-
ouakary foram abatidos em atividade de caça tão entre os fatores que podem influenciar a
em várias localidades da região (VALSECCHI, conservação das espécies. Porém, na RDSA,
2012; PEREIRA et al., 2017). A extrapolação a situação da maioria das populações parece
desses números, com a inclusão de todas as ser estável (ROCHA et al., 2016). Entretan-
comunidades existentes nesta UC, sugere to, estudos sobre a densidade populacional
que de 85 a 90 indivíduos sejam caçados e sobre a utilização das respectivas espé-
anualmente (BOWLER et al., 2013). Neste cies como fonte de proteína animal, além do
86 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
monitoramento contínuo, são necessários
para avaliar a sustentabilidade da caça na
RDSA. Atualmente, além do monitoramen-
to da caça, estudos sobre a sua abundância
e variação espacial para estas e outras es-
pécies visadas estão em andamento. Os re-
sultados destes estudos servirão de subsídio
para modelar a viabilidade da caça susten-
tável na RDSA.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 87
© Edu Coelho
88 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 89
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SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 93
© Marcelo Ismar Santana
94 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
MAMÍFEROS
AQUÁTICOS
Miriam Marmontel
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 95
MAMÍFEROS
AQUÁTICOS
Miriam Marmontel
Introdução O Peixe-boi
Por sua localização geográfica, a Reserva de O peixe-boi de água doce é endêmico da ba-
Desenvolvimento Sustentável Amanã (RDSA) cia Amazônica, ocorrendo em sistemas flu-
estabelece uma conexão física entre duas viais e lacustres, desde as cabeceiras na Co-
importantes Reservas de Desenvolvimento lômbia, Equador e Peru até a foz do rio Ama-
Sustentável (Mamirauá e Amanã) e o Parque zonas, ao longo de estimados sete milhões
Nacional do Jaú – e suas populações - que de quilômetros quadrados (MARMONTEL et
al., 2016). Os animais preferem áreas de flo-
juntos somam quase seis milhões de hectares
resta alagada, rica em nutrientes, mas têm
de área protegida. O território da RDSA é
a sua distribuição limitada por corredeiras
privilegiado por abrigar os cinco gêneros
e dependente da presença de plantas aquá-
de mamíferos dulciaquícolas que ocorrem
ticas, seu alimento principal. No Brasil, eles
no Brasil: peixe-boi (Sirenia: Trichechus),
ocorrem ao longo dos grandes rios, incluin-
botos (Cetartiodactyla: Inia e Sotalia) e
do o Solimões, o Japurá e o Negro, tendo sido
lontras (Mustelidae: Lontra e Pteronura).
registrados em toda RDSA, tanto em áreas
Todas as espécies mostram algum grau de de várzea (região do Castanho, na porção SE
preocupação em termos de conservação, da RDSA) quanto em áreas de terra firme -
por motivos que variam de conflitos diretos região no rio Unini, na porção NE da RDSA
a alterações de habitat, e são protegidas por (GPMAA, dados não publicados) e em lagos
leis internacionais e nacionais. O esforço de profundos (e.g. lago Amanã). Conhecido
pesquisa tem sido concentrado no entorno localmente como “a casa do peixe-boi”, o
do lago Amanã, que empresta seu nome à lago Amanã (02o46’S 64o39’W) proporcio-
Reserva, um grande lago de paleovárzea e na abrigo sazonal a indivíduos provenientes
um dos maiores na região amazônica, com de áreas de várzea adjacentes, mas também
aproximadamente 45 km de comprimento e abriga animais residentes: devido à caça de
2-3 km de largura. três animais muito pequenos, durante a en-
chente, e de uma fêmea adulta na estação
Desde o início de sua atuação na RDSA, o seca, foi possível inferir que pelo menos al-
Grupo de Pesquisa em Mamíferos Aquáticos guns deles permanecem nos igarapés nesse
Amazônicos (GPMAA) aplica o princípio do período, e que nascimentos podem ocorrer
Instituto Mamirauá de envolver as comuni- na cabeceira do lago.
dades no diálogo que se abriu, nas ações, e
na troca de saberes com os moradores locais
(ARAGONES et al., 2012), o que se traduziu
em uma saudável e proveitosa interlocução Caça
entre atores envolvidos. A incorporação do
conhecimento local e a participação dos mo- Graças em parte ao trabalho de longo prazo
radores ao longo dos anos, tanto em pesqui- do Instituto de Desenvolvimento Sustentá-
sa básica quanto nas ações de conservação, vel Mamirauá (IDSM) junto às comunidades
têm sido importantes aspectos e constituem da região, a caça ao peixe-boi atualmente
um eixo fundamental na produção de conhe- é praticamente inexistente no lago Amanã.
cimento (e.g. FLORES et al., 2013; PEREIRA et Entretanto, o animal ainda é abatido para
al., 2013). O trabalho de longo prazo gerou subsistência em toda região amazônica,
ainda um produto com orientações para a incluindo outras áreas da RDSA, e o IDSM
comunicação e sensibilização de comunida- mantém um monitoramento de tais eventos
des (VIEIRA e MARMONTEL, 2010). desde os anos 2000 (CALVIMONTES 2009).
96 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
O estudo do peixe-boi em ambiente natural que tende a acontecer de forma furtiva, não
é tarefa especialmente difícil devido a fa- se pode contar com dados fidedignos sobre
tores como seu comportamento inconspí- a magnitude atual da pressão de caça, o que
cuo ao se deslocar; por assomar à superfície prejudica a produção de índices de mortali-
somente para respirar; pela capacidade de dade, os quais, associados a dados de abun-
manter-se sob a água por até 20 minutos dância, concorrem para refinar a compreen-
quando perseguido; pelo hábito de passar são sobre o estado de conservação da espécie.
grande parte do tempo sob os tapetes de ve- Calvimontes (2009), no estudo mais com-
getação flutuante e pela turbidez das águas preensivo sobre caça de peixe-boi na Ama-
em grande parte de sua área de distribui- zônia brasileira, contabilizou 129 peixes-boi
ção. O conhecimento científico sobre sua abatidos na área de estudo do Amanã, entre
distribuição, abundância e comportamento janeiro de 2002 e junho de 2008, sendo que
em ambiente natural ainda é limitado, mas 53% dos animais tiveram o sexo declarado.
informações sobre estes temas são conhe- O comprimento máximo de animais caçados
cidas pelos moradores locais, que convi- foi de 300 cm (ou 15 palmos - 2 animais); o
vem com a espécie no dia a dia e ao longo comprimento médio foi de 206 cm (ou 10,3
do tempo. Desde 1993, o GPMAA realiza tra- palmos) para um n= 95, dos quais 6% (ou
balhos de pesquisa e conservação da espécie 58) eram adultos (> 200 cm ou 10 palmos).
nas RDSs Mamirauá e Amanã e em seus en- O arpão, instrumento tradicional de caça, foi
tornos, com o apoio de comunidades locais. a arte mais empregada nos abates (107 de 111
Três diagnósticos rurais participativos já eventos). O emprego de malhadeiras foi de-
foram realizados na RDSA, com participa- clarado em apenas três ocasiões, mas pau-
ção de caçadores e ex-caçadores de peixes- latinamente vem se tornando um problema
-boi dos setores Amanã, Paranã do Amanã, significativo, ao capturar acidentalmente fi-
Urini e Castanho, propiciando o intercâm- lhotes sem capacidade de romper as malhas.
bio de informações sobre caça e pesquisa, e O uso disseminado de malhadeiras também
resultando no mapeamento participativo e causa a morte de outros mamíferos aquáti-
na produção de duas cartilhas e um pôster cos e gera conflitos de pescadores com lon-
para divulgar informações sobre a biolo- tras, botos e jacarés.
gia e o estado de conservação do peixe-boi
amazônico (FIGUEIREDO et al., 2001; MAR- Os peixes-boi estão vulneráveis ao longo
MONTEL et al., 2002). de toda sua rota migratória – das regiões
de várzea de Amanã e Mamirauá até o lago
Em 2002, iniciou-se um estudo sobre a et- Amanã - e em todos os tipos de habitat que
nobiologia do peixe-boi amazônico, com frequentam ao longo do ano, pois os ca-
atenção especial para o registro dos co- çadores sabem que durante a enchente os
nhecimentos (incluindo seu uso histórico e animais estão junto às “comedias” (locais
atual) e percepções da população local com de alimentação), e durante a seca são en-
relação ao animal. Ao longo de 120 km das contrados em “boiadores’. A perseguição
margens dos lagos Amanã, Urini e Castanho, aos peixes-boi no que hoje é a RDSA foi in-
ou nos cursos d´água adjacentes, quinze co- tensa da primeira metade do século XX até
munidades foram selecionadas para o estu- o início dos anos 1980. Durante esse perí-
do. Este trecho representa um dos eixos mi- odo, anualmente, na arribação, que ocor-
gratórios sazonais da espécie, previamente re em julho-agosto, grupos de caçadores
confirmado por telemetria, e abriga famílias acampavam em locais específicos para
com estreita relação de uso e conhecimento abater números significativos de peixes-
acerca do peixe-boi (CALVIMONTES e MAR- -boi, sendo o mais famoso deles o paranã
MONTEL, 2010). Empregando a observação do Castanho. Estima-se que feitorias che-
participante e a técnica de bola de neve, re- garam a capturar mais de 200 peixes-boi
alizaram-se entrevistas e registros de cam- por ano. Segundo os moradores locais, a
po junto aos “conhecedores de peixe-boi”. caça intensiva em Amanã declinou a partir
Quarenta e um conhecedores, com idade en- dos anos 1970. Atualmente, apenas 8% dos
tre 27 e 86 anos (média 50,6), pertencentes eventos de caça ocorrem na região Cas-
a 15 famílias com fortes laços de parentesco, tanho Alto, enquanto o Castanho Baixo é
contribuíram no estudo. responsável por quase metade dos abates
(46%). Isto pode estar associado ao fato
Apesar de legalmente protegida, a espécie de ser esta região da RDSA um ambiente de
ainda está sujeita à caça de subsistência e à várzea, e onde as iniciativas de manejo do
venda no comércio local do entorno das ci- IDSM iniciaram-se apenas recentemente,
dades próximas à Reserva, especialmente do tendo sido o contato com pesquisadores
interior, como na feira e em bairros de Tefé historicamente mais limitado. A segun-
(GPMAA, informação não publicada). Por da área mais importante de abates atual-
se tratar de uma atividade ilegal, portanto, mente é a do Urini (21%) (CALVIMONTES
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 97
e MARMONTEL, submetido), onde mudan- no conteúdo nutricional e na disponibilida-
ças na geomorfologia reduziram o lago a um de alimentícia, T. inunguis apresentaria sa-
local de passagem, que pode tornar-se um zonalidade reprodutiva (BEST, 1982), com
gargalo na rota migratória (ARRAUT et al., filhotes nascendo entre dezembro e julho,
2017). Dezessete por cento é a contribuição e pico de partos ocorrendo entre fevereiro
do Amanã Baixo para os abates, e o Amanã e maio, quando o nível da água está cres-
Alto, com o maior e mais importante nú- cendo e a produtividade de plantas é mais
mero de ‘boiadores’ do lago Amanã, repre- alta. Reproduzindo-se sazonalmente, os
senta 8% das capturas (CALVIMONTES e peixes-boi amazônicos conciliam o último
MARMONTEL, submetido). terço da gestação e início da lactação, ener-
geticamente demandantes e custosos, com
Os principais produtos derivados da caça o período de maior disponibilidade alimen-
ao peixe-boi são a carne, a gordura e a pele tar, permitindo à fêmea readquirir sua con-
(DOMNING, 1982), mas a iguaria mais fa- dição fisiológica (MARMONTEL et al., 1992).
mosa e cobiçada é a mixira, pedaços de carne Best (1982) especulou ainda que, em anos
frita e conservada na própria banha; geral- com pouca disponibilidade de alimento,
mente, uma lata de 20 l comanda um preço algumas fêmeas não entrariam em estro,
evitando as demandas energéticas de uma
de R$ 300,00. Recentemente, os moradores
prenhez e lactação longas. Estresse seme-
locais têm se envolvido mais com a agricul-
lhante atuando sobre machos poderia im-
tura, e tal fato, associado à ilegalidade da
pedir também a espermatogênese nessa
caça, tornou o consumo local da carne - com
época (MARMONTEL et al., 1992).
um pequeno componente de venda -, a prá-
tica mais disseminada. O compartilhamento
da carne com parentes e vizinhos também é O período de gestação de todos os sirê-
uma prática comum, o que reforça a cren- nios varia de 12 a 14 meses. A razão sexual
ça de que o caçador é uma pessoa especial, é de 1:1, e o tamanho de prole tipicamente
e o evento da caça uma ocasião importante 1 (MARMONTEL et al., 1992), nunca tendo
(CALVIMONTES e MARMONTEL, submeti- sido registrado o caso de gêmeos na Ama-
do). Os ossos de peixe-boi também podem zônia, embora possível. Os filhotes nascem
com 60-105 cm de comprimento e pesam
ser usados como ‘gaponga’ (isca para pesca
10-15 kg (MARMONTEL et al., 1992). A me-
do tambaqui) ou como medicamentos para
nor cria capturada na área de estudo media
várias doenças em forma de chá (SILVA e
três palmos (ou 60 cm), uma fêmea encon-
MARMONTEL, 2006).
trada, em janeiro de 2004, flutuando em um
dos igarapés da cabeceira do lago Amanã.
