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P R O G R AM A D E E S T U D O S P ÓS -G R AD U AD OS E M P S I C O L O GI A S OC I AL
P ON T I F Í C I A U N I V E R S I D AD E C AT Ó LI C A D E S Ã O P AU L O
S Ã O P AU L O
2005
S OLANGE S UELI DE S ALES G UIMARÃES
Dissertação apresentada à
Banca Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção
do título de MESTRE em Psicologia
Social, sob a orientação da Profª. Drª.
Bader Burihan Sawaia.
PUC-SP
2005
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________
_____________________________________
_____________________________________
À minha mãe, Lia,
eterna lição de perseverança
A GRADECIMENTOS
Mary Jane Spink, Antônio da Costa Ciampa, Odair Sass, Raul Albino, Peter
PUC/SP.
À Alessandra Saraiva, Giseli Cabrini, André Barrocal e Hermógenes
período acadêmico.
E aos novos amigos conquistados pelo caminho como Mabel, Neisa, José
Obrigada!
Guimarães, Solange S. S. (2005) As tramas da inclusão/exclusão social
mediadas pela Economia Solidária. Dissertação de Mestrado em Psicologia
Social. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
RESUMO
ABSTRACT
This research analyse the limits of the cooperativism as means of
social insertion in the capitalist context. The analysis is based on the
perspective of Social-Historic, developed by NEXIN, and tries to understand if
this way of production potentizes attitudes and fellings mediated by solidarity.
As generating of job and income, the cooperative establishes new
relations of production that breach with capitalist values, such as, individualism,
competitiveness, submission, oppression, the social disqualification and the
culture of the guilt. This research analyzes if this new relation changes values
and potentizes the citizen for a collective action of transformation of the society.
Of the chosen cooperative - situated in one of the biggest slum
quarters of Brazil, in Rio De Janeiro, and formed for dressmakers who for two
decades try to combine the cooperativism ideals with good financial results
being had obtained economic success (in the capitalist concept of well-
succeeded company) - it was opted to analyzing the process of subjectivation in
one of the subjects: one of the founders of the cooperative and that today she
participates of another entity in the same community.
The analysis of the data gotten by means of interviews intend to
understand the way to think, to feel and to act and as the daily relations and the
social context had been singular in the personal experience. It is a study of the
tension between the transforming action and the action disciplinarian of the
politics of affectivities.
1
In Portuguese the word “trama” has diverse meanings as net, web, set of wires that if cross forming one
fabric, structure of elements that if they cross and they establish connection forming as if they formed a
net, private project against the life or the security of somebody or an institution, intrigues, scheme.
S UMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................... 1
JUSTIFICATIVA .............................................................................. 6
0
I NTRODUÇÃO
Espinosa
1
O objetivo da presente dissertação é compreender, da perspectiva
São Paulo, e foram impulsionados pelo meu interesse pelas soluções para a crise
gerar emprego, iniciou uma onda de fusões e aquisições que reduziu ainda mais
2
Dados elaborados pelo Departamento Intersindical de Estudos Estatísticos Sociais e Econômicos (Dieese) –
subseção Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de São Paulo (Seeb-SP) com base na
Rais (Relação Anual de Informações Sociais)
2
de S.Paulo – e que foi fechado em 2001 - trabalhei na editoria de Economia e
classes D e E.
conseqüentemente, de salário.
exercendo a mesma função com salários menores e sem os direitos que teriam se
3
Imigrantes ilegais bolivianos escravizados no bairro do Bom Retiro. As famílias eram recrutadas em uma
praça no Brás para trabalhar e morar em oficinas de costura, porém a remuneração paga era sempre inferior
ao valor cobrado pelo aluguel do espaço de moradia e pela alimentação, caracterizando escravidão por
dívida. Apesar de jornadas de 14 horas de trabalho e de colocarem até os filhos pequenos para ajudar no
trabalho, as famílias bolivianas não conseguiam comprar a liberdade e viviam sob a constante ameaça da
denúncia da situação de clandestinidade. Nos dois casos que acompanhei, a exploração da mão-de-obra
escrava vinha de imigrantes coreanos tradicionais comerciantes de roupas na região do Brás e Bom Retiro.
4
Crianças a partir dos 4 anos de idade trabalhando em fábricas de tijolos e telhas nas cidades de Taboão da
Serra e Embu, na região Metropolitana de São Paulo. O Ministério Público estadual ainda investiga
ocorrências de mão-de-obra escrava e infantil na capital e imediações da cidade de São Paulo.
3
organizava a falsa cooperativa, contratava a mão-de-obra e a levava para outra
empregos. Atividades realizadas tanto pelo poder público quanto por sindicatos e
centrais sindicais. Iniciativas diversas que não deram conta de atender o grande
serviços.
“responsabilidade social”.
cada vez mais interessado em descobrir o seu “lugar ao sol” e como “se
leitores, vindas dos mais diversos cantos do País, traziam relatos de preconceito,
durante um ano e meio uma coluna que tratava apenas de Trabalho, com
4
histórias de vida de profissionais negros que se destacaram nos mais diversos
campos de atuação.
unidade entre posse e uso dos meios de produção e distribuição com o princípio
trabalhadores em assembléia.
5
J USTIFICATIVA
“Uma definição,
para que seja dita perfeita,
deverá explicar a essência íntima da coisa”
Espinosa
6
Para tal reflexão escolhi estudar as cooperativas bem-sucedidas.
fuxicos (trouxinhas feitas com pequenos retalhos que unidas podem ser a base
zona sul da cidade. A entrada principal fica na subida da Estrada da Gávea. Seu
mais ricos do Rio de Janeiro, tem uma vista privilegiada, que costuma atrair
Programa Favela Bairro da Prefeitura do Rio de Janeiro que tinha como objetivo a
com a cidade formal, ou seja, trazendo elementos da cidade formal para dentro da
identificação formal.
8
A COOPA-ROCA
a criatividade das crianças. Mas uma certa doação atraiu a atenção das mães.
Eram retalhos de tecidos vindos de uma indústria têxtil. As mulheres acharam que
eram todas um pouco costureiras que usavam suas habilidades na lida do dia-a-
5
As informações históricas sobre a Rocinha e a Coopa-Roca foram obtidas em entrevistas com lideranças
comunitárias, relatos da coordenadora da cooperativa e dados que constam dos sites www.rocinha.com.br e
www.vivafavela.com.br.
9
E assim nasceu a Coopa-Roca, como desdobramento de uma experiência
10
O prédio de três pavimentos está localizado em uma das vielas da rua Um,
um dos pontos mais altos da Rocinha. Ele abriga a oficina de costura, com cerca
da cooperativa.
da própria Rocinha.
ano em que a moda da Rocinha começa a ganhar destaque nos grandes eventos
fashion foi quase instantâneo. A coordenadora lembra que logo após a primeira
revistas como Elle e Vogue disputavam qual seria a primeira a conseguir uma
reportagem exclusiva.
sua inserção dentro de um mercado de classe média onde, até aquele momento,
não eram devidamente valorizados. Por outro lado, outros desafios começaram a
da entidade.
como matéria prima, isso obrigava não só as artesãs a separar cada um dos
tinham muito mais valor como obras de arte do que como roupas ou acessórios e,
continuar a crescer e envolver mais mulheres era preciso reformular esse quadro.
principal criador da M.Officer (uma das griffes mais conhecidas do país). Esta
6
A Coopa-Roca informa que Retalhar significa talhar novamente, dar nova forma, no caso, dar nova forma
para a própria cooperativa. A exposição exibiu produtos confeccionados a partir de técnicas artesanais da
cooperativa, desenvolvidos por conceituados artistas plásticos e designers ligados à moda, decoração e
mobiliário. Dentre os artistas estavam os brasileiros Antônio Dias, Carlos Vergara e Ernesto Neto e os
alemães Michael Wesely e Hermann Hiller
12
grupo. A saída para ampliar a base de clientes foi lançar, em 2002, uma nova
nova sede7 da entidade, com potencial para reunir até 300 mulheres, num terreno
doado por Carlos Miele, dono da M.Officer, e com apoio do Ministério da Cultura.
7
em março de 2005, a obra ainda não estava concluída
13
C APÍTULO 1
O F IO DA M EADA : D O O BJETIVO DA P ESQUISA
Espinosa
14
De todos os desafios colocados para a Coopa-Roca, o mais instigante é o
estamos fazendo não é um projeto, mas uma alternativa social. Queremos fazer
negócios, mas negócios limpos e humanos, negócios que tenham uma ética
também afirma que o atual desafio do grupo é "encontrar formas de criar pontes
com as grandes empresas, uma vez que elas não seguem a mesma lógica que
orienta nossa cooperativa e isso exige pensar com cuidado o que queremos ou
seja cada vez mais um espaço democrático que mantenha todas as participantes
15
Apesar destas iniciativas, destaca-se no grupo o papel de liderança da
de sua própria herança cultural, visto que a tradição do trabalho manual – corte e
(MOURA, 2001:138).
taxa de evasão caiu de 2,7% para 1,4%) e redução de 10% no índice de mortes
violentas nos distritos onde os programas sociais foram implantados e que eram
8
Disponível em:
http://www.trabalhosp.prefeitura.sp.gov.br/conteudo/pesquisas/avaliacao_programas_sociais.pdf
17
renda na faixa etária de 21 e 39 anos) e Começar de Novo (pobres
populares/cooperativas.
exemplo”, afirma.
por exemplo, encerrou o ano de 2004 com um desempregado para cada grupo de
pode vir a possibilitar uma mudança real de situação, pois propõe um novo
9
dados da Pesquisa Emprego Desemprego PED do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos
Socioeconômicos (Dieese) apontaram que a taxa de desemprego na região metropolitana de São Paulo foi
de 17,1% em dezembro de 2004. Já a pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), feita
em seis regiões metropolitanas do país (Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto
Alegre) registra índice de desemprego de 9,6% da população economicamente ativa.
