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Quaresma/Páscoa

Algumas notas introdutórias

Quaresma, ‘tempo’ cristão de penitência

O período do ano litúrgico antes da Páscoa é o tempo da Quaresma.


É considerado um tempo de penitência. Qual o seu sentido? Será que a
Quaresma tem alguma coisa a ver com a Bíblia?

Os 40 dias. Simbolismo.

O termo Quaresma vem diretamente do latim e significa quarenta dias. É um


múltiplo de quatro: perfeição, de totalidade cósmica horizontal; modo de
pensar que teve origem nas constelações da mitologia da Babiló- nia. No AT
não há conotações mitológicas: os quatro rios (Gn 2,10-14), os quatro
querubins (Ez 1, 4-14), a ação divina em toda a criação.

O número 4 pode ter um sentido simbólico ou, em sentido normal,


denotativo: Mc 2, 3-4: homens que transportam o paralítico. Totalidade da
humanidade pagã? As quatro partes do manto de Jesus (Jo 19, 23)?

Os múltiplos de quatro: quarenta - uma totalidade limitada; uma geração,


idade de uma pessoa; 40 anos da travessia do deserto (Ex 16, 35); estada de
Moisés no Sinai (40 dias). 40 anos pode designar a existência total da vida
humana sobre a terra; tempo longo dado por Deus para vencer uma prova.

Os 40 dias de Jesus no deserto: Ele é o fundador de um novo povo, fez o seu


“êxodo”, a sua vida pública (Monte da Quarentena, em Judá). Depois da
ressurreição, fica 40 dias com os discípulos, tempo em que eles hão-de
superar a prova da sua ausência (Act 1, 3; ver Dt 8, 2).

Referência ao número 40 na Bíblia:

* Os dias de chuva durante o Dilúvio: Gn 7,4.12.17.


* O envio do corvo durante o Dilúvio: Gn 8,6-7.
* O jejum de Moisés no cimo do Sinai: Ex 24,18; 34,28; Dt 9,9.18.
* Exploração dos espiões da Terra Prometida: Nm 13,25.
* Oração de Moisés em favor de Israel: Dt 9,25.
* Duração da viagem de Israel no deserto: Ex 16,35; Nm 14,33; Dt 8,2-4;
29,4-5; Js 5,6; Sl 95,10; Am 2,10.
* Tempo de servidão e de libertação no período dos Juízes: Jz 3,11; 13,1...
* O desafio de Golias: 1 Sm 17,16.
* Duração dos reinados de Saul, de David e de Salomão: 2 Sm 5,4; 1 Rs
11,42; Act 13,21.
* Viagem de Elias ao Horeb: 1 Rs 19,8.
* Ezequiel deitado sobre o lado direito: Ez 4,6.
* Desolação do Egito: Ez 29,11-13.
* Advertência de Jonas ao povo de Nínive: Jn 3,4.
* Os quatro chifres e os quatro ferreiros da visão de Zacarias: Zc 2,1-4.
* Permanência de Cristo no deserto, antes da vida pública: Mt 4,2; Mc 1,12;
Lc 4,2.
* Aparições de Jesus depois da Ressurreição: Act 1,3.
* Divisões da existência terrena de Moisés: Act 7,23.30.36.
O mesmo se diga do número 400 = dez gerações (Gn 15,13); e 4000, ligado
ao êxodo, quando Jesus reparte o pão (Mc 8,9.20).

Foi a partir do jejum de Jesus no deserto que a Igreja convocou os cristãos


para um jejum de 40 dias antes da Páscoa. No Concílio de Niceia: 40 dias da
Quaresma já era prática corrente de preparação da Páscoa. Como prática de
penitência, os 40 dias são uma instituição cristã e dependem: da preparação
cristã da Páscoa do Senhor, da preparação dos catecúmenos e também para
comemoração dos 40 dias de jejum de Cristo.