Um estudo com análise da idade da espé- Segundo os moradores locais, o animal es-
cie, baseado no corte do osso do ouvido de taria sozinho, embora, mais provavelmente,
99 peixes-boi caçados na RDSM e na RDSA, se tratasse de um filhote muito jovem, se-
encontrou a faixa de idade entre 0 e 36 anos parado de sua mãe (CALVIMONTES, 2009).
(VERGARA-PARENTE, 2009), sendo que
mais de 61% da amostra correspondia a
animais maiores de 5 anos de idade.
Dieta
98 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
e alguns conteúdos estomacais, foram Reabilitação
então comparados com a epiderme descrita
para cada uma das 69 plantas constando Embora os animais visados pelos caçadores
da coleção de referência. Em cerca de 90% sejam os adultos, filhotes são frequente-
dos casos, houve correspondência entre mente arpoados para facilitar a captura da
conhecimento local e a análise científica, fêmea. Nos últimos anos, a disseminação
e 30 novas espécies foram adicionadas à do uso de redes de pesca representou nova
lista de itens alimentares de peixes-boi ameaça ao peixe-boi, promovendo emalhes
amazônicos até então conhecida. Na RDSA, acidentais, especialmente de filhotes, fre-
foram identificadas 48 espécies consumidas, quentemente seguidos de afogamento. O
sendo 40 delas durante os períodos de cheia destino dos que são removidos com vida
e seca. As mais frequentes foram: o rabo de inclui o abate para consumo local ou co-
raposa, Hymenachne amplexicaulis, o capim mercial da carne, tentativa de criação dos
memeca, Paspalum repens, a arroirana, Oryza animais na comunidade, e venda do animal
grandiglumis, o chibé de peixe-boi, Azolla vivo a comerciantes ou em cidades próximas.
caroliniana e o mureru, Limnobium spongia Anualmente, um número considerável de
(GUTERRES-PAZIN et al., 2014). As duas filhotes é removido da população, seja por
primeiras são consideradas cianogenéticas, capturas acidentais, seja por ações direcio-
capazes de inibir a citocromo oxidase e, nadas (MARMONTEL et al., 2008b). Entre
consequentemente, impedir as células de 2001 e 2013, pelo menos 96 animais este-
receber oxigênio das células vermelhas veram nessa situação (ORTIZ, 2013). Alguns
(GUTERRES-PAZIN et al., 2013). Exceto por peixes-boi são eventualmente devolvidos,
um caso de envenenamento alimentar por diretamente pelos pescadores ou com auxí-
ingestão de macaxeira (Manihot esculenta, lio de técnicos; um dos resultados relevantes
que contém cianeto de hidrogênio) e morte do envolvimento da população foi o episódio
ulterior, nos cativeiros do Instituto Nacional de captura de peixe-boi em malhadeira,
de Pesquisas da Amazônia (D’AFFONSECA resultando na soltura imediata, seguida de
NECO e VERGARA-PARENTE, 2007), não há reencontro com a mãe (MARMONTEL et al.,
nenhum outro registro da ação de princípios 2013). Estas iniciativas promissoras salien-
tóxicos sobre o peixe-boi amazônico. Best tam a importância da conscientização e do
(1983) sugeriu que peixes-boi poderiam envolvimento das populações locais nas
jejuar por até 200 dias. Guterres et al. (2014) atividades de conservação da vida silvestre
demostram que embora possa haver uma (MARMONTEL et al., 2008b).
diferença na composição (por substituição),
possivelmente afetando qualidade e volume, Com o objetivo de equacionar o problema dos
um número semelhante de espécies de filhotes órfãos, o IDSM criou e implementou,
plantas é consumido tanto na cheia quanto em 2007, o Centro de Reabilitação de Pei-
na seca, contradizendo os achados de Best. xes-boi de Base Comunitária (aka Centri-
nho), no lago Amanã, que foi oficializado e
recebeu aval do IBAMA (# 561063) em 2008
(MARMONTEL et al., 2008a, c; MARMONTEL
Parasitos et al., 2009), através da categorização do
IDSM em criadouro conservacionista, auto-
De um total de 115 amostras de fezes de rizado a resgatar e reabilitar filhotes órfãos
peixes-boi nativos capturados, de cativeiro ou de peixes-boi amazônicos, vítimas de ema-
encontradas flutuando no ambiente, cerca lhamento acidental, ou cuja mãe tenha sido
de 4% foram positivas para Cryptosporidium abatida. Foram desenvolvidos protocolos
spp., protozoário transmissível através de para resgate e reabilitação, e todos os cuida-
ingestão de água e/ou alimentos contami- dos são tomados para o bom desenvolvimento
nados com oocistos (BORGES et al., 2007 e do filhote (VAN TOLL, 2008).
2011). Embora a taxa seja consideravelmente
inferior à dos peixes-boi marinhos (BOR- A maioria dos animais foi recebida em si-
GES et al., 2011), indicando um grau de inte- tuação de desidratação e/ou malnutrição,
gridade das águas da RDSA, o resultado gera o que poderia ser revertido, na maior parte
preocupação de transmissão para o homem, das vezes, com tratamento para hidratação
e aponta para os problemas sanitários de e alimentação adequada e paulatina. Os fi-
comunidade locais, para a liberação de fezes lhotes órfãos têm sido criados em cativeiro
nos habitat aquáticos pelos barcos, e depo- no Centrinho, desde 2007, por meio de dietas
sição de dejetos animais em lagos de igapós lácteas artificiais, consistindo em uma mistura
(BORGES et al., 2007). Em estudo recente, de leite em pó com óleo vegetal, suplementada
Borges et al. (2017b) relataram pela primeira por complexo multivitamínico. Visando me-
vez a ocorrência de Giardia sp. em fezes de lhorar o ganho de peso e o crescimento, e
peixes-boi amazônicos. diminuir o período de reabilitação, diversos
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 99
estudos têm sido realizados para formular Um dos filhotes chegou ao Centrinho com
uma dieta mais adequada (DI SANTO, 2013; muitas marcas de mordidas, provavelmen-
FERREIRA, 2015). Uma formulação nutri- te provocadas por um bando de ariranhas, e
cional baseada no aleitamento artificial não resistiu à infecção (GPMAA, dados não
customizado com base no metabolismo da publicados); um outro animal ainda foi re-
espécie, pela determinação das Necessida- movido do recinto por entidade desconhe-
des Energéticas de Manutenção, vem sendo cida (MARMONTEL et al., 2013).
implementada a partir de abril de 2013. Esta
dieta mostrou-se superior em relação à die- Além do envolvimento comunitário, tra-
ta tradicional, alcançando a média de incre- balhos de educação ambiental são parte da
mento de peso mensal de 6,4 kg, comparados rotina de trabalho (VIEIRA e MARMONTEL,
aos 2,9 kg da dieta original (GUERRA-NETO 2010; FLORES et al., 2013a, b; CENTRINHO).
et al., in prep.). Foi também desenvolvida
no Centrinho uma mamadeira subaquática,
para auxiliar no aleitamento de forma mais
similar possível ao experimentado com a
Capturas e solturas
mãe, reduzindo, assim, o contato com os
tratadores e a domesticação (FREIRE et al.,
submetido). Para auxiliar no tratamento O GPMAA tem capturado peixes-boi em
dos animais feridos, medicamentos foram ambiente natural, e monitorado os animais
produzidos e testados, utilizando princípios por radiotelemetria VHF (MARMONTEL et
ativos naturais disponíveis na região (SILVA al., 2012) desde 1994, atividade iniciada na
et al., 2011). Reserva Mamirauá. O acompanhamento
dos primeiros animais permitiu descrever a
Até outubro de 2017, 18 animais passaram rota migratória por eles percorrida entre os
pelo Centrinho, sendo sete machos e onze locais de várzea (no caso, a RDSM), onde per-
fêmeas, com idades estimadas entre um e manecem durante a estação de águas altas, e
oito meses. Os animais resgatados mediam os locais de terra firme, com poços profundos,
entre 85 e 163 cm ao chegar, e apresentaram onde encontram refúgio contra a caça (no
peso inicial variando de 9 a 64 kg. Doze deles caso, a RDSA) (MARMONTEL et al., 2002).
(cinco machos e sete fêmeas) foram soltos Vinte e um animais foram capturados com
em quatro episódios (cinco em 2012; seis redes na RDSA, em 2001 e em 2005. Destes,
em 2015, incluindo uma re-soltura; um em apenas sete eram fêmeas, e somente duas
2016 e outro em 2017). Todos, exceto por delas grandes o suficiente para adaptação
um macho naturalmente esguio, foram li- do cinto. Os animais foram monitorados
berados com radiotransmissores VHF de por até três anos, gerando dados de deslo-
frequência única, inseridos em cintos adap- camento, uso de habitat e locais de maior
tados em torno do pedúnculo caudal dos vulnerabilidade dos indivíduos (ARRAUT et
animais, e monitorados por radiotelemetria al., 2010, 2017).