19
paradigma: a troca da competição pela cooperação nas relações de trabalho e
transformadora.
desta dissertação.
20
C APÍTULO 2
C ONSIDERAÇÕES SOBRE A P ROPOSTA C OOPERATIVISTA
NA D IALÉTICA E XCLUSÃO /I NCLUSÃO
Espinosa
21
A economia solidária vislumbra uma possibilidade geração de emprego e
em relação à produção de bens tiveram como efeito uma redução brutal de mão-
10
Este número consta do “Mapa do Fim da Fome 2”, estudo elaborado pela Fundação Getúlio Vargas em
2004 com base em dados do Censo de 2000 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Nele,
são considerados miseráveis aqueles com renda mensal inferior a R$ 79,00.
11
Em artigo publicado na internet (www.dhnet.org.br), traduzido por Jeanne Sawaya, Ignacy Sachs, da École
des Hautes Etudes en Sciences Sociales, Paris et Cercle Condorcet, Paris, afirma que o reconhecimento
pelas Nações Unidas da miséria como violação dos direitos humanos deve muito aos esforços do Movimento
Internacional ATD Quarto Mundo e representa o resultado de pedido formulado, em 1987, pelo Padre Joseph
Wresinski, fundador deste Movimento. Ver também PNUD (1997, p. 106).
22
Santos12, mestre em Finanças e doutor em Administração pela USP
disponível de pessoas mal capacitadas para qualquer vaga que surja. O dia
exclusão.
seu caráter de termo guarda-chuva, que abriga definições das mais diferentes e
12
Em artigo publicado na Revista Carta Capital, de 20/11/2002 – ano IX – número 216, sob o título “Os dois
brasis”, o professor Hélio Santos faz um apanhado no campo econômico do círculo vicioso de
constrangimentos pelo qual os negros passam ao longo da história. O tema também é desenvolvido em seu
livro “A busca de um caminho para o Brasil – a trilha do círculo vicioso”, em que propõe conceitos como o da
tecnologia da inclusão, instrumento para desenvolver e implementar políticas massivas de inclusão.
23
até opostas. Porém, a exclusão não é entendida aqui como uma categoria
explorado por sua vez está incluso neste sistema pela exclusão.
perversa por ser determinante da ordem social desigual de uma sociedade que
distingue o homem dos outros seres viventes na Terra. É através do trabalho que
produz a sua vida coletiva como sociedade. É “um processo entre o homem e a
24
Natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e
própria ação do trabalho e pelo resultado das experiências contidas nesta ação.
de ser criador e passa a ser alienado porque deixa de ser constitutivo do ser
criado para satisfazer as necessidades das pessoas, perde o seu valor de uso e
Por conseguinte, o trabalho não cria somente bens, ele cria a si mesmo e
mais dono do trabalho. A lei do mercado é a mesma lei que define o valor do
procura que passa a definir o valor do trabalho, sem que o trabalhador tenha
consciência da expropriação.
25
Paralelamente à reprodução da inclusão perversa, um outro Brasil
intenção deste texto debater como se deu a participação brasileira nesta nova
cooperativismo nos anos 1990, mas, para o bem do rigor científico, o leitor (a)
26
Grafico I
8.000
6.000
4.000
2.000
-
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003
não faz referência à estrutura da cooperativa, o que abre brecha para que entre
27
Também se deve considerar que muitas empresas associativas que
cooperativas de fato que não o são de direito e muitas cooperativas de direito que
expressar-se.
28
Tabela I
Princípios Cooperativistas
29
desemprego só pode ser enfrentado com a articulação da sociedade, tanto para a
Singer (1998, p.) afirma que “a solidariedade deixaria de ser uma questão
30
C APÍTULO 3
T ECENDO A T RAM A AN ALÍTICA DA P ESQUISA
Espinosa
Ética
31
A . SENTIDO E SIGNIFICADO
economia solidária como meio de participação social. Uma discussão que está na
pauta do dia e torna-se cada vez mais necessária àqueles que vislumbram uma
Porém, um debate que precisa ser analisado por outras dimensões que o
da potência de ação.
dos movimentos sociais para captar as pessoas de carne e osso, com seus
constituinte e constituída.
32
porque considera que o ser humano é construído nas relações sociais e pelas
pela ciência.
necessidade e ética, razão e emoção, corpo e alma, Natureza e Deus. Tudo, para
ele, vem da mesma substância. O corpo não domina a alma, nem a alma domina
coletivo/universal.
13 Lev S. Vygotsky (1896-1934), professor e pesquisador foi contemporâneo de Piaget, e nasceu em Orsha,
pequena cidade da Bielorrussia em 17 de novembro de 1896, viveu na Rússia, onde morreu, de tuberculose,
aos 37 anos. Construiu sua teoria tendo por base o desenvolvimento do indivíduo como resultado de um
processo sócio-histórico, enfatizando o papel da linguagem e da aprendizagem nesse desenvolvimento. Sua
questão central é a aquisição de conhecimentos pela interação do sujeito com o meio.
33
Leitor de Espinosa, Vygotsky buscava na obra dele a orientação para
14
Sobre a influência de Espinosa sobre Vygotsky, ver Sawaia (2001) e Van der Veer (1991)
34
O sentido depende do momento e de todas as conexões estabelecidas ao
um ao outro. Dessa forma, é por meio das palavras, seus significados (coletivo) e
com os outros, com o ambiente e a maneira como ele se apropria destas relações
profunda porque cria uma relação alienada do homem consigo mesmo, com os
demais homens e com a Natureza. Ela quebra o vínculo com as pessoas e o que
15
Por ideologia entende-se o conjunto de idéias presentes nos âmbitos teórico, cultural e institucional das
sociedades, que se caracteriza por ignorar a sua origem materialista nas necessidades e interesses inerentes
às relações econômicas de produção, e, portanto, termina por beneficiar as classes sociais dominantes.Vale
salientar que ideologia é a totalidade das formas de consciência social, o que abrange o sistema de idéias
que legitima o poder econômico da classe dominante (ideologia burguesa) e o conjunto de idéias que
expressa os interesses revolucionários da classe dominada (ideologia proletária ou socialista)
35
Vygotsky e Espinosa ajudam a entender como a alienação do trabalho se
emoções e do sentido.
serem afetados por outros seres e são as experiências dessas afecções que
idéias, que podem ser considerados bons ou maus de acordo com a qualidade de
potência de ação.
São emoções em que a gênese não está no próprio ser,mas nos outros.
determinada maneira.
As paixões podem ser alegres ou tristes. Somente uma paixão vence outra
paixão, e apenas se for mais forte e contrária a ela. Enquanto as paixões tristes
nos bons e maus encontros. “É quando me torno causa de meus afetos e senhor
potência de ação”.
certo poder de ser afetado; poder este que é, necessariamente, precedido pelas
comum a todos é mais poderosa que o conatus individual. “Se a potência de dois
ser humano, mas, “(...) no capitalismo, em que, pela mediação das forças sociais,
37
a subjetividade é apropriada e devorada pela lógica do lucro, a participação torna-
interessada”.
coletiva.
coletivo ou individual, mas potência, força produtiva de ser afetado que se torna
38
As emoções constituem a base da ética, que é a capacidade do corpo e do
e base dos sentidos e da ação. Segundo ele, para se entender o sentido das
coisas para um sujeito, é preciso captar o subtexto de suas palavras, que é dado
sentida para existir. Elas são configuradas socialmente, pela história, memória e
com o outro. Nós somos sempre afetados por outros corpos. Esse corpo pode ser
40
B . POLITÍCAS DE AFETIVIDADE: A DISCIPLINARIZAÇÃO DAS EMOÇÕES
BMW. Isso vale para a camisa que visto ou para o relógio que trago no pulso. Não
sou eu, pessoa humana, que faço uso do objeto. É o produto, revestido de fetiche,
sociais.”
sistema, que uma pessoa se sinta feliz por ultrapassar seu melhor amigo em uma
utilitaristas. Um mercado onde o que conta é o que o outro pode me dar em troca.
16
Em artigo intitulado “A religião do consumo” publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 21 de março de
2001. Frei Betto volta ao tema no artigo “Valores de uma nova civilização”, escrito com Michael Löwy, para o
II Fórum Social Mundial Porto Alegre 2002. Disponível em: http://www.adital.com.br
41
A esta maneira como a sociedade faz a disciplinarização das emoções, Sawaia
para manipular esses afetos. Todo tirano sabe, por exemplo, como utilizar do
contato com o outro que o sujeito é afetado por emoções. Estas emoções podem
forma de paixão. Por paixão Espinosa define os afetos que tem a gênese em
ser bom para receber recompensa ou ficar feliz com a morte de alguém.
17
denominação usada por Chauí.
42
Marx, de certa forma, fala da disciplinarização dos afetos nos Manuscritos
encobrem a exploração.
própria liberdade. Mas a disciplinarização dos afetos faz com que o homem vá
afeta hoje milhares de famílias, ao invés de ser tratado como sintoma da crise
do público.