Não está ausente o simbolismo que vinha do Antigo Testamento e que Cristo
reassumiu no Novo: Cristo, ao ir ao deserto, refaz a caminhada do povo, para
o refundar. O seu jejum não é apenas o jejum do povo que é alimentado no
deserto, mas também o jejum do novo Moisés e do novo Elias (1 Rs 19,4-8).

Os Padres da Igreja interpretaram assim o número 40, em relação com o AT:


“O demónio sabia que durante quarenta dias tinham caído as águas do
Dilúvio, que a Terra Prometida tinha sido explorada, que a Lei de Moisés
tinha sido escrita por Deus, que o povo tinha vivido no deserto a vida dos
anjos” (Sto. Hilário). Santo Ambrósio acrescenta: “Quarenta dias:
reconheces o número simbólico. Recordas que durante este número de dias
as águas do Dilúvio não cessaram de cair, que o profeta se santificou pelo
jejum, que Moisés mereceu receber a Lei, que os Padres, no deserto, viveram
do pão dos anjos”.

Os 40 anos do Povo no Deserto

Os 40 anos nem sempre recebem o mesmo sentido. Em Números, tempo de


castigo para os que não entrará na Terra Prometida (Nm 14, 34). Este sentido
aparece também no Dilúvio (Gn 7, 4.12.17) e em Ezequiel (4, 6; 29, 11-13).
No Deuteronómio, o tempo do deserto é o tempo de prova (Dt 2,7; Sl 95, 8-
11); ou o tempo em que o Senhor realiza maravilhas. Para outros, os 40 anos
são um tempo de graça. Esse tempo é ainda o tempo de preparação da entrada
na Terra Prometida, que deu origem à preparação do batismo.

O Novo Testamento também dá importância ao número 40: os Actos


dividem a vida de Moisés em três perío- dos de 40 anos (Act 7, 23.30.36); o
reinado de Saul tem 40 anos (Act 13, 21); a Ascensão de Jesus situa-se 40
dias depois da Páscoa (Act 1, 3); em dois lugares recorda os 40 anos do
deserto (Act 7, 23.30.36; 13,18). Mas o NT diz que os 40 anos do deserto
foram um fracasso, pois eram símbolo de uma realidade futura (Heb 4, 6-7;
ver Sl 95): o Êxodo esperado e definitivo acontece presente temporal.

As tentações de Jesus no deserto mantêm um paralelismo com as do povo do


AT: há os 40 dias, as três tenta- ções principais (a das pedras transformadas
em pão: Dt 8,4; a 2a, que lembra a água saída da rocha; e a 3a, que alude ao
bezerro de ouro). Assim, o número 40 está ligado às tentações do deserto.
Mas a infidelidade do povo é vencida pela fidelidade de Cristo.

É por isso que a Igreja inicia a Quaresma com o relato das tentações (1o
domingo). Era também tempo de preparação para o batismo, porque o
catecúmeno encontra-se ainda dividido entre o Mal e Cristo, entre o ser e o
não ser cristão. Com o batismo, o cristão faz a travessia do Jordão e entra na
Terra Prometida.

Quaresma, tempo de jejum

Três personagens. Referimo-nos aos 40 dias que MOISÉS esteve no Sinai,


de Elias, no Horeb, e de Jesus, no deserto. O Dt diz que foi um tempo de
súplica de Moisés pelo povo e, no fim dessa oração, Moisés recebeu a Lei.
Trata-se de temas interessantes da Quaresma: Oração, Palavra e Jejum.
ELIAS aparecerá como um alter -ego de Moisés: atravessa o deserto e é
alimentado por um anjo. A relação entre os dois é clara: o deserto, o alimento
milagroso, a montanha, os 40 dias, os dois vão ao Sinai, fonte da Aliança e
da Palavra para o povo, e pedir perdão pelos seus pecados, jejuando. Santo
Agostinho dá-nos o sentido da Quaresma e o sentido do jejum quaresmal em
relação com JESUS.

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