manual durante vários meses. Os animais
eram provenientes de localidades situadas Animais reabilitados são liberados também
desde Atalaia do Norte (rio Javari) e Igarapé com sistema de rádio VHF, em frequência
Grande (Guajará, AM) até a comunidade São única de amplitude 173-174.999 MHz, para
Francisco, no rio Solimões, abaixo de Tefé, garantir que sua readaptação ao ambiente seja
incluindo comunidades do interior das Re- monitorada (CARVALHO, 2013; CARVALHO et
servas Mamirauá e Amanã. Metade dos ani- al., 2013, 2014). A primeira reabilitação e de-
mais foi resgatada de emalhes em artes de volução de peixe-boi ao ambiente natural na
pesca (primariamente malhadeiras), dois Amazônia brasileira foi feita na RDSM, em
foram arpoados, e três foram emalhados e 2000, e coordenada pelo IDSM (MARMON-
arpoados; dois animais foram encontrados TEL e PETTA, 2000). Desde então, quatro
flutuando, conforme declarado, e um foi solturas de animais reabilitados foram re-
dado como encalhado em praia; um outro alizadas na RDSA: 2012 (5), 2015 (6, sen-
animal foi comprado por um comerciante, do 1 uma re-soltura) (MARMONTEL et al.,
que o entregou aos cuidados do Instituto, 2015b), 2016 (1) e 2017 (1), sendo os animais
para reabilitação. Dos animais que vieram rastreados por VHF e triangulação, a bordo
a óbito, uma fêmea foi comprovadamente de casco de alumínio com motor de popa
vítima de enterocolite aguda com pneuma- 1-2x/dia, metodologia que perdurou por um
tose intestinal, desordem gastrointestinal período de vários meses até cerca de dois
frequente entre filhotes em fase de reabili- anos. Em geral, os animais realizam peque-
tação (GUERRA-NETO et al., 2016). Doenças nos movimentos exploratórios nos primei-
provavelmente do trato digestório acome- ros meses, e em áreas próximas ao local de
teram outros três espécimes, devido à tenra soltura, para posteriormente aventurarem-
idade e à baixa imunidade adquirida da mãe. -se em áreas mais distantes, muitas vezes
Conflitos e percepção
Considerações Finais
As ariranhas são percebidas como uma
Com o crescimento e a movimentação da
ameaça à atividade pesqueira, primaria-
população humana na RDSA, prevê-se uma
mente pelos danos infligidos às redes de
potencialização de conflitos envolvendo os
pesca, e em segunda instância pelos pre-
mamíferos de água doce. Especula-se que
juízos causados aos recursos pesqueiros
as espécies passarão a sofrer interferências
(FONSECA e MARMONTEL, 2011), mais antrópicas diretas de forma mais constan-
do que devido à alegada agressividade dos te, tendendo a aumentar sua mortalidade
animais. Percepção semelhante é compar- (abates ou tentativas de abate por conflitos
tilhada por pescadores do médio Solimões percebidos, aumento do tráfego de embar-
(LASMAR et al., 2013). Entre 2001 e 2013, 11 cações, capturas acidentais); ou indiretas
ariranhas foram abatidas (oito por arma de (poluição por contaminantes e lixo, altera-
fogo, uma por arpão, e duas após terem sido ção de paisagens para agricultura e pecuá-
capturadas incidentalmente); houve quatro ria, levando à lixiviação), que poderão acar-
tentativas de abate (duas por arpão e duas retar impactos subletais, como a redução
por arma de fogo, sem mortes confirmadas) da espermatogênese ou oogênese. As cinco
e cinco capturas acidentais (uma em anzol espécies incluem predadores de topo (bo-
e três em redes de espera, com três mortes tos, lontras) e da base da cadeia alimentar
confirmadas) nas cabeceiras do lago Amanã (peixe-boi), cada um com funções ecológi-
(FONSECA e MARMONTEL, 2011; LIMA et cas chave para o ecossistema amazônico re-
al., 2014b; GPMAA, dados não publicados). gional. Além das atividades antrópicas pre-
Há registros de duas mortes de lontra, em vistas, as mudanças nos padrões climáticos
2002 e 2007, por arpão e arma de fogo, e produzirão alterações nos níveis de precipi-
duas carcaças foram encontradas (2011, tação, que tendem a afetar profundamente
2013), sendo uma de um neonato (GPMAA, a dinâmica de inundação. Até o momento,
dados não publicados). não há registros de exploração de minérios
ou previsão de construção de barragens,
mas dada a política desenvolvimentista
A remoção de filhotes de ariranhas de locas
atual e as prospecções em curso, não cau-
e a separação de seu grupo social é prática
saria surpresa se ameaças adicionais vies-
comum na RDSA, porém, a manutenção da
sem a se somar às atuais no futuro próximo
cria é complexa e onerosa, e a devolução ao (ARRAUT et al., 2017, MARSH et al., 2016). O
grupo é frequentemente malsucedida. Em impacto dessas ameaças, especialmente em
2011, um filhote proveniente do igarapé do bloco, poderia levar à perda da diversidade e
Baré (lago Amanã) foi entregue ao GPMAA. aumentar o risco de extinção local dos ma-
Buscando manter o animal em reabilitação míferos aquáticos em Amanã. Para contra-
o menor tempo hábil, e empregando o mí- balançar essas ameaças, será preciso con-
nimo contato, foi possível reintegrá-lo a ciliar atividades de pesquisa, educação, fis-
seu grupo original, graças ao conhecimento calização, bem como definir o zoneamento
dos grupos da área (LIMA e MARMONTEL, da Reserva. Apesar de os mamíferos de água
2011). Por outro lado, um animal tornado doce terem expectativa de vida longa, todas
cativo foi abatido por seus captores pelo as espécies têm baixa capacidade reproduti-
fato de produzir muito ruído (GPMAA, da- va, típica de espécies k-selecionadas (espe-
dos não publicados). cialmente peixe-boi e botos), com maturação
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DI SANTO, L.G. Análise bromatológica das
T22102A43793736. Acesso em: 6 set. 2017.
macrófitas aquáticas utilizadas como item
alimentar na dieta de filhotes de peixes-
MARSH, H.; ARRAUT, E.; DIAGNE, L.K.; boi amazônicos (Trichechus inunguis) em
EDWARDS, H.; MARMONTEL, M. Impact reabilitação. TCC (Graduação em Medicina
of Climate Change and Loss of Habitat on Veterinária). Universidade Estadual Paulista
Sirenians. In: BUTTERWORTH, A. (Org.). Júlio de Mesquita Filho, 2013.
Marine Mammal Welfare, 1ed., New York:
Springer, 2016, p. 333-357. Acesso em: 06
DA SILVA, V.M.F. Aspects of the biology
sep. 2017.
of the Amazonian dolphins dengus Inia
and Sotalia fluviatilis. (PhD dissertation).
MONTEIRO-FILHO, E.L.D.A.; RABELLO- St John´s College, University of Cambridge,
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Acanthaceae Ruellia sp. L.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Annonaceae Xylopia calophylla R.E. Fr.
- Distribuição restrita;
Deficiência de dados.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Bignoniaceae Bignonia aequinoctialis L.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Calophyllaceae Caraipa richardiana Cambess.
Chrysobalanaceae Licania octandra subs. pallida (Hoffmanns. ex Roem. & Schult.) Kuntze
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Chrysobalanaceae Licania sothersiae Prance
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Dichapetalaceae Tapura lanceolata (Ducke) Rizzini
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Euphorbiaceae Maprounea guianensis Aubl.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Fabaceae Dipteryx lacunifera Ducke
Fabaceae Hydrochorea marginata var. panurensis (Benth.) Barneby & J.W. Grimes
Vulnerável - VU A2cd -
Fabaceae Hymenaea parvifolia Huber
Espécie madeireira.
Distribuição restrita;
Deficiência de dados.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Fabaceae Inga umbellifera (Vahl) Steud.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Fabaceae Stryphnodendron racemiferum (Ducke) W. Rodrigues
Fabaceae Tachigali prancei (H.S. Irwin & Arroyo) L.F. Gomes da Silva & H.C. Lima
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Icacinaceae Emmotum sp. Desv. ex Ham.
Vulnerável - VU A4cd
Lauraceae Mezilaurus itauba (Meisn.) Taub. ex Mez
- Espécie madeireira.
Lauraceae Misanteca aritu (Ducke) Lundell
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Lauraceae Ocotea cymosa (Nees) Palacky
Vulnerável - VU A3cd
Lecythidaceae Bertholletia excelsa Bonpl. - Espécie madeireira e
alimentícia.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Loranthaceae Passovia pyrifolia (Kunth) Tiegh.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Melastomataceae Miconia pyrifolia Naudin
Vulnerável - VU A2cd. -
Meliaceae Cedrela fissilis Vell.
Espécie madeireira
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Moraceae Ficus pertusa L. f.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Vulnerável - VU A4cd. -
Myristicaceae Virola surinamensis (Rol. ex Rottb.) Warb. Espécie madeireira e de
uso farmacêutico.
Myristicaceae Virola venosa (Benth.) Warb.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Ochnaceae Ouratea discophora Ducke
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Polygonaceae Coccoloba ovata Benth.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Sabiaceae Ophiocaryon sp. L.
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Siparunaceae Siparuna thecaphora (Poepp. & Endl.) A. DC.
Urticaceae Pourouma bicolor subsp. digitata (Trécul) C.C. Berg & Heusden
CONTINUA...
Grau de Ameaça ou
Família Espécie
Potencial Ameaça *
Vochysiaceae Vochysia surinamensis Stafleu
CONTINUA...
CONTINUA...
CONTINUA...
CONTINUA...
CONTINUA...
CONTINUA...
CONTINUA...
1
AC = Antes de Cristo; DC = Depois de Cristo
2
Classificação arqueológica dos vestígios cerâmicos a partir de atributos estilísticos.
3
Extensões externadas da borda (flange labial) ou do corpo da vasilha (flange mesial), formando uma pequena superfície horizontal na peça.
4
Técnica decorativa utilizada na superfície da cerâmica que consiste na aplicação de uma fina camada de argila colorida (vermelho,
branco, laranja, etc.), formando uma película com aspecto mais liso e uniforme. Normalmente é utilizado com base para aplicação de
outras pinturas (e.g.: embobo branco por baixo e pinturas vermelhas por cima).
5
Porção angular no contorno do corpo de uma vasilha cerâmica, que forma um ponto de inflexão, podendo ocorrer uma ou mais vezes
em uma mesma peça.
Tefé
Fases cerâmicas
Caiambé
Pocó
Amanã
Anos
Fonte: Tamanaha, 2015.
HILBERT, P. P. Archäologische
FERIZ, H. The ceramics of Tefé-Amaná: Untersuchungen Am Mittlern Amazonas.
a contribution to the archaeology of the Berlim: Dietrich Reimer Verlag, 1968.
Amazon. Revista Ethnos, v. 28, p. 147-
176, 1963.
HORNBORG, A. Ethnogenesis, regional
integration, and ecology in prehistoric
FRASER, J. A.; JUNQUEIRA, A. B.; Amazonia. Current Anthropology, n. 46, p.
CLEMENT, C. R. Homegardens on 589-620, 2005.
Amazonian Dark Earths, Non-
anthropogenic Upland, and Floodplain
Soils along the Brazilian Middle Madeira JUNQUEIRA, A. B.; SHEPARD, G. H.;
River Exhibit Diverging Agrobiodiversity. CLEMENT, C. R. Secondary forests on
Economic Botany, v. 65, n. 1, p. 1-12, anthropogenic soils in Brazilian Amazonia
Março 2011. conserve agrobiodiversity. Biodiversity
Conservation, n. 19, p. 1933-1961, 2010.
1
Consiste na definição dos setores ou zonas de uma Unidade de Conservação, com o objetivo de desenvolver projetos de manejo dos
recursos naturais e elaborar “normas específicas, com o propósito de proporcionar os meios e as condições para que todos os objeti-
vos da UC possam ser alcançados de forma harmônica e eficaz” (SNUC, 2000 p. 10). Para isso, são realizados estudos prévios sobre o
processo de ocupação humana da área, e os resultados são usados para subsidiar as propostas de zoneamento a serem discutidas com
ampla participação dos moradores locais, reunidos em assembleias e no Conselho Gestor, de caráter deliberativo.
Os resultados identificaram alguns padrões Alencar (2007, 2009) salienta alguns ato-
no processo de ocupação humana da área res e instituições com papeis importantes
da RDSA que mostram coincidências com no processo de ocupação humana da área
outros estudos acerca do tema na região do da RDSA: seja por garantirem as condições
médio Solimões, organizando conjuntos de mínimas de sobrevivência às famílias de
fatores para construir períodos históricos encarregadas pela coleta de castanha, ex-
(WAGLEY, 1988; LIMA-AYRES, 1992). No tração do látex e pesca - no caso dos comer-
estudo de Alencar (2007) buscou-se elabo- ciantes (patrões) -, viabilizando, assim, a
rar uma periodização com base na observa- ocupação das áreas mais distantes; ou por
ção de um conjunto de fatores de natureza estimularem a sua organização em comu-
social, política, histórica, econômica e am- nidades e incentivar as ações coletivas de
biental. A periodização sugerida pelos es- gestão de recursos naturais - no caso da
tudos de Amanã apresenta algumas carac- igreja católica, através da Prelazia de Tefé;
terísticas semelhantes às fases propostas ou ainda, o Estado, com a implementação
por Lima-Ayres (1992), ao considerar como de políticas de criação de novos municípios,
marcadores desse padrão as atividades eco- a partir da segunda metade do século XX; e
nômicas, o comércio rural e o padrão demo- não menos importante, nas últimas déca-
gráfico da ocupação. das, os atores responsáveis pela criação de
áreas protegidas.
Alguns fatores sociais foram determinantes
na configuração da ocupação humana e do Os “patrões”, como são conhecidos os co-
processo demográfico na área da RDSA, en- merciantes que financiam e controlam a
tre os quais pode-se destacar: i) o sistema produção, viabilizaram a ocupação das áre-
de produção econômica; ii) a concentração as mais distantes, onde se estabeleciam os
fundiária de vastas áreas de terra firme e extrativistas, construindo acampamentos
de várzea, ricas em recursos naturais co- temporários. A igreja católica, através de
mercialmente valorizados, nas mãos de agentes pastorais ligados ao Movimento de
influentes comerciantes que tinham seus Educação de Base (MEB), estimulou a for-
armazéns sediados nas cidades de Alva- mação de núcleos de povoamento - as co-
rães, Tefé, Coari e Manaus. Esses “proprie- munidades -, e o desenvolvimento de ati-
tários” restringiam o acesso de terceiros às vidades de subsistência menos dependentes
terras e aos recursos naturais, influencian- do extrativismo econômico dominante. E
do, assim, a ocupação humana e limitando as prefeituras, voltando suas políticas para
2
As colocações dessa região se diferenciam daquelas descritas por Almeida (2012) para a região do Juruá, que o autor define como
“uma organização social e um sistema econômico caracterizado pelo uso múltiplo de territórios florestais por uma rede de casas apa-
rentadas, compartilhando ambientes em comum” e que serve como base para a criação das reservas extrativistas, “no modelo de uma
instituição coletiva de uso da floresta que é pouco agressiva para com a natureza e que pode proporcionar uma boa vida a seus habitan-
tes”. (ALMEIDA, 2012 p. 121). (ALMEIDA, M. W. B. de. As colocações: forma social, sistema tecnológico, unidade de recursos naturais.