43
É o que se pode apreender do uso indiscriminado do prefixo “auto”, que
Esse quadro de fórmula do bom humor full time está sustentado num
homogêneo de felicidade.
individualismo. Hoje não existe mais tristeza, se fala “estou deprimida”. É difícil
sua ausência, a qual vou curar no ombro de um amigo. A depressão vou curar
felicidade, que é uma felicidade que eu consigo sozinho, não dependo de mais
ninguém. Com isso, há uma negação daquilo que é fundamental ao ser humano,
44
É por tudo isso que Sawaia (2001:123) identifica a transformação da
ingredientes do “Zeitegeist” (Espírito da Época), Ela alerta para que olhemos com
valor afeto é tão importante quanto o valor trabalho. O valor afeto é a produção e
45
C APÍTULO 4
A TRAJETÓRIA DA P ESQUISA
Espinosa
46
O projeto de pesquisa inicial previa a análise da participação cooperativa a
partir das histórias de vida das artesãs. Após algumas visitas à comunidade
comando do tráfico de drogas na zona sul carioca deu início a uma sangrenta
18
O Centro de Visitação e Comercialização da Rocinha foi criado em 2001, com o apoio do Governo do
Estado do Rio de Janeiro e do Sebrae, para escoar a produção de artistas e artesãos moradores da Rocinha.
O centro recebe mensalmente mais de 1.000 turistas sendo que 90% deles são estrangeiros.
47
resgatar a imagem da comunidade como um lugar de predomínio de pessoas
trabalhadoras.
alegavam não ter tempo disponível para conversa em razão do grande número de
artesãs”,.
além.
48
O trabalho de campo, prejudicado pelos conflitos locais e pela agenda da
jornais.
Roca liderava uma ONG que também trabalhava com artesanato, mas cujo foco
informações consegui chegar até esta artesã. Encontrei uma mulher agitada,
para vencer.
Tivemos uma longa conversa, que ocupou uma tarde inteira. Enquanto
estávamos em sua casa tudo foi gravado, sua história de artesã, sua vida e a
trabalho. Muitos queriam saber sua opinião sobre a eleição para representante da
favela, processo que estava em andamento na época. Sem pestanejar, ela falava
campanha.
19
O nome de nossa entrevistada foi mudado para preservar sua identidade. Todas as frases em itálico são
transcrições da fala da entrevistada
49
Na caminhada, ajudou um carteiro comunitário a encontrar o destinatário
50
A SÍNTESE DO PROCESSO DE CONFIGURAÇÃO DA ARTESÃ SOLIDÁRIA
Segundo ela, sua saída da cooperativa foi ocasionada por fofocas dentro
20
Conforme definição do Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa.
51
onde as mulheres tinham o costume de se reunir para costurar e aproveitavam
cooperativa.
Das meninas rebeldes que sentavam com ela no Terreirão (um terreno baldio que
serve de praça e fica próximo a casa de Maria) para fazer fuxicos e nozinhos,
grupo – não mais uma cooperativa, mas um movimento, uma ONG (organização
feitos e o trabalho do Movimento Unidos pela Paz pode ser visto em alemão (e
Ela tem orgulho de ser uma exportadora, mas quer que a ONG tenha
52
Até no nome da ONG organizada por Maria o tema violência está presente.
O Movimento Unidos pela Paz busca dar ocupação, profissão e novos objetivos
vizinha dela foi morto pela polícia enquanto soltava pipa em cima da laje da
própria casa. A morte do menino confundido com traficante, foi o estopim de uma
causou novos conflitos com a polícia. Era um indício de que a Rocinha estava
porque apresenta toda a crueza da vida no morro enquadrada em uma das mais
trabalho entre a criação e a servidão. Uma questão que precisa ser observada
53
Desde jovem Maria carrega em si uma certa vontade de ajudar as pessoas,
ensinando os trabalhos manuais que aprendeu com a mãe. Este tom se mantém
possibilidade de exportá-lo para além dos limites da favela, conhece uma forma
suas mercadorias são vendidas pela internet para diversos outros países. Ela não
sabe por quanto suas peças são revendidas, não há um contrato firmado, nem a
garantia de que novos pedidos serão feitos. No Brasil, seus produtos são
o termo “ONG” é uma estratégia para obter apoio. Ela sabe que é a sigla da
trabalho. “O nome poderia ser cooperativa ou até mesmo associação”, diz, o que
mostra que para ser aceita há que se fazer concessões, adequações ao gosto do
sistema. Ela quer autonomia, tem claro os caminhos que deve traçar, mas
aguarda pela ajuda externa de alguém “estudado” que possa trazer fornecedores,
comunidade para que eles ocupem o tempo livre e aprendam uma profissão. Esta
aproveitar para mostrar que na favela não existe só violência, mas paz, lazer e
beleza também".
A organização existe de fato e tem até coordenação eleita, mas ainda não
reuniões acontecem nas casas das costureiras. As primeiras peças feitas pelo
55
venda vai para a pessoa que confeccionou a peça vendida. Além das feiras, as
ainda não chegou a este nível de produção. A primeira coleção exportada para
Alemanha deu visibilidade internacional ao grupo. Outro pedido foi feito e, desta
divulgação e captação de recursos, que só pode ser feita por pessoas de fora.
56
C APÍTULO 5
D O FIO À TRAMA - A H ISTÓRIA DE M ARIA QUE SE
E NTRELAÇ A COM A DA C OMUNIDADE
“Se duas pessoas concordam entre si e unem as suas forças, terão mais poder conjuntamente
e, consequentemente, um direito superior (...) que cada uma delas não possui sozinha e,
quanto mais numerosos forem os homens que tenham posto as suas forças em comum, mais
Espinosa
57
Numa conversa muito descontraída, Maria me contou sua história, com
Como ainda não me conhecia, começa sua história me falando seu nome,
Meu nome é Maria D. O., eu vou fazer 51 anos, 52, eu sou campista. Eu sou
Como eu já sabia. A minha mãe quando era viva, ela fazia muitos trabalhos
manuais, então ela passou a experiência pra gente. Inclusive meus parentes
todos sabem fazer trabalhos manuais e tudo. Aí chegando aqui, aqui nessa minha
área não existiam trabalhos artesanais. É quando eu vim da minha terra eu tinha
(...) Eu tenho o meu marido. Só somos eu e minha filha solteira. Meu netinho, a
mãe dele ta trabalhando ele fica aqui comigo. Meus filhos são todo maior. Todos
minha outra filha que também é casada, ela mora lá embaixo. E tem a solteira que
mora aqui.
(...) Eu nunca fui em outro morro, desde que eu vim pra cá. Porque eu tenho
medo. Porque eu vejo aqui a Rocinha tão legal (...), tudo de gringo que passeia,
sobe. Então tem lá dentro, tem a mata ali dentro. Tem o campo, eles vêm visitar.
58
É uma coisa fora de série, fora do comum. Porque a pessoa vê a Rocinha, a
pessoa olha assim a Rocinha com outra visão. Violência tem em todo lugar, mas
intriga assim de várias favelas que eu vejo, a Rocinha é super calma. Entendeu?
pessoa que chegar aqui dentro da nossa comunidade, ninguém implica com
ninguém.
num lugar pra vender e tudo mais, eles compravam das adolescentes. Então daí a
pra eu poder continuar o trabalho. Inclusive tem muita menina aqui perto da minha
casa que hoje já tem filho, que aprenderam a fazer os trabalhos manuais que eu
mesmo passei a experiência pra elas e tudo, né? Aí depois disso eu dei uma boa
parada, né? E o pessoal morador: “Pôxa, Maria, porque você não continua?”
Depois dessa parada que eu dei, já trabalhei como balconista, como caixa. Já fiz
desenvolvo, né?
O trabalho com a comunidade era uma forma de partilhar aquilo que ela
havia aprendido com a mãe, mas este trabalho não lhe garantia a subsistência,
21
Cruzada do Menor, uma instituição social sem fins lucrativos, cuja finalidade é promover o desenvolvimento
social de crianças, adolescentes, idosos e suas famílias - todos de comunidades populares - através de
programas e projetos educativos e culturais. Criada em 1920 para atender crianças com tuberculose, a
instituição passou em 1985 a priorizar também o direito de crianças e jovens à educação, à alimentação e à
iniciação profissional
59
Eu só passava a minha experiência. Fui passando, fazendo várias, qualquer
coisa de artesanato que você imaginar, eu sei fazer, entendeu? Eu tive essa
iniciativa de dividir com as pessoas, porque pôxa, a minha mãe já passou pra
pessoa aja com a gente de boa fé, né? Reconheça que a gente ta passando as
experiências com boas intenções, então eu resolvi dividir esse trabalho meu
com as adolescentes, que é pra elas poder ter um futuro melhor. E muitas delas
Na Coopa-Roca, eu fui uma das fundadoras e muitas dessas meninas que estão
começando a crescer de novo, porque teve uma época que a Coopa-Roca deu
só retalhos. Agora não, agora já faz crochê, desde que eu entrei pra lá eu já
fazia esse trabalho, tricô, crochê, boneca de porcelana. Uma vez, há muitos
Fui eu e uma outra senhora, foram três pessoas. Fizemos uma exposição. E a
crochê, mas a falou: não, Maria, você pode expor seu trabalho, você bota tudo
junto. Era só tapete de retalho, era fuxico, colcha de retalho. Agora não. Agora
ela tem de tudo. Elas fazem bolsa de crochê e fazem muita coisa. Menos isso
22
Entidade que participa do Centro Comunitário União Faz a Força
60
aqui, cestaria não faz. E assim, biquíni assim, trabalho manual eu não soube
contribuir de alguma forma, mas resolveu parar. Esta parada que ela dá não é
explicada de início, mas o que nos diz é que esta atitude não é aceita pela
comunidade:
Então eu dei uma boa parada. Aí depois as meninas mesmo: “Ah, Maria, volta a
fazer aquele trabalho que você fazia. Tão legal e tudo!” Aí, me ajudaram, me
incentivaram com a força deles. Aí eu agora voltei de novo com esses trabalhos.
E neste momento nos fala do grupo que ela organiza, de sua formação e
estrutura:
Ah, minha filha, tem bem umas 13, fora as adolescentes, né. Mas só que nós
Essa mesmo que faz as cesta, ela deve ter na faixa de uns 50 e pouco.
(...) Essa coitada! Se você ver o tanto que ela faz cesta, você precisa ver o tanto
que tem na casa dela. Inclusive a Professora Marina, não tem a Professora
dei curso lá. Mas também era outro inferno porque essa coordenadora é assim:
você tá ali juntinho com ela, ajuda, ajuda, ajuda. Depois ela bota o ouro na mão
de quem não tem nada a ver. Ela falou: “Ah, Maria, tem aqui um espaço”. As
61
pessoas falaram: “não, Maria, no centro comunitário, não”. Eu posso reunir as
pessoas tudinho, te apresento, pra ver se eu estou mentindo. Então fica assim.
Eu falei: gente, vamos ver se a gente consegue arrumar um espaço pra gente
Elas são aprendizes, mas tem muitas que já fazem. A minha neta inclusive faz
bolsa. A minha neta faz. Olha essa minha netinha aqui, olha, tem uma neta
minha de 10 anos que vende, que já exportou bolsa também pra Alemanha.
Tem as meninas do grupo entendeu? Vou até mostrar as fotos pra você. Aí nós
estamos aí, né? Nessa luta. Nós estamos em busca do... de um espaço,
Foi assim, essa moça da Alemanha, a Patrícia, ela é brasileira, mas mora há
treina, ela corre na equipe daqui mesmo da Rocinha, ela é corredora. Então ela
tava em Ipanema correndo. Aí, essa Patrícia ela viu essa comadre da minha
“Ah, você mora na Rocinha? Você conhece alguém que desenvolva algum
62
trabalho social na comunidade e tudo?” Ela falou: “Ah, conheço sim. A Maria.”
“Ah, dá pra você me dá o telefone dela?” ela falou: “Com certeza.” Porque ela
também faz parte do nosso grupo. Foi, já tem o quê? Já tem quase três anos. É,
tem quase três anos já. Aí então tudo bem, ela falou: “Maria, vai ligar uma moça
aqui que ela está interessada em ver os trabalhos”. Eu falei: tudo bem. Aí no dia
que ela ligou ela queria vir. Eu falei: não. Você deixa pra vir amanhã que eu vou
começou. Eu a levei em cada uma das casas das artesãs. Pra ver os trabalhos.
têm bolsa já pronta e tudo. Só estamos aguardando ela ligar, né? Ou a amiga
dela Viviane ligar pra gente pra poder comprar as bolsas, entendeu?
(...) A Patrícia lá da Alemanha, ela não quer que a gente divulgue, mostre aqui
Eu falei: “não, minha filha, vamos colocar nossas peças na rua”. Se a gente
encontrar lugar pra botar, pra gente poder vender, se a gente encontrar pessoas
(...) No começo a Patrícia estava dando a linha. No começo a gente fazia com a
linha e com o lacre da gente. Aí depois ela combinou com a gente de dar a linha
e a gente comprar o lacre. E estava assim. Mas só que agora está demorando
muito a Vivi, não sei o que está acontecendo. Tem muita coisa bonita,
entendeu?
(...) ela não quer. A Patrícia quer que passa primeiro pela Fushico – loja alemã -
que as pessoa tudo encomendem a ela. E ela faz o pedido pra gente. Tudo
bem. Então nós não temos nem noção de como é exportar nada. Tudo bem, é
uma boa pra gente. Importante que as mulher tão ganhando o dinheirinho delas.
Ligou gente de Berlin. Então o que foi que eu fiz: procure a Fushico, dei o nome
63
da Patrícia. Aí quando a Patrícia me ligou, eu dei o endereço direitinho que o
(...) Porque ela está divulgando lá fora, entendeu? Aí a pessoa vem e liga pra
mim. Eu não vou pegar, ela levou o nosso trabalho lá pra fora, entendeu? Eu
não vou pegar e passar por cima das ordens dela, porque foi através dela que
está levando o nosso trabalho lá pra fora. Lá passa, está passando na televisão
querem encomendar na nossa mão, que dizem que sai mais barato. Aí eu falei:
A gente compra nos ferro-velhos os lacres. O meu marido também, ele trabalha
de porteiro, ele também junta. Mas sempre a gente mesmo compra os lacres.
gente faz muita coisa, muita coisa. Olha, biquínis, olha aqui, olha! Olha, esse
daqui é top, foi eu que fiz. Esse aqui é crochê, trabalho manual, entendeu? É
muito bem feito. Nós fomos expor ali no Colégio Teresiano. Olha esse aqui,
esse aqui foi eu que fiz. Porque tem muita... Ali no centro de visitação, você
precisa ver as roupas de lacre, saia de lacre com símbolo da bandeira do Brasil.
Porque tem muita coisa de lacre, de latinha, mas assim igual a da gente... Todo
mundo fala.
64
Menina foi uma benção! Menina não estou falando pra você. Veio o Estadão de
São Paulo, fez a matéria. A Redetv, através da TVRoc, que tem o canal aqui da
Rocinha, a TVRoc. Saiu essa matéria que a Patrícia ela é da Alemanha, ela
falou sobre o nosso trabalho. Tem a vizinha ali que fez essa matéria. Esqueci o
nome dela. Então ela veio aqui na minha casa, viu os trabalho. O Estadão de
São Paulo veio bateu foto das meninas desfilando. No dia que o Estadão veio
eles filmando elas. O Estadão de São Paulo. Então foi bem legal. Mas só que é
pra elas ter uma renda, né? Porque é um trabalho que a gente vai tirar essas
meninas da rua, não só pras meninas, é pros menino também, porque isso não
é só, menina mulher que faz esses trabalhos, até os meninos também. É um
(...) Olha, quando apareceu essa menina da Alemanha, as pessoas, Maria que
benção! Olha as pessoas super feliz e sempre pergunta; Ah Maria, vamos correr
atrás, arranjar lugar pra gente expor os nossos trabalhos. Com certeza, eu vou
correr atrás entendeu? Ali embaixo, no centro de visitação têm muitas dessas.
(...) O Zé Luis do centro de visitação lá embaixo falou: traz suas coisa pra cá.
Porque vende pros gringos lá. Mas é isso, nós estamos com esse trabalho super
legal, super bacana, mas a gente está precisando de uma pessoa pra nos
65
orientar e que venha multiplicar, somar com a gente. Pra divulgar nosso
ressalta que o grupo precisa de uma pessoa de fora que ajude na divulgação:
A dificuldade que a gente sente, é porque a gente precisa de uma pessoa que
esteja do nosso lado entendeu? Nos ajudando, nos orientando, correndo atrás
pra gente. Porque eu só faço mesmo é produzir. Eu não tenho muito tempo.
encontrar alguém que se interesse pelo nosso trabalho, entendeu? Que compre
o nosso trabalho, ou arranje um lugar pra gente deixar lá, uma loja pra gente
poder vender e tudo. Até que seria uma boa, entendeu? Porque a gente precisa
(...) Então, pra esse negócio assim de ir atrás, eu sou muito parada. Por isso
que eu falo que tinha que ter uma pessoa pra estar com a gente nos orientando.
Eu sou parada, parada, parada. Elas estão produzindo. A gente corre atrás, que
condições.