Mediações, Londrina, v. 17, n.1, p. 121-152, Jan./Jun. 2012. DOI: 10.5433/2176-6665.)
3
Sistema de antecipação do crédito pelo qual o extrator fica devendo ao patrão ao adquirir artigos e materiais de trabalho. Por quase
nunca conseguir saldar a dívida com o patrão através da sua produção, o extrator é obrigado a renovar o crédito com o mesmo, que
assim mantém uma mão de obra cativa.
Tabela 3 - Distribuição da população da RDSA na área parcial e total. Anos 2002, 2006 e 2011.
N. de comunidades 34 85 43 62 49 65 57 66
Localidades N. de sítios 6 15 26 38 26 35 29 34
Total 40 100 69 100 75 100 86 100
2000 1871
1511 1530
1500 1387
1209
Várzea
1000
Terra Firme
500
Total
0
Ano
Tabela 4 - Composição populacional por ambiente de várzea e terra firme na área parcial, RDSA
– Anos 2002, 2006 e 2011.
Variação da composição
2002 2006 2011
populacional
Nº de localidades em várzea 24 34 30
50 41 51
Média de moradores por localidade
S * = 30 S =35 S =41
N° mínimo e máximo de
3 a 111 1 a 124 4 a 163
pessoas por localidade
N° mínimo e máximo de
15 a 265 1 a 233 2 a 252
pessoas por localidade
Figura 29 - Taxa média geométrica de crescimento anual por localidades de terra firme e
várzea - Período 2002 a 2011.
Açaituba | 1,3
Ebenézer | 6,0
B. E. do Japurá (Sítio Boa Esperança) | 8,7
Manacabí | 9,8
-12 -8 -4 0 4 8 12
Matuzalém | -3,4
São José da Messejana | -3,1
Jubará | 4,4
Boa Esperança | 5,0
© Bruno Kelly
> = 90 Masculino
85 a 89
80 a 84
75 a 79
70 a 74
65 a 69
60 a 64
Faixa etária
55 a 59
50 a 54
45 a 49 Idade mediana Idade mediana
40 a 44 das mulheres: dos homens:
35 a 39 14 anos 15 anos
30 a 34
25 a 29
20 a 24
15 a 19
10 a 14
5a9
0a4
25 20 15 10 5 0 5 10 15 20 25
Percentual (%)
B. Várzea Feminino
> = 90 Masculino
85 a 89
80 a 84
75 a 79
70 a 74
65 a 69
60 a 64
Faixa etária
55 a 59
50 a 54
45 a 49 Idade mediana Idade mediana
40 a 44 das mulheres: dos homens:
35 a 39 12 anos 13 anos
30 a 34
25 a 29
20 a 24
15 a 19
10 a 14
5a9
0a4
25 20 15 10 5 0 5 10 15 20 25
Percentual (%)
> = 90 Masculino
Figura85
31 a- 89
Pirâmide etária da população da terra firme e várzea – Ano de 2006.
80 a 84
75 a 79
70 aA. 74Terra Firme
Feminino
65 a 69
60
>= a 90
64 Masculino
Faixa etária
55 a
85 a 8959
50 a
80 a 84
54
45
75 aa 49
79 Idade mediana Idade mediana
40 a
70 a 7444 das mulheres: dos homens:
35 a
65 a 6939 13 anos 16 anos
30 a
60 a 6434
Faixa etária
25
55 aa 29
59
20
50 a 24
a 54
15 aa 49
45 19
Idade mediana Idade mediana
10 aa 44
40 14
das mulheres: dos homens:
355aa39 9
13 anos 16 anos
300aa34 4
25 a 29 25 20 15 10 5 0 5 10 15 20 25
20 a 24 Percentual (%)
15 a 19
10 a 14
5a9
0a4
25 20 15 10 5 0 5 10 15 20 25
Percentual (%)
B. Várzea Feminino
> = 90 Masculino
85 a 89
80 a 84
75 a 79
70 aB.74Várzea Feminino
65 a 69
60
>= a 90
64 Masculino
Faixa etária
55 a 59
85 a 89
50 a
80 a 84
54
45 a 49
75 a 79 Idade mediana Idade mediana
40
70 aa 44
74 das mulheres: dos homens:
35 a 39
65 a 69 13 anos 15 anos
30 a 34
60 a 64
Faixa etária
25
55 aa 29
59
20
50 aa 24
54
15 a
45 a 4919
Idade mediana Idade mediana
10 a
40 a 4414
das mulheres: dos homens:
5 a
35 a 39 9 13 anos 15 anos
300aa34 4
25 a 29 25 20 15 10 5 0 5 10 15 20 25
20 a 24 Percentual (%)
15 a 19
10 a 14
5a9
Fonte: IDSM/ Levantamentos Sociodemográficos, 2006.
0a4 Nota: Terra firme - N= 1.839 moradores; Várzea-N: 1.361 moradores.
25 20 15 10 5 0 5 10 15 20 25
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ 199
Percentual (%)
A. Terra Firme Feminino
> = 90 Masculino
Figura 32 - Pirâmide etária da população da terra firme e várzea – Ano de 2011.
85 a 89
80 a 84
75 a 79
70 aA. 74Terra Firme
Feminino
65 a 69
60>=a 90
64 Masculino
Faixa etária
55 a
85 a 8959
50 a
80 a 84
54
45
75 a a 49
79 Idade mediana Idade mediana
40 a
70 a 7444 das mulheres: dos homens:
35 aa 69
65 39 14 anos 15 anos
30 a
60 a 6434
Faixa etária
25
55 a a 29
59
20
50 a 24
a 54
15 aa 49
45 19
Idade mediana Idade mediana
10 aa 44
40 14
das mulheres: dos homens:
355aa399
14 anos 15 anos
300aa34 4
25 a 29 25 20 15 10 5 0 5 10 15 20 25
20 a 24 Percentual (%)
15 a 19
10 a 14
5a9
0a4
25 20 15 10 5 0 5 10 15 20 25
Percentual (%)
B. Várzea Feminino
> = 90 Masculino
85 a 89
80 a 84
75 a 79
70 aB. 74Várzea Feminino
65 a 69
60 a 90
64 Masculino
Faixa etária
>=
55 a
85 a 8959
50 a
80 a 8454
45
75 aa 49
79 Idade mediana Idade mediana
40 a
70 a 7444 das mulheres: dos homens:
35 a
65 a 6939 13 anos 17 anos
30 a
60 a 6434
Faixa etária
25
55 aa 29
59
20
50 aa 24
54
15 aa 49
45 19
Idade mediana Idade mediana
10 aa 44
40 14
das mulheres: dos homens:
355aa39 9
13 anos 17 anos
300aa34 4
25 a 29 25 20 15 10 5 0 5 10 15 20 25
20 a 24 Percentual (%)
15 a 19
10 a 14
5a9
Fonte: IDSM/ Levantamento sociodemográfico, 2011.
0a4 Nota: Terra firme: 1.714 moradores; várzea: 1.321.
25 20 15 10 5 0 5 10 15 20 25
200 SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Percentual (%)
Mortalidade Infantil 29 a 70 anos, estimulando suas atividades
de apoio ao acompanhamento de gestan-
A taxa de mortalidade infantil é conside- tes nas comunidades e no encaminhamento
rada um indicador sintético, por conden- para o atendimento pré-natal nos centros
sar informações relativas aos cuidados com urbanos vizinhos.
a saúde infantil relacionadas às políticas
educacionais de saúde e saneamento, uma Os dados para a totalidade da RDSA no ano
vez que a sua redução está diretamente li- de 2010, apresentados na Figura 33 a seguir,
gada a investimentos sociais nessas áreas. mostram uma redução nas taxas de morta-
Nesse sentido, é um importante indicador lidade infantil em relação aos levantamen-
das políticas sociais associadas à qualidade tos demográficos realizados em anos ante-
de vida das populações. Nos países desen- riores, em 2001 a taxa era de 38/1000, re-
volvidos, as taxas ficam em torno de três a duzindo para 24/1000 em 2010. Esses dados
quatro óbitos por mil nascidos vivos, en- comparativos revelam a importância das
quanto nos países em desenvolvimento ações continuadas de saúde comunitária
os índices sobem para mais de 100. Neste para a obtenção de resultados favoráveis na
sentido, a redução das altas taxas de mor- redução das causas sociais da mortalidade
talidade encontradas nesses países é uma infantil, cuja taxa ainda se apresenta mais
das metas dos Objetivos do Milênio da ONU alta do que a nacional e a estadual.
(UNDP/PNUD, 2014).
30
27,1
25 24,9 25,7 26
21
20 20,6
20,4
15 16
10
0
2001* 2005* 2010*
Ano
0,4
2011
1,0
0,3
-
Fraternal
Monoparental-avô
0,5
0,7
0,4
1,3
0,3
-0,9
Monoparental-mulher
Monoparental extensa-mulher
0,4
0,4
2,0
0,7
2,3
Unipessoal
Monoparental extensa-homem
- 2,5
0,4
Grupo domésticos
2,6
1,0
1,8
Monoparental-homem
-
Fraternal
1,4
0,7
3,0
1,3
5,4
Casal
0,9 5,3
Monoparental-mulher 0,43,6
2,0
27,6
Extensa
Unipessoal
2,3
2,5
2,6
26,1
24,1
61,5
Nuclear
1,8
Monoparental-homem 1,4
3,0
62,2
61,1
5,4
Casal 0 5,3
3,6
20 40 60 80 100
27,6
Extensa 26,1
24,1
Percentual (%)
61,5
Nuclear 62,2
61,1
0 20 40 60 80 100
Percentual (%)
B. Várzea 2002
2006
Monoparental-homem
-
0,4
-
2011
-
B. Várzea Monoparental-avô -
- 2002
-
Nuclear -
0,5
2006
Grupo domésticos
0,7
Não parental
Monoparental-homem
-1,7
0,4
1,4
-
2011
-0,7
Monoparental-mulher
Monoparental-avô -1,7
-1,4
-
Monoparental extensa-homem
Nuclear
-0,4
-1,4
0,5
-
Grupo domésticos
NãoFraternal
0,7
parental -
1,7
2,3
1,4
5,9
Casal
Monoparental-mulher
0,7
1,7
1,7 5,4
1,4
13,7
Extensa
Monoparental extensa-homem
-
0,4 25,3
25,7
1,4
75,8
Unipessoal
Fraternal
-
-
2,3 57,7
63,3
5,9
Casal 1,7
0 5,4
20 40 60 80 100
13,7
Extensa 25,3
25,7
Percentual (%) 75,8
Unipessoal 57,7
63,3
Percentual (%)
Localização % em 2010
60
50 46 51
40 37
Percentual
32 31
30 31
27
22
20 23
10
0
2002 2006 2011
Ano
Sabe ler bem Sabe ler com dificuldade Não sabe ler
Terra Firme
60
50 47
43
40
Percentual (%)
35 34
32 33
30 27
26
23
20
10
0
2002 2006 2011
Ano
Várzea
60
55
51
50
40 39
Percentual (%)
30 31
30 27 28
22
20 17
10
0
2002 2006 2011
Ano
Sabe ler bem Sabe ler com dificuldade Não sabe ler
80
75
70 67
64
63 62
60 60
54 53
50 49
Percentual (%)
44 44
39 39 41 41 41
40 38 38
34 33
32
29 30
30 27 26
25 24 24
22 24 22 23
21 21 21 21
20 18 18
16 17
14
13 13 12
10 8
0
2002 2006 2011 2002 2006 2011 2002 2006 2011 2002 2006 2011 2002 2006 2011
10 a 14 15 a 29 30 a 49 50 a 59 > = 60
Ano
Não sabe ler Sabe ler bem Sabe ler com dificuldade
Na várzea houve uma redução de 12 p.p de 33 p.p entre os que sabem ler bem. Para
entre os que não sabem ler na faixa etária a população de 60 anos e mais houve uma
de 10 a 14 anos, e um crescimento de 12 p.p redução de 15 p.p entre os que não sabem
entre os que sabem ler bem. Na faixa etária ler e um aumento de 19 p.p entre aqueles
de 15 a 29 anos observa-se um crescimento que leem com dificuldade.
70
60 63 61 59
53 54
50
50
Percentual (%)
46
45 43
42 43
39 39 41 42 39 40
40
36 36
31 32 32 30 30
29
30 28
24 24 24 25
21 22 21 22 21 21
20 18 17 17 18
16 16
10 6 6
0
2002 2006 2011 2002 2006 2011 2002 2006 2011 2002 2006 2011 2002 2006 2011
10 a 14 15 a 29 30 a 49 50 a 59 > = 60
Ano
Não sabe ler Sabe ler bem Sabe ler com dificuldade
Os dados demográficos coletados nos anos O fluxo de migração de indivíduos com destino
de 2002, 2006 e 2011 registraram os fluxos a áreas urbanas foi registrado em proporções
de saída de indivíduos das localidades da
mais significativas que o fluxo em direção a
RDSA no ano anterior à aplicação dos cen-
sos (2001, 2005 e 2010). Ao se relacionar os outras localidades rurais. No ano de 2001, en-
registros de saídas de indivíduos da Reser- tre os migrantes que saíram, 65% se destina-
va com o total da população, obteve-se que, ram às áreas urbanas. Em 2005, foi observada
nos anos de 2001 e 2005, uma parcela de 3% uma pequena redução nesse fluxo, estimado
dos habitantes deixou seus lugares de ori- em 54% dos registros. No ano de 2010, 62%
gem com destino às áreas urbanas ou a ou- (área parcial) e 64% (área total) dos fluxos
tras localidades rurais. No ano de 2010, as
migratórios ocorrerem com destino às áreas
saídas de indivíduos corresponderam a 1%
do total da população. A Tabela 6 apresenta urbanas. O gráfico apresentado na Figura 39
a relação dos registros de saída com o total ilustra a relação entre os destinos dos fluxos
da população nos respectivos anos. individuais nos três anos respectivos.
Tabela 6 - Migração individual com relação à população total. Anos de 2002, 2006 e 2011.
Saída (N) 91 89 45 49
População Total (N) 2.720 3.259 3.544 3.860
% saída com relação ao total 3 3 1 1
Figura 39 - Gráfico de relação percentual entre os destinos escolhidos. Anos¹ de 2001, 2005,
2010 e 2010 .
Urbana Rural
100%
90%
70%
Percentual (%)
60%
50%
40%
20%
10%
0%
2001 2005 2010 2010*
Ano
Figura 40 - Fluxo de saída de indivíduos por setores da RDSA com destino às áreas urbanas -
Anos de 2006 a 2010 (N= 82).
Figura 41 - Distribuição percentual por faixa etária de indivíduos que saíram da RDSA - Anos
de 2001, 2005, 2010 e 2010*.
100%
9% 2%
90% 19% 9%
55% 6%
3%
80% 8%
70%
9%
Percentual (%)
21%
60% 5%
21% 8%
50% 54%
40% 13%
19%
30% 6%
33%
20% 24% 7%
22% 11%
10% 32% 4%
0%
< = 14 15 a 20 21 a 25 26 a 30 31 a 50 > 50
Ano
Fonte: IDSM/ Levantamentos sociodemográficos, 2002, 2006 e 2011
Amostra: 2001 (N=74); 2005 (N=72); 2010 (N=43); e 2010*(N=47).
* Área total, exceto região do Unini.
Figura 42 - Distribuição percentual dos moradores da RDSA que saíram das localidades por
grupos de idade e sexo – Anos 2001, 2005, 2010 e 2010*.
100%
13% 6% 11% 8% 10%
90% 21%
25% 26%
80%
30% 39% 40%
70%
27%
Percentual (%)
60%
38% 36% 69%
74%
50%
23%
40% 18%
34% 31%
30% 17% 7%
12%
25%
20% 8%
10% 20% 9% 4%
2% 15% 5% 8%
10% 7% 10%
8% 11% 8%
6% 5% 7% 8% 4%
0% 2% 3%
Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino
< 14 15 a 20 21 a 25 26 a 30 31 a 50 > 50
80
74% 75% 75%
73% 73%
70
63%
61%
Percentual (%)
60
55% 58%
54%
50% 50%
50
45% 46%
42%
39%
40 38%
30 27% 27%
26% 25% 25%
20
15%
10
0
Áreas Outras Áreas Outras Áreas Outras Áreas Outras
urbanas localidades urbanas localidades urbanas localidades urbanas localidades
rurais rurais rurais rurais
2001 2005 2010 2010*
Áreas de destino
Para efeito comparativo, foram seleciona- ra igualitária (50% para as áreas urbanas
das essas categorias de análises referente e 50% para localidades rurais). No ano de
aos motivos de saídas que foram comuns 2005, procurar emprego em áreas urbanas
nos anos 2001, 2005 e 2010. Dentre a mos- se sobrepõe a busca de trabalho em áreas
tra analisada, nos anos de 2001 e 2010, tanto rurais, somando 74% dos casos. No ano de
na área parcial quanto na área total, as pes- 2010, essa distribuição se mantém, sendo
soas que saíram para casar se destinaram a verificadas 75% de migrações para áreas
outras localidades rurais, correspondendo urbanas visando encontrar emprego.
a 55%, 58% e 54% respectivamente. Em
2005, a situação se inverte, mostrando que O motivo ‘acompanhar os pais’, marido ou
os deslocamentos para contrair casamento
esposa, aparece entre os três mais registra-
tiveram como destino áreas urbanas, com
dos, e somente no ano de 2005 representou
63% do total de saídas.
61% das saídas rumo a outras localidades
rurais, enquanto que as áreas urbanas re-
Os registros de saídas dos moradores com presentaram o destino de 39% dos morado-
o objetivo de estudar fora da comunidade res que saíram por esse mesmo motivo.
correspondem aos levantamentos efetu-
ados nos anos de 2001 e 2010. A maioria,
com destino às áreas urbanas, ocorreu no
ano de 2001, perfazendo 85% do total de
registros, enquanto que no ano de 2010 Os Motivos de Saída por Categoria de Sexo
(área total e área parcial) esse mesmo mo-
vimento passa a representar 75% das mi- Na distribuição dos principais motivos de
grações em ambas as áreas, verificando-se saída dos indivíduos segundo a categoria
uma relativa redução. sexo, observa-se que nos três anos conse-
cutivos as mulheres saíram mais por mo-
Em 2001, os destinos mais procurados pelos tivo do casmento em relação aos homens.
moradores que saem da Reserva por razões Essa situação se inverte quando o motivo
de trabalho estão distribuídos de manei- de saída é a busca de emprego, os homens
Conclusões
INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL MAMIRAUÁ (IDSM). Plano
de gestão Reserva de Desenvolvimento
Sustentável Mamirauá. Tefé: IDSM, 2010. 2 v.
Introdução Métodos
Ambiente %
Várzea 37
Terra Firme 58
Misto (Várzea e Terra Firme) 5
1
Os dados apresentados se referem ao ano de 2010, quando as produções agrícola e pesqueira provavelmente tiveram resultados “atí-
picos”, devido às perdas provocadas pela alagação de 2009 e pela diminuição na disponibilidade de manivas para novos plantios no
ano seguinte. Ademais, em anos de grandes cheias, as famílias precisam “desmanchar” as roças mais cedo, o que impacta na produ-
tividade, já que as batatas da mandioca não chegam a amadurecer plenamente. Tudo isso, possivelmente, gerou impactos no ‘fábrico’
da farinha em 2010, sobretudo nas áreas de várzea. A grande seca de 2010, por sua vez, também dificultou o acesso aos lagos, onde é
realizada a pesca de pirarucu e tambaqui, espécies especialmente importantes para a economia local.
100%
90% 89%
80%
75%
70%
63%
60% 60% 59%
57%
51%
50%
46%
40%
34% 31%
30%
24%
20%
16%
11% 11%
10%
5%
3% 3% 1%
0%
do
ta qui
aí
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as
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Cr
Pe
Co
Pe
tr
ão
s
de
Ex
de
Pe
aç
o
ça
tr
iv
Ex
Ca
lt
Cu
Caça 2,2
Coleta 0,3
Cultivo 38,1
Pesca 21,6
Criação 1,1
Trocas 5,3
Mercado (compra) 31,5
Fonte %
Pesca 15
Agricultura 15
Extrativismo 1
Madeira 0
Artesanato 2
Criação 2
Benefícios 43
Comércio 3
Caça 0,02
Salários/serviços 19
A Tabela 10, a seguir, mostra a diferenciação na contribuição das atividades por tipo de ambiente.
Rendimentos Médios
A renda média per capita mensal dos domicílios da RDSA em 2010 foi estimada em R$ 154 (±
148), conforme ilustra a Tabela 11, a seguir.
Tabela 12 - Rendimentos médios anuais dos domicílios da RDSA por atividade produtiva e por
ambiente - 2010 (em R$).
Na RDSA, 40% dos domicílios declararam ter médios domiciliares (Tabela 8). Os principais
a agricultura como sua principal fonte de ren- benefícios sociais recebidos pelas famílias da
da. Apesar dos benefícios também contribuí- amostra estudada foram a aposentadoria ru-
rem com quase a metade do total de ingressos ral, a bolsa família, a bolsa floresta e o seguro
domiciliares, apenas 15% das famílias infor- defeso (Tabela 13).
mam ser esta a sua principal fonte de renda, o
que é indicação da importância das atividades Em termos demográficos, a idade do che-
produtivas para a constituição da identidade
fe é a variável demográfica mais importante
econômica das mesmas.
na determinação da renda domiciliar. Casas
com chefes mais jovens tendem a uma ren-
da mais baixa, enquanto a de chefes a partir
de 55 anos mostram uma renda mais elevada.
Benefícios Sociais Tal fato se deve principalmente à importância
e influência das aposentadorias no orçamento
Entre as conquistas sociais estabelecidas pela dos domicílios (PERALTA e LIMA, 2013).
Constituição Federal de 1988, estão a univer-
salização do acesso às aposentadorias e o es-
A aposentadoria é o benefício social que mais
tabelecimento de benefícios não contributi-
contribui com os rendimentos domiciliares,
vos no sistema de assistência social, como os
programas de transferência de renda condi- chegando a compor 23% da renda total fami-
cionada, destinados às famílias em condições liar da RDSA. A partir da universalização da
de vulnerabilidade socioeconômica (PERAL- aposentadoria rural, os chefes de família mais
TA e LIMA, 2013). idosos, com sua força de trabalho já limitada,
puderam abrir mão da produção agrícola sem
A grande maioria dos domicílios da RDSA que o comprometimento do sustento familiar,
participaram do estudo sobre a economia fa- graças aos benefícios do governo. Entretan-
miliar recebeu bolsa floresta ou bolsa família, to, mesmo entre as famílias com membros
perfazendo 82% do total amostrado. Como foi aposentados a produção agrícola voltada ao
visto, a soma dos benefícios sociais recebidos próprio consumo é mantida, uma vez que o
tem um peso considerável no orçamento do- estudo não encontrou indícios da associação
méstico e representa 43% dos rendimentos entre a aposentadoria e a compra da farinha.
Benefícios %
Aposentadoria 23
Bolsa família 9
Bolsa floresta 5
Pensão 1
Salário maternidade 1
Seguro defeso 4
Rendimento dos Domicílios que Participam não está associada à diminuição da autos-
de Projetos de Manejo suficiência das famílias em termos de pro-
dução de farinha para o consumo próprio.
Na região do Médio Solimões, projetos de As informações sobre valores anuais dos
manejo de recursos naturais foram imple- rendimentos domiciliares por atividades de
mentados junto às comunidades, com as- manejo diversas são apresentadas na Tabela
sessoria técnica do Instituto de Desenvol- 14, juntamente com a renda proveniente de
vimento Sustentável Mamirauá (IDSM) e outras fontes.
outras instituições, como o Instituto Chico
Mendes (ICMBio) e o Instituto de Desenvol-
vimento Sustentável de Fonte Boa (IDS Fon-
te Boa). Na região da RDSA, estes projetos
são principalmente aqueles assessorados
pelo IDSM, desenvolvidos com foco no ma-
nejo de pesca do pirarucu e de espécies or-
namentais, e no manejo de recursos flores-
tais não madeireiros visando a produção de
artesanato. Do total de domicílios estudados
(n=245), apenas 32% declararam participar
de atividades de manejo de recursos natu-
rais. Os domicílios envolvidos em atividades
de manejo participativo apresentaram ren-
dimentos em média mais altos. Essa dife-
rença não se mostrou significativa com re-
lação aos rendimentos totais. Entretanto, os
rendimentos provenientes da pesca foram
substancialmente diferentes entre os dois
grupos de domicílios (p < 0,05). Outro dado
importante revela que não foi observada di-
ferença significativa entre as despesas mé-
dias dos dois grupos, embora os domicílios
que participam do manejo tenham gastos
per capita mais altos com o “rancho”2.