(...) Mas eu sou péssima pra sair, fazer uma divulgação. Eu sou muito parada. E
elas também ficam: “eu estou com vergonha, não sei onde vender”. Inclusive
essa menina que eu acabei de falar, essa coitada. Ela faz bolsa e leva pra PUC
pra vender. Minha filha eu acho é isso, conforme assim, quando nós fomos pra
Então não tem erro de você esconder, botar atrás as coisas da tua amiga e
66
botar a sua na frente pra vender. E essa senhora, coitada, eu tive a maior pena
dela, cada coisa linda que ela faz, bolsa e tudo. Então as mulheres que levam
pobre da mulher. Aí ela como é uma pessoa cristã, não gosta de confusão, ela
sentindo:
A Viviane mora na Tijuca, aí ela vem leva os trabalhos e exporta lá. Mas agora,
faz tempo, nós estamos esperando, não sei o que aconteceu. Eu não sei se elas
mandar mais bolsa mais não? Aí as meninas do grupo ficaram até meio assim,
sabe? Eu falei: ó, Patrícia, eu já mandei as bolsas. Ah! Mas não chegou aqui
ainda. Então eu acho que as pessoas do grupo estão achando que essa que se
diz ser namorada do irmão daquela que mora na Alemanha está desviando as
bolsas. Quando ela vem pegar as bolsas, ela logo paga. Essas bolsas que a
Patrícia perguntou: cadê as bolsas? Ela já tinha vindo aqui pego as bolsas e
assim: pôxa, Maria! E agora? Tem um bocado de bolsa. Aí eu falei: Vivi, quando
que a Patrícia vai vir pegar as bolsas? Sabe o que foi que aconteceu? Ah,
67
Sua vontade de transformar o grupo de trabalhos manuais em uma outra
E com pessoas de fora que queira colaborar com a gente. A pessoa que tenha
instrução pra nos guiar, né? Divulgar nosso trabalho. Correr atrás, né? Porque a
gente não tem. Inclusive a Patrícia, ela concluiu o curso dela de designer com
esses trabalhos da gente, lá na Alemanha. Ela estava no último ano. Está tudo
escrito aí. Porque lá foi super interessante esse trabalho, lá. Mas só que nós, as
mulheres tão assim chateadas com a Viviane, com a Vivi, essa que faz parceria
com ela. Porque assim, pôxa! Eu fico com a minha cara no chão: quando ela vai
vim, Maria? Tal dia marca. Então, eu falei: gente, vamos ver se a gente arruma
outras pessoas que queiram nos ajudar, entrar com a gente. Porque o que vier
pra dentro da comunidade é muito bem vindo. As pessoas que vierem a querer
(...) porque aqui, o que tem mais aqui é olho grande. Então é por isso que eu
ainda estou parada. Eu falei: gente, deixa como está. No dia que aparecer uma
pessoa que queira trabalhar com a gente aqui dentro da nossa comunidade, que
gente se misturar com essas pessoas aí, que elas são tudo macaca velha, tudo
muito esperta. E você tem um grupo legal, um grupo bacana e vem essas
68
pessoas que já têm esses projetos malucos aí: ah! Vamos juntar o projeto!
(...) Aqui na comunidade tem vários projetos. O pessoal me convida, mas eu não
vou. Sabe por que eu não vou? Se eu for, eu tenho muita gente. Se falar que a
gente vai montar uma cooperativa, muitas pessoas estão do meu lado. Olha
aqui, minha filha, pode ver as foto, as meninas. Muita gente. Aí quando a
Patrícia veio aqui, eu levei de casa de uma por uma das pessoas. Entendeu?
Então pra gente trabalhar assim com uma comunidade, se você fizer uma coisa
bacana, todo mundo te elogia. Agora, se você ficar de palhaçada, com sujeira,
ninguém quer te ajudar. Porque eu acho que a gente tem que ver o lado da
não acha você? É por isso que fica nessa. Fica todo mundo, eu fico assim. Deus
me livre, tem umas senhoras decentes, essa moça que faz cestaria é uma
pessoa cristã. As pessoas decentes. Deus me livre. Olha, quando parece uma
coisa assim, as pessoas: Ah, Maria, graças a Deus! Quando a Patrícia chegou
pra exportar essas bolsas, porque inclusive elas faziam bolsa de lacre. Elas
fazem muito bem. Tem vários tipos de bolsa. É muita bolsa. Faz mochila. Muitas
coisas. Tem umas pessoas decentes. Então eu não quero palhaçada, sabe
como é que é? Porque as pessoas que querem: Ah, Maria, vamos juntar! As
vezes quer pegar até a sua idéia. Daqui de dentro mesmo. Porque bolsa de
lacre, tem muita bolsa de lacre, mas por isso que a Patrícia falou: Ah, Maria, não
divulgue, não vende as bolsas, porque você pode andar no Rio e ver muita
bolsa de lacre, mas com o símbolo da bandeira do Brasil, a gente faz assim com
B do Brasil. Vários modelos, entendeu? Tem sim, bolsa de lacre, mas esse
modelo da gente que a gente faz com o símbolo da bandeira, assim triangular,
com a letra B, não tem. Entendeu? Mas é por isso que a Patrícia fica com medo
69
que a gente divulgue o trabalho. Mas as mulheres não vão ficar também sem
ganhar dinheiro.
Pra isso a gente precisa de uma pessoa, a Coopa-Roca tem muitas pessoas...
Até noutro dia a menina disse: “a coordenadora da Coopa-Roca quer falar com
você. Aí as mulheres falaram: se você voltar pra lá, então não vai dar. Muitas
pessoas não querem. (...) eu não tenho nada contra ela, mas muitas pessoas
me pagava. Aí começaram a fofocar: não, Maria porque que ela te paga, se está
70
Em sua fala ela deixa claro que não tinha problemas com a socióloga,
existência. Sabe que eu não peguei idéia de ninguém. Todo mundo sabe que eu
desenvolvo esse trabalho, sabe que eu não peguei idéia de seu ninguém. Sabe
que quem puxou esse trabalho, inclusive a coordenadora na época não tinha
espaço, a gente fazia os trabalho aqui no meio do caminho. Depois foi que a
pessoas falavam: Ah, Maria, com aquela coordenadora não dá. Porque ela já foi
até pra Alemanha também. Então, inclusive quando a Patrícia veio queria até
conversar com ela e tudo. Aí as mulheres do grupo: Ih, minha filha, nem
conversa, porque ali é só ela só. Ela não gosta, se você dá uma entrevista ela
quer te cobrar, é um inferno. Então se chegar uma pessoa ali, porque ela tem
trabalham ali com ela. Então ela não aceita idéia de ninguém. A Patrícia ela
queria: Ah, Maria me apresenta. Tentei o contato com ela, mas ela não quis
conversar não.
Perguntada se não seria mais viável unir sua ONG a outros grupos da
Com a Coopa-Roca? Minha filha, a coordenadora de lá não quer não, ela não
aceita não outra pessoa de fora. A gente aqui? Eu não sei se ela vai querer. Ela
até já me convidou. A menina aqui também. Ela está até aqui na foto, a menina,
que é a minha vice, é de lá. Ela disse: “Ah, Maria, vamos pra lá, agora está bom
71
e tudo”. Mas as meninas falam: “Ah, Maria se você voltar pra lá, acho que eu
não vou ficar mais não. Eu não quero voltar pra lá”. Muitas delas, pode ver aí
(mostra matéria de jornal sobre o grupo), está até escrito aí que muitas delas até
(...) Tem espaço pra todo mundo. Terça agora, nós estamos fazendo uma
reunião pra gente conversar pra gente poder, ver como é que vai ficar esse
negócio da Patrícia, das bolsas. Como é que vai ser. Porque a Vivi: Ah, Maria,
passei um e-mail pra Patrícia e ela não me respondeu. Esse ano ela nem veio,
porque no ano passado ela estava vindo, estava aqui no Brasil, levou bastante
coisa e tudo. Mas agora, esse ano ela não veio. Se ela viesse já tinha me
lá pra ela, mas não sei como liga, faz ligação lá pra Alemanha. Porque tem tudo.
Tem endereço, tem até endereço dela. Que a menina mandou lá de outra favela
pra mim. Mandou o endereço. Eu tenho os e-mail dela. Porque a Patrícia, pelo
jeito, parecia que ela estava com pouca bolsa. Todo mundo gostou dela. Até as
menina falou: Ah, Maria, depois que entrou essa tal de Vivi, a Patrícia foi dá olho
pra essa tal de Vivi porque ela mora no Brasil, agora estragou tudo. Todo mundo
revoltada. Eu falei: gente, calma! De repente a gente arranja outra pessoa que
se interesse pelo nosso trabalho, que queira nos ajudar, estar aqui dentro com a
gente da comunidade.
não contam com uma sede, um espaço próprio, mas já começa a render seus
frutos:
72
Porque nós não temos espaço ainda, mas se Deus quiser, o nosso objetivo é
rebelde, menina muito rebelde que também não queira fazer nada, depois que
dinheirinho: Ah, Maria, que legal! Quando vai vir mais encomenda pra gente
fazer e tudo? E não é tão bacana assim? Eu também tenho meus filho, tenho
meus neto, então tem que pensar no futuro deles também. Apesar de eu ter, eu
tenho 4 filhos, todos eles são maiores né? Então, eu não tenho mais assim que
me preocupar porque eles já tão de maior, já sabem o que faz. Mas tem meus
netos também. Tem que pensar não só nos meus netos, mas nesse
Daqui pra frente, meu sonho é ver essa ONG dar certo. Transformar numa
cooperativa, tudo. O que vier vai ser bem vindo. Alguém que se interesse pra
(...) A construção da sede não custa muito caro. Porque a gente tem que ter ao
menos um cubículo. A gente tem que ter um cubículo pra um começo. Porque
vem essa menina da Alemanha e muita gente conhecida que às vezes ligam: “E
aí, Maria, como é que estão indo os trabalhos?” Sempre me ligam pra saber,
querem vir ver, visitar os trabalhos. As pessoas ligam até de Berlim, que viram
aqui.
73
Pergunto como se deu a escolha do nome do movimento e porque
escolheram um nome relacionado com a paz e não outro que fizesse referência
Porque, minha filha, é tanta violência que a gente vê por aí e pôxa! A gente tem
que dar um basta nessa violência. pôxa! O Brasil todo, o mundo todo está
pedindo paz. Então é por isso que o nome da ONG é Movimento Social Unidos
(O trabalho com artesanato pode mudar a vida das pessoas) Porque a mente
vazia é oficina do diabo. Como diz o outro, né? Então, tendo alguma coisa pra
ocupar, né? Eles não vão pensar assim em fazer besteira. Eles tão ali
trabalhando, então eles se interessam por aquele trabalho, ta sabendo que dali
vai sair o dinheirinho do próprio suor dele. O objetivo da ONG é esse entendeu?