2
Termo regional para o conjunto de mercadorias de alta reposição, principalmente alimentos e artigos de limpeza e higiene.
Tabela 15 - Despesas médias domiciliares da RDSA por ambiente - 2010 (em R$).
Benefícios %
Fogão 91%
Motor rabeta 85%
Televisão 75%
Cama 52%
Freezer ou geladeira 38%
Motor de luz 26%
Motosserra 20%
Celular 12%
Motor de centro 10%
Máquina de lavar 6%
Casa na cidade 11%
Conclusão
De acordo com o histórico de ocupação hu- tanto aquelas situadas dentro dos limites da
mana da Reserva de Desenvolvimento Sus- Reserva quanto aquelas que estão fora des-
tentável Amanã (RDSA) (ALENCAR 2007; ses limites, mas ainda assim reconhecidas
2009; ALENCAR e SOUSA, 2012), em 1998,
e classificadas como usuárias. Todas com-
quando a Reserva foi decretada, muitos dos
partilham dos recursos naturais pertencen-
assentamentos humanos da região do Mé-
dio Solimões já adotavam o modelo de or- tes a um mesmo território, situado na área
ganização proposto pela igreja católica e delimitada pela UC e/ou no seu entorno, to-
pelas administrações municipais, se orga- mando decisões sobre o uso desses recursos
nizando em comunidades. Esse modelo de e participando da gestão desse mesmo ter-
integração social e político, que represen- ritório (MOURA et. al., 2016).
ta oficialmente os moradores, inaugurou
para os ribeirinhos a convivência com a re-
Na área da RDSA, os setores lago Amanã,
presentação delegada em diferentes níveis
(NEVES, 2005). Em um primeiro plano, o Paraná do Amanã, São José, Coraci e Casta-
líder da comunidade representa os mora- nho têm seus respectivos territórios total-
dores junto às lideranças de outras comu- mente localizados no interior da RDSA. Os
nidades de um setor, que por sua vez é de- setores Caruara e Tijuaca têm parte de suas
limitação geográfica e política de um grupo áreas também situadas na RDS Mamirauá. O
de comunidades localizadas próximas umas território do setor Joacaca abrange parte da
das outras. Em um plano de maior ampli-
ilha do Mojuí, que fica na fronteira entre a
tude de relações sociais, esse líder tanto é
RDS Mamirauá e a RDSA (ALENCAR, 2007,
reconhecido internamente, como pelos de-
mais líderes das outras comunidades, assim 2009; ALENCAR e SOUSA, 2012). E no setor
como por representantes de instituições Unini, o território das comunidades abran-
governamentais e não governamentais ex- ge parte da RESEX Unini, sendo que apenas
ternas (NEVES, 2005). Neste sentido, além uma delas está localizada na área da RDSA
da organização interna das comunidades, e (FIGUEIREDO, 2005).
seguindo o modelo católico, estas também
se filiam politicamente a setores, de forma
Além da comunidade e dos setores, a estru-
a facilitar a tomada de decisões políticas da-
quele grupo com relação a vários assuntos tura de organização social na RDSA compre-
de interesse daquela região, entre os quais ende outras instâncias de deliberação, como a
está incluído o uso dos recursos naturais. Assembleia Geral dos Moradores e o Conselho
Essa forma de organização social e políti- Gestor. O conselho é composto por represen-
ca se mantém ainda hoje e contribuiu sig- tantes dos moradores, mas também por en-
nificativamente no processo de construção viados de instituições governamentais e da
do modelo de gestão participativa da RDSA
sociedade civil. Todos constituem fóruns de
(MENDONÇA, 2010).
participação e deliberação da população local,
onde são discutidos assuntos de interesse ge-
Os setores correspondem a um determinado
território político, agrupando comunidades ral em seus vários níveis de representação. A
que estão em uma mesma área geográfica Figura 45, abaixo, ilustra estrutura de organi-
de vizinhança, sendo que aí estão incluídas zação política da Reserva e as suas instâncias.
Conselho gestor
deliberativo
Assembleia
geral
Reuniões
setoriais
Reuniões
comunitárias
No Setor Associações
CONTINUA...
No Setor Associações
Os moradores da RDSA, bem como os da volvido com apoio de AAVs, foi reaplicado
região de modo geral, têm se utilizado da na RDSA a partir de 1997, com a capacita-
organização comunitária como ferramenta ção da primeira turma. No período de 1997
para proteger os recursos naturais em seus a 2011, foram treinados 44 agentes ambien-
territórios de uso. Desde o início dos traba- tais pelo Instituto Brasileiro do Meio Am-
lhos de implantação da Reserva, a necessi- biente e dos Recursos Naturais Renováveis
dade de proteção dos recursos foi externada (IBAMA), com apoio financeiro do Insti-
por representantes dos moradores. Ao longo tuto Mamirauá. Após concluir os cursos,
dos anos, algumas ações foram desenvolvi- os agentes recebiam a credencial que lhes
das para atender parte dessa demanda, ba- conferia autoridade para apreensão de pro-
seando-se principalmente nas experiências dutos de extração indevida e equipamentos
de fiscalização dos agentes ambientais vo- de infratores, podendo lavrar os respectivos
luntários (AAVs), empreendidas na região autos de constatação, e os termos de reten-
da RDS Mamirauá a partir de 1995. ção e de doação de produtos ilegais. A Tabela
17, sintetiza o número de agentes ambien-
O trabalho de proteção ambiental, desen- tais formados por ano durante esse período.
Setores Nº de AAVs
Boa União 03
Caruara 07
Coraci 04
Joacaca 04
Lago Amanã 07
Paraná do Amanã 08
São José 04
Tijuaca 07
Total = 08 setores 44 AAVs
MENDONÇA, M. Desenvolvimento,
participação e alternativas econômicas: em
discussão manejo de peixes ornamentais
como meio de vida na RDS Amanã (AM).
Dissertação (Mestrado) – Programa de
Pós-Graduação em Ciências Sociais,
Universidade Federal do Pará, 2010.
238
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Seção III:
PADRÕES E
POTENCIALIDADES
DE USO DE RECURSOS
NATURAIS
1
Palmeira usada para confeccionar os cabos que vão sustentar o pano da peneira.
Ecologia, Abundância e Distribuição dos Corantes naturais possuem amplo uso e sig-
RFNM nificado, desde as sociedades indígenas pré-
-colombianas até o presente. Existe um mo-
A partir de 2004, o foco das pesquisas do pro- vimento atual no mercado consumidor “ver-
grama se volta para a ecologia, a abundância de” que valoriza tais produtos naturais, e os
e a distribuição RFNM na área da reserva, a corantes atualmente usados para tingir peças
fim de gerar informações para subsidiar as de artesanato estão também associados ao
Distribuição dos Cauaçuzais no Setor Coraci A área de estudo abrangeu cinco comunida-
des ao longo do paraná do Coraci, sendo Vila
Segundo o estudo feito por Leoni (2013), Nova, São Paulo e Iracema situados em áreas
Calathea lutea, monocotiledônea da ordem de várzea; e São João do Ipecaçú e Matuzalém
Zingiberales, é uma planta pertencente à fa- localizados em ambientes onde predomina a
mília das Marantaceas. Caracteriza-se como terra firme.
uma erva perene rizomatosa de grande por-
te, que atinge aproximadamente 4 metros de O cauaçu ocorre em manchas, comumente
altura, emitindo uma ramificação aérea bem
chamadas de cauaçuzeiros ou cauaçuzais. Sua
desenvolvida. A espécie está presente nos es-
ocorrência está relacionada a áreas anterior-
tágios iniciais da sucessão secundária nas áre-
as de várzea e coloniza predominantemente mente de cultivo, especificamente as roças de
áreas de roças liberadas para a sucessão no mandioca. Foram levantados 41 cauaçuzais ao
território que abrange as cinco comunidades longo da área de estudo (Figura 47). Em 2006,
do setor Coraci, ou seja, ocorre na forma de foram mapeados onze na Vila Nova, treze no
touceiras e cresce em restingas altas nos locais São Paulo, oito em Iracema, sete em São João
abertos para a prática de atividades agrícolas. e dois em Matusalém.
Fonte: IDSM/2011.
Distância dos
cauçuzais em
Área total de relação às
Cauaçuzais (N) Área cauaçuzal (ha)
Comunidade cauaçuzais comunidades
2004*/ 2006 Média ± SD (km)
(ha / % do total)
Média ± SD
(min./max.)
Tabela 21 - Número de touceiras e talos maduros de C. lutea por área de uso nas comunidades
do setor Coraci.
Disponibilidade anual
Área total de No. de touceiras
Comunidade de talos maduros
Cauaçuzal Média (SD)
Média (SD)
Tabela 22 - Número de touceiras e talos maduros de cauaçu por área de uso de comunidades
no setor Coraci.
Número de Artesãs 32 23 23 21 21
Renda Total Gerada (US$)* 11,790,00 7,283,3 11,763,00 15,335,00 13,934,00
Renda Média por Pessoa 368,4 316,6 511,4 730,2 663,5
2
Nos anos de 2009 e 2012, ocorreram dois eventos de grandes cheias na região, provocando o alagamento de praticamente todas as
terras do setor Coraci na RDSA. Toda a vegetação de várzea alta e os cauaçuzais existentes foram inundados por um período mais longo.
As touceiras de cauaçu “apodreceram”, os talos ficaram encharcados e tombaram. As grandes concentrações de população de cauaçu
encontradas no setor sofreram redução drástica, afetando a produção do artesanato local. Com a pouca disponibilidade de cauaçu, as
artesãs passaram a trabalhar com o Arumã (Ischnosiphon spp).
A pesca praticada na área de várzea da RDSA (Cichla sp), jaraqui (Semaprochilodus spp.),
é uma importante atividade econômica, pacu (Piaractus mesopotamicus), acará-açu
principalmente para os moradores das mar- (Astronotus spp.), aracu (Leporinus fridericie) e
gens dos paranás Amanã, Coraci, Pirataíma, a curimatã (Prochilodus nigricans).
Tambaqui, Cubuá e do rio Japurá. A ativida-
de pode ser desenvolvida no âmbito familiar Os dados apresentados neste texto são re-
ou coletivo, dependendo dos objetivos dos sultados de uma revisão dos levantamentos
pescadores. As comunidades do entorno do bibliográficos encontrados em relatórios de
lago Amanã, que têm na agricultura a prin- pesquisa, artigos e dissertações, em regis-
cipal fonte de subsistência, quando decidem tros de reuniões promovidas para discussão
fazer um ajuri, por exemplo – reunião de e implementação de projetos de manejo de
um grupo de moradores para realizar um pesca e de relatórios de monitoramento da
plantio, colheita ou limpeza de roça – or- pesca de pirarucus, elaborados pela equipe
ganizam eventos de pesca para alimentação técnica do Instituto Mamirauá. A área de es-
do grupo envolvido no trabalho (ARAÚJO, tudo compreende a porção da RDSA situada
2006). Por ocasião de outras atividades de em ambientes de várzea (Figura 48).
caráter comunitário – festividades, reu-
niões religiosas ou políticas, etc. - que en-
volvem um grande número de visitantes,
o grupo responsável pela organização do
evento realiza uma pescaria com objetivo de
alimentar os participantes. Em outras oca-
siões, a pesca é realizada para alimentação
das famílias locais (ARAÚJO, 2006).
Ano Unid. Kg
O desligamento
Ebenezer, Vila Nova, Iracema,
de Ebenezer, em
Coraci 22.355,66 São Paulo, Matuzalém, Nova 20.952,72
2007, reduziu a área
Canaã e São João do Ipecaçú.
inicialmente manejada
CONTINUA...
As comunidades de
Santa Isabel e Nova
Santa Isabel, Nova Olinda, São
Olinda desligaram-se
Sebastião do Repartimento,
São José 15.897,14 9.693,83 do projeto de manejo,
Várzea Alegre, São José e Nova
com a consequente
Samaria.
redução da área zoneada
inicialmente.
1
Contador certificado é aquele que teve sua contagem validada por uma certificação, quando todos os indivíduos do lago, acima de
1,50 cm, são retirados por meio de arrastão, tendo as suas medidas aferidas. Assim, as estimativas dos contadores são comparadas
ao número real de indivíduos capturados a partir do arrasto, com a avaliação do desempenho e do grau de erro destas mensurações.