Ao falar de paz ela faz questão de deixar claro que quando ocorre
violência na Rocinha, ela vem de fora, geralmente da polícia, a mesma que matou
Eu te juro por Deus, garota. A própria polícia, eles entram, conforme saiu no
jornal. O filho dessa menina, até eu conheço a menina ali de baixo da Rua 2. a
(...) Foi ontem. Não teve ninguém, não teve conflito de vagabundo, de nada. Te
juro! Mas eles subiram aqui e falou. Olha, eu fico super revoltada. Eu tenho
74
meus também, tenho meus netos. Eu não to querendo ver o pior pros meus
filho. Tudo bem. Eles são autoridade. Eles têm todo direito de entrar pra fazer o
trabalho deles. Mas tem que respeitar a comunidade. Eu acho que eles têm que
respeitar. Menina, uma coisa incrível, essa menina, até ela tinha só um filho, um
menino decente. Até passou na reportagem na Band, né, que eu tinha assistido,
que os policiais metia a bala porque o menino era traficante. O que é isso? Eu vi
Gente, eles quer entrar pra fazer o trabalho deles, tem todo direito, mas pôxa,
vamos respeitar a comunidade. Entra, faz o trabalho deles que eles tiver que
fazer, mas não fazer isso, pôxa! Chegar, entrar atirando. Vem cá! Eles são os
moro aqui esses anos todos. Eu graças a Deus. Olha, eu subo, desço, todo
mundo, qualquer pessoa pode subir que eles num perturba ninguém. Não é
dizer: Ah, a Rocinha é violenta. Não. A violência é a polícia que faz, a polícia
mesmo que chega. Acaba fazendo isso, pra dar tiro, e a comunidade fica toda
policial matou o garoto. Aí o jornal da Band diz que foi, que o menino era
traficante. Aí ontem saiu no jornal a matéria direitinho. Mas a pessoa tem que
fazer justiça. Eles fecharam o pessoal. Porque a polícia não tem nada a ver
fazer uma coisa dessas. Eu acho que tudo bem fazer o trabalho deles, mas não
deles que tiver que fazer, mas sem, né? Isso que é uma cachorrada. Eles
mesmo que são os vagabundos fardados. Isso eu fico revoltada, tem hora que
75
eu fico assim olhando, tanta cachorrada, tanta safadeza, com licença da
palavra, que a pessoa fica assim revoltada. Eles sobem o morro, nessa
palhaçada toda. Meu filho às vezes vai descer pra trabalhar: Ah, mãe vamos até
lá embaixo comigo. Eu falei: é vamos embora. Meu filho, não vai esculachar
meu filho, não. Meu filho é trabalhador. Eu falo. Não, não vai esculachar meu
filho, trabalhador, meu filho tem 29 anos. Tem a que tem 25, que é minha
de vizinho meu, que seja uns meninos tudo adolescente trabalhador. Eu vendo,
eu falo: não, meu senhor, faz o trabalho de vocês, um trabalho limpo. Deus me
livre, não mexe com filho meu. Eu falei: meu senhor, não me leve a mal não,
não vem esculachar meu filho não, meus filho são trabalhador, entendeu. Toda
documentação. Leva pra fazer o teste se usa droga ou não. Juro por Deus,
entendeu? Graças a Deus não fumo, não tenho nada contra a quem fuma a
quem bebe. Meu filho, esse que é pai desse menininho, o único vicio que ele
tem é tomar uma cervejinha e fumar cigarro. Não usa droga, entendeu? Meu
filho que mora em Copacabana, ele é obreiro da Igreja Universal. Meu marido e
a minha sogra, do meu segundo casamento. Que o meu marido que eu casei
com ele na minha terra, eu vivo separada, então eu vivo com esse rapaz há 24
anos. Ele trabalha há mais de 17 anos num condomínio ali, uma pessoa super
decente. Se você passar por ele, não fuma não bebe. Se falar com ele, ele fala,
se não falar, ele ta até dormindo, descansando. Então, porque que eu vou
aceitar que venha uma polícia de lá pra esculachar meu filho? Ou um filho de
um vizinho meu que eu to vendo que são umas pessoas decentes? Deus me
livre, eu fico doida. Às vezes meu filho chama e eu digo: bora, meu filho. . Eles
não vão fazer nada com você. A gente tem que ficar vigiando. Eles botam até
fragrante no bolso. Forja. Eles são ordinários, eles. Eles forjam, eles forjam. Não
viu no jornal esse negócio da polícia que matou esse menino? O próprio rapaz
76
era garçom lá na PUC, eles bateram no rapaz porque confundiram ele com
melhorar de vida.
Eu quero ajudar a comunidade. Claro, me ajudar também. Mas meu sonho é ver
profissão, entendeu? Ganhando o dinheirinho com o próprio suor. Elas têm que
aprender ganhar com o próprio suor e ter o dinheirinho delas, né? Não é fácil,
ganhar dinheiro fácil. Que isso também não dá certo. Tem que lutar, né?
(..) Felicidade pra mim é tudo. É tudo, tudo mesmo. Eu sou uma pessoa que eu
aprendi isso assim, assim. A Maria arrumou isso assim, assim pra mim. Me
ensinou a fazer. Ah! Eu fico super feliz. Eu não sou egoísta, eu não quero a
sonho, eu falei: gente, antes de eu morrer eu quero realizar esse meu sonho.
Tem menina já, que já aprendeu comigo e falou: Maria assim que tiver o espaço,
o que você passou par mim, eu to juntinho com você pra passar pra outras
pessoas.
Tem até uma aqui junto comigo na foto, entendeu? Ela tem filho já. Até inclusive
o irmão dela também vem nessa luta junto comigo. Ela era novinha, ela era
adolescente na época, agora ela tem dois filho. Na época ela era novinha. Ela
77
mora aqui perto de mim mesmo. Ela faz até hoje. Sabe que a loucura é tão
grande, é tanta coisa que outro dia eu falei: Jussandra, você sabe o ponto
entendeu?
78
C APÍTULO 6
A T ECITURA DA T RAM A :
A NÁLISE E I NTERPRETAÇÃO DOS DADOS
Espinosa
79
A história de Maria e de como a cooperativa entra em seu processo de
Mas relatar sua história não basta para concluirmos este trabalho, é
de compreensão, uma vez que revela a base afetivo-volitiva das ações e das
falas.
participação no Movimento Social Unidos pela Paz e nas entidades para as quais
Maria para a solidariedade? Qual é o alcance social desta mudança? Chega a ser
pública?
análise, cada uma delas caracterizada por um sistema de afetos que permitem
esperança
80
1. O LUGAR: A FAVELA DA ROCINHA
ela não começa a contar sua história pela infância, não identifica a adolescência,
mas sua história é contada a partir do momento em que ela sai da cidade de
Rocinha23.
“Eu sou natural de Campos, no Estado do Rio.Eu vim da minha cidade, da minha
própria comunidade em que ela vive. Em todos os momentos, ela coloca a história
que ela se identifica com o lugar e que o trata como seu, dividindo,
23
Sawaia também constatou tal fato na pesquisa que fez com mulheres moradoras de uma favela em São
paulo. (Sawaia, 1987)
81
Em nenhum outro momento de seu relato ela torna a falar de sua cidade
natal ou de seus vínculos com ela. Seu lugar, sua comunidade é a Rocinha. Lugar
que ela enaltece e ama a despeito da própria realidade. Esse seu lugar de
costuma sair da favela. Tem medo. Um medo que segrega, isola e limita seus
horizontes, mas que também gera ações de modo a se sentir segura na Rocinha,
na sua comunidade.
de si é como falar da Rocinha e dos diversos grupos pelos quais ela passou. É se
viver, habitado por pessoas boas. Quando alguma coisa de ruim acontece no
morro, é trazido por pessoas de fora, que não pertencem a comunidade, quase
“A Rocinha tão legal (...), todo gringo que passeia, sobe. Então tem lá dentro, tem
a mata ali dentro. Tem o campo, eles vêm visitar. É uma coisa fora de série, fora
outra visão. Violência tem em todo lugar, mas intriga assim de várias favelas que
acontecer alguma coisa que acontece, é a própria polícia. Eu te juro por Deus,
82
garota. A própria polícia, eles entram, conforme saiu no jornal. O filho dessa
menina.Eu até conheço a menina ali de baixo da Rua Dois. a polícia chegou, o
menino soltando pipa em cima da laje, na rua Dois. A polícia chegou atirando do
nada.
ela reproduz o mesmo discurso estereotipado quando se refere aos outros morros
cariocas.
acostumei com a Rocinha. Na Rocinha, gringo pode chegar, qualquer uma pessoa.
Qualquer pessoa que chegar aqui dentro da nossa comunidade, ninguém implica com
ninguém.
ressalta o amor, amor pelo lugar e pelas pessoas, sendo que o medo aparece de
forma difusa e indireta, mas com muita força, é o medo do desconhecido, medo
do outro que invade a favela atirando e tirando a vida dos conhecidos, dos
vizinhos.