(ARANTES et al., 2006).
Sistemas 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
Coraci 604 1.905 2.004 1.944 2.277 3.550 2.999 3.006 5.073
Pantaleão 1.254 4.595 4.712 6.411
Paraná Velho 941 1.257 1.884 2.540
São José 685 2.049
Outro fator que influencia diretamente a O processo inverso também pode acontecer,
análise dos dados de contagem é o ingres- quando há o desligamento de uma comuni-
so ou a saída de comunidades dos grupos dade. Nos sistemas de Amanã, por exemplo,
de manejo, pois, quando uma comunidade essa situação ocorreu com a saída da comu-
passa a fazer parte do acordo para aquela nidade Ebenezer – sistema Coraci, em 2007
-, e com o ingresso da comunidade Novo Pi-
área, os lagos por ela utilizados diretamente
rapucu no acordo de pesca do Pantaleão, em
passam a ser disponibilizados para o manejo
2011. Portanto, só é possível afirmar que há
do grupo, elevando o número de ambientes crescimento ou declínio de uma população
a serem monitorados e, consequentemente, de pirarucus em determinado sistema de
o número de peixes a serem contabilizados, manejo quando a análise dos dados de con-
o que não significa necessariamente o cres- tagem é feita ao longo dos anos e considera
cimento da população. as vicissitudes desse contexto.
10.000
8.719 8.438
8.000
6.828 6.777
6.411 6.119 6.026
6.000 5.869
5.535 5.570
Número
5.073 5.082
4.999
4.712 4.479 5.004
4.595 4.527
4.146 5.128 4.093
5.130
4.590
4.000 3.550
3.367 3.837
3.796
4.571
2.999 3.006
3.873 4.176
2.540
2.277 2.048
2.004 2.841
1.905 1.944 3.670 3.528 3.667
1.884
2.000 1.257 2.120
2.049
941
604
1.254
0 685
2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017
Ano
A classificação dos estádios de maturação de Ao longo de oito anos, 2009 a 2017, foram
indivíduos da espécie amostrados nos siste- amostradas as gônadas de 2.296 fêmeas
mas de lagos da RDSA tem por parâmetro as da RDSA, o que representa 4% das fêmeas
descrições morfológicas das gônadas de pi- capturadas no manejo. A razão sexual obti-
rarucus (Arapaima gigas Schinz, 1822) estu- da durante esse período foi de 1:1,03, sendo
dados na RDS Mamirauá por Lopes e Quei- que as fêmeas sexualmente ativas repre-
roz (2009). A classificação foi determinante sentaram 60% das fêmeas analisadas (Ta-
para reinterpretar os resultados de estudos bela 27).
Tabela 27 - Proporção sexual dos pirarucus (Arapaima gigas) manejados e frequência das
fêmeas ativas amostradas nos sistemas de manejo comunitário da RDSA, entre 2009 e 2017.
Ano 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017
Animais
1243 1564 1608 1369 1826 1353 1123 969 2017
capturados
Número
de áreas de 3 3 3 3 4 3 2 4 4
manejo
Razão sexual
1:0,95 1:0,95 1:1,00 1:0,87 1:0,98 1:0,00 1:0,90 1:1,06 1:1,11
(M:F)
Porcentagem
3,25% 3 ,22% 6,40% 6,16% 2,89% 5,02% 2,87% 2,75% 2,81%
amostrada
Fêmeas
130 150 165 121 102 89 47 40 -
analisadas
Fêmeas
60 78 85 78 55 50 33 24 -
maduras
Freq. Maduras 0,46 0,52 0,52 0,64 0,54 0,56 0,70 0,60 -
Segundo Queiroz (2000), a frequência de fê- fêmeas maduras amostradas nos sistemas de
meas maduras de pirarucu antes das atividades manejo das RDSs Mamirauá e Amanã são se-
do manejo de pesca na RDSM era de 0,66 (pe- melhantes às frequências avaliadas nos estu-
ríodo de 1993 a 1998), enquanto Lopes (2005) dos citados acima. No entanto, as frequências
e Lopes e Queiroz (2009) encontraram frequ- de ocorrência por sistema de manejo apresen-
ência de 0,64, entre 2003 e 2005. A frequência taram uma ampla variação, entre 0,45 no Pan-
de ocorrência média anual (2009-2016) das taleão e 0,79 no Caruara (Tabela 28).
A frequência na ocorrência de fêmeas ma- nessa região foi redefinido em 165 cm para
duras avalia a atividade de recrutamento as fêmeas, e 174 cm para os machos. As
dos pirarucus no estoque dos sistemas mo- informações de comprimento e peso mé-
nitorados ao longo dos anos. A diminuição dio da espécie, assim como comprimento
desta frequência pode ser um indicativo de e peso médio das gônadas (Tabela 29) de-
captura da população juvenil, já que segun- monstram o aumento do tamanho mínimo
do Lopes e Queiroz (2011) o L50 do pirarucu de maturação.
II III
Estádio
I Imatura Maturação Maturação IV Maduro V Desovado Inconclusivo
gonadal
Inicial Avançada
CONTINUA...
Quadro 7 - Espécies de captura autorizada pelo PORA de acordo com o tamanho mínimo e
apetrechos.
Aparelho/ Tamanho Período
Nome
Espécies técnica mínimo de de coleta
popular
recomendado captura (cm recomendado
2
QUEIROZ, H. L.; HERCOS, A. P. Planos de Manejo das Áreas de Coleta de Ornamentais de Amanã. IDSM-ZSL, Tefé/AM. 2009.
Área Localização
Lago Amanã - no curso médio do Igarapé Ubim até após o encontro deste com o Igarapé
1
Ubinzinho.
Lago Amanã - formada pelo curso médio-baixo do Igarapé Cacau, e os cursos baixos dos
2
Igarapés Samaúma e Calafate.
Lago Urini - nos altos cursos dos Igarapés Guariba e Tirirical, e no médio-baixo curso do
3 Igarapé Araueri.
Tamanho
ID Lote Espécie Data venda Destino
Lote
CONTINUA...
Tamanho
ID Lote Espécie Data venda Destino
Lote
3
CRAMPTON, W. G. R. Plano de manejo para o uso sustentável de peixes ornamentais na Reserva Mamirauá. In: QUEIROZ,
Helder L.; CRAMPTON, William, G. R. (Org.). Estratégias Para Manejo dos Recursos Pesqueiros em Mamirauá. 1ed. Brasília,
DF: SCM, CNPq/MCT, 1999, p. 159-176.
Revisão de Literatura
Metodologia
O histórico da produção: grandes momentos
As informações reunidas neste texto são re- de cronologia agrícola local
sultado de pesquisas conduzidas na RDSA
desde o começo dos anos 2000 e da compi- A cronologia de produção agrícola das co-
lação de dados encontrados em relatórios e munidades localizadas no entorno do lago
teses de pesquisas antigas, assim como em Amanã, nas margens dos paranás Amanã,
estudos em andamento. Uma destas pesqui- Coraci e Tambaqui, durante as últimas
sas consiste do monitoramento da dinâmi- décadas, demonstra o caráter flexível e
ca da agricultura migratória, desenvolvido adaptativo deste sistema de produção. A
na Reserva desde 2009 com a participação
agricultura se tornou a principal atividade
de nove comunidades, buscando abranger
econômica das comunidades da região, a
as diferentes realidades encontradas nos
partir principalmente das décadas de 1970
plantios de roça de terra firme e paleovár-
e 1980, após o declínio do sistema extrati-
zea. O monitoramento é realizado em áreas
vista, quando as populações locais passam
agrícolas de comunidades localizadas nos
a investir mais intensamente na produção
setores do Lago Amanã, Paranã do Amanã,
agrícola (ALENCAR, 2010). Nessas comuni-
São José e Coraci, a saber: 1. Boa Esperança;
dades, os relatos da transição de um período
2. Bom Jesus do Baré; 3. Ubim; 4. Boa Vista
no qual predominava o extrativismo para a
do Calafate (incluindo-se a localidade Sítio
fase agrícola, tal como permanece hoje em
São Miguel); 5. Nova Jerusalém; 6. São José
dia, mostram que a combinação ‘mandioca/
da Messejana (incluindo-se Sítio São Fran-
cisco); 7. Nova Samaria; 8. São João do Ipe- produção frutífera’ como principal estra-
caçu, e 9. Matuzalém. As comunidades fo- tégia econômica se desenvolveu a partir da
ram escolhidas em visitas para diagnóstico década de 1980, e mais especificamente nas
e identificação da importância da atividade duas últimas décadas.
agrícola para a população local.
Na década de 1980, a produção comercial
As análises de áreas foram realizadas com se voltava mais intensamente para o cul-
aproximadamente 150 famílias, sendo que, tivo de espécies frutíferas do que para a
nessa amostra, estão incluídos diferen- produção de farinha, especificamente com
tes perfis de comunidades encontradas na a associação do limão e da banana. A de-
RDS. Localizada no setor Lago Amanã, Boa manda e a produção desses produtos eram
Esperança é a maior comunidade em ter- tão altas que os compradores adquiriam os
mos populacionais, com aproximadamente produtos diretamente nas comunidades.
60 famílias, e nela observou-se uma es- O colapso dessas plantações, depois de um
pecialização da atividade agrícola. Já a co- grande ataque fitossanitário, incentivou
munidade de Nova Jerusalém/paraná do a evolução do padrão de produção no sen-
Tambaqui é a segunda maior da área, com tido de reforçar o cultivo da mandioca e de
25 famílias, e apresenta um perfil caracte- sítios mais diversificados. Abacaxi (Ananas
rístico de comunidade de pesca, sendo esta comosus), abacate (Persea americana), açaí
a sua principal atividade, seguida da agri- (Euterpe precatoria e E. oleracea), cupuaçu
cultura. A realização dos estudos também (Theobroma grandiflorum) são hoje as es-
em comunidades menores conferiu uma pécies comerciais dominantes na região do
representação dos diferentes tipos de uso lago Amanã, que complementam a renda
que ocorrem na região. Os resultados são oriunda da venda da farinha. Essa sucessão
representativos do padrão de uso agrícola de escolhas de enriquecimento, substitui-
adotado pelos moradores locais, uma vez ção e transformações das áreas manejadas
que as comunidades estão distribuídas en- ao longo dos anos demonstra a capacidade
tre os dois principais ecossistemas da UC, adaptativa dessas comunidades, adotando
incluindo a terra firme e paleovárzea. estratégias de produção flexíveis às mu-
Atividades J F M A M J J A S O N D
Roçagem
Derruba
Secagem
Queima
Plantio
Capina
Colheita
Replanta
As famílias de agricultores das áreas de ter- Áreas de roças são mantidas de um a três
ra firme/paleovárzea da RDSA iniciam um anos (dois anos, na maioria das vezes),
ciclo produtivo a cada ano, com a abertura formadas por cultivos de ciclo curto, como
de pelo menos um roçado novo. Ao longo do a mandioca (cultivo principal) e outros,
tempo, elas acabam manejando várias áre- tais como: o cará (Dioscorea sp.), a abóbora
as agrícolas em estágio vegetacional e de (Cucurbita sp.), a banana (Musa sp.), mamão
composição botânica diferentes. O manejo (Carica papaya) e batata (Solanum tuberosum
simultâneo de várias parcelas em estágios sp.), os quais também são plantados junto
de regeneração variados proporciona uma com as “manivas” (nome popular da raiz
complementaridade estratégica entre os di- de mandioca). Além de ser a primeira fon-
ferentes produtos agrícolas ao longo do ano. te de carboidrato da alimentação regional
A intensidade de uso de cada área varia con- (ADAMS et al., 2006), a farinha e os deriva-
forme o desenvolvimento e a especializa- dos da mandioca oriunda da roça constituem
ção das famílias e as condições ambientais, também a principal fonte de renda agrícola
como variações entre enchentes ou secas das comunidades da Reserva localizadas na
extremas, que influenciam diretamente na terra firme, e uma das mais importantes
abertura de novas áreas. entre as comunidades de paleovárzea. En-
tretanto, devido às importantes flutuações
Geralmente os agricultores mantêm duas que ocorrem no preço do produto ao longo
roças simultâneas, uma correspondendo à do ano, e de um ano para o outro, a venda de
área de roçado novo, ou recém estabeleci- farinha é complementada pela comerciali-
do, e outra roça madura, do ano anterior; zação de outros produtos dos sítios.
um número variável de capoeiras é mantido
durante a vida ativa das famílias, conforme
a idade dos agricultores (um casal de agri-
cultores, ao longo da vida, vai acumulando Sítios e Capoeiras
um número cada vez maior de capoeiras),
podendo ser de um e quatro sítios. Enfim, Contrariamente à roça, os sítios constituem
uma quantidade importante de hortali- uma forma de uso do solo mais permanente.