O medo a imobiliza Maria, mas também gera ação pela força do outro
sentimento, o amor. No capítulo anterior vimos que a polícia que invade a favela
Maria a enfrenta quando tem que defender seus filhos que precisam descer o
“Então, porque que eu vou aceitar que venha uma polícia de lá pra esculachar
meu filho? Ou um filho de um vizinho meu que eu to vendo que são umas
los. Uma mãe perde um filho e ela se identifica com esta mãe, uma igual. Ela não
quer que seus filhos tenham o mesmo fim, por isso desce com eles, enfrenta seu
medo de perder os filhos é que lhe impele a enfrentar a polícia apresentando seus
filhos e dando a garantia de uma mãe de que seus filhos não são “vagabundos”.
fora do morro, são vistos por ela como pacíficos, pessoas que não agridem os
visitantes e nem mesmo as pessoas da comunidade. Eles são vistos por ela como
24
Maria não suporta injustiça
84
membros da comunidade ao qual ela faz parte, portanto são iguais. Mas há
diferenças. Ela sabe que gente decente e trabalhadora não deve ser confundida
85
2. ATIVIDADE SOLIDÁRIA
O outro da comunidade é visto como um igual, por isso ela luta por ele, ela
mulheres e as jovens e ensinando a arte que sua mãe lhe ensinou. Esta potência
Quando eu vim da minha terra eu tinha 15 anos, eu vou fazer 52. Vários anos já.
levavam num lugar pra vender e tudo mais, eles compravam das adolescentes.
incentivando e tudo pra eu poder continuar o trabalho. Inclusive tem muita menina
aqui perto da minha casa que hoje já tem filho, que aprendeu a fazer os trabalhos
25
Fundada em 82
86
manuais que eu mesmo passei a experiência pra elas e tudo, né? Aí depois disso
eu dei uma boa parada, né? E o pessoal morador: “Pôxa, Maria, porque você não
continua?” Depois dessa parada que eu dei, já trabalhei como balconista, como
caixa. Já fiz várias atividades, entendeu? Além desses trabalhos artesanais que
eu desenvolvo, né?
saindo por conta de falatórios, de “fofocada” como ela mesma diz. Mas sair da
Na Coopa-Roca, eu fui uma das fundadoras e muitas dessas meninas que estão
Roca está começando a crescer de novo, porque teve uma época que a Coopa-
Roca deu uma caída (...) Porque assim, eu Maria, não tenho nada assim contra a
coordenadora. Porque nunca ela ficou me devendo. Mas muita gente fala porque
retalhos. Agora não, agora já faz crochê, desde que eu entrei pra lá eu já fazia
esse trabalho, tricô, crochê, boneca de porcelana. Uma vez, ela foi receber o
presidente da Nicarágua lá em São Paulo. Foi eu, uma outra senhora, foram três
pessoas. Fizemos uma exposição. E a linha da Coopa-Roca não era nem negócio
de boneca de porcelana, tricô, crochê, mas ela falou,: não, Maria, você pode
expor seu trabalho, você bota tudo junto. (...) Até noutro dia a menina disse: a
falaram: se você voltar pra lá, então não vai dar. Muitas pessoas não querem. (...)
87
eu não tenho nada contra ela, mas a pessoa trabalha pra ela, só trabalha pra ela,
entendeu?
comunidade que faz com que ela volte, não para a cooperativa, mas para um
novo trabalho, semelhante, mas com uma outra estrutura e um outro nome.
felicidade é o afeto positivo que predomina nas narrativas das experiências com o
Na lida com o outro, ela se sente responsável, tem que jogar limpo,
honestamente. Às vezes se esforça mesmo por agradar a este outro. Junto a ele,
ela age, tem força, tempo, dedicação, iniciativa. A felicidade para ela é estar
Felicidade pra mim é tudo. É tudo, tudo mesmo. Eu sou uma pessoa que eu gosto
isso assim, assim. A Maria arrumou isso assim, assim pra mim. Me ensinou a
fazer. Ah! Eu fico super feliz. Eu não sou egoísta, eu não quero a coisa só pra
gente, antes de eu morrer eu quero realizar esse meu sonho. Tem menina já, que
já aprendeu comigo e falou: Maria assim que tiver o espaço, o que você passou
par mim, eu estou juntinho com você pra passar pra outras pessoas.
Tem até uma aqui junto comigo na foto, entendeu? Ela tem filho já. Até
inclusive o irmão dela também vem nessa luta junto comigo. Ela era
novinha, ela era adolescente na época, agora ela tem dois filhos. Na época
88
ela era novinha. Ela mora aqui perto de mim mesmo. Ela faz até
entendeu?
a esperança de esperançar. Para tanto sabe que sozinha não conseguirá. Pede
esperar.
O que mais chama a atenção na fala de Maria, é que ela sempre acha um
recurso, parcerias e contratos. O limite técnico, que pode ser confundido com um
limite mais de ordem subjetiva, de retorno à submissão, fica claro quando ela
tenta estabelecer regras para esta ajuda e a relaciona com o receio de perda de
autonomia.
(...) mas não temos assim... nós não temos uma pessoa que dê uma força pra
gente, que nos guie, entendeu? Que esteja junto com a gente, explicando assim:
é isso, é isso. Não andei em lugar nenhum ainda. E... mas é porque eu sou assim,
até as pessoa dizem: Maria, você não quer formar uma cooperativa? Eu falei: tudo
bem, eu gostaria de tivesse algumas pessoas junto nos instruindo pra gente poder
fundar uma cooperativa, nós temos só aqui a Coopa-Roca, né? Outra cooperativa
89
(...) A dificuldade que a gente sente, é porque a gente precisa de uma pessoa que
esteja do nosso lado entendeu? Nos ajudando, nos orientando, correndo atrás pra
(...) E com pessoas de fora que queira colaborar com a gente. Uma pessoa que
tenha instrução pra nos guiar, né? Divulgar nosso trabalho. Correr atrás, né?
parte. Elas são as pessoas de fora da favela que vão dar visibilidade ao seu
(...) Olha, quando pareceu essa menina da Alemanha, as pessoas, Maria que
benção!
transparência do processo.
(..)Aí no dia que ela ligou ela queria vir. Eu falei: não. Você deixa pra vim amanhã
que eu vou reunir o grupo, pra eu poder apresentar o grupo pra você, os trabalho.
Aí começou. Eu levei ela em cada uma casa das artesãs. Pra ver os trabalhos.
90
No entanto, este outro, que é visto em um primeiro momento como aquele
(...) Eu sou uma pessoa que eu gosto de jogar limpo, entendeu? Graças a Deus,
montar um projeto ah, você Maria, todo mundo já sabe que eu sou uma pessoa
super, entendeu? Certinha. Eu não gosto de passar por cima de ninguém, certo?
Então muitas pessoas, elas respeitam o meu trabalho porque sabem o que eu
sou, sabem a minha pessoa. Então, eu acho que tem espaço pra todo mundo a
Logo elas vêem que estas pessoas não vão ajudar naquilo que elas
queriam, por isso cedem apenas em parte a esta exigência. Quando recebem
juro perante os meus netos que estão aqui. A Patrícia quer que passe primeiro
pela Fushico, a loja da Alemanha, que as pessoas encomendem a ela. E ela faz o
pedido pra gente. Tudo bem. Então nós não temos nem noção de como é
exportar nada. Tudo bem, é uma boa pra gente. Importante que as mulheres tão
pessoas com contato social mais amplo. Porém, dentro do Brasil, a história é
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outra. Não prometem exclusividade, querem sim, buscar uma maior divulgação de
seus produtos e um mercado que possa comprá-los, mas não sabe como fazê-lo.
(...) nós não queremos só viver de exportação. Se a gente encontrar alguém que se
interesse pelo nosso trabalho, entendeu? Que compre o nosso trabalho, ou arranje um
lugar pra gente deixar lá, uma loja pra gente poder vender e tudo. Até que seria uma boa,
É importante notar que o medo retorna neste momento, como medo de sair
expansão, tem medo de buscar ajuda com um outro que é diferente dela, que não
Então, pra esse negocio assim de ir atrás, eu sou muito parada. Por isso que eu
falo que tinha que ter uma pessoa pra ta com a gente nos orientando. Eu sou
Diante deste medo ela espera. A comunidade espera por Maria, e Maria
espera por outro que venha de fora para agir também lá fora. São dois espaços
92
distintos: dentro da comunidade ela é autônoma, fora da comunidade ela precisa
que um outro aja por ela. E assim ela clama por alguém que faça pelo seu grupo
Pra isso a gente precisa de uma pessoa. Porque a Coopa-Roca tem muitas
comerciais faz parte desta tendência. Por isso espera e seu medo demonstra
Porém também tem medo de trazer pessoas que explorem as artesãs, ela
sabe dos riscos que podem advir desta ajuda, como a exploração, a perda da
para si, não para esta pessoa. A autonomia do grupo deve ser mantida.
Eu falei: gente, deixa como está. No dia que aparecer uma pessoa que queira
trabalhar com a gente aqui dentro da nossa comunidade, que se interesse e que
valorize o nosso trabalho. Porque o meu medo mais é a gente se misturar com
essas pessoas aí, que elas são tudo macaca velha, tudo muito esperta. E você
tem um grupo legal, um grupo bacana e vem essas pessoas que já tem esses
projetos malucos aí: ah! Vamos juntar os projetos! Depois começa a me sacanear,
O medo de Maria, que pode ser visto como um padecimento, também pode
consciência de que o de fora não pode exercer seu poder, como na Coopa-Roca,
mas seria convidado a participar como um igual, sem deixar de ser diferente, ou
seja, ele teria sua função dentro do grupo, seu lugar, sem dominá-lo.
mais forte e contrária a ela, nem mesmo uma idéia verdadeira ou a razão
consegue vencer uma paixão porque alma e corpo estão juntos e apenas uma
idéia, por mais correta que seja não consegue vencer esta união.