ças, plantas medicinais e espécies frutífe- Depois do desmanche da roça (i.e., a colhei-
ras consumidas no dia a dia são plantadas ta dos últimos tubérculos da mandioca), a
nos quintais (ou “terreiros”), geralmente banana e o abacaxi são as primeiras espé-
localizados ao redor das casas, de acesso cies plantadas a produzir frutos. Essa asso-
rápido. Estes últimos, constituem também ciação permite manter os rendimentos das
em espaços de socialização das famílias, lo- famílias durante o crescimento das outras
cais onde são desenvolvidas diversas outras espécies plantadas na antiga área de roçado,
atividades, como preparação de alimentos, como é o caso das palmeiras (açaí, pupunha)
criação de pequenos animais, entre outras e de espécies arborícolas, como o cupuaçu e
(PEREIRA, 2010). o abacate, cuja frutificação acontece dos três
Para este estudo, Santos et al. (2016) defini- Reserva, Boa Esperança, seja em aspectos
ram três classes distintas: vegetação natural populacionais, seja em termos de ocupação
(mata virgem), solo exposto e áreas em uso e uso da área, apresenta resultados de esta-
(roças, sítios, quintais e capoeira). A partir bilidade, logo, as demais se encontram em
da análise dessas três classes, foi possível condições ainda mais favoráveis. Tal fato
estimar a taxa de alteração na paisagem, se deve a que as comunidades localizadas
quantificando as áreas usadas ao longo do na UC não recebem tanta influência de fa-
tempo, bem como visualizando a etapa de tores estruturais, como o acesso a estradas
reutilização de áreas com vegetação secun- e mercados externos (que poderiam gerar
dária em detrimento daquelas com mata maior pressão sobre essas áreas). Além dis-
virgem. De acordo com os autores, as áre- so, o manejo tradicional, aliado à baixa den-
as de vegetação natural convertidas ao uso sidade populacional, favorece as condições
agrícola na comunidade Boa Esperança, ao de sustentabilidade da região. Estas carac-
longo de 25 anos, somaram 493,66 hecta- terísticas particulares podem ser conside-
res. Desse total, a reutilização de áreas já radas elementos que concorrem a favor do
convertidas foi de 151,77 hectares (30% das panorama apresentado.
áreas de uso agrícola), caracterizando assim
um impacto menor sobre a floresta se com-
parado a outras atividades intensivas de uso
do solo, como a fixação de assentamentos,
a abertura de estradas e o estabelecimento
de pastagens para pecuária, como ocorre
na região sul do estado de Rondônia, onde a
fronteira agrícola teve cerca de 90% de per-
da da sua vegetação natural ao longo de 20
anos (BARNI et al., 2012; MARTINS e BAP-
TISTA, 2013; SANTOS et al., 2016).
Organização do Trabalho
30
Quantidade de criadores
25
20
16
14
15
10
5 2
0
Pequenos Médios Grandes Total
Categorias
Tabela 31 - Quantidade e tamanho das áreas de criação de gado amostradas na RDSA com base
no monitoramento realizado em 2014.
Figura 54- Mapa com a distribuição dos criadores por setor e categoria na área estudada da
RDSA em 2014.
800 761
735
700
600 571
Número de Animais
500 446
395
400 327
300 366
200 289
244
100
0
2005 2010 2014
Ano
Figura 56 - Gráfico da relação entre o tamanho do rebanho e área (ha) utilizada na RDSA - Ano 2014.
160
50
140
120 40
100
30
80
60 20
40
10
20
0 0
CP
Z
ET
JG
CP
C
PT
RC
RP
VC
VN
ZI
AF
BG
N
D
H
BV
G
M
Código do criador
Figura 58- Áreas inventariadas para o desenvolvimento do turismo na região do lago Amanã
e principais atributos turísticos.
4
O Centro Vocacional Tecnológico do IDSM visa a capacitação e o aperfeiçoamento técnico de produtores rurais ligados a associações
comunitárias. Dispoiível em: <www.mamiraua.org.br>
Barco, 3h 20 l Manhã 07 h
Passaral do
jabuti de Março a Voadeira, 1h 30 l gasolina pura Tarde 01 h 1h Igarapé do Baré Não
socó azul junho
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Barco 5l Noite 20h
315
CONTINUA...
Quadro 11 - (Continuação)
316
Tempo de Exigência de
Quantidade Turno Horário Duração do Local do
Atrativos Época Transporte deslocamento preparo físico
(por trecho) combustível de saída passeio passeio
dos visitantes
Manhã 07h
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Tarde 5h
Manhã 07h
Tarde 14 h
Manhã 8h e 30
Possibilidade
Igarapé Jua Grande, Barriga
de avistamento Agosto Canoa 2h 10 l gasolina 50 min Azul, Igarapé do Baré, Não
de ariranhas e março Capoeirinha
lontras Tarde 02 h
CONTINUA...
Quadro 11 - (Continuação)
Tempo de Exigência de
Quantidade Turno Horário Duração do Local do
Atrativos Época Transporte deslocamento preparo físico
(por trecho) combustível de saída passeio passeio
dos visitantes
Manhã 07h
Tarde 2h
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
317
CONTINUA...
Quadro 11 - (Continuação)
318
Tempo de Exigência de
Quantidade Turno Horário Duração do Local do
Atrativos Época Transporte deslocamento preparo físico
(por trecho) combustível de saída passeio passeio
dos visitantes
Possibilidade
de avistamento/
focagem Capoeirinha
Setembro a
de anta em Canoa 2 e 30h 10 l gasolina Tarde 2h 6 a 12h Jua grande (igarapé) - local Sim
outubro
chupador Laguinho.
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
“trilha noturna
na floresta”
Canoa Manhã 8h
Acampamento Setembro a Voadeira, 20 min 10 l gasolina pura Tarde 02 h Pernoite ou Ponta do Joari, Igarapé do
Não
na praia novembro algumas horas Baré e Jua grande e Cacau
CONTINUA...
Quadro 11 - (Continuação)
Tempo de Exigência de
Quantidade Turno Horário Duração do Local do
Atrativos Época Transporte deslocamento preparo físico
(por trecho) combustível de saída passeio passeio
dos visitantes
Amanhecer/ A depender da
Ano todo 5 min Lago Amanã Não
entardecer distância do local
Canoa Manhã
Banho no lago Ano todo 5 min 5 l gasolina livre 50 min a 1 h Lago Amanã Não
Voadeira Tarde
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
319
CONTINUA...
Quadro 11 - (Continuação)
320
Tempo de Exigência de
Quantidade Turno Horário Duração do Local do
Atrativos Época Transporte deslocamento preparo físico
(por trecho) combustível de saída passeio passeio
dos visitantes
SOCIOBIODIVERSIDADE DO AMANÃ
Voadeira 30 min 12 l gasolina Tarde 3h 1h Baré e Cacau
Quadro 12 - Regras para a realização das atividades de turismo de base comunitária na RDSA.
Regras gerais
O turismo poderá acontecer em todas as áreas de uso, desde que respeitando as regras gerais e
específicas da atividade e os acordos locais.
O limite máximo, pré-estipulado, de turistas no setor Lago Amanã, para as estruturas comunitárias
existentes será de 100 pessoas/mês ou 1200/ano (não considerando eventos locais como festas).
Proibida a coleta de animais, sementes e cacos. Só é permitida com autorização do órgão
competente.
É proibido agredir ou interferir na vida de qualquer espécie da fauna e flora.
Embarcações associadas à atividade turística deverão ter autorização do GT para ingressar na área
onde o grupo atua.
A visitação turística deverá ser agendada/comunicada ao GT e acompanhada por guias locais. Sem a
autorização das lideranças, não será permitida a visitação à comunidade.
Os turistas só poderão pernoitar nos locais pré-estabelecidos para este fim, através dos acordos
locais firmados entre o GT e comunidades.
Lagos e Igarapés
CONTINUA...
1
O grupo de turismo era composto por 16 pessoas, de seis comunidades do lago Amanã, setor do lago Amanã e Conselho Deliberativo
da RDSA.
Regras trilhas
Iury Valente Debien Cobra é biólogo, ba- Jonas Alves Oliveira, técnico de pesqui-
charel pelo Centro Universitário UMA, em sa com vasta experiência em taxonomia de
Belo Horizonte, e mestre em Diversidade peixes amazônicos. Atualmente, é parataxo-
Biológica da Amazônia pela Universida- nomista do Grupo de Pesquisa em Ecologia e
de Federal do Amazonas. Sua experiência Biologia de Peixes- ECOPB, do Instituto de
com projetos técnico-científicos na área Desenvolvimento Sustentável Mamirauá.
ambiental se relaciona ao tema das áreas
protegidas/unidades de conservação, à epi-
demiologia de acidentes ofídicos, e ainda à Jonas da Rosa Gonçalves, biólogo, bacha-
ecologia e zoologia. Trabalhou na Secretaria rel e licenciado pela Pontifícia Universidade
de Estado do Meio Ambiente do Amazonas, Católica do Rio Grande do Sul. Sua experi-
como gestor da Reserva de Desenvolvimen- ência como pesquisador abrange a área de
to Sustentável Amanã. Atalmente é bolsista ecologia e conservação, relacionando-se
do IDSM no Grupo de Ecologia de Vertebra- aos seguintes temas: distribuição e moni-
dos Terrestres. toramento de vertebrados terrestres, espe-
cialmente primatas, e populações humanas
e áreas protegidas/unidades de conserva-
Ivan Junqueira é bacharel em Ciências Bio- ção. Integrou, como bolsista de pesquisa no
lógicas pela Universidade Federal de La- Grupo de Ecologia de Vertebrados Terres-
vras, e mestre em Genética, Conservação e tres do IDSM. Atualmente, desenvolve pes-
Biologia Evolutiva pelo Instituto Nacional quisas junto ao Projeto Dinâmica Biológica
de Pesquisas da Amazônia, contando com de Fragmentos Florestais (PDBFF), do Ins-
experiência nos temas da sistemática e ta- tituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
xonomia de mamíferos. Atualmente desen- (INPA), e ao Instituto Mamirauá.
volve estudos fitogeográficos de pequenos
mamíferos em paleovárzeas.
Lisley Pereira Lemos, graduada em Ci-
ências Biológicas pela Universidade Fe-
Jefferson Ferreira-Ferreira, geógrafo deral de Alfenas (UNIFAL-MG), con-
pela Universidade Federal de Santa Maria ta com experiência na área de ecologia,
(RS) e doutor em Geografia pela UNESP/ sobretudo em ecologia de primatas, uso
Rio Claro. Trabalha com geografia física, da fauna e comunidades tradicionais.
geociências e ecologia, com foco na di- É pesquisadora bolsista do Instituto de
mensão espacial dos fenômenos, utilizan- Desenvolvimento Sustentável Mamirauá
do sensoriamento remoto e Sistemas de (IDSM-OS), trabalhando com a dinâmica
Informação Geográfica (SIG). É pesquisa- espacial da caça de vertebrados terrestres
dor e líder do Grupo de Pequisa em Análise nas RDSs Amanã e Mamirauá.
Geoespacial do Ambiente e dos Territórios
Amazônicos e pesquisador colaborador do
Grupo de Pesquisa em Ecologia Florestal. Mariana Terrôla Martins Ferreira, biólo-
ambos no IDSM. Têm dedicado os ultimos ga, formada pela Universidade Federal de
anos de sua carreira a compreender como Ouro Preto, com especialização pela UFLA
as inundações sazonais influenciam em e mestrado na UFOP, nas áreas de ciências
processos ecológico e biogeoquímicos em florestais, ecologia e meio ambiente. Possui
áreas úmidas amazônicas. experiência de pesquisa em ecologia flores-
tal, ecologia de comunidades e populações,
em levantamentos florestais e florísticos e
João Valsecchi do Amaral, graduado em em identificação botânica, além de ter atua-
Ciências Biológicas e da Saúde pela Univer- do em educação com docência e orientação,
sidade São Judas Tadeu, mestre em Zoologia e em levantamentos ambientais para fins de
pelo Museu Paraense Emilio Goeldi e Uni- licenciamento ambiental em diferentes re-
versidade Federal do Pará, e doutor em Eco- giões do país.
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