Na obra de Espinosa, somente uma paixão vence outra paixão, se for mais
forte e contrária a ela, nem mesmo uma idéia verdadeira ou a razão consegue
vencer uma paixão porque alma e corpo estão juntos e apenas uma idéia, por
94
mais correta que seja não consegue vencer esta união. O medo e a esperança
medo é uma tristeza inconstante nascida da idéia de uma coisa futura ou passada
heteronomia, onde o ser é dirigido pelas emoções do outro. São afecções que
mantém a tirania. O medo de um futuro pior – uma contingência que pode ou não
acontecer e que não podemos controlar – nos faz nos submeter ao tirano. O
tirano vive do medo alheio, o servo vive no medo e o sacerdote apieda-se dos que
aos limites do morro, mas que a faz “pôr a boca no mundo” para defender um
95
Com a esperança, o processo se repete. Identificamos momentos de apatia
com esta colaboração de fora, mas quando se trata de projeto para o futuro e da
ativa, guerreira, desafia a lógica do sistema dominante ao propor uma saída para
que aparece com grande força na fala de Maria tanto pode expressar sua
Eu quero ajudar a comunidade. Claro, me ajudar também. Mas meu sonho é ver a
profissão, entendeu? Ganhando o dinheirinho com o próprio suor. Elas têm que
aprender ganhar com o próprio suor e ter o dinheirinho delas, né? Não é fácil,
ganhar dinheiro fácil. Que isso também não dá certo. Tem que lutar, né?
26
Sobre a diferença entre esperança de esperar e esperança de esperançar ver palestra proferida por
Sawaia no Conselho Regional de Psicologia de Campinas. mimeo 2004
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É, não é fácil ganhar dinheiro fácil. Também não é fácil convencer os
jovens de que o repetitivo gesto de emendar tecidos com agulha e linha pode
significar trabalho honesto, dignidade, futuro. Pior ainda quando não consegue
escoar a produção para que as artesãs tenham receita com certa regularidade.
(..) Felicidade pra mim é tudo. É tudo, tudo mesmo. Eu sou uma pessoa que eu
dizer: aprendi isso assim, assim. A Maria arrumou isso assim, assim pra mim. Me
ensinou a fazer. Ah! Eu fico super feliz. Eu não sou egoísta, eu não quero a coisa
Tem menina já, que já aprendeu comigo e falou: Maria assim que tiver o espaço,
o que você passou par mim, eu estou juntinho com você pra passar pra outras
pessoas.
Daqui pra frente, meu sonho é ver essa ONG dar certo. Transformar numa
cooperativa, tudo. O que vier vai ser bem vindo. Alguém que se interesse pra
Espinosa
99
A expressão “na prática a teoria é outra coisa” é o que me vem em mente
idéias para que possamos avançar neste processo de busca por soluções
quanto pela própria crise econômica que tem abalado ate grandes grupos
100
Esta ajuda pode garantir bons negócios, mas pode também desagregar e
Por estar na mais famosa favela brasileira e uma das que mais recebe
na medida em que ela foi afetada pelas diversas instituições por onde passou
que já existia em Maria. Ela era solidária muito antes de descobrir a cooperativa.
Mas foi na cooperativa que percebeu o poder que a criatividade das costureiras
mesmo tempo, percebeu que o crescimento econômico do grupo passa pela ação
101
continuavam a freqüentar a cooperativa porque identificavam ali um espaço de
direta que têm sido muito incentivadas na sua criação por organismos
transformar o grupo no sucesso que é hoje, quer como aquela que controla os
volta à empresa capitalista, quer, no caso de serem mais fortes os interesses dos
uma lição. Aprendeu que este trabalho pode ser rentável e passou a buscar a
com autonomia das pessoas. Logo, o trabalho manual não pode ter um fim em si
as senhoras da terceira idade. Além de ser uma bandeira de luta constante contra
comunidade.
tem novos problemas hoje, precisa de parcerias, quer recuperar o controle das
uma sede, teme que as pessoas que se propõem a ajudar ajam de má-fé e
novas para aquela mulher que desde os 15 anos reúne as meninas para ensinar
tricô e crochê.
Na cooperativa (que ainda não pode usar este nome porque não está
legalizada como tal) que Maria coordena, esta participação conquistada nos bons
causam sofrimento.
de escuta onde cada um pode falar com a própria boca, com suas próprias
palavras. Deve abolir a ordem de sujeição que foi imposta ao trabalhador a vida
104
competências diferentes. É preciso realizar a transformação das pessoas
105
R EFERÊNCIAS B IBLIOGRÁFICAS
Brasiliense, 1987.
Paulo, 1994.
2002.p.25.
106
MOURA, R. Recortes da moda: Coopa-Roca um conceito de arte, Dissertação de
2001.
107
___________. A emoção como locus da produção do conhecimento - Las
1994.
PUC/SP, 1987.
_______e SOUZA, A.R. (orgs.) A economia solidária no Brasil. São PR. ACOSTA,
M. A. F. VITALE (Orgs.). Família: redes, laços e políticas públicas, pp. 39-50. São
Contexto, 1998.
108
SOUZA, T.M.S. A construção das mulheres como sujeitos coletivos: o papel das
109
Anexo 1
Desfile COOPA-ROCA no São Paulo Fashion Week, com direção de estilo de Marcelo Sommer, junho 2003 e
fevereiro 2004;
Workshop e Performance, Teatro Volksbuhne, Berlin, Alemanha, novembro 2003;
Exposição REtalhar 2002, SESC Belenzinho/São Paulo/julho a setembro 2002, Rio Design Barra/novembro 2002
a janeiro 2003, Centro Cultural Justiça Federal abril a junho 2003;
Desfile Fashion Rio, julho 2002;
Participação especial na exposição Morro Labirinto, do Goethe Institut Rio, Paço Imperial, Rio de Janeiro, março
2002;
Participação especial no Desfile da M.Officer, São Paulo Fashion Week, janeiro 2002;
Participação especial no Desfile de Carlos Miele, London Fashion Week, set 2001;
Desfile COOPA-ROCA & M.Officer, Semana Barrashopping de Estilo, Rio de Janeiro, julho 2001;
Participação especial no Desfile da M.Officer, São Paulo Fashion Week, janeiro 2001 e junho 2001;
Participação especial no Desfile da Amazon Life, Rock in Rio, janeiro 2001;
Exposição Design nos 500 Anos, Pinacoteca do Estado de São Paulo, dezembro 2000;
Decoração de Natal do Metrô do Rio de Janeiro, dezembro 2000;
Exposição REtalhar 2000, Galeria do Parque das Ruínas, abril 2.000, Rio de Janeiro e Galeria
do SENAC-Esmod, São Paulo, julho 2000;
Participação Exposição "A culpa é do Pau Brasil", Semana Barrashopping de Estilo, Rio de Janeiro, julho 2.000;
Participação especial no Desfile da M.Officer, no Morumbi Fashion, junho 2000;
FIDEM’99 (Feira Internacional de Empresárias), Granada/Espanha, outubro 1999;
Premiação "Mulher, Pequena Produção e Desenvolvimento", Representante do Brasil na Pesquisa coordenada
pela REPEM (Rede de Educação Popular entre Mulheres da América Latina e Caribe), Montevideo/Uruguai,
dezembro 1998;
Semana Barrashopping de Estilo, Barrashopping, Rio de Janeiro, agosto 1998;
Produção cenográfica da cantora Fernanda Abreu/tourné Brasil e Europa 1998;
Participação especial na exposição de fotografias do estilista alemão Karl Lagerfeld, a convite do Goethe Institut,
MAM-Rio de Janeiro, agosto 1997;
Exposição "Brahma Reciclarte", Jardim Botânico-Rio de Janeiro, outubro/novembro 1997
Exposição "Desenvolvimento Sustentável : 100 Experiências Brasileiras", Consulta Nacional/Agenda 21, no
BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Rio de Janeiro, março 1997;
Desfile lançamento quiosque Riosul, Centro Cultural Banco do Brasil/Rio de Janeiro, novembro 1995;
Desfile Hause Der Kulturen Der Welt/Berlin, Alemanha, março 1995;
Desfile Semana de Estilo/Museu Nacional de Belas Artes/Rio de Janeiro, setembro 1994;
Desfile Phytoervas Fashion/São Paulo, julho 1994;
Desfile Moda Mix, Fundição Progresso/Rio de Janeiro, abril 1994;
Exposição ¨Artesãs da Rocinha¨, Solar Grandjean de Montigny/PUC-Rio, Rio de Janeiro, outubro 1990;
Exposição ¨Retalho:Feminino, Plural¨, Instituto Nacional do Folclore FUNARTE/Ministério da Cultura, Rio de
Janeiro, setembro 1987;
Parceiros para o Progresso, XIV Feira de Berlim, Alemanha, setembro 1986.
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Anexo 2
Fonte: Artigo publicado no site do jornal alemão Welt am Sontag em 23 de maio de 2004. Disponível em:
http://www.wams.de/data/2004/05/23/281327.html
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Anexo 3
Fonte: Notícia publicada no site do jornal alemão Kölnische Rundschau, em 19 de outubro de 2004. Disponível em:
http://www.rundschau-online.de. Nota: o conteúdo do texto é idêntico ao artigo publicado por outro jornal alemão em maio
do mesmo ano.
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Anexo 4
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Fonte: Viva Favela. Disponível em: http://www.vivafavela.org.br
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